Descartes, música e as paixões: um diálogo de época - Resumo Expandido

May 30, 2017 | Autor: Tiago De Lima Castro | Categoria: Estética, Música, Estética y Teoría del arte, Filosofia Da Música, Estética Músical
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Anais do SEFiM, Porto Alegre, V.02 - n.2, 2016.

Descartes, música e as paixões: um diálogo de época Descartes, music and passions: a dialogue of an epoch Palavras-chave: Descartes; Zarlino; Murs; Salinas; Mersenne; Paixões. Keywords: Descartes; Zarlino; Murs; Salinas; Mersenne; Passions.

Tiago de Lima Castro Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho [email protected] A obra Compendium Musicae (1618) de Descartes inicia-se propondo que a música tem a “finalidade de deleitar e movimentar diversas paixões [affetctus]” (Descartes, A.T, X, p. 89), através da proporção, em sentido matemático, dos sons com os sentidos. Essa relação entre música e as paixões remetem diretamente ao pensamento musical da antiguidade, entretanto, seria ingenuidade considerar que o autor não estivesse dialogando com tratados de sua própria época, afinal, o pensamento musical da antiguidade é semelhante a um esteio sob o qual o ocidente elabora, ou reelabora, tal pensamento dentro das necessidades teóricas e práticas de cada época. Por isso, seria ingênuo considerar que o autor se remete diretamente a fontes antigas ao elaborar esta proposição, ao invés de elaborá-la a partir da leitura de obras em voga em sua época, as quais também filtram as proposições antigas através de textos intermediários. Como um texto de juventude, logo após a frequência dos estudos em La Flèche, colégio jesuíta, é possível que seu conhecimento musical advém tanto das aulas, em que a música apresenta ligação intrínseca a matemática, como em suas próprias leituras na vasta biblioteca disponível no colégio. Infelizmente, não se tem registros da biblioteca do colégio no período em que Descartes estudou (cf. WYMEERSCH, 1999), daí a necessidade de leitura de obras em voga em sua época para verificar esse provável diálogo. Jean de Murs foi um teórico musical do século XIV ligado diretamente ao Ars Nova, enquanto um de seus consolidadores, utilizando-se do pensamento de Aristóteles e de Boécio, realizando um diálogo entre sua própria época com o pensamento, já que Boécio fora das grandes fontes da teoria musical antiga em sua época. Como suas obras apresentam forte relação entre música e matemática, através de uma relação entre os ouvidos com o senso de proporção passível de análise matemática. Mesmo Descartes estando num momento em que o Ars Nova já estava estabelecido, é possível apreender uma relação entre os teóricos. Gioseffo Zarlino, na obra Le Istitutioni Harmoniche (1558), articula conceitos musicais da antiguidade com a práticas apreendidas de Adrian Willaert, através do esteio teórico de Aristóteles, entre outras coisas, removendo o abismo entre o músico teórico e prático com a composição musical. Sua análise gira em torno das proporções matemáticas entre os sons e os ouvidos. Descartes cita a obra de Zarlino, no Compendium Musicae, quando

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trata do tema modos musicais. Por muito tempo considerou-se a possibilidade de Zarlino ter sido o teórico musical de maior influência sobre Descartes, porém, tal colocação tem sido minimizada, já que a citação a Zarlino ocorre em um contexto em que ele é indicado para estudo dos modos, o qual não é foco do texto do Compendium Musicae. Entretanto, a citação de direta a Zarlino exige, minimamente, a averiguação do aspecto visado nessa comunicação. Francisco de Salinas foi um teórico espanhol, membro da Universidade de Salamanca; o De musica libri septem [1577], uma obra teórica de importância na época. O colégio La Flèche, como uma instituição jesuíta, tinha em sua biblioteca obras de origem ibérica, já que o pensamento jesuíta, surgido com Inácio de Loyola, tem forte ligação com a produção intelectual ibérica. Pode-se exemplificar que o próprio estudo de lógica era feito com obras do filósofo português Pedro de Fonseca, de metafísica por Francisco Suárez, ambos jesuítas. Dessa forma, é provável a leitura de Salinas por Descartes. Marin Mersenne correspondeu-se intensamente com Descartes, sendo a música um dos temas de sua preferência, a ponto de dialogarem sobre isso nas cartas. Mesmo a obra Harmonie Universelle (1636) tendo sido publicada posteriormente, a amizade e mútua influência entre ambos torna necessário verificar esse aspecto. Deve-se ter em mente que Mersenne correspondeu-se com muitas pessoas de sua época, conhecendo até mesmo Monteverdi. Mesmo não havendo registros diretos das obras pertencentes ao acervo de La Flèche, as obras que circulam em torno de Descartes naquele momento histórico possibilitam articular um debate de época sobre a relação entre a música e as paixões no século XVII. Referências ADAM, C.; TANNERY, P. (Eds.). Oeuvres de Descartes. Paris: Vrin/CNRS, 1897-1913. 11 v. DESCARTES, R. Abrégé de musique: Compendium Musicae. Trad. Frédéric de Buzon. Paris: Puf, 1987. FUBINI, E. La estética musical desde la Antigüedad hasta el siglo XX. Trad. Carlos Guillermo Pérez de Aranda. Madrid: Alianza Edittorial, 2005. GAUKROGER, S. Descartes: uma biografia intelectual. Rio de Janeiro: Contraponto, 1999. MERSENNE, M. Harmonie Universelle. Paris: Éditions du CNRS, 1986. 3 v. [1636] MORENO, J. Musical Representations, Subjects, and Objects The Construction of Musical: Thought in Zarlino, Descartes, Rameau, and Weber. Indiana: Indiana University Press, 2004. MURS, J. Écrits sur la musique. Trad. Christian Meyer. Paris: CNRS Editions, 2000. PESIC, P. Music and the Making of Modern Science. Cambridge: The MIT Press, 2014. SALINAS, F. De musica libri septem. 1577. Disponível em: . Acessado em: 10 fev. 2016. [1577] WYMEERSCH, B. Descartes et l´évolution de l´estethétique musicale. Belgique: Mardaga, 1999. ZARLINO, G. Istitutioni harmoniche. 2007. Disponível em: . Acessado em: 20 out. 2015. [1558]

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