Dissertação: Fontes e reações de estresse em advogados

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UNIVERSIDADE SALGADO DE OLIVEIRA – UNIVERSO PRÓ-REITORIA DE PÓS GRADUAÇÃO E PESQUISA PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA CURSO DE MESTRADO

FONTES E REAÇÕES DE ESTRESSE EM ADVOGADOS

Maria de Fátima Antunes Alves Costa

NITERÓI SETEMBRO DE 2010

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UNIVERSIDADE SALGADO DE OLIVEIRA – UNIVERSO PRÓ-REITORIA DE PÓS GRADUAÇÃO E PESQUISA PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA CURSO DE MESTRADO

FONTES E REAÇÕES DE ESTRESSE EM ADVOGADOS

Maria de Fátima Antunes Alves Costa

Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado do programa de Pós Graduação em Psicologia da Universidade Salgado de Oliveira – UNIVERSO, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Psicologia. Orientador: Maria Cristina Ferreira

NITERÓI SETEMBRO DE 2010

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UNIVERSIDADE SALGADO DE OLIVEIRA – UNIVERSO PRÓ-REITORIA DE PÓS GRADUAÇÃO E PESQUISA PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA CURSO DE MESTRADO

FONTES E REAÇÕES DE ESTRESSE EM ADVOGADOS

Maria de Fátima Antunes Alves Costa

DISSERTAÇÃO defendida e aprovada pela Banca Examinadora composta pelos (as) seguintes professores (as):

______________________________________________________________________ Profa. Dra. Maria Cristina Ferreira, UNIVERSO (Orientadora)

______________________________________________________________________ Profa. Dra. Maria das Graças Torres da Paz, UNB

_____________________________________________________________________ Profa. Dra. Luciana Mourão, UNIVERSO

Dissertação aprovada no dia 29/09/2010, no Curso de Mestrado em Psicologia da UNIVERSO.

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Aos amores da minha vida Maurício, Ana Klara e João Maurício.

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AGRADECIMENTOS

Não são poucas as pessoas a quem agradeço esta vitória, a Jurema que me trouxe ao mundo, a Suzanna que me deu a formação que eu precisava para chegar até aqui, a minha madrinha Verônica, que me ensinou a importância da paciência, da humildade, da bondade e da generosidade na nossa vida.

A todos que me ajudaram a concluir mais esta etapa na minha vida, em especial a a minha orientadora Maria Cristina, a Ana Luisa, a Patrícia e a Aline.

Agradeço especialmente a OAB do Rio de Janeiro e a OAB Federal, que contribuíram significativamente para o sucesso desta pesquisa. E também a todos os advogados que pacientemente, responderam á pesquisa.

Um agradecimento especial ao Dr. Mauricio Alves Costa, que foi incansável durante todo este processo, como marido e como advogado, respondendo pacientemente a todos os meus questionamentos.

Aos meus filhos Ana Klara e João Maurício.

À Deus, o grande Arquiteto do Universo.

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“Há homens que lutam por um dia Esses são bons. Há outros que lutam por um ano E são melhores. Há quem luta por muitos anos E esses são muito melhores. Porém, há os que lutam por toda vida, Esses são imprescindíveis” Bertold Brecht

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Dados descritivos dos participantes.

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Tabela 2: Cargas fatoriais e comunalidades da escala de latitude de decisão.

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Tabela 3: Cargas fatoriais e comunalidades da escala de demandas psicológicas do trabalho. Tabela 4: Cargas fatoriais e comunalidades da escala de suporte social de colegas.

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Tabela 5: Cargas fatoriais e comunalidades da escala de demanda física do trabalho. 69 Tabela 6: Cargas fatoriais e comunalidades da escala de relacionamento com clientes.

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Tabela 7: Cargas fatoriais e comunalidades da escala de insegurança no trabalho.

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Tabela 8: Cargas fatoriais e comunalidades da escala de estressores inespecíficos.

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Tabela 9: Cargas fatoriais e comunalidades da escala de insatisfação no trabalho.

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Tabela 10: Cargas fatoriais e comunalidades da escala de depressão.

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Tabela 11: Cargas fatoriais e comunalidades da escala de problemas psicossomáticos.

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Tabela 12: Estatísticas descritivas, desvio padrão e coeficientes de precisão das escalas do estudo.

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Tabela 13: Matriz de correlações.

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Tabela 14: Regressão múltipla linear hierárquica da insatisfação no trabalho.

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Tabela 15: Regressão múltipla linear hierárquica da depressão.

