Desenvolvimento humano: como se articulam informação e formação no processo educacional?

June 30, 2017 | Autor: Ivar Vasconcelos | Categoria: Education, Teacher Education
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Universidade Católica de Brasília PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA STRICTO SENSU EM EDUCAÇÃO

Mestrado DESENVOLVIMENTO HUMANO: COMO SE ARTICULAM INFORMAÇÃO E FORMAÇÃO NO PROCESSO EDUCACIONAL?

Autor: Ivar César Oliveira de Vasconcelos Orientadora: Prof.ª Dr.ª Jacira da Silva Câmara

BRASÍLIA

2011

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IVAR CÉSAR OLIVEIRA DE VASCONCELOS

DESENVOLVIMENTO HUMANO: COMO SE ARTICULAM INFORMAÇÃO E FORMAÇÃO NO PROCESSO EDUCACIONAL?

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação da Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial à obtenção do Título de Mestre em Educação. Orientadora: Prof.ª Dr.ª Jacira da Silva Câmara.

Brasília 2011

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V278d

Vasconcelos, Ivar César Oliveira de Desenvolvimento humano: como se articulam informação e formação no processo educacional? / Ivar César Oliveira de Vasconcelos – 2011. 138f. : il. ; 30 cm

Dissertação (mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2011. Orientação: Jacira da Silva Câmara 1.Crescimento humano. 2. Valores sociais. 3. Filosofia da educação. I. Câmara, Jacira da Silva, orient. II. Título.

CDU 37:159.922

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Em especial, dedico este trabalho aos meus pais,

Nonato

(in

memoriam)

e

Maria,

incansáveis na luta pela educação dos filhos. À minha querida esposa, Elizabeth, sempre me incentivando para a vida acadêmica. Aos meus filhos Igor, Ivna e Yuri, a quem tenho a obrigação de mostrar o Bem.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, Todo Poderoso, pela proteção durante os estudos. À minha querida orientadora Prof.ª Dr.ª Jacira da Silva Câmara que, com paciência, e zelo pelo meu desenvolvimento, acompanhou-me passo a passo. Soulhe muitíssimo grato pelo crescimento humano e intelectual proporcionado nesta trajetória acadêmica. Ao Prof. Dr. Cândido Alberto da Costa Gomes, pela preciosa colaboração que tanto me ajudou a contextualizar o tema desta dissertação. Um abraço e o eterno reconhecimento. Aos professores Dr. Luis Síveres, Dr.ª Maria Cândida, Dr.ª Clélia Capanema, Dr.ª Beatrice Carnielli, Dr. Geraldo Caliman, Dr.ª Kátia Brasil e Dr. Afonso Galvão, por tudo o que me ensinaram durante a etapa de fundamentação. Ao Prof. Dr. Célio da Cunha, pela atenção e gentileza de ter aceitado o convite para participar da comissão examinadora. À Sheilinha, pessoa fantástica, e demais funcionários da UCB, sempre prestativos. Aos professores participantes da pesquisa, pela disponibilidade, confiança no repasse das informações e entusiasmo com que participaram das entrevistas e aulas observadas. O trabalho é nosso, sem vocês, ele não seria possível. Ao meu dileto filho, Igor, pelas revisões, realizadas com discussões que enriqueceram a nós dois e ao trabalho. Aos colegas do BB, caros para mim, pelo incondicional apoio prestado. Agradeço ao Nonato Lima, que me possibilitou a dispensa da jornada de trabalho para assistir às aulas; à Luisa Sabóia, ao Marney e à Ana Paula, pela colaboração nos dias de ausência; ao Carlos Garcia, que me ajudou a conciliar trabalho e estudos; à Fabíola, por ter coberto minhas ausências; ao Leite e ao Patrick, pelo companheirismo. Finalmente, agradeço aos colegas de aula, com quem fiz amizades. A todos, o meu muito obrigado!

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“Pode ser que educadores sejam confundidos com professores, da mesma forma como se pode dizer: jequitibá e eucalipto, não é tudo árvore, madeira? No final, não dá tudo no mesmo? Não, não dá tudo no mesmo, porque cada árvore é a revelação de um habitat, cada uma delas tem cidadania num mundo específico. A primeira, no mundo do mistério, a segunda no mundo da organização, das instituições, das finanças.”

(ALVES, 1985, p. 12-13).

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RESUMO

VASCONCELOS, Ivar César Oliveira de. Desenvolvimento humano: como se articulam informação e formação no processo educacional? 2011. 138 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2011.

No mundo atual, a ciência e a tecnologia avançam vertiginosamente e a pessoa humana tem sido relegada para o segundo plano. Com isto, desencadeiam-se problemas sociais graves, fazendo emergir discussões sobre a formação integral do ser humano, na qual os valores, tanto quanto os aspectos científicos e tecnológicos, sejam considerados. Este cenário enseja a realização de pesquisas sobre o tema do desenvolvimento humano, atualizando-o e ressignificando conceitos. Este trabalho teve como objetivo geral averiguar a articulação entre informação e formação para o desenvolvimento integral do ser humano. Especificamente, buscou identificar: a presença das dimensões informativa e formativa do processo educacional em documentos institucionais; as percepções dos participantes quanto à articulação entre essas dimensões e a articulação entre elas nas práticas didático-pedagógicas desenvolvidas em sala de aula. Trata-se de uma pesquisa de natureza qualitativa e exploratória, um estudo de campo, que utilizou para a coleta de dados a análise documental, a entrevista semiestruturada e a observação. A análise de conteúdo, realizada a partir do corpus da pesquisa, permitiu descrever, inferir e interpretar os dados coletados. Foram analisados os Projetos Pedagógicos de Curso e os Planos de Ensino das disciplinas selecionadas, ministradas por oito professores, que foram entrevistados e tiveram cada um deles, duas aulas observadas. As disciplinas fazem parte dos cursos de Pedagogia e de Administração de uma instituição de ensino superior do Distrito Federal. Os resultados evidenciaram uma atualização do discurso institucional sobre o desenvolvimento humano em relação às atuais preocupações teóricas sobre o assunto, mas revelou fragilidades no discurso e na prática dos participantes. Mostraram, ainda, o envolvimento dos participantes com o tema estudado, tanto com relação às questões cognitivas, como emocionais e axiológicas, presentes no processo educacional. Demonstraram, no âmbito dos cursos, que existe um distanciamento entre discurso e prática em relação ao cumprimento do papel social da escola, à implementação da interdisciplinaridade e à formação integral do indivíduo. O trabalho apresenta algumas recomendações para o aprimoramento do processo educacional.

Palavras-chave: Educação. Desenvolvimento humano. Informação/Formação. Currículo. Filosofia da educação.

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ABSTRACT

VASCONCELOS, Ivar César Oliveira de. Human development: how are information and formation articulated in the educational process? 2011. 138 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2011.

In today’s world, science and technology advance dramatically and people themselves have been relegated to the background. With that, let loose social problems, giving rise to discussions about the integral formation of the human being, in which the values, as well as the scientific and technological aspects, are considered. This scenario entails the realization of researches on the topic of human development, updating it and redefining concepts. The main goal of this study was to investigate the relationship between information and formation regarding to the development of the human being. Specifically, it sought to identify: the presence of informative and formative dimensions of the educational process in institutional documents’; the participant’s perceptions about the relationship between these dimensions; and in teaching and pedagogical practices developed in the classroom. This is a qualitative and exploratory research, a field study, which used documental analysis, semi-structured interview and observation to collect data. The content analysis, made from the corpus of the research, allowed describing, inferring and interpreting the collected data. The Pedagogical Projects of Course and the Education Plans of the selected disciplines, given by eight teachers, were analyzed and the teachers were interviewed and had, each one of them, two of their classes observed. The disciplines are part of the Pedagogy and Administration courses of a higher education institution of Distrito Federal. The results showed an update on the institutional speech on the human development regarding nowaday’s theoretical concerns about the issue, but revealed fragilities on the speech and actions of the participants. Also showed the involvement of the participants with the studied theme, regarding both cognitive questions and emotional and axiological, present in the educational process. Demonstrated, within the courses, that there is a gap between discourse and practice regarding the fulfillment of the social role of the school, the implementation of interdisciplinarity and integral formation of the individual. The paper presents some recommendations to improve the educational process.

Key-words: Education. Human Development. Information/Formation. Curriculum. Philosophy of Education.

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Domínios de aplicação da análise de conteúdo. .................................... 59 Quadro 2 – Análise documental e análise de conteúdo: semelhanças e diferenças. .................................................................................................................................. 62 Quadro 3 – Discurso institucional: categoria informação e respectivos temas. ........ 66 Quadro 4 – Discurso institucional: categoria formação e respectivos temas. ........... 66 Quadro 5 – Oportunidades de formar integralmente o educando. .......................... 102

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Razão indolente e ecologia dos saberes. ................................................ 47 Figura 2 – Carpe diem e educação em valores......................................................... 49 Figura 3 – Da descrição à interpretação. .................................................................. 60 Figura 4 – Tipos de leitura......................................................................................... 61 Figura 5 – Composição da análise do corpus da pesquisa. ...................................... 65 Figura 6 – Discurso do professor: categorias analisadas.......................................... 76 Figura 7 – Discurso do professor: categoria informação e respectivos temas. ......... 77 Figura 8 – Discurso do professor: categoria formação e respectivos temas. ............ 80 Figura 9 – Discurso do professor: categoria informar/formar e respectivos temas. .. 91 Figura 10 – Intenções organizacionais, inferidas no processo educacional pesquisado. ............................................................................................................. 109

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LISTA DE SIGLAS

BB – Banco do Brasil. CNE/CES – Conselho Nacional de Educação/Câmara de Educação Superior. CNE/CP – Conselho Nacional de Educação/Conselho Pleno. LDBN – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. PE – Plano de Ensino. PIPA – Programa de Iniciação às Práticas Administrativas. PNQ – Plano Nacional da Qualidade. PPC – Projeto Pedagógico de Curso. Unesco – Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura.

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LISTA DE ABREVIATURAS

Adm. – administração. Art. – artigo. Doc. – documento. Et al. – e outros. F. – fala. Fig. – figura. G. – gesto. p. – página. P. – professor. Ped. – pedagogia. SS. – Sua Santidade.

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SUMÁRIO INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 15 JUSTIFICATIVA ........................................................................................................ 20 CAPÍTULO I – REVISÃO DA LITERATURA ............................................................ 24 1.1. 1.1.1. 1.1.2.

SER HUMANO ............................................................................................. 24 Dimensões humanas .................................................................................... 24 Sociocultural, um lugar para o ser humano .................................................. 28

1.2. 1.2.1. 1.2.2.

EDUCAÇÃO E SEU PAPEL SOCIOCULTURAL ......................................... 29 Fenômeno educativo .................................................................................... 30 Papel sociocultural da educação .................................................................. 38

1.3. 1.3.1. 1.3.2. 1.3.3. 1.3.4.

DESENVOLVIMENTO HUMANO ................................................................. 44 Chave do desenvolvimento humano ............................................................ 44 Ecologia dos saberes e formação ................................................................ 46 Aprender a viver no mundo da diversidade moral ........................................ 48 Ser e fazer moral: equilíbrio entre razão e emoção ...................................... 49

CAPÍTULO II – A PESQUISA E SEUS COMPONENTES ........................................ 52 2.1.

FORMULAÇÃO E DELIMITAÇÃO DO PROBLEMA DE PESQUISA .......... 52

2.2. 2.2.1. 2.2.2.

OBJETIVOS ................................................................................................. 53 Geral ............................................................................................................. 53 Específicos ................................................................................................... 53

2.3. 2.3.1. 2.3.2. 2.3.3. 2.3.4. 2.3.5. 2.3.6.

REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO ............................................ 53 Definição e descrição do tipo de pesquisa ................................................... 53 Técnicas utilizadas na pesquisa ................................................................... 55 Campo de pesquisa e participantes ............................................................. 57 Análise de conteúdo ..................................................................................... 58 Análise de conteúdo e análise documental .................................................. 61 Análise de conteúdo e observação em pesquisa qualitativa ........................ 62

CAPÍTULO III – ANÁLISE E DISCUSSÃO DO CORPUS DA PESQUISA ............... 64 3.1. 3.1.1. 3.1.2.

O QUE É PROPOSTO ................................................................................. 65 Discurso institucional .................................................................................... 65 Discurso do professor ................................................................................... 75

3.2. 3.2.1.

O QUE É PRATICADO............................................................................... 101 Aproximações e distanciamentos do que é proposto ................................. 103

3.3. 3.3.1. 3.3.2.

O QUE PODE SER DITO PELO NÃO DITO .............................................. 106 Articulação para uma nova ordem .............................................................. 107 Intenções e hipocrisias organizacionais ..................................................... 109

CAPÍTULO IV – CONSIDERAÇÕES FINAIS E RECOMENDAÇÕES .................... 115 REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 120 APÊNDICE A – ROTEIRO DA ENTREVISTA COM OS PROFESSORES ............. 128 APÊNDICE B – ROTEIRO DA OBSERVAÇÃO EM SALA DE AULA .................... 130

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APÊNDICE C – CARACTERIZAÇÃO DOS PARTICIPANTES ............................... 131 APÊNDICE D – CARACTERIZAÇÃO DAS AULAS OBSERVADAS...................... 132 APÊNDICE E – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ......... 133 ANEXO A – EMENTÁRIO DAS DISCIPLINAS DE PEDAGOGIA .......................... 135 ANEXO B – EMENTÁRIO DAS DISCIPLINAS DE ADMINISTRAÇÃO .................. 136 ANEXO C – COMPETÊNCIAS E HABILIDADES – PEDAGOGIA ......................... 137 ANEXO D – COMPETÊNCIAS E HABILIDADES – ADMINISTRAÇÃO ................. 138

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INTRODUÇÃO

Esta dissertação aborda o tema desenvolvimento do ser humano, tomando como referência o processo educacional realizado junto a graduandos dos cursos de Pedagogia e Administração numa universidade da rede particular de ensino de Brasília. Tem como objetivo averiguar como esse processo articula os aspectos informativos e formativos da educação para o desenvolvimento integral dos indivíduos. No mundo atual, a articulação entre as ciências da natureza e as do homem tem sido objeto de discussão entre estudiosos das mais variadas áreas do conhecimento. As ciências da natureza excluem espírito e cultura, bem como seu próprio estatuto histórico e social; enquanto as do homem não pensam os indivíduos como seres vivos constituídos biologicamente. De acordo com Morin (2008b), a ciência natural não possui meio algum para se conceber como realidade social; por sua vez, a antropossocial não possui meio algum para se conceber no seu enraizamento biofísico. Essa desvinculação entre as duas vertentes de conhecimentos científicos encontra-se na base do atual momento histórico, um tempo em que os desenvolvimentos científicos, técnicos e sociológicos inter-retroagem apenas a partir da manipulação do processo científico em sua relação com a técnica (MORIN, 2008b) e não a partir da busca de uma formação integral do ser humano. Como possibilitar uma inspiração unitária ao saber humano, de maneira que favoreça a solução de questões sociais, se constitui um dos grandes desafios da educação na sociedade contemporânea. Apesar da grande contribuição dos avanços da ciência e da tecnologia, problemas como a fome; as doenças; o descaso com o meio ambiente; a violência social, envolvendo muito particularmente a família e a escola, além de outros, continuam ainda, neste milênio, a fazer parte das grandes preocupações da humanidade. Fica evidente a necessidade de uma nova ordem fundamentada na ecologia dos saberes a qual reconhece a pluralidade de conhecimentos e promove o diálogo entre o saber científico e o saber humanístico, que foi rompido na Modernidade (SANTOS, 2004). Uma nova ordem fundamentada no aprender a viver num mundo plural, multicultural e global, traduzido no desafio de aprender a ser, conviver,

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participar e habitar num mundo de extrema diversidade moral (MARIA PUIG, 2007). Neste sentido, torna-se necessário o reconhecimento de que o homem, para sobreviver confortavelmente na sua humanidade, precisa construir o seu ser e fazer moral valendo-se da emoção tanto ou mais do que da razão (CÂMARA, 2003). Que as ciências da natureza e as ciências antropossociais sejam olhadas em sua complementaridade, eliminando as contradições de uma sociedade que enaltece a pura informação, em detrimento da formação; que endeusa a ciência e a tecnologia, deixando de lado a implementação de valores. Sabe-se que epistéme e antropo são indissociáveis e, correlatamente, também o são as informações e a formação. O reconhecimento dessa nova ordem exige a instauração de um processo educacional que afirme a importância da formação para a integralidade humana. Coerente com isto, o relatório Delors et al. (1996) preconiza que os valores encontram seu lugar adequado em quaisquer culturas, sejam locais, nacionais ou mundial. No mesmo documento consta que é imprescindível reatar o diálogo entre a ciência e a cultura, pois o fosso que hoje separa as pessoas do mundo científico das pessoas do mundo cultural não é algo natural. O relatório conclui que, fundamentalmente, esta alienação é uma característica do século passado, com origem em grande parte na indiferença da educação pela integridade do indivíduo enquanto ser humano. Em termos formais, os valores de um país são estabelecidos na Carta Magna que o rege. De acordo com o art. 1º de sua atual Constituição Federal, o Brasil tem como fundamentos a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, bem como o pluralismo político. No art. 2º, por sua vez, consta que o país tem como objetivos: construir uma sociedade livre, justa e solidária; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (BRASIL, 1988). Para exercitar estes valores, o país elabora leis e conta com a sociedade, que se organiza de maneira a favorecer a realização de uma comunidade fraterna, pluralista e sem preconceitos. Neste sentido, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN 9.394/96) estabelece em seu art. 2º que a educação se inspira nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, visando ao pleno desenvolvimento do educando, seu

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preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Para alcançar esses objetivos, aquela Lei preceitua em seu art. 3º que o ensino deve basear-se, dentre outros, nos princípios de liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber; pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas; respeito à liberdade e apreço à tolerância; valorização do profissional da educação escolar; valorização da experiência extraescolar; vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as práticas sociais. Estes valores não podem ser tratados apenas como conceitos ideais, sendo necessário implementar critérios morais comuns capazes de regular a convivência desejada nos diversos âmbitos da sociedade. Por natureza, o ser humano precisa tomar decisões, sendo um ser que nasce inacabado, mas com grande plasticidade. Uma abertura antropológica que possibilita o processo de endoculturação1 que, por sua vez, transforma-se no locus do trabalho moral a desenvolver-se pela educação. Este assunto, valores na educação, frequentemente tem sido foco de discussões. Iguiñiz e Romero (2009) afirmam que perguntar sobre valores demonstra o interesse pelas pessoas, pelo que elas dão valor, sonhos e motivos que as levam à busca do melhor de si na família, na vizinhança e como cidadãos. Por sua vez, Marchesi (2008) enfatiza que a educação baseada em valores deve integrar a reflexão compartilhada, a expressão afetiva e a ação, que são os três grandes âmbitos em que ela se desenvolve. O assunto faz parte da agenda de discussão de diversos países, como foi demonstrado na Conferência Internacional de Educação de 1994, em que, preocupados com as manifestações de violência, racismo, xenofobia, nacionalismo, dentre outros, ministros da educação propuseram linhas de ação em favor da paz, direitos humanos e democracia. Estudar valores na educação, situando o assunto nestas grandes preocupações, significa, portanto, participar do diálogo sobre as mudanças que buscam construir novos rumos para que a humanidade resgate sua natureza intrínseca, que é viver em paz, sem eliminar as diferenças individuais. Significa participar do debate em torno dos grandes objetivos estabelecidos pela sociedade em suas normas de convivência mais caras. Significa, sobretudo, imergir nas discussões sobre o processo de construção de um novo panorama científico, capaz

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Endoculturação é o processo de aprendizagem e educação em uma cultura desde a infância, segundo Felix Keesing ou Hoebel e Frost (MARCONI; PRESOTTO, 2006).

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de interligar as ciências da natureza às ciências humanísticas, considerando o ser humano em sua integralidade. A pesquisa buscou, portanto, verificar como ocorre a articulação entre informação e formação, a qual é fundamental para o desenvolvimento integral do ser humano. Uma articulação que está sendo exigida pela atual sociedade, que se encontra mergulhada em uma complexa teia de informações, diversidade moral e incertezas. O uso da informação per si é insuficiente para enfrentar grandes problemas vividos por países e povos do mundo inteiro. Exige-se, neste cenário, a implementação de valores que complementem o processo de conhecimento racional, cognitivo. Transformar esses objetivos em algo concreto é ação precípua do processo educacional que visa a reconduzir os indivíduos à condição de protagonistas de suas vidas; a controlar suas conquistas científicas; a se reconhecerem em sua humanidade. Ao exigir do processo educacional um olhar sobre a articulação entre informação e formação, a sociedade espera que a educação contribua para formar sujeitos capazes de pensar, julgar, criar, criticar, elaborar e decidir por si mesmos. Com foco neste olhar, pôde-se compreender, nesta pesquisa, como aquela articulação está sendo desenvolvida na dinâmica curricular do processo educacional em que os indivíduos, sujeitos daquela ação, se desenvolvam cada vez mais em sua humanidade. Esta dissertação compõe-se de quatro capítulos, apresentados após uma breve introdução e justificativa. No primeiro capítulo, demonstra-se o referencial teórico, abordando assuntos que deram base à pesquisa: as dimensões humanas e o lugar do ser humano como ser sociocultural; educação e seu papel sociocultural; articulação entre informar e formar como a chave do desenvolvimento humano, na conexão com a ecologia dos saberes, a moral e afetividade. No segundo capítulo são evidenciadas a formulação e a delimitação do problema de pesquisa, bem como os objetivos propostos. No mesmo capítulo, demonstra-se o referencial teórico-metodológico utilizado, com explicações sobre o tipo de pesquisa, técnicas, campo de pesquisa e participantes, além de explicações sobre a análise de conteúdo e sua relação com a análise documental e a observação.

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O terceiro capítulo constitui-se da análise e discussão do corpus da pesquisa. Por utilizar-se da análise de conteúdo, finaliza com a apresentação de variáveis inferidas, que neste trabalho são as intenções organizacionais. Por fim, o quarto capítulo demonstra as considerações finais e as recomendações de estudos futuros.

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JUSTIFICATIVA

O olhar do pesquisador em direção ao tema desenvolvimento humano originou-se ainda na adolescência. Quando frequentava os bancos escolares do então Segundo Grau, inquietavam-no a priorização de professores pelo repasse de informações em detrimento da efetiva formação humana. Ao cursar Filosofia, na graduação, a inquietação deu lugar à busca de possíveis fundamentos dessa priorização. Nascia o desejo de entender como o processo educacional poderia ser diferente, saindo da exclusiva produção de conhecimentos para o efetivo desígnio de desenvolver pessoas. Passado o tempo, ocorreram ao pesquisador dois insights que se situam na origem do processo de formatação do tema e sua problematização. O primeiro deuse com a leitura de um trecho do opúsculo Conversas com quem gosta de ensinar, de Rubem Alves (1985, p. 12), em que o autor se pergunta se é possível que educadores sejam confundidos com professores, da mesma forma como se confunde jequitibá com eucalipto: “no final, não dá tudo no mesmo?”. O segundo insight se deu durante a etapa de fundamentação deste curso de Mestrado, durante aula da professora orientadora desta dissertação, quando se discutia sobre as dificuldades sofridas pelos professores para articular os aspectos informativos e formativos no processo educacional. Esses dois insights levaram o pesquisador a perguntar: de que maneira a articulação entre as dimensões informativa e formativa da educação está sendo desenvolvida na dinâmica curricular do processo educacional na sala de aula? Como tem acontecido esta articulação no momento histórico atual, neste mundo marcado por mudanças aceleradas e por profundas transformações? Na atual sociedade, os indivíduos exigem, escolhem e interpretam informações e, simultaneamente, necessitam de formação compatível com a realidade dinâmica, plural e inconstante. Desse modo, ainda que o lado informativo do aprender e do conhecer seja enfatizado, não é mais possível aceitar um processo educacional restrito à informação, desconsiderando a integralidade do ser humano. Nesta perspectiva, a solução de grandes problemas relacionados ao consumo, meio ambiente, violência, fome, guerras, globalização e descobertas da

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biotecnologia, exige um olhar mais abrangente, compatível com a magnitude e a complexidade dessas questões e não apenas o olhar exclusivo da via racional. Cada problema precisa ser considerado em seu contexto global, entendido como parte de um tecido interdependente, gerando conhecimentos que contribuam para aprimorar a condição do ser humano, enquanto ser de razão, emoção e ação. Neste caso, os conhecimentos gerados não ficam restritos ao cognitivo, mas alcançam os aspectos axiológicos do fazer humano, reconstruindo permanentemente a relação entre o eu, o tu e o saber. O fazer humano, à exceção da Modernidade, foi constituído por três esferas de valores interdependentes denominadas por Wilber (2006) como Três Grandes: arte, moral e ciência ou o Belo, o Bom e o Verdadeiro ou, ainda, EU, NÓS e ELE. O autor explica que o EU tem a ver com a consciência, a subjetividade, a autoexpressão (inclusive arte estética); com a verdade e sinceridade; com a irredutibilidade e percepção viva imediata; com os relatos na primeira pessoa. O NÓS refere-se à ética e à moral, às visões de mundo, ao contexto compartilhado, à cultura; ao significado intersubjetivo, à compreensão mútua, ao pertinente, ao justo; aos relatos na primeira pessoa do plural. O ELE se relaciona com a ciência e a tecnologia, com a natureza objetiva, com as formas empíricas (inclusive cérebro e sistemas sociais); com a verdade propositiva, com as exterioridades objetivas tanto de indivíduos quanto de sistemas; com os relatos na terceira pessoa. Mais do que a diferenciação existente entre as Três Grandes esferas de valores, Wilber (2006, p. 64) coloca como ponto absolutamente crucial a dissociação dessas grandes esferas, a quem ele chama de desastre da Modernidade. Para o autor, este desastre teve os significados de: “o desencanto do mundo (Weber), a colonização das esferas de valores pela ciência (Habermas), o amanhecer da desolação (T.S. Eliot), o nascimento do homem unidimensional (Marcuse), a profanação do mundo (Schuon), o universo desqualificado (Mumford)”. O mergulho na racionalidade levou o mundo à ilusão de que, juntas, ciência e tecnologia seriam capazes de dar respostas às grandes questões humanas, inclusive às sociais. Neste cenário, o aspecto emocional não tem sido considerado, impedindo a abertura ontológica para a descoisificação do mundo e dos indivíduos e impedindo também a construção de paradigmas humanizadores. A importância atribuída aos aspectos cognitivos tem conduzido à separação entre o eu e o tu,

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instituindo um dualismo ontoepistemológico

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que impede a integração entre a

informação e o contexto sociocultural, econômico e político e reduz a condição humana ao aqui e agora, deixando os indivíduos ao sabor das circunstâncias. Desse modo, torna-se necessário religar as dimensões humanas, principalmente o pensar, o sentir e o agir, em prol de uma visão mais abrangente da realidade. Torna-se necessário articular o conhecimento científico com outros tipos de conhecimento, considerando a multidimensionalidade humana. Verifica-se, de um lado, o mundo da racionalidade, onde a ciência e a tecnologia são colocadas em primeiro plano e, de outro, o mundo da subjetividade e das relações intersubjetivas entre indivíduos. Fica evidente a importância do desenvolvimento de processo de formação integral do ser humano, sem separação entre razão, emoção e ação. Um processo educacional envolvendo, além do conhecimento, a dimensão formativa, buscando, sobretudo, o equilíbrio entre razão e emoção. Um processo educacional onde conhecimento e valores sejam desenvolvidos numa dinâmica profundamente unitária. Nesse processo, os valores são considerados como projeções afetivas que se constroem na intersubjetividade dos sujeitos, conforme Piaget (1954). Como afirma Gomes, C. (2001), quando perspectivados do ponto de vista da moral, os valores criam sentido de vida, ultrapassando necessidades básicas como se alimentar, vestir-se, educar-se, bem como ter habitação, trabalho e lazer. Assim sendo, esse processo forma integralmente o indivíduo porque se fundamenta numa relação social benéfica em que saber e ser se fundem na concretude do fazer humano. O desenvolvimento desse processo exige, inclusive, um posicionamento axiológico. A transmissão, a reprodução e a criação de valores que baseiam o processo educacional dependem do grau de importância a eles atribuída, na articulação com as informações. Refletir, também, sobre os referenciais axiológicos que balizam esse processo é importante na medida em que os valores adotados se constituem em parte fundamental da formação do educando. Esses referenciais, quando coerentes com o papel da educação para o século XXI, definido por Delors et al. (1996), encorajam o indivíduo a agir conforme suas tradições e convicções, a respeitar o pluralismo, elevando o entendimento e o espírito ao plano universal, o 2

Ontológico: relativo ao ser; diz-se de algo que é relativo às propriedades dos seres em si mesmos e, não, derivadas de propriedades estranhas a eles. Epistemológico: relativo aos fundamentos lógicos, valor e alcance do conhecimento (FREIRE-MAIA, 1997, p. 229-237).

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que explicita um processo educacional que considera a dimensão objetivo-cognitiva e a dimensão subjetivo-afetiva do sujeito em formação. Desse modo, informação e formação se articulam, resgatando a autonomia desse sujeito como um ser humano. O estudo dessa articulação, entendida como o locus da formação para a integralidade humana, auxilia na descoberta de como essa formação ocorre na complexa realidade do mundo atual. Um estudo que, certamente, contribui para aumentar a lucidez sobre o processo educacional nos aspectos cognitivo e afetivo. Proporciona informações relevantes na tarefa de conduzir os educandos para a autonomia uma vez que reflete sobre as dimensões humanas na relação com itens curriculares e com aspectos do processo de ensino-aprendizagem. Proporciona, ainda, a oportunidade para combinar esses itens, resgatando o equilíbrio entre informar e formar no processo de desenvolvimento do indivíduo em sua plenitude.

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CAPÍTULO I – REVISÃO DA LITERATURA

Este capítulo apresenta, em três títulos, a revisão da literatura sobre o tema do desenvolvimento humano. Cada título corresponde a um eixo de reflexão, sendo: ser humano; educação e seu papel sociocultural; desenvolvimento humano. O primeiro eixo foi considerado importante porque os estudos sobre aquele tema não pode prescindir da reflexão sobre o ser humano, interrogação fundamental em qualquer época e lugar. Para Mondim (2005), o encaminhamento da vida depende desta solução, considerada em termos individuais ou sociais, bem como da conduta e das relações que os indivíduos mantêm entre si e com o mundo. Estudar sobre o desenvolvimento humano implica, necessariamente, analisar soluções à pergunta: o que é o ser humano e qual o seu lugar? De igual modo, o fenômeno educativo fascina as pessoas, sendo um fato concreto que permite aos indivíduos compartilharem experiências entre si e com o mundo. Como explica Vieira Pinto (2007), a educação é processo histórico pelo qual a sociedade forma seus membros. Formar no sentido de desenvolvê-los como seres humanos. Por fim, o terceiro eixo corresponde aos processos de informação e formação dos indivíduos, que constituem efetivamente o lugar almejado pelos diversos povos, de quaisquer épocas e espaços geográficos, na ideação do ser humano em função dos interesses da sociedade.

