Design e ergonomia: Uma abordagem sobre a inter-relação entre o idoso e o ambiente doméstico

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Design e ergonomia: Uma abordagem sobre a inter-relação entre o idoso e o ambiente doméstico 1

Ana Cristina Lott Daré 2 Orientadora: Cristina Caramelo Gomes 1_Introdução A população mundial tem apresentado uma transformação significativa na sua constituição no último século, com o rápido crescimento da população idosa, devido principalmente ao declínio da taxa de natalidade e ao crescimento da esperança média de vida. Com uma maior longevidade, se chega à velhice com uma saúde e uma qualidade de vida sem paralelo em épocas passadas, tendo transformado radicalmente o perfil da população mundial lançando novos desafios no sentido de adequar e melhorar a resposta relativa à qualidade de vida desses indivíduos. Este processo está sendo difundido por todos os continentes, mas é na Europa que tem ocorrido com mais força. O próprio conceito tradicional de família tem sido alterado ao longo do tempo, sendo substituído por outros tipos de organização familiar, com novas relações e parentescos, obrigando a uma adaptação dos idosos às exigências do séc. XXI. Em contrapartida, diante do facto de se tornarem mais autónomos e activos, os idosos exigem que respeitem as suas necessidades e os seus períodos de lazer, sem, contudo se descuidarem dos compromissos familiares: oferecem experiência e sabedoria nos momentos de crise, transmitem as raízes da história familiar e mantêm o vínculo entre gerações. O objectivo deste estudo é no sentido de uma reflexão sobre a promoção da reavaliação dos ambientes domésticos, com ênfase no entendimento das necessidades ergonómicas e do conhecimento das alterações biológicas do organismo humano. A acessibilidade e a usabilidade dos espaços interiores devem privilegiar o conforto e a segurança, que são requisitos básicos na promoção da qualidade de vida, bem como na manutenção desses indivíduos nos seus ambientes, possibilitando a convivência com os filhos, netos, amigos e vizinhos, sendo possível adaptar a habitação para que as memórias e a segurança sejam aliadas. Os indivíduos que vivem hoje a sua velhice, constituem numa 1ª geração a experimentar essas mudanças, que são ainda mal conhecidas, sofrendo um impacto, devido a força das representações socialmente negativas, bem como da utilização de equipamentos de lógica digital, que não representam qualquer referência ao momento tecnológico que são sobreviventes (Daré, 2010). As habitações nos moldes tradicionais nas quais são concebidas não contemplam as alterações biológicas ocorridas durante o ciclo de vida do ser humano, gerando conflitos na inter-relação desses indivíduos com o ambiente construído. Dessa análise, verifica-se que pouca atenção é dada às necessidades inerentes aos seus utilizadores, visando o uso confortável, seguro e independente, influenciando a competência comportamental e adaptativa, e sendo manifestada através do bem-estar e da satisfação pessoal com a própria vida. Para esses indivíduos a manutenção da sua autonomia, isto é, a capacidade de determinar e executar a sua própria vontade, surge como um paradigma de saúde. A flexibilidade e a possibilidade de ajustes na habitação poderão ser alcançadas quando os projectos forem desenvolvidos de acordo com as ideias defendidas pelo design inclusivo. Este processo apresenta na sua concepção a utilização de espaços, produtos e sistemas de comunicação a serem utilizados pelo mais amplo espectro de indivíduos, sendo contempladas questões relativas ao fácil entendimento sobre o uso (legibilidade, a segurança e o conforto de todos. As habitações são constituídas por duas componentes: a física e a social, com ênfase nos valores humanos, dentro de parâmetro formais ou dimensionais, não devendo privilegiar apenas a adequação da habitação aos indivíduos idosos, mas sim a sua integração ao meio urbano por intermédio da acessibilidade a edificações e serviços apropriados, na comunidade no qual vivem.

