Direita retoma tese da \"vitória\" dos EUA no Vietnã - American conservatives go back to the thesis of an American \"victory\" in Vietnam

July 8, 2017 | Autor: Claudia Antunes | Categoria: Vietnam War, Iraq War, US Foreign Policy
Share Embed


Descrição do Produto

Direita retoma tese da "vitória" dos EUA no Vietnã

CLAUDIA ANTUNES
ESPECIAL PARA A FOLHA, DE CAMBRIDGE (EUA) 

A tese de que os EUA, na verdade, não foram derrotados no Vietnã está sendo
retomada em círculos políticos e militares próximos à Casa Branca. É uma
reação ao aumento da rejeição à Guerra do Iraque e à pressão interna para o
estabelecimento de um cronograma de retirada dos soldados americanos do
território iraquiano.
Segundo essa interpretação, as forças norte-vietnamitas e a guerrilha
vietcong estavam derrotadas quando as últimas tropas de combate americanas
deixaram o país, em 1973. O Exército sul-vietnamita, treinado pelos EUA,
teria condições de deter o avanço inimigo se o Congresso americano não
cortasse a ajuda militar a Saigon (hoje Ho Chi Minh) em 1975, depois da
renúncia do republicano Richard Nixon [1969-74].
O argumento -detalhado no penúltimo número da revista "Foreign Affairs" por
Melvin Laird, que foi secretário da Defesa de Nixon- tem múltiplas
implicações políticas. Em primeiro lugar, sustenta a pressão contra
iniciativas do Congresso que possam precipitar uma saída do Iraque antes
que os EUA sejam capazes de se proclamarem vitoriosos.
Recentemente, o presidente George W. Bush chamou os defensores da saída de
"derrotistas".
Em segundo lugar, a tese pretende demonstrar que o projeto americano de
"nation-building" -estabelecer um governo estável e um Exército eficaz- no
Vietnã do Sul deu certo e teria sido bem-sucedido se os EUA não tivessem
"traído" seus aliados. O mesmo sucesso, prossegue a analogia, pode ser
obtido no Iraque desde que Washington seja persistente e evite os erros
cometidos há 30 anos.
Finalmente, a interpretação sugere que a oposição dentro dos EUA foi a
única causa -e não parte das causas- da vitória comunista em 1975.
Portanto, o Vietnã não teria caído se os americanos tivessem controlado a
dissidência interna e usado o poder militar com maior determinação.
"A verdade sobre o Vietnã que os revisionistas convenientemente esquecem é
que os EUA não haviam perdido quando nos retiramos em 1973. De fato, nós
arrancamos a derrota das garras da vitória dois anos depois, quando o
Congresso cortou o financiamento que havia permitido ao Vietnã do Sul
continuar a luta sozinho", disse Laird na "Foreign Affairs", usando o mesmo
termo -revisionistas- usado pela Casa Branca contra os que acusam o governo
de ter falsificado provas para justificar a invasão do Iraque.
A partir de 1969, Laird coordenou os planos de "vietnamização" do conflito.
A responsabilidade pelas operações terrestres foi sendo transferida ao
Exército sul-vietnamita, enquanto os EUA reforçaram os bombardeios aéreos.
No artigo, ele afirma que resolveu "romper o silêncio" diante da "renovada
vilificação" do papel dos EUA no Vietnã à luz da Guerra do Iraque. "O
legado dessa desinformação deixou os EUA com medo de guerras, profundamente
avessos a intervir mesmo numa causa justa e desconfiados de sua capacidade
de sair de uma guerra uma vez que estejam nela."

