DIALOGISMO, PRODUÇÃO E CIRCULAÇÃO DE SENTIDOS NA LINGUAGEM PUBLICITÁRIA CONTEMPORÂNEA: EDUARDO E MÔNICA – O FILME

June 5, 2017 | Autor: Vanessa Brandao | Categoria: Advertising, Youtube, Publicidade E Propaganda, Publicidade Digital
Share Embed


Descrição do Produto

DIALOGISMO, PRODUÇÃO E CIRCULAÇÃO DE SENTIDOS NA LINGUAGEM PUBLICITÁRIA CONTEMPORÂNEA: EDUARDO E MÔNICA – O FILME 1 Profª. Drª. Vanessa Cardozo BRANDÃO 2 Lucas PANNAIN3 Nayelle OSÉLAS4 PUC Minas, Belo Horizonte RESUMO Este trabalho faz parte de uma investigação de tendências de linguagem publicitária contemporânea, tomando-a como um discurso cada vez mais inserido no campo da cultura, mais do que mera enunciação mercadológica de produtos/marcas. Busca-se refletir sobre como a publicidade tem mimetizado outras linguagens do campo da cultura das mídias, como o caso de séries, videoclipes, filmes, como forma de romper a barreira da saturação das mensagens publicitárias e fazer circular conteúdos de entretenimento que agenciam sentidos para as marcas. Toma-se como exemplo a peça publicitária “Eduardo e Mônica – o filme”, da operadora de telefonia móvel Vivo, que foi divulgada exclusivamente no Youtube e foi distribuída pelo público web em redes sociais, alcançando uma enorme audiência, configurando-se como caso de linguagem narrativa com aspectos simultaneamente interativos e massivos. PALAVRAS-CHAVE: Publicidade narrativa. Publicidade interativa. Publicidade e entretenimento. INTRODUÇÃO A partir da percepção da cada vez mais forte aproximação entre cultura e publicidade, este trabalho busca realizar o estudo das estratégias publicitárias que se misturam a produtos da cultura e da indústria do entretenimento para se destacar na contemporaneidade, lugar cujo excesso de mensagens anestesia, de certa forma, o olhar dos indivíduos. Um dos aspectos mais salientes da comunicação no mundo moderno é que ela acontece numa escala cada vez mais global. Mensagens são transmitidas através de grandes distancias com relativa facilidade, de tal maneira que indivíduos têm acesso à informação e comunicação provenientes de fontes distantes. (THOMPSON, 1998. p.135).

                                                                                                                        1

Trabalho apresentado no III Pró-Pesq PP – Encontro de Pesquisadores em Publicidade e Propaganda. De 24 a 25/05/2012. CRP/ECA/USP. 2 Professora Adjunta da PUC Minas, Doutora em Letras/Estudos literários pela UFF, orientadora e coautora do trabalho, [email protected] 3 Graduado em Publicidade e Propaganda pela PUC Minas, co-autor, email: [email protected] 4 Graduada em Publicidade e Propaganda pela PUC Minas, co-autora, email: [email protected]

Como é possível observar na citação, Thompson já mostrava alguns sinais do excesso de informação disponível ao público, e da saturação em relação aos modos de comunicação ainda no mundo moderno. Diante da configuração desse cenário, exigiu-se da publicidade estratégias que conseguissem se destacar nesse excesso midiático. Daí o incômodo propulsor desse estudo. O quê, realmente, consegue se diferenciar de todo esse volume de informação? Até mais do que isso, convencer o público avesso à publicidade comum? LINGUAGEM PUBLICITÁRIA E CULTURA CONTEMPORÂNEA Para Jameson (1985, p. 17), a “mais desalentadora manifestação da pósmodernidade” é a dissolução que acontece nas culturas erudita e popular. A citação que segue evidencia a união dessas duas categorias, assim, possibilitando a interpretação de uma terceira concepção estética múltipla na proposição de releituras de antigas verdades: O segundo traço desta linha de pós-modernismos é a dissolução de algumas fronteiras e divisões fundamentais, notadamente o desgaste da velha distinção entre cultura erudita e cultura popular (a dita cultura de massa). Possivelmente esta é, entre todas, a mais desalentadora manifestação da pósmodernidade, sob o ponto de vista universitário — o qual tem tradicionalmente interesses declarados tanto na preservação de um domínio de cultura qualificada e de elite contra o cerco de filistinismos, do kitsch, da porcaria, da cultura de Seleções ou dos seriados de TV, quanto na transmissão de técnicas de leitura, audição e modos de ver difíceis e complexos a seus iniciados. (JAMESON, 1985, p. 17).