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Mestre em Design – Faculdade de Arquitectura – Universidade Técnica de Lisboa Doutora em Arquitectura – Faculdade de Arquitectura e Artes – Universidade Lusíada de Lisboa Artigo publicado In SILVA, J. C. P., PASCHOARELLI, L. C. & SILVA, F. M. D. (eds.) Design Ergonômico Estudos e Aplicações. Bauru: Universidade Estadual Paulista, 2010. ISBN 978-85-99679-24-1 2

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Ilustração 1 – Áreas a considerar numa cidade amiga do idoso

(Fonte: WHO, 2009)

Portanto, as necessidades dos indivíduos devem ter como base não apenas os factores biológicos, mas também os factores psicológicos e sociais, não havendo possibilidade de ruptura desses três factores, o que leva ao risco de um condicionamento dos comportamentos e a não possibilidade da realização das suas aspirações. A acessibilidade na habitação contraria a tendência dos modelos projectuais existentes, na medida em que permite a adequação do meio às necessidades de um conjunto diversificado de utilizadores, que passam a poder alcançar e utilizar os espaços e os equipamentos com maior segurança, conforto e autonomia. Dessa forma, privilegia a adaptação das habitações, visando a possibilidade de prever alterações das características do espaço para uma melhor resposta à essas necessidades, tendo-se como resultado a melhoria da qualidade de vida dos indivíduos e contribuindo de forma significativa para a qualidade do parque habitacional. 2_Fundamentação Teórica 2.1_O ser humano e o envelhecer De uma forma generalizada, trata-se o envelhecimento como um estado classificado de terceira idade ou quarta idade. No entanto, o envelhecimento não é um estado, mas sim uma degradação progressiva e diferencial, afectando a todos os seres vivos, sendo o seu termo natural a morte do organismo. Embora seja uma fase previsível da vida dos indivíduos, o envelhecimento não é geneticamente programado. Não existem genes que determinam como e quando envelhecer, mas sim genes variantes cuja expressão favorece a longevidade ou reduz a duração do ciclo de vida (Daré, 2010). Devido a diversidade individual ocorrida nesse processo, o envelhecimento pode ter características de acordo com o nível em que se situa – biológico, psicológico ou sociológico, podendo ser independente da idade cronológica (Fontaine, 2000), sem ocorrer, no entanto, uma dicotomia em relação aos factores externos, comportamentais e ambientais. Envelhecimento biológico – relacionado com o envelhecimento orgânico, sendo que cada órgão sofre modificações que tendem a alterar a capacidade de auto-regulação tornando-se menos eficazes; Envelhecimento psicológico – relacionado com as competências comportamentais que os indivíduos dispõem como respostas à alteração do ambiente, incluindo a memória, inteligência e motivação; Envelhecimento sociológico – relacionado com o estatuto e hábitos dos indivíduos relativamente aos outros membros da sociedade. Esta idade é fortemente determinada pela cultura e pela história de um país. Artigo publicado In SILVA, J. C. P., PASCHOARELLI, L. C. & SILVA, F. M. D. (eds.) Design Ergonômico Estudos e Aplicações. Bauru: Universidade Estadual Paulista, 2010. ISBN 978-85-99679-24-1

Ergonomia e Design Mais do que nunca, o envelhecimento é uma questão demográfica, económica e social, que desde o final do séc. XX, tem apresentado uma evolução nos dados relativos quanto ao crescimento da população idosa, verificado tanto nos países desenvolvidos, bem como nos países em desenvolvimento. Esse facto será mais sentido nas sociedades desenvolvidas europeias, quando as gerações numerosas do Baby Boom do pósguerra atingirem, em 2011, a idade da reforma. Haverá, nesse momento, um aumento dos efectivos de pessoas idosas, desproporcionado com as gerações posteriores, que entram em menor número na idade activa.

