DIREITO JURISPRUDENCIAL E A FORÇA NORMATIVA DO PRECEDENTE: a teoria e o novo código de processo civil, crítica ao padrão de interpretação do direito jurisprudencial e dos precedentes pelo poder judiciário brasileiro

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3. DIREITO JURISPRUDENCIAL E A FORÇA NORMATIVA DO PRECEDENTE: a teoria e o novo código de processo civil, crítica ao padrão de interpretação do direito jurisprudencial e dos precedentes pelo poder judiciário brasileiro

Já é pacífico o entendimento que já se faz presente um verdadeiro fortalecimento na utilização de decisões passadas de determinado tribunal como base de fundamento para futuras decisões judiciais, característica notória e basilar do sistema de common law, principalmente quando o sistema jurídico brasileiro utiliza de julgados de tribunais superiores como se fossem precedentes em sua essência, quando na verdade o cotidiano do sistema jurídico brasileiro promove uma utilização peculiar e distorcida da teoria dos precedentes, utilizando das súmulas e ementas como uma amplitude das leis, transformando os tribunais em uma espécie de legitimado extraordinário para a atividade legislativa, ferindo, desta maneira, o pacto federativo, aplicando os precedentes como comandos e regras gerais e abstratos, quando na verdade os precedentes devem estar ligados estritamente ao enunciado de caso que o produziu, tal equivoco acaba por acarretar um engessamento do judiciário, tendo em vista que a plasticidade da utilização dos precedentes estará ameaçada, o que acarreta, consequentemente em graves danos à celeridade processual e segurança jurídica aos jurisdicionados que pleiteiam demandas judiciais diariamente.
Desta feita, pela historicidade pobre do sistema brasileiro no que tange ao contato com o sistema, geralmente anglo saxão de ótica jurídica, o sistema jurídico brasileiro acabou por tomar outros nortes e fundamentos, bem como princípios mais voltados para uma litigância individualista, como será abordado mais adiante; ocorre que, com a necessidade cada dia mais alarmante em atribuir à atividade jurídica uma pontuação mais célere e efetiva devido às mudanças de paradigma e de cunho tecnológico e social de uma coletividade cada dia mais integrada ao mundo globalizado, o novo código processual civil veio a fim de atribuir ao processo civil características de toda uma dogmática principiológica nova, inserindo novos institutos, em prol de uma demanda mais célere, estando o instituto de resolução de demandas repetitivas dentro deste rol, ocorre que se faz necessário uma compreensão mais completa e didática da teoria dos precedentes, bem como suas origens e conceitos principais, mesmo pela historicidade adversa brasileira no estudo de elementos característicos de outro sistema jurídico, common law, tendo em vista que o Brasil, ad inicium, sempre fora adepto predominantemente ao sistema de civil law, sendo a teoria dos precedentes judiciais estranha à maioria das positivações e doutrinas dentro da jurisdição brasileira, sendo que o capítulo 3 desta obra se concentrará em explicitar as origens do Instituto de resolução de demandas repetitivas, bem como moldará um estudo na perspectiva de direito comparado com o instituto alemão musterverfahrensgetz (KapMu), estando o atual capítulo voltado exclusivamente para a elucidação da teoria dos precedentes, sua origem e sua força normativa no que tange às causas, sobretudo as repetitivas, objeto do Instituto de resolução de demandas repetitivas, presente no NCPC, onde será composto os conceitos basilares da teoria, bem como a presença de elementos da teoria no IRDR, tal análise se faz de vital importância para um bom estudo acerca das novas perspectivas processuais presentes no novo código de processo, visto que a grande maioria do aparato jurídico brasileiro desconhece a processualística teórica e procedimental dos precedentes, o que fundamenta a relevância tópica de um capítulo voltado exclusivamente para esta temática, a fim de dar ao processo maior vitalidade, assegurando o que é garantido pela EC/45, adequando o processo civil novamente para as premissas da celeridade e efetividade processual, bem como à segurança jurídica.
3.1 Os sistemas de common law e civil law
O Brasil, como país herdeiro da família romano germânica, tem como fonte primária de Direito, a lei, descendência do positivismo jurídico, com essa afetação, consequentemente constituiu-se no Brasil um sistema positivado conhecido como civil law, assim como a maioria dos países europeus baseados no sistema romano-germânico, este sistema é composto na lei como fonte primária de direito, onde, através dela, a atividade jurisdicional é vinculada, sendo o juiz uma espécie de declarante da vontade da lei. Nesse sentido, temos Miguel Reale ao falar sobre a tradição romanística.
[...] caracteriza-se pelo primado do processo legislativo, com atribuição de valor secundário às demais fontes do direito. A tradição latina ou continental (civil law) acentuou-se especialmente após a revolução francesa, quando a lei passou a ser considerada a única expressão autentica da nação, da vontade geral, tal como verificamos na obra de Jean Jaques Rousseau, du contrat social. (REALE, 2002, pág. 141).

O sistema chamado Civil law, tem, a partir dos ideais revolucionários da revolução francesa, certas ideologias e princípios resultados de impacto pelo constitucionalismo, onde a lei é a fonte principal de direito, constituindo-se nesse sistema uma grande resistência a determinados institutos de origem diversa, como ocorre com os precedentes judiciais, característicos do sistema de common law, nesse sentido temos Marinoni:
O civil law carrega, a partir das bandeiras da Revolução francesa, dogmas que ainda servem para negar conceitos e institutos que, muito embora não aderentes à sua teoria e tradição, mostram-se indispensáveis diante da prática e da realidade de países que se formaram a partir da doutrina da separação escrita entre os poderes e da mera declaração judicial da lei.
Não obstante as transformações que se operaram no civil law – inclusive nas concepções de direito e de jurisdição, marcadamente em virtude do impacto do constitucionalismo – e as especificidades do sistema brasileiro – que se submete ao controle difuso da constitucionalidade da lei -, há notória resistência, para não se dizer indiferença, a institutos do common law, de grande importância ao aperfeiçoamento do nosso direito, como é o caso do respeito aos precedentes. (MARINONI, 2009, pág. 2)

Ao contrário dos países de descendência romano germânica, os países de origem anglo saxônica moldaram uma diferente forma de estudar e de modelar o direito interno, modelo que se pauta na utilização dos precedentes judiciais como fonte direta de direito, sistema este chamado common law, baseado na teoria do stare decisis, do latim( stare decisis et non quieta movere) que significa mantenha-se a decisão e não se moleste o que foi decidido, doutrina também conceituada como doctrine of binding precedent, originada na Inglaterra do século XIX, tendo sua primeira aparição em 1898, quando a câmara dos lordes inglesa tratou do efeito vinculante do precedente e também definiu sua eficácia vinculativa a todos os juízos de grau inferior, a chamada eficácia vertical dos precedentes, que será abordada mais adiante.
Muitos juristas, motivados pela falta de compreensão completa da teoria dos precedentes, acabavam por estabelecer alegações infundadas sobre o papel do juiz no que tange aos limites da jurisdição, alegando que o juiz seria um criador legislativo extraordinário, ferindo a esfera legislativa de poder, tornando o juiz no sistema de common law um ser estranho ao Direito nacional, para responder este questionamento, podemos utilizar as chamadas súmulas vinculantes, introduzidas no ordenamento jurídico brasileiro pela Emenda constitucional n° 45, constituem-se de normas gerais que, em que pese julgarem um caso especifico também são aplicadas reflexivamente a outros casos análogos, o juiz não legisla, visto que essas súmulas são originadas da interpretação do jurista de uma lei já existente no ordenamento jurídico, ele portanto não cria leis, apenas as interpreta e as molda conforme um entendimento baseado em fatos e casos concretos.
3.1.1 Common law e a teoria declaratória e constitutiva
Ad inicium, utilizou-se na Inglaterra da ideia que o magistrado apenas gozava do poder de declarar o direito, não dispondo de autoridade de criação de novos direitos, devendo manter e declarar um direito já reconhecido, nesse sentido, Marinoni:
Inicialmente, sustentou-se, na Inglaterra, a tese de que o juiz apenas declara o direito. Um dos seus principais defensores foi Blackstone. Em seu entendimento existiria lex non scripta – o direito não escrito ou o common law – e a lei escrita – o direito escrito ou o statue law. O common law propriamente dito espelharia os costumes gerais, embora a lex non scripta ainda englobasse os costumes particulares de algumas partes do reino, assim como os costumes observados apenas em algumas cortes e jurisdições (MARINONI, 2009, pág. 12)

Em combate a teoria declaratória, alguns doutrinadores como Bentham e Austin condenaram utilizando-se do argumento de que o juiz era muito mais do que um mero repetidor mecânico de decisões baseadas em precedentes ou mesmo na própria lei, utilizando o magistrado, ao julgar, de meio criativo de normas jurídicas, não podendo as normas jurídicas serem extraídas por ninguém, como pensavam os adeptos da teoria declaratória, sendo, para os positivistas, o common law desenvolvido e criado por um juiz que dispõe de autoridade para tanto, law making authority, sendo o direito uma criação humana e não descoberto, moldando-se de um pensamento solidamente kelseniano para fundamentar sua teoria, onde, desde que o agente goze de validade, ele tem autoridade para o desenvolvimento da matéria jurídica, o que vem a quebrar com o entendimento diverso do civil law, baseado em fundamentações do ideal francês à época, separando os poderes, dificultando o acesso do juiz à criação jurídica
Em que pese o conflito entre as duas teorias, é pacífico que ambas trazem consigo um respeito grande à utilização de precedentes dentro de suas hipóteses normativas.
Para concluir e advogar por uma possibilidade de utilização e adequação da utilização de precedentes judiciais dentro do ordenamento jurídico brasileiro, deve-se compreender que o sistema de common law vigorou por muito tempo desatrelado da ideia de stare decisis, ou seja, da ideia de vinculação obrigatória de precedentes, sendo o stare decisis apenas um elemento que compõe o common law, nesse sentido, Marinoni:
Como escreve Simpson, qualquer identificação entre o sistema do common law e a doutrina dos precedentes, qualquer tentativa de explicar a natureza do common law em termos de stare decisis, certamente será insatisfatória, uma vez que a elaboração de regras e princípios regulando o uso dos precedentes e a determinação e aceitação da sua autoridade são relativamente recentes, para não se falar da noção de precedentes vinculantes (MARINONI, 2009, pág. 17)

Uma das principais críticas ao modelo de common law, principalmente por parte dos países de descendência romano germânica, encontra-se no argumento de que o magistrado legisla de forma desenfreada, ocorre que no sistema de common law, o juiz trabalhou em conjunto com o parlamento, chegando a confundir-se com ele, fato histórico muito diverso da descendência de civil law, onde existira uma grande desconfiança para com o monarca, sendo mais seguro para este sistema, a separação dos poderes
3.1.2 O problema da interpretação da lei no civil law

