DIREITO DO BRINCAR À CRIANÇA COM DEFICIÊNCIA: UMA DEMANDA PARA MOBILIZAÇÃO SOCIAL PELA EDUCAÇÃO

July 5, 2017 | Autor: Kátia Leite | Categoria: Educação, Ludicidade, Mobilização Social
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DIREITO DO BRINCAR À CRIANÇA COM DEFICIÊNCIA: UMA DEMANDA PARA MOBILIZAÇÃO SOCIAL PELA EDUCAÇÃO Kátia Cristina Novaes Leite1 Najara Santos de Oliveira2 Luciane Ferreira Bomfim3 RESUMO: Crianças com deficiências normalmente, não conseguem ter acesso à maioria dos brinquedos e brincadeiras, quer sejam em espaços públicos ou mesmo em suas escolas.Numa perspectiva de contribuir para o atendimento garantido por leis federais e internacionais, este artigo discute através de uma pesquisa bibliográfica e documental o trabalho de Mobilização Social pela Educação realizado através da “Oficina Brincar para Todos”. Utiliza-se como embasamento teórico o Art.31, da Convenção sobre os Direitos da Criança (1989), o Art. 7 da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2008), o PMSE (2008) e autores que discutem a temática. A proteção e a efetivação dos direitos da pessoa com deficiência não são responsabilidades somente do Estado, mas da família, da sociedade, inclusive dos Movimentos de Mobilização Social. Concluímos que é necessário e possível, levar mais pessoas à reflexão e ação no sentido de buscar a proteção e garantia aos diferentes direitos dessas crianças. PALAVRAS-CHAVE: Direitos Humanos. Brincadeira. Deficiência. Políticas públicas. Mobilização Social pela Educação 1 - INTRODUÇÃO É direito da criança com deficiência, ser criança com deficiência, expressar-se como criança com deficiência, ter a sua disposição brinquedos adequados a crianças com deficiência e não objetos que acentuem suas diferenças. Afinal, brincando com igualdade de oportunidades, envolvendo-se no lúdico, crianças com e sem deficiência juntas se descobrem iguais nos direitos e beneficamente diferentes em suas condições, físicas, sensoriais e intelectuais. Entretanto, nem sempre as crianças deficientes participam das brincadeiras propostas na escola ou mesmo fora dela, quer seja por não conseguirem manusear os brinquedos, por

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Discente do Programa de Pós Graduação Educação e Contemporaneidade - PPGEduC (UNEB); Licenciada em Letras; Especialista em Educação Especial; Coord. APAE de Jacobina. Pesquisadora do grupo de Pesquisa TIPEMSE (UNEB). 2 Discente do Programa de Pós Graduação Educação e Contemporaneidade - PPGEduC ( UNEB); Oficial da Polícia Militar da Bahia; Psicopedagoga Insitucional; Especialista em Prevenção da Violência e Promoção da Cidadania; Pesquisadora do grupo de Pesquisa TIPEMSE (UNEB) 3 Discente do Programa de Pós Graduação Educação e Contemporaneidade - PPGEduC ( UNEB); Especiliata em Libras; Especialista em Atendimento Educacional Especializado (AEE), Licenciada em Pedagogia; Pesquisadora do grupo de Pesquisa TIPEMSE (UNEB)

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não terem acesso aos mesmos ou porque os jogos não são pensados para alcançar a todos os tipo de criança, mas essa realidade precisa mudar. Tanto por ser o brincar um direito de toda criança, assegurado em vários documentos nacionais e internacionais, quanto por se tratar de uma atividade de extrema relevância para o desenvolvimento infantil. Atualmente estamos vivenciando a Década das Américas pelos Direitos e pela Dignidade das Pessoas com Deficiência,