Tabela 1 – Percentagem da população urbana nas principais zonas

(Fonte: WHO, 2009)

The developed world became rich and then it became old while developing countries 3 are becoming old before they become rich. - Social Development and Ageing Crisis or Opportunity? Special panel of Geneva 2000 (WHO and OMS, 2000). A questão relativa ao envelhecimento pode ser analisada sob duas perspectivas: A perspectiva da individualidade, onde o envelhecimento está assente numa maior longevidade dos indivíduos, consequência de um aumento da esperança média de vida e pela perspectiva demográfica, definida pelo aumento de pessoas idosas na população total. Esse aumento da população idosa é conseguido em detrimento da população jovem e/ou em detrimento da população activa (Daré, 2010). A OMS define a população idosa como sendo os indivíduos – homens e mulheres, com idade igual ou superior a 65 anos, quando se trata de países desenvolvidos e 60 ou mais anos, quando se trata de países em desenvolvimento (IBGE, 2002). Dentro de uma perspectiva defendida pela Organização das Nações Unidas (ONU), a criação de uma sociedade para todas as idades, fundamento da justiça social, não pode ser constituída sem que se observe a velhice como uma construção social necessariamente plural e heterogénea, surgindo, dessa forma, uma nova ideia de velhice, construída em torno do envelhecimento activo, num processo que permite optimizar as oportunidades de saúde, participação e segurança, bem como da participação do idoso a nível social, económico e cultural, de acordo com suas necessidades, desejos e capacidades, compatibilizando o envelhecimento e a qualidade de vida. A manutenção da autonomia e da independência durante o processo de envelhecimento são pontos importantes tanto para os indivíduos, bem como para as políticas sociais. Tabela 2 – Determinantes do envelhecimento activo

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TL: “O mundo desenvolvido tornou-se rico e então tornou-se velho enquanto os países em desenvolvimento tornaram-se velhos antes de se tornarem ricos.” Artigo publicado In SILVA, J. C. P., PASCHOARELLI, L. C. & SILVA, F. M. D. (eds.) Design Ergonômico Estudos e Aplicações. Bauru: Universidade Estadual Paulista, 2010. ISBN 978-85-99679-24-1

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(Fonte: WHO, 2009)

A população idosa é composta, na sua grande maioria – 52,5% (Sousa et al., 2002), por indivíduos independentes, sendo que estes não apresentam sintomas de depressão e de diminuição cognitiva, vivendo maioritariamente com as famílias ou mesmo sozinhos (Sousa et al., 2002). Dessa forma, se tornam consumidores conscientes e com um alto poder decisório relativo aos produtos e serviços que virão a utilizar, bem como na manutenção em seu meio habitual de vida. Devido à descoberta de um mercado de consumo direccionado para esse público-alvo, há uma tendência a se considerar as suas potencialidades, permitindo uma associação entre o aumento da esperança de vida e a boa qualidade dessa mesma vida, com a autonomia e integração/participação na família e na sociedade, aproveitando as capacidades individuais desses mesmos indivíduos (Ribeirinho, 2005). 2.2_Envelhecimento biológico X Envelhecimento cronológico Todos os indivíduos que vivem muito tempo não escapam a velhice, tornando-se um facto intolerável para o homem contemporâneo, face a um sistema personalizado onde só resta ao indivíduo durar e conservar, aumentar a fiabilidade do corpo, ganhar tempo e ganhar contra o tempo (LIPOVESTSKY, 1989). É um fenómeno inelutável e irreversível, que se inicia na fase de desenvolvimento, sendo que a grande maioria das alterações são compensadas e ultrapassadas até uma idade muito avançada (Beauvoir, 1990). Quantos anos você teria se não soubesse quantos anos tem? Satchel Paige (Hayflick, 1996) Nos seres humanos, são utilizados marcadores da passagem de tempo, que se baseiam nas certidões de nascimento, histórias ou lembranças, sendo que, dessa forma, podemos identificar, de forma relativamente confiável, a que dia e a que horas se nasceu, qual a data comemorativa do aniversário, isto é, a idade cronológica, mas não as transformações biológicas que se seguem ao nascimento, em momentos diferentes e em ritmos diferentes. São transformações constituintes das etapas naturais do ciclo de vida, causadas pelas alterações moleculares e celulares que resultam em perdas funcionais progressivas dos órgãos e do organismo como um todo, não sendo geneticamente programado. A imagem da velhice vem, na grande maioria das vezes, associadas a uma série de crenças e estereotipas negativos, relacionados a uma infinidades de deficits, deteriorações e dimensões físicas, psicológicas e sociais, no entanto, há que se observar que esses indivíduos pertencem a um grupo heterogéneo e que a diversidade individual se acentua com a idade, revelando-se como uma característica marcante no processo de envelhecimento, devido ao facto que os idosos apresentam características biológicas variáveis, em comparação dos jovens, que apresentam características biológicas mais similares. Ao longo do ciclo de vida, o indivíduo sente a fragilidade e o envelhecimento do corpo físico, a limitação corporal, sendo um impasse em relação ao tempo e ao espaço. No entanto, se houver um exercício da memória e inteligência, esses permanecem intactos, sendo portanto, mais eficientes que alguns jovens (Beauvoir, 1990). De maneira geral, os indivíduos sofrem na habilidade de reconhecimento, integração e reacção às informações captadas pelos 5 sentidos – visão, olfacto, paladar e tacto, levando a alterações dos hábitos diários (Rocha, 2004). Artigo publicado In SILVA, J. C. P., PASCHOARELLI, L. C. & SILVA, F. M. D. (eds.) Design Ergonômico Estudos e Aplicações. Bauru: Universidade Estadual Paulista, 2010. ISBN 978-85-99679-24-1

