DIREITOS, MINORIAS, EPISTEMOCÍDIO & CONSCIÊNCIA HISTÓRICA

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DIREITO, MINORIAS & EPISTEMOCÍDIO (Ou Sobre as Reflexões de Lorelay Fox em 2015) Alexander Martins Vianna – 01 de fevereiro de 2016

DIREITOS, MINORIAS, EPISTEMOCÍDIO & CONSCIÊNCIA HISTÓRICA (Ou Sobre as Reflexões de Lorelay Fox em 2015) por Alexander Martins Vianna

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Fotografia: Arô Ribeiro, ator e diretor no Agrupamento Teatral

*** Não é novidade para quem me acompanha com alguma assiduidade nas redes sociais que o tema presente no vídeo “Privilégios para Gays, Negros e Mulheres?”, de Lorelay Fox, é algo sobre o qual tenho abordado em várias postagens no Facebook. Destaca-se em seus vídeos de 2015 a abordagem crítica sobre temas LGBTs, sempre expressa em tonalidade elegante-empática que lhe é tão peculiar. Dada a abrangência específica de questões conceituais contidas em tal postagem, selecionei-a também para constar entre meus ensaios para a Academia.edu. Contudo, prioritariamente, o meu desejo maior é veicular os vídeos de 2015 de Lorelay Fox que abarcam o tema central deste ensaio, de modo a valorizar, no locus acadêmico de meu discurso, o lugar qualificado de trabalho de Lorelay Fox sobre direitos para as “minorias” nas novas mídias sociais. Para tanto, poderíamos começar com uma pergunta: O que é um calendário festivo e/ou comemorativo? Algo criado para lembrar, ritualizar, celebrar e provocar memória social sobre um assunto que foi alçado como relevante. Nada disso é indisputável. Num movimento socialinstitucional qualquer em torno da construção de memória social está não apenas o que se

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pretende lembrar, mas como e por que lembrar. Calendários festivos e/ou comemorativos são resultados de disputas por memória (e direitos, conforme o caso) e por regimes de sentido histórico. As agendas de igualdade feministas, LGBTs e antirracistas são do interesse de todos, porque uma sociedade que ainda produz machismo, feminicídio1, racismo, trans-homofobia, epistemocídio2 das mais diferentes modulações comportamentais precisa ainda ser lembrada do quanto deve aperfeiçoar os valores ligados à democracia e à igualdade de direitos. À medida que tal premissa efetivamente se aperfeiçoar, o próprio conceito de “minoria” sairá da agenda política e jurídica. À medida que tal premissa se traduzir nos comportamentos, as próprias leis protetivas e reparatórias tornar-se-ão anacrônicas porque, quando se pensar que “todos são iguais perante a lei” (isso para ficar só no solo estritamente liberal-democrático), não será necessário criar parênteses especiais que alertem para epistemocídios que provocam invisibilidade ou apagam a percepção da negação da dignidade sobre tudo que escapa à heteronormatividade branca, patriarcal e cristã que ainda perpassa a prática e percepção de efeitos para as leis constitucionais, civis e criminais no Brasil. Portanto, o conceito de direitos às minorias – e seus marcos simbólicos calendarizados, por exemplo, para lembrar as suas lutas por dignidade – é sintoma de uma agenda de direito ainda não cumprida e de violências estruturais e subjetivas que precisam ser combatidas. O conceito de direitos às minorias é sintoma de padrões de comportamentos na “maioria” que criam, no ato do comportamento discriminatório, a “minorias” sem direito – i.e., o que se presume indigno de humanidade e, portanto, sem enunciado e lugar de direitos. Contudo, é importante ressaltar que o comportamento machista, sexista, racista ou trans-homofóbico não é do indivíduo “branco” ou do indivíduo “homem-hétero”, mas das relações sociais formadas por valores centrados na heteronormatividade branca, patriarcal e cristã, que acabam construindo valências discriminatórias e difundindo-as na linguagem formativa das subjetividades desde a infância. Tal comportamento tem vetores violentos bem claros, provocam desvantagens históricas, sociais e psicológicas imensas e, portanto, demandam vetores, agendas, meios e trajetórias específicos de reparações de direitos.