estabelecida pela Organização dos Estados

Americanos (OEA) para o período de 2006-2016. Durante essa década todos os países que integram a OEA deverão desenvolver projetos e programas de ação visando a promoção da cidadania e da qualidade de vida das pessoas com deficiência. Na Bahia são vários os movimentos sociais que assistem e promovem a inclusão da pessoa com deficiência em sociedade a exemplo das APAE, PESTALOZZI, Instituto de Cegos, Associação de Pais e Amigos de Deficientes Auditivos do Estado da Bahia (APADA) e Instituto Bahiano de Reabilitação (IBR). Existem também eventos sistemáticos promovidos por Universidades e outros institutos que visam educar as comunidades num processo de compreensão da diversidade e das diferenças democráticas que compõem um cenário social. Além disso, vemos multiplicarem-se os grupos de pesquisa que colocam em seus objetivos a pesquisa para promoção da igualdade de oportunidades e a defesa dos direitos das pessoas com deficiência. Trabalhando sobre esta perspectiva encontra-se o grupo de pesquisa em Tecnologias, Inovações Pedagógicas e Mobilização Social pela Educação (TIPEMSE) da Universidade Estadual da Bahia (UNEB). Através da discussão dessa e de outras temáticas nas ações de Mobilização Social pela Educação (MSE). Nossas ações visam atender, dentro de suas limitações, a demanda de garantia e acesso a um brincar inclusivo. Para tanto trabalhamos nas ações de MSE a “Oficina Brincar para Todos” onde são oferecidos exemplos de brinquedos e jogos que podem ser utilizados por todas as crianças, mostrando a possibilidade de utilizar o brincar como um meio de inclusão das crianças com deficiência. Com a oficina levamos a reflexão de que a proteção e a efetivação dos direitos da pessoa com deficiência não são responsabilidades somente do Estado, mas da família e de toda sociedade inclusive através dos Movimentos de Mobilização Social. Nesta perspectiva, apresentaremos neste artigo, inicialmente considerações a respeito das problemáticas que tem dificultado a efetivação do direito ao brincar às crianças com deficiência. No segundo momento abordaremos a possibilidade das ações de Mobilização

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Social pela Educação de propiciar a discussão e reflexão a respeito dessas questões, bem como de mobilizar pessoas para trabalharem em prol da efetivação desse direito. Feita essa discussão teórica propomos que seja dado continuidade ao trabalho realizado apresentando o lúdico como forma de acesso à inclusão nas ações de MSE, através da Oficina Brincar para Todos. Considerando que esta pode ser complementada, enriquecida e/ou melhorada, nas escolas/brinquedotecas/espaços de lazer como forma de efetivação da educação inclusiva e da inclusão social. 2 - O DIREITO AO BRINCAR E O DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA 2.1 A Criança, o brincar e o desenvolvimento Brincar faz parte do imaginário e da vivência infantil, entre tantas propriedades do brinquedo e do brincar, podemos destacar que a mais importante delas é a possibilidade de através da prática desse brincar, construir-se mundos, trabalhar-se a imaginação que desencadeia na permissão subjetiva de ser e aceitar o diferente.. Essa construção dar-se através das propriedades permitidas pelo brinquedo de facilitar e naturalizar a expressão mesmo para quem tem dificuldade em verbalizar seus desejos, possibilidades, realizações. Na escolha dos brinquedos, as crianças não levam em conta a aparência de luxo, o requinte tecnológico ou o preço, o que exerce influencia sobre as crianças é o encantamento produzido pelo brinquedo, esse encantamento dar-se pelo movimento que é produzido, pelas diversas possibilidades de utilização, de motivar brincadeiras e de interagir entre elas que leva à estimulação sensorial causadora do prazer traduzido no sorriso e na satisfação de quem brinca. O brincar infantil não pode ser considerado apenas uma brincadeira superficial, sem nenhum valor, pois, no verdadeiro e profundo brincar, acordam, despertam e vivem forças de fantasias que, por sua vez, chegam a ter uma ação direta sobre a formação e sobre a estruturação do pensamento da criança. Esse processo natural e sadio de se processar a inteligência não é possível, quando as crianças não realizam ou não conseguem mais o verdadeiro brincar. (ROJAS. 2007, p. 18)

Nesse sentido uma simples bola, assume o papel de ser mais que um objeto em jogo, ela torna-se uma parceira de vida, manipulada, sentida e transformada por fim em objeto de desejo, para experimentação plena e ampla das suas possibilidades, pois tão sério quanto o trabalho é para o adulto brincar e jogar o são para as crianças. KISHIMOTO( 2001) nos provoca com a seguinte a firmação:

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É brincando que se aprende o brincar. É jogando que se aprendem as regras do jogo. Enquanto o popular caracteriza-se pela geografia, diversidade espacial, que influencia a forma de objetos, materiais e artesanato, o tradicional, pela temporalidade, incluindo partes de canções, poemas, contos, práticas em desuso de adultos, que se tornam continua e persistentemente objetos do brincar infantil. KISHIMOTO( 2001, p. 34)

A brincadeira, nessa perspectiva poderá representar para a criança a possibilidade de solução de impasses que começam no brincar e se refletem na vida. O impasse causa a necessidade de ação, desencadeando uma serie de conexões e relações. Dessa forma e mediante o brincar, a criança se projeta nas atividades pertinentes à vida adulta, procurando a coerência com os papéis, encontrando no faz-de-conta condições para experimentação e futuramente o desenvolvimento de capacidades e habilidades, ampliadoras do conhecimento de mundo que possuem e carecem para viver em harmonia com o outro. Crianças com deficiência e seus impasses de vida e crianças sem deficiência nas descobertas das singularidades das crianças com deficiência. Encontrando impasses juntas e juntas resolvendo esses impasses. John Huizinga (1993) chamou de Homo ludens o homem que brinca, homem que se diverte, em referência às outras caracterizações de homem em determinados períodos da história da humanidade: Homo sapiens – homem que pensa, projeta e Homo faber – homem que trabalha, relacionando essa condição ao labor. Para Huizinga (1993), pesnsando dessa forma, a nossa capacidade de jogar e a possibilidade dessa ação jogar/brincar é tão importante para a espécie humana quanto o raciocínio e a construção de objetos. Vygotsky e Leontiev (1988) sinalizam que as atividades lúdicas, jogos e brincadeiras não se limitam unicamente ao prazer, pois a imaginação necessária para manter as atividades, as regras necessárias à condução de um jogo são características que servem para definir a brincadeira e o jogo, mesmo que a lógica estabelecida pela situação dessas atividades não seja formal. 2.2 Os Direitos das Crianças e os Documentos Oficiais Passamos atualmente pelo longo e complexo processo de construção de uma sociedade inclusiva na qual, entre outras desigualdades, as pessoas com deficiência, por muitas décadas discriminados no exercício cidadão, reivindicam participação e reconfiguração indenitária, em busca dos direitos comuns a qualquer ser humano: ser ele mesmo independente de suas características físicas, sensoriais ou intelectuais.Nesse processo de visibilidade social, vemos

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crescer as demandas por participação social e política deste grupo e seus representantes legais, instituições e movimentos que os representam. Vários avanços ocorreram em relação aos ganhos legais. Destacaremos aqui a Convenção sobre os Direitos da Criança (1989), promulgada no Brasil através do Decreto 99.710/1990, que traz no seu Art. 31: 1. Os Estados Partes reconhecem o direito da criança ao descanso e ao lazer, ao divertimento e às atividades recreativas próprias da idade, bem como à livre participação na vida cultural e artística. 2. Os Estados Partes respeitarão e promoverão o direito da criança de participar plenamente da vida cultural e artística e encorajarão a criação de oportunidades adequadas, em condições de igualdade, para que participem da vida cultural, artística, recreativa e de lazer.

Destacamos também a Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Pessoa Portadora de Deficiência (1999), promulgada pelo Brasil através do Decreto 6949/2009, onde prevê que as pessoas portadoras de deficiência têm os mesmos direitos

e liberdades que as outras pessoas, inclusive o direito de não ser

submetido a nenhuma discriminação por conta da deficiência. Bem como a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2008) que em seu Art 7 infere: 1.Os Estados Partes tomarão todas as medidas necessárias para assegurar às crianças com deficiência o pleno exercício de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais, em igualdade de oportunidades com as demais crianças. 2.Em todas as ações relativas às crianças com deficiência, o superior interesse da criança receberá consideração primordial. 3.Os Estados Partes assegurarão que as crianças com deficiência tenham o direito de expressar livremente sua opinião sobre todos os assuntos que lhes disserem respeito, tenham a sua opinião devidamente valorizada de acordo com sua idade e maturidade, em igualdade de oportunidades com as demais crianças, e recebam atendimento adequado à sua deficiência e idade, para que possam exercer tal direito.