Ergonomia e Design Tabela 3 – Síntese das alterações biológicas do organismo humano ocorridas no processo de envelhecimento

Decréscimo na mobilidade e destreza Decréscimo nos alcances e força Redução da acuidade sensorial:  Decréscimo na acuidade visual  Dificuldade na percepção e identificação de odores  Dificuldade na percepção dos sons puros frequências altas)  Decréscimo na sensibilidade táctil  Sensibilidade térmica Dificuldades na gestão do equilíbrio (Fonte: DARÉ, 2010)

As perdas funcionais ocorrem nos sistemas vitais devido ao envelhecimento, sendo consideradas normais e não estados de doença. As doenças associadas à velhice não fazem parte do processo normal do envelhecimento. O câncer, as doenças cardíacas, Mal de Alzheimer, doença de Parkinson e derrames ocorrem, principalmente, à medida que o organismo se torna vulnerável, e os mecanismos de defesa menos eficientes (Hoffman, 2004). Tabela 4 – Manter a capacidade funcional ao longo da vida

(Fonte: WHO, 2009)

A perspectiva frente às fases constituintes do ciclo de vida dos indivíduos reconhece que o grupo desses indivíduos não é um grupo homogéneo, sendo que as diversidades individuais tendem a aumentar com o avançar da idade. 2.3_O design ergonómico direccionado ao idoso Com o avanço da idade, o tempo de permanência e o uso da habitação tornam-se mais intenso para os idosos, sem, contudo se privarem do convívio social ao qual estão habituados, sendo que o modo pelo qual vivenciam o quotidiano, é traduzido num sentimento de bem estar físico, mental e espiritual, sendo que essas vivências devam ser qualificadas na promoção da adequação das necessidades do utilizador dentro do conjunto dos espaços, contribuindo para uma melhor qualidade de vida (REBELO, 2004). A idade avançada é acompanhada por alterações que desafiam a inter-relação dos indivíduos com os espaços interiores, sendo que a habitação concebida para o individuo Mítico, não considera as alterações das capacidades funcionais às quais estão sujeitos durante o seu ciclo de vida, estimulando o desequilíbrio no uso da habitação e, consequentemente, afectando negativamente o modo de vida, os hábitos e a sua harmonia. Os projectos habitacionais geralmente não equilibram o ciclo de vida dos indivíduos com o ciclo de vida das habitações (Daré, 2010). Artigo publicado In SILVA, J. C. P., PASCHOARELLI, L. C. & SILVA, F. M. D. (eds.) Design Ergonômico Estudos e Aplicações. Bauru: Universidade Estadual Paulista, 2010. ISBN 978-85-99679-24-1