Enquanto para a elite acadêmica é lamentável a união entre as culturas, para a publicidade a situação é conveniente. O diálogo entre as culturas propicia a publicidade um imenso terreno fértil em possibilidades de novos discursos. A materialização econômica, com objetivos rentáveis financeiramente, da dialética entre as culturas é a própria indústria cultural, que trouxe para o campo publicitário mais uma justificativa de consumo. A cultura refere-se à rede de significantes do indivíduo, seus valores e costumes. Portanto, utilizar-se dela como estratégia enunciativa é, para a publicidade, uma possibilidade assertiva de garantir sua persuasão frente ao seu público. Lívia Barbosa (2004) relaciona diretamente consumo e cultura afirmando que o ato de consumir é uma manifestação cultural. E para o incentivo dessa manifestação, marcas buscam agregar valor por meio da arte, embora apresentem o objetivo de “vender”, opondo-se ao objetivo de “pensar” proposto pela arte. Ainda disposto por Lívia, o valor de um bem é determinado por sua representação cultural muito mais do

que por seu valor de uso. Tem-se claro quando cita: “o valor dos bens depende mais do seu valor cultural (de signo) do que do seu valor de uso e troca. A maioria das mercadorias assume a forma de signos e representações” (2004, p. 36). Baudrillard acrescenta com a afirmação de que na sociedade de consumo o signo é a mercadoria, mais vale o aspecto simbólico do que o valor de troca. A base do consumo está na manipulação de signos, para se juntar a mercadoria e formar o commodity sign. Ainda na relação entre signos e sociedade, Lívia Barbosa afirma: “autonomia do significado em relação ao significante torna a sociedade de consumo ou a sociedade pós moderna um universo social saturado de imagens” (2004, p. 39). Além da saturação de imagens, Lipovetsky, em seu livro “Os tempos hipermodernos” (2004) destaca a profusão de produtos em hipermercados e shoppings. Já faz tempo que a sociedade de consumo se exibe sob o signo do excesso, da profusão de mercadorias; pois agora isso se exacerbou com os hipermercados e shopping centers, cada vez mais gigantescos, que oferecem uma pletora de produtos, marcas e serviços. (LIPOVETSKY, 2004, p. 2).

A sociedade de consumo pode ser definida por um tipo de consumo: o consumo de signo, como defende Baudrillard. Já outros autores defendem que vai além disso, passando por muito descarte e consumo de mercadorias, insaciabilidade, entre outros. Lívia Barbosa acredita que “a escolha da identidade e do estilo não é um ato individual e arbitrário, como alguns autores interpretam no contexto das sociedades ocidentais contemporâneas” (2004, p. 9) Isso é afirmado por Barbosa mostrando que existem sociedades que podem ser consideradas sociedades de mercado, sem que culturalmente esse consumo seja visto como forma de diferenciação. Idade, sexo, grupo étnico, e status tem grande influência no que se consome. O consumo deve ser visto hoje, portanto, como fator de individualidade. Jameson, em seu livro “Pós-modernidade e Sociedade de Consumo” (1985) expõe a interiorização da cultura em que o mundo ‘real’ não mais procura um referente. Os signos são formados de modo subjetivo na mente dos indivíduos, e não a olho-nu. Portanto, com o reforço midiático, a arte pop é mais facilmente internalizada e interpretada pelo indivíduo na construção de um passado histórico inalcançável. A mídia funciona como ferramenta de reforço às sensações, transformando em arte aquilo que o mercado demanda. O ‘novo’ é concebido na reprodução em série. Para tanto, o que se entende como criação pós-moderna abrange aspectos econômicos. Tudo isso é possível perceber quando Jameson (1985) cita:

A produção cultural foi empurrada para o interior da mente, para dentro do sujeito monádico: já não mais fita diretamente, com seus próprios olhos, o mundo real à procura do referente; como na caverna de Platão, ela é forçada a buscar as suas imagens mentais do mundo nas paredes de seu confinamento. O realismo que nos resta é um "realismo" que decorre da captação — chocante — deste confinamento e da consciência viva de que, por razões especiais de algum tipo, nos vemos condenados a buscar o passado histórico através de nossas imagens pop e de nossos estereótipos a seu respeito, sendo que o próprio passado permanece, para sempre, fora de alcance. (JAMESON, 1985, p. 103).