O mais importante deles foi a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência ratificada pelo Brasil em julho de 2008, após um longo embate com os movimentos sociais envolvidos na área da deficiência. Onde o seu art. 30 dispõe sobre a participação da pessoa com deficiência na vida cultural, recreação, lazer e desporto em suas comunidades, ocupando cada vez mais espaços em ambientes institucionalizados da sociedade, propondo reorganizações e criação de leis em atenção às novas demandas sociais. Sendo assim, todo este movimento precisa ser valorizado, fazendo-se necessário, portanto, o desenvolvimento de estudos sobre esses grupos, suas lutas e conquistas coletivas assim como ampliar as situações de socialização destes resultados.

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3.0 MOBILIZAÇÃO SOCIAL PELA EDUCAÇÃO TRABALHANDO UM BRINCAR INCLUSIVO A Mobilização Social pela Educação é uma convocação realizada pelo MEC a toda a sociedade brasileira para realização de um trabalho voluntario em prol da melhoria da qualidade da nossa educação. Para tanto, em 2008 foi estabelecido o Plano de Mobilização Social pela Educação - (PMSE) que estabelece a estratégia de ação, o objetivo e as diretrizes para a implantação da mobilização nas comunidades. O PMSE tem como fundamentos “os direitos humanos, a cidadania, a ética, a solidariedade, a inclusão e a tolerância (PMSE, 2008, p. 01)”. A partir da estratégias de ação apresentada e dos fundamentos estabelecidos no PMSE cada comunidade deve estabelecer o seu plano de ação específico, levando em consideração as particularidades locais. Muitos teóricos mostraram a importância do lúdico para o desenvolvimento de potencialidades sociais, motoras e simbólicas. Deixando para nós um vasto material de pesquisa que mostra o brincar como elemento importante para a educação e o desenvolvimento infantil. O desenvolvimento das crianças com deficiência também é potencializado com o brincar, pois: As crianças precisam brincar, independentemente de suas condições físicas, intelectuais ou sociais, pois a brincadeira é essencial a sua vida. O brincar alegra e motiva as crianças, juntando-as e dando-lhes oportunidade de ficar felizes, trocar experiências, ajudarem-se mutuamente; as que enxergam e as que não enxergam, as que escutam muito bem e aquelas que não escutam, as que correm muito depressa e as que não podem correr (SIAULYS, 2006, p. 09)

Sendo assim, cabe aos mobilizadores sociais pela educação e educadores a tarefa de oferecer possibilidades para a inclusão efetiva das pessoas com deficiência em todos os aspectos da vida escolar e social, especialmente no que tange ao brincar, para que por intermédio da ludicidade e da afetividade possamos colaborar para o desenvolvimento integral do indivíduo. E cabe aos familiares e aos representantes dos movimentos sociais das pessoas com deficiência estarem atentos para que o direito ao brincar das crianças com deficiência seja garantido. Foi visando atender a essa demanda social que a Oficina Brincar para Todos foi pensada e construída, e é com esse intuíto que ela vem sendo trabalhada em várias cidades no interior e na capital da Bahia, 3.1 A “Oficina Brincar para Todos” Pensando no brincar para todos é que surgiu a proposta de descobrir juntos de que forma os brinquedos podem nos unir não transformando diferenças em desigualdades. Essa é

