Design Gráfico Como Arma de Revolta

July 17, 2017 | Autor: Gonçalo Sepúlveda | Categoria: Design for Social Innovation, Graphic Design, Social Responsible Design, Social Design
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Felt - Need Denomina-se de felt need quando o autor relaciona uma área do seu interesse com um trabalho que lhe é proposto ou ao qual ele se autopropõe. Perguntar às pessoas o que elas querem é frequentemente utilizado para identificar felt needs. Este tipo de processo criativo resulta numa melhor performance durante todas as fases de trabalho, sendo o desejo da sua concretização a principal razão da melhoria da performance. No entanto deve-se ser cuidadoso ao usar este tipo de abordagem visto que as diferentes percepções de possibilidades, a aceitação social, assim como os atributos pessoais pode influenciar o que as pessoas dizem realmente querer. Introdução. O design gráfico desempenhou ao longo da sua história um grande número de diferentes utilidades: desde os grafismos decorativos a acções interventoras, sendo a sua prática mais reconhecida, promoção de produtos e serviços de consumo. No entanto, há que reconhecer a presença do design gráfico nos mais diversos eventos históricos. A minha experiência com o design (grande parte académica) fez-me reflectir que, na era moderna, há um potencial muito maior para o design knowledge. Um que não se limita à frieza consumidora e institucional. Um dos grandes dilemas sobre o design com que me confrontei, surgiu duma frase dita pelo meu professor de licenciatura Steven Sarson e cito: “Design can never be neutral”. Foi durante uma conversa com esse professor que chegamos a esta conclusão, na minha opinião, irrefutável. Enquanto o design gráfico surgir da autoria de um esforço humano, haverá sempre uma mensagem, uma cor ou um grafismo que está presente para se identificar com um certo público-alvo, independentemente do seu conteúdo. No entanto, surgem cada vez mais casos em que é procurado um estilo onde o sentimento do criador não existe, ou é fingido e em que a mensagem transmitida é substituída por uma abordagem mais generalizada, onde o que importa, é fazer chegar a informação de um novo serviço e incentivar o seu consumo utilizando o poder do grafismo. Seja um lançamento de um livro ou a promoção de um festival, apesar de apelativo e interessante, o design temse tornado na minha opinião um aliado demasiado chegado ao capitalismo. Cada dia tento afastar-me mais da noção de designer como profissão e da sua utilização na promoção ao consumo. Ando em busca de uma realidade em que o design possua uma utilidade muito prática e social. Acredito que

o design gráfico atinge o seu apogeu quando aliado à necessidade de comunicação. Por necessidade de comunicação não me refiro apenas aos grupos reacionários, extremistas e causas solidárias, refiro-me à existência de qualquer desejo de comunicar com um grupo de pessoas que poderão estar interessadas ou necessitadas de receber a sua mensagem. São nestas obras que o produto final não pretende coisificar o público num alvo, mas sim um espectador de uma voz transformada graficamente. São obras que ganham a vida e dão forma à mensagem do seu desenhador. Não há procura de lucro, de buzz nem intenções de consumo. Só o prazer somado ao desejo de usufruir da liberdade que temos. Liberdade de poder expor uma mensagem, um desabafo ou até uma chamada de atenção a todos que se identificarem com a obra. “As opposed to architects, who honestly think that the world would cease to exist if they stopped working, we graphic designers know that the world would probably carry on pretty much the same without our services. things may look a little less colorful and some companies might sell less without our help in communicating their services or goods, but lives will not be lost.”. Na minha opinião, esta citação do designer e tipografo alemão é na minha opinião uma provocação à força que um designer poderia ter fora de um contexto de mercado. São estes factores que têm abafado um dos ramos mais profundos e conceptuais do mundo do design gráfico, vamos chamarlhe design de intervenção. Daqui nasce a minha enorme vontade de estudar e fundamentar uma realidade em que o design como ciência, se apresenta ao serviço do público e do seu desenvolvimento. Mas antes… Esta grande conquista, foi um verdadeiro reconhecimento global do poder do design knowledge e foi apresentado em Julho de 1987. O International Council of Communication Design expôs à UNESCO um relatório com o título “Graphic Design For Development” e que resultou num seminário que durou quatro dias em Nairobi no Quénia. Este seminário teve como objectivo consciencializar as pessoas de como o design gráfico pode ser usado para melhorar e intervir na educação e no nosso quotidiano a uma escala mundial. Uma enorme prova do sucesso deste seminário é o artigo de 2008, “The Role Of Grahpic Design in International Development” de Sali Sasaki que se introduz com uma análise ao designer contemporâneo com a seguinte frase: “In recent years the realm of design has expanded rapidly into new areas. The social and humanitarian benefits of design paved the way towards a new kind of practice shaped around socially responsible behaviour.” Os designers têm desenvolvido, nos últimos anos

