DESPESAS DE CONDOMÍNIO: ABUSOS DA MINORIA QUALIFICADA
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DESPESAS DE CONDOMÍNIO: ABUSOS DA MINORIA QUALIFICADA Revista de Direito Privado | vol. 16/2003 | p. 216 224 | Out Dez / 2003 DTR\2003\546 Murillo Giordan Santos Área do Direito: Civil Sumário: 1.Introdução 2.Natureza jurídica das despesas de condomínio 3.Classificação 4.A fixação das despesas pelas assembléias e o surgimento de abusos por parte das minorias qualificadas 5.Proposta de solução: as sociedades mercantis 6.Conclusão Bibliografia 1. Introdução Da análise já procedida quanto à natureza jurídica do condomínio, ficou claro o seu status de genus novus, por possuir uma parte indivisa, comum a todos os condôminos, e outra parte em que cada condômino é titular de um domínio absoluto, ressalvadas, evidentemente, as limitações legais. Assim, devido a essa natureza jurídica, decorrem obrigações para todos os condôminos. "O fato de exercerem os condôminos, na copropriedade tradicional, os direitos conjuntos sobre a coisa, impõelhes sobre a seu turno uma série de deveres, que já vinham especificados no direito romano, que o Código Civil (LGL\2002\400) conservou no art. 623, do CC/1916 (LGL\1916\1) (art. 1.314, do CC/2002 (LGL\2002\400)). No condomínio especial, em propriedade horizontal, é jurídico acentuar que, em princípio, subsistem os mesmos deveres, a que outros são acrescidos. Na verdade, o fato de coexistirem unidos a propriedade exclusiva e o condomínio não sugere a abolição, senão o reforço das imposições, das limitações, das restrições, que em benefício da harmonia do grupo, em benefício da coisa comum e em benefício do comportamento respeitoso dos interesses alheios se estatuem. Não se pode, contudo, perder de vista a relatividade da idéia de perturbação: o que em apartamento de luxo, em bairro residencial, constitui incomodo e é repelido, em edifícios de condições mais modestas em bairro comercial ou industrial é tolerado." 1 Entre essas imposições está a de contribuir para as despesas da coisa comum. Tal obrigação, devido à complexidade que o condomínio representa, traz inúmeros questionamentos que a lei não pôde acobertar completamente, cabendo à doutrina e à jurisprudência debruçaremse sobre os casos concretos que surgirão. "Divergem, contudo, as técnicas e os efeitos, no tocante à provisão de valores pecuniários. Relativamente ao condomínio tradicional, à falta de conformismo de quaisquer dos comunheiros terá como sansão a extinção do condomínio, com divisão da coisa e responsabilidade de cada coproprietário com o seu quinhão. No condomínio especial não pode assim ocorrer. A lei não pode admitir que o comunheiro se insurja contra os gastos de conservação e manutenção do edifício, de vez que é visível e palpável a sua necessidade. Cabe, então, anualmente, reuniremse os condôminos, em assembléia, a fim de votarem, por maioria, a verba relativa as despesas de conservação, cumprindo a cada um concorrer no primeiro mês de cada trimestre, com a cota que lhe é atribuída no rateio." 2 Este trabalho ficará limitado aos abusos que as minorias qualificadas podem exercer no momento em que as assembléias de condomínios deliberarem sobre a fixação das despesas de manutenção do condomínio. Antes disso, devese buscar embasamento teórico junto aos institutos que alicerçam a doutrina sobre as despesas condominiais e outros institutos privatísticos análogos para, posteriormente, concluir acerca de uma proteção doutrinária adequada aos minoritários. 2. Natureza jurídica das despesas de condomínio Devido à já referida delimitação, o presente trabalho limitarseá às despesas de manutenção do condomínio como obrigação dos condôminos, excluindo as demais obrigações destes (em sentido lato) por não se relacionarem com a questão das minorias, v.g. as despesas tributárias, que serão lançadas considerando cada condômino individual e separadamente. Assim, dentre as obrigações dos condôminos (obrigação em sentido lato), temse as despesas de condomínio como obrigações em seu sentido estrito, portanto dotadas de patrimonialidade, respondendo o patrimônio do devedor pelo seu inadimplemento. http://www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document/retrieval?docguid=I2e9ce070f25111dfab6f010000000000&deliveryFormat=FO_HTML&del...