1.1.

SER HUMANO

Este título gira em torno de duas questões. A primeira, sobre o que é o homem, é discutida nos limites de reflexões sobre as dimensões humanas da razão, emoção e ação. A segunda, sobre a sociabilidade humana, restringe-se a reflexões a respeito do sociocultural como o lugar do ser humano.

1.1.1. Dimensões humanas

Inicia com Sócrates (469-399 a.C.) a ideia de que um indivíduo se define como humano quando, ao ser perguntado racionalmente, surge uma resposta

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racional. Em suas reflexões no campo da antropologia filosófica, Cassirer (1994) afirma que Sócrates não arriscava uma definição do ser humano. No entanto, aquele pensador grego identificava-o pelas qualidades e virtudes individuais, como a bondade, justiça, temperança e coragem. De qualquer maneira, predominava na resposta socrática a ideia de humanidade a partir da capacidade de raciocinar. Para Platão (428/427-348/347 a.C.), o ser humano é dual, constituído de alma suprassensível e corpo sensível, sendo estas instâncias não apenas distintas, mas opostas. Enquanto para Sócrates o corpo estava a serviço da alma, em Platão o corpo é entendido como tumba, lugar onde a alma sofre suas penas neste mundo o qual é cópia do Mundo das Ideias. O discurso socrático-platônico em favor da primazia da razão tem continuidade com Aristóteles (384-322 a.C.). Embora admita existir algo oposto à dimensão racional, e isto seria a emoção, Aristóteles entende que a característica mais humana é a razão. Finalmente, para os estóicos, cada indivíduo deve se perguntar constantemente sobre a relação que mantém com a parte chamada Razão soberana, aquela que o torna independente e o deixa em perfeita harmonia com o Universo. Estas concepções, entre os gregos antigos, consubstanciam a resposta clássica de que o ser humano é constituído, na essência, pela razão. Tal resposta sofreu abalo pelo ideal cristão. A faculdade de pensar, que traria independência e harmonia aos indivíduos, e concebida como virtude humana, passou a ser entendida como algo que poderia levar ao vício e ao erro. Em Agostinho (354-430), a razão não é mais o caminho da clareza, verdade e sabedoria, porque ela mesma existe na obscuridade, sendo possível desvendá-la somente por meio da revelação cristã. Mesmo quando Aquino (1225-1274) atribui à razão um poder maior que o concedido por Agostinho, a razão não usa seu poder corretamente a não ser que esteja guiada e iluminada por Deus. Esta discussão, envolvendo razão e fé, perdura ao longo da Idade Média, assumindo conotação diferente com Pascal (1623-1662) no início da Idade Moderna. Para ele, o que caracteriza o ser humano é a sua variedade intrínseca, sendo a contradição sua primeira e verdadeira lei, não havendo mais uma natureza capaz de defini-lo. A religião é a única abordagem capaz de responder o que é o ser humano, embora ela não pretenda esclarecer o mistério humano, mas aprofundá-lo (CASSIRER, 1994).

26

De todo modo, Descartes (1596-1650) busca finalizar essa discussão, fortalecendo a ideia de homem racional, explicando que a unidade dos seres humanos é representada pela razão bem guiada e desenvolvida. Para o autor, o bom senso e a razão são naturalmente iguais em todos os indivíduos (DESCARTES, 1973). Nietzsche (1844-1900), por sua vez, afirmou no século passado que o homem é a medida de todas as coisas (repetindo Protágoras, o antigo filósofo grego) porque de sua vontade de potência é que cada coisa adquire o seu sentido. O autor defende a ideia do Super-Homem, aquele que está para além da racionalidade, que despreza valores éticos, vive num mundo dionisíaco e percebe o passar do tempo como um eterno retorno. Em Assim falou Zaratustra, afirma que cada indivíduo é uma corda sobre o abismo, atada entre o animal e o além-dohomem, tendo como grandeza o fato de que ele é uma ponte e não um fim (NIETZSCHE, 1996). Explicações sobre o ser humano se relacionam, também, com a dimensão emocional, tendo sido Aristóteles o primeiro pensador a refletir e a concluir sobre o assunto, demonstrando que é necessário haver equilíbrio entre razão e emoção. Em Ética a Nicômaco, o filósofo grego demonstra que as paixões são bem vindas, desde que manifestadas de forma equilibrada, senão levam ao erro; explica que são dignos de louvor aqueles que se encolerizam por justos motivos e com os indivíduos certos, fazendo isto como, quando e enquanto devem (ARISTÓTELES, 1996). As explicações no âmbito da dimensão emocional perduram no tempo. Na atualidade, Casassus (2009) acentua a importância das emoções para que a pessoa se perceba como ser vivo. Para o autor, o indivíduo percebe a sua própria existência somente quando se dá conta de que sente a vida pulsando em si mesmo. Assim, essa noção encontra-se distante da concepção do ser humano presente no antigo cogito cartesiano, sendo possível assumir, em vez do penso, logo existo algo como sinto a vida, logo existo. Os sociobiólogos entendem que durante a evolução da espécie humana houve uma ascendência do emocional sobre o racional. Para Goleman (2007), pesquisas demonstram que as emoções orientam os indivíduos nos desafios cotidianos, cuja solução não deve ser relegada unicamente a cargo do intelecto. Conforme explica, cada emoção predispõe os indivíduos a agirem imediatamente diante de ações que se repetem no enfrentamento de desafios. O repertório

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construído por elas na lida com os problemas do dia a dia tem sua importância atestada porque essas ações permanecem gravadas no sistema nervoso de cada um como inclinações inatas e automáticas do coração. As experiências no âmbito do pensamento e da emoção têm seu suporte no próprio corpo do indivíduo. Para Aranha e Martins (1986), o primeiro momento da experiência humana é o corpo, pois, antes do ser que conhece, há o ser que vive e sente. Por seu intermédio, o indivíduo se engaja de inúmeras maneiras perante o real, a exemplo do trabalho, arte, amor e sexo. As autoras explicam que o corpo não é um instrumento por meio do qual o íntimo de cada um tenta se manifestar, mas, sim, o próprio indivíduo se manifestando. A partir da disposição natural de decidir, o indivíduo age. Sua ação, diferentemente daquela realizada pelos animais irracionais, produz experiências que criam a existência humana. O ser que pensa-sente-quer é direcionado para fins elaborados conscientemente, em resposta aos desafios da natureza em sua luta pela sobrevivência, reproduzindo técnicas já utilizadas pelos semelhantes e inventando outras (ARANHA; MARTINS, 1986). Desse modo, sua capacidade de resposta cresce qualitativamente porque, ao se desenvolver biologicamente, evolui na capacidade de reflexão e, com isto, inova sua atuação sobre a natureza. Estas ideias sobre o ser humano demonstram que não se pode fragmentá-lo, ora em sua racionalidade, depois na emoção ou, ainda, na capacidade de agir. Embora o Homo sapiens, segundo a resposta clássica, tenha dado lugar ao Homo fidei, entre os medievos; não obstante o homem sem natureza definida e contraditória, conforme explicam os primeiros modernos, tenha cedido lugar ao homem que é dono da razão; embora, na contemporaneidade, tempo de incertezas e indefinições, as explicações se relacionem com a multidimensionalidade, prevalece, apesar das tentativas de fragmentá-lo, a concepção de que há uma unidade constitutiva do ser humano. As tentativas de definir o ser humano em instâncias delimitadas resumem-se, meramente, a uma opção didática visando a entendê-lo melhor. Pois não há ser humano em dimensões separadas. Ele não existe exclusivamente na razão, esta entendida como instrumento de compreensão das coisas; na emoção, concebida como meio de aproximação entre os indivíduos; nem na vontade, compreendida como recurso para prepará-lo ao enfrentamento de desafios. Como afirmam Aranha

28

e Martins (1986), embora didaticamente seja possível distinguir essas atividades, o homem é uma unidade que pensa-sente-quer-age.

1.1.2. Sociocultural, um lugar para o ser humano

Na

Antiguidade,

fundamentalmente,

sobre

os o

chamados princípio

pré-socráticos

material

e

perguntavam-se,

ordenador

das

coisas,

denominando-o pela palavra arché. Com Sócrates, a pergunta fundamental passa a localizar-se na pessoa humana, o que alicerça as grandes questões da humanidade até o século XVI, quando então surge o sistema heliocêntrico postulado por Nicolau Copérnico (1473-1543). Nessa época, o homem deixa de ocupar o centro do Universo, constituindo-se uma nova cosmologia, diferente da metafísica clássica, da religião e da teologia medievais, abrindo portas para a compreensão científica do ser humano. Essa cosmologia colocava cada indivíduo em solidão diante do infinito oceano circundante; uma infinitude que fez Pascal (1623-1662) afirmar que “le silence éternal de ces espaces infinitis m’effraye” (CASSIRER, 1994, p. 29). Naquele momento histórico, Montaigne (1533-1592) exigia, em sua Apologia de Raimond Sebond, que lhe mostrassem por meio da razão o porquê da ideia de supremacia do ser humano em relação às demais criaturas. Aquele filósofo se pergunta: quem teria feito os indivíduos pensarem que o admirável movimento do arco celestial, a luz eterna das luminárias situadas acima de suas cabeças e os prodigiosos e temíveis movimentos do infinito teriam sido estabelecidos e continuariam por muito tempo a seu serviço? (CASSIRER, 1994). Por outro lado, para Giordano Bruno (1548-1600), a infinitude na qual os indivíduos se encontravam mergulhados significava não somente a inesgotável riqueza da realidade, mas o poder fantástico do intelecto do ser humano. Até o século XVIII, pensadores como Galileu Galilei (1564-1642), René Descartes (1596-1650), Bento de Espinoza (1632-1677), Gottfried Leibniz (16461716) e, tantos outros, também refletiram sobre o lugar do ser humano no Universo. No século XIX, com o nascimento da biologia e o lançamento da obra Origem das Espécies, de Charles Darwin (1809-1882), a pessoa humana passou a ser compreendida como um animal de espécie superior inserido num processo seletivo do qual a totalidade dos seres vivos participa. No entanto, essa concepção empírica

29

não consegue explicar as diferentes motivações do indivíduo em sua relação com os outros, localizando a discussão em área de conhecimento que envolve o tema da cultura. O ser humano é compreendido não mais em termos individuais, mas na complexidade das relações sociais, envolvendo a linguagem, o mito, a religião e a arte. Estas explicações, do ponto de vista antropológico, consideram o ser humano em sua totalidade, admitindo-o como elemento integrante de grupos organizados, histórico e possuidor de crenças, usos e costumes, linguagem e assim por diante. Como explicam Marconi e Presotto (2006), ele é o resultado de um processo de evolução, um ser bio-psico-cultural, portanto, pensante, produtor de culturas e pertencente a uma sociedade. No século XX, essas concepções se consolidam, mas as discussões e perguntas continuariam, recebendo contribuições de ciências surgidas naquele século, tais como: física quântica; neurociência; biologia celular e molecular. Ademais, contribuem para as discussões teorias como o princípio da incerteza, de Heisenberg; o princípio da complementaridade, de Niels Bohr; os níveis de realidade, de Basarab Nicolescu; a teoria autopoiética, de Maturana e Varela; o pensamento complexo, de Edgar Morin; o pensamento ecossistêmico, de Moraes (MORAES, 2008). Estas teorias explicam que o ser humano existe na interação com aquilo que o circunda. Nesta perspectiva, Moraes (2008) toma Morin como referência para explicar que, de certo modo, os princípios que regem o Universo são os mesmos que regem o ser humano. Portanto, há muito tempo ficou descartada a ideia de que o ser humano é somente ou razão, ou fé ou emoção. O indivíduo não existe na solidão do encontro com ele mesmo ou com a Natureza, mas na relação significativa mantida com o mundo e com aqueles que nele habitam. Sendo essencialmente sociável, o ser humano não vem ao mundo sozinho; não cresce sozinho; não se educa sozinho. Somente na companhia dos outros, o indivíduo ocupa um lugar que é seu enquanto ser humano, podendo realizar suas necessidades elementares e suas aspirações. Nesta interação, ele emerge como um ser sociocultural.

1.2.

EDUCAÇÃO E SEU PAPEL SOCIOCULTURAL

30

O conceito ideal do ser humano e, no desdobramento, a clareza quanto ao seu lugar no mundo, são condições que subjazem, previamente, à intencionalidade de educar para formar. Para Vieira Pinto (2007), aquele conceito é um dado de consciência. Assim, a educação assume dois entendimentos: como procedimento de transformação do não-homem em homem (segundo a forma elementar de consciência, ingênua); como diálogo entre os homens (segundo a forma superior de consciência, a crítica). Por conseguinte, pode-se dizer que o conceito de educação, bem como o de seu papel sociocultural, depende do nível de consciência dos indivíduos afetados pelo processo de formação.

1.2.1. Fenômeno educativo

A palavra educação origina-se do verbo educar, proveniente do latim educare, sendo este a tradução do grego paidagogia. Este termo, por sua vez, constitui-se de pais (criança) e ago (conduzo), significando para os gregos antigos a formação integral da pessoa (GILES, 1983). Seu entendimento envolve dois níveis de abrangência, um restrito e outro amplo. No primeiro caso, educação se refere à pedagogia clássica sistematizada, ocorrida no contexto de unidades educacionais formais, por meio de dinâmicas que utilizam recursos como aula, quadro, computadores, livros e material escolar. Neste nível, encontra-se a ideia de capacitação para sobreviver e fazer parte de contextos de vida. O processo educacional aqui é considerado a partir da visão clássica e tradicional. No segundo nível de abrangência, ênfase deste subtítulo, educação refere-se a algo situado nas relações sociais estabelecidas pelos indivíduos entre si em ambientes formais ou informais, portanto, tem a ver com a existência da pessoa ao longo de sua vida, englobando os mais variados aspectos dessas relações. Tal significado remonta aos gregos antigos. Para o cidadão daquela época, à educação cabia formar o mais elevado tipo do ser humano, sendo ela a representação dos esforços dos membros da comunidade. Entre eles, o fenômeno educativo era a última justificação da comunidade e de seus componentes, sendo o conhecimento e a inteligência do grego antigo localizados no ápice de seu desenvolvimento (JAEGER, 2001).

31

Com os gregos antigos nasceu a educação baseada em conteúdos que eram, simultaneamente, morais e práticos. Aos preceitos relacionados à moralidade externa, à prudência para a vida, agregaram-se mandamentos como honrar os deuses e os pais e respeitar os estrangeiros. Nasceu, também, a ideia de transmissão de conhecimentos e aptidões para a prática de uma profissão, a techne, como a denominavam os gregos (JAEGER, 2001). Dos gregos antigos até hoje inúmeras definições de educação foram elaboradas. Para Vieira Pinto (2007), ela tem um caráter processual, permitindo à sociedade moldar seus membros à sua imagem e de acordo com seus interesses. Sendo histórica, ela forma o indivíduo ao longo do tempo. Além disto, representa a história de cada um dos indivíduos e de sua comunidade, devendo ser interpretada por intermédio da lógica dialética e não da lógica formal. Desse modo, as pessoas se

formam

no

sentido

Bildung3

porquanto

a

sociedade

atua

sobre

o

desenvolvimento de seus componentes visando a integrá-los ao seu modo de ser e fazê-los aceitar os fins coletivos. Para Freire (1987), a educação acontece no esforço contínuo por intermédio do qual os seres humanos vão se percebendo, de maneira crítica, como estão sendo no mundo, com que e em que se acham. A educação deve ser problematizadora,

iniciando-se

justamente

na

historicidade

dos

homens,

reconhecendo-os como seres inconclusos em e com uma realidade que, sendo histórica, também é inconclusa. Neste sentido, o fenômeno educativo re-faz-se na práxis, pois, para ser, tem que estar sendo. Justamente

neste

re-fazer-se

na

práxis,

próprio

da

concepção

problematizadora, encontra-se a necessidade de interpretar o fenômeno educativo a partir da lógica dialética. Para Vieira Pinto (2007) a historicidade está na essência da educação e qualquer programa em seu favor nasce inconcluso porque sua própria execução lhe altera aspectos qualitativos, tais como o professor, o aluno e os recursos utilizados, exigindo constante aprimoramento.

3

Freitag (2001) explica que, para Kant, Bildung significa o processo de moldagem em que o educador e o educando buscam obter um padrão de excelência, uma virtude suprema, uma consciência moral baseada na razão e na justiça. Para a autora, o termo pode significar a realização da imagem de um personagem idealizado e pode referir-se ao processo de construção do caráter do indivíduo e à busca de um objetivo social e comunitário. Jaeger (2001), por sua vez, explica que Bildung é uma herança dos gregos, a qual aparece sempre que o espírito humano não se deixa aprisionar pelos fins exteriores e procura se encontrar na essência da educação.

32

Desse modo, a concepção freiriana de educação supõe que a situação humana seja compreendida como um problema sobre o qual incida o ato cognoscente. Em decorrência, explica Freire (1987), o indivíduo aprofunda a tomada de consciência sobre a realidade, apropriada como história e, por isto mesmo, sujeita à transformação. Conforme Vieira Pinto (2007), a educação é um fato que se determina de acordo com a consciência social alcançada e, simultaneamente, tem o objetivo de suscitar no educando a consciência de si mesmo e do mundo. Finalmente, vale ressaltar que estas concepções filosófico-científicas demonstram o caráter endógeno da educação. Um caráter que não é identificado exclusivamente por formulações teóricas, por um pensar rigoroso e legitimado pelos meios acadêmicos. Ele é evidenciado, também, em discursos como os de indígenas brasileiros: Aprendi com meu povo o verdadeiro significado da palavra educação quando via meu pai ou a mãe do menino ou da menina conduzindo-os passo a passo no aprendizado cultural: pescar, caçar, fazer arcos e flechas, limpar o peixe e cozê-lo, buscar água, subir na árvore (...) Aprendi que na sociedade indígena, educar é arrancar de dentro para fora, fazer brotar os sonhos e, às vezes, rir do mistério da vida. Descobri, depois, que na sociedade pós-moderna ocidental, educação significa a mesma coisa: tirar de dentro, jogar para fora. Mas decepcionei-me ao ver que os professores faziam o contrário: colocavam de fora para dentro. Os sonhos ficavam entalados dentro das crianças e dos jovens. Aprender, para o ocidental, é ficar inerte, ouvindo (MUNDURUKU, 2001, p. 38).

1.2.1.1. Social na educação

O processo de humanização dos indivíduos inicia com a procriação natural, mas evolui do plano físico ao espiritual. As pessoas sobrevivem, buscando sua alimentação, moradia e proteção, mas emergem como seres espirituais, sendo capazes de realizar ações que melhoram as formas de existência (JAEGER, 2001). Segundo Mota (2007), os indivíduos produzem sua existência ao extrair necessidades do mundo natural, fazendo isto na relação mantida com os outros. Neste processo, eles transformam a Natureza e a si mesmos, na medida em que inventam novas técnicas, ferramentas, conhecimento, cultura. Desse modo, essas ações transformam-se em princípio educativo porque os indivíduos passam a perceber, de maneira diferente, a si, aos outros e ao mundo em que vivem. Como explica Jaeger (2001), a educação surge devido à necessidade que o ser humano tem de organizar-se, física e espiritualmente, ainda que a estrutura

33

corpórea e espiritual adquirida naturalmente crie condições especiais de se manter e de ser transmitida, a exemplo da capacidade de se comunicar e de viver socialmente. Segundo o autor, na educação encontra-se a mesma força vital que leva os seres vivos a se conservarem. Nela, esta força se intensifica ao mais alto grau porque o conhecimento e a vontade são esforços conscientes. Considerando a perspectiva da evolução física, observa-se que a satisfação de necessidades gera o processo histórico-social, caracterizando estruturas próprias de cada sociedade e envolvendo os mais diversos interesses. Segundo Vieira Pinto (2007), a educação real tem acontecido nos limites deste processo. Por um lado, seu caráter social manifesta-se quando os indivíduos são habilitados técnica, social e ideologicamente para gerar resultados por intermédio do trabalho. Neste caso, fica favorecido um grupo que se julga no direito de saber e especializar-se na tarefa de educar, bem como de legislar sobre o fenômeno educativo. Por outro lado, o caráter social da educação fica evidente quando o desenvolvimento de potencialidades e a apropriação do saber social, refletido em conhecimentos e habilidades, atitudes e valores, se voltam para o atendimento de interesses coletivos. Segundo essa caracterização, o trabalho dos membros da comunidade realiza-se de acordo com suas possibilidades, permitindo-lhes se apropriar daquilo de que precisam. Neste caso, a educação contribui com conhecimentos e atitudes que possibilitam às pessoas sobreviverem na comunidade. De uma perspectiva da evolução espiritual, constata-se que ao inventar sua existência a partir de mecanismos adquiridos naturalmente, o homem promove, em sua especificidade, aquilo que Freire (2009) denomina suporte. Este seria o espaço ao qual o animal se vincula, seja prendendo-se ou resistindo a ele. No caso do ser humano, o suporte alonga-se, fazendo-se mundo. Simultaneamente, a vida faz-se existência. Para Freire (2009), isto ocorre na medida em que o corpo humano transforma-se em corpo consciente, capaz de captar a realidade, aprender, transformar e criar o que é belo, e não em espaço vazio a ser preenchido por conteúdos. De acordo com Freire (2009), ao inventar sua existência o indivíduo encontrase envolto na linguagem, na cultura, na comunicação, em níveis mais complexos do que antes, quando o domínio era o da vida. Encontra-se envolto, também, na espiritualização do mundo, na possibilidade de torná-lo belo ou feio. Conclui o autor que isto inscreve as pessoas como seres éticos.

34

Este processo, portanto, evidencia a dimensão social da educação. À medida que o indivíduo se conscientiza de sua natureza coletiva, ele se dá conta de que precisa preservar o que favorece a concordância entre o seu comportamento e os interesses da coletividade. Essa dinâmica de conscientização sobre aquilo que é bom ou ruim para a manutenção do grupo é a própria educação se concretizando. 1.2.1.2. Cultura e educação

Segundo Ullmann (1991), cultura é o modus vivendi global, do qual um determinado povo participa, incluindo a maneira de agir, de pensar e de sentir. Neste sentido, refere-se ao conjunto de costumes humanos, traduzindo o cabedal de conhecimentos acumulados e transmitidos na relação social. Ela possibilita a interpretação do mundo humano, sendo resultado da elaboração simbólica e, consequentemente, ultrapassa o sentido meramente factual. Por sua vez, Hofstede (1997) define cultura como uma programação mental coletiva que torna distintos os membros de um grupo, ou categoria de pessoas, diante de outro. Neste entendimento, a cultura acontece porque cada indivíduo transporta em si padrões de pensamentos, sentimentos e ação potencial, originários de um contínuo aprendizado, que se instalam em sua mente ao longo da vida. Intersectando os principais aspectos dessas definições com a realidade educacional, depreende-se que o caráter cultural da educação manifesta-se na transmissão, interpretação e ressignificação de experiências vividas e saberes acumulados, compartilhados por intermédio da interação entre educadores e educandos, gerando características e dinâmicas de existência específicas de seus grupos de pertença. Para Vieira Pinto (2007), a educação constitui-se em acontecimento cultural que envolve não apenas o repasse de conhecimentos, vivências, usos, crenças e valores, mas também os métodos implicados neste processo, os quais concernem à totalidade social. Segundo esse entendimento, o aspecto material da relação entre educação e cultura manifesta-se na transmissão de saberes e o aspecto formal evidencia-se nos meios criados e possibilitados pela própria cultura para que esse repasse aconteça na sociedade. Educação e cultura, por serem totalidades sociais, se autoproduzem e produzem o ser humano na reflexão do indivíduo sobre si mesmo e no diálogo mantido com os demais membros da comunidade. Essa produção do ser humano,

35

que se dá na relação entre educação e cultura, pode ser compreendida melhor a partir da seguinte definição: A cultura é, pois, o processo pelo qual o homem acumula as experiências que [ele] vai sendo capaz de realizar, discerne entre elas, fixa as de efeito favorável e, como resultado da ação exercida, converte em ideias as imagens e lembranças, a princípio coladas às realidades sensíveis, e depois generalizadas, desse contato inventivo com o mundo natural (VIEIRA PINTO, 1979, p. 123).

Nesta definição, ação exercida significa o trabalho humano, que acontece no convívio que os indivíduos decidem estabelecer entre si; acumular experiências e converter imagens e lembranças em ideias significa, precipuamente, aprender, conhecer, tomar consciência sobre o que se faz e pensa. Neste sentido, o caráter cultural da educação se manifesta na dinâmica construída pelas categorias trabalho, aprendizado, natureza e ser humano, na capacidade que o indivíduo tem de se reconstruir consciente e permanentemente no convívio com o outro. Na convivência, exige-se respeito ao direito de tomar decisões possibilitadas pelos conhecimentos e experiências adquiridas no grupo. Desse modo, o caráter cultural da educação evidencia-se na tensão entre a dimensão material e a espiritual. Uma tensão que é constituída pelo acúmulo de experiências humanas que são, inicialmente, vinculadas ao sentido factual, mas depois elevadas à categoria do simbólico. Neste nível, idealizam-se valores e crenças, que são manifestações culturais presentes no processo educacional. Sublimando o caráter cultural da educação, Carneiro (2003) propõe a reinvenção da paideia, sinônimo de educação e cultura. Visionário, o autor supõe o despertar de um novo humanismo ao explicar que: Se a Paideia predominar, isto é, o social, o cultural e o humano adquirirem prioridade sobre o econômico, veremos inaugurado um tempo inclusivo, onde todos podem habitar a cidade e nela buscar a sua felicidade pessoal na dignidade e na concertação de interesses com todos os demais concidadãos (CARNEIRO, 2003, p. 109).

1.2.1.3. Valores da educação

O caráter axiológico do processo educacional existe independentemente da concepção que se tenha sobre valores, sejam estes entendidos como essências eternas a serem alcançadas pelo indivíduo ou compreendidos como uma construção a partir do ato de valorar. Para Silva (2000), a educação acontece em

36

bases axiológicas pré-estabelecidas e, simultaneamente, transmite, reproduz ou cria valores. Neste trabalho, entende-se que os valores aderem ao processo educacional qualificando-o e dotando-o de contravalores, que podem ou não contribuir para o êxito desse mesmo processo. De qualquer forma, aqueles são transmitidos, reproduzidos ou criados segundo uma hierarquia que lhes é atribuída pelos 4

envolvidos . Silva (2000) analisa esse caráter axiológico, relacionando-o com as propostas educativas da escola tradicional e escolanovista, as quais correspondem à pedagogia da essência e da existência; com a proposta progressista, a qual corresponde ao materialismo histórico-dialético5. A pedagogia da essência remonta aos gregos, para quem o ser humano é essencialmente livre; perpassa os tempos medievais, quando o homem tem sua essência na criação divina; alcança os modernos, quando, ser homem, é ser livre por natureza. Tal concepção pedagógica fundamenta a escola tradicional de educação a partir dos seguintes valores, dentre outros: ensino humanístico de cultura geral segundo saberes e conhecimentos já constituídos; autoridade e orientação do professor, com a valorização da organização lógica do ensino o qual deve ser externo ao aluno; disciplina escolar; aprendizado pela apreensão de modelos para somente depois criar; memorização de conteúdos; caráter conservador na relação educação-sociedade (SILVA, 2000). Nessa perspectiva, o professor transmite informações e o aluno torna-se passivo, memorizando os conteúdos transmitidos. Conforme explica Pedro (2002), a escola tradicional preocupava-se, principalmente, com a pura transmissão de saberes e de determinados valores pertencentes ao patrimônio cultural da nação. Uma adesão irracional aos conteúdos memorizados, sem sua compreensão.

4

Os valores possuem quatro categorias ontológicas: os valores não são, mas valem algo; são qualidades, portanto, algo que não é, mas que adere a outra coisa; implicam polaridade na medida em que tem um contravalor, positivo ou negativo; os valores têm hierarquia, na multidão de tipos existentes (GARCÍA MORENTE, 1980). 5

O ser humano pode ser uma invenção de Deus, existente a partir de um modelo estebelecido (essencialismo). Pode não ser apenas como o indivíduo se concebe, mas como ele quer ser depois de sua existência (existencialismo). E pode ser o resultado de um processo de vida real, em que a consciênca ocorreria por intermédio do trabalho (materialismo histórico-dialético) (ARANHA; MARTINS, 1986).

37

Por sua vez, a pedagogia da existência, que inclui diversas correntes de pensamento,

como

pragmatismo,

vitalismo,

historicismo,

existencialismo

e

fenomenologia, fundamenta a escola nova a partir de valores como: ensino para a vida e atividades humanas, sendo a criança o centro do processo educacional; o presente é mais importante do que qualquer herança cultural e modelos pedagógicos; iniciativa pessoal e autonomia do aluno; reforma pedagógicometodológica em vez da preocupação com os conteúdos; sistematização do mundo escolar, sendo a existência do cotidiano a principal referência; transferência natural do conhecimento adquirido pela criança por si só; integração escola-sociedade, sendo a educação um instrumento de mudança (SILVA, 2000). Em sua atuação, o docente é substituído por um monitor e o ensino acontece somente se houver uma autogestão individual ou em grupo, buscando atingir postura voltada para a integração, em lugar da separação. Pedro (2002) explica que, em oposição à escola tradicional, a qual criava uma separação entre pensamento e sensibilidade, a escola nova proporcionava uma educação em que o educador tinha o papel de intervir indiretamente, orientando e aconselhando o aluno. As tentativas de síntese entre os pontos positivos da escola tradicional e os da escola nova são inúmeras, resultando em proposta educativa cunhada por Snyders (1974) como educação progressista. Esta proposta tem uma tendência axiológica advinda das reflexões instauradas a partir do materialismo históricodialético. Dentre os valores que a fundamentam, destacam-se: conteúdos e métodos educativos atualizados, significativos e relacionados ao mundo do aluno; participação ativa do aluno; não há natureza humana, mas uma condição humana, sendo o homem o construtor da sociedade e da história; o presente como fonte de valores, projeção no futuro; o aluno é coparticipante do processo educacional; a disciplina como o conjunto de resultados, aluno autodisciplinado; o jogo como instrumento preparatório para o trabalho; professor valorizado que trabalha com alegria e com o desejo do aluno; a escola como comunidade de vida real, contradições trabalhadas cientificamente e valores da coletividade; coletivo sobre o individual; relação educação-sociedade crítica; educação fundada em valores sociais; o trabalho humano entendido como categoria universal e núcleo gerador dos valores da coletividade (SILVA, 2000).