Ergonomia e Design As dimensões corporais, das quais os indivíduos têm plena consciência, servem como parâmetros de medidas para a percepção e relação do espaço habitacional. O corpo deveria ser a medida base para edificar num sistema tridimensional, numa escala de relações no espaço finito (CÍRICO, 2001). Os princípios dos fundamentos organizacionais do espaço têm como base os resultados obtidos através da experiência da relação do homem com o seu próprio corpo e com outras pessoas, confrontando as necessidades biológicas e as relações sociais. A construção só irá surtir um efeito intenso, quando forem satisfeitas todas as distâncias possíveis, todos os aspectos e condições da escala humana. O dimensionamento humano se torna, portanto, importante na utilização em projectos de espaços físicos, tais como: a altura e os comprimentos dos membros superiores – do braço e antebraço, e dos membros inferiores – da coxa e da perna. As mais importantes diferenças entre as medidas do corpo são pelo sexo, idade e por factores étnicos. Com a idade, diminuem as medidas de comprimento, enquanto que o peso e a circunferência do corpo aumentam (CÍRICO, 2001).

Tabela 5 – Valores médios de estatura e peso de adultos de várias idades

(Fonte: PHEASANT; HASLEGRAVE, 2006)

O envelhecimento biológico é uma variável crítica e relevante nos factores humanos e que deve ser considerada e fundamentada em três factores básicos: 1. O crescimento do número de indivíduos idosos nos países desenvolvidos e nos países em desenvolvimento, em função do aumento da esperança média de vida; 2. A constituição de diferenças relevantes entre os indivíduos jovens e os indivíduos idosos quanto às necessidades específicas; 3. O reconhecimento dos indivíduos idosos como força de trabalho e como utilizadores de produtos e sistemas (Pheasant and Haslegrave, 2006). A insistência na consideração de um processo metodológico de concepção projectual centra-se na realidade vivenciada por toda uma sociedade envelhecida, que encontra no meio construído, nos produtos da vida quotidiana e nos sistemas com os quais interage a limitação da igualdade de oportunidade, o desconforto e a insegurança. O que é considerado um sítio seguro e agradável, pode tornar-se numa potencial armadilha, sendo que os acidentes ocorrem, em geral, por causa das condições do ambiente combinado com dois factores: limitações físicas e hábitos dos moradores, sendo considerada as zonas mais perigosas as casas de banho, as escadas e as cozinhas. Dessa forma, um ambiente não adequado pode aumentar as chances de ocorrência de acidentes que podem ser fatais (SESI, 2007). A Ergonomia deve fundamentar o design, tendo como foco o utilizador, sendo que para sua plena utilização, o design deve ter como base as características físicas e mentais do utilizador, sendo determinado Artigo publicado In SILVA, J. C. P., PASCHOARELLI, L. C. & SILVA, F. M. D. (eds.) Design Ergonômico Estudos e Aplicações. Bauru: Universidade Estadual Paulista, 2010. ISBN 978-85-99679-24-1