Dada a origem romano germânica do sistema de civil law, sobretudo após a revolução francesa, onde o judiciário dispunha de plenos poderes para tomar todas as decisões que achasse necessária, estando quase sempre atrelado à ideia de corrupção, onde mantinham laços com os grandes aristocratas feudais e outras classes sociais, onde a investidura se dava por caráter hereditário ou comprado, aplicando a legislação sempre de modo parcial em prol da classe na qual o judiciário nutria empatia.
Nesse contexto histórico a teoria de Montesquieu se fez de extrema importância para romper as funções do legislativo e do judiciário, transformando o juiz em mero ''boca da lei'', onde manteria uma função nula (em quelque façon, nulle) dentro das esferas de poder, devido ao grande perigo e poder que dispunha em mãos, estando subordinado ao parlamento, sendo a separação de poderes uma forma de manter a ordem estatal, impedindo que membros de cada esfera interfiram na jurisdição de poder do outro, sendo o judiciário coibido e extremamente limitado de interpretar a lei, devendo apenas reproduzi-las de acordo com códigos e legislações completas e exaurientes
A lei revolucionária de agosto de 1790 não só afirmou que '' os tribunais judiciários não tomarão parte, direta ou indiretamente, no exercício do poder legislativo, nem impedirão ou suspeitarão a execução das decisões do poder legislativo'' (título II, art. 10), mas também que os tribunais '' reportar-se-ão'' ao corpo legislativo sempre que assim considerarem necessário, a fim de interpretar ou editar uma nova lei'' (título 2, art. 12).
Afirmou-se que o juiz ao não poder identificar a norma aplicável a solução do caso, deveria recorrer ao legislativo, supunha-se, é claro, que estas situações seriam raras e que –depois de um tempo de consulta ao legislativo – tenderiam a desaparecer. De qualquer forma, pouca coisa pode expressar de forma tão marcante a pretensão da revolução em limitar o poder judicial (MARINONI, 2009, pág. 32)
Diante desta dogmática, percebe-se que o sistema de civil law traz consigo um verdadeiro ''trauma'' devido a todas as injustiças e abusos ocorridos no passado, ocorre que, diante de uma modernização jurídica decorrente da posteridade, percebe-se que nos dias atuais a interpretação da atividade legislativa dentro de um sistema criado para inibir o judiciário diante do parlamento, não se faz mais exequível tal como fora em outrora, devendo a atividade jurídica modernizar-se a fim de expandir a atividade judicial, sobretudo para a garantia de um processo menos moroso, onde a plasticidade e o dinamismo na interpretação das normas jurídicas se faz essencial.
De qualquer forma, é imprescindível e importante notar que a corte de cassação, hoje tribunal jurisdicional voltado a assegurar a uniformidade da interpretação da lei, tem origem em um órgão não jurisdicional, instituído para evitar que a vontade dos juízes se sobrepusesse à vontade dos habitantes do parlamento. De órgão voltado a garantir a supremacia da lei para órgão destinado a afirmar e a zelar por uma única interpretação da lei, eis a verdadeira mutação pela qual a cassação passou. (MARINONI, 2009, pág. 34)
3.1.3 O impacto do constitucionalismo no civil law
Pela influência da revolução francesa, em adotar uma norma geral emanada pelo parlamento, com conceitos e premissas basilares para o funcionamento de um estado, com conceitos abstratos, não auferiu muito êxito diante dos tempos mais modernos, onde percebeu-se que a própria lei poderia ser criada de modo contrário aos interesses da sociedade e à justiça, sobretudo após a 2°guerra mundial, com o estado nazista consolidado.
Para sanar a insuficiência da mera produção de leis que não apontavam para o conceito de justiça ou contrária aos direitos da sociedade, a solução para tal problemática consiste na constituição, que, quando rígida, não é passível de modificação pela legislação comum, sendo superior aos demais instrumentos normativos, devendo todos seguirem os preceitos constitucionais, que por sua vez estampa os princípios e prerrogativas basilares a fim de auferir justiça e equidade, obrigando as demais legislações a acompanharem esses princípios, sob pena de inconstitucionalidade, ou seja, a lei passa, para ser válida e eficaz, a ser obrigada a seguir os princípios fundamentais presentes na constituição.
A lei passa a encontrar limite e contorno nos princípios constitucionais, o que significa que deixa de ter apenas legitimação formal, restando substancialmente amarrada aos direitos positivados na constituição. A lei não vale mais por si, porém depende da sua adequação aos direitos fundamentais. Se antes era possível dizer que os direitos fundamentais eram circunscritos à lei, torna-se exato, agora, afirmar que as leis devem estar em conformidade com os direitos fundamentais (MARINONI, 2009, pág. 22)
O próprio princípio da legalidade encontrou um relativismo, onde, a partir da ideia de que o cerne normativo é a constituição, passa a legalidade a adequar as leis às premissas constitucionais, ocorrendo portanto uma mudança de paradigma em relação ao antigo estado legislativo, onde a separação dos poderes deve ser extrema, não podendo o judiciário interferir nessa liberalidade. Tal estado neoconstitucionalista, acarretou em um processo de transformação do civil law, no que tange às concepções de direitos e jurisdições, passando os juízes deste sistema normativo a desempenhar um papel análogo aos juízes do common law, o que enriquece o entendimento pela possibilidade de adequação, do sistema brasileiro, por exemplo, em adotar teses e princípios inerentes ao common law, visto que o magistrado passa a desempenhar, também, função criativa, ao interpretar a lei de acordo com a constituição federal, moldando-a.
O Brasil atualmente adere a um sistema misto, híbrido, pautado na coexistência entre o civil law e o common law em diversas legislações, materiais e processuais, principalmente após a influência pós positivista, a chamada revolução neoconstitucionalista, que aproximou a legislação brasileira dos 2 regimes processuais, sobretudo após a emenda constitucional n° 45, que instituiu a repercussão geral do recurso extraordinário, o julgamento liminar de improcedência, o julgamento de recursos especiais repetitivos, a súmula impeditiva de recursos e ainda, a questão da sumula vinculante, institutos que apresentam características elementares dos precedentes judiciais, moldando a jurisprudência; tem-se, portanto, um processo constitucional voltado à tradição norte americana e um sistema infraconstitucional mais voltado ao sistema romano germânico, possuindo a legislação brasileira características próprias dos dois regimes processuais.
3.2 Da relação e utilização dos precedentes judiciais com o sistema normativo brasileiro atual
Ao atentar-se pela viabilidade da utilização dos precedentes judiciais dentro do cenário brasileiro a fim de garantir ao processo mais velocidade, qualidade e segurança, se faz importante salientar que, no direito moderno, a utilização dos precedentes sempre se fará presente, por tratar-se de uma realidade de qualquer sistema jurídico, seja ele civil law ou common law, o novo código processual civil, NCPC, estipula em seu corpo diversos institutos voltados e baseados na utilização de precedentes judiciais como fonte do direito e como meio assecuratório de segurança jurídica, celeridade processual, tempestividade da tutela jurisdicional, dentre outras garantias, porém, é possível que exista uma válida dúvida "será que o sistema jurídico brasileiro estaria pronto para sustentar institutos trazidos de um sistema normativo diferente(common law)? ", ou mesmo "seria o sistema jurídico brasileiro compatível com a utilização de precedentes judiciais, visto que é descendente do sistema de civil law?". Para sanar eventuais dúvidas em relação à exequibilidade da aplicação no NCPC, de institutos baseados nos precedentes, vale salientar que o atual código processual e a constituição apresentam, dentro do ordenamento jurídico, de forma rotineira, mecanismos uniformizadores de jurisprudência baseados na teoria dos precedentes judiciais do common law.
O famoso instituto da súmula vinculante consiste em um dos exemplos da utilização atual, no ordenamento jurídico brasileiro, de mecanismo baseado na jurisprudência e vinculação dos precedentes, possuindo um papel de destaque como parâmetro a ser seguido pelas demais instâncias jurisdicionais e órgãos da administração pública, que não poderão contrariar o entendimento firmado quando da elaboração do enunciado sumular, cabendo inclusive reclamação constitucional ao STF no caso de contrariedade.
O instituto das súmulas vinculantes encontra-se disciplinado no art.103-A da CF/88, nos seguintes termos:
Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.
§ 1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica.
§ 2º Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento de súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor a ação direta de inconstitucionalidade.
§ 3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso.
Pela análise do disserto referente às sumulas vinculantes, percebe-se que esta consiste em um mecanismo de fixação de determinada interpretação constitucional, vinculando-a em relação aos demais órgãos do poder judiciário, impedindo dessa feita, a multiplicação de processos fundados em dúvida no que tange da ratio decidendi de determinada matéria constitucional, ou seja, dúvidas sobre os fundamentos que embasarão determinado julgamento com potencial de gerar insegurança jurídica, trata-se da ''controvérsia atual''.
O art. 285- A, do CPC, traz o Julgamento liminar de ação idêntica, que ocorre quando a matéria em controvérsia for unicamente de direito e, dentro do juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros casos idênticos o magistrado poderá dispensar a citação e proferir sentença, no mesmo teor da anteriormente prolatada. Tal instituto processual está fortemente conexo com a teoria dos precedentes judiciais, tendo em vista que o magistrado tem a possibilidade de julgar de acordo com casos pretéritos, podendo indeferir de plano, o pedido do autor, fundamentando-se em precedente, ao invés da lei propriamente dita.
O preceito refere-se somente às sentenças de improcedência de juiz de primeiro grau, mas existem doutrinadores que entendem ser possível tal julgamento mesmo em tribunais superiores.
A presença do instituto garante ao processo mais celeridade, tornando o abarrotamento judiciário menor, ao diminuírem os procedimentos no processo, tornando-o menos custoso, tanto financeiramente quanto na questão temporal.
Outro instituto adotado atualmente pelo regramento jurídico pátrio, consiste na chamada Súmula impeditiva de recurso, que consiste em outro instrumento presente no atual regramento processual capaz de refletir a utilização dos precedentes no atual CPC.
O juiz não receberá o recurso de apelação quando a sentença estiver conforme com súmula do STJ ou do STF, proporcionando assim uma uniformização da jurisprudência do tribunal superior, acarretando uma maior segurança jurídica do jurisdicionado, pelo fato da existência de julgamentos equânimes em casos análogos, bem como assegura uma maior celeridade processual, impedindo a proliferação de recursos pendentes de julgamento, baseados em uma matéria já pacificada pelo tribunal superior.
No que tange à vinculação dos precedentes no Supremo tribunal federal, cabe ao STF, por força da constituição federal, uniformizar a jurisprudência de seu tribunal, uniformizando a interpretação das normas constitucionais, por força do controle de constitucionalidade, que pode ocorrer de maneira concentrada ou difusa, sendo que no concentrado, o caráter constitucional da norma é o cerne da demanda, ou seja, é o objeto principal da ação, como ocorre com ADC, ADPF, ADI e ADIN, tratando-se de um controle abstrato, com vinculação erga omnes, já o controle difuso pode ser suscitado por qualquer órgão, e pode ocorrer dentro de determinado caso concreto, como questão incidental nos autos, sendo que quando STF, este controle é realizado por força do Recurso Extraordinário, sendo que a eficácia da decisão é apenas entre as partes, podendo, de forma extraordinária, dispor de eficácia erga omnes, de acordo com o art. 52,X, da CF.
Um dos mecanismos da vinculação dos precedentes no STF, consiste em um requisito para o conhecimento do recurso extraordinário, trata-se da Repercussão geral no Recurso Extraordinário, onde deverá ser demonstrado, pelo recorrente, a repercussão geral que a matéria suscitada dispõe, ou seja, trata-se de um requisito de admissibilidade do RE, fundado no intuito de limitar e restringir a competência do STF, limitando-o a matérias de essencial relevância, estando o preceito no art. 543- A, do CPC. Ao abordar sobre a repercussão geral do recurso extraordinário, Henrique Mouta:

Ao consagrar a repercussão geral, objetivou a Emenda Constitucional n. 45/2004 e posteriormente a Lei 11.418/06, a criação (ou o restabelecimento)10 de um filtro restritivo de acesso ao STF. A mesma EC consagrou no texto constitucional a Súmula Vinculante, posteriormente regulamentado pela Lei 11.417/2006. Analisando os dois institutos (RG e ESV) é razoável concluir que a pretensão do constituinte reformador foi ampliar o conceito de manutenção e verticalização dos precedentes do Supremo, mantendo-os com clara vinculação aos demais órgãos do Judiciário. (MOUTA, 2007, pág.3)

Onde aduz que, caso a matéria seja considerada sem repercussão geral, tal decisão vinculará a todos os recursos sobre matéria idêntica, onde serão indeferidos liminarmente, salvo revisão da tese, de acordo com o regimento interno do STF.
Vale frisar que a vinculação ocorre somente da denegação da existência de repercussão geral, sendo que, caso admitida, não existe obrigatoriedade do tribunal em deferir de plano todas as matérias idênticas, pela inexistência de previsão legal para tanto, servindo esta decisão apenas como matéria influenciadora e não vinculante.
Outro instituto voltado para a adoção dos precedentes no Supremo tribunal federal, trata-se da Multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica controvérsia que, de acordo com o art. 543-B, do CPC, permite que o tribunal, diante de muitos recursos com idêntica controvérsia , selecione alguns casos-piloto e os encaminhe ao STF, sendo os demais sobrestados até o julgamento definitivo, após a decisão, os sobrestados serão julgados, com apreciação de mérito pelos respectivos tribunais competentes, que devem seguir a orientação do STF, caso isto não ocorra, o supremo poderá cassar ou reformar liminarmente o acórdão contrário à orientação firmada pelo supremo, consistindo esta hipótese em um exemplo claro de vinculação das decisões judiciais com base na utilização dos precedentes.
Com base no estudo das súmulas vinculantes e dos demais institutos mencionados acima, já presentes dentro do ordenamento jurídico brasileiro, entende-se que existe uma verdadeira tendência, no Brasil, em adotar-se um sistema mais voltado para os precedentes judiciais, que acabam por moldar a jurisprudência de forma parecida, porém menos abrangente de como ocorrerá no NCPC, sobretudo no que tange ao instituto de resolução de demandas repetitivas, presente no novo código processual civil e cerne desta pesquisa, em que um processo modelo paradigma da controvérsia resulta em um único julgamento que se aplica aos demais, vinculando a decisão a todos os casos análogos, desde que a matéria seja apenas de direito, tal instituto será explicitado e analisado em capítulo posterior desta pesquisa.
No direito moderno, a utilização dos precedentes sempre se fará presente, por tratar-se de uma realidade de qualquer sistema jurídico, seja ele civil law ou common law, o que se difere é basicamente o grau de eficácia que este modelo possui dentro das legislações nacionais, sendo que em alguns sistemas pode adimplir uma função obrigatória, vinculante, ou, em outros sistemas, uma função de molde, de parâmetro não vinculativo, servindo apenas como norteador e método de retórica e interpretação conforme determinado objetivo, sobretudo de acordo com os interesses da parte, tal como o sistema jurídico brasileiro atual, salvaguardadas algumas exceções.
3,2.1 As novas premissas processuais brasileiras e da necessidade de instauração do sistema de precedentes no NCPC pela garantia de celeridade e efetividade à tutela jurisdicional
O novo código de processo civil adotou como ideologia a responsabilidade de conferir ao processo civil celeridade e efetividade na prestação jurisdicional, a fim de garantir ao jurisdicionado duração razoável ao processo. Nesse sentido temos o texto de apresentação do anteprojeto:
É que, aqui e alhures não se calam as vozes contra a morosidade da justiça. O vaticínio tornou-se imediato: 'justiça retardada é justiça denegada'' e com esse estigma arrastou-se o poder judiciário, conduzindo o seu desprestígio a índices alarmantes de insatisfação aos olhos do povo. Esse o desafio da comissão: resgatar a crença no judiciário e tornar realidade a promessa constitucional de uma justiça pronta e célere. Como vencer o volume de ações e recursos gerado por uma litigiosidade desenfreada, máxime num país cujo ideário da nação abre as portas do judiciário para a cidadania ao dispor-se a analisar toda lesão ou ameaça a direito? Como desincumbir-se da prestação da justiça em um prazo razoável diante de um processo prenhe de solenidades e recursos? Como prestar justiça célere numa parte desse mundo de deus, onde cada cinco habitantes um litiga judicialmente? (...) o brasil clama por um processo mais ágil, capaz de dotar o país de um instrumento que possa enfrentar de forma célere, sensível e efetiva, as misérias e as aberrações que passam pela ponte da justiça(...) (Apresentação do anteprojeto de novo código de processo civil, redigida pelo ministro Luiz Fux, p 07-09 Disponível em: http://www.senado.gov.b/senado/novocpc/pdf/Anteprojeto.pdf. Acesso em: 18/06/2012).
Ou seja, o atual regramento processual, recheado de instrumentos e procedimentos morosos, não mais é exequível, tendo em vista que pela sua morosidade acaba por não garantir os princípios constitucionais e processuais da celeridade processual e, por conseguinte, da efetividade da tutela jurisdicional.
Dentro do novo diploma processual, o legislador garantiu expressamente o resguardo e observância aos princípios da dignidade da pessoa humana, proporcionalidade, razoabilidade, legalidade, publicidade e eficiência.
Alguns doutrinadores discorrem no sentido de melhor garantir a eficácia do princípio da eficiência dentro de um diploma legal, alguns, como Remo Caponi, entendem que a melhor forma de conseguir este fim seria simplesmente apenas mensurar eficiência, deixando em aberto sua aplicação, no sentido que eficiência seria a atividade jurisdicional tentar o máximo de resultado em detrimento ao número de recursos utilizado, consistindo em uma boa administração da máquina processual, no caso, correlato ao entendimento de proporcionalidade, de fazer mais com menos, porém não basta apenas isto, outras considerações devem adentrar na análise, visto que um processo célere, porém sem qualidade, sem observância a princípios constitucionais, como o contraditório por exemplo, não se faz eficiente.

O processo judicial deve ter efetividade, com duração razoável, garantindo isonomia, segurança, com contraditório e ampla defesa. Em razão do princípio da eficiência, o procedimento e a atividade jurisdicional hão de ser estruturados para que se construam regras adequadas à solução do caso com efetividade, duração razoável, garantindo-se a isonomia, a segurança, com contraditório e ampla defesa. (CUNHA, 2014. P.08).

É de se ressaltar que a democracia nem sempre coincidirá com celeridade, uma vez que o debate ampliado no processo poderá até incrementar o seu tempo de tramitação. Por exemplo, o fortalecimento do amicus curiae, ocasionará mais interlocutores no processo e um controle maior por parte da atividade jurisdicional, até sob o ponto de vista da decisão judicial, exigindo o fortalecimento do ônus argumentativo do próprio juiz. (CUNHA, 2014. P.02).
A legislação é composta geralmente por regras complexas, o que ocasiona, consequentemente, em maior morosidade processual, sendo costumeiro ressaltar que existe ineficiente na prestação do estado processual. Necessitando, assim, de práticas administrativas gestoras para tentar sanar ao máximo tal problemática, é nesse diapasão que o NCPC tenta atuar, trazendo ao procedimento maior informalidade, com abreviações de ritos procedimentais, julgamento conforme estado do processo, onde poderá ocorrer julgamento antecipado do mérito ou extinção do processo, onde, para fins de celeridade processual, em casos de julgamento antecipado do mérito, poderá ser dispensada audiência de instrução e julgamento, dada sua falta de relevância nesses casos.
O NCPC também propõe uma previsão pesada de acordos dentro do seu procedimento, tal como ocorrem nos juizados especiais e na justiça do trabalho, onde as próprias partes poderão compor mudanças no procedimento, ajustando-os às especialidades da causa, onde as partes poderão inclusive compor sobre faculdade, poderes, ônus, bem como agendar datas para cumprimentos de procedimentos, consistindo em avanço importante para fins de eficiência e celeridade.
A emenda constitucional n° 45, de 8 de dezembro de 2004, contribuiu, de forma efetiva, para uma melhora de diversos institutos presentes no ordenamento jurídico brasileiro, muitos já existentes antes mesmo da promulgação da atual constituição de 1988, contudo, a emenda também inovou ao trazer ao Direito brasileiro diversos novos preceitos e mecanismos de vital importância para o ordenamento, temos como exemplo a criação do conselho nacional do Ministério Público, ou mesmo a criação do CNJ, também, de especial importância, a criação do efeito vinculante às sumulas do STF, a criação da repercussão geral como requisito para a interposição do Recurso Extraordinário e, em destaque, como uma das principais inovações da Emenda, temos a tão merecida e esperada consagração, como direito fundamental, no art. 5° LXXVIII, do principio da razoável duração do processo, princípio este que é uma das principais premissas do NCPC.
Em relação ao princípio da razoável duração do processo, art. 5°, in verbis:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
LXXVIII a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.
Os princípios constitucionais são norteadores e servem como verdadeiros parâmetros para a criação das normas infraconstitucionais e também atentam e norteiam quais os valores e caminhos normativos a serem regidos, seguidos, protegidos e efetivados nas posteriores criações legislativos, nessa ótica, em que pese o referido principio já estivesse presente em outras legislações mesmo antes da criação da EC/45, ao tornar-se cláusula pétrea, retrata a preocupação e reflete o intuito do legislador em proporcionar um processo justo, célere e efetivo, de forma material e formal, tornando imperioso e vinculante a necessidade de passar-se a atentar a um processo mais célere, entendendo que a não preocupação com este princípio acabaria por atribuir o sentido inverso do pleito do jurisdicionado ao judiciário sempre que a efetivação deste princípio for ignorada.
José Raimundo Gomes da Cruz, nesse sentido, aduz que:

O texto demonstra que a Emenda busca certo equilíbrio entre a segurança (ter decidido) e a justiça (o acerto da decisão). Nota-se a presença, no tempo e no espaço, do empenho em que o processo acabe logo (preclusão, coisa julgada), mas que não cause injustiças (recursos, ação rescisória). (CRUZ 2008, p. 208).
Percebe pelo disserto destacado acima que, nem sempre celeridade será o maior interesse almejado pela razoável duração do processo, e sim uma espécie de equilíbrio de um processo justo, sem procedimentos desnecessários, para que assim seja efetivo e que tenha um desfecho em tempo razoável, equilíbrio que leve o tempo em consideração e não como norte.
Fora com base nestes fundamentos que veio a ser criado o novo código de processo civil, para garantir maior celeridade ao processo, mas também garantindo ao jurisdicionado segurança jurídica, com eficiência dos julgados, diversos institutos foram desenvolvidos para este fim, a uniformização de jurisprudência e a utilização dos precedentes são dois dos principais.
Sabe-se que precedente consiste na decisão judicial construída no caso concreto cuja ratio decidendi pode servir de diretriz para o julgamento de casos análogos. Dentro dessa perspectiva, o NCPC é instituído para confirmar uma tendência legislativa vivenciada no Brasil, tendência essa consubstanciada no empréstimo de efeitos vinculativos aos precedentes judiciais como uma maneira de viabilizar a prestação jurídica mais célere e efetiva. Essa lógica é vislumbrada tanto no propósito da súmula vinculante, via de exemplo, quanto no do incidente de resolução de demandas repetitivas.
Art. 926. Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente.
§ 1º Na forma estabelecida e segundo os pressupostos fixados no regimento interno, os
tribunais editarão enunciados de súmula correspondentes a sua jurisprudência dominante.
§ 2º Ao editar enunciados de súmula, os tribunais devem ater-se às circunstâncias fáticas dos precedentes que motivaram sua criação.
Com a análise do art. 926 do NCPC, pode-se perceber a preocupação do legislador em modificar as premissas processuais do Brasil, outorgando poder maior aos precedentes judiciais, a fim de uma maior garantia de segurança e velocidade no processo.
A comissão de juristas composta para a elaboração do novo código processual estava a par das dificuldades e problemas do atual cenário jurídico, onde a multiplicidade de demandas vêm prejudicando a atividade jurisdicional, diante deste diapasão, foram criados meios para tentar sanar estas realidades de forma processual, é nessa ótica que fora instituído o incidente de resolução de demandas repetitivas junto com todo um sistema normativo para questão das demandas de massa no novo código processual, tomando os precedentes como base de instauração.
Com a iminência real de um novo diploma processual civil, se fez necessária a criação de mecanismos para garantir a efetividade e a celeridade processual, o precedente judicial no NCPC consiste, portanto, em um viés útil para proporcionar estes princípios constitucionais na nova codificação. Ao tratar da efetividade da tutela jurisdicional, temos a exposição de motivos do novo código de processo civil:
Um sistema processual civil que não proporcione à sociedade o reconhecimento e a realização dos direitos, ameaçados ou violados, que têm cada um dos jurisdicionados, não se harmoniza com as garantias constitucionais de um Estado Democrático de Direito. Sendo ineficiente o sistema processual, todo o ordenamento jurídico passa a carecer de real efetividade. De fato, as normas de direito material se transformam em pura ilusão, sem a garantia de sua correlata realização, no mundo empírico, por meio do processo. (BRASIL. Exposição de motivos do Anteprojeto, p.16. Disponível em: . Acesso em 20.9.2013.).
Pelo estudo da exposição de motivos do novo código, bem como sua busca às garantias fundamentais, pôde-se perceber que o NCPC não consiste em uma reforma, e sim uma reconstrução, com novos princípios norteadores e novas concepções, combatendo a morosidade como premissa basilar.
"Teve como ideologia norteadora dos trabalhos a de conferir maior celeridade à prestação da justiça, no afã de cumprir a promessa constitucional da duração razoável dos processos". (FUX, 2011, p. 01).
Sobre a correta compreensão e interpretação do código de processo civil.
Se é correto afirmar que o Código de Processo Civil deve ser compreendido como uma concretização dos direitos fundamentais previstos na Constituição, também é igualmente correto afirmar que deve ser interpretado de acordo com valores e os princípios fundamentais previstos na Constituição, também é igualmente correto afirmar que deve ser interpretado de acordo com valores e os princípios fundamentais estabelecidos na Constituição da República (art. 1º do PLC 8.046/2010). O formalismo do processo civil é um formalismo-valorativo, que se estrutura a partir de valores encarnados nas normas constitucionais. Daí a razão pela qual principia bem o Projeto do Código de Processo Civil. A legislação infraconstitucional deve ser compreendida como concretização de direitos fundamentais processuais civis. Logo, também deve ser interpretada de maneira conforme aos direitos fundamentais, haja vista a eficácia irradiante a eles inerente, oriunda de sua dimensão objetiva. (MARINONI, 2009, vol. 1, Parte 1)
Ou seja, o processo civil, por ter reflexos constitucionais, deve por obrigação seguir os princípios constitucionais para que se funda profundamente aos ditames constitucionais.
3.2.2 Sistemáticas dos precedentes

A partir do momento e que o ordenamento jurídico brasileiro passou a adotar elementos reais do regime de precedentes, desperta-se para a necessidade de um estudo e conhecimento mais aprofundado para uma correta aplicação desse fenômeno, sobretudo no que tange às demandas repetitivas.
A atual instrução processual, por não ter sido moldada à luz da doutrina de precedentes, acaba por refletir a insuficiência do regime exclusivo de civil law ao tratar-se das questões repetitivas, onde titulares de um direito semelhante recebem julgamentos dissonantes, diferentes, dispares, acarretando uma verdadeira '' jurisprudência lotérica", como aduz Eduardo Cambi.
Como premissa no NCPC, a própria exposição de motivos do novo código explicita a preocupação do novo regramento em combater este fenômeno, onde as decisões semelhantes ou análogas são julgadas de modo discrepante. Também constatou-se, com base nas elucidações da exposição de motivos do anteprojeto do já aprovado novo código de processo civil, a importância da busca pela isonomia e segurança jurídica pela premissa da estabilidade, onde, a partir de decisões uniformes e previsíveis, a segurança jurídica será preservada, sanando-se o atual conflito de decisões, onde determinado magistrado julga um caso de uma forma e, em outra vara, uma causa análoga é julgada de forma diversa, o combate a este fator é ventilado em diversos trechos da exposição de motivos do anteprojeto:
Por outro lado, haver, indefinidamente, posicionamentos diferentes e incompatíveis, nos tribunais, a respeito da mesma norma jurídica, leva a que jurisdicionados que estejam em situações idênticas, tenham de submeter-se a regras de conduta diferentes, ditadas por decisões judiciais emanadas de tribunais diversos. Esse fenômeno fragmenta o sistema gera intranquilidade, por vezes, verdadeira perplexidade na sociedade. Prestigiou-se, seguindo-se direção já abertamente seguida pelo ordenamento jurídico brasileiro, expressado na criação da súmula vinculante do Supremo tribunal federal(STF) e do regime de julgamento conjunto de recursos especiais e extraordinários repetitivos (que foi mantido e aperfeiçoado) tendência a criar estímulos para eu a jurisprudência se uniformize, à luz do que venham a decidir tribunais superiores e até de segundo grau, e se estabilize. Essa é a função e a razão de ser dos tribunais superiores: proferir decisões que moldem o ordenamento jurídico, objetivamente considerado. A função paradigmática que devem desempenhar é inerente ao sistema. Por isso é que esses princípios foram expressamente formulados. (...)
Encampou-se, por isso, expressamente princípio no sentido de que, uma vez firmada jurisprudência em certo sentido, esta deve, como norma, ser mantida, salvo se houver relevantes razões recomendando sua alteração, rata-se, na verdade, de outro viés do princípio da segurança jurídica, que recomendaria que jurisprudência, uma vez pacificada ou sumulada, tendesse a ser mais estável.
De fato, a alteração do entendimento a respeito de uma tese jurídica ou do sentido de um texto de lei pode levar ao legitimo desejo de que as situações anteriormente decididas, com base no entendimento superado, sejam redecididas à luz da nova compreensão. Isto porque a alteração da jurisprudência, diferentemente da alteração da lei, produz efeitos equivalentes ao ex tunc. Desde que, é claro, não haja regra em sentido inverso. Mas talvez as alterações mais expressivas do sistema processual ligadas ao objetivo de harmonizá-lo com o espírito da Constituição Federal, sejam as que dizem respeito a regras que induzem à uniformidade e à estabilidade da jurisprudência. O novo Código prestigia o princípio da segurança jurídica, obviamente de índole constitucional, pois que se hospeda nas dobras do Estado Democrático de Direito e visa a proteger e a preservar as justas expectativas das pessoas. Todas as normas jurídicas devem tender a dar efetividade às garantias constitucionais, tornando "segura" a vida dos jurisdicionados, de modo a que estes sejam poupados de "surpresas", podendo sempre prever, em alto grau, as consequências jurídicas de sua conduta. Se, por um lado, o princípio do livre convencimento motivado é garantia de julgamentos independentes e justos, e neste sentido mereceu ser prestigiado pelo novo Código, por outro, compreendido em seu mais estendido alcance, acaba por conduzir a distorções do princípio da legalidade e à própria ideia, antes mencionada, de Estado Democrático de Direito. A dispersão excessiva da jurisprudência produz intranquilidade social e descrédito do Poder Judiciário. Se todos têm que agir em conformidade com a lei, ter-se-ia, ipso facto, respeitada a isonomia. Essa relação de causalidade, todavia, fica comprometida como decorrência do desvirtuamento da liberdade que tem o juiz de decidir com base em seu entendimento sobre o sentido real da norma. A tendência à diminuição16 do número17 de recursos que devem ser apreciados pelos Tribunais de segundo grau e superiores é resultado inexorável da jurisprudência mais uniforme e estável. Proporcionar legislativamente melhores condições para operacionalizar formas de uniformização do entendimento dos Tribunais brasileiros acerca de teses jurídicas é concretizar, na vida da sociedade brasileira, o princípio constitucional da isonomia. Criaram-se figuras, no novo CPC, para evitar a dispersão18 excessiva da jurisprudência. Com isso, haverá condições de se atenuar o assoberbamento de trabalho no Poder Judiciário, sem comprometer a qualidade da prestação jurisdicional. (...) (BRASIL. Exposição de motivos do Anteprojeto, p.16. Disponível em: . Acesso em 20.9.2013.).
Pela análise do disserto destacado acima, resta oportuno elucidar que, a fim de garantir o princípio da segurança jurídica imposto constitucionalmente, dar maior igualdade de tratamento é elemento obrigatório no NCPC, para tornar exequível tal prerrogativa do judiciário se faz necessária a aplicação dos precedentes vinculantes na nova conjectura processual, visto que, sem esta técnica, não resta outra alternativa para reduzir o número cada vez maior de processos semelhantes, repetitivos, sendo julgados no Poder judiciário.
Ocorre que, para uma correta aplicação da teoria dos precedentes no ordenamento jurídico brasileiro, não basta a mera aplicação de técnicas de precedentes para torna-los efetivos e válidos dentro do referido sistema, ainda faz-se crucial, uma análise minuciosa e sistematizada sobre a teoria dos precedentes, que dispõe de elementos próprios, técnicas e conceitos particulares, que por sua vez diferem muito do sistema de civil law no qual os juristas e a sociedade civil brasileira encontram-se acostumados, somente após esta análise e estudo profundo é possível entender a teoria dos precedentes e dirigir sua correta aplicação dentro do processo civil brasileiro, sobretudo pela força do instituto de resolução de demandas repetitivas.
O direito brasileiro apenas trata a jurisprudência como elemento consultivo, como elemento de fundamentação de determinado tema, sendo fonte secundária de direito, servindo apenas de parâmetro norteador sem força normativa, sem vinculação e, quando chega a tratar de precedentes como fonte vinculativa, é apenas no que tange ao verbete sumulado, onde um tribunal determina um pronunciamento final de determinada questão jurídica, por consequência, a relevância dada a este caso, é apenas ao texto sumulado, que é tratado pelo operador do direito como se lei fosse, é como se a jurisprudência sumulada fosse uma segunda unidade de criação de regramentos, estranha ao poder legislativo. O foco do jurista brasileiro, sobretudo devido ao fato de não estar preparado para esta abordagem, que é deveras estranha ao civil law, é apena s no que diz respeito com o enunciado da súmula e não com a razão de decidir (ratio decidendi) que veio a solidificar aquele entendimento, ou seja, o jurista brasileiro apenas leva em consideração o texto, o corpo, o verbete sumulado, respeitando tal verbete como se lei fosse, fazendo-se inferir que seria de integral importância estudar-se a ratio decidendi e os outros elementos da teoria dos precedentes, tal como stare decidis, obter dictum, distinguishing, overruling e overriding, dentre outras expressões típicas do modelo de common law, para, apenas após este acompanhamento jurídico, compreender a aplicação do precedente no Brasil na aplicação do novo código processual, principalmente no que tange ao incidente de resolução de demandas repetitivas
3.2.2.1 Diferença entre Jurisprudência e Precedente
Ad inicium, para chegar-se a uma saudável interpretação e compreensão do direito jurisprudencial, uma correta compreensão da teoria dos precedentes, sobretudo pela diferenciação do termo '' precedentes'' do termo '' jurisprudência'' se faz essencial, a fim de se desenraizar o entendimento equivocado comum ao jurista brasileiro em sinonimizar ambos os institutos, nesses termos, tem-se a diferenciação.
3.2.2.2 Jurisprudência
Entende-se que a origem do que chamamos atualmente de Jurisprudência tenha sido na Roma antiga, fundada pelos religiosos e pontífices, à época em que a jurisdição era exercida pelos sacerdotes, que monopolizavam o conhecimento do direito, ocorre que, a partir do desenvolvimento do comércio e da sociedade como um todo, os litígios consequentemente aumentaram em proporções altas, o que motivou a outorga do poder jurisdicional a magistrados públicos, sobremaneira após a transição da realeza para a república, tornando o direito uma atividade menos vinculada à questão religiosa, voltando-se à laicidade. Com a postulação escrita do primeiro ordenamento positivada, a chamada lei das doze tábuas, fora consolidado de forma expressa certos costumes da praxe religiosa, além do que, a partir do momento em que se está presente uma norma positivada, o direito deixa de ser monopolizado pelo juiz, passando também aos jurisdicionados, o que, consequentemente, acabou por integrar a jurisprudência ao direito, visto que o corpo da lei passa a vincular também a atividade decisória do magistrado, que se baseia em diversos fatores para moldar seu entendimento. Sérgio Sérvulo da Cunha, ao conceituar jurisprudência no atual ordenamento jurídico brasileiro:
No sistema jurídico brasileiro, a par de algumas exceções(v.63), as decisões judiciais não possuem força obrigatória (efeito vinculante) a não ser com relação às partes envolvidas no processo. Assim, um juiz pode recusar a interpretação dada à lei, em outro processo, por outro juiz ou tribunal, mesmo que se trate do Supremo Tribunal Federal.
Entretanto, é grande o prestigio das decisões dos tribunais, que costumam ser acompanhadas pelas instâncias inferiores, seja pela sua natural autoridade - sobretudo quando reiteradas – seja porque todas as decisões das instâncias inferiores são reformáveis, mediante recurso pelas superiores.
A jurisprudência é um produto coletivo. Toda lei nova é como um sapato novo que vai se amoldando através das variadas interpretações – disparadas umas, parciais outras – que recebe. Esse é um processo de descoberta pelo qual, em cotejo com a multiplicidade dos fatos, vai-se desdobrando a potencialidade normativa da lei, alcança certa sedimentação e tenderia à cristalização, não fosse a inteligência da lei tão mutável quanto a própria realidade. (CUNHA, 1999, p.19/20)