Ofensiva do Tet
Laird também critica a imprensa, que acusa de retratar a Guerra do Iraque
como "um fracasso e uma futilidade" -da mesma maneira que retratou a
Ofensiva do Tet, em 1968 (em que o Vietcong perdeu dezenas de milhares de
homens), como uma derrota dos EUA. A ofensiva marcou a virada da opinião
pública contra o envolvimento do país no Vietnã.
O artigo do ex-secretário de Defesa foi saudado por Fred Barnes, editor-
executivo da "Weekly Standard", revista próxima ao governo. "A lição é
clara: uma guerra pode ser vencida no exterior e perdida em Washington",
concluiu Barnes. Há quatro meses, a revista já chamara a atenção para a
publicação em livro de trechos dos arquivos do general Creighton Abrams,
comandante americano no Vietnã a partir de 1969.
Os trechos foram selecionados pelo tenente-coronel reformado e veterano do
conflito Lewis Sorley, cujo livro "A Better War" (uma guerra melhor), de
1999, defende que os EUA venceram militarmente no Vietnã. Sorley diz que a
vantagem americana foi fruto da estratégia de Abrams, que substituiu as
operações de "busca e destruição" lançadas entre 1965 e 1968 pelas de
"limpeza e controle", para criar "áreas seguras" para a população do Sul,
minando as bases de apoio à guerrilha.
O argumento da vitória americana no Vietnã não é novo, diz o cientista
político Dan Reiter, co-autor de "Democracies at War" (democracias em
guerra): "Tanto Nixon quanto [o ex-secretário de Estado Henry] Kissinger
defenderam essa idéia por anos".
Para Reiter, é verdade que a estratégia militar dos EUA a partir de 1969
obteve melhores resultados, mas a sobrevivência do Vietnã do Sul se a ajuda
americana fosse mantida é especulação. "O Exército sul-vietnamita não era
tão eficaz assim, o governo não era tão legítimo assim. Mais ajuda poderia
atrasar o colapso, mas não sei se seria capaz de manter um Estado viável a
longo prazo."
Outros pesquisadores questionam a eficácia das operações de "limpeza e
controle", uma vez que muitas vezes a segurança foi obtida com bombardeios
que destruíram aldeias inteiras.
"O livro de Sorley é interessante, mas o outro lado, que ele não enfatiza,
é que os norte-vietnamitas e o Vietcong, depois de 1968, evitaram
confrontações a fim de reagrupar suas forças até a grande ofensiva de março
de 1972 [que levou os EUA a negociarem o cessar-fogo de janeiro de 1973].
Desse modo, a segurança relativa no Vietnã do Sul entre 1970 e 1972 também
tem muito a ver com a estratégia do inimigo", diz George Herring, autor de
"America's Longest War" (a guerra mais longa da América).
Herring contesta que a "vietnamização" tenha dado certo. "Os sul-
vietnamitas não estavam preparados para lutar sem o apoio dos EUA, e isso
independe do que houve no Congresso em 1975."
Quanto ao peso da oposição interna, Reiter lembra que a Guerra do Vietnã,
justificada pela necessidade de frear a expansão comunista na Ásia, teve
por muito tempo o apoio da maioria nos EUA.
De fato, um estudo do cientista político John Mueller, da Universidade de
Ohio, também na "Foreign Affairs", mostra que a queda da aprovação à Guerra
do Iraque começou mais cedo do que no caso do Vietnã. "No início de 2005,
quando as baixas [no Iraque] estavam em torno de 1.500, a porcentagem dos
que consideravam a guerra um erro -pouco mais da metade- era a mesma dos
que consideravam a Guerra do Vietnã um erro na época da Ofensiva do Tet,
quando quase 20 mil soldados já haviam morrido", escreveu Mueller.
Na opinião de Herring, o problema de teses como as de Laird é que elas são
"etnocêntricas demais". "Quando há um fracasso, deve ser por nossa culpa, e
procuramos bodes expiatórios em nosso meio: as más escolhas de nossos
líderes, a mídia, o movimento antiguerra. (...) O fato é que, no Vietnã,
mais bombardeios ou guerra não teriam resolvido o que sempre foi o problema
central -a viabilidade do Vietnã do Sul."
Laird, por seu lado, não subestima os custos e riscos da ocupação do
Iraque. Para que os iraquianos não sejam traídos, como ele acredita que os
aliados sul-vietnamitas foram, ele sugere que Bush e seus secretários
"sejam honestos" em relação à guerra. "O público americano vai tolerar
perdas de vidas se o conflito tiver objetivos alcançáveis, que valham a
pena e que sejam abraçados claramente pelo governo."
Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.