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Também, pelo fato de decorrerem do condomínio (tanto da parte divisível quanto da parte indivisível), essas despesas assumem o caráter de obrigação propter rem, por advirem de um direito real (o condomínio). 3 3. Classificação Fixada a natureza jurídica das despesas condominiais e a sua importância vital para o funcionamento do condomínio, cumpre agora classificálas para distinguir qual de seus aspectos pode gerar o abuso das minorias. Na literatura jurídica brasileira, destacase a primorosa obra de João Batista Lopes ( Condomínio. 7. ed. São Paulo: RT, 2000), na qual este jurista, antes de mencionar a sua classificação, que é coincidente com a doutrina pátria, busca esteio no estudioso argentino Alberto Anibal Gabas, que, por sua vez, assim classifica as despesas condominiais: a) despesas com administração: são as que se destinam a cobrir gastos com a conservação e funcionamento do edifício, inclusive reparações nas partes comuns para manterlhes as condições normais de segurança, conforto etc.; b) despesas com inovações: as que objetivam melhorar as condições de uso e gozo do prédio; c) fundo de reserva: destinado a cobrir despesas extraordinárias ou imprevistas, que refogem ao conceito normal de administração; d) despesas decorrentes de atos dos condôminos: as que são efetuadas por um ou vários condôminos, na omissão do síndico, em casos especiais, como reparações urgentes no prédio. 4 Porém, João Batista Lopes simplifica essa classificação, agrupando as despesas condominiais em ordinárias e extraordinárias, 5o que, conforme dito anteriormente, é coincidente com a doutrina pátria. 6
Orlando Soares assim diferencia as despesas ordinárias e extraordinárias: As despesas condominiais são: ordinárias, quando correspondentes à totalidade dos encargos referentes a salários de empregado e encargos sociais; pagamento de taxas de água, esgoto, luz, força e gás; remuneração do síndico se houver; realização de obras programadas; material de limpeza; conservação e manutenção das partes comuns, como elevadores, bombas, material elétrico etc.; e extraordinárias: todas que não tiverem sido previstas e revestiremse caráter eventual, tais como obras de emergências, multas aplicadas pelo poder público, despesas judiciais etc. 7 Já João Batista Lopes busca solução legal para explicar essa classificação: "De acordo com o art. 22, X, da Lei 8.245/1991 Lei do Inquilinato, o locador é obrigado a pagar as despesas extraordinárias de condomínio, assim consideradas aquelas não concernentes a gastos de rotina com a manutenção do edifício (obras de reforma, pintura das fachadas, indenizações trabalhistas, instalação de equipamento de segurança, despesas com decoração e paisagismo, constituição do fundo de reserva etc.). Ao locatário tocam os pagamentos das despesas ordinárias, isto é, as que forem necessárias à administração do condomínio (salários, encargos trabalhistas, consumo de esgoto, água, luz e força das áreas comuns, limpeza, conservação das instalações e equipamentos, inclusive elevadores, pequenos reparos nas instalações elétricas e hidráulicas)". 8 4. A fixação das despesas pelas assembléias e o surgimento de abusos por parte das minorias qualificadas Uma vez que as despesas condominiais ordinárias e extraordinárias estão diferenciadas, cabe, agora, aplicar esta diferenciação classificatória, pois sem aplicação essa classificação seria vã. Assim, as despesas ordinárias decorrem do orçamento aprovado pela assembléia anual do condomínio, consistindo em obrigação do síndico solvêlas para garantir o funcionamento ordinário do condomínio, sob pena de sua responsabilização. "Deve o síndico cumprir fielmente o orçamento aprovado, evitando, portanto negligenciar quanto à execução de determinados serviços ou medidas aprovadas em assembléia, nem tampouco executar, por arbítrio ou capricho, aquilo que não foi autorizado, porque de tudo deve prestar contas, estando sujeito à responsabilidade, de natureza civil ou criminal, conforme o caso, equiparandose, para este efeito, à condição de mandatário (art. 1.288, do CC/1916 (LGL\1916\1))." 9 Ao contrário, as despesas extraordinárias não possuem a referida previsão no orçamento condominial, devendo, uma a uma, serem aprovadas em outras assembléias. Ocorre que as convenções de condomínio possuem natureza jurídica de ato regra, com inegável conteúdo normativo, não obstante a controvérsia quanto a essa natureza. Também, as deliberações das http://www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document/retrieval?docguid=I2e9ce070f25111dfab6f010000000000&deliveryFormat=FO_HTML&del...
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assembléias possuem a mesma obrigatoriedade, desde que observadas as prescrições legais. Além do que, suas decisões não precisam ser unânimes para aprovar as referidas despesas. Assim, algumas minorias podem submeter outras minorias a sua vontade. A situação é agravada quando se tem em mente a forma como as deliberações das assembléias são tomadas, ou seja, por simples maioria. "Se a inovação importar na afronta aos direitos dos condôminos ou se atentar contra a estrutura do prédio, tornase obrigatória a deliberação unânime, não por ser inovação, mas pela outra circunstância. Em caso contrário, a assembléia é o órgão deliberativo do conjunto, e a decisão tomada pela maioria obriga a todos. 10 Importa ressaltar que, nas assembléias gerais, a contagem dos votos não se faz pelo número de condôminos, mas proporcionalmente às frações ideais do terreno e das partes comuns, salvo disposição em contrário da convenção (art. 24, § 3.º, da Lei 4.591/64). No que tange à votação, o critério adotado é o da 'maioria dos presentes', não se levando em consideração a opinião dos ausentes, ainda que manifestada por escrito. O sistema adotado tem recebido críticas, por isso estimula a formação de verdadeiras 'ditaduras' no interior dos condomínios." 11 Podese claramente observar que além da possibilidade de aprovação de maioria simples das assembléias, ainda que à revelia de grande parte dos condôminos, que raramente comparecem às assembléias, a contagem dos votos se faz, segundo a lei brasileira, na proporção das frações ideais, e não da maioria de interesses, o que leva João Batista Lopes a observar: "O princípio geral que rege as votações das assembléias de condôminos é o da maioria de interesses, e não de pessoas, como decorre da letra do art. 24, § 3.º, da Lei 4.591/1964: Nas assembléias gerais, os votos serão proporcionais às frações ideais dos terrenos e partes comuns, pertencentes a cada condômino, salvo disposição diversa da convenção. Assim, o condômino titular de frações ideais que representem mais de 50% do total terá, de fato e de direito, o controle das assembléias e suas deliberações, podendo surgir a figura que a doutrina denomina de maioria de um só". 