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Num sentido estrito, feminicídio está ligado ao assassinato ou violação do corpo de mulheres pelo fato de serem mulheres. Num sentido abrangente, feminicídio está presente nas diversas formas institucionais e comportamentais de discriminação, desvalorização, hierarquização ou negação da dignidade, da capacidade, da autonomia e da inteligência da mulher. 2 Entendemos por episteme o paradigma, forma ou modelo estruturante de sentido interpretativo que codifica entendimentos e saberes (científicos ou não) na sociedade sobre pessoas, coisas, instituições, processos, valores, comportamentos e demais fenômenos sociais e naturais. Por este viés, há epistemocídio quando uma episteme se hegemoniza a tal ponto que provoca invisibilidade social, exclusão institucional ou aniquilação efetiva de outros entendimentos e saberes sobre fenômenos sociais e naturais.

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Por isso, a luta das minorias por direitos é uma luta de todos, porque o que está em jogo é nosso aperfeiçoamento civilizacional em termos de percepção de dignidade humana e direito; e do permanente aprendizado reflexivo com a diferença que expande a fronteira da dignidade humana. Tudo que fere a dignidade humana não pode ser relativizável em nome da “diferença cultural”. Hoje, vários neoconservadores e neofascistas têm usado uma retórica antirreflexiva e descontextualizada de relativismo cultural e de liberdade de expressão para veicular os seus horrores focais e mensagens de ódio, posicionando-se como minorias na ordem democrática. O tipo de relativismo que provoca insulação essencializadora e interrompe a autorreflexão crítico-genética3 (e, portanto, o deslocamento cultural) não cumpre efetivamente a função crítica do relativismo cultural porque provoca argumentos essencializantes e imobilidade epistemológica no sujeito do conhecimento. Na grande farsa dos neoconservadores e neofascistas, há sempre espaço para citar Voltaire... Quem sofre a violência discriminatória e consegue elaborar reflexão crítica sobre tal trauma que evidencie o padrão civilizatório que gera tal vetor de violência, é pessoa digna e corajosa que precisa ser respeitada em seus enunciados de dor e trauma. Não é nada fácil formular enunciados sobre traumas. No cruel enunciado “Pára de mimimi!”, por exemplo, há a bárbara negação da possibilidade de tais pessoas enunciarem publicamente os seus traumas. Assim, são apagadas ou diluídas as suas singularidades de trajetórias de dor. Pior ainda quando ocorrem aqueles cruéis paralelos analógico-imagéticos maldosos e banalizantes no Facebook, que igualmente diluem a dor (e, portanto, as guerras de compreensões4 específicas) de um grupo. No final das contas, é traumatizar de novo fazer calar tais enunciados de trauma por meio de artifícios discursivos diluidores de sua singular trajetória de dor. Frente ao trauma, além de acolhimento, devemos oferecer o silêncio reflexivo do ouvido que saiba escutar para aprender a não criar ou ratificar mais mecanismos de trauma e ódio. Cada tipo de trauma demandará uma agenda específica de guerra de compreensão. Há uma dimensão comportamental-política nessas leis para minorias que é importante notar: ao provocar enfrentamento ao status quo habitual, criam visibilidade e guerras de compreensões sobre temas e questões latentes na sociedade que ficariam silenciados pelo epistemocídio (machista-branco-normativo) dentro e fora de espaços acadêmicos. Disputamos ressemantizações de categorias o tempo todo nessas guerras de compreensões; provocamos deslocamentos; criamos novas categorias. A língua é viva e disputada. O grande campo de 3

Veja nota 6. Tal expressão foi deslocada para meu ensaio a partir do ensaio de Alberto Lins Caldas, intitulado “Fragmentos sobre o Verso e o Poema”, no qual fala que “o poema é guerra de compreensão”. 4

