Dinâmicas Socioeconômicas, planejamento e políticas urbanas implementadas na área central de São Paulo nos anos 2000.

October 12, 2017 | Autor: C. Pozzi de Castro | Categoria: Reabilitação Urbana
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DINÂMICAS SOCIOECONÔMICAS, PLANEJAMENTO E POLÍTICAS URBANAS IMPLEMENTADAS NA ÁREA CENTRAL DE SÃO PAULO NOS ANOS 2000. M. P. Ruivo, C. M. P. Castro

RESUMO Dados recentes divulgados pelo último Censo (IBGE, 2010) apontam uma reversão na tendência de esvaziamento populacional na área central da cidade de São Paulo. Depois de décadas de perda populacional e fuga de atividades econômicas para áreas de maior atratividade, é possível observar não só uma diminuição no ritmo de esvaziamento, mas o aumento no número de moradores de alguns distritos da área central. No entanto isso não significa necessariamente uma mudança de paradigma no processo de produção do espaço urbano no Brasil. O objetivo do trabalho é verificar até que ponto os recentes números são resultado de uma política de reabilitação da área central de caráter inclusivo, ou simplesmente a reprodução do mesmo modelo excludente de crescimento desigual e segregação espacial, em curso há décadas nas cidades brasileiras, focado prioritariamente em questões mercadológicas e interesses privados. 1 INTRODUÇÃO No Brasil o processo de expulsão de populações de menor poder aquisitivo de áreas centrais valorizadas e providas de infraestrutura para áreas com pouca ou nenhuma infraestrutura básica não é um fenômeno recente. Desde o final do século XIX o país convive com uma intensa crise habitacional, resultado de um crescente processo de industrialização. Entre 1885 e 1890 houve o primeiro surto de crescimento industrial, atraindo um grande número de trabalhadores do campo para a cidade. Entre 1886 e 1893 a população de São Paulo triplica, passando de 44.030 para 130.775 habitantes (BONDUKI, 1998, p. 18). Sem possuir infraestrutura capaz de suportar tamanho crescimento em um período tão curto de tempo, a situação se agravou e o Estado se mostrou incapaz de criar uma política habitacional eficiente para enfrentar a crise e planejar o crescimento da cidade. Mesmo com a criação do Banco Nacional de Habitação - BNH (1964 a 1984), que contava com a utilização dos recursos do Fundo de Garantia por Tempo de serviço (FGTS) e tinha como objetivo inicial promover a construção e aquisição da casa própria, em especial para a população de menor poder aquisitivo, a crise habitacional se intensificou. A produção do BNH se distanciou de suas metas iniciais com a elevação das faixas de renda do público alvo e a política habitacional desse período não chegou a prover habitações para a esmagadora maioria da população. Ao longo do século passado o processo de exclusão social se acentuou não apenas em São Paulo, mas nas demais capitais e a população de menor poder aquisitivo se viu forçada a ocupar locais distantes sem infraestrutura adequada, provocando um crescimento acelerado em áreas periféricas. Segundo Maricato (2000, p.140), boa parte

do crescimento urbano se deu fora de qualquer lei ou de qualquer plano, com tal velocidade e independência que é possível constatar que cada metrópole brasileira abriga, nos anos 1990, outra cidade de moradores de favelas em seu interior. Santos (2009, p. 50) aponta que, entre 1972 e 1980, o número de barracos na cidade de São Paulo cresceu 403%, enquanto a população aumentou pouco mais de 40%. Entre 1975 e 1977, o número de favelados dobrou, passando de 117 mil a 230 mil, distribuídos em 919 núcleos. Já em 1980 esse número chega perto de 600 mil, ou seja, 7% do total da população. Atualmente a cidade possui 3.576.864 domicílios particulares ocupados, sendo que cerca de 10% desse total (355.756) estão localizados em aglomerados subnormais, totalizando 1.280.400 pessoas (11,3% da população total do município) (IBGE, 2010). Entretanto esse crescimento desordenado não se deve exclusivamente à falta de planejamento, mas a um processo político e econômico que construiu no Brasil uma das sociedades mais desiguais do mundo e que teve no planejamento urbano modernista/funcionalista importante instrumento de dominação política e ideológica, que contribuiu para ocultar a cidade real e para a formação de um mercado imobiliário restrito e especulativo. (MARICATO, 2000, p. 124). Os centros urbanos concentram grande parte da oferta de empregos e atraem diariamente grande contingente de trabalhadores de todas as partes. Apesar disso, importantes áreas consolidadas das cidades passaram por um violento processo de esvaziamento nas últimas décadas do século XX. O repovoamento habitacional do centro de São Paulo é uma proposta que está em debate há anos. De acordo com Bonduki (2010) tanto em São Paulo como nas principais metrópoles brasileiras notou-se um processo gravíssimo de perda de população nas áreas urbanas melhor servidas por infraestrutura e emprego e um crescimento acelerado nas áreas periféricas e de proteção ambiental. Mas a partir dos anos 2000, conforme apontam dados do último censo (IBGE, 2010), começa a haver uma mudança importante no ritmo de esvaziamento da região central de São Paulo. Pela primeira vez em décadas a região passa a atrair novos moradores e sua taxa de crescimento populacional supera a taxa de crescimento total do município. O objetivo do trabalho é buscar possíveis respostas para essas questões, através da analise e comparação dos dados do último censo (IBGE) com dados sobre as políticas reabilitação da área central e instrumentos de planejamento urbano que podem ter atuado como indutores desse processo, juntamente com o papel exercido pelo mercado imobiliário e por investidores privados. Para isso foram levantados números sobre os resultados das políticas públicas e instrumentos de planejamento voltados para a reabilitação da área central no período de 2000 a 2010, e comparados com a produção do mercado imobiliário na região para o mesmo período. Embora os números sejam animadores, algumas questões importantes acerca dessa mudança precisam ser respondidas. Quais fatores podem ter contribuído para esse crescimento, depois de anos de debate e tentativas de contenção do processo de degradação e esvaziamento da área central? Quais instrumentos de planejamento urbano podem ter induzido esse processo? Qual o papel do mercado imobiliário e do capital financeiro privado? Quais os resultados efetivos dos programas sociais e das políticas de incentivo à moradia em área central vigentes no período? Houve alteração no estoque de unidades habitacionais vazias e/ou subutilizadas? Quantos foram os lançamentos de edifícios novos no mesmo período?