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Tabela 16: Regressão múltipla linear hierárquica dos problemas psicossomáticos.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Esquema do modelo de Michigan de estresse ocupacional

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Figura 2: Esquema do modelo de McGrath de estresse ocupacional

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Figura 3: Esquema do modelo ajuste pessoa – ambiente

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Figura 4: Esquema do modelo demanda-controle

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Figura 5: Esquema do modelo desequilíbrio esforço-recompensa

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Figura 6: Esquema de fontes e reações de estresse no trabalho

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Figura 7: Esquema do modelo de estresse em advogados

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Figura 8: Modelo da pesquisa

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Figura 9: Teste gráfico (scree plot) da escala dos estressores do JCQ

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Figura 10: Teste gráfico (scree plot) da escala de insatisfação no trabalho

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Figura 11: Teste gráfico (scree plot) da escala de depressão

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Figura 12: Teste gráfico (scree plot) da escala de problemas psicossomáticos

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Figura 13: Modelo Final de regressão para insatisfação no trabalho

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Figura 14: Modelo Final de regressão para depressão

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Figura 15: Modelo final de regressão para problemas psicossomáticos

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LISTA DE ANEXOS

Anexo A: Escala de estressores Anexo B: Escala de insatisfação no trabalho Anexo C: Escala de depressão Anexo D: Escala de problemas psicossomáticos Anexo E: Informações sócio-demográficas Anexo F: Questionário da pesquisa Anexo G: Contrato de uso do instrumento Anexo H: Carta de aprovação do Comitê de Ética Anexo I: Notícia no site da OAB/RJ Anexo J: Banner do site da OAB/RJ Anexo K: Notícia do site da OAB/Federal Anexo L: Divulgação em site de informações jurídicas Anexo M: Divulgação em site de saúde do trabalhador Anexo N: Divulgação em site de informações jurídicas Anexo O: Artigo desenvolvido com base na divulgação da pesquisa Anexo P: Termo de consentimento livre Anexo Q: Primeira página do site da pesquisa (www.pesquisaadvogados.blogspot.com) Anexo R: Segunda página da pesquisa Anexo S: Página de finalização em caso de ausência de resposta Anexo T: Questionário da internet

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO

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CAPÍTULO 1 - O CONCEITO E AS ABORDAGENS INICIAIS SOBRE ESTRESSE

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CAPÍTULO 2 - O ESTRESSE OCUPACIONAL

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2.1 - Conceituando o estresse ocupacional

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2.2 - Modelos teóricos sobre o estresse ocupacional

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2.2.1 - Modelo de Michigan

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2.2.2 - Modelo de McGrath

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2.2.3 - Modelo de Ajuste-Pessoa-Ambiente

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2.2.4 - Modelo Demanda – Controle

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2.2.5 - Modelo de Desequilíbrio Esforço Recompensa

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2.3 - Antecedentes e consequentes do estresse ocupacional

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CAPÍTULO 3 - O ESTRESSE EM ADVOGADOS: ESTUDOS EMPÍRICOS

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3.1 – Caracterizando a profissão do advogado e o estresse nesses profissionais. 3.2 – Estudos empíricos sobre o estresse em advogados

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CAPÍTULO 4 - MODELO DE PESQUISA, OBJETIVOS E HIPÓTESES DA PESQUISA CAPÍTULO 5 - MÉTODO

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5.1 - Participantes

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5.2 - Instrumentos

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5.3 - Procedimentos

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CAPÍTULO 6 - RESULTADOS

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6.1 - Análise preliminar dos dados

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6.2 - Validação do Job Content Questionnaire (JCQ)

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6.2.1 - Escala de demandas das situações de trabalho (Estressores)

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6.2.2 - Escala de insatisfação no trabalho

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6.2.3 - Escala de depressão

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6.2.4 – Escada de problemas psicossomáticos

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6.3 - Estatísticas descritivas, coeficientes de precisão das escalas e correlações

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6.4 - Análise dos pressupostos para análise de regressão múltipla

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6.5 – Análise de regressão múltipla hierárquica

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CAPÍTULO 7 - DISCUSSÃO

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Considerações Finais

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Bibliografia

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Anexos

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RESUMO

Fundamentando-se no modelo de demanda-suporte-controle de Karasek e Theorell (1990), a presente pesquisa objetivou investigar o poder preditivo de sete fontes de estresse (latitude de decisão, demandas psicológicas do trabalho, demandas físicas do trabalho, suporte social de colegas, estressores inespecíficos, relacionamento com colegas e insegurança no trabalho) na insatisfação no trabalho, na depressão e em problemas psicossomáticos nos advogados. A amostra foi composta por 702 advogados de diferentes regiões do Brasil e atuantes em diversas áreas do direito. A coleta de dados efetivou por meio de uma versão adaptada do Job Content Questionnaire (JCQ), respondida em ambiente virtual. Os resultados obtidos revelaram que: (1) quanto maiores as demandas psicológicas e a insegurança no trabalho, maiores os índices de insatisfação no trabalho, de depressão e de problemas psicossomáticos; (2) quanto maior o suporte social recebido de colegas, menores os índices de insatisfação no trabalho, de depressão e de problemas psicossomáticos; (3) quanto maior a latitude de decisão, menores os índices de insatisfação no trabalho e de depressão; (4) quanto maiores os estressores inespecíficos, maiores os índices de depressão e de problemas psicossomáticos; (5) as mulheres, quando comparadas aos homens, tenderam a apresentar mais problemas psicossomáticos; (6) os profissionais mais jovens apresentaram maiores índices de insatisfação no trabalho. Tais resultados são discutidos a partir do modelo teórico que deu suporte à pesquisa e, à guisa de conclusão, são feitas sugestões relacionadas a estratégias de intervenção com possibilidades de reduzir o estresse em advogados e a uma futura agenda de pesquisa na área. Palavras-chave: estresse ocupacional; estressores laborais, reações ao estresse; advogados.