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combate é a linguagem. Então, como ultrapassar a linguagem do senhor e do colonialismo? Como evitar que a afirmação das diferenças e a luta por igualdade de direitos caiam em soluções essencializantes como produtos reativos à agenda do “senhor/colonialismo”? Como fazer a “reação à indignidade” se tornar “ação por direitos” que desloque categorias de percepções e avaliação de toda a sociedade para horizontes categoriais que vão além do trauma provocado pelo “senhor/colonialismo”? Sem as agendas das “minorias”, tais questões não seriam cogitáveis. As próprias lutas por direitos – à medida que conquistam respeito, comportamento e provocam novos hábitos – precisam mudar de tom e formas de combate. Então, cada tom ou forma de combate por direitos deveria ser visto como sintoma do tipo de problema que se enfrenta em cada época e lugar, e o quanto isso pode também criar prisões em linguagens circunstanciais de combate e afirmação por direitos. Tudo isso é da ordem da relação social que se constrói a cada momento. Então, é um violento epistemocídio algumas mentes tacanhas diluírem um problema complexo (como as lutas das minorias por direitos) em frases banalizantes ou comentários que só evidenciam a sua ignorância histórica crítico-formativa e/ou sua incapacidade de ver o mundo para além de suas categorizações e referências tribais (e isso numa época de mídias virtuais!). “Minoria” não é um conceito demográfico-numérico, mas ético-sociológico. Há “minoria” quando há alguma estrutura institucional-social, valor, crença e/ou padrão comportamental específico que se hegemoniza de tal forma que confunde a sua singularidade com universalidade (i.e., um “local” se torna “meta universal”), deixando de pôr-se em questão ou não desenvolvendo criticidade sobre a sua própria historicidade5 para além de um regime de sentido tradicional-fundador. Daí, tudo que “destoa” ou “desvia” de paradigmas ou epistemes hegemônicos torna-se “minoria” social, cultural, comportamental, política e/ou epistemológica quando lhe é negada validade expressiva, ou esta é circunscrita (e tacitamente hierarquizada) a um nicho de tolerância (insuladora) que não dialoga com (e relativiza) o “padrão hegemônico”. Nesse sentido, numa sociedade machista de valores patriarcais, “mulher” é minoria, mesmo que demograficamente abranja 50% da população.

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Historicidade ou regime de historicidade é a forma epistêmico-hermenêutica de conceber categorias, noções, ideias, substantivos coletivos, figuras e demais recursos linguísticos que criam, sugerem ou constituem narratividades que configuram vínculos implicativos entre passado e presente/futuro. Segundo a tipologia proposta por Jörn Rüsen, tais formas narrativas de vínculos implicativos entre passado e presente/futuro podem ser reduzidas a quatro tipos, os quais podem ou não convergir: tradicional, exemplar, crítico e genético. Ver: RÜSEN, Jörn. História Viva: Teoria da História – Formas e funções do conhecimento histórico. Brasília: Editora UnB, 2007. p.4367

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Daí, para tomar outro exemplo, durante o regime de Apartheid na África do Sul, a população negra (maioria demográfica de duas etnias principais) era “minoria” num regime que a segregava em bantustões, controlava a sua mobilidade e criminalizava escolhas afetivas inter-raciais. Este tipo de hierarquização discriminatória intolerante – cujas faces mais extremas no século XX foram, sem dúvida, os campos de concentração/extermínio nazistas – concorre em sentido e consequência com outra modalidade de fabricação de “minorias”: a nidificação guetizante-tolerante, do tipo “separados, mas iguais”, ou seja, o viés de tolerância liberal-segregacionista que faz a cabeça de algumas lideranças brancas e não-brancas nos EUA. Fabrica “minorias” – e gera potenciais epistemocídios – a negação velada ou explícita de expressão da diferença capaz de relativizar paradigmas ou epistemes hegemônicos ou tidos como universais/naturais. Portanto, trata-se de um conceito relacional-dialético. Por isso, acredito que o debate contemporâneo de direitos deveria exigir dos (e/ou provocar nos) sujeitos sociais o desenvolvimento de uma consciência histórica crítico-genética6, porque esta efetivamente é constituída por episteme reflexiológica. A consciência histórica tradicional7, por