Ergonomia e Design por um método de investigação de ciência empírica (Pheasant and Haslegrave, 2006). É importante que nesse processo sejam considerados factores, tais como: 1. Eficiência funcional; 2. Fácil utilização; 3. Conforto; 4. Segurança; 5. Qualidade de vida (Pheasant and Haslegrave, 2006) Independente da falta de informação representativa relativamente à população idosa, deve-se considerar que esses indivíduos podem ser caracterizados por um grupo no qual algumas medidas antropométricas e capacidades funcionais estão em declínio, sendo diferente de pessoa para pessoa, não se devendo projectar para uma média, mas permitindo uma flexibilidade na adaptação, de acordo com as necessidades de cada um. As medidas antropométricas disponíveis são limitadas às medidas estáticas, sendo que a resposta para os problemas relativos a usabilidade dos ambientes não é aplicada apenas para as medidas estáticas, mas sim para as medidas relativas ao corpo em movimento ou seja de antropometria dinâmica e funcional, sendo que essas questões devem ser consideradas no projecto de ambientes, de modo a evitar e/ou minimizar que esses indivíduos se comportem como deficientes. A associação do idoso aos indivíduos com mobilidade condicionada é no mínimo perversa, não facilitando-lhes a vida, estimulando e enfatizando o preconceito já existente. A questão importante é a definição do ponto de equilíbrio entre os ciclos de vida do edifício e de seus utilizadores, sejam eles públicos ou privados. Se os novos estilos de vida privilegiam os edifícios inclusivos, a questão mais crítica é o facto que os indivíduos idosos vivem sozinhos, e em alojamentos de precárias condições habitacionais e de conforto. Em vista da natureza da vida contemporânea, é importante definir-se os utilizadores, as dimensões antropométricas e ergonómicas e o seu estilo de vida (DARÉ; CARAMELO GOMES, 2009). Ilustração 2 – Antropometria do idoso do sexo feminino do percentil 1. Idade: 65-79

Artigo publicado In SILVA, J. C. P., PASCHOARELLI, L. C. & SILVA, F. M. D. (eds.) Design Ergonômico Estudos e Aplicações. Bauru: Universidade Estadual Paulista, 2010. ISBN 978-85-99679-24-1

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(Fonte: TILLEY, 2005)

Os Designers devem privilegiar, quando da sua actividade, o pleno conhecimento dos indivíduos ao qual estão a projectar, ou seja, seguir o princípio do design centrado no utilizador, não significando que, no caso dos idosos, o envelhecimento constitua um processo linear/ou padrão, sendo um grupo que apresenta uma maior diversidade, por ser esta uma fase em que muitas alterações ocorrem no organismo, sendo precisamente o mais esquecido e/ou mais insuficientemente servido pela industria e os respectivos designers (PAPANECK, 1995). Na maioria dos casos, as soluções encontradas de usabilidade dos espaços, produtos e sistemas de comunicação voltados aos indivíduos idosos, também o serão para outros grupos de utilizadores, transformando-se, dessa forma, numa ferramenta de auxílio ao designers quando da rápida identificação das dificuldades de interacção que possam surgir em outros grupos que apresentem a mesma similaridade (Fisk et al., 2009). 2.4_O design dos ambientes privilegiando uma melhor qualidade de vida O envelhecimento da população é uma realidade, tanto nos países desenvolvidos, como em países em desenvolvimento, provocando fortes pressões no sistema de segurança e assistência social. Devido ao aumento do número de indivíduos a viverem em famílias uni familiares, emerge questões relativas sobre as condições que devem ser oferecidas nas habitações, para a manutenção das tendências de vida cada vez mais autónomas e integradas a sociedade (IBGE, 2002). A vida do ser humano é constituída de tarefas quotidianas, que não sofrem alterações em todo o seu ciclo, mesmo em face das relacionadas com as capacidades funcionais. Essas capacidades estão relacionadas com a autonomia na execução das tarefas práticas frequentes e necessárias a qualquer ser humano, sendo que Artigo publicado In SILVA, J. C. P., PASCHOARELLI, L. C. & SILVA, F. M. D. (eds.) Design Ergonômico Estudos e Aplicações. Bauru: Universidade Estadual Paulista, 2010. ISBN 978-85-99679-24-1

Ergonomia e Design a dependência funcional surge quando há necessidade do auxílio de terceiros para a execução dessas mesmas tarefas. A manutenção da independência, definida como condição de quem recorre aos seus próprios meios para a satisfação de suas necessidades, é uma das prioridades do indivíduo idoso, estando dependente do grau funcional do indivíduo frente as actividades da vida diária (AVD’s), expressão de autonomia física, que incluem actividades de andar, vestir, lavar, comer, deitar e levantar da cama; tendo como complemento as actividades instrumentais da vida diária (AIVD’s), que reflectem numa autonomia que incluem as actividades de preparo dos alimentos, fazer compras, falar ao telefone, tomar medicamentos, gerir o orçamento e finanças (Sousa et al., 2002). A conjugação dessas duas actividades possibilita a esses indivíduos a sua autonomia. (LA BUDA, 2000). Ilustração 3 – Convívio intergeracional