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ABSTRACT Basing on the model of the demand-control-support Karasek and Theorell (1990), this study investigated the predictive power of seven sources of stress (decision latitude, psychological demands of work, physical demands of labor, social support colleagues, nonspecific stressors, relationship with colleagues and job insecurity) in job satisfaction, depression and psychosomatic problems with the lawyers. The sample consisted of 702 lawyers from different regions of Brazil and engaged in various areas of law. Data collection was effected by means of an adapted version from Job Content Questionnaire (JCQ), answered in a virtual environment. The results revealed that: (1) the greater the psychological demands and job insecurity, higher rates of job dissatisfaction, depression and psychosomatic problems, (2) the greater the social support received from colleagues, the lower the rates of job dissatisfaction, depression and psychosomatic problems, (3) the higher the latitude of decision, the lower the rates of job dissatisfaction and depression, (4) the greater the nonspecific stressors, higher rates of depression and psychosomatic problems , (5) women compared to men, tended to have more psychosomatic problems, (6) young professionals had higher job satisfaction. These results are discussed from the theoretical model that supported the research and, in conclusion, some suggestions related to intervention strategies with the potential for reducing the stress on lawyers and a future research agenda in the area. Keywords: occupational stress, work stress, reactions to stress; lawyers.

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INTRODUÇÃO

As pesquisas sobre doenças relacionadas ao trabalho iniciaram-se em meados do século XX e, desde então, vêm contribuindo para a compreensão de diferentes aspectos associados ao contexto macro, meso e micro organizacional. Dentre eles, merece destaque o estresse laboral, em função dos graves prejuízos que tal fenômeno pode causar à saúde do trabalhador.

Nesse sentido, quando o ambiente de trabalho é

percebido como negativo e o indivíduo não se mostra capaz de atender às excessivas demandas por ele provocadas, pode acabar vivenciando um processo de estresse ocupacional, que costuma gerar conseqüências físicas, psicológicas e comportamentais que frequentemente afetam o desempenho no trabalho. Assim é que as reações associadas ao estresse vêm há muito tempo afastando os profissionais do trabalho. Nesse sentido, estatísticas do INSS de 2000 a 2006 revelam que os afastamentos por distúrbios mentais relacionados ao trabalho cresceram 260% no período considerado, enquanto dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) indicam que entre 30 e 40% da população economicamente ativa sofrem algum tipo de transtorno mental ou de comportamento decorrente do trabalho. Por outro lado, segundo a Divisão Brasileira da International Stress Management Association, o estresse caracteriza-se como um problema que afeta 70% da população do país, sendo que 30% desse total encontram-se em nível crítico. Em razão dos sérios efeitos que tal fenômeno provoca, ele vem sendo, há várias décadas, objeto de atenção de estudiosos de diferentes áreas, interessados em elucidar suas principais causas e conseqüências, bem como os contornos que ele assume em diferentes categorias profissionais. De particular interesse para o presente trabalho é a

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profissão de advogado, que envolve uma série de atividades e atribuições bastante específicas. Esses profissionais são, assim, constantemente expostos a diferentes estressores no dia a dia de sua profissão, que lhe podem trazer alegrias, mas também frustrações e ansiedade. Nesse sentido, evidencias empíricas de investigações realizadas no exterior, têm evidenciado que diferentes fatores associados à profissão do advogado acabam por comprometer sua saúde mental (Daicoff, 2008). No entanto, as pesquisas brasileiras no campo do estresse ocupacional em advogados ainda são raras, já que os estudos nessa área tem privilegiado as profissões de educação e saúde (médicos, enfermeiros, psicólogos) ou juízes. O presente trabalho busca assim atender ao déficit de informações que cercam a profissão de advogado no Brasil, especificamente no que diz respeito à saúde mental e qualidade de vida destes profissionais. Seu objetivo geral vincula-se, portanto, a investigar o poder preditivo de sete fontes de estresse (latitude de decisão, demandas psicológicas do trabalho, demandas físicas do trabalho, suporte social de colegas, estressores inespecíficos, relacionamento com colegas e insegurança no trabalho) na insatisfação no trabalho, na depressão e em problemas psicossomáticos nos advogados. Para tanto, a dissertação estrutura-se em oito capítulos. O primeiro traz algumas definições sobre o estresse e sobre como ele se processa, enquanto o segundo versa sobre o estresse ocupacional e os principais modelos teóricos que vêm sendo desenvolvidos para explicar tal fenômeno. O terceiro capítulo discorre sobre a profissão de advogado e suas peculiaridades, apresentando também alguns estudos empíricos realizados com os advogados e demais profissionais da área jurídica. No quarto capítulo, as evidências empíricas revistas são sintetizadas, como forma de se contextualizar o modelo de pesquisa e as hipóteses que orientaram a investigação. Os capítulos seguintes dedicam-se à descrição da metodologia do estudo (participantes,

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instrumentos, procedimentos) e dos resultados obtidos. O capítulo sete traz a discussão de tais resultados e o capítulo oito, por fim, aborda algumas sugestões de estratégias que podem ser implementadas para reduzir o estresse laboral em advogados, bem como de pesquisas nacionais futuras que podem dar prosseguimento a essa linha de investigação.