Pensamento similar ao de Lipovetsky em seu artigo “Sedução, Publicidade e Pós-modernidade” (2000), que coloca a publicidade não mais como limitada a racionalidade argumentativa, passando a atuar no imaginário dos indivíduos. Jameson (1985) caracteriza o indivíduo pós-moderno como aquele que experimenta com nitidez intensa o mundo, com relativa focalização. Isso fica claro na rotina online: informações são oferecidas na rede como pílulas, desse modo a percepção do indivíduo se fixa a uma notícia de acordo com seu repertório, o que lhe interessa é o que será acessado. Lívia Barbosa acrescenta a esse indivíduo a insaciedade, a propensão natural ao consumo. Complementado por Lipovetsky em “Os Tempos Hipermodernos” (2004) como imediatista, assim dispondo: Confundindo-se com a derrocada das construções voluntaristas do futuro e o concomitante triunfo das normas consumistas centradas na vida presente, o período pós-moderno indicava o advento de uma temporalidade social Inédita, marcada pela primazia do aqui-agora. (LIPOVETSKY, 2004, p. 1).

Para Lipovetsky (2004), o mercado pós-moderno se configurava na expansão do consumo e na comunicação de massa, as normas autoritárias e disciplinares se dissolviam, exacerbando o individualismo, tudo isso somado a falta de fé no futuro. O “palco” para todas essas mudanças eram sociedades abastadas. No entanto, é muito além disso o que a sociedade contemporânea experimenta. Para o autor, ainda quando anunciavam o pós-modernismo a “hipermodernização do mundo” já se apresentava sob uma modernidade potencializada. Essa sociedade, por sua vez, é caracterizada como: Hipercapitalismo, hiperclasse, hiperpotência, hiperterrorismo, hiperindividualismo, hipermercado, hipertexto – o que mais não é hiper? O que mais não expõe uma modernidade elevada à potência superlativa? Ao clima de epílogo segue-se uma sensação de fuga para adiante, de modernização desenfreada, feita de mercantilização proliferativa, de desregulamentação econômica, de ímpeto técnico-científico, cujos efeitos são tão carregados de perigos quanto de promessas. (LIPOVETSKY,2004, p. 2).

O individualismo aguça o privatismo, além do consumismo, prejudicando a noção coletiva que acirra a disputa econômica, como evidencia o autor no trecho de “Tempos Hipermodernos”: “O Estado recua, a religião e a família se privatizam, a sociedade de mercado se impõe: para disputa, resta apenas o culto à concorrência econômica e democrática, a ambição técnica, os direitos do indivíduo.” (2004, p. 2). O consumo pode até ser justificado, segundo o autor, por uma espécie de compensação à falta de controle do indivíduo sob sua existência, voltando a expor a dificuldade temporal característica do homem hipermoderno. Lipovetsky explica melhor a causa desse consumo: A compulsão pré-sentista do consumo mais o retraimento do horizonte temporal de nossas sociedades até constituem um sistema. Mas será que essa febre não é apenas escapista, diversão pascaliana, fuga em face de um mundo desprovido de futuro imaginável e transformado em algo caótico e incerto? Na verdade, o que nutre a escala consumista é indubitavelmente tanto a angústia existencial quanto o prazer associado às mudanças, o desejo de intensificar e reintensificar o cotidiano. (LIPOVETSKY, 2004, p. 12).

A fim de compreender o homem contemporâneo, faz-se necessário caracterizar a forma como este se comunica, assim buscando na linguagem a resposta para uma série de comportamentos desse indivíduo. Jameson (1985) destaca, como característica da linguagem publicitária, o ‘pastiche’. Tal termo se diferencia do conceito de ‘paródia’ elencado por Hutcheon no sentido de ser uma representação mimética de um estilo próprio com o objetivo neutro, sem intuitos satíricos ou simpatizantes. O ‘pastiche’ é uma “paródia que perdeu seu senso de humor” (1985, p. 12). Esta última imitação tem mais a ver com o conceito ‘retrô’, que designa o vazio de uma sociedade sem novidades. Para Lívia Barbosa (2004), a excessiva reprodução de imagens e signos, característica da publicidade pósmoderna, leva a uma perda de significados, tornando o ‘pastiche’ mais real do que o ‘real’. Corroborando com a discussão sobre imitação na linguagem publicitária contemporânea, Carrascoza, em seu livro “Redação Publicitária - Estudos Sobre a Retórica do Consumo” (2003) levanta uma questão importante: Quando é que um dado pode ser considerado plágio e quando é que isso é apenas mera coincidência? Ele mostra como textos e imagens podem ser facilmente parecidos, com ideias semelhantes, sem necessariamente caracterizarem um plágio. O autor não nega a existência do plágio, mas sim mostra que nas propagandas atuais há, muitas vezes, uma referência - e que

