Democracia e golpes e sua relação com os meios de comunicação na América Latina

June 7, 2017 | Autor: Andrezza Richter | Categoria: Latin American Studies, Media Studies, Political Science, Golpes de Estado
Share Embed


Descrição do Produto

Democracia e golpes e sua relação com os meios de comunicação na América Latina Andrezza Richter, 2015 Através das experiências políticas latinoamericanas envolvendo golpes e revoluções (frustradas ou não), é possível perceber analogias e repetições em tais acontecimentos. Podemos usar como exemplo o desenvolvimento de políticas progressistas por governos populares e tentativas (ou realizações factuais) de golpes perante tais governos, como no caso do Chile nos anos 70, na Venezuela em 2002 e no Brasil em 2015. É importante ressaltar e perceber a influência que a mídia exerceu perante esses processos políticos. A começar pelo Chile, constata-se que o governo de Allende (Unidade Popular) tinha, de fato, uma proposta de um governo socialista, cuja transição se daria de maneira pacífica. O projeto de Allende confrontava diretamente os interesses das classes dominantes, e nele estava incluído a reforma agrária, nacionalização de empresas estratégicas e a democratização no acesso aos bens básicos. Neste caso, as classes dominantes se mobilizaram em greves e boicotes de distribuição e, contando com o apoio estadounidense, inferiram um golpe de estado para derrubar o governo democrático e impor uma ditadura autoritária contra a ameaça comunista (sic!). Durante o governo de Allende, a imprensa adquiriu uma postura reacionária e mentia ou omitia os progressos da nação durante o mandato de o presidente socialista, ajudando, assim, a propagar desinformação e ódio em relação ao governo vigente e à política socialista. No caso da Venezuela de Hugo Chavéz, é constatado que o governante, eleito em 1999, possuía projetos que confrontavam o espectro neoliberal que rondava a América Latina naquele período. Seu governo se pautava principalmente por transformações na política, de modo a ampliar a democracia e a participação da população. Seu governo elaborou uma nova Constituição, além de aprovar 49 leis em um único ano (uma lei por semana) e, por conseguinte, se constituiu como um governo transformador da política nacional, porém tímido quando se tratava de mudanças da economia do país. Mesmo assim, ele foi fortemente acusado pelas elites e grupos de poder de dividir o país em pobres e ricos e causar problemas no sentido de prejudicar as classes mais altas. Em 2002, o dia 11 de abril foi um marco comprobatório do poder da mídia perante o jogo de poder: Foi o dia em que ocorreu um golpe de Estado virtual. Ali, setores conservadores das classes médias e altas organizaram uma manifestação contra o governo pelas ruas de Caracas e a ênfase dada pelos canais de comunicação foi forte e tendencioso. As notícias sobre a manifestação eram televisionadas a cada 10 minutos e os canais de televisão criavam uma realidade própria e diferente da que acontecia nas ruas. O ápice desse método de manipulação (ou golpe, como preferir) foi num discurso oficial de Chavez em rede nacional (o qual os canais de comunicação foram obrigados a transmitirem) quando, durante o discurso do presidente, ele denunciava a manipulação dos fatos pelas mídias, a tela foi dividida em duas partes onde, do

outro lado, havia imagens da manifestação contra o governante, e o áudio de Chávez foi cortado e substituído pelos sons do protesto. Esse foi o marco venezuelano para que ocorresse de fato um golpe de Estado, encoberto e respaldado pela mídia privada nacional. Por último, pensaremos no Brasil pós Lula-2002 como um país que tem investido fortemente em políticas sociais de redução da desigualdade social. Por meio de políticas redistributivas como o bolsa-família, programas de incentivo e financiamento estudantil como o Prouni e o Fies, tem havido possibilidade de acesso ao consumo e à políticas públicas que não havia antes. Esse acesso e democratização do Brasil, assim como aconteceu nos outros países já citados, incomodou alguns setores das classes dominantes. Desde que o partido governista (o PT) está no poder, há um movimento incessante da mídia e de grupos de oposição em apontar escândalos e descontentamento perante o governo. A gestão de Dilma Rouseff é marcada pela intensificação da ofensiva midiática, sobretudo por meio de repetição de propagação de alardes sobre uma crise econômica e sobre escândalos de corrupção na empresa estatal Petrobrás, utilizando especulações de possível participação da atual presidente e de seu antecessor (Luís Inácio Lula da Silva). No começo de 2015, grupos de classe média e de saudosistas da ditadura saíram às ruas pedindo Impeachment da atual presidente, dentre as diversas reivindicações (como intervenção militar, fim da corrupção – um tema vago). O papel da mídia foi crucial para aumentar o montante de pessoas e a desinformação (ou melhor, informação manipulada) acerca da manifestação em si. As chamadas na televisão se deram de maneira incessante, assim como ocorreu na Venezuela; a cada 10 minutos a rede Globo pausava sua programação normal para mostrar imagens do protesto (lançando mão de palavras como “democrático” e “pacífico”). Ressaltamos que a rede Globo também respaldou o golpe e a ditadura militar brasileira que ocorreu em 1064. Nesta manifestação brasileira ocorrida em abril de 2015, dentre as informações e pesquisas colhidas nas mídias alternativas, constata-se que a maior parte das pessoas que estavam lá tinha como principal meio de obter informações as indústrias midiáticas tradicionais e as redes sociais, e não estavam inteiradas sobre a realidade política brasileira em escala estrutural e funcional. Ou seja, essa manifestação ocorrida em abril, e amplamente divulgada e transmitida pela televisão, teve um pano de fundo nebuloso e, de certa forma, foi constituída por massas de manobra de grupos de interesses, que foram guiadas pelas informações amplamente divulgadas e manipulas pelos meios tradicionais de comunicação. É possível, por meio da análise dos acontecimentos relatados nos três países latinoamericanos em questão, constatar o poder que a imprensa exerce sobre a política em cada pais. As mídias tradicionais constituem blocos de poder cujo interesse converge para o liberalismo e muitas vezes até ao golpismo, se opondo fortemente a quaisquer mudanças e transformações sociais e se constituindo como uma barreira para uma realidade igualitária.

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.