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CAPÍTULO UM O CONCEITO E AS ABORDAGENS INICIAIS SOBRE O ESTRESSE

A palavra “stress” vem sendo utilizada desde o século XIV, não apenas na área da Psicologia, mas também em outros campos do conhecimento, como a Fisiologia, a Medicina e a Engenharia. Sua origem remonta ao termo “strictus”, do latim, que significa estreito, oprimido. No português, ela foi traduzida como estresse, termo que, segundo o dicionário de Houaiss (2001), associa-se a um distúrbio fisiológico ou psicológico causado por circunstância adversa. Um dos primeiros autores a desenvolver pesquisas sobre tal fenômeno, embora ainda não adotando o termo estresse para designá-lo, foi Claude Bernard (1865, citado por Sabbatini, 1998), médico fisiologista francês, que se dedicou à pesquisa experimental e relacionou a fisiologia com leis da química e da física, para desenvolver teorias sobre os fundamentos da vida orgânica. Em suas pesquisas, o autor identificou que há estabilidade na composição química e no fluido corporal em que vivem as células humanas, além de demonstrar que o equilíbrio químico do corpo pode ser controlado pelo sistema nervoso, independentemente das mudanças externas ao indivíduo. A teoria de Bernard recebeu o nome de “mellieu intérier” ou meio interno (Sabbatini, 1998). A continuidade dos estudos de Bernard deu-se por meio do médico fisiologista americano Walter Cannon (1914, citado por Mc Ewen & Lasley, 2002), que desenvolveu análises sobre como o sistema nervoso autônomo regula o meio interno e de que forma os mecanismos fisiológicos, bioquímicos e comportamentais variam em

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torno de determinados limites. Suas pesquisas resultaram na descrição das respostas de um animal diante de uma ameaça, às quais denominou de respostas de luta ou fuga, e no desenvolvimento do conceito de homeostase, caracterizado como a estabilidade interna dos sistemas de um organismo vivo (Sabatini, 2003). Os conceitos de meio interno, resposta de luta ou fuga e de homeostase revelaram-se fundamentais para o posterior estudo do estresse, termo cuja introdução na literatura acadêmica é creditada a Hans Selye (1965), que o descobriu de forma absolutamente casual. O autor estava pesquisando um novo hormônio de ovário e, a partir da decepção com esta experiência, julgou interessante continuar estudando as lesões produzidas nos tecidos, de modo a identificar os agentes nocivos que produziam essas lesões. Tal pesquisa resultou na identificação de uma síndrome produzida por agentes nocivos internos e externos, a que o autor inicialmente deu o nome de Síndrome Não-Específica, por se tratar de uma síndrome produzida por vários agentes nocivos, o que tornava difícil a detecção dos agentes que a produziam. De acordo com Selye (1965), a referida síndrome apresenta três fases. Na primeira – fase de alarme –, a homeostase se rompe pela ação excessiva do sistema nervoso simpático ou pela diminuição da ação do sistema nervoso parassimpático, estabelecendo-se assim uma resposta inicial ao estímulo nocivo, acompanhada de alterações fisiológicas, como, por exemplo, taquicardia, dores musculares e perda ou aumento de apetite, havendo ainda um gasto das reservas das glândulas, entre outras reações. Na segunda fase – resistência –, com a repetição contínua de situações que acabam por alterar a homeostase, ocorre um aumento das dosagens hormonais, do fluxo sanguíneo e, conseqüentemente, das formas dos órgãos e tecidos. Já na terceira e última fase – exaustão –, há um desgaste dos órgãos que foram sobrecarregados pelas fases

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anteriores, devido à exposição prolongada a um ou vários agentes nocivos, o que leva à exaustão física e/ou psicológica e ao conseqüente aparecimento de doenças. Posteriormente, considerando que nas três fases mencionadas ocorria uma adaptação do organismo, destinada a estimular as defesas orgânicas, Selye (1965) alterou o nome da síndrome para Síndrome de Adaptação Geral ou SAG. Avançando em suas formulações, e procurando também adotar um termo que melhor refletisse o fenômeno que vinha estudando, o autor passou então a utilizar a expressão Síndrome do Estresse, tendo-a conceituado como um estado decorrente de uma síndrome não específica e associado a alterações simultâneas produzidas no organismo por agentes nocivos. No Brasil, Lipp (2001) propôs a incorporação de uma quarta fase – quase exaustão – às três anteriores formuladas por Selye, situando-a entre a segunda e a terceira fases e caracterizando-a pelo fato de a pessoa não mais conseguir resistir ao fator estressor, o que ocasiona o início do processo de adoecimento que posteriormente dá origem à fase de exaustão. Uma proposta mais recente para a explicação do estresse, desenvolvida por Lazarus e Folkman (1984), é a teoria transacional do estresse, que destaca a interdependência entre percepção, emoções e comportamentos e enfatiza os processos de avaliação e de coping presentes na interação do indivíduo com seu meio ambiente. De acordo com o referido modelo, os indivíduos utilizam suas funções cognitivas para perceberem as situações como neutras, positivas ou negativas, fazendo assim uma avaliação primária das mesmas, nas quais verificam se houve perda, dano, ameaça ou desafio. Em seguida, interpretam-na mediante a avaliação secundária, na qual ocorre o julgamento da ação a ser empreendida. Na fase seguinte, fazem a reavaliação ou modificação da avaliação realizada na fase anterior, com base nos novos dados obtidos. Finalmente, na fase de cooping ou enfrentamento, avaliam os recursos cognitivos e