Pode-se então conceituar jurisprudência como um conjunto das decisões proferidas por determinado tribunal para as questões jurídicas de alguma matéria, sendo a jurisprudência a decisão constante e uniforme dos tribunais no que diz respeito a determinado ponto jurídico.
De acordo com Sérgio Sérvulo Cunha, cabe à jurisprudência a função de aplicar a lei a determinado caso, segundo uma interpretação uniforme, também assiste como sua prerrogativa a função de adaptar e modernizar o direito, através da adaptação da lei para com as atualizações contemporâneas, função de modernizar, e uma terceira atividade que seria a de preencher as lacunas na lei, ou seja, criando posicionamentos quando a lei for omissa ou lacunosa, com a ajuda da analogia e dos princípios gerais de direito, suplementando a legislação, tornando-se uma espécie de acessório legislativo, com base no direito consuetudinário.
No direito brasileiro, costumeiramente utiliza-se o termo '' jurisprudência'' para tratar das decisões dadas pelos tribunais ao caso concreto, não gozando de qualquer efeito vinculante, servindo apenas como técnica e estratégia retórica utilizada pelo operador do direito para reiterar que determinado tribunal já decidiu de determinada forma, ou seja, como já fora elucidado anteriormente, a jurisprudência nos países que utilizam o modelo de Civil law, como é o caso do Brasil, salvo algumas exceções, não vincula a atividade jurídica.
3.2.2.3 Precedente

Freddie Didier júnior, ao conceituar precedente:
Precedente é a decisão judicial tomada a luz de um caso concreto, cujo núcleo essencial pode servir como diretriz para o julgamento posterior de casos análogos, (DIDIER JUNIOR, 2013, p. 381).
Consiste o precedente em uma decisão jurisdicional, tomada em relação a um caso concreto, cujo núcleo é capaz de servir como base, como parâmetro para a decisão de questões análogas, ou seja, precedente é uma única decisão com potencialidade de seu núcleo servir de parâmetro para casos parecidos, diferenciando-se da jurisprudência, que é um conjunto de decisões (precedentes) que moldam o entendimento de determinado tribunal, sendo que a utilização dos precedentes é corriqueira na maioria dos estados, o que irá diferir é o grau de eficácia que será atribuído a ele, podendo gozar de eficácia persuasiva (romano germânico) ou de eficácia vinculante (anglo saxão).
3.3 Teoria do precedente judicial como base teórica para a utilização dos precedentes no novo código processual civil
3.3.1 Ratio Decidendi