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o argumento da Oficina Brincar para Todos, oferecida nas Ações de Mobilização Social pela Educação que visa possibilitar aos participantes refletir sobre como todas as crianças independente da condição física ou intelectual, podem brincar juntas. Como afinal brincar de forma inclusiva e as possibilidades desse brincar utilizando brinquedos acessíveis, evocando Vygotsky no entendimento de que “o mundo não é visto simplesmente com cor e forma, mas também como um mundo com sentido e significado”. (1991, p. 37) A questão crucial da Oficina e que desperta a reflexão do grupo é se o nosso brincar serve para todos, se quando planejamos o brincar em nossas instiutições de ensino e espaços cumunitários vislumbramos um brincar onde ninguém seja excluido, tenha que parar e aguardar a proxima brincadeira que talvez lhe seja “adequada”. Ao concluir negativamente essa questão inicial, evocando os espaços e suas barreiras, o tipo de brincadeira que geralmente é proposta, encaramos o desafio de criar outras possibilidades de promover a inclusão através da brincadeira, algo tão natural à criança de acordo com Almeida e Tavares (2009, p. 164-165) O brincar desenvolve a imaginação, estimula a atividade motora, faz criar cumplicidade entre aqueles que jogam e dançam juntos favorecendo a socialização, independente de seus graus de habilidades/capacidades e das necessidades educacionais especiais. O brincar é indispensável para o desenvolvimento do potencial de todas as crianças. É brincando que a criança experimenta situações e emoções da sua realidade. (ALMEIDA e TAVARES, 2009, p.164-165)

São apresentados na Oficina Brincar para Todos e estão disponíveis para socialização por escolas e quaisquer instituições educativas interessadas, três brinquedos não industrializados, passíveis de confecção por qualquer pessoa que tenha habilidades mínimas com uma máquina de costura e colagem e possibilidades de adaptação às mais variadas necessidades de quem brinca, nesse caso crianças com diversos tipos de deficiências, sejam elas físicas, sensoriais ou intelectuais. Sejam cegos, surdos, crianças com deficiências físicas ou amputações. Chamamos o primeiro brinquedo de Caixa Multiuso. Uma caixa retangular com dimensões de 30x60, forrada de forma criativa com apenas um ou dois orifícios por onde as mãos das crianças alcançam seu interior para a manipulação de objetos introduzidos pelo professor, previamente separados por categorias ou não, a depender do objetivo de utilização da caixa na atividade proposta ou no objetivo de aprendizagem planejado pelo professor para um aluno ou grupo. Sugerimos que a caixa possua apenas um orifício, com o intuito de evitar o constrangimento de utilizadores que dispõem apenas de uma mão ou um pé controláveis por si.

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O sentimento de surpresa é o maior atrativo da caixa, apesar da apresentação previa dos elementos inseridos, suas características e usos. Fica para a criança a pergunta e a expectativa do inesperdo, alimentado pelo fértil imaginário infantil. A “formalização” do saber com a caixa pode se dar de várias maneiras: através de pranchas de figuras, números, letras, texturas, painel sonoro ou simplesmente a mímica. Conseguir, ser vitorioso em uma atividade de forma efetiva, com suas capacidades reveladas supera qualquer limitação e é o elemento impulsionador de novas conquistas, estimulando o ato de arriscar-se comungando com Sutton-Smith (1986) que nos afirma que o brincar, enquanto fruto de uma construção social, assume característica principal de ser ato binário, paradoxal, opondo-se, por exemplo a liberdade e o controle, admitindo porém, a importância de deixar a criança expressar seus desejos limitando o controle adulto. Para as crianças cegas é importante que os objetos que serão inseridos na caixa sejam descritos de forma minuciosa, a fim de oferecer-lhes a possibilidade de participação em igualdade de condições com as crianças que poderão ver inicialmente os objetos. Isso porque caso o professor/oficineiro/brinquedista deseje trabalhar os meios de transporte, por exemplo, fará diferença a compreensão por uma criança cega da diferença entre uma caçamba e um ônibus ou ambulância, bem como de um carro de passeio e uma viatura policial. E nesse item destacamos também a importância de símbolos que caraterizem o objeto serem destacados em alto relevo nos brinquedos, e serem trabalhados com a criança previamente. O segundo brinquedo trabalhado é a Corda Mágica, um pedaço de elástico de 3m, revestido com tecidos coloridos e arrematados nas pontas de forma a tornar-se um círculo ou o que permitir a imaginação infantil: trenzinho, carro, elástico, castelo, fronte, dentre outros. O brinquedo favorece o uso em pé, sentado ou deitado, possui alças que podem ser usadas por quem usa as mãos, pés ou precisa de encaixes por não dominar os membros inferiores ou superiores, no caso de crianças com paralisia cerebral ou outras deficiências físicas. A criação de uma situação imaginária não é algo fortuito na vida da criança; pelo contrário, é a primeira manifestação da emancipação da criança em relação às restrições situacionais. O primeiro paradoxo contido no brinquedo é que a criança opera com um significado alienado em uma situação real. O segundo é que, no brinquedo, a criança segue o caminho do menor esforço – ela faz o que mais gosta de fazer, porque o brinquedo está unido ao prazer – e, ao mesmo tempo, ela aprende a seguir os caminhos mais difíceis, subordinando-se às regras e, por conseguinte, renunciando ao que ela quer, uma vez que a sujeição a regras e a renúncia à ação impulsiva constitui o caminho para o prazer no brinquedo. (VYGOTSKY, 1991, p.113)