isso é algo natural - ao que já foi dito, não como forma de imitar, mas sim de contextualizar ou reler um dado determinado. A causa dessa dificuldade em lidar com informações anteriores, obras ou dados, na condição pós-moderna, é dada por Jameson (1985): dificuldade de relacionamento com o tempo na construção de uma história, além do apego ao passado para delinear uma perspectiva de mundo. O pós-modernismo, segundo o autor, é esquizofrênico – no sentido de “desordem de linguagem”, despercebe a temporalidade humana. Prejudicando, portanto, a formação de uma identidade, o indivíduo pós-moderno é sempre um ‘vir-a-ser’. Dentro dessa discussão, Jameson expõe duas perspectivas, uma radical e outra moderada, sobre a individualidade pós-moderna: A primeira se contenta em afirmar: sim, em tempos idos, na era clássica do capitalismo competitivo, no apogeu da família nuclear e na ascensão da burguesia como classe social hegemônica, existia isso que se chama individualismo, existiam sujeitos individuais. Mas hoje, na era do capitalismo corporativo, do assim chamado homem-da-organização, das burocracias empresariais e estatais, da explosão demográfica — hoje não mais existe o velho sujeito individual burguês. Há também uma segunda posição, a mais radical, que pode ser considerada a posição pós-estruturalista. Acrescenta: o sujeito individual burguês não é somente coisa do passado como também não passa de um mito, antes de mais nada ele nunca existiu realmente; nunca existiram sujeitos autônomos desse tipo. Este construto não passaria, mais precisamente, de uma mistificação filosófica e cultural que procurava persuadir as pessoas de que elas "tinham" sujeitos individuais e possuíam tal identidade pessoal singular. (JAMESON, 1985. p. 19).

O interessante da discussão não é saber qual das duas visões é a certa e sim perceber que o indivíduo se transformou e transformou a arte de acordo com sua percepção de mundo, o que também é possível no sentido inverso em uma espécie de influência mútua. Portanto, o autor conclui nessa análise que a arte de outrora não mais tem o mesmo efeito para os indivíduos desconexos dela no tempo e no espaço. Dessa forma, as releituras de linguagens estéticas anteriores, o ‘pastiche’, causa um sintoma no indivíduo pós-moderno: a incapacidade ou dificuldade de se relacionar com o presente. Vê-se na citação de Jameson: Parece-me extremamente sintomático constatar que o estilo dos filmes de nostalgia esteja invadindo e colonizando até mesmo os filmes atuais que têm cenários contemporâneos: como se, por alguma razão, fôssemos hoje incapazes de focalizar nosso próprio presente, como se tivéssemos nos tornado inaptos para elaborar representações estéticas de nossa própria experiência corrente. Se for este o caso, trata-se de uma terrível incriminação à própria sociedade capitalista de consumo — ou, quando menos, de um sintoma alarmante e patológico de uma sociedade que se tornou incapaz de se relacionar com o tempo e a história. (JAMESON, 1985. p. 21).

Lipovetsky também acredita nas tradições como fonte de inspiração para o presente: “Celebrando até o menor objeto do passado, (...) a hipermodernidade não é estruturada por um presente absoluto; ela o é por um presente paradoxal, um presente que não pára de exumar e ‘redescobrir’ o passado.” (2004, p.14) Sob a ótica de Lipovetsky (2000), na contemporaneidade existe uma grande preocupação com a identidade, reconhecimento, valorização de si e com a aceitação do outro. O que, de certo modo, transforma em falso o discurso de que a vontade de consumir vem de uma manipulação publicitária. Afinal, não é possível se fazer desejar o indesejável. Daí o que o autor afirma: “Os adolescentes tem obsessão por marcas e agem por mimetismo, em função do grupo que integram, gerando, sob pretensa forma de diferenciação, um intenso conformismo” (2000, p. 8). CRIATIVIDADE NA LINGUAGEM: INOVAÇÃO PUBLICITÁRIA Será novo o “novo”? Originalidade e ousadia, no contexto contemporâneo, não são padrões pré-definidos e sim produtos de releituras de diversos trechos ou recortes de obras anteriores. Não há criação sem repertório. Entende-se, então, que a criação é uma nova perspectiva que se utiliza do “velho” como matéria-prima. Jameson (1985) busca analisar o conceito de arte no pós-modernismo. Não esquecendo, é claro, da estética moderna. Para tanto este último tópico será iniciado com a polêmica citação: No mundo em que a inovação estilística não é mais possível, tudo o que restou é imitar estilos mortos, falar através de máscaras e com as vozes dos estilos do museu imaginário. Mas isto significa que a arte pós-moderna ou contemporânea deverá ser arte sobre a arte de um novo modo; mais ainda, isto significa que uma de suas mensagens essenciais implicará necessariamente a falência da estética e da arte, a falência do novo, o encarceramento no passado. (JAMESON, 1985. p. 20).