12 Desta forma, o sistema brasileiro permite, por meio da fixação de despesas pelas assembléias de condomínio, o abuso por parte de uma minoria qualificada, seja pelo quorum das deliberações, seja pelo valor que se atribui às cotas ideais. Como a lei brasileira não oferece solução para este empecilho odioso, cumpre que a solução seja buscada ou no direito estrangeiro, ou na teoria do fechamento do ordenamento jurídico, suprindo suas lacunas através da analogia. A busca de socorro no direito comparado pode implicar uma solução de lege ferenda, o que não é conveniente, devendo, assim, ser buscada na analogia a solução. A situação dos condôminos em muito se assemelha à questão das minorias do direito societário, conforme será visto nos itens infra. 5. Proposta de solução: as sociedades mercantis Tanto as sociedades anônimas quanto os condomínios têm o direito de voto em suas respectivas assembléias regulado por uma forma censitária, e não paritária. Nas sociedades anônimas, nem todas as ações conferem direito a voto, v.g. as ações preferenciais. Já nos condomínios, todos os comunheiros dispõem desse direito, mas, em ambos os casos, aqueles que possuírem a maior parte do capital social ou o maior número de frações ideais pode impor a sua vontade nas deliberações das assembléias respectivas. Como ressalvado anteriormente, no caso dos condomínios não há solução legal específica, motivo pelo qual buscase na Lei 6.404/1976 uma analogia para esta lacuna da lei, já que a legislação do anonimato possui solução para tanto. "É que, em regra, estando os acionistas dispersos, um grupo de acionistas coeso, às vezes ínfimo, pode tomar o controle da sociedade e dirigila a seu talante. Necessário era, pois, que algumas regras fossem editadas, além das já tradicionais de proteção aos acionistas, para evitar abusos por parte dos controladores." 13 Assim, a lei das sociedades anônimas define controlador e enumera os casos de desvio de poder. Para Modesto Carvalhosa a lei dispõe que o acionista, para obter o controle, deve deter: "A maioria de votos nas deliberações da assembléia geral e o poder de eleger a maioria dos administradores. Esses dois atributos não podem ser entendidos como cumulativos, já que se pode ter o controle interno da http://www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document/retrieval?docguid=I2e9ce070f25111dfab6f010000000000&deliveryFormat=FO_HTML&del...
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companhia exercendo apenas um deles". 14 No entanto, mesmo sendo detentor do poder de controle de uma companhia, a lei confere ao acionista certa responsabilidade, com o intuito justamente de proteger as demais minorias. Como lembra Waldírio Bulgarelli: "E o parágrafo único do art. 116, ao considerar o dever do controlador, erige verdadeiro princípio a que se deve obedecer na utilização do poder de controle, estabelecendo que ele deve ser usado com o fim de fazer a companhia realizar o seu objeto e a fazer cumprir a sua função social, e tem deveres e responsabilidades com os demais acionistas da empresa, os que nela trabalham e para a comunidade em que atua, cujos direitos e interesses deve lealmente respeitar e atender. Embora o emprego de expressões gerais em lei, como função social seja de duvidosa eficácia, sem dúvida o legislador brasileiro bem compreendeu a empresa, no seu sentido mais moderno, entrelaçada a uma gama de interesses da mais alta valia; o dos acionistas, o dos trabalhadores e o da própria economia da nação". 15
O art. 117 da referida lei enumera os casos de exercício abusivo de poder; dentre os inúmeros casos arrolados, apenas dois parecem aproveitar à disciplina dos condomínios: "Art. 117. (...) § 1.º (...) a) orientar a companhia para fim estranho ao objeto social ou lesivo ao interesse nacional, ou levála a favorecer outra sociedade, brasileira ou estrangeira, em prejuízo da participação dos acionistas minoritários nos lucros ou no acervo da companhia, ou da economia nacional; (...) d) eleger administrador ou fiscal que sabe inapto, moral ou tecnicamente". O art. 117, § 1.º, a, guarda relação bem mais estrita com os condomínios ao se considerar a proteção do objeto social da companhia, como semelhante à obrigatoriedade da convenção. Não obstante a convenção possa ser alterada pela assembléia (mediante 2/3 dos votos), ela deve ser respeitada, constituindo limite impostergável às deliberações da própria assembléia, inclusive quanto às despesas. Esta relativa proteção legal que a legislação do anonimato estende aos acionistas minoritários não detentores de poder de controle possui instrumentos de proteção. Sobre isto Fábio Konder Comparato leciona: "Na Lei 6.404, a sansão, prevista genericamente, é apenas a de perdas e danos (art. 117), salvo quando o abuso de controle ocorre mediante voto em assembléias gerais, hipótese em que tem aplicação as normas do art. 115, com a previsão, em seu § 4.º, da anulabilidade da deliberação tomada em decorrência do voto de acionista com interesse conflitante com o da companhia; ou, então, da norma geral de anulação de deliberações viciadas por dolo, fraude, ou simulação (art. 286)". 16 Entre estes remédios, aproveita ao condomínio apenas a possibilidade de anulação de decisões das assembléias, mesmo que não haja voto conflitante de condômino, o que não é aplicável no caso. É certo que o art. 5.º, XXXV, da CF/1988 (LGL\1988\3) garante o acesso ao Judiciário ao dispor: "A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". Isto, por si só, já seria suficiente para garantir a apreciação judicial de eventuais abusos cometidos pelas assembléias de condomínios relativos às suas despesas. No entanto, a lei das sociedades anônimas subsidia uma possível solução analógica para os abusos cometidos pelas minorias qualificadas quanto às despesas do condomínio, já que prevê a anulação de deliberação contrária ao objeto social da empresa. Ora, o condomínio também possui objeto social, exemplificativamente, quando se destina a fins residenciais ou comerciais; pode, ainda, abrigar classes sociais distintas, ou ser tombado pelo patrimônio históricocultural, situações que melhor acomodam a questão das despesas. Tais casos podem acarretar deliberações diversas quanto às despesas condominiais. Um prédio abrigado em zona nobre de uma cidade, dotado de decoração suntuosa e outros utensílios de luxo, pode suportar despesas que não seriam cabíveis em um condomínio residencial de origem mais humilde. O mesmo acontece com os edifícios tombados, pois estes comportam despesas especiais para sua conservação, o que não acontece com edifícios não tombados pelo patrimônio históricocultural. Ainda é passível de menção a opinião de J. Nascimento Franco, que não vê com bons olhos esta http://www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document/retrieval?docguid=I2e9ce070f25111dfab6f010000000000&deliveryFormat=FO_HTML&del...
