DESENVOLVENDO CULTURAS, POLÍTICAS E PRÁTICAS INCLUSIVAS DE AVALIAÇÃO NA FORMAÇÃO DOCENTE INICIAL

June 4, 2017 | Autor: Mônica P.Santos | Categoria: Teacher Education, Educational evaluation, Inclusive Education
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SANTOS, M. P. e SEPÚLVEDA, D. Desenvolvendo Culturas, Políticas e Práticas Inclusivas de Avaliação na Formação Docente Inicial. Anais do I Congresso Nacional de Avaliação em Educação: I CONAVE. Bauru: CECEMCA/UNESP, 2010, pp. 1 12. (ISBN: 978-85-99703-52-6) Eixo-temático: Avaliação em Educação: Fundamentos Teóricos e Metodológicos DESENVOLVENDO CULTURAS, POLÍTICAS E PRÁTICAS INCLUSIVAS DE AVALIAÇÃO NA FORMAÇÃO DOCENTE INICIAL Mônica Pereira dos Santos – Universidade Federal do Rio de Janeiro ([email protected]) Denize de Aguiar Xavier Sepúlveda – Universidade do Estado do Rio de Janeiro ([email protected]) Resumo: O presente trabalho baseia-se numa pesquisa desenvolvida entre fevereiro de 2004 e dezembro de 2007, que investigou a formação de futuros professores da Faculdade de Educação de uma Universidade Pública da cidade do Rio de Janeiro com relação a uma orientação inclusiva de educação. Os resultados mostraram que a instituição possuía entraves a serem superados quanto a uma formação inclusiva dos futuros professores. Muitos desses entraves fundamentam-se na confirmação de culturas, no desenvolvimento de políticas e na orquestração de práticas pedagógicas que possuem uma orientação “tradicional” do processo ensino/aprendizagem, em especial no que tange à avaliação. Para superar esse quadro, é preciso uma revisão das concepções e práticas avaliativas por parte dos professores formadores, na tentativa de se construir uma cultura em que a avaliação seja considerada um processo pelo qual o professor acompanha o desenvolvimento do aluno, um momento de análise no qual o educador interroga-se a si mesmo, e ao se perguntar como seus alunos estão construindo seus conhecimentos e organizando o pensamento, o professor procura compreender o que os estudantes necessitam de sua mediação, favorecendo a aprendizagem de todos os alunos. A amostra foi composta por 1007 licenciandos. Metodologicamente, usou-se análise documental para analisar ementas das disciplinas oferecidas na formação dos professores, e aplicamos questionários e grupos focais aos sujeitos. A relevância do estudo se verifica, no tocante: (a) a discussões curriculares, pelo desvelamento do currículo oculto: relações de conflito, tensões e poderes, visão hierarquizada, disciplinar (por oposição a interdisciplinar) e separatista entre o pensar e o fazer, levando a exclusões; (b) à dialética exclusão/inclusão, pela maneira como se configurou a vida acadêmica dos alunos participantes, e pelos respectivos reflexos na formação; e em termos mais macros (c) pelo fato da pesquisa abordar tema de expressiva preocupação no ordenamento jurídico atual, nacional e internacional, de Educação. Palavras-chave: Construção de Culturas, Desenvolvimento de Políticas, Orquestração de Práticas, Avaliação, Formação Docente. Financiamento: CNPq