Se para Lipovetsky o novo produz uma autonomia em relação aos modelos para Jameson, como observado na citação anterior, é declarado falência ao “novo”. Com o surgimento da sociedade de consumo, o capitalismo se intensifica e influencia a ideia de arte. Nesse momento o “novo” é contaminado pelo passado. Para Lipovetsky, a pósmodernidade alcança a saturação criativa, não há possibilidades matemáticas de criar como no período moderno. Em contrapartida, Lipovetsky, em “Sedução, publicidade e pós-modernidade” (2000), diz que a afirmação de um parâmetro estético virou um jogo em que a busca é

eterna, e tudo é passageiro. A busca dessa afirmação é vista como a busca da linha do horizonte: à medida em que você se aproxima, ela se distancia. Ainda sobre a linguagem, sob a compreensão de Jameson é exposto que a linguagem através dos seus signos, intensificado pela globalização, impacta o comportamento humano no que diz respeito a ideias e ideais. A linguagem é composta, na contemporaneidade, do que o autor nomeia de “mito” do “referente”. O objeto que parte do mundo “real”, aquele referente ao signo, é cada vez mais subjetivo e impalpável. O modelo estruturalista de linguagem, aquele onde o siginificante e o significado tem ligação permamente com o externo, rebate a idéia de rotulação, onde um significante corresponde “termo-a-termo” a um significado, afirmando que o “efeito-de-sentido” ocasionado pela interrelação das palavras é que garante uma significação mais completa. “O significado — talvez mesmo a ilusão ou a miragem do significado e do sentido em geral — é um efeito produzido pelo interrelacionamento das materialidades significantes.” (JAMESON, 1985, p. 22). O que se pode associar à idéia de Barthes na produção de novos sentidos, novas interpretações ampliadas pela abertura de significantes. Nesse sentido, Washington Olivetto diz, no prefácio do livro “Razão e Sensibilidade no texto publicitário” (2004), de Carrascoza, que a propaganda, quando bem feita, parece “ter sido criada pelo próprio produto anunciado”. Isso se dá justamente pela relação instrínseca entre significante e significado, que vem a tona por meio da linguagem. Lívia Barbosa ainda aborda a diferença entre inovação e mudança, onde no universo publicitário as duas palavras podem até andar juntas. Porém, até certo ponto, pois a mudança traz consigo um discurso repleto de lugares comuns, o que não é permitido na inovação. Adilson Citelli acrescenta a esse pensamento que a mudança também pode ser vista como alterações que são feitas de forma fragmentada. Esse pensamento pode ser observado quando o autor cita: “Ao se mudarem os instrumentos de produção, modificam-se as relações de produção e, consequentemente as relações sociais” (2005, p. 157). O importante destacar é que o processo de linguagem, não só publicitária, é extremamente sensível e sujeito às transformações. Estas, por sua vez, não ocorrem apenas no plano tecnológico, pois com a evolução desses aparatos tecnológicos foi possível o desenvolvimento da capacidade dialógica das linguagens, com novas experiências e uma busca de maiores campos de sentidos.