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Tipologicamente, tal forma de consciência histórica é regida pelo regime crítico-genético de historicidade, o qual pressupõe que os sujeitos sociais são variados no tempo e lutam por reconhecimento e/ou poder. Aqui, há o entendimento de que a História é um discurso disputado pela diversidade de sujeitos sociais que estruturalmente mudam com o tempo, tendo cada indivíduo, grupo, sociedade ou cultura a sua forma singular de concebê-lo. Para tal regime de sentido de tempo histórico, cada época é qualitativamente distinta da outra, ou seja, não é possível reduzir experiências de diversas épocas a recorrências típicas exemplares porque a percepção histórica é formada pelo princípio da transformação, o que significa que o horizonte de expectativa não é fixo por um marco fundador inquestionável. Portanto, no regime crítico-genético de historicidade, existe o entendimento de que há uma unidade abrangente, reflexiva e dinâmica de vínculo implicativo entre passado e presente/futuro, no qual as diferenças e diversidades não são apagadas pela força da tradição, pela abstração da regularidade exemplar (clássica) ou pela abstração evolutiva (moderna-iluminista, ou seja, aquela que nega peremptoriamente o valor da tradição como fator de orientação do presente). No regime crítico-genético de historicidade, diferenças e diversidades são elaboradas por um princípio de comunicação efetiva, e não pela peremptória negação do diálogo com formas de orientações precedentes de vida, porque é formado por uma episteme sem o imperativo normativo da ruptura necessária como condição de percepção ou interpretação da transformação histórica. Nesse sentido, rege um tipo de consciência histórica que equilibra mudança e ordenamento reflexivo da vida. Daí, podemos dizer que o regime crítico-genético de historicidade é um passo qualitativo adiante em relação aos regimes tradicional, exemplar e crítico de historicidade, os quais tinham, em comum, uma percepção pouco dinâmica de passado, entendido respectivamente como: algo fundador que se ratifica por exemplos contingentes do presente; algo regular que se deduz da abstração de recorrências de paralelos (analógicos) exemplares; algo atávico com o qual se estabelece uma relação necessária de ruptura histórica. Ver: RÜSEN, Jörn. História Viva: Teoria da História – Formas e funções do conhecimento histórico. Brasília: Editora UnB, 2007. p.46-63 7 Tipologicamente, tal forma de consciência histórica é regida pelo regime tradicional de historicidade, o qual é formado por ações comunicativas com subtendidos automatizados ou habituais que criam perspectivas temporais sobre as relações sociais, identidades, instituições e subjetividades que pressupõem a presença pura e simples do passado no presente. Aqui, a tradição enquadra toda a orientação histórica da vida prática, na qual o mito de origem ou mito fundador seria a manifestação tipológica mais pura do regime tradicional de historicidade, por conceber a continuidade como a experiência do tempo que representa a periódica ratificação das premissas fundadoras de sentido para a vida por meio de exemplos contingentes. Neste universo, o presente é uma confirmação permanente do passado, que se torna, portanto, um destino que determina as escolhas dos indivíduos e transforma contingências em afirmações/confirmações de ideias, concepções, percepções ou valores eternos. Isso fica exemplarmente representado pela forma como se concebe ou aborda identidades de gênero ou papéis sociais como naturais, mesmo em sociedades capitalistas atuais, como se a socialização e a individuação psicogénica não

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outro lado, sempre cria a possibilidade de vários graus de epistemocídio na forma como se categorizam ou silenciam orientações culturais para as pessoas na vida prática. O epistemocídio está presente, por exemplo: no sexismo da linguagem, na piada machista, no comentário racista; num padrão unidimensional de concepção de pesquisa/escrita científica, de identidade de gênero e orientação sexual; quando se diz acusativamente e de forma criminalizante nas escolas “Isso é ideologia! Não pode!” (tacitamente, quem acusa supostamente estaria num lugar “não-ideológico” ou “neutro”, o que, na verdade, é uma forma velada de impor uma concepção técnica e restritiva de “ciência” e bem pouco crítico-reflexiva-poética-artística de construção do conhecimento no espaço escolar); quando se pergunta “Por que não se cria um dia de consciência branca ou de orgulho hétero?”, etc. São formas de banalização do horror, de apagamentos de enfrentamentos

crítico-genéticos

e

que

evidenciam

enunciados

pretensamente

universalizantes que ainda não desenvolveram capacidade epistêmica crítico-genética na percepção de seus lugares e paradigmas interpretativos de mundo. Não há necessidade de dias de orgulho “branco” e/ou “hétero” porque o que está em cheque são os padrões civilizatórios do “senhor/colonialismo” que transformaram “branco”

e

“hétero”

em

paradigmas

patriarcais

universais

que

definem

unidimensionalmente noções de “humanidade”, “masculino” e “feminino”. Na agenda das “minorias”, nos tipos de enfrentamentos que ainda são necessários, há a possibilidade de ser “branco” e/ou “hétero” de outra forma: aquela que não se incomoda com quem não seja socialmente “branco” ou “hétero” e, portanto, não vai queimar índio em Brasília, ou perseguir e ofender gays, trans e lésbicas; não vai normatizar e hierarquizar valor para cabelo, trejeito e tom de pele de ninguém; não vai arrebentar lâmpada na cara de casais homoafetivos na rua; não vai humilhar, perseguir e assassinar travestis por serem travestis; não vai acreditar que mulheres “merecem ser estupradas” quando violam tabus de nudez de determinados espaços sociais; etc. Ainda no campo de combates das linguagens, há o enfrentamento no modo como se usam metonímias e paralelos analógicos. Já falei dos paralelos analógicos anteriormente. Então, falemos das metonímias. Em termos comportamentais, esta é a figura de linguagem que nos atos comunicativos cria mecanismos de sentido que deduzem o “todo” a partir da “parte”, ou diluem uma “suposta” parte num suposto “todo”. Em si mesma, é uma figura que

fizessem parte das transformações históricas das subjetividades. Ver: RÜSEN, Jörn. História Viva: Teoria da História – Formas e funções do conhecimento histórico. Brasília: Editora UnB, 2007. p.48-49