(Fotografia de Ana Beatriz Lott Macynthire)

Devido ao processo de envelhecimento, há uma maior expectativa na melhoria da qualidade de vida, sem contudo haver um comprometimento em relação ao conforto, ao sentido estético e a segurança (Altman, 2002). Ao espaço destinado ao habitat, que os indivíduos se apropriam, transformam-no segundo as suas necessidades, procurando encontrar a sua identidade e fazendo prevalecer o seu direito à privacidade e ao convívio familiar (CÍRICO, 2001). É preciso reconhecer o modo pelo qual os indivíduos “habitam” o seu espaço vital em consonância com todas as dialécticas da vida, como se enraízam, dia-a-dia, num “canto do mundo” (BACHELARD, 1993). Os indivíduos idosos são um grupo com características mais heterogéneas frente a todos os outros grupos, e com tendências de tempo de permanência e uso da habitação mais intensos, sem contudo abdicar do convívio social ao qual estão habituadas. As modificações do aspecto da habitação que irá beneficia-los, tem como ênfase o entendimento das necessidades ergonómicas e as alterações biológicas, a que são submetidos ao longo do seu ciclo da vida, privilegiando, dessa forma, o conforto e a prevenção de acidentes domésticos, não sendo beneficiados apenas os indivíduos idosos, mas todos sem distinção. A reavaliação do ambiente doméstico não deve focar apenas nas necessidades actuais, mais também nas necessidades que irão ocorrer num futuro próximo - as facilidades dos indivíduos hoje se transformam nas necessidades de amanhã (Altman, 2002). A nova geração de idosos que privilegiam permanecer nas habitações que sempre viveram, tem como contributo o entendimento do impacto futuro que terá essa decisão e o desafio da promoção da ligação entre o sentido estético e o sentido funcional. Na medida que as questões relativas a segurança e a acessibilidade, visto como um direito de ir e vir de todos, tornam-se factores relevantes, há uma tendência na valorização da autonomia, independência e mobilidade, mas também da valorização do conforto e do prazer. Esse facto irá promover uma maior oportunidade de compreensão das alterações ocorridas no processo de envelhecimento e a integração dessas características nos projectos que beneficiem a todos nos anos que virão (ASID, 2002). 3_Considerações finais

Artigo publicado In SILVA, J. C. P., PASCHOARELLI, L. C. & SILVA, F. M. D. (eds.) Design Ergonômico Estudos e Aplicações. Bauru: Universidade Estadual Paulista, 2010. ISBN 978-85-99679-24-1