Ainda nesse aspecto, Carrascoza em “Razão e Sensibilidade no texto publicitário” (2004), reforça a teoria de Citelli no que diz respeito ao modo como fez-se necessária a vinda de uma comunicação diferenciada e encantadora ao público. Diante desse contexto, os redatores procuraram experimentar outros tipos de discursos e formatos, tentando garantir a originaidade e a atenção do target. Segundo o autor, com o uso de diferentes mídias foram sendo descobertas diferentes formas de comunicação e interação com o público, e diversos recursos linguísticos e formas de diferenciação começaram a ser utilizadas. Nesse contexto, Carrascoza (2004) lança uma discussão acerca do que Nietzsche chama de discurso Apolíneo e Dionisíaco. O apolíneo é o viés racional, enquanto o dionisíaco é a emoção e o humor. Ele ressalta que de acordo com o produto a ser oferecido, a mensagem tende a ser mais séria ou mais emotiva, portanto, mais apolínea ou dionisíaca dependendo do modo como se quer atingir o público. Ele segue esse raciocínio dizendo que no texto apolíneo há o predomínio da razão prática, enquanto o dionisíaco explora mais uma visão lúdica e utópica. Nessa perspectiva a propaganda, com o passar dos anos, foi passando de apolínea para dionisíaca, com uma mensagem mais implícita, mas sutil e subjetiva. Os anúncios desse tipo de texto vão conquistar o público contando histórias. O interessante a ser observado nessa perspectiva é o fato de, exatamente por todo mundo ter uma história, quando uma história publicitária é criada, há quem se identifique com aquela narrativa, que coloque a sua história naquela história, assim gerando o consumo. Dessa forma, o produto vendido é inserido nessa história de uma forma velada, não tão explicíta como acontece no modelo anterior. Esse é o lugar da propaganda pós-moderna. O texto dionisíaco, no qual as propagandas mais inusitadas se baseiam, visa persuadir, fazendo apologia ao produto e aconselhando o público a experimentá-lo. Em geral, esse tipo de discurso tem intenção de levar o público a decidir-se por uma ação. Tudo isso ajuda a tornar as mensagens publicitárias cada vez mais originais e, com isso, cada vez mais assertivas em relação ao seu público, atingindo-o de forma inusitada e criativa, gerando ato de compra. UMA ANÁLISE DE “EDUARDO E MÔNICA – O FILME”: A PUBLICIDADE DISFARÇADA DE NARRATIVA FÍLMICA PARA WEB A campanha da Vivo de Dia dos Namorados vem de encontro com os 25 anos que completa a música Eduardo e Mônica, da banda Legião Urbana. Ela consiste num videoclipe de 4 minutos para a música, narrando a trajetória de um casal conhecido no

rock brasileiro. A propaganda é considerada criativa por empregar elementos da linguagem narrativa, com técnicas de storytelling, como a escolha da música de Renato Russo, compositor tradicionalmente conhecido por escrever letras que são verdadeiras histórias contadas. Outra característica é a forma como a letra da canção casa com a cena, reforçando a idéia que se trata de um vídeo narrando a música. Além da ampla divulgação na Internet, o clipe foi exibido em diversas salas de cinema e Eduardo e Mônica ganharam perfis na rede de relacionamentos Facebook, onde eram postadas fotos do making of do video feitas pelos próprios atores que os representavam.

Imagem 1: Eduardo e Mônica – 3:31 Fonte: youtube.com/results?search_query=eduardo+e+monica&aq=2&oq=ed

Com mais de nove milhões de visualizações (Imagem 1), o video contava com 65141 avaliações no Youtube (dados analisados em 02/11/2011), onde 63585 pessoas gostaram, e apenas 1556 pessoas não gostaram do video, evidenciando o sucesso do video. Fato verificado também com os comentários das pessoas que assistiram o vídeo

que, em sua grande maioria, se mostraram receptivos com o mesmo e o identificaram como um vídeo clipe de música tradicional e não como uma campanha publicitária. O video não se apresenta como uma mensagem publicitária, fato que apenas fica explícito no final do mesmo, quando aparece a mensagem “Essa é uma homenagem da vivo a todos os Eduardos e Mônicas de um Brasil cada vez mais conectado”, fazendo então uma menção ao slogan da Vivo, “Conexão como nenhuma outra”, passando a mensagem de que é o serviço que a empresa oferece que faz com que as pessoas se conectassem cada vez mais, seja pela internet, ou pelo telefone. A última parte do video é onde finalmente aparece o slogan - “Conexão como nenhuma outra”- e a logo da Vivo. Esses são os únicos dois pontos onde a empresa deixa claro que o video se trata de uma mensagem publicitária, e eles aparecem exatamente no final para que o público veja todo o filme pensando nele como um clipe musical sem pretenções publicitárias, dando mais atenção a ele, se entregando ao clima proporcionado pelo clipe, se identificando com a história. Logo depois do público imergir na história do clipe é que aparece a logo da Vivo (Imagem 2), com isso o espectador já teria captado a mensagem da Vivo antes mesmo dessa explicitação.