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comportamentais disponíveis para gerenciar a situação, enfrentando-a ou não (França & Rodrigues, 2007). Em teorização posterior, Lazarus e Folkman, (1984) propuseram três tipos básicos de estresse: o fisiológico, que se associa aos distúrbios dos sistemas e tecidos corporais; o psicológico, que diz respeito aos distúrbios cognitivos que afetam principalmente a percepção do indivíduo em relação às situações à sua volta, e o social, que se relaciona à ruptura com uma unidade ou sistema social. De acordo com Cooper, Dewe e O´Driscoll (2001), o estresse pode ser entendido como causa (estímulo), conseqüência (resposta) ou processo, dependendo da área de estudo dos autores envolvidos nas pesquisas sobre o fenômeno. O estresse enquanto um estímulo refere-se a perturbações que ocorrem a partir da percepção (real ou não) de fatos de ordem externa que criam a necessidade de adaptação física, psicológica ou comportamental, por parte do indivíduo. Assim, por exemplo, Chamon (2006) concebe o estresse como um estímulo nocivo que pode ser de ordem física, emocional ou sensorial e que ameaça o equilíbrio e a sobrevivência das pessoas. O estresse como resposta caracteriza-se por uma tensão que gera reações físicas, comportamentais e psicológicas. Neste sentido, Lipp (2001) conceitua-o como uma reação complexa determinada por alterações psicofisiológicas que ocorrem diante de situações geradas por um estímulo desafiador e que forçam o indivíduo a superar sua capacidade de enfrentamento. Por fim, o estresse visto como interação ou processo envolve uma relação entre o ambiente interno e externo do indivíduo. Assim é que McGrath (1970, citado por Shupe & McGrath, 1998), por exemplo, define-o como um desequilíbrio substancial entre a demanda física ou psicológica imposta ao indivíduo e sua capacidade de resposta, o que pode gerar sentimentos de fracasso.

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As definições de estresse abordadas até aqui tendem a fazer uma leitura negativa desse fenômeno, associando-o a emoções de tristeza, medo, insegurança, derrota ou fracasso. De fato, no estresse negativo ou distresse ocorre o predomínio de emoções destrutivas que comprometem o funcionamento mental. O indivíduo fica confuso e sem criatividade; suas reações musculares tornam-se descoordenadas e desarmônicas, o que pode gerar tremor ou tensão muscular, e o desprazer e a desmotivação predominam, o que aumenta a probabilidade de doenças, insegurança, depressão e até mesmo da morte (França & Rodrigues, 2007). Contudo, as reações ao estresse também podem ser positivas, como no caso do estresse associado a formas de sobrevivência e à motivação, que gera emoções relacionadas à conquista, ao prazer e à alegria. O coração dispara, a respiração fica ofegante, há um aumento da agilidade mental e ocorrem reações musculares harmoniosas e bem coordenadas, assim como sentimentos de vitalidade e autoconfiança (França & Rodrigues, 2007). Em síntese, o estresse excessivo é prejudicial à vida, mas as pessoas que desejam ser ativas, criativas e capazes de encarar desafios e suportar as pressões do dia a dia precisam de algum estresse no seu cotidiano (McEwen & Lasley, 2002). O conceito de estresse vem sendo, portanto, utilizado, de forma diferenciada, pelos estudiosos das diversas áreas do conhecimento que se dedicam às pesquisas científicas e acadêmicas sobre o assunto. No entanto, a revisão das várias definições que vêm sendo oferecidas para tal fenômeno revela que ele ainda não parece estar devidamente elucidado. De particular interesse para o presente trabalho é o estresse que costuma ser encontrado na população economicamente ativa e que decorre de fatores relacionados ao trabalho, tema a ser abordado no próximo capítulo.

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CAPÍTULO DOIS O ESTRESSE OCUPACIONAL Dando sequência à abordagem da temática do estresse, o presente capítulo irá abordar o estresse ocupacional. Nesse sentido, serão apresentadas algumas das conceituações que vêm sendo oferecidas para tal fenômeno, bem como os principais modelos teóricos utilizados para descrevê-lo. Além disso, serão discutidos os principais antecedentes e conseqüentes do estresse ocupacional.