2 AS POLÍTICAS URBANAS E O REPOVOAMENTO DA ÁREA CENTRAL DE SÃO PAULO A partir da década de 1980 inicia-se no Centro Velho da cidade de São Paulo um intenso processo de esvaziamento populacional e degradação, atrelado à fuga de atividades econômicas para áreas de maior atratividade, como a região da Avenida Paulista e Faria Lima (CASTRO, 2010). Entre 1980 e 2000, na região correspondente à subprefeitura da SÉ1, houve uma diminuição de 152.256 mil habitantes. Nesse período o distrito da Sé chega a perder cerca de um terço de seus habitantes. Paralelamente a população do município de São Paulo passa de 8.493.226 habitantes para 10.434.252 Tabela 1. Se em 1950 a população da subprefeitura da SÉ corresponde a 16,31% da população total do município, nos anos 2000 não passa de 3,58%. Enquanto o centro se retrai e deixa subutilizada parte de sua infraestrutura, a periferia da cidade se expande em ritmo acelerado, agravando os problemas de mobilidade. Tabela 1 - População nos Anos de Levantamento Censitário no Município de São Paulo (MSP), Subprefeitura (SÉ) e Distritos Municipais (Bela Vista, Bom Retiro, Cambuci, Consolação, Liberdade, República, Santa Cecília e Sé) 2. Unidades Territoriais

1950

1960

1970

MSP

2.151.313

3.667.899

5.924.615



350.947

432.708

Bela Vista Bom Retiro Cambuci Consolação Liberdade República Sta. Cecília Sé3

46.340 45.880 35.499 38.228 55.523 35.994 63.460 30.022

57.364 53.893 39.789 52.182 68.210 48.346 80.581 32.343

População 1980

1991

2000

2010

8.493.226

9.646.185

10.434.252

11.253.503

445.175

526.170

458.677

373.914

431.106

64.704 45.662 39.727 60.600 71.503 50.348 83.075 29.555

85.416 47.588 44.851 77.338 82.472 60.999 94.542 32.965

71.825 36.136 37.069 66.590 76.245 57.797 85.829 27.186

63.190 26.598 28.717 54.522 61.875 47.718 71.179 20.115

69.460 33.892 36.948 57.365 69.092 56.981 83.717 23.651

A partir dos anos 2000 começa a haver uma alteração nesse cenário e dados do censo populacional de 2010 (IBGE) apontam uma taxa de crescimento positiva na área central (1,43% na subprefeitura da SÉ), superior à taxa de crescimento do município (0,76%) – Tabela 2. Pela primeira vez em décadas a região passa a atrair novos moradores, totalizando 57.192 novos habitantes. Apesar disso, a população da região hoje equivale à população nos anos 1960. Os distritos que tiveram as maiores taxas de crescimento foram Cambuci e Bom Retiro, com 2,55% e 2,45% respectivamente. Já a menor taxa de crescimento foi observada no distrito da Consolação (0,51%).