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analogia com as sociedades anônimas, pois entende que as sociedades comerciais giram em torno apenas de interesses econômicos, e os condomínios, mormente quando comerciais, enfocam assuntos humanos e de família, com delicadas relações de vizinhança, o que tornaria esta analogia incompatível com a "maioria de um só" ou de poucos. 17 Independentemente da opinião deste estudioso ser acertada, não se pode negar que a questão das despesas condominiais fixadas pelas assembléias é dotada de inegável conteúdo econômico (como obrigações em seu sentido estrito patrimonialidade), ainda que reflexas de delicadas relações familiares e de vizinhança. 6. Conclusão Bibliografia Assim, por parte deste trabalho, entendese cabível a aplicação analógica dos arts. 115, § 4.º, 116 e 117, da Lei 6.404/1976 às assembléias condominiais, com o fito de anular as deliberações contrárias ao objeto social do condomínio ou com abuso de poder da maioria qualificada, causando prejuízos aos demais minoritários. Também, de lege ferenda, podese cogitar de uma reestruturação do valor de cada voto, de forma a impedir que uma minoria (ou um só) imponha sua vontade em relação à grande parte de condôminos que não possuem a maior parte das frações ideais. Não pode deixar de ser mencionada a proposta de João Batista Lopes, que, ao reconhecer a ausência de disciplina específica na lei de condomínio, busca fundamento na teoria das nulidades do direito comum para apontar a sua solução. 18 Na nulidade, basta o descumprimento da lei, não sendo necessária a demonstração do prejuízo, podendo ser decretada ex oficio em razão do interesse público. Já a anulabilidade pode ser ratificada pela parte, só podendo ser modificada pelo juiz mediante a sua provocação ao demonstrar o prejuízo sofrido. A nulidade produz efeitos ex tunc, e a anulabilidade efeitos ex nunc. Também, João Batista Lopes menciona a questão da inexistência, admitindo, porém, a sua controvérsia. O ato inexistente é o desprovido de elementos essenciais, tão evidentes que não se pode cogitar da constituição do negócio jurídico. 19 Na mesma esteira, este eminente jurista aponta como remédio para os casos de nulidade e anulabilidade a ação constitutiva negativa, 20no que acompanha a solução apontada por Comparato quanto às deliberações das sociedades anônimas. Mesmo esta formulação não dispensa a solução analógica apontada, pois prevê o instrumento adequado sem, no entanto, mostrar o conteúdo substantivo dos casos a serem atacados, ou seja, que tipo de deliberação pode ser desconstituída, o que evidencia a proposta anteriormente formulada. Bibliografia BULGARELLI, Waldírio. Manual das sociedades anônimas. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1984. CARVALHOSA, Modesto. Comentários à lei de sociedades anônimas. São Paulo: Saraiva, 1997. vol. 2. COMPARATO, Fábio Konder. O poder de controle na sociedade anônima. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1983. LOPES, João Batista. Condomínio. 7. ed. São Paulo: RT, 2000. NASCIMENTO FRANCO, J. Condomínios. São Paulo: RT, 1997. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Condomínio e incorporações. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001. SOARES, Orlando. Incorporações imobiliárias e condomínios de apartamentos. Rio de Janeiro: Forense, 1975. (1) PEREIRA, Caio Mário da Silva. Condomínio e incorporações. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 141. Grifo nosso. (2) PEREIRA, Caio Mário da Silva. Op. cit., p. 142. (3) Aqui, mais uma vez ressaltase a natureza jurídica do condomínio como uma nova criação legal de um direito real a ser acrescido no rol taxativo ( numerus clausus) dos direitos reais. (4) GABAS, Alberto Anibal. Manual teoricopractico de propiedad horizontal. Hammurabi, 1987. p. 160. Apud LOPES, João Batista. Condomínio. 7. ed. São Paulo: RT, 2000. p. 101. http://www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document/retrieval?docguid=I2e9ce070f25111dfab6f010000000000&deliveryFormat=FO_HTML&del...
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(5) Op. et loc. cit. (6) SOARES, Orlando. Incorporações imobiliárias e condomínios de apartamentos. Rio de Janeiro: Forense, 1975. p. 120. (7) Idem, ibidem, p. 120. (8) Op. cit., p. 101 e 102 (grifo nosso). (9) SOARES, Orlando. Op. cit. p. 119. (10) PEREIRA, Caio Mário da Silva. Op. cit., p. 147. (11) LOPES, João Batista. Op. cit., p. 113. (12) Op. cit. p. 114. (13) BULGARELLI, Waldírio. Manual das sociedades anônimas. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1984. p. 201. (14) CARVALHOSA, Modesto. Comentários à lei de sociedades anônimas. São Paulo: Saraiva, 1997. vol. 2, p. 431. (15) Op. cit. p. 203 (16) COMPARATO, Fábio Konder. O poder de controle na sociedade anônima. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1983. p. 305. (17) NASCIMENTO FRANCO, J. Condomínios. São Paulo: RT, 1997. p. 109. (18) Op. cit., p. 120. (19) Op. cit. p. 120121. (20) Idem, ibidem, p. 121.