2.1 Conceituando o estresse ocupacional De acordo com Cooper e cols. (2001), o estresse ocupacional ou laboral consiste em uma tensão que se instala no indivíduo em função de seu ambiente laboral, em um estado físico ou psicológico no qual a pessoa se sente desconfortável e com necessidade de agir de forma a restaurar seus padrões de conforto. Adotando a mesma linha de argumentação, Quick (2007) define o estresse laboral como um conjunto de reações físicas, psicológicas e comportamentais que ocorrem em razão das interações negativas entre empregado e empregador. Já na visão de Bartlett (1998), tal fenômeno decorre da maneira como o indivíduo percebe a relação de suas capacidades, habilidades e atributos com os aspectos de seu ambiente físico de trabalho. De modo semelhante, França e Rodrigues (2007) conceituam-no como um processo surgido em função do fato de as características de personalidade do indivíduo não se mostrarem suficientemente adequadas ao enfrentamento das exigências, desafios e pressões relacionadas ao trabalho.

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Para French e Kahn (1962, citados por Cooper & cols., 2001), o estresse laboral associa-se a um conjunto de reações psicológicas, físicas e comportamentais que surgem quando a pessoa se sente ameaçada, por entender que as exigências do trabalho são superiores à sua capacidade, ou seja, quando as demandas do trabalho são superiores à sua habilidade de cumpri-las. A mesma linha de raciocínio é utilizada por Karasek (1979), ao definir o estresse ocupacional como um conjunto de reações físicas, emocionais e sociais decorrentes dos tipos de relações estabelecidas entre o grau de demandas do trabalho e o tipo de controle exercido sobre o mesmo. Em síntese, os vários autores que vêm se dedicando ao estudo do estresse ocupacional tendem a concordar com o fato de que ele decorre principalmente do ambiente de trabalho percebido como negativo e da incapacidade do indivíduo em atender às excessivas demandas por ele provocadas. Nesse sentido, o conceito de estresse ocupacional acaba se mostrando muito próximo ao conceito de estresse, na medida em que a interação da pessoa com o ambiente, bem como mecanismos cognitivos e estratégias de cooping, encontram-se subjacentes a ambos os fenômenos. A única diferença reside, portanto, no fato de que o estresse laboral circunscreve-se a um fenômeno que se origina e se manifesta no contexto do trabalho.

2.2. Modelos teóricos sobre o estresse ocupacional Os estudiosos do estresse ocupacional têm desenvolvido diversos modelos para explicá-lo, tomando por base a teoria transacional de Lazarus e Folkman (1984). Dentre eles, cabe destacar o de Michigan (French & Kahn, 1962, citados por Jex, 1998), o de McGrath (1976, citado por Shupe & McGrath, 1998), o de Ajuste Pessoa-Ambiente (Edward, Caplan e Harrison, 2001), o de Demanda-Controle (Karasek, 1979) e o de

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Desequilíbrio entre Esforço e Recompensa (Siegrist, 1998), por serem os mais freqüentemente citados na literatura, razão pela qual serão abordados a seguir.

2.2.1 O Modelo de Michigan O modelo de Michigan é assim chamado por ter sido desenvolvido por French e Kahn (1962, citados por Jex, 1998), pesquisadores do Instituto de Pesquisa Social da Universidade de Michigan, e se utiliza dos conceitos de ambiente objetivo e ambiente psicológico ou subjetivo para explicar o estresse ocupacional (Figura 1). O ambiente objetivo se refere aos fatos, circunstâncias e acontecimentos reais ocorridos no contexto do trabalho. Já o ambiente subjetivo ou psicológico diz respeito à percepção positiva ou negativa desse ambiente objetivo.

CARACTERÍSTICAS PESSOAIS

Ambiente Objetivo

Ambiente Psicológico

Reação de Estresse

RELAÇÕES INTERPESSOAIS

Figura 1: Esquema do Modelo de Michigan de Estresse Ocupacional (Fonte: Figueiroa, Schufer, Muiños, Marro & Coria, 2001)

Doença física ou psicológica

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A percepção negativa do indivíduo sobre sua situação de trabalho irá dar início ao processo que culminará no estresse ocupacional. Essa percepção sofre influências não apenas da situação em si, mas também das características pessoais (a personalidade, as habilidades e os conhecimentos adquiridos pelo indivíduo ao longo de sua vida) e das relações interpessoais que ele mantém (com supervisores, colegas de trabalho, família, etc.), além de interferir diretamente nas reações que caracterizam o estresse ocupacional (Jex, 1998). Tais reações ao estresse podem ser de natureza física (taquicardia, sudorese, pressão alta, etc.), psicológica (tristeza, insatisfação, medo, etc.) ou comportamental (agressividade, uso de drogas, dificuldades de relacionamento interpessoal, etc.) (Jex, 1998). Por outro lado, elas podem também ocasionar o adoecimento, isto é, a instalação de um processo patológico no organismo, que altera as funções normais do corpo e provoca, em consequência, doenças físicas ou psicológicas. As críticas ao modelo de Michigan dirigem-se ao fato de seus autores não terem incorporado ao mesmo os aspectos não específicos ao ambiente real, como por exemplo, certas situações presentes na vida pessoal (morte de um familiar, doenças, as separações e até mesmo o desemprego, etc.), que podem atuar como mediadoras da percepção do indivíduo (Figueiroa, Schufer, Muiños, Marro & Coria, 2001). Além disso, eles não incluíram, também, no rol de reações ao estresse, os distúrbios fisiológicos e psicológicos que extrapolam o ambiente de trabalho (Cooper, 1998).