1

O município de São Paulo está dividido em 32 Subprefeituras que por sua vez se subdividem em Distritos. Fazem parte da subprefeitura da SÉ os distritos: Bela Vista, Bom Retiro, Cambuci, Consolação, Liberdade, República, Santa Cecília e Sé. Para evitar confusão entre a subprefeitura SÉ e o distrito Sé adotou-se como padrão utilizar letras maiúsculas (SÉ) sempre que se fizer referência à subprefeitura. 2 Fonte: Portal da Prefeitura de São Paulo – Histórico Demográfico do Município: http://smdu.prefeitura.sp.gov.br/historico_demografico/tabelas/pop_dist.php. Acesso em 03/04/14. 3 Os distritos da Sé e República formam a chamada Coroa Central do município.

Tabela 2 - Taxa de crescimento no Município de São Paulo (MSP), Subprefeitura (SÉ) e Distritos Municipais (Bela Vista, Bom Retiro, Cambuci, Consolação, Liberdade, República, Santa Cecília e Sé) 4. Unidades Territoriais MSP

Taxas de Crescimento 1970/1980 1980/1991 3,67 1,16

1950/1960 5,48

1960/1970 4,91



2,12

0,28

1,69

Bela Vista Bom Retiro Cambuci Consolação Liberdade República Santa Cecília Sé

2,16 1,62 1,15 3,16 2,08 2,99 2,42 0,75

1,21 -1,64 -0,02 1,51 0,47 0,41 0,31 -0,90

2,82 0,41 1,22 2,47 1,44 1,94 1,30 1,10

1991/2000 0,88

2000/2010 0,76

-1,24

-2,24

1,43

-1,56 -2,47 -1,72 -1,35 -0,71 -0,49 -0,88 -1,74

-1,41 -3,35 -2,80 -2,20 -2,29 -2,11 -2,06 -3,29

0,95 2,45 2,55 0,51 1,11 1,79 1,64 1,63

A figura abaixo mostra a evolução das taxas de crescimento nos distritos da cidade entre os anos 1980 e 2010.

Figura 1 – Taxas geométricas de crescimento anual do município entre os anos 1980/1991, 1991/2000 e 2000/20105.

A análise da figura nos permite perceber um maior equilíbrio nas taxas de crescimento na última década, sem grandes picos de crescimento ou esvaziamento. É possível notar que a periferia passou a crescer em ritmo um pouco mais lento, enquanto o centro da cidade deixa de ter um crescimento negativo. 2.1 As Políticas de Reabilitação da Área Central 4

Fonte: Portal da Prefeitura de São Paulo – Histórico Demográfico do Município: http://smdu.prefeitura.sp.gov.br/historico_demografico/tabelas/tx_cresc.php Acesso em 03/04/14. 5 Fonte: IBGE. Censos demográficos. Elaboração: Secretaria Municipal de desenvolvimento urbano – SMDU / Departamento de Estatística e Produção da Informação – DIPRO. Disponível em: http://infocidade.prefeitura.sp.gov.br/mapas/7_taxas_de_crescimento_populacional_anual_1980_10315.p df. Acesso em 17/04/14.

Castro (2010) aponta duas forças opostas atuantes nas políticas de reabilitação da área central de São Paulo. “De um lado uma vertente em que políticas públicas de desenvolvimento buscam romper o processo de segregação urbana de expansão periférica, num esforço de viabilizar a diversidade de acesso à moradia reabilitada. Em oposição, uma segunda vertente onde a permanência de moradores e trabalhadores de menor poder aquisitivo no centro é antagônica e conflitante aos interesses e processos da revitalização urbana. Seus princípios e ações seguem os cânones de agências de financiamento, consultores e investidores internacionais, empreendedores imobiliários e gerentes de cidades, adotando tanto as estratégias de valorização do capital imobiliário, como as definidas nas práticas de competição global”. Dentro da primeira vertente de atuação política que busca romper com o processo de segregação espacial, garantindo diversidade de rendimentos na região central, podemos destacar o programa Morar no Centro, concebido na gestão da prefeita Marta Suplicy entre 2001 e 2004. Teve como objetivo principal incentivar o uso residencial no centro da cidade, a partir de programas acessíveis a diferentes extratos da população, partindo do princípio que o repovoamento seria estratégico para a preservação e desenvolvimento equilibrado da região. Segundo Maleronka (2005), além de buscar a viabilização de projetos de moradia para as pessoas que trabalham próximas à área central, o programa foi uma tentativa de evitar os processos de expulsão de populações de menor poder aquisitivo, geralmente associados às políticas de reabilitação de centros urbanos. Outra característica importante do programa foi a priorização da reforma de prédios vazios e/ou subutilizados. Entre os principais Programas Sociais em vigência a partir dos anos 2000, podemos destacar: o PAR - Programa de Arrendamento Residencial (1999 a 2008), o Programa de Locação Social e o Programa de Cortiços. Uma das características comum a todos esses programas é o atendimento a pessoas de menor poder aquisitivo que não tem acesso ao mercado formal de habitação6. O Programa de Arrendamento Residencial (PAR), programa federal operado pela Caixa Econômica Federal, lançado como medida provisória em 1999 e convertido em lei no ano de 2001 contemplou a possibilidade de recuperação e reforma de edifícios existentes para fins habitacionais. Apesar do contexto favorável, devido ao estoque considerável de edifícios vazios ou subutilizados na região central, foram finalizados apenas sete empreendimentos, totalizando 709 unidades habitacionais7 (MALERONKA, 2005, p. 61; NEUHOLD, 2009, p. 107). O Programa de Locação Social, implantado pela Resolução nº 23 do Conselho do Fundo Municipal de Habitação (CFMU) em junho de 2002, foi criado com o objetivo de oferecer unidades habitacionais novas ou requalificadas a famílias com renda de zero a três salários mínimos, e pessoas sós, por meio de um contrato de locação social renovável a cada quatro anos, cuja taxa de recuperação mensal compromete entre 10 e 6