tal como muitas mais profissões e outros ofícios, uma maior responsabilidade social e também um desejo de intervenção na sociedade para atingir os mais variados fins humanitários. A autora avisa no entanto, que ainda há muito mais espaço para melhorar o nosso papel como designers gráficos no mundo. Vou transcrever e traduzir dez das suas sugestões apresentadas no seu artigo: - Ganhem experiência em torno das necessidades das pessoas que vivem em diferentes contextos sociais; - Juntem-se a organizações internacionais e grandes empresas humanitárias, a fim de provar o valor do design gráfico; - Participar em iniciativas multidisciplinares onde os designers têm um papel crucial a desempenhar no desenvolvimento do empreendedorismo e da inovação; - Trabalhar em eventos, exposições e concursos de design em colaboração onde os órgãos de design de diferentes continentes apresentando iniciativas de desenvolvimento cultural; - Mostrar o poder do design gráfico em um contexto cultural, organizando workshops e seminários e ao incentivar actividades de design multiculturais; - Estudar o padrão da qualidade de ensino do design em todo o mundo e apresentar projectos de melhoramento e desenvolvimento global; - Aprendam com as organizações profissionais que podem proporcionar experiência, conhecimento, orientação, contactos e garantir sempre uma perspectiva internacional do projecto; - Criar fontes abertas de informação sobre metodologias de projecto com parceiros públicos / privados em todo o mundo; - Proporcionar novas plataformas onde os indivíduos e as organizações profissionais podem compartilhar melhorias práticas e criar oportunidades para os designers a trabalhar juntos internacionalmente; - Batam nas portas que nunca foram abertas.

Durante a leitura deste artigo, senti que encontrei informação inspiradora e muito útil, mas também uma rampa de lançamento bem fundamentada que pode ajudar a mim e a todos que se identificam nesta aventura na busca da responsabilidade social dos designer gráficos. A realidade de que o design não tem qualquer tipo de  salvação do mundo consumista começou a iluminar-se e reparei que somos muitos os que lutamos com esta arma para melhorar e desenvolver o nosso mundo. É apenas necessário não se deixar apagar (muitas vezes por nós próprios designers) essa chama da mudança. Reforço esta ideia com a seguinte citação: “Also, we have this incredibly powerful tool in our hands, but most people choose to ignore the power it has to change society and affect opinions. If this is not the case, why are we surrounded by advertising hoardings, bombarded with TV commercials, and given leaflets to sell us stuff? It is exactly the same media that is used to facilitate change in protest and political movements. So I am confident that design has that power. It’s just that we are distracted so much by well-paying “glam” jobs that people don’t think it’s not realistic to use it in this way” (Jonathan Barnbrook, 2010 p.128). Jonathan Barnbrook é uma grande referência na minha pesquisa, tornando-se um exemplo durante o Occupy London em 2011, que aliou duas áreas do meu interesse: o design gráfico e a política. Jonathan é um designer e tipografo britânico que trabalhou com artistas como o David Bowie e o Damien Hirst e para a conceituada AdBusters. Quero salientar o projecto de identidade gráfica para o movimento político Occupy London. Este movimento surgiu inspirado num movimento chamado Occupy WallStreet, sendo apenas uma variante da mesma luta, num panorama mais global. Este grupo politicamente liberal, discordava com o resgate bancário e outras questões económicas que foram decididas pelo governo britânico. Temos neste caso presente um grupo de pessoas que acreditam numa causa humanitária e defendem uma solução alternativa, opondo-se à decisão governamental que tem obrigatoriamente muito mais força. No entanto, esta classe não se sente de todo representada pelo seu governo nem se identifica nas suas decisões. Este grupo precisa de uma voz. Como refere o designer na sua entrevista, “I do think that even if they are evicted the idea of what they are doing is now in the mainstream and we can’t go back. Occupy London has become a channel for the voice of people who feel that they are not being represented by the government. This financial crisis has affected everybody, and the City, being accountable to only itself, has got off lightly. This was a direct