Ao falar-se de precedentes, deve-se tomar a ideia de uma decisão judicial, em determinada situação fática, em que o ponto central da decisão pode ser utilizado como parâmetro para julgar-se casos parecidos, sendo que, de acordo com Bruno Garcia Redondo, todo precedente judicial obrigatoriamente será uma decisão judicial, mas nem toda decisão poderá ser considerada um precedente, visto que esta decisão, obrigatoriamente, deverá dispor de características mínimas para servir como base para a decisão de casos análogos no futuro.
De acordo com Cruz e Tucci, existem duas partes que compõem o precedente, as circunstancias fáticas que embasam a divergência entre as partes e a tese ou princípio jurídico utilizado como motivação para determinada tese ou decisão (ratio decidendi). Diante dessa informação, se faz necessário diferir as duas partes do precedente, tendo em vista que apenas uma delas gerará uma eficácia vinculante ou mesmo apenas persuasiva, dependendo do grau de eficácia deste precedente dentro do Direito nacional em análise, trata-se da Ratio decidendi.
A ratio decidendi, que, para os norte-americanos é conhecida como holding, - sendo que são sinônimos, apenas que aquela é utilizada com maior frequência pelo sistema inglês e essa pelos norte-americanos – consiste nos fundamentos técnico-jurídicos fundamentadores da decisão judicial. Nos dizeres de José Rogério Cruz e Tucci, temos uma conceituação do que trata-se como ratio decidendi e de suas ramificações internas:
A ratio decidendi(...) constitui a essência da tese jurídica suficiente para decidir o caso concreto (rule of law) (...). Ela é composta: (i) da indicação dos fatos relevantes da causa (statement of material facts), (ii) do raciocínio lógico-jurídico da decisão (legal reasoning) e (iii) do juízo decisório(judgement).
Sobre a percepção prática de como caracterizar-se a ratio decidendi, de acordo com Roger Stiefelmann Leal, deve–se utilizar de uma operação mental, invertendo o teor do núcleo decisório, caso a decisão permanecesse a mesma, então a tese originária não pode ser considerada uma ratio decidendi, caso a inversão descaracterize o teor primário da decisão, neste caso sim, estar-se-ia diante de uma ratio decidendi, com este exemplo é possível inferir que nem sempre será tarefa fácil identificar a ratio em determinados casos concretos, o que consiste em um dos principais obstáculos da aplicação dos precedentes vinculantes , na prática.
Compete ao magistrado, quando da decisão do litígio, "criar", obrigatoriamente, dois preceitos normativos jurídicos dentro de sua decisão, sendo a primeira de caráter geral, consistindo na relação dos fatos envolvidos com a matéria positivada no ordenamento, o outro preceito tem caráter meramente individual, sendo a decisão para a situação específica que lhe foi posta para análise, ou seja, a ratio decidendi não será toda a decisão proferida pelo magistrado dentro de um sistema baseado em precedentes judiciais, será apenas a parte da decisão cujo núcleo seja capaz de servir de parâmetro para casos análogos, sendo dever do operador do direito saber encontrar a ratio decidendi, bem como saber se ela é ou não existente em determinada decisão.
Exemplificando a presença da ratio decidendi no atual ordenamento jurídico, temos Didier:
Um exemplo pode vir a calhar: o art. 1.102-A do CPC permite o ajuizamento de ação monitória a quem disponha de "prova escrita" que não tenha eficácia de título executivo. "Prova escrita" é termo vago. O STJ decidiu que "cheque prescrito" (n.299 da súmula do STJ) e "contrato de abertura de conta-corrente acompanhado de extrato bancário" (n.247 da súmula do STJ) são exemplos de prova escrita. A partir de casos concretos, criou "duas normas gerais" luz do Direito positivo, que podem ser aplicadas em diversas outras situações, tanto que se transformaram em enunciado de súmula daquele Tribunal Superior. Nota que a formulação desses enunciados sumulados não possui qualquer conceito vago, não dando margem a muitas dúvidas quanto à sua incidência.
Como se percebe. Á luz de uma situação concreta, o magistrado termina por criar uma norma jurídica que consubstancia a tese jurídica a ser adotada naquela caso- por exemplo, "cheque prescrito" se enquadra no conceito de "prova escrita" de que fala o art. 1.102-a do CPC. Essa tese jurídica é que chamamos de ratio decidendi. Ela deve ser exposta na fundamentação do julgado, porque é com base nela que o juiz chegará, no dispositivo, a uma conclusão acerca da questão em juízo. Trata-se de norma geral, malgrado construída, mediante raciocínio indutivo a partir de uma situação concreta. Geral porque, tal como ocorre com os princípios gerais a que se chega por raciocínio indutivo, a tese jurídica (ratio decidendi) se desprende do caso específico e pode ser aplicada em outras situações concretas que se assemelhem àquela em que foi originalmente construída – por exemplo, com base nela é possível admitir, em qualquer outra situação concreta. A ação monitória para cobrança de cheque prescrito. Eis aí a essência do precedente: uma decisão judicial cujo núcleo essencial (tese jurídica, ratio decidendi) pode servir como diretriz para demandas semelhantes. (DIDIER JR, 2009, pág. 382)
O renomado doutrinador mencionado acima, ressalta a construção, pelo magistrado, da primeira norma presente na decisão judicial, com base na teoria dos precedentes, que seria o caráter geral delimitado na fundamentação no julgado, capaz de servir de parâmetros para casos semelhantes(ratio decidendi), tem-se também, além desta primeira norma, uma segunda, de caráter individual, também presente na decisão do julgado, servindo tão somente para dar conclusão ao caso concreto naquele processo ou processos em específico, sendo que somente esta norma especifica fica acobertada pela coisa julgada material.
Em que pese a segunda norma '' criada'' pelo magistrado em sua decisão dispor apenas de cunho individual, importante se faz explicitar que, caso esta norma individualizada que serve para dar desfecho à LIDE principal não estiver presente na prolatação da sentença ou acórdão, ensejará, por consequência, a inexistência da decisão judicial, diferente do que ocorreria se a ausência tratar-se da primeira norma jurídica, geral e abstrata, com potencial para tornar-se ratio decidendi, o que ensejaria tão somente a nulidade da decisão, ou seja, a decisão continua existindo mesmo sem a presença específica das condições fáticas e análise hermenêutica que levou o juiz a este entendimento, ocorre que estará viciada, por não conter esta exposição obrigatória para que esteja-se adiante de uma ratio decidendi, trata-se de uma decisão sem fundamentação, sem ratio decidendi, não podendo nunca, desta maneira, servir de paradigma para quaisquer decisões futuras e análogas, devendo o vício ser sanado, ou a decisão será descartada para fins de vinculações de precedentes ou mesmo de força para convencimento.
O precedente judicial é, portanto, norma extraída da ratio decidendi de determinada demanda real, dispondo da capacidade de ser universalizada e generalizada para um número difusos de indivíduos quando vinculado ou mesmo servindo de eficácia persuasiva dentro de determinado sistema jurídico, encontra-se localizado, em sua essência, dentro da fundamentação do julgado.
Neste ponto vale salientar a importância da participação do magistrado neste momento processual, tendo em vista que, ao julgar determinadas demandas, além de solucionar a controvérsia principal do caso, também poderá, em sua decisão, fixar a ratio decidendi que servirá de paradigma para outras decisões, ao extrair-se uma determinada norma geral dentro do caso concreto, passando a decisão judicial a compor, além de um discurso voltado para o caso concreto, também determinada ordem pública, uma ordem jurídica social, ao fixar-se uma tese que gozará de efeitos mais amplos para os jurisdicionados, fazendo-se necessário todo um sistema e incidente processual para manejar a administrar esta atuação no NCPC, visto que, caso utilizado de forma errônea por magistrados com preparação e entendimento da teoria dos precedentes insuficientes poderá ocasionar o efeito inverso ao objetivo do novo código, ou seja, poderá, como consequência do despreparo e falta de técnica, atravancar ainda mais as demandas no judiciário, tornando os precedentes uma máquina de injustiças erga omnis.
No atual CPC, o juiz, em regra, não precisa identificar a ratio decidendi do caso de forma expressa, com algumas exceções, como é o caso das decisões que julgam o incidente de uniformização de jurisprudência, o de decretação de inconstitucionalidade ou o dos incidentes de julgamentos por amostragem de recursos repetitivos, devendo, os julgadores, examinar a decisão prévia para extrair o precedente e, decidir pela viabilidade para o caso atual e posterior. De acordo com o artigo 978 do NCPC, em seu parágrafo único, bem como o artigo 979 parágrafo 2°, refletem da instauração da tese jurídica a ser apta a influenciar as demandas posteriores por intermédio do incidente de resolução de demandas repetitivas.
Art. 978. O julgamento do incidente caberá ao órgão indicado pelo regimento interno dentre aqueles responsáveis pela uniformização de jurisprudência do tribunal.
Parágrafo único. O órgão colegiado incumbido de julgar o incidente e de fixar a tese jurídica julgará igualmente o recurso, a remessa necessária ou o processo de competência originária de onde se originou o incidente.
Art. 979. A instauração e o julgamento do incidente serão sucedidos da mais ampla e específica divulgação e publicidade, por meio de registro eletrônico no Conselho Nacional de Justiça
§ 2º Para possibilitar a identificação dos processos abrangidos pela decisão do incidente, o registro eletrônico das teses jurídicas constantes do cadastro conterá, no mínimo, os fundamentos determinantes da decisão e os dispositivos normativos a ela relacionados
3.3.2 Obter Dictum
Obter dictum, ou obter dicta, no plural, dictum ou grátis dicta, conceitua-se como o conjunto de argumentos expostos apenas como coadjuvantes em uma decisão são apenas "de passagem" na motivação da decisão, consistindo-se, portanto, em juízos acessórios à causa principal, secundários, nos quais constam elementos e impressões que não têm influência direta no resultado da causa, sendo meios periféricos dentro de uma decisão que não possuem o condão de relevante nem decisivo para a solução da LIDE, sendo, prescindível, não incorporando, por consequência, a ratio decidendi. Cabe, ao magistrado, ou mesmo a qualquer operador da norma, saber diferenciar, dentro do caso concreto, o que é ratio decidendi e o que é Obter dictum, a fim de não misturar os dois institutos, o que ocasionaria um relevante embaraço para a questão dos precedentes, prejudicando as análises da jurisprudência firmada em determinado tribunal, que não poderá conter, em sua ratio decidendi elementos não essenciais para a solução da controvérsia, pois poderia acarretar na não combinação entre as ratio decidendi e os novos casos modelos da controvérsia.
Em que pese o Obter dictum não exerça por si só a função de precedente vinculante, este não é, de todo, inútil ao sistema jurídico em que está inserido, podendo consistir em elemento teórico de uma futura orientação do tribunal ou como elemento de persuasão em uma tentativa posterior de superar os precedentes firmados, gozando de uma propriedade persuasiva e orientadora de mudanças e superações dos precedentes no futuro, com as possíveis e corriqueiras mudança nos entendimentos dos tribunais, tendo em vista que, além de outros elementos, o voto vencido nos julgamentos de plenos e colegiados de tribunais superiores podem ser utilizados como obter dictums destes julgamentos, podendo ser utilizado como fundamentação de recursos para que a decisão seja diferente no novo pleito, tal como, via de regra, utiliza-se os embargos infringentes.
3.4 Classificações dos precedentes judiciais:
Quanto à classificação dos precedentes judiciais, podem ser classificados, de acordo com a doutrina dominante, sobretudo quanto ao renomado jurista e doutrinador, Fredie Didier Junior, quanto ao seu conteúdo ou quanto aos seus efeitos.
No que tange ao seu conteúdo, podem compor o grupo dos precedentes declarativos e precedentes criativos. Os precedentes declarativos são aqueles que admitem a existência de uma norma jurídica, ou mesmo os que aplicam uma norma jurídica previamente existente, apenas reconhecem e aplicam, se baseia em um precedente anterior para dar término à controvérsia, como ocorre nos casos em que determinada súmula vinculante do STF é aplicada a um caso posterior que se encaixa na tese paradigma em contrapartida. Os precedentes criativos são aqueles criam e aplicam determinada norma jurídica, como ocorre quando determinado magistrado necessita suprir determinada lacuna legislativa, precisando criar determinada norma para solucionar o litigio, Fredie Didier Júnior, utiliza do exemplo das cláusulas gerais, que permitem ao magistrado agir com discricionariedade na solução a ser dada ao caso concreto, como ocorre com o art. 1,109, CPC.
Ao explanar que mesmo tratando-se de precedentes criativos, tal fato não descaracteriza a criatividade judicial, pela própria análise hermenêutica do magistrado a cada caso concreto, temos Didier:
O fato de ser declarativo o precedente não descaracteriza a criatividade judicial. Ainda que haja norma jurídica pré-existente, ao magistrado cabe, como se viu no item sobre sentença como norma jurídica individualizada, analisar cada caso concreto à luz da Constituição e dos direitos fundamentais, criando, a partir daí, a norma jurídica individualizada que servirá de fundamento para a sua decisão. (DIDIER JR, 2013, Pag. 387).
No que tange aos efeitos, pode-se classificar os precedentes como vinculantes (ou obrigatórios), obstativos da revisão de decisões ou persuasivos.
O precedente vinculante trata-se do precedente referente ao binding precedent, dotado de autoridade vinculativa (binding autority), ocorre quando sua eficácia vinculativa puder ser usada em situações futuras análogas ao seu conteúdo, servindo como parâmetro para decisões semelhantes de outros casos, no futuro.
O precedente vinculante é utilizado como regra geral nos países adeptos ao common law, sendo que, quando for possível seu afastamento, sua não aplicação, poderão ser relativamente obrigatórios e, absolutamente obrigatórios quando obrigados a serem seguidos no futuro.
Quanto ao efeito vinculante dos precedentes, é importante fazer-se uma distinção entre esse e a eficácia da intervenção e o efeito vinculante da coisa julgada, segundo Didier:
É preciso fazer uma distinção entre(i) o efeito vinculante da coisa julgada, (ii) a eficácia da intervenção e (iii) a eficácia vinculativa do precedente judicial. Nos três casos, temos efeitos jurídicos que vinculam sujeitos a uma decisão judicial, mas que possuem regimes jurídicos bastante diferentes. (...) ao falar em efeito vinculante do precedente, deve-se ter em mente que, em certas situações, a norma jurídica geral (tese jurídica, ratio decidendi) estabelecida na fundamentação de determinadas decisões judiciais tem o condão de vincular decisões posteriores, obrigando que os órgãos jurisdicionais adotem aquela mesma tese jurídica na sua própria fundamentação. (DIDIER JR, 2013, pag.389).