38

A educação progressista, conforme afirma Snyders (1974), se distingue da pedagogia conservadora pelo que diz sobre as questões de desigualdades sociais, racismo, guerras e sobre práticas vinculadas às diversas interpretações. De acordo com sua explicação, essa pedagogia se preocupa que o aluno ultrapasse a própria experiência, a qual assume um sentido ativo para ele. Uma experiência que tem necessidade da cultura e de ser guiada. Segundo Pedro (2002), trata-se de uma pedagogia que valoriza o saber socialmente significativo e jamais o saber artificial e fechado para o aluno ou, ao contrário, o saber espontâneo; mas que trabalha a relação direta entre a experiência do aluno e os conteúdos.

1.2.2. Papel sociocultural da educação A busca por uma definição do papel sociocultural da educação constitui-se, há muito tempo, em área problemática. As dificuldades se ampliam quando essa busca acontece no mundo atual caracterizado por mudanças aceleradas, transformações profundas, complexidade das relações entre os indivíduos e pelas facilidades de comunicação oferecidas pelos avanços tecnológicos. Trata-se, portanto, não somente de definir esse papel, mas apresentar as condições nas quais se dá a sua concretização. Inicialmente, importa mencionar que as tentativas de definir esse papel envolvem a ideia de educação preocupada em atender às exigências de seu tempo e espaço na busca de soluções para grandes questões humanas. Não foi diferente o que aconteceu, por exemplo, na elaboração do Relatório Faure (1974) – Aprender a Ser – e Relatório Delors (2000) – Educação: um Tesouro a Descobrir. Para o primeiro relatório, é fundamental haver: solidariedade entre governos e pessoas; democracia para a realização do potencial de cada indivíduo; desenvolvimento que considere a riqueza da personalidade e da complexidade das formas de expressão humanas; educação para a vida. Para o segundo relatório, é necessário superar tensões existentes entre: global e local; universal e individual; tradição e modernidade; visão de longo e de curto prazo; competição e igualdade de oportunidades; expansão do conhecimento e capacidade de assimilá-los; espiritual e material. Enquanto no primeiro relatório, o papel sociocultural da educação refletese na noção de aprender; no segundo, esse papel consubstancia-se nas noções do

39

aprender a ser, aprender a conhecer, aprender a fazer e aprender a conviver. A concretização desse papel pode estar representada no cumprimento de duas grandes tarefas a cargo da educação. A

primeira

dessas

tarefas

refere-se

à

formação

para

o

trabalho.

Considerando que atualmente o processo formativo não pode mais ser pensado de modo excessivamente rígido, voltando-se para a aquisição de competências e habilidades que possibilitem a execução de certas atividades (TAVARES, 1996), o papel sociocultural da educação deve contribuir para que o educando se prepare para um quadro de ocupações mais flexível, sendo capaz de inovar. Neste sentido, é importante a classificação feita por Reich (1994) das ocupações que existem em função da competitividade. Segundo o autor, o universo do trabalho tem se organizado em torno de dois eixos de ocupação: os seguidores de rotinas e os analistas simbólicos. O primeiro eixo, que envolve os serviços rotineiros de produção e os serviços pessoais, caracteriza-se pelo cumprimento de procedimentos padronizados e regras pré-estabelecidas e seus funcionários são remunerados em função do número de horas trabalhadas e do volume de trabalho realizado, não sendo necessário possuírem grande educação escolar. O segundo eixo, que envolve atividades de identificação e solução de problemas, caracteriza-se pela manipulação de símbolos – dados, palavras, representações, dentre outros – e seus funcionários são remunerados de acordo com a qualidade do trabalho, tendo a maior parte deles cursos de graduação e pós-graduação. Para Machado (2004), essa bifurcação fundamental do mundo do trabalho ainda não é considerada pela escola, havendo uma formação para ocupações bastante específicas. Segundo ele, os cursos de graduação ainda são incipientes no preparo das pessoas com algo que ultrapasse o conteúdo, o que as tornaria aptas para um melhor discernimento; não formam, ainda que de maneira geral, em áreas como a educação, a psicologia, a filosofia e a sociologia. Para o autor, o mundo do trabalho aponta para uma formação mais ampla, transdisciplinar, que possibilite às pessoas o desempenho de múltiplas funções e mantenha o foco na capacidade de criar. A segunda tarefa da educação é desenvolver práticas formativas que permitam deixar manifestos os valores importantes ao indivíduo e à sociedade. Para Aristóteles (1996), ninguém nasce moral ou imoral, mas potencialmente capaz de desenvolver virtudes morais através dos hábitos, decorrendo daí a necessidade do

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fenômeno educativo. Além disso, segundo o pensamento aristotélico, ser bom significa ser bom cidadão, o que é possível somente na relação que as pessoas mantêm entre si. No mundo atual, é necessário resgatar princípios e valores morais universais que permitam fundamentar um processo educacional capaz de libertar e formar o indivíduo e a sociedade segundo premissas éticas em que o Amor e a Justiça possibilitem o fazer social (BEUST, 2000). No mundo contemporâneo, caracterizado pela pluralidade moral, como se desenvolve o papel sociocultural da educação na perspectiva dos valores? Como atualmente não existe um modelo de pessoa ideal, Marchesi (2008) lembra que os direitos declarados fundamentais em 1948 constituem-se num conjunto de valores universais que possuem força para orientar a ética individual e a coletiva. Lembra, ainda, que essa perspectiva universalista dos valores sustenta-se na noção de cidadania, servindo para dar coerência aos valores básicos que aglutinem propostas de uma educação moral. Entretanto, Marchesi (2008) alerta que, dado o aspecto generalista presente na definição desses valores básicos, a maioria dos problemas éticos não são solucionados. Por exemplo, há contradições quando valores fundamentais colidem e há diferenças quando eles são interpretados e implementados. Desse modo, mesmo tendo valores que são referenciais de uma educação moral, o fenômeno educativo lida continuamente com contradições típicas dos relacionamentos inerentes aos grupos. A maior contradição envolvendo a prática de uma educação moral encontrase, conforme Marchesi (2008), na diferença entre os valores transmitidos pela sociedade e aqueles que ela mesma exige que a escola promova. De acordo com sua explicação, à competição, ao individualismo, à violência e à desigualdade presentes na sociedade atual competitiva, contrapõem-se a lealdade, a igualdade, a paz e a solidariedade, cuja promoção exige-se da escola. Para Marchesi (2008), as preocupações sobre a educação em valores e para a cidadania giram em torno de três enfoques que se complementam: educação para a cidadania, em que o objetivo é atingir uma formação necessária ao tempo atual, incluindo a aquisição de competências cognitivas, comunicação, ética etc.; educação sobre cidadania, em que a educação moral e cívica deve acontecer por meio da reflexão; educação por meio da cidadania, em que a escola é o lugar do

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exercício de valores cívicos que serão assumidos pelos alunos, tais como participação, respeito mútuo, tolerância e assim por diante. Com efeito, a instituição escolar é lugar onde os valores cívicos podem ser exercitados. Pesquisa realizada na década de 90 do século passado pela Associação Internacional para a Avaliação do Rendimento Educacional, sobre Educação Cívica, envolvendo 90 mil estudantes de 14 anos de idade em 28 países, evidenciou que as escolas contribuem para a melhoria dos conhecimentos cívicos dos estudantes ao promoverem discussões abertas em sala de aula (TORNEYPURTA, 2002). A pesquisa mostrou que a participação em organizações, como os grêmios ou conselhos de classe, também leva a resultados positivos em alguns países. Sobre o assunto, Perrenoud (2000) explica que, embora seja uma injustiça esperar dos professores virtudes educativas maiores do que às pertencentes à sociedade na qual eles se inserem, a educação deve insistir na construção de valores, mesmo que em tais sociedades eles sejam contrários ao que é exigido das escolas. Para o autor, não se deve aquiescer ao estado de confusão e cinismo de uma comunidade violenta, bruta, preconceituosa, desigual, plena de discriminações. Conclui que, ceder a esse estado, significa esquivar-se da contradição entre o que ensina um professor e o que vivenciam as crianças reunidas na classe. Portanto, cabe à educação enfrentar abertamente a contradição entre os valores afirmados por ela e os costumes da sociedade na qual está inserida. A efetividade desse enfrentamento não depende exclusivamente de boas intenções, convicção e realismo, mas de vivências que possam facilitar a verdadeira aprendizagem, tomada de consciência, construção de valores e identidade moral e cívica (PERRENOUD, 2000). Desse modo, o processo educacional não se restringe ao cumprimento de uma grade horária, mas amplia-se, perpassando questões curriculares envolvidas com a reflexão e a prática conexas a valores e cidadania. Essas duas tarefas da educação – formar para o trabalho e formar para valores – atualizam a gênese humana, multidimensional, na medida em que formam para além do simples aprendizado de conhecimentos acadêmicos e familiares. Uma atualização em que cada indivíduo se apropria do processo de construção de sua identidade por intermédio de dinâmicas educacionais desenvolvidas na interação intersubjetiva.

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Entretanto, essas tarefas a cargo da educação se concretizarão se forem satisfeitas, pelo menos, duas condições. Na atualidade, exige-se das pessoas, de um lado, competência e rigor aliados à capacidade de raciocinar rapidamente e comportar-se de maneira ética e, de outro lado, saber conviver com as contradições que permitem fazer e pensar numa mistura de interesses e individualismo (TAVARES, 1996). Existem, simultaneamente, uma cultura científica, rigorosa e bem delineada, e um conjunto de culturas humanas, plenas de incoerências e ricas de possibilidades de realização dos indivíduos. Resgatar o vínculo entre estas duas vertentes, perdido na Modernidade, integra o papel sociocultural da educação que esteja atualizado com as exigências de seu tempo. As duas condições de concretização do papel sociocultural encontram-se, necessariamente, vinculadas a esse resgate. A primeira dessas condições refere-se ao que Morin (2008a) designa como uma reforma do pensamento, o que permitiria o emprego da inteligência visando a ligar cultura científica e culturas das humanidades. Nesta perspectiva, o papel da educação deve estar conexo com a ideia de que a reforma do ensino leva à reforma do pensamento e vice-versa. Na mesma linha de raciocínio, Pedro (2002) afirma que o desafio do tempo atual é desenvolver nova maneira de pensar, novo tipo de racionalidade, possibilitando ao indivíduo enfrentar as exigências do mundo pósmoderno acelerado e necessitado de uma nova ética. Desse modo, torna-se necessário perguntar pelas relações que existem entre a ciência e a virtude, pelo valor do conhecimento tido como vulgar e que a ciência insiste em considerar irrelevante (SANTOS, 2000). O que Morin (2008a) propõe é uma razão aberta, que não rejeite mais fragmentos da realidade e conceba o ser humano em todas as suas dimensões, portanto, uma razão complexa. Um novo pensar, pelo qual alguns termos até então antinômicos, tais como inteligência-afetividade e razão-desrazão, não sejam mais concebidos em oposição absoluta, mas em oposição relativa, mantendo complementaridade. Esta razão aberta implica no abandono de paradigmas6 que reduzam o indivíduo a processos de trabalho, a coisas em favor da economia, da eficácia e do cálculo. Um papel sociocultural atualizado com seu tempo pauta-se em modos de 6

Paradigma é o modo como se pensa e como se usa a lógica. É aquilo que rege a ordem do discurso, do pensamento e das açoes (MORAES; TORRE, 2004).

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pensar e de organizar o discurso que consideram os indivíduos como seres humanos plenos, em sua relação com o mundo e entre si. O pensamento ecossistêmico, proposto por Moraes (MORAES; TORRE, 2004), é coerente com essa necessidade. Por seu intermédio, os fenômenos físicos, biológicos, antropológicos ou socioculturais são lidos considerando-se os conceitos de sistema (inter-relações organizacionais entre os elementos); complexidade (para além do conceito de sistema, incorpora-se a sua dinâmica); auto-organização (o ser e a vida se auto-organizam porque são cíclicos e fluidos); autonomia e emergência. Moraes e Torre (2004) afirmam que o pensamento ecossistêmico é um paradigma emergente e que, a partir de sua fundamentação e de seus pressupostos epistemológicos, colaborará para que aconteçam transformações cruciais na prática pedagógica e no estilo de vida dos educadores. Para Moraes (2004), ele supera os seguintes paradigmas: o positivista, que descreve a realidade sociocultural em termos de fatos concretos; o interpretativo, que valoriza o impacto desses fatos sobre as pessoas; o sociocrítico, que valoriza a coerência, a legitimidade das atuações e os valores envolvidos. A razão aberta considera, inclusive, que o trágico, o sublime, o irrisório, e tudo o que é amor, dor e humor sejam fontes de conhecimento e de verdade e não meramente

um

divertimento

(MORIN,

2008a).

Um

processo

educacional

consubstanciado nessa razão conta, de acordo com Marchesi (2008), com professores competentes, capazes não somente de alimentar nos alunos o desejo de aprender, mas ampliar conhecimentos zelando pelo desenvolvimento afetivo e pela capacidade de conviver. A segunda condição para que se concretize o papel sociocultural da educação está ligada ao aspecto emocional presente no processo educacional. Pesquisa liderada por Casassus (2009), realizada para a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco), demonstra que a melhor aprendizagem se encontra na dimensão humana da emoção, ou seja, acontece no espaço das relações e interações afetivas entre os envolvidos nesse processo. O autor não releva a importância do conhecimento cognitivo, mas ressalta que as emoções vêm antes e depois deste conhecimento, podendo facilitar e motivar para novas aprendizagens. Também Santos (2007) chama atenção para a importância que assume a dimensão emocional no processo de construção do conhecimento a qual estaria

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sendo mal trabalhada por educadores. Segundo ele, cada indivíduo tem consciência dos obstáculos da vida, que é a dimensão racional; e a vontade de ultrapassá-los, que é a emocional. A priorização entre uma ou outra dessas dimensões é o que distingue as culturas. De modo que a emoção se encontra no centro do papel sociocultural da educação. Não se trata, portanto, de dividir o educando em duas metades, uma cognitiva e outra afetiva, resultando num ensino com ênfase na razão em 8detrimento da dimensão emocional. Para Vasconcelos (2004), esta crença, ainda presente entre os educadores, alimenta a ideia de que o pensamento calculista, frio e desprovido de sentimentos é apropriado ao ensino de matérias clássicas. Acredita-se que somente o pensamento leva o sujeito a atitudes racionais e inteligentes; crença que é representada pelo pensamento científico e lógicomatemático. Os sentimentos, conclui, são vistos como coisas do coração que levam a atitudes irracionais e não ao conhecimento.

1.3.

DESENVOLVIMENTO HUMANO

Sendo o indivíduo um ser sociocultural, cujo processo de ideação se consolida de acordo com a consciência definida socialmente (VIEIRA PINTO, 2007) e, sendo a educação um fenômeno que intenciona concretizar a imagem-ideal do ser humano consolidada por esse processo, cabe definir parâmetros de entendimento sobre o locus do desenvolvimento humano e sobre os aspectos a ele inerentes.

1.3.1. Chave do desenvolvimento humano

A imensa quantidade de informações circulante no mundo atual pressiona os indivíduos, causa dispersão e confusão, muitas vezes gerando o que Tavares (1996) denomina iletrados diplomados. Vive-se, como explica Alarcão (2008), numa sociedade complexa, marcada por enorme riqueza informativa em que as pessoas têm dificuldade para lidar com informações novas, que as inundam e que se entrecruzam com ideias e problemas, oportunidades, desafios e ameaças que vão surgindo. É o mundo da informação fragmentária, acumulada. Uma sociedade que tem o pendor para o saber desorganizado e problemático.

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Este contexto contribui para o estabelecimento de um processo educacional baseado no acúmulo de conhecimentos pelos alunos, em detrimento de sua formação pessoal e social; e, como explica Alarcão (2008), cria a necessidade de se reestruturar as relações que professores e alunos mantêm com o saber disponível e com a utilização que dele se faz. Nesse processo educacional, nos termos de Freire (1987), o professor entende que seu papel é encher os educandos de conhecimentos, intentando transformá-los em depósitos de conteúdos, como se estes fossem o verdadeiro saber. Para o autor, esta educação, bancária, é o que Jean-Paul Sartre (1905-1980) chamava de concepção digestiva ou alimentícia do saber, em que este assume, portanto, a conotação de uma espécie de alimento, um tratamento de engorda. Ao contrário, no processo educacional preocupado com a formação pessoal e social, o professor contribui para que os alunos se problematizem em sua relação com o mundo. Neste caso, a educação é um ato cognoscente, não mais um depósito, uma narrativa, uma transferência de conhecimentos e valores. Evidencia-se, desse modo, a necessidade de haver um processo educacional que busque o equilíbrio entre conhecimento teórico e desenvolvimento humano. Que articule a dimensão informativa à formativa da educação, integrando saber e consciência. Como afirma Câmara (2002), enfatizar a transmissão pura e simples de conteúdos significa uma ruptura epistemológica entre saber e consciência, de um lado, e o compromisso político do educador e a competência técnica do saber, do outro. Desse modo, a educação não se isola na compreensão mecanicista da História, reduzindo a consciência a puro reflexo da materialidade; não se isola no subjetivismo idealista, reduzindo o fazer consciente ao acontecer histórico (FREIRE, 2009). O processo educacional que articula a dimensão informativa com a formativa da educação pressupõe a reforma do pensamento proposta por Morin (2008a). Sua implementação possibilitaria aos indivíduos superar o atual dilema de escolher entre sofrer o bombardeio de informações sobre si ou reter dessas informações somente o que é inteligível, desprezando como erro o que é incompreensível. Em vez de acumular saberes, aquele processo educacional disponibiliza, simultaneamente, aptidões gerais para colocar e tratar de problemas, e princípios organizadores que possibilitam ligar os diversos saberes, dando-lhes sentido (MORIN, 2008a).

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Essa articulação torna-se a chave para que a educação forme integralmente os indivíduos; para que a educação desenvolva a capacidade de pensar e aprender estrategicamente, permitindo às pessoas entender, sentir, relacionar-se, intervir e sobreviver no mundo atual, permanentemente em mudança (TAVARES, 1996). Portanto, uma educação que acontece a partir de experiências coletivas e polissêmicas desenvolvidas segundo um processo que considere o indivíduo na integralidade humana, um ser que pensa, emociona-se e age, além de construir significados na relação aberta com os semelhantes. Uma educação, conforme Morin (2008a), que não forma para uma cabeça bem cheia, mas para uma cabeça bem feita. Esta educação considera também, de acordo com Moraes (2008), a importância de haver maior abertura do coração, sem a qual o ser humano não desenvolve melhor compreensão dos limites de suas ações e palavras, nem aperfeiçoa suas habilidades para realizar intercâmbios e desenvolver projetos coletivos e solidários. 1.3.2. Ecologia dos saberes e formação O processo de desenvolvimento humano perpassa a instauração de uma epistemologia adequada, uma ecologia dos saberes, expressão que se refere à existência de conhecimentos plurais e à valorização do diálogo entre o saber científico e o humanístico. Para Santos (2004), essa epistemologia leva o conhecimento científico a se comparar com outros tipos, rebalanceando aquilo que foi desequilibrado na primeira Modernidade, que é a relação entre ciências naturais e práticas sociais. Esse desequilíbrio impediu, até hoje, de serem cumpridas as promessas modernas de liberdade, igualdade e solidariedade. Essas promessas, conforme Santos (2007), são expectativas vivas para populações do mundo inteiro que ainda não cumpridas porque, no limite, a compreensão da realidade reduz-se ao entendimento

ocidental

de

mundo.

Uma

compreensão

que

se

baseia

equivocadamente no paradigma moderno-ocidental polarizador, o qual explica a realidade a partir de uma epistemologia positivista que separa a ciência da cultura. Para Santos (2007), a razão indolente, preguiçosa, que se considera única e exclusiva e que perde a inesgotável diversidade epistemológica do mundo, produz como ausentes muitas realidades que poderiam estar presentes. Segundo o autor,

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ela se manifesta como metonímica na medida em que toma a parte pelo todo, sendo a totalidade feita de partes homogêneas, não interessando o que fica de fora dela; manifesta-se como proléptica na medida em que se sabe qual é o futuro: o progresso, o desenvolvimento. Assim, conforme essa explicação, a razão metonímica contrai o presente e a razão proléptica expande o futuro. O autor propõe uma estratégia oposta: expandir o presente e contrair o futuro. Essas interpretações estão representadas na Figura 1, a seguir, em que a ecologia dos saberes é evidenciada como alternativa de superação da razão indolente:

Situação atual Razão indolente

Situação proposta Ecologia dos saberes

Presente contraído

Futuro contraído

Futuro expandido

Presente expandido

Figura 1 – Razão indolente e ecologia dos saberes. Fonte: o autor, a partir das explicações de Santos (2007).

Dentre as monoculturas que tornam ausentes realidades que poderiam estar presentes, Santos (2007) destaca a monocultura do saber e do rigor, caracterizadora da hegemonia da ciência, que não valida os conhecimentos que estão fora do rigor científico; que não dá credibilidade à sabedoria popular, à indígena, à camponesa, dentre outras. Tentando fazer uso contra-hegemônico da ciência hegemônica, o autor propõe a ecologia dos saberes, a qual possibilitaria à ciência entrar, não como monocultura, mas como parte de uma ecologia mais abrangente de saberes, sendo o saber científico capaz de dialogar com o laico, o popular, o indígena e o das populações urbanas marginais e camponesas. Em suma, a utopia de uma ecologia dos saberes é a possibilidade de aprender novos conhecimentos sem abandonar os que já foram adquiridos. De outra perspectiva, Santos (2007) explica que não existem culturas completas, portanto, torna-se necessário operacionalizar um processo de tradução. Significa isto um procedimento intercultural, intersocial, por intermédio do qual se promove o relacionamento entre os conhecimentos, considerando as respectivas

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culturas de onde eles emergiram. A tradução de saberes em outros, respeitando as culturas envolvidas, significa buscar a inteligibilidade sem haver homogeneização ou destruição mútua. Desse modo, situando a ciência como parte de uma ecologia mais ampla de saberes e realizando a tradução intercultural entre conceitos, esse novo modo de produzir conhecimento proporciona a abertura necessária para restabelecer o equilíbrio entre as ciências da natureza e as antropossociais. Um conhecimento que se traduz na formação integral na medida em que reúne, num novo paradigma, ciência e valores, informação e formação, epistéme e antropo.

1.3.3. Aprender a viver no mundo da diversidade moral

Instaurar uma prática educacional que desenvolva integralmente o indivíduo significa, também, contribuir para que ele aprenda a viver num mundo plural, globalizado e de várias culturas. Aprender a viver significa, para Maria Puig (2007), prepará-lo para que aprenda a ser, a conviver, a participar e a habitar neste mundo caracterizado pela diversidade moral. Desse modo, a educação que forma para a integralidade humana preocupa-se com o aprendizado para a vida na relação que a pessoa mantém com o mundo. De acordo com Martín García (2010), ajudar os indivíduos a aprender a viver é o principal objetivo da educação em valores. O foco é contribuir para que os indivíduos aprendam a escolher como querem viver, portanto, a adotarem um modo de vida sustentável. Refere-se, dessa maneira, ao fazer humano na relação inteligente estabelecida pelos indivíduos entre si, aqui e agora, projetando o futuro. Nesta perspectiva, ensinar a viver não se restringe a informar ou a passar conhecimentos; não significa transmitir saberes, mas um saber fazer, pois o que se exige, para saber viver, são habilidades, capacidades ou virtudes. Para Cortella (2009), falta à escola se preocupar com o fato de que os indivíduos, no mundo atual, vivem a ansiedade de viver o tempo presente, o carpe diem, sem elaboração de um projeto de vida para o futuro. Especialmente entre os jovens, a noção de aproveite o dia se baseia numa lógica que leva parte da juventude a um nível de exaustão do dia e da vitalidade, prejudicial à moral. Desse modo, no campo da educação em valores, o que é proposto é uma espécie de contração do presente e expansão do futuro.

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(...) carpe diem é, talvez, a mais negativa forma de estruturação de valores que se possa ter hoje, especialmente em relação aos jovens. Por quê? Antes de mais nada, porque estamos dizendo aos jovens que não haverá futuro. Estamos dizendo que não haverá trabalho, meio ambiente nem segurança. A mensagem que estamos transmitindo a eles é: ‘Vocês não têm passado porque não tiveram infância (...)’. Em resumo estamos dizendo que eles não têm história. E quem não tem história não tem projeto de vida (CORTELLA; DE LA TAILLE, 2009, p. 44).

Estas explicações encontram-se representadas pela Figura 2, a seguir, em que a educação em valores é evidenciada como alternativa de superação do carpe diem:

Situação atual

Situação proposta

Carpe diem Presente expandido

Educação em valores

Futuro contraído

Presente contraído

Futuro expandido

Figura 2 – Carpe diem e educação em valores. Fonte: o autor, conforme Cortella e De La Taille (2009).

Segundo Maria Puig (2007), a educação em valores pressupõe a existência, entre os indivíduos, de um núcleo comum constituído por duas vertentes complementares: as pessoas compartilham a necessidade de pertencerem a uma maneira particular de entender o mundo; as pessoas estão abertas à criação de laços comuns entre elas. Para o autor, as vias educativas que permitem manifestar os valores capazes de expressar essas vertentes são: interpessoal, curricular e institucional. A via interpessoal, focalizada nas relações que se estabelecem entre professor e alunos, motiva intensamente a formação do modo de ser do educando; a via curricular, centralizada na formação de instrumentos cognitivos, permite ao aluno estabelecer pontos de vista pessoais diante de situações controvertidas; a via institucional, situada na cultura moral escolar, incide sobre o comportamento do educando dando forma a seus hábitos e virtudes.

1.3.4. Ser e fazer moral: equilíbrio entre razão e emoção

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A construção do ser e do fazer moral exige de cada indivíduo o uso da dimensão emocional tanto ou mais do que a racional. Razão e emoção fazem parte da tessitura complexa composta por elementos internos e externos, atuantes sobre o indivíduo, que origina o agir moral (BEUST, 2000). Desse modo, uma educação em valores desenvolve plenamente as pessoas quando possui uma metodologia que considera o equilíbrio entre essas duas dimensões. Neste sentido, favorece o desenvolvimento pleno a metodologia conhecida pelo neologismo sentipensar, que significa para Moraes (2008) um processo que, simultaneamente, ativa o sentimento e o pensamento, a emoção e a razão, evidenciando o quanto o cognitivo é perpassado pelo emocional, pelos sentimentos e pelas crenças. Essa metodologia, segundo Moraes e Torre (2004), manifesta uma experiência traduzida na interligação entre o sentir e o pensar, entre o que acontece nas profundezas do ser humano e o que se encontra em seu entorno. Religa, portanto, os sentimentos, os pensamentos e as ações durante o processo de conhecimento (MORAES, 2008). Do ponto de vista da neurobiologia, Damásio (1996) explica que parece haver um elo, em termos anatômicos e funcionais, entre os sentimentos e a razão e entre estes e o corpo. Um elo que interfere na tomada de decisões. Certos aspectos relacionados à emoção e ao sentimento seriam imprescindíveis para que a racionalidade encaminhe o indivíduo para a direção adequada na tomada de decisões e para o bom uso dos instrumentos da lógica. De acordo com esta hipótese, emoção e sentimento, em conjunto com o aparelho fisiológico, ajudam os indivíduos na tarefa de vislumbrar o futuro, que não é certo, e de planejar as ações que vêm em seguida. A formação do indivíduo, pensada nessas bases, pressupõe o ato de educar na perspectiva da complexidade e da interdisciplinaridade: Educar é enriquecer a capacidade de ação e reflexão daquele que aprende, seja individualmente, seja em parceria com outros seres. É a integração entre o sentir, o pensar e o agir; é acima de tudo a integração entre razão e emoção; é o resgate dos sentimentos visando à restauração da incerteza humana e paradoxalmente da multidimensionalidade do ser (GOMES, C. et al., 2008, p. 45).

Pressupõe, assim, e ainda segundo Moraes e Torre (2004), que o educador ajude o indivíduo a localizar o seu centro, a descobrir a virtude; que faça justiça ao todo que cada um é; que conspire a favor da plenitude humana, possibilitando que

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cada um cumpra a finalidade de sua existência. Esta educação pressupõe, conforme Moraes (2008), que o educador contribua para mostrar o quanto os seres humanos são interdependentes. Quem a si propõe esta tarefa não apenas é competente na técnica, mas, sobretudo, é ético, tem valores humanizantes, permitindo compreender a realidade simultaneamente solidária, conflituosa, determinada, indeterminada, linear e não-linear.

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CAPÍTULO II – A PESQUISA E SEUS COMPONENTES

Neste capítulo, que é composto por três títulos, são apresentadas a formulação e a delimitação do problema de pesquisa, o objetivo geral, os objetivos específicos e o referencial teórico-metodológico no qual o trabalho se baseou.

2.1.

FORMULAÇÃO E DELIMITAÇÃO DO PROBLEMA DE PESQUISA

No mundo atual, caracterizado por aceleradas mudanças e transformações, a tensão entre o espiritual e o material tem suscitado reflexões sobre a importância dos valores na sociedade (DELORS at al., 1996). Com os avanços científicos e tecnológicos decorrentes da priorização da ciência, a pessoa humana tem sido relegada para o segundo plano, desencadeando problemas sociais gravíssimos (CÂMARA, 2001). Problemas como a violência, o desrespeito a direitos humanos básicos, as questões de gênero, a xenofobia e tantos outros têm suas raízes nessa priorização. Este cenário faz emergir discussões sobre o desenvolvimento humano, no qual os valores, tanto quanto os aspectos científicos e tecnológicos, devem ser considerados. Este é o grande desafio de um processo educacional que vislumbra uma formação integral do ser humano envolvendo não somente o conhecimento, mas também e, acima de tudo, as questões axiológicas. Assim sendo, torna-se imprescindível à educação buscar estabelecer uma nova ordem na qual estas duas vertentes não sejam olhadas dicotomicamente, mas, sobretudo, seja reconhecida a necessidade de que as ciências do homem e as da natureza voltem a se encontrar, para que o saber encontre de novo uma inspiração profundamente unitária (SS. PAPA JOÃO PAULO II, 2000). Com base nestas considerações, a presente pesquisa buscou identificar a realidade educacional de forma mais ampla e integradora, na qual se desenvolva uma prática didático-pedagógica capaz de contribuir para a articulação entre a dimensão informativa e a formativa da educação. Uma educação que, além de instruir, forme; mais do que preparar indivíduos para ingressarem no mercado de trabalho, abra perspectivas de vida; mais do que transmitir conteúdos e teorias, proporcione autonomia. A relevância dessas asserções permite suscitar a seguinte indagação: de que maneira a articulação entre as dimensões informativa e formativa

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da educação está sendo desenvolvida na dinâmica curricular do processo educacional?