action of people who were prepared to sacrifice the comfort of a roof over their heads to represent us all.” (2012). Seria lógico concluir que, caso se tratasse de uma empresa com um grande capital, surgiria a possibilidade de se realizar uma intervenção mais impactuosa e abrangente, fazendo-se notar mais uma vez a hipocrisia dos valores deste tipo de economia. Mas estes cidadãos não quer ser vistos como uma instituição, nem angariar likes ou visualizações, nem mesmo vender a sua visão alternativa nem sequer procurar novos membros na sua luta. “What matters is we’ve been able to come together and meet a lot of people who have all formed networks, both nationally and internationally, to make our voices heard against the crisis which the banks have created and the corporate greed.” comentou Catherine Brogan, uma das manifestantes desta causa. O movimento tinha como objectivo fazer-se ouvir a sua mensagem com a mesma força e seriedade dos seus supostos representantes. Foi aí que Jonathan entrou e ofereceu a esse grupo uma voz e uma nova força. O cidadão-designer abdicou do seu tempo de ateliê para dar aos que mais necessitavam, uma imagem, identidade que lhes foi tirada pela Transport of London pouco antes das demonstrações que decorreram desde Outubro de 2011 a Janeiro de 2012. Quando acções destas acontecem, não importa o julgamento do valor estético do resultado final, há algo muito mais profundo presente. Um designer que tem contacto regular com clientes numa liga bastante comercial, dedicou tempo do seu trabalho, arriscando-se até a perder tempo que podia ser emprenhado em outros trabalhos pagos monetariamente, para ajudar um grupo de pessoas que merecia ser ouvido, que precisavam de uma solução para divulgar uma mensagem que é muitas vezes filtrada e alterada pelos media e até por outros cidadãos que estejam identificados com outro tipo de ideias (sendo seguro dizer que ideias de esquerda e liberais são muitas vezes vistos como falaciosos e utópicos o que resulta numa falta de seriedade por parte de quem tem pouco contacto com esse tipo de políticas ou de quem discorda com os seus ideais). Para além disso, Jonathan ofereceu o uso de uma família tipográfica da sua autoria chamada Bastard para uma publicação, “The Occupied Times”, que foi impressa e distribuída livremente durante a ocupação do grupo em St. Pauli. Barnbrook decidiu ajudar os protestantes nesta luta pelo mesmo desejo e razão que me motivou reflectir e investigar sobre este projecto. A comunidade designer reforça constantemente que está farta de que os designers estejam relacionados a uma realidade tão manipuladora e consumista, por isso, tal como Jonathan, temos que provar e afirmar o nosso ponto de mudança. Apesar de simpatizar com as soluções

alternativas do movimento Occupy London, durante a sua entrevista ao jornal The Guardian Jonathan cita, e traduzo: “É mais que óbvio que temos de olhar para uma nova maneira de construir a nossa sociedade, e eu acredito que os Occupiers são o início dessa mudança. A economia de mercado tem mancado ao longo de vários anos, trazendo injustiça para todos, menos alguns. As pessoas que apelavam ao mercado livre foram todos desacreditados. Pessoas como Matt Ridley vêm-me à mente - ele foi presidente do Northern Rock, quando o governo o salvou do colapso. Ele já era contra a regulamentação por parte do governo em todas as suas formas.” O nosso mundo, agora global e moderno, permite que as ideias e os acontecimentos circulem a uma velocidade surreal. Como consequência o mundo funciona a um passo muito mais acelerado e os acontecimentos ultrapassam muitas vezes o local da sua existência e tornam-se lutas de solidariedade mundial. Tal como a sociedade, a esfera dos designers gráficos também está a mudar. O que começou em 1987 como um seminário necessário para que o mundo entenda o que os designers podem fazer por ele, é agora uma prática cada vez mais recorrente em que o designer se torna numa arma e não num produtor de luxos, tendo o seu papel em dar voz a aqueles que precisam. O movimento Occupy London decidiu que uma logomarca seria um passo necessário para a que fossem reconhecidos como um núcleo forte, por isso, vamos rever um outro exemplo actual mas igualmente marcante, onde o design gráfico prova ser essencial ao serviço do sociedade. Miguel Neiva foi o primeiro português a integrar a rede da Ashoka, organização que identifica e apoia ideias socialmente inovadoras que têm potencial para mudar o mundo, responsável pela criação da ColorAdd código universal de identificação de cores desenhado a pensar na inclusão das pessoas que sofrem de daltonismo - cerca de 350 milhões em todo o mundo e 10% de toda a população masculina. Miguel aliou o design à semiótica e criou uma linguagem monocromática que permite aos daltónicos identificar qualquer tipo e variante de cor. Este trabalho tem vindo a ser utilizado em variados suportes escolares e didáticos como lápis de cor, rotulagem farmacêutica e de vestuário, linhas de metro e catálogos de tinta. Este terceiro exemplo mostra um caso onde a prática social do design não dispensa a sua presença no mercado de trabalho, na verdade, o designer conseguiu ajudar o público a que se dirigia e também criar uma gama de produtos a serem comercializados com o ColorAdd. No âmbito deste projecto, Miguel Neiva tem vindo também a desenvolver a ColorADD Social, uma associação sem fins lucrativos criada para apoiar a