Ergonomia e Design A habitação concebida nos moldes tradicionais, não contemplam as alterações que podem ocorrer ao longo do ciclo de vida do ser humano, podendo gerar um descompasso quanto à sua utilização. Os projectos habitacionais geralmente não apresentam uma abordagem, de uma forma sistemática, do uso presente e futuro dos seus utilizadores (PERITO, 2007). Com o avanço da idade e, consequentemente, as alterações biológicas, o tempo de permanência e uso das habitações torna-se cada vez mais intenso, como também a necessidade do convívio social, ao qual esses indivíduos estão habituados. Devido a esse facto, surgiu, no 1º quarto do Século XXI, o fenómeno que privilegia a manutenção dos indivíduos idosos nas suas próprias habitações (ASID, 2002). Não se pode ver o fenómeno do envelhecimento apenas pelas alterações biológicas, mas deve-se ter em conta a importância dos aspectos ambientais, psicológicos, sociais, culturais e económicos que o influenciam. Os indivíduos idosos necessitam de ambientes que sejam seguros, possibilitando o exercício do controlo pessoal, devendo privilegiar o senso de auto-suficiência e auto-estima; motivar e colaborar com o grau de competência dos indivíduos no uso do ambiente, como também o de evitar os riscos de ocorrência de acidentes e incidentes, bem como a severidade de suas consequências. As limitações decorrentes do envelhecimento não são o verdadeiro problema, uma vez que constituem o ciclo natural de vida. O problema encontra-se na falta de interacção entre as habilidades dos indivíduos e o ambiente no qual vivem. O grande desafio dos profissionais é o de projectar ambientes que compensem essas limitações e que possam ser utilizados com segurança e conforto por muitos anos. A diversidade individual decorrente do processo de envelhecimento é complexa e envolve questões de estilo de vida, sendo um conjunto de factores que definem os indivíduos, com perspectivas diversas e diferenciadas de vida. Cada um tem o seu próprio padrão de comportamento, de estar, de viver, e torna-se complexo gerar e aplicar um padrão de comportamento, configurando, inequivocamente, numa situação de exclusão social. Torna-se importante desenvolver e sistematizar conhecimentos sobre esses indivíduos que permitam a quem projecta conhecer melhor as suas necessidades, a diversidade característica desses indivíduos e, assim, identificar nichos mais específicos. Outra questão recorrente, seria o estabelecimento de critérios de avaliação de acuidades para determinadas tarefas, traduzidos, dessa forma, em critérios de usabilidade, legibilidade e, por que não, atractividade. Devido à evolução científica e tecnológica, abrem-se vastas perspectivas que são constantes desafios à capacidade de inovação, dando um contributo para uma sociedade humanamente inclusiva e economicamente sustentável. No sentido de evitar as situações que coloquem em risco a segurança dos indivíduos, deve-se projectar considerando o impacto que as alterações biológicas irão promover na capacidade dos indivíduos ao interagirem com o ambiente doméstico, prevendo necessidades futuras, permitindo assim uma adequação fácil e a um custo faseado e reduzido. O aspecto económico é uma variável importante na determinação da independência desses indivíduos. Investir em projectos dentro do processo do design inclusivo e na promoção da acessibilidade é sinónimo da redução de custos e de qualidade de vida. Um projecto concebido de forma adequada às condições de acessibilidade sofre um acréscimo de 1% no valor da obra, enquanto se precisar de adequação depois de construído esse valor poderá alcançar os 25% (ALCÂNTARA, 2007). Factores como conforto e segurança no uso da habitação são fundamentais para o bem-estar das pessoas, mas esse é apenas um dos requisitos na promoção da qualidade de vida. O convívio social, uma boa infra-estrutura urbana, o acesso e qualidade dos serviços sociais, o suporte familiar e a habitação, são a base para a promoção da felicidade e satisfação dos indivíduos idosos e uma importante ferramenta para a inclusão social (CARLI, 2004). O grande desafio ao qual a sociedade se propõe é conseguir uma sobre vida cada vez maior, com uma melhoria cada vez mais significativa na sua qualidade, permitindo que as alterações biológicas não sejam um impedimento para que os anos vividos com idade avançada tenham, de facto, mais significado. Mais do que incorporação desses indivíduos a políticas proteccionistas, reforçando o estigma e o preconceito a eles associado devido simplesmente a idade, torna-se importante a busca de políticas globalizantes que atendam o maior número de pessoas, ampliando o direito a moradias adequadas com garantia de conforto e segurança, possibilitando uma vida digna e saudável (CARLI, 2004). 4_Referências Bibliográficas ALCÂNTARA, Luiz Carlos de. Acessibilidade e a visão de futuro Acesso em: 10 de Dezembro de 2007.

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em:

Artigo publicado In SILVA, J. C. P., PASCHOARELLI, L. C. & SILVA, F. M. D. (eds.) Design Ergonômico Estudos e Aplicações. Bauru: Universidade Estadual Paulista, 2010. ISBN 978-85-99679-24-1

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