O Programa Federal Minha Casa Minha Vida (PMCMV), criado em 2009, não teve qualquer influência na melhoria dos dados apresentados na região central, uma vez que seus recursos estão sendo aplicados majoritariamente em áreas periféricas afastadas onde os terrenos são mais baratos. 7 São eles: Fernão Sales - 54 unidades (período de reforma 2000/01); Olga Benário Prestes - 84 unidades (período de reforma 2001/02); Riskallah Jorge - 167 unidades (período de reforma 2001/03); Edifício Labor (Brigadeiro Tobias) – 84 unidades (período de reforma 2002/03); Maria Paula – 75 unidades (período de reforma 2001/03); Hotel São Paulo – 152 unidades (período de reforma 2004/06) e Joaquim Carlos – 93 unidades (período de reforma 2004/07).

15% da renda familiar. Compõe o programa um total de cinco empreendimentos8, entregues entre 2004 e 2009, totalizando 853 unidades habitacionais (DIAGONAL URBANA, 2011). Implantado em 2006, o Programa de Cortiços atua junto aos proprietários dos imóveis para que obedeçam aos parâmetros legais vigentes (Lei 10.928/81 - Lei Moura e Decreto 33.189/93) e melhorem as condições de habitabilidade das famílias. Em 2001 a Subprefeitura da SÉ possuía um total cadastrado de 1.320 cortiços, totalizando 11.995 pessoas (LÓPEZ et al., 2010, p. 106). Já em 2010, de acordo com relatório anual da Diagonal Urbana (2011), de um total de 1295 imóveis trabalhados pelo Programa de Cortiços, 17 haviam sido reformados, sendo que outros 270 estavam com obras em andamento e 222 em definição com o proprietário quanto à reforma ou mudança de uso. Outros 51 imóveis haviam tido mudança de uso, 278 ainda não haviam sido vistoriados e outros 300 deixaram de ser classificados como cortiços e portando deixariam o programa. Se analisarmos a produção desses programas de reabilitação, podemos concluir que seus resultados ficaram aquém das expectativas e sozinhos não explicam o aumento de quase 60 mil novos moradores apenas na região da subprefeitura da SÉ. De acordo com o Censo 2010, houve um acréscimo de 37.880 Domicílios Particulares Permanentes (DPP) entre ao longo da década – Tabela 3. Parte dessa variação no total de DPP pode ser explicada pela diminuição no número de domicílios vagos – Tabela 4. Resultado ou não das políticas de incentivo à moradia em área central, o fato é que dos 34.592 domicílios vagos em 2000, 14.725 domicílios foram ocupados até 2010. Restam ainda quase 20 mil domicílios vagos na região, número ainda muito alto diante da carência habitacional do município. Em 2010, se observa a grande concentração de domicílios vagos em relação aos permanentes na Coroa Central – Sé (13,7%) e República (14,2%), cujo peso relativo é reduzido em relação a 2000. Tabela 3 - Número de Unidades Domicílios Particulares Permanentes (DPP) no Município de São Paulo (MSP), Subprefeitura da SÉ e Distritos Municipais (Bela Vista, Bom Retiro, Cambuci, Consolação, Liberdade, República, Santa Cecília e Sé) nos anos 20009 e 201010. Unidades Territoriais MSP