2.2.

OBJETIVOS

2.2.1. Geral

Averiguar a articulação entre a informação e a formação para o desenvolvimento integral do ser humano.

2.2.2. Específicos

a) Identificar, em documentos dos cursos participantes da pesquisa, a presença das dimensões informativa e formativa do processo educacional; b) Identificar as percepções do professor quanto à articulação entre as dimensões informativa e formativa do processo educacional; c) Identificar nas práticas pedagógicas, desenvolvidas na sala de aula, a articulação entre as dimensões informativa e formativa.

2.3.

REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO Neste título são apresentadas a definição e a descrição do tipo de pesquisa,

as técnicas utilizadas, o campo de pesquisa, os participantes e as considerações sobre a análise de conteúdo, bem como a relação desta com a análise documental e a técnica da observação.

2.3.1. Definição e descrição do tipo de pesquisa

Este trabalho se caracteriza como de natureza qualitativa e exploratória. A pesquisa qualitativa, de acordo com Denzin e Lincoln (2000), perpassa disciplinas, estudos e problemas subjetivos. É complexa e cercada por termos, conceitos e suposições, incluindo tradições associadas a várias perspectivas de interpretação. Seu insumo advém de experiências pessoais, histórias de vida e artefatos componentes da cultura envolvida, possibilitando interpretar e descrever o cotidiano

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dos participantes a partir de significações originárias desse conjunto de elementos. Desse modo, a pesquisa qualitativa trabalha com significados, motivações e aspirações, crenças envolvidas, valores e atitudes que permeiam esse cotidiano (MINAYO, 2009). Numa pesquisa qualitativa de caráter exploratório, busca-se a familiarização com o problema a ser estudado, tentando sua maior explicitação, aprimorando ideais, descobrindo intuições e construindo hipóteses (GIL, 2002). Ao orientar-se pelo paradigma qualitativo, o pesquisador se situa ao longo da investigação como um observador da situação-problema em seu contexto natural, fazendo interpretações complementares a partir de saberes, práticas e atitudes dos participantes. Para isso, podem ser utilizadas diversas representações, incluindo notas de campo, entrevistas, conversações, fotografias e gravações. Dessa forma, a pesquisa se constitui numa interpretação que faz emergir o objeto estudado em seu espaço natural, sem que o mesmo sofra alterações por parte do pesquisador, portanto, sem que as variáveis sejam controladas por ele. Com essas características, a pesquisa qualitativa e exploratória se torna favorável como método de aproximação do fenômeno da educação, uma vez que este, fundamentalmente, busca conhecer o mundo e os seres humanos em suas relações. O paradigma qualitativo e a educação se aproximam porque neles predominam a complexidade das relações entre os indivíduos e a diversidade de insumos, num movimento interpretativo conduzido pelo pesquisador. O caráter exploratório da investigação, por sua vez, permite formular questões envolvendo a educação, desenvolver hipóteses, familiarizar com o ambiente educacional explorado e clarificar conceitos (MARCONI; LAKATOS, 2010). Como quaisquer outros tipos de investigação, a pesquisa qualitativa exige o research design, um delineamento, um plano capaz de proporcionar a identificação de nexos entre as questões propostas e os dados coletados. Configura, desse modo, a estrutura do trabalho, permitindo obter respostas a perguntas a que se propôs elucidar (KERLINGER, 2003). Para ser um bom plano de pesquisa, o delineamento deve explicitar e integrar procedimentos para: selecionar certa amostra de dados a serem analisados; categorizar os conteúdos e as unidades de registro enquadradas nas categorias; comparar as categorias e as classes de inferência extraídas dos dados (FRANCO, 2007). Optou-se pelo estudo de campo, o qual permite aprofundar questões e

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ressaltar a interação entre os participantes. Segundo Minayo (2009), campo é o recorte espacial situado na correspondência entre o limite teórico e o objeto a ser investigado. Este recorte constituiu-se de um grupo de professores, com os quais o pesquisador já mantém contato profissional, a partir do que foi possível estabelecer uma experiência mais direta no desenvolvimento dos trabalhos.

2.3.2. Técnicas utilizadas na pesquisa

2.3.2.1. Análise documental A análise documental se caracteriza pela busca de informações em documentação selecionada, com vistas a atender a objetivos predeterminados, formatando-as convenientemente para representá-las de modo diferente do que foi encontrado (BARDIN, 2009). Como vantagens de sua utilização, Gil (2002) enumera a riqueza de detalhes e a estabilidade de dados; o baixo custo, uma vez que depende basicamente de um debruçar-se sobre o material selecionado; a não exigência de contato com os participantes. Como desvantagens, a pesquisa documental pode ter pouca representatividade e tender à subjetividade. Os documentos analisados foram os Projetos Pedagógicos do Curso de Pedagogia e do curso de Administração (PPC) e os Planos de Ensino das disciplinas selecionadas (PE). A objetividade que caracteriza o procedimento contribuiu para identificar a presença de princípios que evidenciam a articulação entre informação e formação no processo educacional desenvolvido nas disciplinas pesquisadas.

2.3.2.2. Entrevista semiestruturada

A entrevista semiestruturada pressupõe que o processo de pesquisa seja uma construção contínua de textos capazes de mostrar e de criar significados enquanto a técnica é desenvolvida. Szymanski et al. (2004) lembram que os responsáveis por esse fazer construtivo são o pesquisador e os participantes, que criam conhecimentos organizados com foco nos objetivos propostos na medida em que interagem.

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Marconi e Lakatos (2010) enumeram uma série de vantagens no uso da entrevista como técnica de coleta de dados, dentre elas, a obtenção de dados que não se encontram em fontes documentais e a flexibilidade ao entrevistador para refazer perguntas feitas ao participante. Dentre as desvantagens, os autores citam o risco de indisposição do entrevistado em fornecer informações, o pequeno grau de controle sobre determinada situação durante a coleta de dados, a ocupação de muito tempo e a dificuldade para ser realizada. Cada participante foi entrevistado uma vez, em média durante 40 minutos, e as entrevistas foram gravadas e posteriormente transcritas. Utilizou-se um roteiro, constituído de duas partes: a primeira contendo a caracterização dos participantes e a segunda os aspectos conceituais relacionados aos objetivos da pesquisa. O mesmo foi submetido a um pré-teste, buscando aperfeiçoá-lo (ver Apêndice A).

2.3.2.3. Observação A literatura considera a observação como uma técnica valiosa, especialmente na coleta de dados não verbais. Um processo empírico em que o observador pode utilizar os sentidos para captar fatos, sendo viável a sua aplicação em conjunto com outras técnicas (VIANNA, 2007). Fica claro que seu ponto forte é a evidenciação do realismo da situação observada. Com ela, ultrapassa-se o mero ver e ouvir (MARCONI; LAKATOS, 2010). O pesquisador depende menos da introspecção ou da reflexão, podendo também obter dados que não constavam no roteiro de entrevistas ou questionários. Como desvantagens, o que é observado tende a criar impressões favoráveis ou desfavoráveis no observador e o pesquisador pode não acessar aspectos da vida cotidiana. Foram observadas duas aulas por disciplina, com duração de 50 minutos cada uma, totalizando 13 horas e 20 minutos de observação (ver Apêndice D). Para tanto, foi utilizado um roteiro constituído de duas partes: a primeira referiu-se à caracterização dos participantes e a segunda constou de aspectos conceituais relacionados aos objetivos propostos. O mesmo foi submetido a um pré-teste, buscando aperfeiçoá-lo (ver Apêndice B).

57

2.3.3. Campo de pesquisa e participantes

A pesquisa desenvolveu-se numa universidade da rede particular de ensino, estando localizada em Brasília, Distrito Federal, onde o pesquisador ministra aulas nos cursos de Pedagogia; Propaganda e Marketing; Administração; Ciências Contábeis, Ciências Sociais e Arquitetura e Urbanismo, nas disciplinas: Currículos e Programas;

Didática:

Metodologia

do

Novas

Trabalho

Mediações;

Acadêmico;

Filosofia,

Homem

e

Comunicação Sociedade;

e

e

Ética;

Filosofia,

Comunicação e Ética. Participaram da pesquisa oito professores, sendo quatro do curso de Pedagogia e quatro do curso de Administração (ver Apêndice C). Estes cursos foram selecionados porque, respectivamente, são emblemáticos quanto ao papel sociocultural da educação de formar para a cidadania e formar para o trabalho. A escolha dos professores, por sua vez, ocorreu em função das disciplinas selecionadas. De Pedagogia foram selecionadas quatro disciplinas: Didática para o ensino à distância; Reflexões filosóficas, ética, comunicação e marketing; Prática de gestão em escolas e empresas; Metodologia do ensino da educação básica. De Administração foram priorizadas as disciplinas: Jogos de empresas; Direito nas organizações; Administração de suprimentos e logística; Administração financeira. As disciplinas foram escolhidas em função da pertinência de seus conteúdos curriculares com os objetivos da pesquisa, envolvendo, dentre outras, questões relativas a procedimentos pedagógicos diante do uso de novas tecnologias; reflexões filosóficas sobre o ser humano; práticas de um gestor de empresas e de escolas enquanto elementos ativos na formação de indivíduos (ver Anexos A e B). Desse modo, as disciplinas oferecem oportunidades de focalizar o desenvolvimento do aluno – razão, emoção, valores, ação consciente. As aulas observadas foram ministradas pelos professores participantes, o que ofereceu a oportunidade de comparar os discursos com as práticas. Como numa pesquisa qualitativa o universo analisado não se constitui dos sujeitos em si, mas de representações, conhecimentos, práticas, comportamentos e atitudes (DESLANDES, 2009), a quantidade de disciplinas e participantes estabelecida foi suficiente para a obtenção de informações para a análise e a construção de resultados.

58

2.3.4. Análise de conteúdo A análise e interpretação de dados numa pesquisa qualitativa, conforme explica Gomes, R., (2009), tem como foco a exploração de opiniões e representações sociais relativas ao fenômeno investigado consideradas em seu conjunto. Para o autor, não é necessário que falas e expressões dos participantes sejam analisadas e interpretadas em sua totalidade. O importante é ir além do que foi descrito, decompondo e relacionando, o que resulta em interpretações. É o momento em que se chega ao sentido das falas e das ações, alcançando uma compreensão que ultrapassa a mera descrição e análise. Utilizou-se a análise de conteúdo nesta pesquisa qualitativa e exploratória, delineada como estudo de campo, porque se buscou desenvolver ideias sobre determinado tema – o desenvolvimento humano, estudado da perspectiva da articulação entre informar e formar. Segundo Marconi e Lakatos (2010), essa modalidade de análise se constitui em recurso do qual a investigação exploratória se vale quando o objetivo é desenvolver ideias, extraindo generalizações que levam à montagem de categorias conceituais passíveis de utilização em estudos posteriores. A análise de conteúdo, de acordo com Bardin (2009), se aplica a discursos diversificados, sendo um conjunto de técnicas de análise das comunicações que diferem nos procedimentos, dependendo dos objetivos a serem alcançados. Enquanto em pesquisas quantitativas, o que serve de informação é a frequência com que aparecem as características do material analisado, na pesquisa qualitativa importa mais a presença ou ausência de uma característica, ou de um conjunto delas, identificadas em determinado trecho da mensagem. Noutras palavras, embora a análise de conteúdo possa focalizar frequências, em princípio ela remete o olhar do pesquisador para o que está presente ou ausente (BAUER; GASKELL, 2008). Finalmente, enquanto os números possibilitam apanhar parcialmente a significação do conteúdo, por intermédio de frequências e outros índices, a abordagem mais qualitativa conserva a forma literal dos dados (LAVILLE; DIONNE, 1999). Baseando-se no desmonte da estrutura e dos elementos do conteúdo, esse tipo de análise esclarece diferentes características ao extrair significações (LAVILLE; DIONNE, 1999). Por intermédio de procedimentos sistemáticos e

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descrição do conteúdo das mensagens, obtêm-se indicadores quantitativos, ou não, que possibilitam a inferência de conhecimentos (BARDIN, 2009). Diante do fato de que qualquer comunicação parece ser suscetível de análise, Bardin (2009) elaborou um quadro demonstrativo dos domínios de aplicação potencial das técnicas da análise de conteúdo (ver Quadro 1). Uma aplicação que inclui documentos, transcrições de entrevistas e protocolos de observação. Quantidade de pessoas envolvidas na comunicação Código e suporte

Monólogo

Comunicação de massa

Diálogo

Grupo restrito

Cartas, respostas a questionários [...]

Ordens de serviço numa empresa, todas as comunicações escritas trocadas dentro de um grupo. Discussões, entrevistas [...]

Jornais, [...]

LINGUÍSTICO Escrito:

Oral:

ICÔNICO OUTROS CÓDIGOS SEMIÓTICOS (i.e., tudo o que não sendo linguístico pode ser portador de significações; ex.: música, código olfativo, objectos diversos, comportamentos, espaço, tempo, sinais patológicos, etc.).

Agendas [...]

Delírio do mental [...]

livros

doente

Entrevistas e conversas de qualquer espécie.

Exposições, discursos [...]

Garatujas [...], grafitos, sonhos.

Respostas aos testes projetivos [...]

[...] símbolos icônicos numa sociedade secreta.

Sinais de transito, cinema [...]

Manifestações histéricas da doença mental [...]

Comunicação não verbal com destino a outrem (posturas, gestos, distância espacial, sinais olfactivos, manifestações emocionais, objectos quotidianos, vestuário, alojamento...), comportamentos diversos, tais como rituais e regras de cortesia.

[...] sinalização urbana, monumentos, arte [...]

Quadro 1 – Domínios de aplicação da análise de conteúdo. Fonte: Bardin (2009, p. 36). Obs.: os grifos são do autor da pesquisa.

De acordo com Bauer e Gaskell (2008), embora a análise de conteúdo trabalhe tradicionalmente com material escrito, outras fontes podem ser analisadas. Segundo os autores, tanto textos tais como memorandos de corporações, como os construídos no processo de pesquisa, a exemplo de entrevistas e protocolos de observação, podem ser manipulados. A análise de conteúdo se desenvolve, conforme Bardin (2009), a partir de três polos cronológicos: a pré-análise, momento em que é feita uma leitura flutuante de textos, a qual é seguida pela escolha de documentos, formulação das hipóteses (se

60

houver), objetivos e elaboração de indicadores (quando houver hipótese) e preparação do material; a exploração do material, quando é feita a codificação e decomposição, ou enumeração; o tratamento dos resultados, inferência e interpretação. Na exploração do material, optou-se nesta pesquisa pelo recorte em temas, que são elementos a fazer parte de um conjunto previamente constituído pela diferenciação e, momento contínuo, reagrupados de acordo com o gênero e os critérios já definidos. Estando reunidos, os temas são as unidades de registro que compõem as categorias. Portanto, estas são classes que agrupam itens com características comuns sob um título genérico (BARDIN, 2009). Para Bardin (2009), a escolha do tema como unidade de registro corresponde a uma regra de recorte do sentido (e não da forma) que não se encontra pronta, pois o recorte depende do nível de análise e não de manifestações formais. Segundo Laville e Dionne (1999), o recorte do conteúdo em temas é rico, mas torna a análise mais delicada. Na prática, o conteúdo é recortado em fragmentos que correspondem a ideias particulares, podendo ser um conceito ou a relação entre conceitos. Bauer e Gaskell (2008), por sua vez, explicam que as unidades temáticas, ou semânticas, são definidas como características textuais que implicam um juízo humano e que consideram certos fundamentos teóricos, possibilitando a estratificação. Ao tratar os resultados, utilizaram-se quadros de resultados e figuras, pondo em relevo e descrevendo informações decorrentes da análise temática. Buscou-se seguir, com rigor, as orientações de Bardin (2009) com relação à trajetória do processo de análise de conteúdo, representada pela Figura 3, a seguir:

Descrição

Inferência

Interpretação

Figura 3 – Da descrição à interpretação. Fonte: Bardin, 2009, p. 41.

A inferência, a qual consiste em obter uma conclusão a partir de provas, em alcançar certas crenças e opiniões a partir de outras (SALMON, 1993), constitui a intenção da análise de conteúdo. Ela é, conforme Bardin (2009), uma interpretação controlada. Assim, inferir é deduzir de maneira lógica. Neste processo, o analista

61

age como um arqueólogo, valendo-se de vestígios. Portanto, busca provas. Considerando que numa inferência a pessoa que inferiu é quem deve ter a prova (SALMON, 1993), o analista do conteúdo é o sujeito que, detendo informações por ele desveladas, chega às conclusões de inferências. Ao inferir, um analista busca o entendimento dos sentidos implícitos na comunicação, assumindo o papel de um receptor normal. No entanto e, principalmente, altera o seu olhar, buscando significações, outras mensagens, alcançadas por intermédio ou paralelo à mensagem inicial (BARDIN, 2009). Desse modo, trata-se de ler as mensagens não se restringindo à letra, mas ampliando a leitura na busca de sentidos localizados num segundo plano, até se obter as variáveis inferidas. A Figura 4 demonstra dois tipos de leitura possíveis: (Se)

(So)

(Se)

(So)

Leitura normal

Figura 4 – Tipos de leitura. Fonte: Bardin, 2009, p. 43.

Variáveis inferidas Análise de conteúdo

Como se observa, cabe ao analista passar pelo que foi dito e chegar ao não dito. Chegar a novos sentidos, a significações segundas a partir das primeiras. Deve fazê-lo por intermédio desta espécie de interpretação controlada que, na análise de conteúdo, é a inferência (BARDIN, 2009).

2.3.5. Análise de conteúdo e análise documental

Em virtude da utilização simultânea de técnicas de análise de conteúdo e técnicas documentais nesta pesquisa, torna-se oportuno demonstrar semelhanças e diferenças entre as duas. Anteriormente foi dito que, para Bardin (2009), a análise de conteúdo pode se utilizar de documentos, transcrições de entrevistas e protocolos de observação. Segundo a autora, o código linguístico oral, quando analisado da perspectiva de um grupo restrito, abrange todas as comunicações escritas trocadas por seus membros. Por ilação, os documentos institucionais de uma universidade, como, por exemplo, os PPC’s e os PE’s, podem sofrer a aplicação da análise de conteúdos.

62

A análise documental se identifica com a análise de conteúdo se desta for suprimida a sua função de inferência, reduzindo-a a análise categorial ou temática. Além

disso,

elas

se

assemelham

porque

ambas

seguem

os

seguintes

procedimentos: recorte da informação, categorização com o emprego da analogia e utilização de índices na representação (BARDIN, 2009). Em seus estudos sobre análise documental, Bardin (2009) a define como um conjunto de operações que buscam representar o conteúdo de um documento, dando forma diferente da original para facilitar a sua consulta e a referenciação. Com isto, passa-se de uma fonte primária para uma fonte secundária. A síntese destas explicações se encontra no Quadro 2, a seguir:

Análise documental

Análise de conteúdo

Semelhanças Ambas se desenvolvem a partir dos seguintes procedimentos: leitura flutuante de textos, escolha de documentos, preparação do material, referenciação dos índices/elaboração de indicadores, recorte do conteúdo, categorização e tratamento dos resultados.

Trabalha com documentos.

Realiza-se, principalmente, por classificação-indexação. Busca representar informações, de maneira condensada, para consulta e armazenamento.

Diferenças Trabalha com mensagens (comunicação). Por isto, dois tipos de documentos podem ser submetidos à análise de conteúdo, conforme Bardin (2009): documentos naturais, ou seja, tudo o que é comunicação produzida espontaneamente; documentos suscitados pela necessidade de estudo, como as respostas a questionários, inquéritos, testes, experiências etc. Utiliza-se de inúmeras técnicas. A análise categorial temática é uma das técnicas da análise de conteúdo. Busca manipular mensagens (o conteúdo e sua expressão) para evidenciar indicadores que permitam inferir sobre uma realidade diferente da mensagem analisada.

Quadro 2 – Análise documental e análise de conteúdo: semelhanças e diferenças. Fonte: Bardin (2009, p. 41, 47-48).

2.3.6. Análise de conteúdo e observação em pesquisa qualitativa

Em virtude da simultânea utilização de técnicas de análise de conteúdo e de observação nesta pesquisa, torna-se oportuno esclarecer de que modo os dois conjuntos de procedimentos se relacionam em trabalhos científicos. Além disso, como explicam Lavillle e Dionne (1999), persiste muita confusão em torno da ideia de análise de conteúdo, com alguns estudiosos vinculando-a estreitamente a

63

pesquisas com base documental. Para os autores, não se deve restringir o termo conteúdo somente ao material apresentado em documentos escritos. Como foi dito anteriormente, para Bardin (2009), bem como para Bauer e Gaskell (2008), a análise de conteúdo abrange documentos, transcrições de entrevistas e protocolos de observação. Segundo Bardin (2009), códigos semióticos diferentes do escrito, oral e icônico, como os comportamentos, podem se constituir em domínios de sua aplicação. Por ser uma técnica de coleta de dados que ultrapassa o mero ver e ouvir ao examinar fatos ou fenômenos (MARCONI; LAKATOS, 2010), a observação trabalha com os mesmos códigos semióticos da análise de conteúdo: posturas, gestos, distância espacial, manifestações emocionais e ritos de cortesia. Como foi dito anteriormente, estes elementos não verbais da comunicação ocorrida nas relações duais, ou em grupos restritos, podem ser observados e analisados segundo procedimentos da análise de conteúdo. Nesta pesquisa, os códigos coletados na observação foram submetidos a uma variante da técnica análise de avaliação (ver Título 3.2.) que, originalmente, visa a medir as atitudes do locutor quanto aos objetos de sua fala, sendo adaptável aos fins da pesquisa. Optou-se por esta maneira de analisar porque, embora ela se pareça com a análise de conteúdo temática, o procedimento não se atém à presença ou ausência de determinados temas, mas à carga avaliativa das unidades de significação que são consideradas, verificando-se a direção e a intensidade das opiniões (BARDIN, 2009).

64

CAPÍTULO III – ANÁLISE E DISCUSSÃO DO CORPUS DA PESQUISA

Em três títulos, este capítulo apresenta análises e discussões a partir dos dados coletados em documentos, entrevistas e observações. Bauer e Gaskell (2008) explicam que, embora o sentido de corpus implique a coleção completa de textos, de acordo com algum tema comum, recentemente foram incluídos quaisquer materiais com funções simbólicas. Como explicado anteriormente, a análise documental se identifica com a análise de conteúdo até o momento em que esta não contempla as inferências. Neste trabalho, a primeira teve como suporte os PPC’s de Pedagogia e de Administração e os PE’s das disciplinas pesquisadas; a segunda, as transcrições das falas gravadas e os protocolos de observação coletados de acordo com os roteiros previamente elaborados e aplicados aos participantes durante as entrevistas e observações. Na descrição dos resultados optou-se por organizar as informações em três partes: que é proposto, relativo às pretensões, aos enunciados e às opiniões sobre os aspectos informativos e formativos do processo educacional no discurso institucional (PPC’s e PE’s) e na fala dos participantes (entrevistas); que é praticado, que se refere à ação dos participantes na sala de aula durante as observações; que pode ser dito pelo não dito, momento em que são feitas inferências e interpretações, tendo como pano de fundo as teorizações de Brunsson (2007) sobre as relações entre o que é decidido e o que é adotado numa organização (ver Figura 5). Essa maneira de organizar as informações está coerente com a análise de conteúdo. Para Bardin (2009, p. 44), ao realizar seu trabalho, o analista possui, ou inventa, um jogo de operações analíticas adaptável à natureza do material e ao problema ao qual busca dar uma solução. Segundo a autora, o pesquisador “pode utilizar uma ou várias operações, em complementaridade, de modo a enriquecer os resultados, ou aumentar a sua validade, aspirando assim a uma interpretação final fundamentada”. O importante, de acordo com Bardin (2009), é o analista fundamentar impressões e juízos intuitivos utilizando operações que conduzam a resultados de confiança. Assim, a maneira como estão apresentadas a análise e a discussão do corpus desta pesquisa buscou dar maior confiabilidade ao trabalho e enriquecer as análises.

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Momentos da análise Descrição Códigos

Que é proposto

Que é praticado

Escrito

PPC’s e PE’s

Anotações no quadro-negro, resumos etc.

Oral

Entrevistas

Falas

Outros códigos semióticos

Procedimentos

Inferência Que pode ser dito pelo não dito

Descrição dos resultados com foco na significação

Gestos

Análise temática

Análise de avaliação (variante)

Figura 5 – Composição da análise do corpus da pesquisa. Fonte: o próprio autor, a partir dos dados coletados.

3.1. O QUE É PROPOSTO

3.1.1. Discurso institucional A análise documental foi realizada visando a alcançar o primeiro objetivo específico deste trabalho, que é identificar, em documentos dos cursos participantes da pesquisa, a presença das dimensões informativa e formativa do processo educacional. Definiu-se como unidade de codificação a análise categorial a qual considera a totalidade de um texto, classificando-o segundo a presença ou ausência de itens de sentido, constituindo os temas. O tema é a unidade de significação que se liberta naturalmente do texto sob análise, um deslocamento que ocorre a partir de critérios relacionados à teoria que guia a leitura (BARDIN, 2009). Buscou-se identificar nos documentos a presença desses itens, relacionados à informação e à formação no processo educacional, compondo duas categorias (ver Quadros 3 e 4).

66

Temas Autonomia intelectual, visando à resolução de problemas; formação para a vida profissional e produção de conhecimentos; competências e habilidades voltadas para exercer o papel do profissional pedagogo. Domínio de conteúdos em áreas de conhecimento da atividade profissional.

Curso/Disciplina Ped./Não identificada.

Apropriação de linguagens tecnológicas em educação.

Ped./ Didática para o ensino a distancia; Reflexões filosóficas, ética, comunicação e marketing.

Integração entre teoria e prática, por diversos meios.

Adm./Não identificada.

Ped./Todas as disciplinas. Adm./Não identificada.

Capacidade de análise dos desafios do professor Ped./Todas as disciplinas. contemporâneo, que lida com novas tecnologias de comunicação e informação. Competências e habilidades do pedagogo enquanto gestor. Quadro 3 – Discurso institucional: categoria informação e respectivos temas. Legenda: Ped – Pedagogia; Adm – Administração. Fontes: PPC”s e PE’s.

Temas Visão macro do processo educacional, formação interdisciplinar, envolvendo as dimensões técnica, humana e político-social; profissionalização e desenvolvimento do aluno mais consciente, crítico, com ampla visão da realidade do pedagogo; competências e habilidades voltadas para aprender a viver (ser, conviver, participar num mundo diversificado, problematizar). Visão ampla do mundo contemporâneo e capacitação para ser administrador; capacidade de observação e análise de mundo; sentido da ação profissional.

Curso/Disciplina Ped./Não identificada.

Metodologias que levem o aluno a problematizar a realidade e a integrar os diversos saberes.

Ped./ Didática para o ensino a distância

Competências e habilidades voltadas para senso crítico e capacidade de contextualização. Competências e habilidades voltadas para o pensamento estratégico.

Competências e habilidades com preocupação em aspectos éticos e legais no exercício da profissão. Compromisso com a ética na atuação profissional.

Doc.

PPC

PE

Doc.

PPC Adm./Não identificada.

PE

Adm./Não identificada. Adm./Todas as disciplinas. Adm./ Jogos de empresas; Administração de suprimentos e logística (pensamento sistêmico); Administração financeira. Adm./ Direito nas organizações. Ped./ Didática para o ensino a distancia; Reflexões filosóficas, ética, comunicação e marketing. Ped./ Prática de gestão em escolas e empresas. Ped./ Didática para o ensino a distância

Competências e habilidade para uma atuação adequada à dinâmica cultural da escola. A metáfora da cabeça bem feita como componente da didática do novo tempo. Quadro 4 – Discurso institucional: categoria formação e respectivos temas. Legenda: Ped – Pedagogia; Adm – Administração. Fontes: PPC’s e PE’s.

PPC

PE

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3.1.1.1. Projetos Pedagógicos de Curso

3.1.1.1.1. Curso de Pedagogia

Reconhecido pelo Decreto 77.546 em 05.05.1976, o curso rege-se pelo modo semestral e funciona nos turnos diurno e noturno. Sua duração é de 3.216 horas, sendo: 2.596 horas teóricas para 50 disciplinas; 400 para estágio supervisionado em 4 semestres; 220 para atividades culturais-acadêmico-científicas. O PPC tem como base legal a LDBEN 9.394/96; as Resoluções CNE/CP 01/2002, 02/2002 e 01/2006; os Decretos 5.296/2004 e 5.626/2005; a Lei 11.788/2008. Foi elaborado em 2009, organizando-se em: apresentação, contexto institucional e estruturação do curso. O

curso

busca

desenvolver

mecanismos

de

interdisciplinaridade

e

flexibilização do currículo a fim de permitir “o desenvolvimento da progressiva autonomia intelectual do aluno, condição necessária para que o egresso possa vir a superar os desafios de renovadas condições de exercício profissional e de produção do conhecimento” (PPC, p. 21). Observa-se que a filosofia que sustenta o curso se volta para a formação de autonomia intelectual visando a resolver problemas, priorizando a vida profissional e a aquisição de conhecimentos. Com o objetivo de proporcionar ao aluno uma visão macro do processo educacional, adquirindo uma formação interdisciplinar, o curso busca atingir:

a) A dimensão técnica, em que o processo de incorporação de conceitos, habilidades e atitudes possibilitem o ajustamento do educando ao mundo que o cerca; b) A dimensão humana, cujo foco de atenção é o educando, enquanto pessoa, com características físicas, emocionais e psicológicas únicas; c) A dimensão político-social, favorecendo o desenvolvimento do educando como cidadão consciente, atuante, solidário e construtor de uma nova sociedade.

Desse modo, o curso visa a cumprir o papel sociocultural da educação de formar para o trabalho e para valores. De um lado, a intenção é instrumentalizar o aluno para executar certas atividades, ao tempo em que o prepara para um quadro

68

de ocupações flexível, compatível com o mundo contemporâneo. De outro lado, busca desenvolver práticas formativas para que se manifestem valores importantes a ele e à sociedade. As três dimensões, acima enumeradas, contribuem com a função educacional de resgatar princípios e valores morais universais que fundamentam um processo educacional que liberta e forma o indivíduo e a sociedade a partir de premissas éticas (BEUST, 2000). Conforme consta no PPC: O curso (...) visa à preparação de profissionais para o exercício da docência, organização e gestão na Educação, estando aptos a conhecer, analisar, avaliar e atuar de forma consciente e crítica na prática escolar, levando em consideração os contextos sociais, culturais, históricos, econômicos, e geopolítico da sociedade em questão, bem como os valores da educação (p. 21).