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O uso da Corda Mágica oferece à criança uma série de possibilidades de criação, estimulando á imaginação e ao professor uma série enorme de possibilidades de uso, pois a mesma favorece todas as áreas de desenvolvimento das crianças de todas as idades e suas necessidades. O desenvolvimento social, o emocional, o motor, a linguagem e o desenvolvimento cognitivo são amplamente privilegiados, estimulando a aprendizagem ativa através da cooperação, a atenção e a concentração requeridas pelo movimento constante e desafiador, o que é necessário a qualquer criança não só as que possuem deficiências. Outro objetivo importante da Corda Mágica é o desenvolvimento das habilidades sociais, nas crianças não surdas, através da solicitação cadenciada das trocas de turno na fala e habilidades, além de trabalhar fornecendo informações sensoriais para as articulações e músculos, uma necessidade das crianças que tem deficiências físicas. Falar enquanto brinca possibilitando que espontaneamente a criança use sua capacidade de separar o significado do objeto sem saber que o está fazendo, sem parecer algo sofrido ou obrigatório. Da mesma forma que ela não sabe formalmente que está fazendo uso da linguagem em prosa e, no entanto, fala, sem prestar atenção às palavras, desvendando sentimentos, dando ao professor pistas por onde seguir na mediação do brincar e dos demais aprendizados. Por meio do brinquedo, é possibilitado á crianças atingir uma definição funcional de conceitos e objetos e, “assim, as palavras passam a se tornar parte de algo concreto. A ação da criança, no momento do brincar, é o ponto de partida para o desenvolvimento de suas capacidades.” (ROJAS. 2007, p. 26) Por fim é trabalhado o Lençol Colorido, um composto de triângulos de várias cores formando um octógono, com adaptações nas pontas para favorecer a participação de alunos com os mais diversos tipos de deficiências na mesma proposta da Corda Mágica: todos podem fazer uso sem restrições. O lençol é utilizado para a brincadeiras com bolas de vários tipos com o objetivo de máxima diversão e movimento sem deixar a bola cair. As bolas são enriquecidas com guizos para favorecer o uso de alunos com deficiência visual e com texturas para os demais alunos com outras deficiências ou não. Importante ressaltar a necessidade da presença de um profissional interprete de LIBRAS antes e durante os momentos de utilização dos brinquedos, para que possa proporcionar uma participação efetiva das crianças surdas. Para tanto é necessário um encontro prévio entre o professor/oficineiro/brinquedista e o interprete a fim de que este possa conhecer as regras, os comandos, os momentos e os procedimentos do jogo e dessa forma ambos possam fazer as melhores adaptações para contemplar esses indivíduos, por se

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encontrarem alinhados no momento da brincadeira. Os comandos que indiquem mudança de movimento/tempo/ritmo devem ser feitos de forma sonora e gestual, considerando a necessidade de se alcançar tanto crianças cegas quanto surdas. Todos os brinquedos trabalhados na Oficina, apresentados para uso criativo do professor e das famílias tem a possibilidade de serem transformados em diversas brincadeiras divertidas, inclusive cantadas, aumentando ainda mais o prazer proporcionado e o envolvimento do grupo que ao integrar-se brincando, consequentemente inlcui.