8

Total de DPP 2000

Total de DPP 2010

2.983.283

3.573.509



140.233

178.113

Bela Vista

24.714

29.945

Bom Retiro

8.213

10.608

Cambuci

8.924

12.636

São eles: Parque do Gato, com 486 unidades (entregue em 2004); Residencial Olarias, com 137 unidades (entregue em 2004); Vila dos Idosos, com 145 unidades (entregue em 2007); Conjunto Habitacional Asdrúbal do Nascimento, com 40 unidades (entregue em 2009) e Conjunto Habitacional Senador Feijó, com 45 unidades (entregue em 2009). Dos cinco empreendimentos, dois deles, embora localizados em áreas centrais, não estão dentro da Subprefeitura da SÉ: Residencial Olarias (Canindé) e Vila dos Idosos (Pari). 9 Fonte: Portal da Prefeitura de São Paulo – Secretaria de Desenvolvimento Urbano: http://infocidade.prefeitura.sp.gov.br/htmls/9_domicilios_particulares_permanentes_segu_2000_458.html Acesso em 14/04/2014. 10 Fonte: Portal da Prefeitura de São Paulo – Secretaria de Desenvolvimento Urbano: http://infocidade.prefeitura.sp.gov.br/htmls/9_domicilios_particulares_permanentes_segu_2010_458.html Acesso em 14/04/2014.

Consolação

21.800

26.315

Liberdade

21.962

27.307

República

20.792

26.289

Santa Cecília

26.151

35.915



7.676

9.098

Tabela 4 - Distritos da Subprefeitura da SÉ – Variação no número de domicílios vagos entre os anos 2000 e 201011 Unidades Territoriais

Total de domicílios vagos ano 2000



% total DPP* ano 2000

34.592 Bela Vista 5.479 Bom Retiro 1.821 Cambuci 1.910 Consolação 3.694 Liberdade 5.283 República 7.007 Santa Cecília 6.343 Sé 3.055 *DPP – Domicílios Particulares Permanentes

24,7 22,2 22,2 21,4 17 24,1 33,7 24,3 39,8

Total de domicílios vagos ano 2010

% total DPP* ano 2010

19.867 3.494 1.114 1.201 2.890 3.166 3.732 3.024 1.246

11,2 11,7 10,5 9,5 11 11,6 14,2 8,4 13,7

2.2 O papel do Mercado Imobiliário no processo de repovoamento A diminuição no número de domicílios vagos na região central indica uma importante tendência de reocupação da região e mostra um retorno importante de moradores a locais antes desvalorizados. Concomitantemente foi registrado no período um crescente interesse do mercado imobiliário e investidores privados em voltar a investir na área central. Como Castro (2010) apontou, havia a emergência de novas oportunidades para a produção habitacional para o Centro Velho. Aproveitando uma situação econômica favorável, crédito farto e recuperação do poder aquisitivo dos salários a partir da segunda metade da década de 2000, foram lançadas, no total, 20.728 unidades residenciais verticais apenas na subprefeitura da SÉ – Tabela 5, número próximo ao do estoque atual de domicílios vagos existente na área. Tabela 5 - Número de Unidades Residenciais Verticais Lançadas no Município de São Paulo, Subprefeitura da SÉ e Distritos Municipais entre os anos de 2000 e 201012. Unidades Territoriais MSP SÉ Bela Vista Bom Retiro Cambuci Consolação 11

Lançamentos 300.788 20728 4085 1659 2006 2736

Dados cedidos por Luiz Kohara, do Instituto Gaspar Garcia de Direitos Humanos. Elaboração: Kazuo Nakano e Luiz Kohara - livro Sentido territoriais e sociais, organizado por Aldaíza Sposati e Dirce Koga, Editora Senac (prelo). Fontes: Censos Demográficos IBGE, 2000 e 2010. 12 Fonte: EMBRAESP. Elaboração SMDU/DEINFO. Disponível em: http://infocidade.prefeitura.sp.gov.br/htmls/15_numero_de_unidades_residenciais_verticai_1992_10677.h tml. Acesso em 04/04/14.

Liberdade República Santa Cecília Sé

4074 2132 4024 12

Uma das consequências diretas do interesse do mercado imobiliário na região é a valorização dos imóveis e aluguéis, processo que dificulta não só o acesso e permanência de moradores de menor poder aquisitivo, como também a aquisição de imóveis para realização de programas sociais voltados para faixas de renda mais baixas. Essa é possivelmente uma das razões para os tímidos resultados dos programas sociais que previam a utilização do estoque vazio edificado da região central para fins habitacionais, ao lado das descontinuidades dos referidos programas de provisão. O interesse na área central não se restringe ao mercado residencial e programas habitacionais públicos, e nota-se uma forte tendência de valorização da região, devido ao número de conjuntos-tipo comerciais verticais lançados na subprefeitura da SÉ (10,7% do total de lançamentos do município) – Tabela 6. Nesse caso os lançamentos se concentraram na Bela Vista, Consolação, Liberdade e Santa Cecília. Tabela 6 - Número de Conjuntos-tipo dos Lançamentos Comerciais Verticais lançados no Município de São Paulo, Subprefeitura da SÉ e Distritos Municipais entre os anos de 2000 e 201013. Unidades Territoriais MSP SÉ Bela Vista Bom Retiro Cambuci Consolação Liberdade República Santa Cecília Sé