DESPESAS DE CONDOMÍNIO: ABUSOS DA MINORIA QUALIFICADA Revista de Direito Privado | vol. 16/2003 | p. 216 224 | Out Dez / 2003 DTR\2003\546 Murillo Giordan Santos Área do Direito: Civil Sumário: 1.Introdução 2.Natureza jurídica das despesas de condomínio 3.Classificação 4.A fixação das despesas pelas assembléias e o surgimento de abusos por parte das minorias qualificadas 5.Proposta de solução: as sociedades mercantis 6.Conclusão Bibliografia 1. Introdução Da análise já procedida quanto à natureza jurídica do condomínio, ficou claro o seu status de genus novus, por possuir uma parte indivisa, comum a todos os condôminos, e outra parte em que cada condômino é titular de um domínio absoluto, ressalvadas, evidentemente, as limitações legais. Assim, devido a essa natureza jurídica, decorrem obrigações para todos os condôminos. "O fato de exercerem os condôminos, na copropriedade tradicional, os direitos conjuntos sobre a coisa, impõelhes sobre a seu turno uma série de deveres, que já vinham especificados no direito romano, que o Código Civil (LGL\2002\400) conservou no art. 623, do CC/1916 (LGL\1916\1) (art. 1.314, do CC/2002 (LGL\2002\400)). No condomínio especial, em propriedade horizontal, é jurídico acentuar que, em princípio, subsistem os mesmos deveres, a que outros são acrescidos. Na verdade, o fato de coexistirem unidos a propriedade exclusiva e o condomínio não sugere a abolição, senão o reforço das imposições, das limitações, das restrições, que em benefício da harmonia do grupo, em benefício da coisa comum e em benefício do comportamento respeitoso dos interesses alheios se estatuem. Não se pode, contudo, perder de vista a relatividade da idéia de perturbação: o que em apartamento de luxo, em bairro residencial, constitui incomodo e é repelido, em edifícios de http://www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document/retrieval?docguid=I2e9ce070f25111dfab6f010000000000&deliveryFormat=FO_HTML&del...
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condições mais modestas em bairro comercial ou industrial é tolerado." 1 Entre essas imposições está a de contribuir para as despesas da coisa comum. Tal obrigação, devido à complexidade que o condomínio representa, traz inúmeros questionamentos que a lei não pôde acobertar completamente, cabendo à doutrina e à jurisprudência debruçaremse sobre os casos concretos que surgirão. "Divergem, contudo, as técnicas e os efeitos, no tocante à provisão de valores pecuniários. Relativamente ao condomínio tradicional, à falta de conformismo de quaisquer dos comunheiros terá como sansão a extinção do condomínio, com divisão da coisa e responsabilidade de cada coproprietário com o seu quinhão. No condomínio especial não pode assim ocorrer. A lei não pode admitir que o comunheiro se insurja contra os gastos de conservação e manutenção do edifício, de vez que é visível e palpável a sua necessidade. Cabe, então, anualmente, reuniremse os condôminos, em assembléia, a fim de votarem, por maioria, a verba relativa as despesas de conservação, cumprindo a cada um concorrer no primeiro mês de cada trimestre, com a cota que lhe é atribuída no rateio." 2 Este trabalho ficará limitado aos abusos que as minorias qualificadas podem exercer no momento em que as assembléias de condomínios deliberarem sobre a fixação das despesas de manutenção do condomínio. Antes disso, devese buscar embasamento teórico junto aos institutos que alicerçam a doutrina sobre as despesas condominiais e outros institutos privatísticos análogos para, posteriormente, concluir acerca de uma proteção doutrinária adequada aos minoritários. 2. Natureza jurídica das despesas de condomínio Devido à já referida delimitação, o presente trabalho limitarseá às despesas de manutenção do condomínio como obrigação dos condôminos, excluindo as demais obrigações destes (em sentido lato) por não se relacionarem com a questão das minorias, v.g. as despesas tributárias, que serão lançadas considerando cada condômino individual e separadamente. Assim, dentre as obrigações dos condôminos (obrigação em sentido lato), temse as despesas de condomínio como obrigações em seu sentido estrito, portanto dotadas de patrimonialidade, respondendo o patrimônio do devedor pelo seu inadimplemento. Também, pelo fato de decorrerem do condomínio (tanto da parte divisível quanto da parte indivisível), essas despesas assumem o caráter de obrigação propter rem, por advirem de um direito real (o condomínio). 3 3. Classificação Fixada a natureza jurídica das despesas condominiais e a sua importância vital para o funcionamento do condomínio, cumpre agora classificálas para distinguir qual de seus aspectos pode gerar o abuso das minorias. Na literatura jurídica brasileira, destacase a primorosa obra de João Batista Lopes ( Condomínio. 7. ed. São Paulo: RT, 2000), na qual este jurista, antes de mencionar a sua classificação, que é coincidente com a doutrina pátria, busca esteio no estudioso argentino Alberto Anibal Gabas, que, por sua vez, assim classifica as despesas condominiais: a) despesas com administração: são as que se destinam a cobrir gastos com a conservação e funcionamento do edifício, inclusive reparações nas partes comuns para manterlhes as condições normais de segurança, conforto etc.; b) despesas com inovações: as que objetivam melhorar as condições de uso e gozo do prédio; c) fundo de reserva: destinado a cobrir despesas extraordinárias ou imprevistas, que refogem ao conceito normal de administração; d) despesas decorrentes de atos dos condôminos: as que são efetuadas por um ou vários condôminos, na omissão do síndico, em casos especiais, como reparações urgentes no prédio. 4 Porém, João Batista Lopes simplifica essa classificação, agrupando as despesas condominiais em ordinárias e extraordinárias, 5o que, conforme dito anteriormente, é coincidente com a doutrina pátria. 6
Orlando Soares assim diferencia as despesas ordinárias e extraordinárias: As despesas condominiais são: ordinárias, quando correspondentes à totalidade dos encargos referentes a salários de empregado e encargos sociais; pagamento de taxas de água, esgoto, luz, força e gás; remuneração do síndico se houver; realização de obras programadas; material de limpeza; conservação e manutenção das partes comuns, como elevadores, bombas, material elétrico etc.; e extraordinárias: todas que não tiverem sido previstas e revestiremse caráter eventual, tais como obras http://www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document/retrieval?docguid=I2e9ce070f25111dfab6f010000000000&deliveryFormat=FO_HTML&del...