Assim, o curso ultrapassa o objetivo de profissionalizar, criando condições para que o aluno seja mais consciente, mais crítico e tenha uma visão ampliada da realidade na qual irá atuar ao término da graduação. De certa maneira, esta preocupação institucional atende ao alerta de Machado (2004) sobre a carência existente nos cursos de graduação na preparação das pessoas com algo que ultrapasse o conteúdo, o que habilitaria para um melhor discernimento no desempenho de múltiplas funções. Em relação às competências e habilidades, identificaram-se, de um lado, expressões como: apropriar-se [...] conhecer e dominar os conteúdos [...] estabelecer metas que promovam [...] formar o docente para o Magistério [...] relevância nos conteúdos da Língua Portuguesa [...] capacidade de atuar nas funções de gestão e supervisão [...] valorizar conhecimentos (PPC, p. 32). Expressões estas que evidenciam um olhar voltado à preparação para o exercício de papéis na profissão de pedagogo, enfatizando a vertente informativa do processo educacional.

Por

outro

lado,

identificaram-se

passagens

como:

articular,

coletivamente [...] estabelecer relações de parceria [...] promover práticas educativas que desenvolvam integralmente a criança até seis anos, em seus aspectos físicos, psicossociais e cognitivo-linguístico [...] refletir para compreender (PPC, p. 32). Evidencia-se uma ênfase no aprender a viver, significando, nos termos de Maria Puig (2007), formar para aprender a ser, a conviver, a participar e a habitar num mundo diversificado moralmente. O texto enfatiza, também, a instauração de um processo educacional que valorize a formação para a integralidade humana,

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possibilitando aos alunos se problematizarem na relação com o mundo (FREIRE, 1987). As competências e habilidades das disciplinas pesquisadas encontram-se no Anexo C.

3.1.1.1.2. Curso de Administração

O curso é reconhecido pelo Ministério da Educação e do Desporto, conforme Portaria 875, de 18.03.1993, publicada no Diário Oficial da União em 21.06.1993. Funcionando nos turnos diurno e noturno, sua duração é de 3.020 horas, sendo: 2.400 horas para as 42 disciplinas obrigatórias; 20 para as 2 optativas; 300 destinadas a estágio supervisionado; 300 a atividades complementares. O PPC tem como base legal a LDBEN 9.394/96, o Decreto 5.773/2006 e a Resolução CNE/CES 02/2007. Foi elaborado em 2009 e se constitui das seguintes partes: introdução, contexto institucional, organização do curso, corpo docente e técnico administrativo e instalações. O curso tem como pressuposto epistemológico a associação entre as disciplinas, visando a colocar o aluno diante de sua realidade local, regional e nacional. Pretende que ele tenha a melhor compreensão dos fenômenos da administração (PPC, p. 8), possibilitando a formação econômica, política, cultural e social. Desse modo, a interdisciplinaridade é uma característica institucionalizada pelo curso, buscando preparar o aluno para conviver com os diversos matizes sociais e contribuir para desenvolver ampla visão de mundo e ser capaz de exercer o melhor possível a profissão de administrador. Por um lado, os mecanismos de interdisciplinaridade abrangem a dimensão informativa, pois no documento analisado consta que: A integração entre a teoria e a prática se dá por meio de diferentes meios, ao longo do curso, dentre os quais se destacam: os trabalhos interdisciplinares, extraclasse, relacionados ao Programa de Iniciação às Práticas Administrativas (PIPA), através dos quais os alunos são estimulados a verificar a aplicação prática dos conhecimentos adquiridos (PPC, p.11).

Por outro lado, a interdisciplinaridade proposta pelo curso abrange a dimensão formativa da educação na medida em que os mecanismos desenvolvidos possibilitariam aos alunos refletir sobre a realidade concreta das organizações. Em

70

termos freirianos, os alunos teriam a oportunidade de se perceberem como seres humanos capazes de intervir no mundo (FREIRE, 1987). Desse modo, além de colocar em prática conhecimentos adquiridos, o aluno se formaria para observar e analisar as diversas realidades. Segundo o documento, o egresso deve ser capaz de identificar e definir com clareza a missão das organizações em que for trabalhar, bem como os fatores e os meios necessários que possibilitem a ele desempenhar o melhor possível seus papéis, sob a ótica do desenvolvimento sustentado (PPC, p. 9). É possível perceber, neste discurso, um processo educacional que ultrapassa a mera informação. Percebe-se o fundamento antropológico de que o ser humano se constrói e se reconstrói conscientemente no trabalho coletivo. Segundo Vieira Pinto (1979), essa é uma condição primordial para que o indivíduo encontre sentido em sua ação. Quanto às competências e habilidades, foi identificado que: O desenvolvimento das competências-chave [..] dos egressos [...] se dá por meio de: aprendizado dos conhecimentos relativos aos conteúdos das disciplinas [...], por meio de: desenvolvimento pessoal derivado das estratégias de aulas (por exemplo: trabalho em equipe e comunicação e expressão); desenvolvimento pessoal derivado das estratégias de avaliação (por exemplo: orientação para resultados, solução de problemas e comunicação e expressão); crescimento pessoal do aluno pelo seu envolvimento em atividades complementares (PPC, p.11).

Essas metodologias visam a possibilitar a articulação entre conteúdo e desenvolvimento pessoal na medida em que favorece ao aluno problematizar as diversas realidades (FREIRE, 1987) e reorganizar princípios que facilitam a integração entre os diversos saberes (MORIN, 2008a). As competências e habilidades das disciplinas pesquisadas encontram-se no Anexo D. 3.1.1.2. Planos de Ensino O PE de cada disciplina é elaborado pela respectiva Coordenação Geral do 7

Curso , compondo-se de ementa; objetivo geral; objetivos específicos; conteúdo programático; estratégias de trabalho; avaliação; bibliografia. O documento é disponibilizado aos professores via internet na página eletrônica da universidade.

7

Este é um procedimento de toda a universidade. As Coordenações Gerais de Curso concentram-se na sede da instituição, localizada na capital de um estado da região sudeste do Brasil.

71

Com base nesse documento, o professor responsável pela disciplina elabora um Cronograma de Aulas, valendo-se de tabela composta por colunas contendo informações sobre a semana das aulas, dias e conteúdos. A tabela passa a fazer parte do PE, sendo uma cópia do conjunto entregue ao seu Coordenador Assistente de Curso8 e outra aos alunos, na primeira aula. 3.1.1.2. As disciplinas de Pedagogia

Segundo os objetivos gerais identificados nos PE’s das disciplinas pesquisadas (Didática para o ensino a distância; Reflexões filosóficas, ética, comunicação e marketing; Prática de gestão em escolas e empresas e Metodologia do ensino da educação básica), o aluno deverá ser capaz de:

a) Articular ensino e pesquisa na produção do conhecimento e na prática pedagógica; b) Ter compromisso com uma ética de atuação profissional e com a organização da vida em sociedade; c) Analisar os desafios da atuação do professor, frente às novas tecnologias de comunicação e informação; d) Identificar as possibilidades da Didática como mediadora de um processo de ensino interativo oferecido pela multimídia e hipermídia; e) Compreender

a

educação

como

processo

(econômico,

político,

sociocultural); f)

Apreender a dinâmica cultural e atuar adequadamente em relação ao conjunto de significados que a constituem com ênfase no contexto escolar;

g) Atuar, enquanto diretor de escola, como um administrador (gestor) comprometido com a melhoria do ensino e com a sociedade; h) Aplicar princípios da administração prática, na atuação como pedagogo, nas funções administrativas e pedagógicas no contexto do Sistema Escolar Brasileiro e no mundo corporativo; 8

Os Coordenadores Assistentes de Curso ficam lotados em 27 campi distribuídos em quatro Unidades Federativas, abrangendo três Regiões brasileiras.

72

i)

Dominar princípios teórico-metodológicos das áreas de conhecimento que se constituam objeto de sua prática pedagógica;

j)

Compreender o processo de construção de conhecimento no indivíduo inserido no seu contexto sociocultural;

k) Refletir sobre a formação do professor da Educação Básica e conhecer as metodologias aplicadas neste nível de ensino.

Com estes objetivos gerais, as disciplinas buscam preparar o aluno para atuar como um pedagogo consciente de seu papel, como professor e como gestor da área da educação, dominando os processos de construção de conhecimentos, simultaneamente, ao desenvolvimento como pessoa ética e capaz de contextualizar nas diversas situações profissionais. Ressalte-se que o aluno deve dominar princípios teórico-metodológicos e utilizar a multimídia e a hipermídia como recursos didáticos para estabelecer maior interação na sala de aula. De acordo com a disciplina Didática para o ensino a distância, o aluno deve ser capaz de verificar a inter-relação entre tecnologia e pedagogia; explorar recursos que possibilitem a alunos e professor interagirem com o conhecimento a partir de um processo dinâmico e cooperativo mediado pelas novas tecnologias; explorar as possibilidades de educação a distância através de pesquisa e construção de projetos. Com a disciplina Reflexões filosóficas, ética, comunicação e marketing o aluno passa a identificar a Filosofia como uma reflexão profunda, rigorosa e global sobre os problemas que o ser humano enfrenta na construção de sua existência; a refletir sobre a importância dos valores na práxis educativa e estabelecer relações entre ética, democracia e exercício da cidadania; a relacionar os principais problemas abordados pelo pensamento filosófico-educacional com o contexto atual, possibilitando o exercício do pensamento autônomo; a refletir, a partir da Filosofia e de seus instrumentos, para um pensar consequente, de maneira que possa organizar pensamentos e expressá-los com base em argumentos válidos. Ao cursar Prática de gestão em escolas e empresas, o aluno se compromete com a ideia de atuação profissional e com a organização democrática da vida no contexto da sociedade moderna; conhece a estrutura administrativa e didática da escola, bem como os procedimentos relativos à organização da vida escolar do aluno e relativos à organização da vida funcional; manipula documentos referentes à vida escolar e funcional, observando o preenchimento correto e a importância dos

73

mesmos na organização escolar; reconhece as diferentes áreas de atuação do pedagogo no contexto da atualidade; analisa o papel do pedagogo na formação de recursos humanos em ambientes corporativos; organiza um projeto de educação continuada em ambientes corporativos. Finalmente, com Metodologia do ensino da educação básica, o aluno se prepara quanto ao diagnóstico de componentes metodológicos da prática educativa nas escolas de Ensino Fundamental a partir do sexto ano e de Ensino Médio; conhece os principais artigos da LDBEN 9.394/96 relacionados com a formação do professor de Ensino Fundamental e Ensino Médio; conhece as duas possibilidades de formação do professor de Educação Básica, o Normal e a graduação em Pedagogia; identifica um estudo socializado, individualizado e socioindividualizado e algumas técnicas para desenvolvê-los. Com estes objetivos específicos, os documentos analisados explicitam um processo

educacional

que

valoriza

o

acúmulo

de

conhecimentos

e,

simultaneamente, considera a formação pessoal e social. Que leva em conta que o universo do trabalho se organiza em torno dos seguidores de rotina e analistas simbólicos (REICH, 1994), contrariando Machado (2004), para quem essa bifurcação ainda não é vista pela escola, havendo uma formação para ocupações bastante específicas. O processo educacional identificado nos PE’s prepara o aluno com algo que ultrapassa o conteúdo, desenvolvendo-o, ainda que de maneira geral, em áreas como a educação, a psicologia, a filosofia e a sociologia. Aponta no sentido de uma formação integral que leva em conta o papel sociocultural da educação de preparar para

o

trabalho

e

de

desenvolver

valores,

bem

como

a

prática

da

interdisciplinaridade. Em sintonia com Alarcão (2008), o processo educacional identificado nos PE’s se preocupa que o aluno tenha clareza da necessidade de reestruturação das relações mantidas por professores e alunos com o saber e com a sua utilização. Em consonância com Freire (1987), preocupa-se que o professor contribua para que os alunos problematizem sua relação com o mundo.

3.1.2.3. As disciplinas de Administração

74

A partir dos objetivos gerais descritos nos PE’s das disciplinas pesquisadas (Jogos de empresas; Direito nas organizações; Administração de suprimentos e logística e Administração financeira), o aluno deve:

a) Ter visão holística das organizações, bem como compreender a interdisciplinaridade que a gestão administrativa requer; b) Adquirir ou produzir conhecimentos para o desenvolvimento de: planejamento estratégico, senso crítico, contextualização, visão sistêmica, orientação para resultados, identificação e solução de problemas, empreendedorismo e trabalho em equipe; c) Ter visão jurídica global do Sistema Tributário Nacional, contribuindo para a formação como profissional e cidadão; d) Estar orientado para processos, necessidades dos clientes e resultados. Estes objetivos gerais evidenciam a preocupação em preparar o aluno para lidar com os processos internos de uma organização e, simultaneamente, a ler cenários, instrumentalizando-o para se desenvolver pessoal e profissionalmente no convívio interno e externo à organização. Com a disciplina Jogos de empresas o aluno se prepara para entender as características mais importantes de um jogo na organização; a reconhecer variáveis comportamentais que podem ser influenciadas e a sua utilização na educação empresarial; a entender as características da simulação presente num jogo. O alvo é ampliar a visão do graduando sobre as questões organizacionais implícitas à gestão, à tomada de decisão, ao planejamento e à logística. Neste sentido, as simulações de ambientes organizacionais criam a oportunidade de desenvolver a capacidade de interagir. Na disciplina Direito nas organizações o aluno compreende a relação do Direito com a Administração nas relações sociais e, respeitando os preceitos éticos e legais, identifica oportunidades para a organização. O formando deve compreender que as organizações têm que se submeter a uma série de normas legais e saber como identificá-las quando necessário. Ao cursar Administração de suprimentos e logística o aluno se prepara para desenvolver técnicas pertinentes ao gerenciamento de cadeias de suprimentos; a entender a necessidade do uso eficiente dos recursos, na busca pela eficácia; a conhecer a necessidade da logística como ferramenta estratégica; a conhecer os

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diferentes modais de transporte e sua disponibilidade; a levar à compreensão da gestão de estoques, dos custos de armazenagem; a compreender a função de ferramentas para a gestão de estoques; a entender os Incoterms, que são termos utilizados no comércio internacional; a apresentar os meios de medição de desempenho nas cadeias de suprimentos. Com Administração financeira, o futuro administrador passa a identificar as necessidades atuais e futuras de recursos em organizações, bem como a avaliar a saúde financeira de uma organização e, a partir disso, saber tomar decisões. Ao definir estes objetivos específicos, os documentos analisados evidenciam um processo educacional que articula conhecimento com desenvolvimento pessoal e social. Evidencia um processo educacional que pressupõe a integração entre as diversas disciplinas do curso em favor da maior compreensão dos fenômenos da administração. Denota a preocupação em instrumentalizar o aluno para a boa prática administrativa e, ao mesmo tempo, cuida de sua formação integral. Dessa maneira, o discurso proposto nos PE’s do curso de Administração coaduna com as ideias de Maria Puig (2007), para quem a prática educacional que forma integralmente o indivíduo contribui para que ele aprenda a viver num mundo plural, globalizado e constituído por diversas culturas.

3.1.2. Discurso do professor Para atender ao segundo objetivo específico da pesquisa, identificar as percepções do professor quanto à articulação entre as dimensões informativa e formativa do processo educacional, foram entrevistados oito professores. Feitas as entrevistas, as falas foram transcritas, na íntegra, para possibilitar a análise do corpus. Cada entrevista durou em média 40 minutos e o exaustivo trabalho de transcrição demorou 24 horas. Visando à preservação da identidade dos professores participantes, estes foram codificados com a letra “P”, seguida de sequencial à sua direita (P1 a P8). Tal como ocorreu na análise documental, definiu-se como unidade de codificação a análise categorial, em que se verificou a presença ou ausência de itens de sentido. Considerando os objetivos propostos e, de acordo com os princípios teóricos da análise de conteúdo, os dados foram organizados em categorias semânticas, sendo as unidades de registro escolhidas conforme a coleta

76

de dados a partir de frases, afirmações e resumos. A escolha teve como ponto de início os assuntos previamente selecionados no roteiro de entrevista. Desse modo, aos assuntos predeterminados no roteiro foram agregados outros itens coletados nas entrevistas, formando um conjunto de informações que se tornaram os núcleos de sentido na comunicação estabelecida entre pesquisador e participantes. Foram organizados em três rubricas, sob os títulos genéricos conforme abaixo (ver Figura 6). • Informação

• Formação

CATEGORIAS • Articulação entre informar e formar

Figura 6 – Discurso do professor: categorias analisadas. Fonte: dados coletados nas entrevistas.

3.1.2.1. Informação A sociedade atual é marcada por uma avalanche de informações sobre os indivíduos, interferindo no processo educacional, o qual passa a se basear no acúmulo de conhecimentos em detrimento da formação pessoal e social. Um cenário que, segundo Alarcão (2008), exige a reestruturação das relações mantidas por professores e alunos com o saber e com a utilização que dele se faz. Um processo educacional no qual, de acordo com a concepção freiriana, o professor busca encher os educandos de conhecimentos, como se eles fossem depósitos de conteúdos (FREIRE, 1987). Para Machado (2004), a escola ainda forma para ocupações bastante específicas, sendo necessário que os cursos de graduação ultrapassem o conteúdo, levando aos egressos uma formação mais ampla, que possibilite o desempenho de funções diversificadas e mantendo o foco na criatividade. Como explica Severino (2010), o processo de ensino-aprendizagem na universidade constitui-se tão somente numa mediação para formar o indivíduo, implicando mais do que o mero repasse de informações empacotadas.

77

Considerando isto, os participantes foram perguntados quanto à percepção que têm sobre a dimensão informativa do processo educacional. As respostas obtidas foram organizadas em três temas (ver Figura 7). Conhecimento, instrução, processo exógeno

• Conteúdo

INFORMAÇÃO

• Técnico

Figura 7 – Discurso do professor: categoria informação e respectivos temas. Fonte: dados coletados nas entrevistas.

3.1.3.1.1. A informação é conhecimento, instrução, um processo exógeno O aluno, enquanto ser humano, capta, recebe, digamos, externamente, dos meios de comunicação, de outros meios, digamos, de socialização do conhecimento, da cultura; daí ele vai absorvendo isso. São canais informativos. E a própria aula, também é um canal informativo (P2). A instrução tá mais voltada para o conhecimento puro [...] Conhecimento das teorias [...] que é o de fora para dentro. E a educação que seria de dentro pra fora (P5).

Para os participantes P2 e P5, a informação se constitui em processos que acontecem da perspectiva externa ao indivíduo. Seria, conforme as falas dos entrevistados, o conhecimento originário de dados, experiências, formas, conteúdos e teorias, que vêm ao encontro do aluno. Em sua resposta, P5 estabelece uma dicotomia entre os termos instrução e educação. Segundo ele, a primeira é o conhecimento puro, que ocorre para o sujeito que aprende; a segunda é um fenômeno que ocorre do sujeito que se educa. De fato, instruir, proveniente do latim instruere, significa a transmissão de conhecimentos a alguém. Significa ensinar (FERREIRA, 1986). Tem o sentido de edificar, construir dentro de. Diferentemente é o que ocorre com o termo educação, proveniente do latim educare, que significa fazer sair, conduzir para fora, estimular e liberar forças latentes (HAIDT, 1994). Educação é processo de criação do indivíduo, que tem início em seu íntimo, expandindo-se no sentido dos outros e do mundo. Se, por um lado, a instrução pode até separar, a educação integra, à vista de sua função social.

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3.1.3.1.2. A informação seria o conteúdo Eu lembro um pouco a questão da educação informal [...] E também tem a questão da informação [...] Lembra um pouco a questão do conteúdo [...] Lembra informática, a distancia [...] Mas eu acho que na questão da informação seria o conteúdo (P4).

Em consonância com esta fala de P4, o participante P1 entende que a dimensão informativa restringe-se à ideia e à prática de uma educação que busca desenvolver e transmitir conteúdos sistematizados ao aluno. Em permanecendo nesta transmissão de conteúdos, fica caracterizado o processo educacional em que, segundo Freire (1987), a dialogicidade como essência da educação é negada. Neste sentido, o educador apenas educa, mas não é educado. Não há diálogo com o educando. O educador possui os objetos cognoscíveis, que são descritos por ele e, figurativamente, são depositados na cabeça dos educandos, meros elementos passivos. Estas percepções são significativas na medida em que remetem, dentre outras, para as seguintes reflexões: estariam os professores, na sala de aula, formando ou informando? Em que medida a pressão para transmitir conteúdos que são definidos sem a participação dos professores estaria contribuindo para restringir o processo educacional à simples informação?

3.1.3.1.3. A técnica como aspecto informativo da educação Eu formo o aluno como técnico. Então, tem o aspecto bem objetivo da disciplina a que se pretende [...] Então eu tenho que ensiná-lo a agir como gerente [...] a atividade de compra, atividade de suplay, share, os termos técnicos, as contas, as técnicas [...] Então são aspectos formativos importantes que eu não posso abrir mão dele (P7).

Na mesma linha do entendimento de P7, o participante P8 vincula o aspecto informativo do processo educacional à transmissão do conhecimento técnicocientífico. Segundo ele, a informação tem a ver “apenas, talvez, com o acréscimo de conhecimentos” que não mudam a atitude do aluno. Que não mudam paradigmas. Desde os gregos antigos, a preocupação de formar para a techne, transmitindo conhecimentos e aptidões para a prática de uma profissão (JAEGER, 2001), não constitui, em si, um problema. Esta é uma concepção coerente com a fala dos participantes. No geral, ficou evidenciado que eles compreendem e aceitam

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que é necessário acumular dados e informações visando à preparação para o mercado de trabalho. O que os preocupa é que, em sendo considerado isoladamente, o conhecimento técnico não contribui para mudar atitudes e posturas dos alunos. Freire (2009) alerta que não é possível pensar o ser humano longe da ética. Para o autor, a transformação da experiência educativa em puro treinamento técnico significa tornar mesquinho o que existe de fundamentalmente humano no ato educativo, que é o seu caráter formador. No âmbito de uma epistemologia utilizada em prol da formação integral do indivíduo, transformá-la em treinamento técnico significa, nos termos de Morin (2008b), contribuir para perpetuar a desarticulação entre ciências da natureza e ciências do homem. Para o autor, os desenvolvimentos científicos, técnicos e sociológicos têm inter-retroagido apenas quando o processo científico é manipulado em favor da técnica, relegando a formação integral do ser humano ao segundo plano. Estas teorizações constituem o pano de fundo das preocupações evidenciadas pelos participantes ao mencionarem a preponderância da técnica no processo educacional sobre a formação integral do aluno. 3.1.2.2. Formação À

educação

cabe

contribuir

para

atualizar

a

gênese

humana,

multidimensional, possibilitando que o indivíduo se desenvolva para além do simples aprendizado de conhecimentos, que o educando se aproprie da construção de sua identidade, realizada por intermédio de dinâmicas educacionais desenvolvidas na interação entre professor e alunos. Deve permitir que se manifestem valores importantes tanto para o indivíduo como para a sociedade, que sejam resgatados princípios e valores morais universais, tais como o Amor e a Justiça, possibilitando o fazer social (BEUST, 2000). Neste sentido, buscou-se identificar entre os participantes qual a sua percepção sobre os aspectos formativos do processo educacional. Os dados obtidos foram organizados em oito temas (ver Figura 8).

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Visão do ser humano



Relacionamentos •

• Mercado de

trabalho • Convivência harmônica

FORMAÇÃO

• Conhecimentos científicos

Consciência crítica • • Autonomia

• Valores

Figura 8 – Discurso do professor: categoria formação e respectivos temas. Fonte: dados coletados nas entrevistas.

3.1.2.2.1. A formação tem a ver com a visão do ser humano [... A] formação, ela passa primeiro por uma visão filosófica e antropológica do ser humano... Além da ética, estética e outras dimensões... a política, a convivência, a cultura, são características próprias do ser humano... criatividade, admiração do belo... [...] Formar o ser humano, de modo geral, é prestar atenção, incentivar esses valores, incentivar essas capacidades, que ele tem [...] quando vejo um aluno, quando eu entro na sala de aula, primeiro lugar eu estou vendo aquele aluno como um ser humano. Depois, a partir da visão do ser humano que eu tenho, é que eu o vejo como aluno [...] (P2).

Para P2, as didáticas, técnicas e conteúdos que formam o aluno fundamentam-se na visão que o educador tem sobre o ser humano: “o aluno na sala de aula, ele se forma como sujeito ético, estético, de cultura, [...] que se politiza [...] E as minhas didáticas, as minhas técnicas, as minhas metodologias têm que estar a favor disso... propiciar esse tipo de formação”. Para o participante, formar o indivíduo é desenvolvê-lo enquanto ser humano, num processo que acontece na convivência. No mesmo sentido, obteve-se a seguinte fala: Pra mim, formar o aluno parte do pressuposto de olhar pra ele como um ser humano na sua integralidade [...] tanto quanto possível criar condições pra que ele se aprimore, se desenvolva no seu crescimento como pessoa, como ser humano. A gente não desenvolve profissionais, a gente desenvolve seres humanos. Seu desenvolvimento pessoal é a primeira etapa, o primeiro passo, o profissional vem por consequência (P6).

Mais adiante, P6 falou que, ao criar condições para desenvolver o aluno, o professor lança mão de informações, entendidas como um conjunto de conhecimentos adquiridos e acumulados por ele durante a sua vida. Ao falar em desenvolver o ser humano em sua integralidade, o participante declarou que a

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formação dos alunos inclui aspectos informativos, políticos, cidadãos, afetivos, sociais e ideológicos, permitindo-lhes “fazer opções pela vida”. Também para P7, formar relaciona-se com a integralidade humana, mais do que a preparação técnico-profissional: [...] Eu formo o aluno como técnico, [...] um aspecto bem objetivo da disciplina a que se pretende [...] Tem outro aspecto formativo, que é olhando o meu aluno como homem. Da formação dele como cidadão. Como uma pessoa que vai agir com ética. Uma pessoa que vai agir pensando no outro ser humano. Que vai agir respeitando a liberdade do outro. O espaço do outro. Porque isso é mais do que... é assim, num é um aspecto técnico, é um aspecto mesmo da formação dele como homem (P7).

Segundo P7, formar não se restringe ao aspecto técnico porque, nesse caso, isto seria um treinamento, não uma educação. Para ele, formar o aluno é “olhar esses aspectos, humano, sob o ponto de vista assim filosófico, e mais técnico também”. Na fala desses participantes ficou evidenciada a concepção do ser humano como uma unidade que pensa-sente-quer-age (ARANHA; MARTINS, 1986), um ser integral, que existe não exclusivamente em sua racionalidade; mas, também, em sua dimensão emocional, o que permite a convivência entre os semelhantes; e um ser de vontade, o que o instrumentaliza naturalmente para enfrentar desafios. Formar o indivíduo, segundo ficou evidenciado, seria criar condições para desenvolver capacidades próprias do ser humano, o que significa ter práticas educacionais que conduzam ao melhor de cada educando como pessoa plena, integral.

3.1.2.2.2. A formação como a preparação para o mercado de trabalho Eu diria assim preparar muito mais pra esse mercado de trabalho que o aluno vai encontrar aí [...] Hoje você tem crianças que não têm referência familiar... Tem crianças que vêm de contextos totalmente desestruturados [...] É preparar de certa forma pra enfrentar essa realidade que atualmente é uma realidade bem diferente, bem atípica, no contexto de família (P3).

O participante P3 vincula a formação do aluno à preparação para o trabalho, incluindo a lida com contextos familiares adversos. Neste processo, o aluno deve ser incentivado a buscar algo novo, a ler, a participar de seminários e congressos, cabendo ao professor trazer assuntos “lá de fora da escola para a sala de aula”. Vale ressaltar que, mesmo quando P3 vincula a formação do futuro pedagogo ao

82

desenvolvimento de valores, essa vinculação focaliza o aspecto profissional: “essa questão dos valores tem que ser trabalhada. Por que como é que eu preparo [...] o aluno que vai atuar lá na escola se ele num tem isso...? Aí, voltando pra escola... O que eu vejo lá? Professor sem ética...”. Outro participante, também vincula a formação diretamente com a preparação para o mercado de trabalho, entendendo que é importante levar o egresso a colocar em prática o aprendizado adquirido: Formar é um despertar de potencialidades [...] pra profissão que o aluno escolheu [...] Eu, na minha aula, eu procuro, primeiro: fazer com que aquele conhecimento faça sentido pra ele; que ele perceba que ele tem como por aquilo na prática [...] O que é fazer sentido? É transformar esses conhecimentos em outros resultados [...] Tô formando. Eu tô despertando algo de dentro dele, tô juntando, fazendo conexões [...] Que vai fazer ele se desenvolver. Se formar. É isso que eu tenho fazer. Ou seja, com esses conhecimentos [...] que é você pegar aquela teoria e perceber que ela pode te ajudar a ter melhores resultados na sua prática (P5).

3.1.2.2.3. Formar relaciona-se com a preparação para a convivência harmônica Mas quando a gente fala de formação é mais numa perspectiva integral [...] o objetivo de você formar o individuo pra viver harmonicamente em sociedade. Um indivíduo que tenha valores, um indivíduo que tenha uma perspectiva de trabalho de enfoque coletivo na sua vida, profissional e pessoal [...] Formar um indivíduo não apenas como um profissional, mas pra vida dele... Seja como profissional, seja como uma pessoa humana (P1).

Esta fala de P1 revela o entendimento de que a formação tem o fito de conduzir o aluno para ser alguém digno, ético, com valores; uma pessoa “que possa verdadeiramente contribuir com a sociedade”. Demonstra a compreensão de que formar significa antes de tudo ver o aluno como ser humano. Por isto, deve contribuir para desenvolver valores, preparar para o aspecto profissional e, sobretudo, preparar para a vida social em harmonia. Segundo P3, formar significa preparar para a convivência agradável entre colegas de trabalho, em ambiente onde haja respeito e as situações de conflito sejam dirimidas da melhor forma possível. O participante questionou: “eu preciso me relacionar, eu preciso conviver num grupo [...] o que é que a gente pode fazer pra essa convivência ser mais agradável?”. Suas reflexões vêm a favor de teorias que explicam o ser humano como um ser sociocultural. Como foi dito antes, cada indivíduo existe na relação significativa mantida com o mundo e com seus

83

habitantes, não existindo na solidão do encontro que mantém com ele mesmo ou com o ambiente. Pela fala dos participantes, a formação se destina a preparar o indivíduo para viver em paz, em harmonia com os outros. Como afirma Maria Puig (2007), preparar para aprender a viver. Neste sentido, formar considera o que havia entre os gregos antigos sobre o fenômeno educativo. Formar o indivíduo significava, para eles, viver os mais diversos aspectos das relações mantidas com os semelhantes. Em última instância, o ato educativo justificava a existência da sociedade. Seu desenvolvimento tinha, no ápice, o conhecimento e a inteligência (JAEGER, 2001) que eram construídos na polis.