SANTOS, M. P. e SEPÚLVEDA, D. Desenvolvendo Culturas, Políticas e Práticas 2 Inclusivas de Avaliação na Formação Docente Inicial. Anais do I Congresso Nacional de Avaliação em Educação: I CONAVE. Bauru: CECEMCA/UNESP, 2010, pp. 2 -12. (ISBN: 978-85-99703-52-6) O presente artigo baseia-se em trabalho apresentado no IX Colóquio sobre Questões Curriculares e V Colóquio Luso Brasileiro, ocorrido em Porto, Portugal, em 2010 (SEPÚLVEDA e SANTOS, 2010), e versa sobre a Pesquisa Ressignificando a Formação de Professores para uma Educação Inclusiva, desenvolvida no Programa de Pós Graduação em Educação da UFRJ. A pesquisa iniciou-se em fevereiro de 2004 e objetivou investigar a formação de futuros professores da Faculdade de Educação com relação a uma orientação inclusiva de educação (SANTOS e PAULINO, 2008; SANTOS, FONSECA e MELO, 2009), que compreende os processos de inclusão e exclusão como interligados em uma relação dinâmica, tensional, dialética e trialética, perpassada, contínua e simultaneamente, por três dimensões: a da construção de culturas, a do desenvolvimento de políticas e a da orquestração de práticas de inclusão em educação, como veremos mais adiante. Os resultados mostraram que a instituição possui entraves a serem superados quanto a uma formação inclusiva dos estudantes, alimentando a enorme lacuna entre teoria e prática, permitindo-nos verificar as práticas incoerentes dos formadores de professores, quando relacionadas às políticas públicas atuais em educação e às ementas das próprias disciplinas que ministram, cujo teor é potencialmente crítico, reflexivo, democrático e inclusivo. Esta lacuna e incoerências podem ser explicadas, em parte, pelo fato de o ensino dos professores de nível superior estar fundamentado, predominantemente, em práticas pedagógicas que possuem uma orientação ‘tradicional’ do processo ensino/aprendizagem. Segundo Sepulveda (2003/2010), a avaliação na abordagem tradicional é realizada predominantemente visando a exatidão da reprodução do conteúdo comunicado em sala de aula. Mede-se, portanto, pela quantidade e exatidão de informações que se consegue reproduzir. Daí a consideração de provas escritas e orais, exames etc..., que evidenciem a exatidão da reprodução da informação. O exame passa a ter um fim si mesmo e o ritual é mantido. As notas obtidas funcionam, na sociedade capitalista, como indicadores dos níveis de aquisição do patrimônio cultural. Para a superação desse quadro, uma das sugestões feitas ao final da pesquisa diz respeito à revisão das Concepções e Práticas Avaliativas por parte dos professores formadores, na tentativa de propor uma nova cultura da avaliação pedagógica na Faculdade de Educação, onde a avaliação não seja um fim em si mesma, mas seja vista

SANTOS, M. P. e SEPÚLVEDA, D. Desenvolvendo Culturas, Políticas e Práticas 3 Inclusivas de Avaliação na Formação Docente Inicial. Anais do I Congresso Nacional de Avaliação em Educação: I CONAVE. Bauru: CECEMCA/UNESP, 2010, pp. 3 -12. (ISBN: 978-85-99703-52-6) como um processo pelo qual o educador acompanha o desenvolvimento do aluno, privilegiando-a como momento de análise na qual o professor interroga-se a si mesmo e aos alunos e se pergunta como eles estão construindo seus conhecimentos e organizando o pensamento. Assim sendo, este artigo está dividido em quatro seções, além desta introdução. Na primeira, esclareceremos em que consistem as dimensões acima referidas e suas respectivas categorias de análise e apresentaremos os dados gerais da pesquisa. Na segunda, discutiremos a problemática da avaliação no processo ensinoaprendizagem, em particular no ensino superior, tomando por base as referidas dimensões. Na terceira, teceremos considerações acerca da avaliação no que tange à formação docente, novamente tendo as três mencionadas dimensões como base de análise. Por fim, apresentaremos nossas conclusões. As dimensões de análise da dialética e trialética inclusão/exclusão e os dados da pesquisa: O tripé culturas, políticas e práticas de inclusão está baseado no estudo do material denominado Index para a Inclusão (BOOTH & AINSCOW, 2000; Trad. SANTOS, 2002) e nos ajuda a pensar a questão das Concepções e das Práticas Avaliativas, já que o referido tripé proposto por esse material está baseado em três dimensões, essas presentes em qualquer esfera educacional e que influenciam nas concepções e práticas avaliativas dos professores que atuam nas instituições formadoras de futuros professores. As dimensões propostas pelo Index são: Dimensão A – Construindo Culturas Inclusivas; Dimensão B: Desenvolvendo Políticas Inclusivas; Dimensão C: Orquestrando Práticas Inclusivas. Os conceitos de inclusão são argumentados na direção da construção de culturas, políticas e práticas inclusivas no âmbito da educação, dimensões fundamentais para a redução das barreiras que impedem as aprendizagens ou não ampliam as participações de todos os alunos. Vale dizer que o princípio da participação é, no campo teórico dos processos de inclusão/exclusão, um conceito chave, na medida em que seja compreendida não apenas em seu aspecto de integrar as pessoas – por fazerem parte de -, como também de que tal parte se dê no sentido da tomada conjunta de decisões.