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de emergências, multas aplicadas pelo poder público, despesas judiciais etc. 7 Já João Batista Lopes busca solução legal para explicar essa classificação: "De acordo com o art. 22, X, da Lei 8.245/1991 Lei do Inquilinato, o locador é obrigado a pagar as despesas extraordinárias de condomínio, assim consideradas aquelas não concernentes a gastos de rotina com a manutenção do edifício (obras de reforma, pintura das fachadas, indenizações trabalhistas, instalação de equipamento de segurança, despesas com decoração e paisagismo, constituição do fundo de reserva etc.). Ao locatário tocam os pagamentos das despesas ordinárias, isto é, as que forem necessárias à administração do condomínio (salários, encargos trabalhistas, consumo de esgoto, água, luz e força das áreas comuns, limpeza, conservação das instalações e equipamentos, inclusive elevadores, pequenos reparos nas instalações elétricas e hidráulicas)". 8 4. A fixação das despesas pelas assembléias e o surgimento de abusos por parte das minorias qualificadas Uma vez que as despesas condominiais ordinárias e extraordinárias estão diferenciadas, cabe, agora, aplicar esta diferenciação classificatória, pois sem aplicação essa classificação seria vã. Assim, as despesas ordinárias decorrem do orçamento aprovado pela assembléia anual do condomínio, consistindo em obrigação do síndico solvêlas para garantir o funcionamento ordinário do condomínio, sob pena de sua responsabilização. "Deve o síndico cumprir fielmente o orçamento aprovado, evitando, portanto negligenciar quanto à execução de determinados serviços ou medidas aprovadas em assembléia, nem tampouco executar, por arbítrio ou capricho, aquilo que não foi autorizado, porque de tudo deve prestar contas, estando sujeito à responsabilidade, de natureza civil ou criminal, conforme o caso, equiparandose, para este efeito, à condição de mandatário (art. 1.288, do CC/1916 (LGL\1916\1))." 9 Ao contrário, as despesas extraordinárias não possuem a referida previsão no orçamento condominial, devendo, uma a uma, serem aprovadas em outras assembléias. Ocorre que as convenções de condomínio possuem natureza jurídica de ato regra, com inegável conteúdo normativo, não obstante a controvérsia quanto a essa natureza. Também, as deliberações das assembléias possuem a mesma obrigatoriedade, desde que observadas as prescrições legais. Além do que, suas decisões não precisam ser unânimes para aprovar as referidas despesas. Assim, algumas minorias podem submeter outras minorias a sua vontade. A situação é agravada quando se tem em mente a forma como as deliberações das assembléias são tomadas, ou seja, por simples maioria. "Se a inovação importar na afronta aos direitos dos condôminos ou se atentar contra a estrutura do prédio, tornase obrigatória a deliberação unânime, não por ser inovação, mas pela outra circunstância. Em caso contrário, a assembléia é o órgão deliberativo do conjunto, e a decisão tomada pela maioria obriga a todos. 10 Importa ressaltar que, nas assembléias gerais, a contagem dos votos não se faz pelo número de condôminos, mas proporcionalmente às frações ideais do terreno e das partes comuns, salvo disposição em contrário da convenção (art. 24, § 3.º, da Lei 4.591/64). No que tange à votação, o critério adotado é o da 'maioria dos presentes', não se levando em consideração a opinião dos ausentes, ainda que manifestada por escrito. O sistema adotado tem recebido críticas, por isso estimula a formação de verdadeiras 'ditaduras' no interior dos condomínios." 11 Podese claramente observar que além da possibilidade de aprovação de maioria simples das assembléias, ainda que à revelia de grande parte dos condôminos, que raramente comparecem às assembléias, a contagem dos votos se faz, segundo a lei brasileira, na proporção das frações ideais, e não da maioria de interesses, o que leva João Batista Lopes a observar: "O princípio geral que rege as votações das assembléias de condôminos é o da maioria de interesses, e não de pessoas, como decorre da letra do art. 24, § 3.º, da Lei 4.591/1964: Nas assembléias gerais, os votos serão proporcionais às frações ideais dos terrenos e partes comuns, pertencentes a cada condômino, salvo disposição diversa da convenção. Assim, o condômino titular de frações ideais que representem mais de 50% do total terá, de fato e de direito, o controle das assembléias e suas deliberações, podendo surgir a figura que a doutrina denomina de maioria de um só". 12 Desta forma, o sistema brasileiro permite, por meio da fixação de despesas pelas assembléias de http://www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document/retrieval?docguid=I2e9ce070f25111dfab6f010000000000&deliveryFormat=FO_HTML&del...