Lançamentos 22.929 2.453 846 811 392 404 -

Há um grande interesse corporativo para a região quando se trata de projetos urbanos de requalificação, que são conflituosos em relação à população que vive na região. As gestões Serra/Kassab (2005-12) investiram na proposta conhecida como Nova Luz (interrompida em 2013 devido a uma intensa mobilização popular), para atrair empreendimentos privados do setor terciário e promover uma renovação na região da República (SOUZA, 2010). Isto que revela a diversidade de interesses e propostas para o Centro no contexto democrático pós Constituição de 1988 e do Estatuto da Cidade. 2.3 Os Instrumentos de Planejamento Urbano Do conjunto de Instrumentos de Planejamento Urbano previstos pelo Plano Diretor Estratégico do Município, aprovado em setembro de 2002 (atualmente em processo de 13

Fonte: EMBRAESP. Elaboração SMDU/DEINFO. Disponível em: http://infocidade.prefeitura.sp.gov.br/htmls/15_numero_de_conjuntos_tipo_dos_lancamentos_1992_1054 2.html. Acesso em 04/04/14.

revisão), os que podem ser destacados como indutores do processo de repovoamento da região central são as Operações Urbanas, em especial a Operação Urbana Centro; a Outorga Onerosa do Direito de Construir e a demarcação de Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS). Já o IPTU progressivo, a ser aplicado em propriedades que não cumprem sua função social, até hoje encontra dificuldades para ser colocado em prática no município como um todo. Embora a demarcação de ZEIS em áreas centrais tenha sido uma vitória dos movimentos sociais, a utilização dessas áreas para a construção de moradias para a população de menor poder aquisitivo ainda está longe de ser efetiva. Segundo Kara José e Barreto Silva (2014) tem havido uma deturpação na utilização das ZEIS-3 para fins sociais e empresas têm utilizado essas áreas para a produção exclusiva de unidades para a classe média, em desrespeito às regras estabelecidas no PDE de 2002. Mas enquanto a utilização das áreas demarcadas para fins sociais acabou esbarrando em dificuldades para sua efetivação, o mesmo não ocorreu com a produção voltada para faixas de renda mais elevadas. Do total de estoque residencial de Outorga Onerosa do Direito de Construir disponível para a subprefeitura da Sé, cerca de 50% estavam comprometidos em dezembro de 2010. Nos distritos de Bela Vista, Cambuci e Liberdade praticamente não há mais outorga disponível. Os distritos da Sé e República foram os únicos que não tiveram o seus estoques alterados – Tabela 7. Do estoque não residencial, de 295.000,00m2 disponibilizados, 37,5% estavam comprometidos ao final de 2010 e novamente na Coroa Central restavam 100% deles não utilizados – Tabela 8. Tabela 7 - Estoque de Outorga - Situação do estoque Residencial na Subprefeitura da SÉ em 30/12/201014. Distrito Bela Vista Bom Retiro Cambuci Consolação Liberdade Republica Santa Cecilia Sé Total

Total Estoque (m2) 50.000,00 40.000,00 20.000,00 80.000,00 25.000,00 20.000,00 90.000,00 40.000,00 365.000,00

Comprometido (m2) 49.973,49 33.131,15 19.999,92 32.331,52 24.951,06 0,00 19.755,62 0,00 180.142,76

Disponível (m2) 26,51 6.868,85 0,08 47.668,48 48,94 20.000,00 70.244,38 40.000,00 184.857,24

Tabela 8 - Estoque de Outorga - Situação do estoque Não Residencial na Subprefeitura da SÉ em 30/12/201015. Distrito Bela Vista Bom Retiro Cambuci Consolação Liberdade Republica 14

Total Estoque (m2) 40.000,00 30.000,00 10.000,00 60.000,00 105.000,00 10.000,00

Comprometido (m2) 39.992,68 3.110,37 0,00 19.136,75 32.792,21 0,00

Disponível (m2) 7,32 26.889,63 10.000,00 40.863,25 72.207,79 10.000,00

Fonte: Portal da Prefeitura de São Paulo – Secretaria de Desenvolvimento Urbano: http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/chamadas/planilha_estoque_oficial_residencial _30_12_2010_1293729370.pdf . Acesso em 27/04/14. 15 Fonte: Portal da Prefeitura de São Paulo – Secretaria de Desenvolvimento Urbano: http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/chamadas/planilha_estoque_oficial_nao_reside ncial_30_12_2010_1293729488.pdf . Acesso em 27/04/14.