SANTOS, M. P. e SEPÚLVEDA, D. Desenvolvendo Culturas, Políticas e Práticas 4 Inclusivas de Avaliação na Formação Docente Inicial. Anais do I Congresso Nacional de Avaliação em Educação: I CONAVE. Bauru: CECEMCA/UNESP, 2010, pp. 4 -12. (ISBN: 978-85-99703-52-6) Como culturas de inclusão compreendemos os valores, conceitos e representações que os sujeitos têm a respeito da inclusão. Como políticas de inclusão entendemos as diretrizes e norteamentos das ações que visem à inclusão. Como práticas de inclusão definimos as participações sociais efetivas em relação à inclusão (SANTOS, 2003). Todas as instâncias de formação de professores possuem as referidas dimensões: Culturas, Políticas e Práticas, que influenciam a maneira como as universidades se organizam e os processos de apropriação dos conhecimentos dos alunos. Além disso, vale lembrar que como as dimensões se apresentam simultânea e continuamente, o que caracteriza o aspecto dinâmico da di/trialética inclusão/exclusão, podemos afirmar que, por mais que lutemos contra as exclusões, enquanto nossas sociedades estiverem organizadas como estão, em parâmetros capitalistas, que se alimentam da desigualdade social, toda pessoa, instituição, rede/sistema ou governo será sempre, a um só tempo, tanto inclusiva quanto excludente. Eis a complexidade da dialética e trialética inclusão/exclusão. Não há como garantir que sejamos, um dia, totalmente “inclusivos”, como se inclusão fosse um estado ao qual chegarmos em nossa “evolução”. Porque inclusão é processo, e não estado. E como tal, não é o fim, mas o meio para que a luta, que deve ser infindável, contra as exclusões, nunca acabe. Daí a necessidade de busca do que vimos chamando de um olhar trialético sobre os processos de inclusão/exclusão. Trata-se de adotarmos uma perspectiva de reflexão que suplemente uma visão dialética (e não a substitua) no sentido de tornar possível que a análise crítica se faça para além do pensamento binário, classificatório e polarizado (tese – antítese – síntese) que o racionalismo moderno insiste em afirmar e defender. O olhar polarizado, binário, dicotômico, gera uma visão monolítica acerca dos complexos processos humanos e sociais, em que se incluem a educação e as histórias das sociedades. Tratase, em suma, não da defesa de uma síntese como fruto de acolhimento da pluralidade reflexiva, mas da defesa do reconhecimento da coexistência de múltiplas maneiras e formas de existirmos, todas com peso moral e ético igual, pois que o reconhecimento de tal coexistência abdicaria de julgamentos (práticas classificatórias e comparativas) apriorísticos sobre o Outro.