De acordo com o suscitado acima pelo referido autor, não se pode equivocar-se sobre o efeito vinculante do precedente e os efeitos decorrentes da própria coisa julgada, o que ocorre em determinadas situações, como ocorre, por exemplo, no controle concentrado de constitucionalidade, em que a própria lei determina a chamada coisa julgada erga omnes, por expressa determinação legal, estando esta decisão vinculante aos demais órgãos do judiciário e à administração direta e indireta, nas esferas municipais estaduais e federais, porém, não se vincula por um precedente e sim pela coisa julgada erga omnes decorrente da lei.
Além das categorias expostas acima, tem-se os precedentes obstativos da revisão de decisões, que consistem em desdobramentos dos efeitos vinculantes dos precedentes, onde, o legislador autoriza que o magistrado deixe de dar seguimento a determinados recursos ou dispense a remessa necessária do recurso quando, tais matérias recursais estiverem em confronto com determinado precedente, em geral quando emanados de tribunais superiores.
Como última categoria de precedentes existem os precedentes persuasivos (persuasive precedent) que em que pese não disporem de eficácia vinculante, possuem fortes diligências vinculantes, indicando possíveis medidas interpretativas futuras para determinados precedentes, utilizado também como método de embasamento para possível futura superação de determinados precedentes pelos votos vencidos dos julgamentos colegiados.
3.5 Dinamismo e administração jurídico-instrumental da utilização de precedentes dentro de um sistema normativo a fim de uma saudável aplicação de suas premissas.
Estudar uma teoria específica para todo sistema normativo baseado na utilização de precedentes judiciais consiste em fato praticamente inexequível, devendo-se, portanto, criar-se métodos e dinâmicas para adaptar elementos da teoria dos precedentes dentro de um sistema normativo, como ocorre no NCPC, ao instaurar o incidente de resolução de demandas repetitivas e também no que tange aos recursos repetitivos previstos no novo diploma processual, ocorre que alguns conceitos básicos sempre deverão ser arbitrados para que o próprio procedimento na utilização de precedentes seja saudável, com institutos voltados à manutenção e estabilidade do sistema, garantindo princípios fundamentais, como a segurança jurídica e a celeridade processual. Nesse sentido, temos Edward Allan:
De acordo com EDWARD ALLAN FARNSWORTH, '' o uso do precedente é mais uma técnica do que uma ciência. É tão difícil aprendê-lo por meio da leitura de uma discussão da doutrina quanto o é aprender a andar de bicicleta através do estudo de um livro sobre mecânica, acrescendo que o assunto é muito mais controverso. É possível, porém estabelecer vocabulário, fazer algumas generalizações mais óbvias e examinar alguns problemas mais interessantes''. (FARNSWORTH, 1963, p 63).
Como exemplo de mecânica basilar para uma utilização otimizada dos precedentes dentro de um sistema processual consiste da não utilização de termos vagos na composição dos enunciados da ratio decidendi, visto que sua propositura objetiva exatamente o sentido inverso, devendo a ratio decidendi ser formulada com acepções precisas para evitar a criação de dúvidas quanto à sua aplicação em casos análogos no futuro. Tal apontamento não é observado no atual cenário jurídico brasileiro, sobretudo no que tange aos enunciados de súmulas vinculantes, por exemplo, que, em muitas vezes, editam textos completamente abertos, abrindo margem à milhares de interpretações e lacunas diferentes, o que, obviamente, acaba por onerar ainda mais o judiciário para que este soluciona a dúvida que o próprio órgão ocasionou. Deve o tribunal superior atentar para a diferença entre jurisprudência e lei, sendo que os objetivos do papel normativo da jurisprudência é diverso, dadas suas especificidades, sendo que sempre serão examinadas após o precedente e nunca antes, como ocorre com a lei.
Técnica essencial, que deve estar presente em todos os sistemas jurídicos que se baseiam em precedentes é o chamado distinguishing, moldado a fim de garantir os princípios do contraditório e ampla defesa, bem como o da segurança jurídica, sobretudo presente nas legislações que utilizam de precedentes vinculativos. Ao analisar o caso concreto, o juiz deve analisar se tal caso é compatível com alguma tese já firmada, caso haja esta aproximação, ele passa a analisar a ratio decidendi das decisões proferidas nessas demandas anteriores. O distinguishing ocorrerá quando se estiver presente uma distinção entre o caso concreto a ser julgado e o caso paradigma anteriormente firmado, quando os fatos do caso atual não coincidir com os fatos que serviram de embasamento para a ratio decidendi presente no precedente, ou mesmo quando existe certa aproximação entre os casos mas, também, existe algum elemento que justifique a separação das teses, afastando a aplicação do precedente. O distinguishing pode configura-se como uma técnica de confronto, podendo ser considerado, para alguns, como a própria técnica de comparação entre o caso concreto e o paradigma, como entende Cruz e Tucci.
Fredie Didier Júnior utiliza o termo distinguishing em duas acepções diversas, o distinguish-método e o distinguish-resultado, sendo o método o usado para designar o método de comparação entre o caso concreto e o paradigma e o resultado consiste no utilizado para designar o resultado do confronto, em casos em que conclui-se existir entre eles alguma discrepância.
Em que pese a raridade de encontrar-se casos absolutamente compatíveis entre os casos paradigmas e os casos a serem analisados nos julgamentos presentes, cabe ao magistrado definir a presença ou não do distinguishing entre eles, podendo dar à ratio decidendi interpretação restritiva(restritive distinguishing), afastando o precedente ao caso em análise, por entender que o caso detém elementos próprios que impossibilita a afetação, podendo também dar à ratio decidendi interpretação mais ampla, por admitir que, apesar das diferenças e peculiaridades, a tese ainda assim é aplicável e compatível(ampliative distinguishing). Tal atividade do magistrado serve para romper com a ideia a ser superada da automaticidade dos magistrados dentro de um sistema de precedentes, onde muitos asseguram que ele passa a ser mero boca de lei, expressão por muito utilizada por Montesquieu, sendo que, com base nessa interpretação do magistrado, resta claro que a função do juiz vai muito além, podendo interpretar a lei para analisar se os fatos concretos a elas se vinculam, ou mesmo interpretar os precedentes e os casos concretos para uma correta verificação de sua adequação à ratio decidendi já definida anteriormente.
Ao fazer a comparação (distinguishing-método) o juiz concluir pela compatibilidade entre a questão atual e a que resultou no precedente, poderá então aplicar o precedente ou superá-lo, enquanto caso concluir que não existe proximidade entre o caso paradigma e o caso concreto, conclui-se pela distinção entre eles(distinguishing-resultado) resultando na não aplicação do precedente, ou sua aplicação extensiva, nos moldes do parágrafo anterior.
Quando a matéria está sendo discutida pela primeira vez no universo jurídico, estar-se diante de um hard case, onde não existirá precedente a ser analisado, podendo o julgador estar livre para decidir o mérito de acordo com seu convencimento na causa, que, em que pese tenha certa autonomia para julgar, também precisa respeitar alguns parâmetros, deverá manter sua sentença harmônica com o sistema de precedentes "o juiz cria: mas tem o dever de fazê-lo de forma harmônica com o sistema'' (WAMBIER, 2005, p. 30)
Diferente do hard case, consistem em clear cases os casos em que já existe precedente relacionado com sua matéria, devendo o magistrado, obrigatoriamente, aplicá-lo, caso vinculante, sendo o sistema de precedentes apenas persuasivos, o magistrado levará em consideração o clear case.
Como atividade humana, a função jurisdicional sujeita-se a equívocos, como no caso em que, o magistrado ou tribunal vier a decidir o caso e ignorar a presença de precedentes obrigatórios ou uma lei relacionada ao caso concreto, acarretando-se a decisão per incuriam, devendo-se, para concretizá-la, a demonstração de que, caso o julgador tivesse conhecimento do precedente ou lei ignorado, o resultado seria diferente do alcançado.
Outro instituto de significativa importância a ser estudado e elucidado para uma sadia interpretação da dinâmica dos precedentes judiciais, consiste nas técnicas de superação dos precedentes, overruling, transformation, overriding, technique of signaling e decisum per incuriam.
Overruling consiste em uma técnica pela qual o precedente perde sua eficácia, perde sua força vinculante, sendo substituído(overruled), pela revogação expressa por outro precedente mais novo e apto àquele sistema jurídico, sendo o julgamento em regra pelo mesmo tribunal, visto que o prolator do precedente deve ser o mesmo a abandoná-lo, em regra.
O precedente pode ser superado quando encontrar-se obsoleto, quando tornar-se injusto, incorreto ou equivocado, pelas mudanças e paradigma e de entendimento comuns ao direito moderno, sempre renovando-se, devendo os precedentes constarem com mecanismos para abarcar tais avanços, evitando engessamentos processuais e materiais.
O overruling pode ser expresso (express overruling) ou implícito (implied overruling, ou transformation) que ocorre quando do abandono da posição anterior sem substituição expressa pela subsequente, a corte nega o conteúdo do precedente de forma tácita, sem expressão formal do ato, diferente do overruling expresso em que existe tal formalidade.
No que diz respeito à eficácia da alteração, existem três ramificações do overruling, sendo ele retrospectivo, prospectivo ou antecipado, o que pode variar de acordo com o entendimento do tribunal, que deve sopesar suas opções de acordo com os princípios da juridicidade, segurança jurídica, não surpresa, isonomia, dentre outros princípios processuais e constitucionais.
O retrospective overruling dispõe de eficácia ex tunc, onde o precedente a ser modificado não poderá ser suscitado nem mesmo no que diz respeito a fatos de antes de sua substituição, ou seja, tem eficácia retroativa. Já o prospective overruling goza de eficácia não retroativa, ex nunc, ou seja, a ratio decidendi do precedente a ser substituído será válida e vinculante aos casos ocorridos e processos instaurados antes da substituição por um novo entendimento jurisprudencial de precedentes. Além das duas modalidades tem-se também, trata-se do antecipatory overruling, onde, preventivamente, órgãos de instâncias inferiores percebem que determinado precedente teve seu entendimento alterado por alguma corte superior, sem modificação expressa, passando também a não mais aprová-lo.
Existem determinadas hipóteses em que um determinado tribunal, movido pela incidência de uma nova regra ou princípio legal, pode vir a limitar o âmbito de incidência de determinado precedente, sem, com esta conduta, superá-lo de forma total, trata-se de uma revogação parcial do precedente chamada de overriding.
Com a conceituação de overruling e overriding, passa-se a observar a sua importância dentro de um sistema vinculante de precedentes, tendo em vista que eles mantém a ordem e o organismo do direito sempre de forma moderna e dinâmica, podendo, a qualquer momento, entendimentos serem modificados com base na jurisprudência e nos precedentes, colaborando com a redução do número de demandas correntes no judiciário brasileiro, como consequência de uma correta utilização das dinâmicas e elementos da doutrina dos precedentes, tem-se uma evolução no pensamento jurídico brasileiro.
(...) todos esses mecanismos estão a evidenciar que a força vinculante do precedente não impede que uma determinada tese dominante, antes sedimentada, possa ser superada, passando-se a um novo processo de 'normatização pretoriana'. A mutação progressiva de paradigmas de interpretação de um determinado episódio da vida, dotado de relevância jurídica, sempre veio imposta pela historicidade da realidade social, constituindo mesmo uma exigência de justiça. (TUCCI, 2004, p.180)
No direito brasileiro atual existem vestígios destes modelos de superação de precedentes judiciais, ocorre que, com a entrada em vigor do NCPC, será determinante para o sucesso dos institutos voltados à proteção dos direitos coletivos, difusos e individuais homogêneos, de processos repetitivos e de litigância de massa, uma correta análise, compreensão e principalmente, aplicação destes modelos de superação para evitar o engessamento da matéria do judiciário, tornando o processo mais célere e dinâmico. Tal necessidade de cuidado dar-se pela seriedade da matéria pois, quando mal estruturada, acaba por gerar danos aos jurisdicionados e ao próprio direito, se faz necessário, além das técnicas de utilização dos precedentes, uma certa criatividade na jurisprudência, com inovações constantes a fim de manter o sistema orgânico e funciona, exequível, devendo, além de todos os fatores expostos, o magistrado abrir margem ao contraditório e ampla defesa, fundamentando suas decisões de forma real, material, a fim de sanar qualquer dúvida ou vício no que disser respeito à causa paradigma, ou mesmo as demais decisões que não se tornarem precedentes.
O novo código processual civil prevê diversos institutos que podem ser utilizados pelos juízes para a produção de resultados uniformes em casos análogos, como a improcedência liminar do pedido, ou, com demais relevância, quando se estiver diante de uma demanda com potencial de gerar relevante multiplicação de processos fundados em idêntica questão de direito e de causar grave insegurança jurídica, pela coexistência de questões conflitantes, quaisquer dos sujeitos do processo poderá suscitar o incidente de resolução de demandas repetitivas, objetivo e cerne desta pesquisa. As decisões proferidas pelo incidente serão de obrigatória observância pelos órgãos inferiores vinculados ao tribunal que proferiu a decisão, característica dos precedentes judiciais, apresentando também exigências de elementos dos precedentes para sua validade, como por exemplo, a exigência da presença dos fundamentos determinantes da decisão(ratio decidendi) e os dispositivos a eles relacionados, onde, contribuirá para moldar a jurisprudência das demandas repetitivas, bem como contribuirá com a garantia à isonomia e duração razoável do processo, bem como à celeridade jurisdicional, ocorre que, para uma correta e produtiva utilização deste instituto, basilar torna-se a presença e ocorrência dos métodos de tratamento dos precedentes, como o distinguishing, ratio decidendi, overruling, overriding, para a manutenção do incidente, dentro de seus parâmetros processuais e prerrogativas constitucionais.
3.6 A nova sistemática do dever de fundamentação expresso no ncpc e sua contribuição para a adoção do sistema de precedentes pela legislação brasileira