3.1.2.2.4. Formar está relacionado com a aquisição de conhecimentos científicos Num é instruir, não! Formar é adquirir conhecimento! Entendeu? Na formação ele tá adquirindo conhecimento. Ele já pode até trazer esse conhecimento. Mas aqui dentro é o científico. Então, é o contato com o científico, a formação (P4).

Ao ser perguntado o que entende sobre a dimensão formativa do processo educacional, P4 respondeu que dentro da universidade o aluno “só vai ter o contato com o científico, com esse conteúdo científico que a gente chama academia, segundo Platão [...] Aí você fecha a formação”. Para P4, conhecimento é o que leva à formação. Segundo ele, formar é adquirir conhecimentos científicos num processo de busca que precisa ser contínuo, dialético, porque se vive numa sociedade globalizada. Conhecimentos científicos que precisam incluir, na visão do participante, disciplinas vinculadas às ciências humanas, tais como a filosofia da educação, a sociologia da educação e a história da educação. Por sua vez, P5 afirma que adquirir conhecimento é instruir-se. Para ele, “a instrução está mais voltada para o conhecimento puro”, sendo que formar é mais do que adquirir conhecimento, devendo abranger, também, a colocação em prática do conhecimento adquirido.

3.1.2.2.5. Formar é desenvolver valores

84

Nós estamos aqui não só para a transmissão do conhecimento científico, o conhecimento técnico-científico, mas, também, para a transmissão de valores. Eu acho que o nosso papel aqui não é um papel só de professor, mas de educador. Então, eu acho que nós temos que contribuir para a formação do cidadão. Uma formação integral [...] Prepará-lo para a vida! (P8).

Esta fala evidencia o entendimento sobre formação integral, envolvendo conhecimentos, valores e o papel do educador. Para o participante, a formação integral pode se traduzir em “... valores, valores, basicamente valores!”. Formar significa fazer com que os conhecimentos adquiridos mudem atitudes em relação a alguma coisa: “não só conhecimento, mas a mudança de atitude; o formativo”. Para o participante, é necessário trabalhar valores no processo educacional. P1 enumerou três elementos do processo educacional que contribuem para desenvolver valores: o preparo do professor, como pessoa, e não apenas como profissional; abertura do aluno aos processos de mudança; adequação das estratégias pedagógicas, em especial a contextualização do currículo às questões da atualidade: O professor tem que estar devidamente preparado, enquanto pessoa, principalmente, e não apenas como profissional, para desenvolver isso.. Então, preparado como pessoa, no sentido daquele indivíduo ético, daquele indivíduo responsável, certo? Que tenha condições de chamar atenção do aluno quando for realmente necessário. Daí vem a importância de o professor ser um educador de fato e não um mero transmissor de informações [...] O indivíduo, ele tem que tá aberto pra isso. Se o aluno não tiver aberto pra isso, fica difícil. Por melhor que seja o professor, se o aluno não tiver aberto a ouvir e se o aluno não tiver aberto a mudar – aí vem aquela ideia de que ninguém forma ninguém, de que ninguém educa ninguém [...] E a outra questão são as estratégias pedagógicas. Que aí vem a contextualização do currículo. O fato, por exemplo, de você tá trabalhando temas atuais e que interferem diretamente na questão da ética, na questão da dignidade humana (P1).

Para P6, o educador precisa estar consciente sobre o que fazer com os conteúdos curriculares. Ele entende que “qualquer dinâmica curricular tem valores por trás; tem uma ideologia, uma concepção”, cabendo ao educador saber o que está fazendo. São afirmações que confirmam o entendimento de Silva (2000), para quem a educação tem uma base axiológica, buscando transmitir, reproduzir ou criar valores. Segundo P4, embora existam disciplinas com conteúdos que facilitem o trabalho de desenvolvimento de valores, o que vale mesmo é a ação do professor, de sua consciência: “puxar um pouquinho para essa questão dos valores”. Neste sentido, P8 afirmou que dar o exemplo é fundamental: “eu tenho certeza que o

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professor serve de referencial para o aluno. Não tenho dúvida. Pra uns mais, para outros menos". Também o participante P5 encaminhou sua fala neste sentido ao afirmar que o desenvolvimento de valores, na sala de aula, depende da atitude manifestada pelo professor na resolução de conflitos e da utilização dos próprios conteúdos para desenvolver valores. O desenvolvimento de valores em sala de aula depende, conforme P4, da presença de conteúdos de disciplinas como filosofia e ética. Já o participante P7 queixou-se da falta de sequenciamento entre as disciplinas do curso, fato que prejudica uma ação mais efetiva de qualquer professor para desenvolver valores. Ele entende que o assunto valores deve perpassar o curso por inteiro: “porque eu não acho legal trabalhar valores só numa parte do curso não; tem que ser o curso todo”. Neste sentido, para P2, o processo educacional desenvolve valores se a dinâmica curricular for trabalhada na perspectiva da interdisciplinaridade e transdisciplinaridade. Somente assim, concluiu o participante, serão desenvolvidos valores tais como: compreensão, socialização, interação e aproximação. Uma opinião que reforça as ideias de Silva (2007) sobre o desenvolvimento de valores na educação, que deve ser sustentado pelas teorias da complexidade. Ao estudar procedimentos e estratégias para uma educação em valores, Araújo (2007) propõe a implementação da unidade complexa, a qual seria uma forma de intervenção social favorável ao desenvolvimento de valores, alicerçada em três tipos de ações independentes e complementares: inserção transversal e interdisciplinar de conteúdos de natureza ética no currículo; introdução de sistemáticas para melhorar e democratizar as relações interpessoais na escola; articulação dessas ações com a família e a comunidade onde o aluno vive. Neste ambiente ético, convivem escola e ambiente externo, a partir de valores como a democracia, a cidadania e os direitos humanos.

3.1.2.2.6. Formar envolve a aquisição de autonomia [...] Na própria LDBEN, autonomia é um princípio [...] Quando você trabalha num enfoque mais liberal, a ação docente [...] pode ser mais o quê? Tradicional. Pode ser de uma linha mais tecnicista. E isso parte, inclusive, do modelo de gestão, do modelo pedagógico que a escola vai procurar desenvolver dentro do seu espaço educativo. Se você trabalha numa linha mais progressista, aí, isso já vai ajudar, ou vai contribuir mais pra que o

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professor possa [...] desenvolver autonomia do seu aluno em sala de aula (P1). Autonomia requer, digamos, uma relatividade, uma relação de sujeitos. Sujeitos que prezam, digamos, seus espaços, seus tempos, né, próprios, mas conectados com os demais. Então, por exemplo, autonomia de uma escola, num é do diretor. Num é do professor. Num é do aluno isolado. É do conjunto da escola. Uma escola autônoma é aquela que sabe decidir, organizar-se, decidir conjuntamente. Pra poder ser autônoma (P2).

Como se observa, a compreensão de P1 e P2 sobre a autonomia perpassa o discurso freiriano. À pergunta como o processo educacional contribui para que ela seja adquirida pelo aluno, obtiveram-se as seguintes respostas: para P1, o papel do gestor na escola é fundamental nesse objetivo; para P2 o Projeto Político Pedagógico é o instrumento a contribuir para romper velhos paradigmas de uma cultura instalada pela sociedade, na escola, que alimenta nos alunos o isolamento, o egoísmo, as ideologias e o individualismo. No entanto, P2 alerta que é necessário que esse projeto seja construído “por todos os atores dentro da escola [o que] vai levar à autonomia da escola, e naturalmente, essa experiência de autonomia por cada um deles”. Desse modo, “cada professor, cada turma, seria orientado por esse modelo, por este Projeto Político Pedagógico nas suas didáticas, nas suas metodologias”. A autonomia como independência intelectual se encontra presente nas falas dos participantes P5 e P7. Para o primeiro, o processo educacional contribui quando o professor cria oportunidades de aprendizado, trazendo questões desafiadoras, fazendo debates com temas atuais, e o aluno fazendo dessa oportunidade “uma alavanca pra ele crescer [...] crescer no sentido de aprender mais”. Contribui, também, continua P5, com a aplicação de provas com questões abertas, que oportunizam ao aluno dar sua opinião e criar argumentos. Para P7, para quem autonomia é a capacidade de o aluno produzir seu próprio conhecimento, as atividades contribuem “quando o aluno, ele mesmo busca; ele mesmo acha; ele mesmo passa a compreender aquele pedacinho de mundo que cabe àquela disciplina”. Além de adquirir conhecimentos teóricos, complementa P8, autonomia significa utilizar-se desses conhecimentos para resolver problemas específicos e práticos da área de formação: “é conseguir fazer essa junção da teoria com a prática”.

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Outro participante, P3, amplia o conceito de autonomia. Para ele, esta se relaciona com a capacidade intelectual e moral e com a atitude coerente com a situação trabalhada em sala de aula. Segundo o participante, é necessário também conhecer o aluno e sua situação social; até mesmo sua saúde, e assim por diante. Quanto ao educando, torna-se necessário ter conhecimento para adquirir autonomia: [...] Eu vejo que autonomia tá vinculada ao conhecimento! Se ela [aluna] não tem conhecimento, ela não vai ter uma atitude dela, autônoma, com o momento, com o que a ação permite [...] A autonomia, as atitudes de autonomia na escola, em relação ao que eu vou fazer, em determinadas situações, eu penso, passa pelo conhecimento que eu tenho! Porque se eu não tenho conhecimento, eu não vou ter uma atitude coerente com aquela situação... (P3).

À pergunta o que é fundamental para que seus alunos sejam mais autônomos, P3 respondeu: “leitura, leitura!”. Citou que a disciplina de estágio pode favorecer a aquisição de autonomia e possibilitar maior flexibilidade da instituição de ensino superior no que tange ao acréscimo de assuntos que não estão na ementa da disciplina. Autonomia como um processo de descoberta; como independência do aluno em relação ao professor na condução do processo educacional. Estas concepções foram evidenciadas pelo participante P6, para quem o professor precisa ter clara visão do ser humano, deve estimular os alunos a buscarem novas fontes de pesquisa, contribuir para que eles observem a realidade como esta se apresenta e ajudá-los a “andar com as próprias pernas”. Para P4, por sua vez, autonomia é “a capacidade de o aluno interagir na sala de aula” em favor da aprendizagem. Para este participante, autonomia é “a capacidade que ele tem de discernir com o professor” e, nesse sentido, os trabalhos de grupo e os seminários são estratégias importantes porque, assim, os alunos “vão trabalhando em grupo, interagindo e depois vão apresentando” seu trabalho aos que estão na sala de aula. 3.1.2.2.7. Formar é colaborar com a obtenção de consciência crítica Um aluno pensante, um ser reflexivo e não apenas um ser, um receptor, um mero receptor de informações e que com aquilo ali ele vai fazer um vestibular [...]. A questão da crítica, ela tem muita ligação com a questão das estratégias do currículo. Obviamente, também com as concepções; linhas; estratégias pedagógicas que são utilizadas; seja pela escola, seja pelo professor (P1).

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Discutindo sobre consciência crítica, P1 buscou clarificar o papel do professor no desenvolvimento do currículo. Para ele, o professor é um colaborador do processo de construção do aluno crítico: “a gente não pode simplesmente pegar e jogar tudo na mão do professor e falar que ele tem o poder de mudar ou de tornar o aluno mais crítico. Ele tem, sim, o poder... de colaborar... nesse processo”. P1 situou a formação para a consciência crítica no contexto da dinâmica curricular, sendo coerente com Pacheco (2005a; 2005b). Para este autor, o currículo é um projeto de formação que envolve conteúdos, valores, atitudes e experiências, construído a partir da multiplicidade de práticas inter-relacionadas por intermédio de decisões tomadas nos contextos social, cultural, político, ideológico e econômico. Como declarou P1, o educador faz parte de um amplo contexto que delineia o desenvolvimento do currículo, ainda que o professor seja aquele indivíduo que mais se coloca em evidência, sendo o ator principal no processo de concretude do currículo (CÂMARA, 1995). Para que o aluno tenha consciência crítica, P4 entende que ele precisa conhecer o projeto pedagógico da universidade. Além disso, é necessário levar o aluno a pensar a sua realidade, podendo fazer isto com a aplicação de leituras dialogadas. Desse modo, sua fala evidencia a preocupação com a clareza de papéis numa escola, inclusive dos alunos. Do mesmo modo, para P6, a consciência crítica “se desenvolve a partir de elementos que você consiga trabalhar na sala de aula, que vinculem com a realidade da pessoa”; para P7, a consciência crítica acontece quando o aluno “consegue captar aquela informação, traz um pouco mais pra realidade dele, analítica, e começa a fazer comparações disso com o mundo em que ele vive”. Seria uma educação que, no dizer de Freire (1987), problematiza, não sendo um ato de depositar, narrar, transferir ou transmitir conhecimentos e valores aos educandos. Para P8, por sua vez, formar para a consciência crítica envolve a transmissão de valores, por parte do professor: “buscando sempre fazer com que o aluno se conscientize e use aqueles conhecimentos que ele tá tendo, dentro da ética, da moral, dos bons costumes”. O processo educacional que colabora para a obtenção da consciência crítica valoriza o ato reflexivo em sala de aula, conforme a fala de P2:

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[...] Pra sair desse estado, de consciência amorfa, apática, acrítica, pra uma consciência critica é um processo conflitivo, doloroso... Lembrando um pouco Platão, saindo do fundo da caverna para a luz. O teatro é uma ferramenta que se pode usar na sala de aula pra criar esse tipo de situação. Eu sempre faço experiências com meus alunos usando o método socrático, A saída dele daquele estado de consciência, manipulável, pra uma consciência critica. Ele vê e começa a criticar.

A saída do estado de consciência a-crítica para o da consciência crítica descrita pelo participante, explicada com inspiração no Mito da Caverna, de Platão, remete para a explicação de Perrenoud (2002) sobre a atitude reflexiva de qualquer profissional. Segundo o autor, o profissional deve ter uma postura reflexiva, que deve ser permanente e inserida na relação analítica com a ação, mais ou menos independente dos empecilhos da vida. A prática reflexiva seria uma forma de identidade, um habitus, que tem sua realidade medida pela natureza e pelo que advier da reflexão do profissional e não por discursos ou intenções.

3.1.2.2.8. Formar é cuidar do relacionamento aluno-aluno-professor

Segundo Freire (2009), a prática educativa deve ser vivida com alegria sem prescindir da formação científica e da clareza política dos educadores e educadoras. Para o autor, aquela se caracteriza, simultaneamente, pela afetividade, alegria, capacidade científica e domínio técnico em favor da mudança. Desse modo, formar é ensinar cuidando do relacionamento entre indivíduos participantes do processo educacional. Em que o processo educacional contribui para desenvolver melhor o relacionamento entre os alunos? A esta pergunta, os participantes responderam a partir de diversas perspectivas, conforme demonstram as falas e análises a seguir. A melhoria do relacionamento é uma estratégia de gestão pedagógica, no sentido do desenvolvimento de projetos que possam disseminar e fortalecer valores humanos dentro da escola (P1). Eu acho que tem que mexer na estrutura do curso [...] A desvalorização da profissão, a questão da remuneração, a questão das condições de trabalho, tudo isso interfere no bom relacionamento (P3).

Como evidenciam estas falas, a contribuição do processo educacional em prol de melhor relacionamento entre alunos, e entre estes e o professor, passa por questões institucionais na escola. Na opinião de P1, para resolver problemas de

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relacionamento,

as

escolas

precisam

implementar

projetos

não

somente

interventivos, mas preventivos. Segundo P3, talvez fosse necessário realizar um “trabalho”, “com dinâmicas, reflexões sobre relacionamento, sobre convivência...”.

Para P8 e P1, o relacionamento melhora à medida que os alunos adquirem conhecimentos. Segundo P8, o pouco conhecimento e a pouca compreensão de mundo leva o indivíduo a julgar os outros de maneira errada, interferindo no relacionamento. E, conforme manifestou P1, conhecer bem o aluno, chamando-o pelo nome e sendo sincero, evita barreiras, distâncias, o que melhora o relacionamento. Para P6, entretanto, o mais importante é a atitude do professor e a consciência de que nas relações em sala de aula existe “aquilo que a gente chama de componente afetivo do processo educacional”. O participante cita o exemplo de uma experiência que teve, numa universidade chilena, para demonstrar o quanto valoriza a afetividade: “os alunos cumprimentavam professoras e professores com um beijo no rosto [...] O que era aquilo? Um pouco do meu sonho de processo educacional que, pra mim, não existe sem a componente afetividade...”. Os participantes P2, P7 e P8 evidenciaram que o trabalho em grupo é uma atividade que favorece a melhoria do relacionamento entre os alunos, uma oportunidade que eles têm para se comunicar, interagir, aprender a resolver problemas, administrar a relação grupal e distribuir tarefas.

3.1.2.3. Articulação entre informar e formar

A velocidade das mudanças e transformações no mundo atual cria uma tensão entre o espiritual e o material, suscitando reflexões sobre a importância dos valores na sociedade (DELORS at al., 1996). Há uma priorização da ciência, que leva a avanços científicos e tecnológicos, mas relega a pessoa humana para o segundo plano, desencadeando problemas sociais gravíssimos (CÂMARA, 2001). Isto caracteriza um cenário que desafia para a construção de um processo educacional voltado para a formação integral do ser humano, abrangendo não somente o conhecimento, mas as questões axiológicas. Busca-se uma educação capaz de reconhecer a necessidade de que as ciências humanas e as ciências da natureza se reencontrem para que, dessa forma,

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o saber encontre de novo uma inspiração profundamente unitária (SS. PAPA JOÃO PAULO II, 2000). Um processo educacional que tenha como objetivo equilibrar conhecimento teórico e desenvolvimento humano; seja capaz de articular a dimensão informativa à formativa da educação, integrando saber e consciência; concretize a reforma do pensamento proposta por Morin (2008a). Uma articulação que, no mundo contemporâneo, torna-se a chave para que a educação forme integralmente os indivíduos. Neste sentido, e a partir de percepções dos participantes a respeito da dimensão informativa e formativa do processo educacional, foi possível identificar como eles percebem a articulação entre aquelas duas dimensões. As respostas obtidas foram organizadas em oito temas (ver Figura 9). Visões do mundo • Conteúdo

Visão do ser humano •

• Mercado de trabalho

ARTICULAÇÃO INFORMAR//FORMAR Consciência e exemplo •

Cognição e emoção

• Ambiente participativo • Conhecimento

Figura 9 – Discurso do professor: categoria informar/formar e respectivos temas. Fonte: dados coletados nas entrevistas.

3.1.2.3.1. Visão do ser humano A articulação entre a dimensão informativa e a formativa da educação: Depende da visão do ser humano que o educador tiver [...] O educador que não tem uma concepção do ser humano, de uma forma mais integral, holística, que não veja a pessoa na sua integralidade, provavelmente vai ficar muito só no aspecto informativo (P6).

Para P2 e P6, o educador precisa ter clara a sua visão do ser humano, considerando-o em todas as suas dimensões. As opiniões remetem para as teorizações de Morin (2008a) sobre a reforma do pensamento, o que possibilitaria o emprego da inteligência para ligar a cultura científica às culturas das humanidades. Ao esclarecer que o papel da educação deve considerar que a reforma do ensino leva à reforma do pensamento, e vice-versa, o autor pressupõe a existência de uma

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razão aberta, que integra os fragmentos da realidade e concebe o ser humano em todas as suas dimensões. A razão aberta significa um novo pensar, que não opõe coisas que aparentemente são antinômicas, tais como: inteligência versus afetividade, razão versus desrazão. Considerando cada indivíduo como um ser humano pleno capaz de se relacionar com o mundo e com o semelhante, a razão aberta resta no abandono de paradigmas que moldam o indivíduo a processos de trabalho, que colocam as coisas e fatos em prol do econômico, em favor da eficácia e do cálculo. De certa forma, estas teorizações espreitam as falas dos participantes sobre o desenvolvimento do aluno conexo com as concepções sobre o ser humano em sua integralidade. Neste sentido, a fala de P2 é representativa: “minha visão do ser humano, uma visão antropológica e filosófica, vai me permitir pensar como formar esse ser humano”.

3.1.2.3.2. Visões do mundo Maria Puig (2007) lembra que cada indivíduo compartilha com o outro a necessidade natural de pertencer a uma maneira particular de entender o mundo. Para o autor, esta característica do ser humano é expressa na manifestação de valores a qual acontece na escola por intermédio da via interpessoal, curricular e institucional. As relações estabelecidas entre professor e alunos motivam de maneira profunda o modo de ser do educando. Os instrumentos cognitivos presentes no currículo permitem ao educando estabelecer pontos de vista próprios ao lidar com as dificuldades. A escola, em sua institucionalidade, altera comportamentos do educando, formatando hábitos e virtudes. Desse modo, essa complexidade do ambiente escolar demonstra que a articulação entre informação e formação pressupõe o compartilhamento de visões de mundo por parte dos alunos. Considerando isto, foi perguntado aos entrevistados “em que o processo educacional contribui para que os educandos compartilhem as visões do mundo na sociedade contemporânea?”. Quanto mais eu participar da informação, do conhecimento, tiver envolvido; eu vou, obviamente, além de conhecer o que todos estão conhecendo, eu também vou me comprometer com esse conhecimento de todos. Isso significa autonomia, significa democracia e eu diria que significa [...] cidadania. Quer dizer, eu quero um novo padrão de civilização [...] e, aí, a

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escola propicia ao aluno, e o aluno vai pra fora da escola, e se comunica com outros grupos (P2). A partir do momento em que a escola mudar enquanto um ente institucional [...],que ela entender a sua verdadeira função, [o processo educacional] poderá contribuir para que haja trocas de visões de mundo entre os alunos] (P1).

Os participantes P2 e P1 situam a discussão num nível macro, refletindo sobre o papel da escola. Para P2, independentemente dos manuais e do Projeto Político Pedagógico, há uma relação entre escola e meio externo que a torna responsável por transformar o mundo e por propiciar ao aluno melhor compreensão da sociedade onde ele vive e maior participação. P1 entende que o papel da escola precisa ser restabelecido. Como? Para ele, as políticas públicas federais se refletem nos sistemas educacionais, que impactam as secretarias estaduais e municipais de educação, podendo gerar maior integração nos espaços educacionais. Isto cria oportunidades para que o professor, dentro da sala de aula, contribua para transformar a sociedade: “eu, como professor, eu procuro transformar, eu procuro modificar e contribuir para que haja maior vinculação desse processo educativo com as questões sociais, dentro do espaço da sala de aula”. Essa preocupação com a melhor estrutura do sistema educacional foi identificada na fala de P3. Segundo ele, há um engessamento do ensino em disciplinas, prejudicando a troca de experiências e conhecimentos entre os alunos. “Acho que aí é uma questão mais profunda, a iniciar no nível de políticas públicas mesmo [...] A estrutura do sistema educacional é uma estrutura assim meio engessada [...] o professor acaba se burocratizando...”. No nível do desenvolvimento de atividades didático-pedagógicas, P3 entende que a discussão em grupo, os debates, as sessões de filme, são recursos que facilitam o compartilhamento de visões de mundo. Com exceção de P4, que não se pronunciou quanto ao assunto, os demais participantes consideram que essas atividades contribuem, significativamente, para esse compartilhamento. P8 acrescentou que, no nível institucional, a universidade poderia

ter

iniciativas

mais

abrangentes,

desenvolvendo

trabalhos

sociais

relacionados à visão de mundo. P5, por sua vez, adicionou que as tecnologias também se constituem em oportunidades.

94

3.1.2.3.3. Conteúdo

Para P4 e P1, a dimensão informativa do processo educacional se restringe à ideia e à prática de uma educação preocupada em desenvolver e transmitir conteúdos. A maioria dos entrevistados disse que, ao ultrapassar esses conteúdos por meio de dinâmica própria, o educador consegue que os aspectos informativos e formativos da educação sejam integrados. Para eles, muitas vezes o curso não tem conteúdos que favoreçam esta integração: O professor, ele não necessariamente ele precisa entrar na questão dos valores e fazer essa correlação com o conteúdo. Lógico que, por exemplo, nas ciências exatas, é mais difícil de você fazer essa ligação. Mas, nada impede que um professor, ao final de uma aula, faça uma reflexão com os alunos (P1). [Falando do curso que dou aula], não há articulação com relação a isso... Se você pegar a grade curricular, você não encontra disciplinas mais voltadas para isso! (P3).

Os participantes P1 e P3 convergem sobre a importância de ultrapassar os conteúdos da disciplina. Entretanto, na continuidade de suas falas, foram identificados pontos diferenciados quanto às estratégias a serem desenvolvidas. Para o primeiro, o professor deve ir além do conteúdo e buscar a reflexão crítica de seus alunos. Para o segundo, é a formação do professor que é importante, pois em ele estando mal preparado perdem-se oportunidades de formar o aluno na sala de aula. Já o participante P7 entende que deveria haver mais conteúdos no campo da filosofia e do comportamento, bem como abordagens sobre cidadania. Mencionando que este não é caso do curso em que ministra aulas, o participante descreveu uma de suas iniciativas para amenizar esta carência: Essa turma mesmo que eu estou dando aula agora, no semestre passado eles abriam e entravam na sala batendo a porta. Um dia, eu parei a aula, saí e bati a porta com muita força. Foi aquele susto! Depois, entrei, saí e fechei a porta devagarzinho. Aí voltei de novo e perguntei: vocês perceberam qual foi a diferença? Claro, professor, o senhor tava nervoso... Não, eu não tava nervoso, eu estava sem educação. Na segunda, eu estava educado. Não faz muita diferença? É tão simples... (P7).

P1 falou ser necessário que a escola trabalhe numa perspectiva de gestão democrática, implantando conselhos escolares e promovendo maior autonomia para funcionários, professores e alunos. Segundo ele, o gestor deve ter uma ação

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proativa, cuidando para que o mero desenvolvimento de um modelo neoliberal na educação não sobreponha o objetivo primordial de formar seres humanos: Quando você trabalha o enfoque da qualidade total [...], você tem de certa forma uma valorização de instrumentos avaliativos como a prova. E isso inculca a ideia da importância demasiada dos conteúdos curriculares [...] Quando você trabalha na perspectiva da qualidade social aí já é uma coisa mais ampla, no sentido da formação humana... da formação do indivíduo como pessoa [...] (P1).

3.1.2.3.4. Mercado de trabalho Então, esse formativo, como é que a gente junta isso? Através de você pegar essa teoria e fazer uma vinculação dela com essas experiências; pequenas experiências que você pode fazer numa sala de aula, de mostrar pra ele como é que aquilo está presente nele ou não, ou no colega (P5).

Para P5, informação e formação se articulam quando o aluno é chamado a viver experiências em sala de aula, simulações, jogos, reuniões etc., criando oportunidades de vinculação entre teoria e prática. Para ele, formar é vincular os conceitos, as ideias, os aprendizados à prática. É prepará-los para aplicar conhecimentos no mundo do trabalho, competitivo, que os esperam após a graduação. É ajudá-los a ganhar visão empresarial. O participante enfatiza o preparo técnico do aluno ao adquirir visão empresarial: “formar é um despertar de potencialidades [...] pra profissão que o aluno escolheu”. De igual modo, P3 vincula a formação do aluno à preparação para o trabalho: “eu diria assim preparar muito mais para esse mercado de trabalho que o aluno vai encontrar aí...”. Por sua vez, P7 vincula o conhecimento técnico-científico transmitido em sala de aula à dimensão informativa do processo educacional: “eu formo o aluno como técnico [...], um aspecto bem objetivo da disciplina a que se pretende...”, [mas, formar, é mais do que isso], é “olhar aspectos humanos, sob o ponto de vista assim filosófico, e mais técnico também”. De todo modo, as opiniões evidenciaram que o desenvolvimento do aluno considera a integração entre os conhecimentos adquiridos na sala de aula e a sua prática. Em geral, prática para os participantes significa atuar no mercado de trabalho.

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3.1.2.3.5. Ambiente participativo Quando eu faço educação para o aluno, para alguém, o aluno não participa, sou eu que estou fazendo para ele; isso tem consequências fortíssimas... Porque ele se sente alheio, se sente alienado, se sente alijado do processo. É aquilo que Paulo Freire chama de educação bancária. Eu planejo, eu faço, eu elaboro os conteúdos para o aluno... Agora, quando eu faço educação com o aluno, é diferente. Tudo muda. Porque gera um espírito de comunidade, gera um espírito de comum-unidade. Gera um espírito de comum-união. De participação desse aluno para o processo vital de sua própria educação (P2).

Para P2, o ambiente participativo na sala de aula favorece a integração entre informar e formar, enriquecendo a todos os envolvidos no processo de desenvolvimento humano. Neste processo, professor e aluno devem estabelecer um diálogo fecundo, pois “quando ele [aluno] traz a informação e eu [professor] trago também a informação pra sala de aula, e juntamos essas informações, e transformamos isso em formação, ele é o sujeito também [...] tanto quanto eu...”. Sujeito que, segundo Freire (2009), abre-se para o mundo e aos outros e que, nesse gesto, inaugura a relação dialógica que confirma a sua inquietação, sua curiosidade, sua incompletude no movimento permanente na História. No ambiente participativo, o fazer didático-pedagógico se dá com o aluno e não para o aluno, o que significa, nos termos de Freire (2009), abrir-se à realidade dos educandos com os quais o educador compartilha a sua atividade docente. Parece haver, na explicação de P2, a mesma inquietação daquele educador quando este se pergunta, ao discutir sobre a disponibilidade do diálogo na prática pedagógica: “como ensinar, como formar sem estar aberto ao contorno geográfico, social, dos educandos?”. O espírito de comum-unidade, de comum-união, mencionado por P2, evidencia o entendimento de que desenvolver o aluno significa, em convergência com a opinião de P1, “formar o individuo pra viver harmonicamente em sociedade”. Conforme ficou evidenciado, informar e formar se articulam quando os envolvidos no processo de desenvolvimento humano participam da construção desse mesmo processo. O que significa, por parte do professor, preocupar-se com a realidade do aluno e com a sua preparação para viver em harmonia na sociedade. 3.1.2.3.6. Conhecimento

97

Na opinião de P2, o processo de desenvolvimento humano envolve mais do que aspectos cognitivos. O conhecimento seria tão somente o amálgama desse processo. Para ele, a dimensão informativa é o que o aluno, enquanto ser humano, capta, recebe externamente, sendo que à mesma se juntaria a dimensão formativa: [...] As duas dimensões, informativa e formativa, elas caminham muito juntas, mas tem uma relativa diferença, porque uma vem mais de fora, pra dentro; esse movimento de trazer a informação, trazer o conhecimento pra ele [aluno], por vários meios [...] vai se processando na sua formação, de seu caráter, sua personalidade, da sua estrutura mental, seu horizonte cultural... (P2).