SANTOS, M. P. e SEPÚLVEDA, D. Desenvolvendo Culturas, Políticas e Práticas 5 Inclusivas de Avaliação na Formação Docente Inicial. Anais do I Congresso Nacional de Avaliação em Educação: I CONAVE. Bauru: CECEMCA/UNESP, 2010, pp. 5 -12. (ISBN: 978-85-99703-52-6) Isto posto, a pesquisa acusou, em seus resultados, no que tange à complexidade dialética e trialética inclusão/exclusão, que a Faculdade investigada ainda estava longe, à época, de poder dizer-se uma instituição que buscasse, ou que tinha como proposta ou projeto, uma orientação inclusiva de formação de seus futuros professores. Isto porque, em quase nenhum dos indicadores de culturas, políticas e práticas de inclusão utilizados como base para a investigação, as respostas dos sujeitos da amostra apresentavam características que nos pudessem fazer crer que a instituição ao menos tivesse como proposta a busca de relações mais justas e democráticas para seus alunos, o que constituiria indícios de uma perspectiva inclusiva de formação. Quando referiam-se à avaliação no sentido das culturas, mencionavam valores e critérios adotados por seus professores de graduação que, em suas percepções, obedeciam a “dois pesos e duas medidas” e em muito eram influenciados pela empatia ou antipatia que porventura pareciam sentir pelos alunos. Critérios, portanto, na avaliação dos entrevistados, bastante subjetivos e passíveis de discussão e questionamento. Quando mencionavam a avaliação no sentido das políticas, exemplificavam as normas em vigor a respeito dos direitos que possuíam, como alunos, a terem suas notas revisadas, por exemplo. Ou ainda, às normas relativas à obtenção de uma média mínima, ao percentual acumulado de créditos e ao quanto isso poderia interferir negativamente em qualquer tentativa de bolsa de apoio estudantil ou iniciação científica, caso tais médias e coeficientes fossem abaixo do mínimo ditado pelas políticas da instituição. Levantavam a discussão de que as notas e as políticas institucionais que as orientavam não eram, necessariamente, representativos de seus potenciais como alunos. Quando, por fim, referiam-se à avaliação em termos das práticas, não eram poucos os exemplos de exclusão que sofriam em muitas matérias cursadas. Havia casos de alunos que precisaram faltar às avaliações marcadas e não tiveram chance de fazê-las em outro dia; de alunos que chegavam atrasados e eram impedidos de iniciar a avaliação, perdendo-a; de alunos que solicitavam uma segunda chance para melhorar suas notas ao professor e eram recusados; alunos cujos professores haviam perdido seus trabalhos e ao não admitirem tal perda, penalizavam o aluno, não atribuindo-lhe nota

SANTOS, M. P. e SEPÚLVEDA, D. Desenvolvendo Culturas, Políticas e Práticas 6 Inclusivas de Avaliação na Formação Docente Inicial. Anais do I Congresso Nacional de Avaliação em Educação: I CONAVE. Bauru: CECEMCA/UNESP, 2010, pp. 6 -12. (ISBN: 978-85-99703-52-6) alguma, o que baixava sua média, ou mesmo o reprovava. Foram muitos o exemplos, enfim.

Analisando a avaliação a partir de uma perspectiva de inclusão. Nesse contexto, os alunos que fogem do modelo de aluno ideal, modelo esse ainda presente no imaginário dos professores, inclusive (e arriscaríamos até a dizer: principalmente), os universitários, muitas vezes apresentam dificuldades em seu processo de formação e acabam experimentando histórias de fracasso e exclusão. Por isso as dimensões propostas pelo INDEX se tornam importantes, pois os princípios inclusivos contidos nesse material ajudam a orientar as concepções e práticas avaliativas dos professores formadores de maneira que a aprendizagem de todos os alunos seja favorecida. No que tange à dimensão da construção de culturas avaliativas de inclusão, por exemplo, a própria definição, percepção e maneira de trabalhar a avaliação seria bastante diferente do que se vê comumente. Os alunos não seriam comparados entre si, tampouco classificados, em suas competências, dentro de uma média geral em relação à turma. Ele seriam avaliados em comparação a eles mesmos, em sua própria trajetória dentro da disciplina. Na dimensão do desenvolvimento de políticas, a instituição, o professor e a turma refletiriam e decidiriam sobre que aspectos valorizar em cada momento da avaliação, em um processo coletivo. Decidiriam também quais as melhores formas de se levar a avaliação a cabo. Estas decisões seriam tomadas com base em orientações eleitas como principiais a uma educação democrática e de qualidade. Na dimensão das práticas, dificilmente uma avaliação inclusiva seria apenas fundamentada nas capacidades e ações individuais, mas a tendência seria sempre ao trabalho coletivo e de modo alternado, de modo a não repetir grupos nem criar-se ‘panelinhas’, tendo em vista uma formação social e pedagógica solidária, crítica e relativizada. Entretanto, percebemos que muitas práticas avaliativas atuais possuem uma tensão entre continuidade e ruptura, ou seja, apesar de alguns professores demonstrarem uma crítica às práticas avaliativas tradicionais, em alguns momentos, ainda mantêm