2.2.2 O Modelo de McGrath O modelo de McGrath (1976, citado por Shupe & McGrath, 1998) enfatiza o papel da cognição no surgimento do estresse ocupacional. Outrossim, que tal fenômeno caracteriza-se por um processo composto por uma sequência de eventos, que se

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encontra organizada em quatro diferentes estágios e processos decorrentes de situações estressantes, formando assim um ciclo fechado (Figura 2). O início deste ciclo ocorre a partir de demandas externas decorrentes de situações do ambiente de trabalho que por vezes são percebidas como estressoras, mediante um processo de avaliação cognitiva (Fase 1). Seis tipos de estressores são propostos: intrínsecos ao trabalho, baseados na tarefa, relacionados aos papéis desempenhados pelo indivíduo, relativos ao contexto do comportamento do indivíduo, provenientes do meio ambiente físico e social e referentes a características do próprio indivíduo (Melo, Gomes & Cruz, 1997). Em seguida, o indivíduo irá se engajar em um processo de decisão que culminará na seleção da resposta a ser adotada para fazer frente à situação estressora (Fase 2). Escolhida tal resposta, ele passa a agir, isto é, a emitir determinados tipos de comportamentos (Fase 3) destinados a solucionar a situação estressora, ou seja, a dar um desfecho à mesma (Fase 4) (Shupe & McGrath, 1998). Desfecho do Processo

SITUAÇÃO

COMPORTAMENTO

Processo de Avaliação Cognitiva

Processo Desempenho

SITUAÇÃO PERCEBIDA

Processo Decisório

SELEÇÃO DE RESPOSTA

SISTEMA FOCAL INTERNO

Figura 2: Esquema do Modelo McGrath (Fonte: Shupe & McGrath, 1998)

As críticas a este modelo apóiam-se no fato de ele não permitir uma real compreensão do processo de estresse ocupacional, em virtude de não contemplar os

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aspectos subjetivos que costumam estar presentes não apenas nas situações de trabalho, mas também em outras situações do cotidiano. Nesse sentido, a capacidade perceptiva e a autoconfiança do indivíduo não são contemplados, em que pese o fato de poderem interferir no medo do fracasso e, consequentemente, no nível de estresse (Melo & Cruz, 1997).

2.2.3 O Modelo de Ajuste Pessoa-Ambiente O presente modelo destaca a importância de se entender conjuntamente a pessoa e seu ambiente de trabalho, ao se estudar o estresse laboral. Um dos primeiros autores a formalizar essa teoria foi Harrison (1978, citado por Edward & cols., 1998), ao propor que a boa saúde mental é caracterizada pela menor discrepância possível entre a pessoa objetiva e o ambiente objetivo, bem como entre a pessoa subjetiva e o ambiente subjetivo (Figura 3). CONTATO COM A REALIDADE

Ambiente Objetivo Demandas Suprimentos

OBJETIVO Ajuste pessoa - ambiente

Pessoa Objetiva Habilidades Necessidades

Enfrentamento

Defesa

EXATIDÃO DE AUTO-AVALIAÇÃO

Ambiente Subjetivo Demandas Suprimentos

SUBJETIVO Ajuste pessoa - ambiente

E S T R E S S E

Pessoa Subjetiva Habilidades Necessidades

Figura 3: Esquema do Modelo de Ajuste Pessoa-Ambiente (Fonte: Edward & cols., 1998)

D O E N Ç A

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O ambiente objetivo inclui as situações e eventos do ambiente físico e social que ocorrem independentemente da percepção do indivíduo, enquanto o ambiente subjetivo refere-se às situações e eventos desse ambiente, segundo a percepção do indivíduo. Já a pessoa objetiva diz respeito às habilidades e talentos que a pessoa possui atualmente, enquanto a pessoa subjetiva associa-se à percepção que a pessoa possui sobre si mesma, isto é, à sua auto-identificação ou autopercepção. Desta forma, as distinções entre a pessoa e ambiente objetivos, assim como entre a pessoa e o ambiente subjetivos, decorrem de distorções na percepção do indivíduo, motivadas por processos cognitivos, pela repressão, pela negação ou por limites no acesso às informações sobre a estrutura objetiva (Edward & cols., 1998). Tais distinções serão assim responsáveis por quatro tipos de desajuste, quais sejam: entre a pessoa objetiva e o ambiente objetivo, entre a pessoa subjetiva e o ambiente subjetivo, entre o ambiente subjetivo e o ambiente objetivo, que se relaciona ao contato com a realidade, e entre a pessoa objetiva e a pessoa subjetiva, que diz respeito à exatidão da autoavaliação. De acordo com Harrison (1978, citado por Edwards & cols., 1998), o estresse ocorre quando as demandas e suprimentos do ambiente (objetivo ou subjetivo) não se integram às habilidades e as necessidades da pessoa (objetiva ou subjetiva), levando ao surgimento de respostas psicológicas e fisiológicas de enfrentamento (no caso do desajuste pessoa e ambiente objetivo) ou de defesa (no caso do desajuste pessoa e ambiente subjetivo). O refinamento subseqüente da teoria apontou, no entanto, que o desajuste entre pessoa-ambiente objetivo possuía pouca influência na saúde mental, com o contrário ocorrendo, porém, quando o desajuste era entre a pessoa e o ambiente subjetivo (Caplan, 1983, citado por Edward & cols, 1998). Em outras palavras, os proponentes da referida teoria passaram a defender que o desajuste pessoa-ambiente