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condomínio, o abuso por parte de uma minoria qualificada, seja pelo quorum das deliberações, seja pelo valor que se atribui às cotas ideais. Como a lei brasileira não oferece solução para este empecilho odioso, cumpre que a solução seja buscada ou no direito estrangeiro, ou na teoria do fechamento do ordenamento jurídico, suprindo suas lacunas através da analogia. A busca de socorro no direito comparado pode implicar uma solução de lege ferenda, o que não é conveniente, devendo, assim, ser buscada na analogia a solução. A situação dos condôminos em muito se assemelha à questão das minorias do direito societário, conforme será visto nos itens infra. 5. Proposta de solução: as sociedades mercantis Tanto as sociedades anônimas quanto os condomínios têm o direito de voto em suas respectivas assembléias regulado por uma forma censitária, e não paritária. Nas sociedades anônimas, nem todas as ações conferem direito a voto, v.g. as ações preferenciais. Já nos condomínios, todos os comunheiros dispõem desse direito, mas, em ambos os casos, aqueles que possuírem a maior parte do capital social ou o maior número de frações ideais pode impor a sua vontade nas deliberações das assembléias respectivas. Como ressalvado anteriormente, no caso dos condomínios não há solução legal específica, motivo pelo qual buscase na Lei 6.404/1976 uma analogia para esta lacuna da lei, já que a legislação do anonimato possui solução para tanto. "É que, em regra, estando os acionistas dispersos, um grupo de acionistas coeso, às vezes ínfimo, pode tomar o controle da sociedade e dirigila a seu talante. Necessário era, pois, que algumas regras fossem editadas, além das já tradicionais de proteção aos acionistas, para evitar abusos por parte dos controladores." 13 Assim, a lei das sociedades anônimas define controlador e enumera os casos de desvio de poder. Para Modesto Carvalhosa a lei dispõe que o acionista, para obter o controle, deve deter: "A maioria de votos nas deliberações da assembléia geral e o poder de eleger a maioria dos administradores. Esses dois atributos não podem ser entendidos como cumulativos, já que se pode ter o controle interno da companhia exercendo apenas um deles". 14 No entanto, mesmo sendo detentor do poder de controle de uma companhia, a lei confere ao acionista certa responsabilidade, com o intuito justamente de proteger as demais minorias. Como lembra Waldírio Bulgarelli: "E o parágrafo único do art. 116, ao considerar o dever do controlador, erige verdadeiro princípio a que se deve obedecer na utilização do poder de controle, estabelecendo que ele deve ser usado com o fim de fazer a companhia realizar o seu objeto e a fazer cumprir a sua função social, e tem deveres e responsabilidades com os demais acionistas da empresa, os que nela trabalham e para a comunidade em que atua, cujos direitos e interesses deve lealmente respeitar e atender. Embora o emprego de expressões gerais em lei, como função social seja de duvidosa eficácia, sem dúvida o legislador brasileiro bem compreendeu a empresa, no seu sentido mais moderno, entrelaçada a uma gama de interesses da mais alta valia; o dos acionistas, o dos trabalhadores e o da própria economia da nação". 15
O art. 117 da referida lei enumera os casos de exercício abusivo de poder; dentre os inúmeros casos arrolados, apenas dois parecem aproveitar à disciplina dos condomínios: "Art. 117. (...) § 1.º (...) a) orientar a companhia para fim estranho ao objeto social ou lesivo ao interesse nacional, ou levála a favorecer outra sociedade, brasileira ou estrangeira, em prejuízo da participação dos acionistas minoritários nos lucros ou no acervo da companhia, ou da economia nacional; (...) d) eleger administrador ou fiscal que sabe inapto, moral ou tecnicamente". O art. 117, § 1.º, a, guarda relação bem mais estrita com os condomínios ao se considerar a proteção do objeto social da companhia, como semelhante à obrigatoriedade da convenção. Não obstante a convenção possa ser alterada pela assembléia (mediante 2/3 dos votos), ela deve ser respeitada, constituindo limite impostergável às deliberações da própria assembléia, inclusive quanto às despesas. http://www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document/retrieval?docguid=I2e9ce070f25111dfab6f010000000000&deliveryFormat=FO_HTML&del...
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Esta relativa proteção legal que a legislação do anonimato estende aos acionistas minoritários não detentores de poder de controle possui instrumentos de proteção. Sobre isto Fábio Konder Comparato leciona: "Na Lei 6.404, a sansão, prevista genericamente, é apenas a de perdas e danos (art. 117), salvo quando o abuso de controle ocorre mediante voto em assembléias gerais, hipótese em que tem aplicação as normas do art. 115, com a previsão, em seu § 4.º, da anulabilidade da deliberação tomada em decorrência do voto de acionista com interesse conflitante com o da companhia; ou, então, da norma geral de anulação de deliberações viciadas por dolo, fraude, ou simulação (art. 286)". 16 Entre estes remédios, aproveita ao condomínio apenas a possibilidade de anulação de decisões das assembléias, mesmo que não haja voto conflitante de condômino, o que não é aplicável no caso. É certo que o art. 5.