SANTOS, M. P. e SEPÚLVEDA, D. Desenvolvendo Culturas, Políticas e Práticas 7 Inclusivas de Avaliação na Formação Docente Inicial. Anais do I Congresso Nacional de Avaliação em Educação: I CONAVE. Bauru: CECEMCA/UNESP, 2010, pp. 7 -12. (ISBN: 978-85-99703-52-6) parâmetros dessas. Muitas vezes as concepções dos professores formadores estão alicerçadas em alguns autores críticos às práticas avaliativas tradicionais que ainda ocorrem em muitos de nossos estabelecimentos de ensino superior; em outros momentos estão baseados na perspectiva tradicional da avaliação. Essa situação acaba apresentando-se como uma contradição entre as concepções avaliativas dos professores e a prática avaliativa por eles desenvolvida, o que acaba por influenciar na formação dos futuros professores e automaticamente em sua prática posterior. Nossa argumentação encontra eco no posicionamento de Hoffman (2003: 108). Para essa autora, a questão da avaliação no ensino superior passa a ser um fator muito sério, porque: a avaliação nesses cursos, é um fenômeno com características seriamente reprodutivistas. Ou seja, o modelo que se instala em cursos de formação é o que vem a ser seguido pelos professores que exercem o magistério nas escolas e universidades. Muito mais forte que qualquer influência teórica que o aluno desses cursos possa sofrer, a prática vivida por ele enquanto estudante passa a ser o modelo seguido quando professor. (..)

Em nosso ver, o problema inicia-se na visão idealizada do aluno, a que nos referimos acima. A formação docente ainda continua sendo feita de modo a fazer crer que todos os alunos sejam homogeneamente iguais e apreendam, depreendam, compreendam e aprendam da mesma maneira. Triste construção histórica, não desprovida, evidentemente, de intencionalidade política, e fruto da herança iluminista, moderna, liberal e positivista de escola a que nos referimos no início deste artigo. Concepção esta que já teve seu lugar, mas que nos dias de hoje, não nos parece suficiente, porque deixa de lado a multiplicidade e as diferentes velocidades de existências humanas (e consequentemente de “estilos” de aprendizagem), que precisam ser consideradas, se a inclusão deve mesmo assumir espaço nas arenas educacionais. Uma avaliação orientada inclusivamente desafia as estruturas de tudo aquilo que, como docentes, até o presente, demos como certo e inquestionável em nossa formação. Eis porque falar de avaliação nos remete, então, a discutir estes assuntos um pouco mais especificamente, em relação à formação docente. É o que faremos na próxima seção.