Santa Cecilia Sé Total

30.000,00 10.000,00 295.000,00

15.546,44 0,00 110.578,45

14.453,56 10.000,00 184.421,55

Isso mostra que apesar do estoque de edifícios vazios e/ou subutilizados na região, a construção de imóveis novos se mostrou muito mais atrativa para os investidores e agentes de mercado do que a reabilitação dos edifícios existentes. Segundo dados disponíveis no site da prefeitura, a somatória dos Valores Gerais de Venda (VGV) dos lançamentos residenciais verticais na subprefeitura da SÉ entre os anos 2000 e 2010 foi da ordem de R$ 5.122.589.131,00 (equivalente a 5,92% do VGV total do município para o mesmo período) 16. A Operação Urbana Centro (Lei 12.349/97) que abrange as regiões do chamado Centro Velho e parte de bairros históricos como Glicério, Brás, Bexiga, Vila Buarque e Santa Ifigênia, engloba uma área de aproximadamente 663 hectares. A Operação tem como objetivo a requalificação urbana, buscando estimular investimentos nessas áreas específicas. Mediante contrapartida financeira essa operação estabelece incentivos à produção de novas edificações, à regularização de imóveis, à reconstrução e reforma das existentes para sua adequação a novos usos, e também cria condições especiais para a transferência de potencial construtivo de imóveis de interesse histórico. Conforme previsto em todas as Operações Urbanas, os recursos delas advindos devem ser obrigatoriamente aplicados na própria região de cada Operação Urbana. Pelo resumo da movimentação financeira disponibilizado pela Prefeitura de São Paulo, é possível verificar o peso da venda de outorga como principal fonte de receita da operação urbana. Tabela 9 - Operação Urbana Centro - Resumo da movimentação até 31/01/2014 (Elaborado em: 10/03/2014) 17 OPERAÇÃO URBANA CENTRO ENTRADAS Outorga Onerosa Receita Financeira Líquida SAÍDAS Obras e Serviços Taxa de Administração Desapropriação Outras Despesas SALDO FINAL - DISPONÍVEL PMSP

R$ 44.261.850,91 R$ 29.095.143,38 R$ 15.166.707,53 -R$ 8.282.463,94 -R$ 3.064.791,63 -R$ 1.061.971,97 -R$ 4.017.192,93 -R$ 138.507,41 R$ 35.979.386,97

2.3 Favelas, Invasões e População em Situação de Rua. Se por um lado a região central tem mostrado uma tendência de reversão no processo de degradação e fuga de população, atraindo novos moradores para distritos que estavam sendo esvaziados há décadas, por outro lado os conflitos sociais continuam intensos e as populações de menor poder aquisitivo encontram cada vez mais dificuldade em se 16

Fonte: EMBRAESP. Disponível em: http://infocidade.prefeitura.sp.gov.br/htmls/15_valor_geral_de_vendas_dos_lancamentos_re_1995_10613 .html. Acesso em 18/04/2014. 17 Fonte: Portal da Prefeitura de São Paulo – Secretaria de Desenvolvimento Urbano: http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/desenvolvimento_urbano/sp_urbanismo/o ufinanceiro2014/ou_centro_financeirojan14_publicacao.pdf. Acesso em 05/04/14.

manter em seus locais de origem, uma vez que a região tem passado por um crescente processo de valorização. Segundo reportagem do jornal O Estado de São Paulo de 07/04/2014, a Prefeitura tem mapeado 49 prédios ocupados por movimentos de moradia na área central18. Além disso, de acordo com o relatório anual da SEHAB, a área ocupada por favelas na Subprefeitura da SÉ em 2010 era de 35.544,71m2, totalizando duas favelas com 463 famílias (DIAGONAL URBANA, 2011).Ao analisar a situação dos moradores em situação de rua da região, os números pioraram muito entre os anos 2000 e 2011, passando de um total de 3.387 pessoas recenseadas para 6.832 apenas na subprefeitura da SÉ – Tabela 10. Tabela 10 – Censo da População em Situação de Rua*19 Unidades Territoriais

Total de Pessoas Recenseadas Ano 2000 Ano 2011 Ano 2000 Ano 2011 Ano 2000 Ano 2011 5013 6765 3619 7713 8632 14478 MSP 2561 3747 826 3085 3387 6832 SÉ 138 135 14 540 152 675 Bela Vista 151 197 6 146 157 343 Bom Retiro 74 77 0 0 74 77 Cambuci 167 159 0 0 167 159 Consolação 109 92 627 523 736 615 Liberdade 715 719 81 488 796 1207 República 434 1197 51 1320 485 2517 Santa Cecília 773 1171 47 68 820 1239 Sé * Pessoas que não têm moradia e que pernoitam nas ruas, praças, calçadas, marquises, jardins, baixos de viadutos, mocós, terrenos baldios e áreas externas de imóveis, assim como aquelas pessoas, ou famílias, que, também sem moradia, pernoitam em centros de acolhida ou abrigos. ** Pessoas em pernoite nos espaços públicos da cidade Pessoas na Rua**