implementação do código nas escolas e bibliotecas escolares, tornando-se um inovador que está a mudar o mundo contando com o design gráfico no seu arsenal. O contexto político é uma área onde o design pode ter uma enorme influência e que é muitas vezes esquecida ou pouco praticada. Voltando para 1968, em Paris sucedeu-se um dos maiores movimentos reaccionários onde trabalhadores e estudantes se juntam para combater as consequências criadas pela adesão europeia à vida conservadora e capitalista. Mais um caso em que um grupo de pessoas não conseguia tolerar viver com as regras e as ordens de uma força de poder superior que supostamente as representa. Neste emblemático caso, os vários confrontos com a polícia e a troca de cartas e comunicados com os representantes, criaram a força e a vontade necessária para ambos trabalhadores e estudantes quererem fazer a mudança. Um dos pormenores que marcou este protesto popular foi o emblemático grafismo dos posters e flyers que voavam e se erguiam por entre manifestantes e revoltados. No caso de Maio’68, que se prolongou por muito mais tempo que a demonstração londrina acima referida, a necessidade de comunicar e de se expressar crescia com tal intensidade que não houve a procura nem a necessidade de esperar pela oferta de um designer ou um grupo qualificado para os ajudar. Foi formado um colectivo protestante que ocupou a faculdade de Belas Artes em Paris chamada: Atelier Populaire. Este colectivo contava com trabalhadores e estudantes que, durante os protestos, produziam e criavam grafismos e slogans para fortalecer a voz de cada um. O próprio atelier defendia que estes posters serigráficos eram: “…armas ao serviço da luta. E são uma parte crucial dela! Elas pertencem nas ruas, nas mãos de quem luta e nas paredes das fábricas.” O designer deve estar pronto a envolver-se num processo de trabalho onde a realidade que o rodeia deve ser a sua maior influência e qualquer recompensa, que não seja a satisfação pessoal e o espírito solidário, não deve ser esperada. Esta aproximação do designer gráfico com o cliente é agora algo muito mais pessoal, visto que este grupo de pessoas está dependente de um profissional que lhes dê uma voz, ao contrário do cliente que precisa de uma simples encomenda de um serviço gráfico. Espero com estes exemplos salientar a importância da investigação deste tipo de prática mais solidária, procurando resultados mais duradouros e aperfeiçoados. Uma comunidade focada no design de um mundo justo e colaborativo seria sem dúvida eficiente, mesmo sendo um grande desafio hipotético. A prática do design protagoniza uma realidade consumista, que alimenta a destruição rápida da humanidade à qual todos nós somos espectadores. Desde a reformulação da educação à sensibilidade solidária,

os valores da comunidade devem estar apontados para um fim construtivo. Mais que nunca, agora é altura de agir. Pesquisar e fundamentar sobre práticas sociais reforça este manifesto. Manifesto que confio ser a porta de uma revolução. O cidadão-designer é forte e é responsável por todos os outros que não têm voz. Comunicar ideias e partilhar informação é essencial para contra-atacar o capitalismo selvagem. Cabe a nós designers assumir o papel de actores na mudança que o mundo precisa e unirmo-nos para provar a força das nossas armas. Desde a reformulação da educação à sensibilidade solidária, os valores da comunidade devem estar apontados para um fim construtivo.

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