Desse modo, o processo educacional desenvolve o aluno na medida em que se estabelece uma dinâmica que envolve, dentre outros, o conhecimento, a cultura na qual ele está inserido, contribuindo para a formação da personalidade do indivíduo. O participante entende que, ao vivenciar essas situações, à sua volta, a construção de sua identidade se processa de forma mais eficiente. Contextualizando esta fala para o mundo contemporâneo, trata-se de resolver o dualismo ontoepistemológico instalado que prioriza aspectos cognitivos em detrimento de itens culturais, impedindo a integração entre informação e contexto sociocultural, econômico e político. Significa combater este dualismo, o qual reduz a condição humana ao aqui e agora. Com efeito, nesta contemporaneidade, o mundo e os indivíduos se encontram coisificados, imersos numa racionalidade que leva à ilusão de que a ciência e a tecnologia são capazes de resolver sozinhas as grandes questões humanas e até mesmo sociais. A abertura ontológica necessária à descoisificação e à construção de paradigmas humanizadores passa pela articulação entre conhecimento científico e outros tipos de conhecimento, condizente com a multidimensionalidade humana e social. Fundamentalmente, essas ações consistem em religar as três esferas de valores interdependentes denominados por Wilber (2006) como os Três Grandes. Um religar que exige do processo educacional uma dinâmica que possibilite ao educando criar estruturas mentais e culturais.

3.1.2.3.7. Cognição e emoção

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Para Freire (2009), educar envolve a integração entre afetividade, bem como alegria, à formação cientifica séria. Envolve, também, clareza política dos educadores. Segundo Morin (2008a), o trágico, o sublime, o irrisório, o amor, a dor e o humor devem ser concebidos como fontes de conhecimento e de verdade. Por sua vez, Marchesi (2008) explica que professores competentes, que pensam assim, alimentam o desejo de aprender e, simultaneamente, ampliar conhecimentos, considerando o desenvolvimento afetivo e a capacidade de conviver. Neste sentido, os participantes foram perguntados: “Que condições o professor deve proporcionar aos alunos, em sala de aula, para que haja equilíbrio entre os aspectos cognitivos e emocionais?”. Para P1, deve haver integração entre escola, família e comunidade, pois, segundo ele, a formação deve contribuir para desenvolver valores, preparar no aspecto profissional e, fundamentalmente, preparar para a vida social harmônica. Para P6, “a busca desse equilíbrio é uma procura incessante do professor [que envolve] sua atitude e sua concepção do ser humano”. Segundo P7, é necessário “manter a sala sob controle”, o que significa “proteger, incentivar, reforçando aprendizados” e fazer “trabalhos em grupo”. Para o participante, o controlar pressupõe aproximar-se dos alunos: “isso é fundamental para manter esse equilíbrio entre o aprendizado cognitivo e os aspectos emocionais”. Os participantes P3, P5 e P8 enfatizaram as metodologias de ensino. Para P3, são as leituras, discussões e seminários que auxiliam o educador a perceber onde o processo pode melhorar. P5 entende ser importante esclarecer os papéis, conhecer os alunos e oferecer espaços para manifestação, com leituras que mostrem o valor das teorias visando ao fortalecimento de conhecimentos. Finalmente, partindo da compreensão de que “a aprendizagem significativa é aquela que é feita com emoção”, P8 afirmou que o professor deve “associar aquele conhecimento a algo prático, a algo ligado ao dia a dia, à vida, às necessidades...”. Numa perspectiva mais subjetiva, P2, P4 e P7 disseram que o professor não deve levar problemas particulares para a sala de aula e, sim, promover a participação em clima prazeroso pelo aprender, com empatia e diálogo: “na medida em que eu consigo criar um ambiente emocionalmente gostoso, de se viver prazerosamente na sala de aula, isso facilita, em muito, o aluno entender a, digamos, a minha mensagem em termos de conhecimento” (P2).

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Estas preocupações e opiniões se coadunam com as reflexões de diversos autores, dentre eles, Casassus (2009), Santos (2007) e Vasconcelos (2004). Para eles, e outros, o conhecimento cognitivo é importante, mas os aspectos emocionais no processo educacional devem ser valorizados. Autores criticam, dentre outras coisas, o fato de estes aspectos estarem sendo mal trabalhados por educadores e serem concebidos como coisas do coração que se encontram distantes do pensamento científico e lógico-matemático.

3.1.2.3.8. Consciência e exemplo O participante P8 entende que o processo educacional deve contribuir com a conscientização do aluno, para a mudança de atitudes, transformando-o em verdadeiro cidadão. Formar, para P8, é levar o aluno a mudar posturas a partir do conhecimento adquirido, sendo que isto acontecerá somente se houver “a conscientização das pessoas que estão nesse processo educacional”. Os participantes entendem que a maior conscientização do aluno exige que o educador esteja preparado como pessoa e não somente como profissional (P1); que o educando esteja aberto às mudanças (P1); que o educador saiba o que fazer com os conteúdos curriculares (P6); saiba, também, que é necessário desenvolver valores (P4). Entendem que ao educador cabe inspirar aos alunos: “o professor tem esse papel de educador porque ele tem que dar o exemplo” (P8). Seria, de acordo com Freire (2009), dar às palavras a corporeidade do exemplo. De outra forma, não pode haver pensar certo, isto é, ficam faltando compreensão e interpretação profundas dos fatos. Compreender profundamente os fatos, interpretando-os da perspectiva histórica que perpassa a ação educativa, faz parte do conjunto de preocupações do educador voltado para a conscientização do educando. Especialmente neste mundo, em que os desenvolvimentos científicos, técnicos e sociológicos interretroagem em relações estreitas e múltiplas (MORIN, 2008b). Desse modo, educador e educando se afastam da divinização ou diabolização da tecnologia ou da ciência, uma atitude altamente negativa e perigosa do pensar certo (FREIRE, 2009).

100

3.1.2.4. Sobre o discurso institucional

Para Morin (2008a), resistências à reforma do pensamento podem ser a rigidez, a inflexibilidade e a burocratização da máquina da educação. Para o autor, isto configura um cenário do qual participa a imensa maioria dos professores, que se encontram instalados em hábitos e na autonomia de suas disciplinas. Desse modo, é coerente afirmar que o processo educacional desenvolve o educando tanto mais o professor internalize o discurso institucional. Em vez de ficar preso a orientações rígidas e aos exageros da burocracia, o professor atualizado participa, critica, propõe. O professor que conhece os fundamentos da instituição na qual atua, certamente desempenha melhor o papel para o qual está designado. Sabendo qual é o discurso institucional da escola onde leciona, ele aproveita, o melhor possível, as oportunidades para desenvolver seus alunos. Nesta perspectiva, os participantes foram perguntados: o desenvolvimento humano é mencionado no PPC de Pedagogia (ou Administração) e no PE de sua disciplina? Três

participantes

não

lembraram o que o PPC menciona sobre

desenvolvimento humano; outros se recordaram de algumas passagens. P8 recordou-se que “a universidade tem que atuar na comunidade em que vive [...] promovendo um desenvolvimento de maneira sustentável”. O participante P3 falou que algumas disciplinas, como a psicologia do desenvolvimento e a psicologia da adolescência “contemplam essas questões do desenvolvimento humano”. P5 lembrou que o PPC “trabalha essa dimensão do desenvolvimento humano [mencionando] a questão da interação [...], trabalhos em grupo e muitas vivências práticas”. P5 explicou que essa interação é trabalhada na dinâmica curricular desenvolvida pela universidade, tendo o Prêmio Nacional da Qualidade (PNQ) como modelo de referência. Para P1 e P7, o curso de Administração forma para que o indivíduo seja um cidadão que contribua com o desenvolvimento social do país. Quanto ao PE, dois participantes não lembraram o que é mencionado sobre o desenvolvimento humano. Já o participante P3 foi categórico ao afirmar que “não tem nada que mencione a questão do desenvolvimento humano”. P2 relatou que “o Plano não reza, não tem, assim, um tópico sobre desenvolvimento humano e sobre o aluno. Mas todos os conteúdos levam a essa visão, trabalhando a questão do desenvolvimento humano”.

101

Enfatizando a formação profissional, P5 lembrou que o PE de sua disciplina tem como objetivo desenvolver competências, tais como: trabalho em equipe, tomada de decisão, comunicação, liderança, planejamento, trabalhar com dados e fatos. O participante P8 entende que o desenvolvimento do aluno, mencionado no PE, restringe-se à formação técnica: “a ementa, ela aborda, digamos, assim, um desenvolvimento, mas um desenvolvimento de um conhecimento técnico aplicado à administração”. Finalmente, P6 e P1 lembraram que o PE menciona o senso crítico e o trabalho em equipe. Para P6, estas ações sinalizam um trabalho que vai além de um simples conjunto de informações.

3.2.

O QUE É PRATICADO

Para identificar na dinâmica curricular, desenvolvida na sala de aula, a articulação entre as dimensões informativa e formativa, que é o terceiro objetivo específico desta pesquisa, utilizaram-se os apontamentos obtidos nas observações das aulas. Enquanto o que é proposto foi construído pelos discursos da instituição e dos participantes, o que é praticado compõe-se de enunciados, falas e gestos identificados nas aulas observadas. Em relação aos procedimentos de análise, enquanto os discursos foram submetidos à análise categorial como unidades de codificação, verificando-se a presença ou ausência dos temas, a comunicação não verbal (posturas, gestos, distância espacial, manifestações emocionais e regras de cortesia) entre professores e alunos foi submetida a uma variante da análise de avaliação (BARDIN, 2009).9 Para desenvolver a análise comparativa, foi elaborada uma tabela de dupla entrada (temas/participantes) para demonstrar a quantidade de evidências por curso, que foram organizadas segundo codificação específica (falas/gestos). 9

Segundo Bardin (2009), a análise de avaliação se fundamenta na linguagem “representacional”, aquela que representa e reflete diretamente quem a utiliza, possibilitando trabalhar com dados explícitos na comunicação e fazer inferências a respeito da fonte emissora. Trata-se de uma técnica utilizada na análise de conteúdo que toma como critérios a direção e a intensidade dos textos considerados. Como neste estudo optou-se por fazer uma comparação entre “o que é proposto” (PPC’s, PE’s e entrevistas) e “o que é praticado” (falas e gestos), precisava-se de uma técnica que permitisse realizar inferências envolvendo aspectos significativos identificados nos textos institucionais, nas falas e nos gestos dos participantes – tendo como critérios a direção e a intensidade.

102

Para análise dos dados, foram estabelecidos dois conjuntos de informações: a) oportunidades de formação integral; b) aproximações e distanciamentos. a) Oportunidades de formação integral, identificadas na sala de aula, considerando dados da categoria articulação entre informar e formar e os que foram coletados segundo o roteiro da observação, seguidas de análises sobre as relações entre as oportunidades e as ações didático-pedagógicas utilizadas na sala de aula. As informações estão distribuídas por: temas, cursos e participantes. Os temas são decorrentes das respostas dos participantes sobre a dimensão informativa e a formativa, conforme apresentado na página 92. Os cursos são aqueles selecionados para a pesquisa e os participantes são representados pelas denominações que lhes foram atribuídas (ver página 74). O Quadro 5 apresenta estas informações. b) Aproximações e distanciamentos entre o que é proposto e o que é praticado, tomando como critérios a direção e a intensidade das falas e gestos identificados nas aulas.

Pedagogia P1

Temas

P2 F

Administração

P3

F

G

G

1. Cognição e emoção

2

1

3

3

2. Ambiente participativo

5

1

4

1

F

P4

G

F

6

3

G

P5 F

G

3

2

1

6

3. Consciência e exemplo

10

5

3

4. Mercado de trabalho

1

5

9

1

1

5. Visões de mundo

1

6. Conteúdo

1

8. Visão do ser humano

20

G

F

G

14 6

4

1

4

9

2

2

3

3

4

5

1

P8 F

G 1

4

39 34 15

1

1

6

1

3

1

1 2

P7

1

1 9

F

1

7. Conhecimento Totais

P6

2 1

5

13 6

3

0

T o t a i s 49

22 10 27

2 8

10 9

5

1

150

Quadro 5 – Oportunidades de formar integralmente o educando. Fonte: observações em sala de aula. Legenda: F – Fala; G – Gesto. P1 a P8 – Classificação dada aos participantes.

As oportunidades de formação integral foram organizadas em 8 temas, totalizando 150 fatos, sendo 58 no curso de Pedagogia e 92 no curso de Administração. Quanto às atividades didático-pedagógicas para desenvolver integralmente os alunos (informação e formação), nas aulas de Pedagogia, os professores P1 e P3

103

desenvolveram 30 destas oportunidades por meio de aula expositiva, filme e leitura dirigida. O professor P2 utilizou apenas aula expositiva, contribuindo com 25 oportunidades. Nas aulas de Administração, os professores P5, P6 e P7 ofereceram 86 oportunidades de desenvolvimento integral dos alunos por meio de aula expositiva, jogo, seminário e estudo dirigido. P8 utilizou tão somente aula expositiva como metodologia de ensino, oferecendo 6 oportunidades para desenvolver integralmente os alunos.

3.2.1. Aproximações e distanciamentos do que é proposto

3.2.1.1. Aproximações

De modo geral, a prática em sala de aula (falas e gestos) se aproximou dos discursos (PPC’s, PE’s e opiniões dos professores participantes). As evidências mais significativas observadas no processo educacional desenvolvido em sala de aula vinculam-se à categoria articulação entre informar e formar. Perceberam-se esforços por parte dos participantes em desenvolver maior equilíbrio entre os aspectos cognitivos e emocionais. Foram identificados falas e gestos significativos para a articulação entre o aprendizado desejado e o clima emocional da sala de aula. O professor P6 buscou distribuir de maneira equânime sua atenção aos alunos enquanto desenvolvia suas atividades. A atenção aos alunos foi um aspecto encontrado também nas ações de outros professores. Estas falas e gestos dos professores participantes evidenciam uma aproximação com as propostas do curso de Pedagogia, que busca atingir, dentre outras, a “dimensão humana, cujo foco de atenção é o educando, enquanto pessoa, com características físicas, emocionais e psicológicas únicas” (PPC, p. 25). Observou-se que o discurso e a prática de P2 são coerentes. Para ele, cognição e emoção “andam juntas no processo educacional”. Na aula observada, este participante se manteve permanentemente calmo, dialogando com os alunos e explicando com argumentos consistentes. A busca pela participação dos alunos foi ação permanente dos professores participantes. A prática de P2 se constitui em exemplo, ao promover discussões de temas, como liberdade, valores e ética. Essa ação do professor é coerente com o

104

seu depoimento na entrevista, ao afirmar: “quando eu faço educação para o aluno, para alguém, o aluno não participa; sou eu que estou fazendo para ele [...] Agora, quando eu faço educação com o aluno, é diferente”. O professor P6 também buscava a participação dos alunos, discutindo situações reais na sala de aula. Da mesma forma, o participante P8 buscava obter a participação dos alunos, vinculando o conteúdo a situações reais de empresas. Outro destaque refere-se à procura, por parte dos participantes, pela formação da cidadania junto aos alunos. Obediência às regras, respeito aos alunos e escuta de suas manifestações, evidenciaram um processo educacional preocupado em despertar para a autonomia e em desenvolver valores. Para P5, um processo educacional deve articular teoria e prática. Esta integração ê também proposta no PPC de Administração. Outras falas e gestos dos participantes evidenciaram preocupação com a preparação para o trabalho, com o compartilhamento de visões de mundo, com o conteúdo e com a visão do ser humano. A preocupação em preparar para o trabalho, evidenciada no discurso de P3, aproximou-se de sua prática em sala de aula. O professor fez referência ao estágio como sendo um recurso que favorece a preparação para o trabalho. Quanto ao compartilhamento de visões de mundo, o professor P1 fez referências sobre a necessidade de maior integração entre as questões sociais discutidas em sala de aula. O uso da internet em cursos a distância foi trazido na aula observada como exemplo dessa integração. Embora os assuntos explorados por P6, em sala de aula, não favorecessem a articulação entre conteúdos e desenvolvimento de valores, as falas e gestos desse professor evidenciaram uma prática que não se limitou a transmitir conteúdos. Atitudes de respeito, paciência, clareza, interação, cooperação e interesse pelas pessoas destacaram-se na atuação desse professor. Segundo P6, “o educador que não tem uma concepção do ser humano, que não veja a pessoa na sua integralidade, provavelmente enfatizará o aspecto informativo”. Em sua aula, o participante foi coerente com esta fala ao demonstrar carinho pelos alunos, provocar atitude crítica e curiosidade por meio de tema como direito tributário o qual possivelmente poderia favorecer a dimensão informativa da

105

educação colocando em segundo plano as questões axiológicas necessárias à formação integral do sujeito.

3.2.1.2. Distanciamentos

Os distanciamentos mais significativos entre discurso e prática identificados nas aulas observadas estiveram relacionados com os seguintes temas da categoria articulação entre informar e formar: desenvolvimento de valores, conscientização e conteúdo. O PPC de Administração prevê que o professor deve se preocupar com o desenvolvimento pessoal dos alunos, buscando atingir este objetivo por intermédio de ações didático-pedagógicas que envolvam trabalhos em equipe e comunicação e expressão. No que se refere ao desenvolvimento de valores, duas situações observadas em sala de aula não foram aproveitadas pelo professor para que esse desenvolvimento se efetuasse. Na aula de P5, este participante explicou que “a principal característica do jogo de empresa é despertar o espírito competitivo, que é natural, que pode ser trabalhado de forma positiva”. Na aula de P7, a discussão girava em torno da vantagem de um modal de transporte

10

sobre outro (terrestre,

aéreo ou aquário), instalando-se clima de competição. Em tom de brincadeira, um aluno foi à frente da sala e falou em voz alta: “eu vim aqui para acabar com essa discussão...”. Ainda que houvesse clima de descontração na atitude, o tema competitividade não foi explorado no sentido de desenvolver ou aprimorar maior consciência moral junto aos alunos. Quanto ao tema conscientização, para P8, o processo educacional articula informação e formação quando o aluno internaliza a necessidade de mudar atitudes e maneiras de se relacionar. Na aula deste professor, algumas oportunidades para maior conscientização sobre valores implicados na relação entre alunos e professor

10

Por modal de transporte, ou modo de transporte, SLACK et al. (2002) designam a tecnologia por intermédio da qual os bens de uma organização são movimentados. Estes modais podem ser: rodovia, ferrovia, hidrovia, via aérea e dutos.

106

foram perdidas. A situação na sala de aula esteve confusa, sem interferência do professor, o que demonstra um distanciamento entre seu discurso e sua prática. Em relação ao tema conteúdo, os participantes declararam que somente com a inclusão de assuntos relacionados às ciências sociais na grade curricular seria possível integrar plenamente informação e formação. Entretanto, o professor participante P3 perdeu a oportunidade de promover esta integração ao finalizar uma sessão de filme na aula observada sem promover uma discussão sobre a mensagem veiculada no filme.

3.3. O QUE PODE SER DITO PELO NÃO DITO Nesta pesquisa, buscou-se identificar o que foi dito e não dito, valendo-se das descrições do discurso institucional e do discurso dos participantes, como também da prática observada em sala de aula, chegando-se a novas significações, o que representa o momento da inferência na análise de conteúdo. Segundo Bardin (2009), a inferência é o momento da análise de conteúdo que remete ou se apóia em elementos constituintes do arcabouço clássico da comunicação, tais como: emissor, receptor, código, canal, mensagem e significação. Neste estudo, as inferências realizadas pelo pesquisador recaíram sobre o elemento significação. Para Laville e Dionne (1999), na análise de conteúdo, o olhar do pesquisador dirige-se para nuanças de sentido existentes entre as unidades, para elos lógicos entre essas unidades ou entre as categorias que as reúnem. Isto porque a significação de um conteúdo se encontra amplamente no que ele possui de específico em seus elementos e nas relações entre eles. Dado que a inferência é uma interpretação controlada (BARDIN, 2009), apreende-se que a mesma se situa em limites definidos pelos objetivos da pesquisa e pelas realidades identificadas nos discursos (PPC’s, PE’s e entrevistas) e nas práticas observadas em sala de aula. Considerando esses limites, bem como o tipo da pesquisa realizada, foi possível desenvolver inferências baseadas em elementos importantes encontrados nos discursos e nas práticas realizadas para a instalação de uma nova ordem.

107

Uma nova ordem que considere a pluralidade de conhecimentos e a necessidade de diálogo entre ciências naturais e ciências sociais. Uma nova ordem que reconheça a importância do aprender a viver no mundo plural, multicultural e globalizado e que considere a emoção e a razão na construção do fazer moral. Enfim, buscou-se identificar o que esteve submerso a estes discursos e práticas, capaz de revelar um processo educacional que afirme a importância da formação para a integralidade humana e procurou-se identificar, também, as dificuldades para o desenvolvimento dessa integralidade.

3.3.1. Articulação para uma nova ordem Nesta pesquisa, constatou-se que, de modo geral, o curso de Administração contribui para aproximar as ciências naturais das ciências sociais, aspecto fundamental

na

implementação

de

uma

ordem

que

seja

favorável

ao

desenvolvimento humano. As oportunidades de desenvolver os alunos, contribuindo para aproximar essas duas vertentes do conhecimento, ocorreram com mais frequência nos momentos em que houve diversificação das ações didáticopedagógicas – aula expositiva, jogo, seminário e leitura dirigida. Sobre o assunto, vale mencionar que, há tempos, a alternância do método expositivo com outras técnicas didáticas é tida como uma prática salutar na sala de aula (HAIDT, 1994). Há quase cinquenta anos, por exemplo, Anísio Teixeira criticava a ênfase que era dada ao ensino meramente expositivo (TEIXEIRA, 1962). Para ser coerente com o conhecimento do mundo pós-moderno, o processo educacional deve ser capaz de articular ciências naturais e ciências sociais por meio da pluralidade metódica (SANTOS, 2008). Outra constatação importante na construção de uma nova ordem verifica-se na declaração dos participantes quanto à necessidade de o educador ter clara a sua concepção do ser humano. Com efeito, se cada época da história da humanidade projeta uma imagem ideal do ser humano (GILES, 1983), espera-se que o educador atualize sua concepção do ser humano de acordo com o seu tempo e o entorno geográfico. Para alguns participantes dos dois cursos pesquisados, a existência na grade curricular de conteúdos vinculados às ciências antropossociais é uma condição sine qua non para a implementação de ações didático-pedagógicas favoráveis ao

108

desenvolvimento dos alunos. Entretanto, a maioria dos participantes relatou que o mais importante é a atitude do professor em sala de aula, cabendo a ele “puxar” um pouco para a questão dos valores; ser um exemplo para os alunos; estar preparado para resolver pequenos conflitos. Quanto à importância de aprender a viver no mundo contemporâneo, aspecto crucial na implementação de uma ordem mais favorável ao desenvolvimento humano, um participante do curso de Pedagogia entendeu que o equilíbrio entre os aspectos cognitivos e emocionais envolve a integração entre escola, família e comunidade. Para ele, a formação do aluno deve contribuir para desenvolver valores, preparar para a vida profissional e, sobretudo, preparar para viver harmonicamente na sociedade. Esse entendimento reforça a posição de Araújo (2007), para quem a intervenção social favorável ao desenvolvimento de valores é a implementação de unidades complexas. O autor se fundamenta nas ideias piagetianas ao teorizar sobre estratégias escolares no desenvolvimento de valores. Toma o conceito de valor como uma construção baseada em projeções de sentimentos positivos do indivíduo sobre objetos, pessoas e relações. Com isto, entende que à educação cabe reorganizar tempo e espaço escolares, bem como as relações envolvidas, por meio da inclusão, nos currículos e na sua dinâmica, seja na escola, seja na sala de aula, de conteúdos relacionados com sentimentos, emoções e fundamentos éticos desejados para o desenvolvimento cultural do aluno. Estas opiniões dos professores participantes levaram a inferências que confirmam entendimentos dos diversos autores a respeito da complexidade que envolve o ato educativo. Consta na literatura sobre o assunto que a integração entre os aspectos informativos e formativos da educação não depende de um ou outro elemento isolado, não se construindo, portanto, a partir de uma visão linear. O desenvolvimento humano não ocorrerá, por exemplo, somente buscando-se a conscientização dos alunos para a mudança de atitudes e de maneiras de se relacionar com o mundo e com os outros. Nem se restringirá, também, à preparação para o mercado de trabalho. Deste modo, as inferências confirmam o posicionamento de autores sobre a implementação de uma ordem favorável ao desenvolvimento humano fundamentada em maneiras inaugurais de conceber a educação. A partir de um novo olhar, a educação passa a ser mais questionadora das relações existentes entre ciência e virtude, bem como do valor do conhecimento tido como vulgar e desprezado pela

109

ciência (SANTOS, 2000). Este olhar considera que a educação é conexa com a ideia de que o indivíduo deve ser capaz de enfrentar as exigências do mundo pósmoderno acelerado e que clama por uma nova ética (PEDRO, 2002). Pressupõe este olhar que a educação vincula-se à ideia de uma reforma do ensino que, por sua vez, impulsiona a reforma do pensamento, e vice-versa (MORIN, 2008a).

3.3.2. Intenções e hipocrisias organizacionais Submerso aos discursos (PPC’s, PE’s e entrevistas) e às práticas didáticopedagógicas observadas em sala de aula e, situando-se no ponto extremo das análises realizadas, encontram-se três intenções organizacionais: função social da escola, interdisciplinaridade e formação integral. Intenções organizacionais que foram inferidas com base nas descrições encontradas nos discursos e nas práticas e correspondem, considerando Bardin (2009), às variáveis inferidas alcançadas por intermédio das técnicas e procedimentos da análise de conteúdo. Estas intenções organizacionais se organizam numa tríplice estrutura associativa, a qual corresponde a uma segunda estrutura que é composta por três polos articulados naturalmente – sociedade, escola e aluno (ver Fig. 10). Há uma relação biunívoca entre intenções e polos. Verificou-se que no interior daquelas intenções falta uma articulação entre aspectos importantes para que o processo educacional contribua efetivamente para o desenvolvimento dos alunos. Constatouse, a partir das descrições realizadas na pesquisa, que esse fato se relaciona com as hipocrisias organizacionais teorizadas por Brunsson (2007). Função social da escola Sociedad

Escola Interdisciplinaridade

Aluno Formação integral

Figura 10 – Intenções organizacionais, inferidas no processo educacional pesquisado. Fonte: descrições dos resultados e análises.

110

Para Brunsson (2007), as hipocrisias organizacionais caracterizam-se pelas contradições existentes entre as decisões tomadas e as ações realizadas na organização. Para o autor, as hipocrisias organizacionais mantêm a organização viva na medida em que contribuem para acomodar conflitos intergrupais e proporcionar flexibilidade para resolvê-los11, assim como legitimar a organização de modo a continuar assegurando recursos para a sua manutenção.

3.3.2.1 Função social da escola

Este trabalho identificou que existe, em relação aos cursos pesquisados, hipocrisia organizacional quanto à função social da escola. De acordo com a análise documental dos PPC’s e PE’s, o papel sociocultural da educação de formar para o trabalho e para valores encontra-se presente nos objetivos do curso de Pedagogia; encontra-se presente, também, no curso de Administração quando o PPC menciona que o aluno será formado no campo econômico, político, cultural e social do País. Nos PE’s dos dois cursos, esse papel encontra-se presente, dentre outros, nos objetivos de formar para o compromisso com uma ética profissional e com a vida em sociedade;

formar

para

a

visão

holística

das

organizações,

produzindo

conhecimentos contextualizados. Este discurso institucional, de caráter normativo, garante a legitimidade social dos cursos na medida em que o cumprimento da função social da educação é anunciado no PPC e nos PE’s como se fosse uma lei a ser obedecida pelos envolvidos no processo educacional. No entanto, as pressões e exigências no âmbito dos cursos, conforme evidenciou a pesquisa, caracterizam contradições que distanciam o discurso da prática. Esta situação define uma hipocrisia organizacional, pois, em seu nascedouro, as decisões estão fadadas a não se cumprirem (BRUNSSON, 2007). Se, por um lado, tal hipocrisia é favorável à gestão organizacional por funcionar como uma forma de resolver conflitos intergrupais ao conferir flexibilidade à organização (LIRA, 2010), por outro lado, seus desdobramentos impactam o

11

Cabe explicar que o conceito de hipocrisia organizacional proposto por Brunsson (2007) não possui conotação pejorativa ou condenatória que, em princípio, poderia supor. Como explica Lira (2010), neste conceito não está em jogo um juízo de valor, mas um juízo de realidade sobre o comportamento das organizações.

111

processo educacional, como evidenciaram algumas falas dos professores participantes. Os depoimentos dos participantes P1 e P8 são emblemáticos. Para o primeiro, a função social da escola tem se perdido: “O verdadeiro papel da escola é preparar os alunos para realizarem exames avaliativos nacionais, estaduais e municipais ou formá-los para serem cidadãos?”. Para P8, a universidade deveria apoiar trabalhos filantrópicos em prol do meio ambiente, envolvendo os alunos. Esta fala evidencia uma preocupação em formar o aluno para ter compromisso com a ética profissional e com a organização da vida em sociedade, conforme preconizam os PE’s de vários professores dos cursos pesquisados.

3.3.2.2. Interdisciplinaridade

A pesquisa identificou que a interdisciplinaridade presente no discurso da instituição se caracteriza como uma hipocrisia organizacional. Os documentos normatizam sua implementação, porém a mesma não acontece de acordo com a proposta institucional. No PPC de Pedagogia consta que o curso se sustenta numa filosofia que busca desenvolver mecanismos de interdisciplinaridade e flexibilização do currículo a fim de permitir “o desenvolvimento da progressiva autonomia intelectual do aluno” (p. 21). Essa autonomia é considerada condição necessária para que o egresso possa vir a superar os desafios de renovadas condições de exercício profissional e de produção do conhecimento. De acordo com o documento, estes mecanismos interdisciplinares serão desenvolvidos na medida em que as dimensões técnica, humana e político-social do educando sejam envolvidas. O PPC de Administração, por sua vez, normatiza a integração entre as disciplinas do curso como uma epistemologia a ser adotada para melhor compreensão dos fenômenos da administração de empresas. Estas normatizações sobre a interdisciplinaridade legitimam os cursos na medida em que anunciam a integração de aspectos da realidade social e científica a qual foi fragmentada pela Modernidade (MORIN, 2008b; SANTOS, 2007, 2008; WILBER, 2006). Para o curso de Pedagogia, o aluno deve ser capaz de “articular ensino e pesquisa na produção do conhecimento e na prática pedagógica” (p. 41). Para o curso de Administração, os alunos devem ter uma “visão holística das organizações bem como compreender a interdisciplinaridade que a gestão

112

administrativa requer” (PE da disciplina Jogos de empresas, p. 1). Apesar do que propõem os dois cursos, a pesquisa identificou que a dinâmica curricular desenvolvida é diferente do discurso institucional. De acordo com os depoimentos, os participantes sentem falta de uma estratégia integradora entre as diversas disciplinas, envolvendo conteúdos, tais como: ética, cidadania, moral, valores, relacionamentos, leituras e autonomia. Para o professor participante P1, embora ética e cidadania sejam assuntos que constem dos parâmetros curriculares nacionais como temas transversais, isto não acontece porque eles permanecem no nível das conceituações. Para P2, por sua vez, a interdisciplinaridade e a transdisciplinaridade contribuem para desenvolver valores. No entanto, o participante citou que a formação dos alunos tem sido um processo de “apartação” dos conhecimentos científicos, filosóficos e religiosos, sendo necessário organizar as informações dessas três áreas do saber humano de maneira que haja continuidade dos assuntos, o que contribuiria para desenvolver os alunos. Segundo a opinião de P7, a descontinuidade favorece a perda de oportunidades para desenvolver valores. De acordo com os participantes, o relacionamento entre professor e alunos, bem como destes entre si, também seria favorecido com a concretização da interdisciplinaridade. Para o participante P4, o tema conflito deveria ser explorado melhor no curso de Pedagogia, não ficando a cargo de decisões solitárias dos professores a implementação de ações didático-pedagógicas. Para P5, os alunos deveriam ser incentivados a ler diversos autores sobre determinado tema, o que contribuiria para desenvolver diferentes visões sobre o mesmo assunto e para adquirir autonomia. Por sua vez, P8 entende que esta aquisição será possível se a universidade desenvolver mais atividades, programas e projetos interdisciplinares – além do PIPA12.