º, XXXV, da CF/1988 (LGL\1988\3) garante o acesso ao Judiciário ao dispor: "A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". Isto, por si só, já seria suficiente para garantir a apreciação judicial de eventuais abusos cometidos pelas assembléias de condomínios relativos às suas despesas. No entanto, a lei das sociedades anônimas subsidia uma possível solução analógica para os abusos cometidos pelas minorias qualificadas quanto às despesas do condomínio, já que prevê a anulação de deliberação contrária ao objeto social da empresa. Ora, o condomínio também possui objeto social, exemplificativamente, quando se destina a fins residenciais ou comerciais; pode, ainda, abrigar classes sociais distintas, ou ser tombado pelo patrimônio históricocultural, situações que melhor acomodam a questão das despesas. Tais casos podem acarretar deliberações diversas quanto às despesas condominiais. Um prédio abrigado em zona nobre de uma cidade, dotado de decoração suntuosa e outros utensílios de luxo, pode suportar despesas que não seriam cabíveis em um condomínio residencial de origem mais humilde. O mesmo acontece com os edifícios tombados, pois estes comportam despesas especiais para sua conservação, o que não acontece com edifícios não tombados pelo patrimônio históricocultural. Ainda é passível de menção a opinião de J. Nascimento Franco, que não vê com bons olhos esta analogia com as sociedades anônimas, pois entende que as sociedades comerciais giram em torno apenas de interesses econômicos, e os condomínios, mormente quando comerciais, enfocam assuntos humanos e de família, com delicadas relações de vizinhança, o que tornaria esta analogia incompatível com a "maioria de um só" ou de poucos. 17 Independentemente da opinião deste estudioso ser acertada, não se pode negar que a questão das despesas condominiais fixadas pelas assembléias é dotada de inegável conteúdo econômico (como obrigações em seu sentido estrito patrimonialidade), ainda que reflexas de delicadas relações familiares e de vizinhança. 6. Conclusão Bibliografia Assim, por parte deste trabalho, entendese cabível a aplicação analógica dos arts. 115, § 4.º, 116 e 117, da Lei 6.404/1976 às assembléias condominiais, com o fito de anular as deliberações contrárias ao objeto social do condomínio ou com abuso de poder da maioria qualificada, causando prejuízos aos demais minoritários. Também, de lege ferenda, podese cogitar de uma reestruturação do valor de cada voto, de forma a impedir que uma minoria (ou um só) imponha sua vontade em relação à grande parte de condôminos que não possuem a maior parte das frações ideais. Não pode deixar de ser mencionada a proposta de João Batista Lopes, que, ao reconhecer a ausência de disciplina específica na lei de condomínio, busca fundamento na teoria das nulidades do direito comum para apontar a sua solução. 18 Na nulidade, basta o descumprimento da lei, não sendo necessária a demonstração do prejuízo, podendo ser decretada ex oficio em razão do interesse público. Já a anulabilidade pode ser ratificada pela parte, só podendo ser modificada pelo juiz mediante a sua provocação ao demonstrar o prejuízo sofrido. A nulidade produz efeitos ex tunc, e a anulabilidade efeitos ex nunc. Também, João Batista Lopes menciona a questão da inexistência, admitindo, porém, a sua controvérsia. O ato inexistente é o desprovido de elementos essenciais, tão evidentes que não se pode cogitar da constituição do negócio jurídico. 19 Na mesma esteira, este eminente jurista aponta como remédio para os casos de nulidade e anulabilidade a ação constitutiva negativa, 20no que acompanha a solução apontada por Comparato quanto às deliberações das sociedades anônimas. http://www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document/retrieval?docguid=I2e9ce070f25111dfab6f010000000000&deliveryFormat=FO_HTML&d...
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Mesmo esta formulação não dispensa a solução analógica apontada, pois prevê o instrumento adequado sem, no entanto, mostrar o conteúdo substantivo dos casos a serem atacados, ou seja, que tipo de deliberação pode ser desconstituída, o que evidencia a proposta anteriormente formulada. Bibliografia BULGARELLI, Waldírio. Manual das sociedades anônimas. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1984. CARVALHOSA, Modesto. Comentários à lei de sociedades anônimas. São Paulo: Saraiva, 1997. vol. 2. COMPARATO, Fábio Konder. O poder de controle na sociedade anônima. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1983. LOPES, João Batista. Condomínio. 7. ed. São Paulo: RT, 2000. NASCIMENTO FRANCO, J. Condomínios. São Paulo: RT, 1997. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Condomínio e incorporações. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001. SOARES, Orlando. Incorporações imobiliárias e condomínios de apartamentos. Rio de Janeiro: Forense, 1975. (1) PEREIRA, Caio Mário da Silva. Condomínio e incorporações. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 141. Grifo nosso. (2) PEREIRA, Caio Mário da Silva. Op. cit., p. 142. (3) Aqui, mais uma vez ressaltase a natureza jurídica do condomínio como uma nova criação legal de um direito real a ser acrescido no rol taxativo ( numerus clausus) dos direitos reais. (4) GABAS, Alberto Anibal. Manual teoricopractico de propiedad horizontal. Hammurabi, 1987. p. 160. Apud LOPES, João Batista. Condomínio. 7. ed. São Paulo: RT, 2000. p. 101. (5) Op. et loc. cit. (6) SOARES, Orlando. Incorporações imobiliárias e condomínios de apartamentos. Rio de Janeiro: Forense, 1975. p. 120. (7) Idem, ibidem, p. 120. (8) Op. cit., p. 101 e 102 (grifo nosso). (9) SOARES, Orlando. Op. cit. p. 119. (10) PEREIRA, Caio Mário da Silva. Op. cit., p. 147. (11) LOPES, João Batista. Op. cit., p. 113. (12) Op. cit. p. 114. (13) BULGARELLI, Waldírio. Manual das sociedades anônimas. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1984. p. 201. (14) CARVALHOSA, Modesto. Comentários à lei de sociedades anônimas. São Paulo: Saraiva, 1997. vol. 2, p. 431. (15) Op. cit. p. 203 (16) COMPARATO, Fábio Konder. O poder de controle na sociedade anônima. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1983. p. 305. (17) NASCIMENTO FRANCO, J. Condomínios. São Paulo: RT, 1997. p. 109. (18) Op. cit., p. 120. (19) Op. cit. p. 120121. (20) Idem, ibidem, p. 121. http://www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document/retrieval?docguid=I2e9ce070f25111dfab6f010000000000&deliveryFormat=FO_HTML&de...
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