Pessoas Acolhidas

3 CONCLUSÃO Apesar dos números positivos registrados na última década, apontando uma reversão do processo de esvaziamento populacional nas áreas centrais da cidade de São Paulo, não se pode afirmar que esse crescimento é resultante da aplicação de políticas urbanas e habitacionais consistentes e constantes, coerentes com os princípios e diretrizes presentes no Estatuto da Cidade. O aumento populacional dos distritos da região central deve-se muito mais ao aquecimento do mercado imobiliário e interesse de investidores privados, bem como à disponibilidade de crédito para faixas de renda mais altas, do que como resultado das lutas por direito à moradia para diferentes faixas de renda na área central. Durante o período analisado, vários programas de reabilitação foram lançados na tentativa de conter o processo de esvaziamento e atrair novos moradores para a região central, mas nenhum com abrangência e resultados satisfatórios. Para agravar ainda mais a situação, o interesse do mercado imobiliário acabou gerando uma extrema valorização da região, dificultando ainda mais a aquisição de imóveis para programas sociais. Com isso corre-se o risco de aprofundamento no processo de segregação espacial nessas áreas, à medida que as populações de menor poder aquisitivo encontram dificuldades de permanecer em seus locais de origem e se veem forçadas a mudar para 18

Fonte: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,sem-teto-invadem-quatro-predios-no-centro-dacapital,1150270,0.htm Acesso em 18/04/2014. 19 Fonte: Portal da Prefeitura de São Paulo – Secretaria de Desenvolvimento Urbano: http://infocidade.prefeitura.sp.gov.br/index.php?cat=5&titulo=Assist%EAncia%20Social Acesso em 04/04/2014.

locais afastados, reproduzindo o mesmo padrão de crescimento desigual registrado no último século. Apesar do conjunto de instrumentos de planejamento disponíveis para garantir um desenvolvimento equilibrado e socialmente justo para a região, o que se verifica na prática é á utilização seletiva desses mesmos instrumentos, de acordo com os interesses e motivações do mercado imobiliário de um lado, ou de outro quando os movimentos organizados são atuantes e pressionam a administração pública, estadual ou municipal para atender as demandas sociais. 4 REFERÊNCIAS MARICATO, E. (2000). As idéias fora do lugar e o lugar fora das idéias, A cidade do pensamento único: desmanchando consensos. Editora Vozes, Petrópolis. BONDUKI, N. (1998) Origens da Habitação Social no Brasil: Arquitetura Moderna, lei do Inquilinato e Difusão da Casa Própria. Estação Liberdade, FAPESP, São Paulo. BONDUKI, N. (2010) Imposto progressivo sobre imóveis ociosos. Carta Capital, (19). CASTRO, C. M. P. de. (2010) O centro velho e a moradia: requalificação urbana em São Paulo. In: Pluris 2010 - 4º Congresso Luso -Brasileiro para o Planeamento Urbano, Regional, Integrado, Sustentável. Faro/Portugal. DIAGONAL URBANA (2011) Relatório anual SEHAB 2011. São Paulo. KARA JOSÉ, B.; BARRETO SILVA H. M. (2014) A PPP da Casa Paulista: solução ou impasse para a moradia popular no centro de São Paulo? Carta Maior. Disponível em: http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Cidades/A-PPP-da-Casa-Paulista-solucao-ouimpasse-para-a-moradia-popular-no-centro-de-Sao-Paulo-/38/29759 [Acesso 27/04/2014]. LÓPEZ, A., FRANÇA, E., COSTA, K. P. (2010) Cortiços. A experiência de São Paulo. HABI – Superintendência de Habitação Popular, São Paulo. MALERONKA, C. (2005) Par Reforma: Quem se habilita? A viabilização de empreendimentos habitacionais em São Paulo através do programa de arrendamento residencial - modalidade reforma: 1999-2003. Dissertação de Mestrado, IPT, São Paulo. NEUHOLD, R. R. (2009) Os Movimentos de moradia e sem-teto e a ocupação de imóveis ociosos: a luta por políticas públicas habitacionais na área central da cidade de São Paulo. Dissertação de Mestrado, FFLCH, São Paulo. SANTOS, M. (2009) Metrópole Corporativa Fragmentada. O caso de São Paulo. Edusp, São Paulo. SOUZA, F. F. (2010) Um olhar crítico sobre a concessão urbanística em São Paulo: formulação pelo executivo, audiências públicas e regulamentação pelo legislativo. Dissertação de Mestrado, FGV, São Paulo.

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