Imagem 2: Eduardo e Mônica – 4:06 Fonte: youtube.com/results?search_query=eduardo+e+monica&aq=2&oq=ed

Outra tática utilizada pela Agência Africa, responsável pela criação do vídeo, é a forma de distribuição, perceptível através das palavras-chave utilizadas na página do video no youtube. As palavras são as seguintes: “Legião Urbana, Eduardo e Monica, Renato Russo, videoclipe, música, romance, história de amor, Vivo, agência Africa,

campanha comercial, propaganda, viral, O2 Filmes, Nando Olival, Music Records, Pop Rock, Brock, Rock Brasil, anos 80.” As palavras foram escolhidas de modo que as pessoas achem o video casualmente, quando estiverem procurando por videos da banda, ou de videos de musicas brasileiras, por exemplo. O vídeo é estrategicamente distribuído como se fosse um filme, e não uma campanha publicitária, o que pode ser corroborado pela escolha do título colocado no Youtube: “Eduardo e Mônica – O filme”. A intenção era vincular a produção com um trailer de lançamento de um filme sobre a música, o que geraria maior espectativa no público e maior número de visualizações do que se ficasse evidente ser mais uma ação publicitária da Vivo. As primeiras palavras chave escondem esse intuito publicitário, apenas algumas inseridas de forma secundária nessa lista que indicam o caráter publicitário do vídeo, e algumas dessas também não seriam explicitas o suficiente, como por exemplo a palavrachave “agência Africa”, onde poucos saberiam que se trata de uma agência de publicidade. O video é enquadrado na categoria “Filmes e Desenhos”, novamente ressaltando o esforço usado para, a primeira vista, o público encarar o clipe como se não houvessem pretenções comerciais, abordando o espectador de forma despretensiosa que ao ver o video não tem o pensamento de que o filme deseja vender um produto. A ideia da operadora era relacionar a data comemorada com sua filosofia de conexão e relacionamento. Para reforçar a marca, durante o video, os protagonistas utilizavam os próprios aparelhos da Vivo, como smartphones, tablets e aparelhos de conexão 3G. Isso corroborava com a identidade da empresa, que propõe “conexão como nenhuma outra”, assim como Eduardo e Mônica estavam conectados, e como propunham que os namorados estivessem nessa data, ligados através de produtos e pacotes de serviços da operadora.

Imagem 3: Eduardo e Mônica – 0:47 Fonte: youtube.com/results?search_query=eduardo+e+monica&aq=2&oq=ed

A campanha procura ganhar a atenção do público, a fim de que ele se identifique com a história e consequentemente, com os produtos e a marca. Ela faz isso à medida que utiliza-se da linguagem narrativa para criar um universo no qual o público possa se aproximar dos personagens, visto que o vídeo conta a história de representantes da música pop que são conhecidos na realidade das pessoas que assitem ao video clipe. Outro elemento que busca essa aproximação das pessoas com o a história é a escolha da cena título desse vídeo no Youtube que é a parte em que o casal do filme está em um parque num clima bem descontraído e romântico, com uma lista de nomes de possíveis casais descendo na tela, dando a impressão que se trata de um vídeo comum de namorados que poderia ser de qualquer pessoa. Reforça essa idéia a personagem Mônica que pisca para a câmera representando um espécie de amadorismo de vídeo caseiro (Imagem 4), mas que na verdade é uma forma de interagir com o telespectador.

Imagem 4: Eduardo e Mônica – 3:57 Fonte: youtube.com/results?search_query=eduardo+e+monica&aq=2&oq=ed

Nesse contexto, o produto é inserido em partes puntuais do vídeo, de forma sutil, como complemento da história. O que importa aqui, é menos anunciar o produto de forma que ele seja o centro das atenções, do que criar uma atmosfera que envolva o target com a data comemorada. No fim do vídeo, logo após a mensagem “Essa é uma homenagem da vivo a todos os Eduardos e Mônicas de um Brasil cada vez mais conectado”, aparece que o video é também uma homenagem à vários outros casais, mostrando nomes de várias pessoas aleatórias que formam um casal, que juntos