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tem um latente risco de simplificação quando interpreta visões comportamentais cuja potencial escala discriminatória se apresenta quando opera categorizações e percepções que explícita ou tacitamente constituem assimetrias discursivas antitéticas na percepção de “indivíduos” e “grupos” – que se tornam “indivíduos” e “grupos” pelo próprio jogo categorial-prisional antitético assimétrico. Tais ponderações ficam mais claras se as exemplificarmos com enunciados ou circunstâncias-modelo ainda recorrentes em nosso cotidiano: “Isso é coisa de viado!”, “Isso é coisa de preto!”, “Deixa de ser mulherzinha!”; ou quando se supõe que determinada modalidade esportiva ou intelectual é própria para “negro”, “branco” ou “asiático”; ou quando se fazem paralelos implicativos entre “ser negro”, “ter gingado”, “saber sambar” e “potência sexual”; ou entre “ser gay” e “ser sensível/amoroso”, “ser compreensivo” ou “ser permissivo”; ou entre “ser branco(a)” e ser “frio(a)” [i.e., pouco carinhoso(a), pouco(a) acolhedor(a) e sexualmente com menos traquejo]; ou quando se opera com um padrão de medo de violência subjetiva que focaliza preventivamente no socialmente negro a ameaça criminal em determinados espaços de circulação social; etc. Em todas essas formas socioculturais de expressão de percepção diluidora dos indivíduos por meio de grupos-referência ou supostas características grupais, observamos evidentes assimetrias antitéticas tácitas nas formulações de discursos, os quais ainda operam noções patriarcais coloniais hierárquicas sobre “feminino/masculino” e/ou “branco/não-branco”. Há discriminação hierárquica toda vez que um indivíduo-referido é diluído (por uma visão assimétrica essencializante) num suposto grupo-referência. Portanto, cada vetor de violência discriminatória (racista, sexista, machista, trans-homofóbica, etc) exige um tipo de guerra de compreensão específico, podendo-se convergir agendas em certas arenas e circunstâncias, mas não se podem perder de vista as singularidades de seus enfrentamentos sociais, culturais, comportamentais, jurídicos e políticos. A metonímia é a figura linguística mais recorrente e formativa dos hábitos diluidores discriminatórios e preconceituosos em qualquer comportamento (de “minoria” ou “maioria”) quando se perde ou não se desenvolve capacidade crítico-reflexiva sobre as nossas próprias formas de expressão e categorias de percepção e avaliação do mundo e das pessoas. Em vários vídeos de Lorelay Fox, observamos a sua elegante guerra de compreensão contra as perigosas diluições generalizantes, essencializantes e normativas das metonímias em vários campos sociais. Quem observar com atenção a sua trajetória em 2015,

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perceberá que Lorelay desenvolve periódico olhar crítico para “fora” e para “dentro”, porque superar a linguagem do “senhor/colonialismo” é tarefa de todxs. *** VÍDEOS NO CANAL “PARA TUDO” DE LORELAY FOX, EM 2015, QUE ABARCAM OS TEMAS DESTE ENSAIO: “Sobre as Lutas por Direitos das Minorias” “Haters e a visibilidade pelo Ódio nas Redes Sociais” “Família Tradicional Brasileira” “Desenhos Animados & Diversidade Sexual” “Gênero nas Escolas” “Bissexuais Existem” “Por que Parada Gay?” “Ser afeminado é revolucionário” “Lésbicas na Sociedade” “Sair do Armário” “Gays são engraçados?” “É Drag ou é Trans?” *** SINOPSE: Tendo como ponto de partida o trabalho no canal “PARA TUDO” da personagem Lorelay Fox, este ensaio crítico pretende demonstrar a importância do desenvolvimento da consciência histórica crítico-genética como um meio possível de combate educacional que possibilite a efetiva superação de valores patriarcais heteronormativos colonialistas, os quais são norteadores unidimensionais de ideias, concepções e valores que infelizmente ainda provocam violências estruturais e subjetivas de natureza discriminatória hierarquizante (racismo, sexismo, machismo e trans-homofobia). Por meio desta discussão, pretende-se demonstrar a necessidade, para as agendas contemporâneas, do enfrentamento do tema das reparações que se traduzem em leis específicas de visibilização e proteção às “minorias”.

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