3.3.2.3. Formação integral

12

Como foi dito anteriormente, o PIPA é um trabalho interdisciplinar do curso de Administração, que visa a integrar teoria e prática, incentivando os alunos a verificarem a aplicação dos conhecimentos adquiridos (p.11 do PPC).

113

A pesquisa evidenciou, também, hipocrisia organizacional no discurso da instituição sobre a formação para a integralidade humana. Segundo o PPC de Pedagogia, os egressos do curso estão aptos a “promover práticas educativas que desenvolvam integralmente a criança até seis anos, em seus aspectos físicos, psicossociais e cognitivo-linguístico e refletir para compreender” (p. 32). Por sua vez, o egresso do curso de Administração deve saber planejar e solucionar problemas, ter senso crítico, capacidade de contextualizar, visão sistêmica, gosto pelo trabalho em equipe e, finalmente, ser empreendedor. O caráter formal e institucionalizado destes discursos legitima o objetivo de preparar pedagogos e gestores, bem como administradores, para serem pessoas críticas, contextualizadas com o mundo e com os valores da educação e da administração de organizações. No entanto, a preparação desses futuros profissionais evidenciou lacunas na formação integral do educando. Foi também constatado que os participantes se desdobravam para que os futuros profissionais concluíssem a graduação com essas competências. Entretanto, dificuldades práticas eram encontradas para desenvolver valores e formar os alunos numa perspectiva mais humanista. Para P1, valores são desenvolvidos a partir de três condições. O professor precisa estar preparado tanto profissional como pessoalmente para o exercício de sua tarefa, fazendo o que diz e falando somente o que faz. O currículo precisa estar contextualizado, sendo necessário desenvolver “temas atuais envolvendo conteúdos como a ética e a dignidade humana”. O aluno precisa estar aberto a mudanças. No entanto, de acordo com o depoimento do participante, nenhuma dessas três condições se efetiva porque “a função social da escola está totalmente deturpada. Os professores não sabem quais são os seus verdadeiros papéis e, com isto, entram no jogo de trabalhar conteúdos curriculares para fazer com que os alunos passem no vestibular”. Segundo o participante, este é um dilema vivido pelos professores que provém do descumprimento da Carta Magna brasileira: “a formação para a cidadania é algo que a Constituição prega, mas não é cumprida. Forma-se o aluno somente para o mercado de trabalho”. Para o participante P6, desenvolver valores como autonomia e consciência crítica exige, por parte do professor, mais do que o mero conhecimento do PPC do curso e sua compreensão. Para ele, o PPC de Administração é bem elaborado, no entanto, é sempre possível ao docente descumprir as normatizações, “podendo

114

subverter tudo aquilo”. Segundo P6, o desenvolvimento dos alunos ocorre quando a sua formação “inclui, além da informação, a dimensão política e a cidadania, permitindo-lhes optar pela vida”.

115

CAPÍTULO IV – CONSIDERAÇÕES FINAIS E RECOMENDAÇÕES

A articulação entre conhecimentos e desenvolvimento de valores se constitui num dos grandes desafios do processo educacional. No mundo contemporâneo, este desafio se torna maior. Na busca de soluções para os grandes problemas da humanidade geram-se novos conhecimentos que devem contribuir para aprimorar a condição do ser humano, enquanto ser de razão, emoção e ação. Com base nestas considerações, esta pesquisa indagou como ocorre a articulação entre a informação e a formação para o desenvolvimento integral do ser humano em cursos de Pedagogia e Administração de uma universidade da rede particular de ensino do Distrito Federal. Na revisão da literatura a questão do que é o ser humano foi bastante discutida. Esta discussão envolveu a perspectiva da capacidade humana de pensar, emocionar-se e agir conscientemente. Fica evidente que a abordagem fragmentada do ser humano em dimensões distintas constitui mero recurso didático para compreender melhor o ser humano que, na verdade, é uma unidade que pensasente-quer-age. Evidenciou-se, ainda, que o indivíduo existe na relação significativa que mantém com o mundo e com seus habitantes. Além disso, estudaram-se as diversas concepções filosófico-científicas de educação, e seu papel sociocultural, ficando compreendido que a dimensão social da educação ocorre quando o indivíduo se conscientiza de sua natureza coletiva e busca preservar aquilo que o aproxima dos interesses coletivos. Evidenciou-se, também, que a dimensão cultural da educação se manifesta na tensão entre a dimensão material e a espiritual, sendo constituída pelo acúmulo de experiências humanas. Constatou-se que o caráter axiológico do processo educacional existe independentemente da concepção dos professores sobre valores e das propostas pedagógicas apresentadas. A revisão da literatura permite afirmar que, ao formar para o trabalho e desenvolver valores, a educação atualiza a gênese humana, multidimensional, na medida em que desenvolve o indivíduo para além do aprendizado de conhecimentos acadêmicos e familiares. A concretude destas tarefas, no entanto, passa por duas condições: a reforma do pensamento (MORIN, 2008a) e a valorização da dimensão emocional no processo de construção do conhecimento (SANTOS, 2007).

116

Desse modo, caracteriza-se o processo educacional onde a articulação entre informar e formar se constitui na chave da formação para a integralidade humana. Uma

articulação

que

desenvolve

a

capacidade

de

pensar

e

aprender

estrategicamente, daí a concretude do ser humano pleno, que entende, sente, relaciona-se, intervém e sobrevive neste mundo em mudança (TAVARES, 1996). Uma articulação que forma não para uma cabeça bem cheia, mas para uma cabeça bem feita (MORIN, 2008a). A literatura demonstra que esta articulação implica em situar a ciência como parte de uma ecologia mais ampla de saberes, traduzindo conceitos na cultura dos envolvidos, restabelecendo o equilíbrio entre ciências da natureza e ciências antropossociais. Na medida em que essa articulação reúne num mesmo paradigma ciência e valores, informação e formação, epistéme e antropo, gera um conhecimento que forma integralmente o ser humano. Instaura-se, assim, a prática educacional que forma o indivíduo para aprender a viver num mundo plural, globalizado e de várias culturas, preparando-o para aprender a ser, a conviver, a participar e a habitar num mundo marcado pela diversidade moral (MARIA PUIG, 2007). Constrói-se o ser e o fazer moral, lançando mão da dimensão emocional tanto ou mais do que a racional (CÂMARA, 2003). Como explica Beust (2000), razão e emoção participam da complexa tessitura composta por elementos internos e externos que atuam sobre o indivíduo, originando o agir moral. Estas construções teóricas, estudadas na revisão da literatura, balizaram a presente pesquisa. Para averiguar como ocorre a articulação entre informação e formação para o desenvolvimento integral do ser humano, foram identificados aspectos informativos e formativos do processo educacional, presentes nos documentos institucionais que orientam os cursos pesquisados; identificou-se como a articulação é percebida pelos professores participantes e foram observadas práticas pedagógicas desenvolvidas em sala de aula. Os documentos analisados evidenciaram em relação ao curso de Pedagogia que o mesmo busca, simultaneamente, profissionalizar o aluno e criar condições para que ele seja mais consciente e crítico, bem como tenha uma visão ampliada da realidade na qual irá atuar após a graduação. O curso enfatiza a formação do aluno para aprender a viver, instaurando um processo educacional que valoriza a formação para a integralidade humana, possibilitando-lhe problematizar sua relação

117

com o mundo. As disciplinas de Pedagogia (Didática para o ensino a distância; Reflexões filosóficas: ética, comunicação e marketing; Prática de gestão em escolas e empresas e Metodologia do ensino da educação básica), de modo geral, buscam formar o aluno para articular o conhecimento científico com o desenvolvimento pessoal, contribuindo para um novo pensar sobre o homem, o mundo e os grandes desafios contemporâneos. No curso de Administração, por sua vez, há preocupação com a interdisciplinaridade. Além dessa preocupação, o curso busca, por um lado, a integração entre teorias e práticas e, por outro, oferecer aos alunos a oportunidade de se perceberem como seres em permanente construção (FREIRE, 1987). As disciplinas de Administração (Jogos de empresas; Direito nas organizações; Administração de suprimentos e logística e Administração financeira) estabelecem objetivos que contribuem para desenvolver a capacidade de articular as diversas dimensões da realidade. Portanto, um discurso que coaduna com Pedro (2002), quando afirma que é tempo de implementar uma nova racionalidade, em que os indivíduos sejam capazes de enfrentar as exigências do mundo pós-moderno. Em geral, os participantes não conseguiram dizer se o desenvolvimento humano é mencionado nos PPC’s e nos PE’s, o que leva a inferir o desconhecimento destes documentos por parte dos professores. Desse modo, ficou evidenciada a necessidade de leitura e reflexão mais aprofundadas, por parte dos professores

participantes,

sobre

o

discurso

institucional

apresentado

nos

documentos acima referidos. Ficou evidente que os professores conseguem perceber aspectos essenciais que diferenciam informar do formar. Eles entendem que os aspectos informativos do processo educacional têm a ver com instrução, conhecimento puro, “algo de fora para dentro” e consideram a formação como “algo mais intrínseco”. Evidenciou-se, também, que existe uma pressão para que os professores participantes cumpram os conteúdos cognitivos estabelecidos na “grade curricular” do curso. Alguns depoimentos surpreenderam quando enfatizaram a necessidade de o professor ter uma visão clara sobre o que é o ser humano e quando explicaram que formar é preparar para a vida harmônica em sociedade. Surpreendeu, também, o desejo sincero dos participantes de contribuir para a formação integral dos alunos.

118

A importância do fator emocional, no processo de desenvolvimento do ser humano, também esteve muito presente nos depoimentos e nas práticas observadas em sala de aula. Conclui-se que os objetivos desta pesquisa foram atingidos: a leitura dos PPC’s e dos PE’s permitiu extrair discursos sobre aspectos informativos e formativos preconizados pela instituição; as falas e os gestos dos participantes, identificados nas entrevistas e nas práticas desenvolvidas em aula, revelaram nuanças importantes do processo educacional capaz de desenvolver plenamente o indivíduo. Conclui-se, também, por algumas limitações da pesquisa: as observações das aulas foram realizadas após as entrevistas, levando ao risco de contaminação da prática pelo diálogo estabelecido entre pesquisador e participantes; os resultados das análises de dados coletados nas entrevistas e observações não oferecem quaisquer

possibilidades

de

generalização,

estando

restritos

ao

processo

educacional estudado; a quantidade de aulas observadas, sendo duas por professor, não pode ser considerada representativa da atuação do docente e, finalmente, a não participação de alunos restringe as possibilidades de averiguar a articulação entre o informar e o formar. Os depoimentos obtidos por meio das entrevistas e as evidências provenientes das práticas didático-pedagógicas desenvolvidas na sala de aula possibilitaram a inferência das seguintes intenções institucionais: função social da escola, interdisciplinaridade e formação integral. Estas intenções, que representam as variáveis inferidas com a análise de conteúdo, não se articulam plenamente, mas oferecem oportunidades para a implementação de estratégias de atuação nos cursos condizentes com um processo de desenvolvimento mais integrado. Ao averiguar a articulação entre informar e formar observou-se o quanto é importante estabelecer um diálogo direcionado para a troca de experiências e de concepções entre os professores. Vale ressaltar que o uso complementar da aula expositiva com outras técnicas de ensino oferece mais oportunidades para o desenvolvimento do ser humano na sua integralidade. Vale destacar que as intenções institucionais inferidas nesta pesquisa – função social, interdisciplinaridade e formação integral – ensejam novos estudos. Assim sendo, é possível enumerar alguns pontos relevantes para aprimorar o processo educacional desenvolvido nos cursos estudados:

119

a) Implementar ações sistêmicas envolvendo, na dinâmica curricular, o desenvolvimento de valores. b) Implementar estratégias integradoras entre as disciplinas, envolvendo conteúdos cognitivos e o desenvolvimento da ética, da moral, dos valores na construção de uma cidadania que atenda às exigências da sociedade contemporânea. c) Desenvolver uma dinâmica curricular de maneira que possibilite maior integração entre os conteúdos cognitivos e as questões axiológicas da educação. d) Promover fóruns de discussão com os professores, envolvendo o papel sociocultural da escola, melhor definição de papéis da comunidade acadêmica da escola e desenvolvimento de ações didático-pedagógicas que favoreçam a formação integral do educando. e) Propiciar momentos de reflexão sobre os PPC’s e os PE’s. f)

Implementar programas de leitura, entre os alunos, possibilitando a compreensão e o compartilhamento de visões do mundo.

g) Desenvolver reflexões que contribuam para a re-elaboração das percepções de professores e alunos sobre o saber existente e a sua utilização. h) Incluir, em novos trabalhos, a participação de alunos da Educação Superior e, num espectro mais amplo, escolas, professores e alunos da Educação Básica.

120

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128

APÊNDICE A – ROTEIRO DA ENTREVISTA COM OS PROFESSORES Local _____________________________. Data: ____/____/___. Hora: __________. I. Caracterização do professor: 1. Nome:________________________________________________________ _. 2. Gênero: ( ) F

( )M

3. Faixa etária: ( ) 20 a 30 ( ) 31 a 40 ( ) 41 a 50 ( ) 51 a 60 ( ) acima de 60 anos. 4. Formação acadêmica: Graduação ( ). Qual? ______________. Especialização ( ). Em que área? _______________. Mestrado ( ). Em que área? ______________. Doutorado ( ). Em que área? _________________. 5. Curso/disciplina em que atua: __________________/___________. 6. Tempo total de magistério? _______ anos. II. Aspectos conceituais: 1. Qual a sua percepção sobre as dimensões informativa e formativa do processo educacional? 2. O que você entende por formar o aluno? 3. O desenvolvimento humano é mencionado no Projeto Pedagógico de Curso (de Pedagogia ou Administração)? 4. O desenvolvimento humano é mencionado no Plano de Ensino de sua disciplina? 5. O que entende por autonomia do aluno? 6. Que atividades do processo educacional contribuem para que o aluno adquira autonomia? 7. No processo educacional, o que é fundamental para que o educando adquira uma postura consciente e crítica? 8. Em que o processo educacional contribui para desenvolver melhor o relacionamento entre os alunos?

129

9. Que condições o professor deve proporcionar aos alunos, em sala de aula, para que haja equilíbrio entre os aspectos cognitivos e emocionais? 10. Quais valores consegue desenvolver, em sua disciplina, junto aos alunos? 11. Que atividades didático-pedagógicas, em sua disciplina, favorecem o desenvolvimento de valores? 12. Em que o processo educacional contribui para que os educandos compartilhem as visões de mundo na sociedade contemporânea? 13. Que outras considerações gostaria de acrescentar?

130

APÊNDICE B – ROTEIRO DA OBSERVAÇÃO EM SALA DE AULA Local _____________________________. Data: ____/____/___. Hora: __________.

I. Caracterização do professor:

Considerando que os professores a serem observados serão os mesmos que foram entrevistados, neste roteiro, os itens referentes à caracterização desses professores tornam-se desnecessários. Na análise dos dados, quando necessário, os professores serão identificados por letras e números.

II. Aspectos a serem observados em sala de aula: 1. Número de alunos matriculados. 2. Número de alunos presentes à aula observada no início, meio e fim. 3. Verifica-se articulação entre conteúdos e formação crítica (condições que levem o aluno a adquirir uma postura consciente e crítica)? Como? 4. Verifica-se articulação entre informação e formação, oferecendo condições para o desenvolvimento de valores? Como? 5. Verifica-se articulação entre conteúdos e autonomia: estratégias que conduzem o aluno a desenvolver autonomia? Como? 6. Verifica-se articulação entre a dimensão cognitiva e a emocional: condições oferecidas pelo professor para o desenvolvimento do equilíbrio entre os aspectos cognitivos e emocionais? Como? 7. Verifica-se articulação entre aprendizagem cognitiva e o desenvolvimento de visões de mundo na sociedade contemporânea? Como? 8. Outras observações pertinentes.

131

Políticas Públicas e Gestão Educacional

Licenciatura e bacharelado em filosofia

Pedagogia

Sociologia; MBA em políticas da educação com ênfase em monitoramento e avaliação. Educação infantil

Sociologia e História

Metodologia do ensino superior

História

Desenho industrial e Administração

MBA Marketing, Gestão da comunicação organizacional, Informativa em educ., Tutoria em ensino a distância, Direção estratégica em empreendedorismo corporativo e Direção estratégica do capital intelectual. Direito tributário e Gestão pública no Brasil

Gestão da qualidade e produtividade com foco em planejamento e estratégia organizacional.

Comunicação social

Gestão da qualidade e MBA Marketing

Engenharia de produçãoPlanejamento e estratégia organizacional

Administração de suprimentos e logística

Engenharia civil e oficial do Exército

Matemática e estatística

Aplicações militares

Administração Financeira

Reflexões filosóficas: ética, comunicação e marketing

Prática de gestão em escolas e empresas

Metodologia do ensino da educação básica

Jogos de empresas

Administração

História

Direito nas organizações

Administração

Educação especial

Administraçã o

51 a 60

Didática para o ensino a distância

Curso

Administração Educacional

Pedagogia

Pedagogia

Ciências contábeis e Ciências jurídicas e sociais

Doutorado

Pedagogia

Mestrado

Pedagogia

Especialização

Pedagogia

Graduação

Administração

Faixa etária 31 a 40

Disciplina

41 a 50

Acima de 60

Formação acadêmica

51 a 60 51 a 60 41 a 50 51 a 60

Gênero M

P1 P2

M F

P3 P4

F F

P5 P6

F M

P7 P8

M

Participante

APÊNDICE C – CARACTERIZAÇÃO DOS PARTICIPANTES

132

P7

Administração de suprimentos e logística

Curso Pedagogia Pedagogia Pedagogia Administração

P8

Administração Financeira

Mediatização: os desafios das novas tecnologias de informação e comunicação (NTIC).

Exposição e leitura comentada.

Moral, ética e educação.

Exposição dialogada.

Aprendizagem eficiente.

Avaliação.

Análise do aproveitamento educacional na utilização de jogos de empresa.

Exposição dialogada e filme.

Avaliação escrita com questões subjetivas.

Fim

P6

Direito nas organizações

Metodologia

Meio

P5

Jogos de empresas

Conteúdos

Quantidade de alunos (momento da aula) Início

Metodologia do ensino da educação básica

Pedagogia

Prática de gestão em escolas e empresas

Administração

Reflexões filosóficas: ética, comunicação e marketing

Administração

Disciplina Didática para o ensino a distância

Administração

P4

P3

P2

P1

Professor

APÊNDICE D – CARACTERIZAÇÃO DAS AULAS OBSERVADAS

8

23

22

17

25

22

13

17

12

9

30

32

45

55

52

48

54

55

41

39

34

70

68

62

Jogo e exposição dialogada.

Crédito Tributário. Suspensão e extinção do crédito tributário. Prescrição e Decadência.

Estudo dirigido e exposição dialogada.

Movimentação de materiais na cadeia de suprimentos. Modais: aeroviário, marítimo, ferroviário, rodoviário, dutoviário.

Seminário e exposição dialogada.

Indicadores de Desempenho: risco, retorno e hedge. Indicadores Serasa e 500 MM. Avaliação de empresas: diagnóstico empresarial: empresas com lucro X empresas com prejuízo. Lucro X investimento. Estruturação de capitais. empresas com dívidas X empresas sem dívidas. Empresas com capital de giro X empresas sem capital de giro. Excessos de custos/despesas e consequências. Ciclo financeiro excessivo.

Exposição.

133

APÊNDICE E – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Você está sendo convidado a participar, como voluntário, da pesquisa “Desenvolvimento humano: como se articulam informação e formação no processo educacional?”. No caso de você concordar em participar, por favor, assine ao final do documento. Sua participação não é obrigatória, e, a qualquer momento, você poderá desistir de participar e retirar seu consentimento. Sua recusa não trará prejuízo algum em sua relação com o pesquisador. Você receberá uma cópia deste termo onde constam telefone e endereços do pesquisador, podendo tirar dúvidas do projeto e de sua participação. NOME DA PESQUISA: Desenvolvimento humano: como se articulam informação e formação no processo educacional? PESQUISADOR RESPONSÁVEL: Ivar César Oliveira de Vasconcelos. ENDEREÇO: SQN 116 – Bloco G – Ap 305 – Asa Norte – Plano Piloto – Brasília (DF). TELEFONE: (61) 9224-6781 EMAIL: [email protected]. OBJETIVOS: Averiguar a articulação entre informação/formação como aspecto fundamental para o desenvolvimento integral do ser humano. PROCEDIMENTOS DO ESTUDO: O participante responderá a dez perguntas, relacionadas aos objetivos da pesquisa, em entrevista a ser gravada. A entrevista será realizada na universidade onde o participante dá aula e demorará cerca de cinquenta minutos. O participante também terá duas aulas observadas, por cerca de cinquenta minutos cada aula. A entrevista e a observação acontecem em horários combinados entre o pesquisador e o participante. Os dados coletados serão utilizados

para

análise,

com

dados

coletados

de

outros

participantes,

EXCLUSIVAMENTE para os objetivos desta pesquisa. RISCOS E DESCONFORTOS: Não há riscos e desconfortos a serem provocados pela pesquisa. BENEFÍCIOS: O estudo contribuirá para refletir sobre as dimensões humanas na relação com itens curriculares e com aspectos do processo de ensinoaprendizagem. Contribuirá para maior compreensão do processo educacional nos aspectos cognitivo e afetivo.

134

CUSTO/REEMBOLSO PARA O PARTICIPANTE: O participante não arcará com gastos decorrentes de sua participação na entrevista e observações. O participante não receberá qualquer espécie de reembolso ou gratificação devido à participação na pesquisa. CONFIDENCIALIDADE DA PESQUISA: Fica assegurado total sigilo, assegurando a privacidade do participante quanto aos dados confidenciais envolvidos na pesquisa. Somente serão divulgados dados diretamente relacionados aos objetivos da pesquisa.

Assinatura do Pesquisador Responsável: _________________________________

CONSENTIMENTO DE PARTICIPAÇÃO DA PESSOA COMO SUJEITO

Eu, (nome do participante), CI (número), CPF (número), declaro que li as informações

contidas

nesse

documento,

fui

devidamente

informado

pelo

pesquisador IVAR CÉSAR OLIVEIRA DE VASCONCELOS, dos procedimentos que serão

utilizados,

riscos

e

desconfortos,

benefícios,

custo/reembolso

dos

participantes, confidencialidade da pesquisa, concordando ainda em participar da pesquisa. Foi-me garantido que posso retirar o consentimento a qualquer momento, sem que isso leve a qualquer penalidade. Declaro ainda que recebi uma cópia deste Termo de Consentimento.

Brasília (DF), (data).

__________________________________ (Nome do participante)

135

ANEXO A – EMENTÁRIO DAS DISCIPLINAS DE PEDAGOGIA

1. Didática para o ensino a distância: Concepções atuais e procedimentos pedagógicos que reorientam a Didática e a formação do professor nos dias de hoje. Mediação da didática no uso de novas tecnologias despertando atitudes de aprendizagem mais complexa e significativa. O ensino a distância. Incorporação e aplicação dessas novas tendências e desafios pedagógicos na era tecnológica. 2. Reflexões filosóficas: ética, comunicação e marketing: Estudo do ser humano enquanto um ser produtor de linguagem, de conhecimento e de meios técnicos que alteram o seu habitat e a sua própria existência. Exame das inter-relações entre a educação, a moral e a sociedade. Reflexão sobre o conjunto de valores socialmente acordados que permeiam nossas ações e sobre a importância da educação filosófica para a formação do sujeito ético. Análise do conceito de Marketing e de sua aplicação à atuação do Pedagogo e à imagem da instituição escolar. 3. Prática de gestão em escolas e empresas: Conceitos de administração, gestão, direção no contexto educacional da atualidade; prática de gestão: gestão administrativa; gestão pedagógica; gestão de recursos humanos; aspectos práticos da gestão escolar: negociação e solução de conflitos. Aprendizagem organizacional; gestão do conhecimento nas empresas; prática em treinamento e desenvolvimento; estágio supervisionado. 4. Metodologia do ensino da educação básica: Trabalho orientado para o diagnóstico dos componentes metodológicos envolvidos na prática educativa nas escolas do ensino fundamental (a partir do sexto ano) e ensino médio, procurando analisá-las. Contato com um conjunto de documentos sobre as determinações mais amplas a que estão submetidas as questões da Educação Básica, como a LDBEN 9.394/96, Lei n. 12.014 (que alterou o art. 61º da LDBN atual), o Plano Nacional de Educação (Lei n. 10.172, de 2001) e os Parâmetros Curriculares Nacionais. Apresentação das duas possibilidades de se formar um professor

da

Educação

Básica



curso

de

Pedagogia

ou

curso

Normal/Magistério. Reflexões tendo em vista a prática das escolas relacionadas aos métodos, à luz das teorias e da própria prática.

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ANEXO B – EMENTÁRIO DAS DISCIPLINAS DE ADMINISTRAÇÃO

1. Jogos de empresas: Jogos de empresa na aprendizagem; histórico e conceitos; características; classificação. Simulação e Jogos de Empresas. Jogos de Empresa: variáveis comportamentais e uso no ensino. Aproveitamento educacional na utilização de jogos de Empresa. Simuladores; simulador logístico. 2. Direito

nas

organizações:

Direito

Constitucional Tributário



princípios

constitucionais tributários; Direito Tributário – obrigação tributária, nascimento e extinção e Direito Penal Tributário – tipo penal e extinção da punibilidade. 3. Administração de suprimentos e logística: A definição histórica da administração de suprimentos. A gestão de suprimentos. A inter relação com a administração da produção. A decisão entre comprar ou produzir internamente. A gestão dos estoques, os modelos de planejamento e a avaliação pela curva ABC. O MRP e a gestão da cadeia de suprimentos. Os fluxos dentro da cadeia de suprimentos. A medição de desempenho na cadeia de suprimentos. O Balanced Score Card na cadeia de suprimentos. O planejamento e controle Just InTime. A atividade de compras. A gestão e a logística na cadeia de suprimentos. O que é logística e rede logística. Movimentação de materiais na cadeia de suprimentos. A logística reversa. Modais. Modelos de paletização. Incoterms. 4. Administração Financeira: Objetivo e Ambiente da Administração Financeira. Decisões de Financiamento a Curto Prazo. Decisões de Financiamento a Longo Prazo. Indicadores de Desempenho.

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ANEXO C – COMPETÊNCIAS E HABILIDADES – PEDAGOGIA

Disciplinas Didática para o ensino a distância. Reflexões filosóficas, ética, comunicação e marketing.

Competências e habilidades Conhecer e dominar os conteúdos básicos relacionados às áreas de conhecimento de sua atividade docente. Apropriar-se de linguagens tecnológicas em educação. Conhecer e dominar os conteúdos básicos relacionados às áreas de conhecimento de sua atividade docente. Apropriar-se de linguagens tecnológicas em educação.

Prática de gestão em escolas e empresas.

Articular, coletivamente, a elaboração, a gestão e o desenvolvimento do projeto educativo e curricular da escola. Estabelecer relações de parceria com os pais dos alunos, promovendo sua participação na comunidade escolar. Compreender e gerenciar o efeito das ações propostas nos projetos pedagógicos. Atuar nas funções de gestão e supervisão dos trabalhos pedagógicos da estrutura educacional, com competência.

Metodologia do ensino da educação básica.

Dominar os princípios teórico-metodológicos das áreas de conhecimento que se constituam objeto de sua prática pedagógica. Compreender o processo de construção de conhecimento no indivíduo inserido no seu contexto social e cultural. Refletir sobre a formação do professor da Educação Básica e conhecer as metodologias aplicadas neste nível de ensino. Diagnosticar os componentes metodológicos da prática educativa nas escolas de EF (a partir do sexto ano) e de EM. Conhecer os principais artigos da Lei 9394/96 relacionados com a formação do professor de EI, EF e EM. Conhecer as duas possibilidades de formação do professor de EB-Normal e Graduação em Pedagogia. Identificar estudo socializado, individualizado e sócioindividualizado e algumas técnicas para desenvolvê-los.

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ANEXO D – COMPETÊNCIAS E HABILIDADES – ADMINISTRAÇÃO Disciplina Jogos de empresas

Direito nas organizações.

Administração de suprimentos e logística.

Administração financeira.

Competências e habilidades Senso crítico e capacidade de contextualização. Pensamento estratégico. Visão sistêmica. Orientação para resultados. Capacidade de identificar, analisar e solucionar problemas. Trabalho em equipe. Comunicação e expressão. Desenvolvimento pessoal. Compreender que a organização está inserida em uma sociedade, com um conjunto de regras que devem ser respeitadas. Identificar oportunidades com o conhecimento do ordenamento jurídico. As oportunidades aqui mencionadas devem sempre respeitar os aspectos éticos e legais. Senso crítico e capacidade de contextualização. Trabalho em equipe. Comunicação e expressão. Desenvolvimento pessoal. Capacidade de identificar, analisar e solucionar problemas. Visão estratégica. Pensamento sistêmico. Orientação para processos, para as necessidades dos clientes e para resultados. Capacidade de identificar, analisar e solucionar problemas. Trabalho em equipe, orientação e empreendedorismo. Senso crítico e capacidade de contextualização. Senso crítico e capacidade de contextualização. Pensamento estratégico. Visão sistêmica. Orientação para processos. Orientação para resultados. Trabalho em equipe. Comunicação e expressão. Desenvolvimento pessoal.

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