escrevem suas próprias histórias de amor. Essa homenagem ajuda a estabelecer uma ligação com o espectador, que sente que essa história pode ter muita identificação com a sua história e a da sua namorada. Através dessa identificação é que o público percebe a importância de se presentear a pessoa amada em uma ocasião especial. Percebe-se, nessa perspectiva, o predomínio de um discurso dionisíaco, que tende para a emoção, em detrimento do apolíneo, que limitaria-se apenas a descrever os atributos dos produtos e serviços da operadora. Outra estratégia adotada para fazer com que o público interaja com o video é através dos ângulos das câmeras, que foca em primeiro plano em diversos momentos, ou então em movimentos, de aproximação em direção aos personagens, ou travellings acompanhando assim os deslocamentos dos atores em cena. Dessa forma o espectador tem a sensação de estar entrando no vídeo, de estar participando da cena. É nesse universo proporcionado pelo discurso dionisíaco que encontra-se a possibilidade da publicidade ser cada vez mais híbrida. Ela apropria-se da linguagem do videoclipe de uma forma criativa, à medida que traduz em vídeo a história de uma música que, em 25 anos, nunca teve um clipe gravado. Dessa forma, o vídeo traz uma historia de anos atrás de uma maneira completamente nova, empregando o passado de forma recontextualizada. Essa é a essência do pós-moderno e constitui uma característica importente e crucial do vídeo, que aposta na intertextualidade e na integração entre música e vídeo. A produção vem preencher o vazio de uma música famosa com a qual todos se identificam. Dessa forma, ela também preenche o vazio do próprio público, que se insere na história e vive aquela emoção. A partir de uma releitura da música, utilizando-se do formato do audiovisual e apropriando-se da canção de uma nova maneira, o vídeo revela-se um verdadeiro pastiche. Também utiliza-se da linguagem cinematográfica para este mesmo fim, quando veicula o video em salas de cinema. Os meios utilizados na divulgação da campanha estavam diretamente inseridos no cotidiano do público. Através do Youtube, as pessoas viam e compartilhavam o conteúdo, que foi amplamente divulgado nas redes sociais. Além disso, os perfis dos personagens no Facebook ajudavam na identificação e interação do público com a ação e consequentemente com a marca. Estas são características de uma viralização da história, que possibilita maior exposição da operadora e impulsiona atos de consumo. Assim, este exemplo da campanha publicitária da Vivo sinaliza para a forma como a publicidade, através da sua hibridação com outras linguagens de produtos

culturais (como a música, o videoclipe, o filme) se atualiza para atrair o olhar do público e gerar não apenas mais atratividade para a peça publicitária em si, mas para gerar a circulação dessa peça, compartilhada por grupos de pessoas que “curtem” o conteúdo de entretenimento feito pela marca. Torna-se esta uma Publicidade colocada em circulação, em grande parte, pelo próprio usuário da web, permitindo a inserção da Publicidade disfarçada de Filme em sua rede de contatos nas redes sociais. Desta forma, mais do que produzir um sentido de mensagem publicitária, a campanha torna-se emblemática de uma Publicidade que usa o público como agente disseminador, que faz circular os sentidos criados pela e para uma marca.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BAUDRILLARD, Jean. A sociedade de consumo. Lisboa: Ed. 70, 2008. BARBOSA, Lívia. Sociedade de consumo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004. CARRASCOZA, João Anzanello. Razão e sensibilidade no texto publicitário: como são feitos os anúncios que contam histórias. São Paulo: Futura, 2004. CITELLI, Adilson. Comunicação, mídia e consumo. São Paulo, Volume 2, N.3, Páginas 155162, Março, 2005. ECO, Umberto. Algumas verificações: a mensagem publicitária. In: ECO, Humberto. A Estrutura Ausente: Introdução à Pesquisa Semiológica. São Paulo: Editora Perspectiva S. A, 1987. HUTCHEON, Linda. Poética do pós-modernismo: história, teoria, ficção. Rio de Janeiro: Imago, 1991. JAMESON, Frederic. Pós modernidade e sociedade de consumo. Novos Estudos CEBRAP, São Paulo n.°12, pp. 16-26, jun. 85 1985. LIPOVETSKY, Gilles; CHARLES, Sébastien. Os tempos hipermodernos. São Paulo: Barcarolla: 2004. LIPOVETSKY, Gilles. Sedução, publicidade e pós-modernidade. Revista FAMECOS: Mídia, Cultura e Tecnologia, Porto Alegre , n.12 , p.7-13, jun. 2000. PETERS, Michael. Pós-estruturalismo e filosofia da diferença: uma introdução. Belo Horizonte: Autêntica, 2000. THOMPSON, John B. A mídia e a modernidade: uma teoria social da mídia. Petrópolis: Vozes, 1998.

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.