SANTOS, M. P. e SEPÚLVEDA, D. Desenvolvendo Culturas, Políticas e Práticas 8 Inclusivas de Avaliação na Formação Docente Inicial. Anais do I Congresso Nacional de Avaliação em Educação: I CONAVE. Bauru: CECEMCA/UNESP, 2010, pp. 8 -12. (ISBN: 978-85-99703-52-6) Considerações Sobre o Processo de Formação Docente Os debates sobre a formação docente, desenvolvidos nos últimos anos, têm demonstrado a preocupação com as práticas realizadas no cotidiano de nossas escolas. A discussão sobre as funções da escola, sobre o tipo de educação que queremos, sobre o controle do saber, sobre avaliação e tantas outras questões, vem se tornando mais tensa e explícita. Verdades consagradas, no momento, se apresentam insuficientes, exigindo de nós, professores e professoras, a busca e o entrecruzamento de novos saberes. As antigas certezas, que os professores achavam que possuíam, mostram-se esvaziadas, gerando em muitos de nós dúvidas e incertezas, provocando transformações no processo de formação docente. A formação docente anuncia mudanças ainda não consolidadas, das quais destacamos a manutenção da prioridade da aprendizagem da teoria sobre a prática pedagógica, ficando em segundo plano a atuação, não entendida como um lugar de aprendizagem, mas de treino. Entretanto, entre esses dois lugares, existem pontos intermediários ocupados pela observação e pela crítica, ou seja, os alunos e alunas aprendem na sala de aula, vão ao estágio observar o professor e a professora, criticam o observado e a partir do que aprenderam, num momento posterior, possivelmente vão atuar. Os alunos e alunas em formação primeiro aprendem, observam, refletem, teorizam, criticam, treinam (pois eles vão atuar a partir da observação de um outro professor) e depois, quando supõe-se que já sabem, realizam. Segundo Schön (1992), muitas vezes a teoria e a técnica não dão conta dos problemas que aparecem na prática. A teoria e a técnica aprendidas nos cursos de formação se mostram, na maioria das vezes, insuficientes para lidar com as questões do cotidiano escolar, dificultando um diálogo entre teoria e prática que se torna cada vez mais necessário para a formação de professores e professoras. Dessa forma, vemos que muitas vezes são as práticas avaliativas dos professores formadores que vão influenciar mais decisivamente nas futuras práticas avaliativas dos futuros professores e não as concepções teóricas avaliativas. Portanto, se torna fundamental que as práticas avaliativas dos professores sejam desenvolvidas sobre um pilar inclusivo, pois, como já foi visto, elas também são formadoras e serão decisivas para o desenvolvimento de uma prática cotidiana democrática.

SANTOS, M. P. e SEPÚLVEDA, D. Desenvolvendo Culturas, Políticas e Práticas 9 Inclusivas de Avaliação na Formação Docente Inicial. Anais do I Congresso Nacional de Avaliação em Educação: I CONAVE. Bauru: CECEMCA/UNESP, 2010, pp. 9 -12. (ISBN: 978-85-99703-52-6)

A busca da democratização das práticas cotidianas A dualidade entre as concepções e as práticas de avaliação presente nas instâncias de formação acaba referendando de alguma maneira a forma como os alunos foram avaliados durante toda sua vida de estudantes. Muitos professores foram avaliados sob uma concepção tradicional de ensino/aprendizagem durante sua vida; se, ao ingressarem em um curso superior, continuam a ser avaliados dessa forma, provavelmente terão dificuldades para modificar o fazer pedagógico. Assim, o presente, aliado à nossa experiência de vida, às nossas lembranças de estudantes e toda dinâmica escolar que fragmenta e hierarquiza os conteúdos e classifica os estudantes, acabam demonstrando como a experiência orienta a ação. Segundo Thomson, citado por Oliveira (2001:48): O processo de recordar é uma das principais formas de nos identificarmos quando narramos uma história. Ao narrar uma história, identificamos o que pensamos que éramos no passado, quem pensamos que éramos no passado, quem pensamos que somos no presente e o que gostaríamos de ser. As histórias que relembramos não são representações exatas do nosso passado, mas trazem aspectos desse passado, e os moldam para que se ajustem às nossas identidades e aspirações atuais.