Art. 489. São elementos essenciais da sentença:
I – o relatório, que conterá os nomes das partes, a identificação do caso, com a suma do
pedido e da contestação, e o registro das principais ocorrências havidas no andamento do
processo;
II – os fundamentos, em que o juiz analisará as questões de fato e de direito;
III – o dispositivo, em que o juiz resolverá as questões principais que as partes lhe submeterem.
§ 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:
I – se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;
II – empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso;
III – invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão;
IV – não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;
V – se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles
fundamentos;
VI – deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.
§ 2º No caso de colisão entre normas, o juiz deve justificar o objeto e os critérios gerais da ponderação efetuada, enunciando as razões que autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas que fundamentam a conclusão.
§ 3º A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé.

O novo código processual impõe, ao magistrado, o cumprimento do que já era previsto no art. 93, IX, CF, em seu art. 489, tal imposição se deu pelo fato da má qualidade nas fundamentações judiciais por parte dos magistrados em suas decisões, servindo o NCPC para tornar exequível a previsão constitucional.
Com o dever de fundamentação obrigatório no NCPC, necessário se faz a quebra do entendimento de que o juiz não é obrigado a fundamentar sua decisão, tendo em vista que isto acabaria por tornar o processo inexequível e moroso, nesse sentido, Humberto Theodoro
Percebe-se, assim, que devemos nos afastar daquele antigo entendimento(que imperou durante séculos até o advento do Código de Frederico II da Prússia, em 1748) de que a fundamentação das decisões não seria obrigatória e que ela induziria uma quebra da praticidade e da rapidez do sistema, para percebermos a absoluta necessidade e relevância de seu papel.(THEODORO JUNIOR, 2015, p.219)

Sabe-se que a exigência de fundamentação material das decisões judiciais consistem em um grande avanço ao jurisdicionado, bem como ao próprio estado democrático de direito, viabiliza uma garantia contra o arbítrio e o livre convencimento motivado do magistrado, que, em muitas ocasiões, primeiro julga e depois busca elementos jurídicos para embasar sua decisão, ocorre que, para uma correta fundamentação dos julgados, apenas a explicação da decisão não se faz suficiente, sendo o conceito de fundamentação diferente do conceito de motivação e do conceito de explicação.
(...) é preciso diferenciar a fundamentação válida de suas simulações. Fundamentar validamente não é explicara decisão. A explicação só confere à decisão uma falsa aparência de validade. O juiz explica, e não fundamenta, quando diz que assim decide por ter incidido ao caso" tal ou qual norma legal". A atitude do juiz que repete o texto normativo que lhe pareceu adequado, sem justificar a escolha, não vai além do que faria se não explicitasse deforma alguma o motivo da decisão. Diz Streck que "jamais uma decisão pode ser do tipo 'defiro com base na lei x ou na súmula y'''. Esta escolha '' livre'' de sentido não fundamenta o julgado, a não ser para alguém ainda tão imerso no paradigma racionalista que acredite que a lei tenha um sentido unívoco e pressuposto.
Ao juiz contemporâneo não pode bastar, ao dar cabo a uma discussão, a mera declaração do vencedor, repetindo as razões deste como quem enuncia uma equação matemática. Ao contrário, é preciso que o julgador, no mesmo passo em que diz por que acolheu as razões do vencedor, afirme aas razões pelas quais rejeitara a interpretação dada pela parte sucumbente. (RAMIRES, 2010.p. 41-42)
O NCPC, em seu turno, promove uma nova perspectiva para o preceito constitucional da fundamentação das decisões judiciais, expandindo e tutelando a norma, expandindo o conteúdo da mesma.
A fundamentação se diferencia da mera motivação das decisões judiciais, visto que a fundamentação deve explicar as razões pelas quais o judiciário concebe ou denega determinado entendimento sobre o direito, sendo que a motivação serve apenas para estabelecer o que o magistrado pensa sobre o direito, consistindo em algo descartável para o ordenamento jurídico, visto que, na fundamentação, o entendimento pessoal do magistrado pouco importa para a análise jurídica, sendo que, a partir do novo conceito de fundamentação empregado no NCPC, pode-se trabalhar com a ideia de extinção do Livre convencimento motivado do magistrado, estando o juiz vinculado ao dever de fundamentação do caso concreto.
O dever de fundamentação das decisões judiciais, muito se fez relevante na ótica da litigiosidade massiva e repetitiva, tendo em vista que, ao julgar o caso melhor, fundamentando as decisões, bem como sua ratio decidendi, torna-se, o processo, mais célere e efetivo, pois os casos futuros análogos que poderão se beneficiar dos precedentes firmados do primeiro caso, contribuirão com a redução das demandas no judiciário, bem como elevará o nível e a qualidade das sentenças e acórdãos proferidos pelos tribunais e, também, diminuirá de forma considerável o número de recurso a estas decisões, visto que é prolatada com maior grau de eficiência e atenção.
Caso o NCPC mantivesse o mero dever de motivação das decisões pelo magistrado, o nível de preocupação e precariedade no judiciário, no que tange às causas repetitivas e massivas, só tenderia à piora, colocando em risco a validade e eficiência das decisões judiciais, não apenas a decisão em si, mas as análogas e semelhantes a serem interpostas no futuro.
Pode-se perceber que o art. 489 traz em seu caput e nos seus incisos disposições referentes ao art. 458, CPC, porém, a grande inovação está em seus parágrafos, onde traz o caráter compulsório da fundamentação das decisões, criticando as fundamentações superficiais, imprecisas e ineficientes, não devendo o magistrado se limitar à mera indicação de súmulas, artigos ou atos normativos, sem o devido enquadramento na causa em questão, não devendo também empregar determinados conceitos indeterminados, ou mesmo se limitar a invocar precedente ou súmula sem a devida exposição da ratio decidendi do caso, bem como sua adequação ao caso em análise.
No caso da mera transcrição de enunciados de súmulas, clara é a análise de que, para ser suscitada em decisão, deve-se identificar o enquadramento do caso em questão com o caso moldador do entendimento sumulado, elemento claríssimo da utilização da teoria dos precedentes no NCPC, pela força obrigatória hermenêutica do magistrado em identificar e adaptar os julgados para com os casos futuros análogos, daí a necessidade de uma instrumentalização das decisões em consonância com a teoria dos precedentes.
Em relação ao processo, não novo, de convergência entre o civil law e o common law.
O sistema jurídico brasileiro, encontra-se há algum tempo profundamente imerso no movimento de convergência entre o civil law e o common law, com a utilização cada vez mais corrente de decisões jurisprudenciais como fonte de aplicação do direito. Esse movimento de transição foi fortalecido pela EC n°.45/2005, que permitiu os julgamentos dos recursos extraordinários pelo STF em repercussão geral (regulamentados pelos arts. 543-A e B, CPC/1973, reformado) e das técnicas de julgamentos repetitivos absorvidas por reformas legais na legislação processual. (THEODORO JUNIOR e BAHIA NUNES, 2009, 177)
As alterações no modo de visualizar o processo, pela convergência paulatina entre o civil law e o common law, acabou por propiciar, dentro do NCPC, um verdadeiro sistema híbrido processual, adotando características de ambos os sistemas normativos, rompendo com o velho modo de visualizar o processo, em que o juiz julga por mera liberalidade, dependendo apenas de um mero convencimento motivado de suas decisões, passando agora a desempenhar um papel mais responsável no que tange às suas decisões, passando a ter, em sua função constitucional, um papel mais moderno e voltado aos precedentes, onde suas decisões passarão a conter um padrão decisório, voltado à garantia de estabilidade, confiança, segurança jurídica, previsibilidade e, mesmo indiretamente, celeridade processual, onde a partir desta decisão, será possível extrair-se a ratio decidendi do caso, passando os casos futuros a seguir ou não esta razão de decidir, como será exposto mais adiante.
A celeridade será concebida pelo fato de que, no Brasil, a principal utilização da padronização decisória consiste na chamada litigiosidade repetitiva, onde um número grupo de pessoas, geralmente trata-se de direitos individuais homogêneos, com pretensões isomórficas, adentram ao judiciário procurando, individualmente, sanar as irregularidades, muitas vezes contra o próprio estado, o que acaba abarrotando o judiciário, sendo a padronização decisória elemento importante para diminuir este contingente no judiciário, onde uma sentença poderia aproveitar a todos os casos análogos.



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