Deus é brasileiro

June 23, 2017 | Autor: P. Faria Nunes | Categoria: Geography, Education, Brazilian Politics
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DEUS É BRASILEIRO Paulo Henrique Faria Nunes Goiânia, Diário da Manhã, 30 out. 2014 A eleição de um papa argentino em março de 2013, o cardeal Jorge Mario Bergoglio, mexeu com o brio dos brasileiros. Para não se sentir por baixo, as pessoas se lembraram da nacionalidade do Criador por todos os cantos do país: “o papa Francisco é argentino, mas Deus é brasileiro”. Até a presidente Dilma Roussef o declarou em público. Apesar dos incrédulos e descontentes, eis uma verdade incontestável. O Altíssimo só pode ser brasileiro. Dizem as más línguas que um assessor muito próximo do Todo-Poderoso foi designado para contratar a empreiteira que construiria o Universo: um certo Lúcifer, que parecia ter muita inveja de seu chefe. Ele queria galgar postos mais altos na hierarquia celeste e pensou que a escolha de uma empresa brasileira agradaria Deus. O sujeito ignorou as leis divinas, não fez a licitação e contratou a companhia dos conterrâneos do Grande Arquiteto. Empreiteiras de outros continentes, planetas e galáxias tinham propostas e preços bem mais interessantes mas foram afastadas de maneira fraudulenta. Uma obra do porte do Universo não pode ser feita com menos de trinta dias. O tal Lúcifer e a construtora resolveram fazer tudo em apenas uma semana para economizar na mão de obra. No projeto original, o volume de terras férteis era muito superior. Deus não queria fome nem penúria por aqui. Como o solo de boa qualidade não é tão barato, utilizaram areia e compostos menos nobres em vários lugares. As placas tectônicas não correspondem às especificações do plano estrutural. A companhia aproveitou umas sobras da construção de Vênus. As placas nunca se encaixaram perfeitamente. Às vezes uma esbarra na outra e o resultado são os terremotos e tsunamis. Pra piorar tudo, encheram o centro da Terra de magma (uma commodity solar). As fissuras e infiltrações na crosta terrestre facilitaram o surgimento de vulcões. Além dos problemas estruturais, houve falha na fase de acabamento. Um dos principais, o equilíbrio climático. O sistema de refrigeração de algumas regiões não funciona bem e o superaquecimento das águas do mar leva à formação de furacões. A empreiteira brasileira não tinha um especialista em recursos hídricos. Em vez de buscar um profissional qualificado (quiçá o grego Poseidon), improvisaram com o Saci Pererê. Consequência: de toda pouca água doce existente (cerca de três por cento do total), quase setenta por cento foi alocada nas calotas polares. A maior parte do volume restante ficou escondida na forma de aquíferos. Só uma mixaria sobrou para o consumo humano. “Cresceivos e multiplicai-vos”... isso requer, obviamente, comida e água em abundância. Para entregar a obra, os restos de materiais deveriam ser encaminhados para um local apropriado e reciclados na medida do possível. A companhia não implementou o plano de manejo ambiental. Botaram uma grande quantidade de terra improdutiva e partes de animais diversos em um lugar mais escondido, bem ao sul, na crença que ninguém andaria por aquelas bandas. Até demorou, mas a Austrália foi descoberta. Surpreendentemente, apesar do imenso deserto e da bicharada esquisita (ornitorrinco, canguru...), o povo ali não vive tão mal. A maracutaia foi descoberta e os responsáveis punidos. Lúcifer foi demitido, mas com o dinheiro desviado ergueu um império para si. A empreiteira brasileira nunca mais foi contratada pelas autoridades divinas. Posteriormente, soube-se que ela entregou um planeta inacabado (Plutão).



Professor e pesquisador na PUC Goiás e na Universidade Salgado de Oliveira.

Logo após a eleição do papa Francisco começaram a especular que alguém muitíssimo importante pediu naturalização na Argentina.

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