Assim, percebemos que aprendemos a partir das práticas sociais que vivemos e desenvolvemos, seja nas ruas, em casa, na escola, nas relações de amizade ou nas lembranças que possuímos. A avaliação do cotidiano escolar não é desvinculada do contexto social, é estabelecida pelos padrões sociais que definem o que deve, ou não, ser valorizado. Em uma sociedade capitalista como a nossa, onde impera a lógica da meritocracia e da competitividade, os melhores ganham destaque, alguns são excluídos, e os outros são considerados medianos. Acaba-se estimulando a competição entre os indivíduos de uma maneira naturalizada, como se o mundo, para sobreviver, necessitasse realmente dos melhores, assim, e os que não são considerados melhores devem se conformar com a situação de subjugados. Como a avaliação do cotidiano escolar pode escapar a essa premissa, se ela é alimentada pela própria dinâmica social? As questões da comparação e da competição não estão presentes só na esfera educativa, a avaliação está permeada, na maioria das

SANTOS, M. P. e SEPÚLVEDA, D. Desenvolvendo Culturas, Políticas e Práticas 10 Inclusivas de Avaliação na Formação Docente Inicial. Anais do I Congresso Nacional de Avaliação em Educação: I CONAVE. Bauru: CECEMCA/UNESP, 2010, pp. 10 -12. (ISBN: 978-85-99703-52-6) vezes, pelos valores sociais. Somos educados numa sociedade que compara e compete. De que forma nós, professores e futuros professores, podemos escapar a esses valores em que somos educados, para que possamos desenvolver uma prática democrática onde todos os alunos sejam incluídos no processo educativo? É necessário pontuar que os valores dominantes não são os únicos, existem outros sendo abafados ou ressaltados em determinadas circunstâncias, como a participação, solidariedade e a cooperação. Quem sabe, a partir destes valores, possamos começar a tecer práticas mais democráticas onde todos possam estar incluídos? Como os valores dominantes não são únicos, algumas práticas pedagógicas já começam a ser traçadas, tentando diminuir a competitividade e a meritocracia. Cremos que a pesquisa realizada, que possibilitou essas reflexões, é uma tentativa de modificação dessa situação, já que objetivou investigar a formação de futuros professores da Faculdade de Educação com relação a uma orientação inclusiva de educação. A complexidade dos cursos de formação de professores mostra que o seu cotidiano é cheio de nuances e imprevisibilidades. Através do movimento da pesquisa e da percepção da complexidade do cotidiano podemos compreender que o ensinar e o aprender são movimentos compartilhados, em que professores e alunos caminham entre os dois pontos, mesclando seus papéis (ESTEBAN, 2001). Esse é um aspecto significativo se levarmos em conta que a transformação nas práticas escolares deve partir de movimentos compartilhados; talvez assim possamos pensar em práticas avaliativas inclusivas. É importante salientar que o processo de formação docente deve continuar em sua ação de maior democratização de suas práticas avaliativas, como parte de um processo maior de democratização da sociedade para que possamos construir, permanente e interminavelmente, uma sociedade inclusiva.

Referências Bibliográficas BOOTH, Tony & AINSCOW, Mel. Index para a Inclusão: desenvolvendo a aprendizagem e a participação na escola. Rio de Janeiro: UFRJ – LaPEADE (trad. Mônica Pereira dos Santos), 2002.