4 - SEM DESEJAR CONCLUIR Ao envolver-se na educação e, portanto conscientes das singularidades das aprendizagens de cada aluno o professor envolve-se também na tarefa de planejar o que será efetivamente usado por esse aluno. As descobertas exitosas passam a ser desejos de compartilhamento. Esse compartilhamento de experiências e êxitos dialoga com a interculturalidade proposta por Kincheloe (1999), quando este afirma que quando nos propomos a compartilhar a cultura com outros, aprendem-se e ensinam-se brincadeiras nas quais se utilizam habilidades, cooperação, interação. A interação entre quem brinca e suas diversidade, não pretende simplesmente a apropriação e a integração das brincadeiras, com a perda das especificidades culturais e sim uma convergência enriquecedora. Divulgar

e estimular variantes das brincadeiras evita

práticas de dominação. Conhecer as diferentes formas de brincar e especificar as regras de uso para cada grupo social é respeitar o outro, suas singularidades e abrir-se às possibilidades que democratizam o brincar para todos, direito da criança objetivo de quem educa para a diversidade. Como bem colocam Leite e Oliveira (2014) o trabalho de inclusão das crianças com deficiência nos momentos de lazer, nas escolas, além de contribuírem para o desenvolvimento global dessas crianças também fornecem uma grande contribuição no processo de formação moral e social das crianças sem deficiência. Pois nesses momentos, muito mais que nos horários de educação formal é possível que as crianças tenham contato com a inteireza do ser existente no outro. Sendo possível perceber que embora de uma forma diferente da habitual o outro também pode se divertir e propiciar diversão. Se tornando um espaço ideal para criação de vínculos e para a aprendizagem viva da tolerância e do respeito a diferença, além de trabalhar na desconstrução dos rótulos criados pelos adultos.

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Urge então a necessidade de nos debruçarmos sobre as leis que garantem esses direitos às crianças e através das propostas de MSE promovermos o empoderamento da escola, da família e das comunidades no que se refere à discussão, a critica e o cumprimento das garantias legais que cercam a infância e suas demandas. Sendo a Oficina Brincar para Todos uma iniciativa que pode e deve ser melhorada, adaptada e enriquecida visando atender as especificades de cada criança e localidade, visto que seus difusores buscam levar pessoas à reflexão e ação para defesa e garantia do direito ao gozo pleno da infância pelas crianças com deficiência.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA, Clarita Claupero; TAVARES, Helenice, Maria. O brincar da criança com deficiência. Revista da Católica, Uberlândia, v. 1, n. 2, p. 159-168, 2009. Disponível em: < http://catolicaonline.com.br/revistadacatolica2/artigosv1n2/13-PEDAGOGIA-02.pdf>. Acesso em: 03 jun. 2014. BRASIL. Decreto n.º 99710, de 21 de novembro de 1990. Promulga a Convenção sobre os Direitos da Criança. BRASIL. Decreto nº 6949, de 25 de agosto de 2009. Promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007. BRASIL. Plano de Mobilização Social pela Educação, 2008, MEC. CONVENÇÃO INTERAMERICANA PARA ELIMINAÇÃO DE TODAS AS FORMAS DE DISCRIMINAÇÃO CONTRA A PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA, 1999, GUATEMALA. CONVENÇÃO SOBRE OS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA, 2008. CONVENÇÃO SOBRE OS DIREITOS DAS CRIANÇAS, 1989. HUIZINGA, J. Homo ludens. São Paulo: Perspectiva, 1993.disponível em: http://jnsilva.ludicum.org/Huizinga_HomoLudens.pdf KINCHELOE, Joe et al. Repensar el multiculturalismo. Barcelona: Editora Octaedro, 1999. KISHIMOTO, Tizuko. Jogo, brinquedo, brincadeira e educação. São Paulo: Cortez, 2001. LEITE, Kátia Cristina Novaes; OLIVEIRA, Najara Santos de. Brincar para Todos: Uma Experiência na Fabricação e Utilização de Brinquedos Acessíveis que Possibilitam o Trabalho com a Diversidade. In: I Congresso Baiano de Educação Especial e Educação Física Adaptada, 2014, Jacobina. ROJAS, Jucimara. Jogos, brinquedos e brincadeiras: a linguagem lúdica formativa na cultura da criança. Campo Grande: UFMS, 2007. SUTTON-SMITH, Brian. The spirit of play. In: Review of research, volume 4. Greta Frein, Mary Rivkin, 1986.

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