SANTOS, M. P. e SEPÚLVEDA, D. Desenvolvendo Culturas, Políticas e Práticas 11 Inclusivas de Avaliação na Formação Docente Inicial. Anais do I Congresso Nacional de Avaliação em Educação: I CONAVE. Bauru: CECEMCA/UNESP, 2010, pp. 11 -12. (ISBN: 978-85-99703-52-6) CAMPOS, Silmara de & PESSOA, Valda Inês Fontenele. Discutindo a Formação de Professoras e de Professores com Donald Schön. In: GERALDI, Corinta Maria Grisolia; FIORENTINI, Dario & PEREIRA, Elisabete Monteiro de A.. Cartografias do Trabalho Docente: Professor(a) – Pesquisador(a). São Paulo: ALB, Mercado de Letras, 2000. ESTEBAN, Maria Tereza & ZACCUR, Edwiges. Professora – pesquisadora: uma práxis em construção. Rio de Janeiro: DP&A, 2002. _______. O Que Sabe Quem Erra? Reflexões sobre avaliação e fracasso escolar. Rio de Janeiro: DP&A, 2001. GOMES, Angel Peres. O Pensamento Prático do Professor: A Formação do Professor como Profissional Reflexivo. In: NOVOA, Antonio. Os Professores e sua Formação. Lisboa: Publicações Don Quixote, 1992. HOFFMAN Jussara. Avaliação Mediadora; uma prática em construção da pré-escola à universidade. Porto Alegre: Mediação, 2003. OLIVEIRA, Inês Barbosa. Espaços educativos cotidianos em imagens. In: OLIVEIRA, Inês Barbosa & SGARBI, Paulo. Fora da Escola também se aprende. Rio de Janeiro: DP&A, 2001. SANTOS, Mônica Pereira dos; FONSECA, Michele Pereira de Souza da e MELO, Sandra Cordeiro (orgs.). Inclusão em Educação: diferentes interfaces. Curitiba: Editora CRV, 2009. ______. & PAULINO, Marcos Moreira (orgs). Inclusão em educação: Culturas, Políticas e Práticas. 2.ed.São Paulo: Cortez, 2008. _______. Relatório de Pesquisa: Ressignificando a Formação de Professores para uma Educação Inclusiva. Rio de Janeiro: UFRJ - LAPEADE, 2007. _______. O Papel do Ensino Superior na Proposta de uma Educação Inclusiva. Revista da Faculdade de Educação da UFF, n. 7, maio 2003. SCHÖN, Donald A. Educando o Profissional Reflexivo: um novo design para o ensino e a aprendizagem. Porto Alegre: Artmed, 2000. _______. Formar Professores Como Profissionais Reflexivos. In: NÓVOA, Antonio. Os Professores e a Sua Formação. Lisboa: Don Quixote, 1992. SEPULVEDA, Denize. Ressignificando a Formação de Professores: A Construção de Uma Nova Cultura da Avaliação. In: SANTOS, Mônica Pereira dos; SILVA, Ana Patrícia da, FONSECA, Michele Pereira de Souza da (orgs). Universidade e Participação: Os Ecos das Pesquisas. Rio de Janeiro: UFRJ/PR-5, 2010. ______, Denize e SANTOS, Mônica Pereira dos. Ressignificando a Formação de Professores: A Construção de Uma Nova Cultura da Avaliação. In: LEITE, Carlinda; MOREIRA, Antônio Flávio; PACHECO, José Augusto (orgs). Livro de Resumos: IX

SANTOS, M. P. e SEPÚLVEDA, D. Desenvolvendo Culturas, Políticas e Práticas 12 Inclusivas de Avaliação na Formação Docente Inicial. Anais do I Congresso Nacional de Avaliação em Educação: I CONAVE. Bauru: CECEMCA/UNESP, 2010, pp. 12 -12. (ISBN: 978-85-99703-52-6) Colóquio sobre Questões Curriculares e V Colóquio Luso Brasileiro. Debater o Currículo e seus Campos: Políticas, Fundamentos e Práticas. Porto: Legis, 2010. _______. Avaliação, Formação do Professor e Fracasso Escolar: uma relação de complexidade presente no cotidiano da escola. Dissertação de Mestrado. Faculdade de Educação. Niterói: UFF, 2003. ZEICHNER, Kenneth M. Novos caminhos para o practicum: uma perspectiva para os anos 90. In: NÓVOA, A. (coord). Os professores e sua formação. Portugal: Dom Quixote, 1997.

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