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subjetivo é potencialmente estressor, na medida em que anula o aspecto objetivo da situação e leva o indivíduo a um estado de ansiedade. Conseqüentemente, é o ajuste pessoa-ambiente subjetivo que promove a saúde mental e o bem-estar no trabalho.

2.2.4 O Modelo de Demanda -Controle Um dos modelos mais utilizados como referencial nas pesquisas sobre estresse laboral é o de demanda-controle, proposto por Karasek (1979), com base nas pesquisas de Gardell (1977, citado por Araújo, Graça & Araújo, 2003) sobre a organização psicossocial do trabalho (aspectos ligados à carga de trabalho, autonomia, participação, etc.) e de Kohn e Schooler (1973, citados por Araújo & cols., 2003), sobre as características do trabalho (complexidade, rotina, supervisão, etc.). Segundo Karasek (1979), as demandas psicológicas do trabalho e o controle ou latitude de decisão constituem os dois principais deflagradores do estresse ocupacional. A demanda psicológica associa-se ao nível de exigência que o trabalhador enfrenta em seu contexto de trabalho, como, por exemplo, a pressão de terceiros, o nível de concentração que lhe é exigido, as freqüentes interrupções ocorridas durante a execução do trabalho, a necessidade de realizar atividades que dependem de terceiros, etc. Já o controle ou latitude de decisão envolve a extensão com que o indivíduo faz uso de suas habilidades ao realizar as tarefas que lhe cabem, bem como seu grau de autoridade decisória, isto é, o quanto ele tem liberdade individual para tomar decisões e influenciar os resultados e grupos de trabalho (Karasek & Theorell, 1990). O controle ou latitude de decisão pode ser de natureza comportamental ou cognitiva. O controle comportamental refere-se aos limites de atuação do indivíduo na produção dos resultados desejados e às oportunidades de escolher, dentre várias opções de tarefas, ações e resultados, as que devem ser adotadas. Já o controle cognitivo

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sinaliza a extensão em que o indivíduo possui habilidade ou vontade de interpretar estímulos estressantes (Cooper & cols., 2001). Quando o indivíduo possui um desses tipos de controle, ele acredita ter poder sobre o aparecimento de um estressor, isto é, de ser capaz de identificá-lo ou prever seu aparecimento, o que acaba por ter efeitos benéficos na sua saúde psicológica, em função de reduzir seus estados de ansiedade e depressão. Em outras palavras, o controle pode produzir efeitos sobre a demanda, alterando, assim, seus impactos na saúde física e mental do indivíduo (Karasek & Theorell, 1990). Avançando em suas formulações, Karasek (1979) destaca que a demanda psicológica e o controle caracterizam-se como dimensões independentes, com ambas variando de níveis baixos a altos, o que gera quatro possibilidades de experiências psicossociais no trabalho. Tais experiências podem ser representadas em um gráfico no qual a demanda psicológica localiza-se no eixo das abscissas, e o controle, no eixo das ordenadas, o que permite a formação de quatro quadrantes (Karasek, 1979) (Figura 4).

Figura 4: Esquema do modelo de Demanda - Controle (Fonte: Karasek, 1979) Diagonal A – riscos de adoecimento psíquico e físico. Diagonal B – motivação para desenvolver novos tipos de comportamento

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No quadrante inferior direito situa-se o trabalho de altas exigências ou de alto estresse, em que há alta demanda e baixo controle, o que em geral suscita reações psicológicas como a fadiga, ansiedade, depressão, etc. Tais reações costumam se manifestar mais freqüentemente em atividades que não prevêem a existência de interrupções capazes de minimizar a tensão por elas provocadas. No quadrante superior direito está alocado o trabalho ativo, que se associa a uma alta demanda e a um alto controle. Por essa razão, esse tipo de trabalho pode fazer com que o indivíduo se torne motivado a desenvolver novos tipos de comportamentos, ainda que isso possa levá-lo também à exaustão emocional. Assim, por exemplo, os cargos gerenciais possuem alto nível de exigência, além de que seus ocupantes necessitam usar com freqüência habilidades complexas e possuir grande poder de controle ou decisão e autonomia em relação às demandas estabelecidas, o que em geral lhes torna mais motivados. O trabalho passivo encontra-se no quadrante inferior esquerdo, sendo caracterizado por baixa demanda e baixo controle. São exemplos do mesmo, as atividades de secretária e recepcionista que se encontram associadas a níveis baixos de decisão e podem acabar levando à diminuição da capacidade produtiva do indivíduo e, consequentemente, à desmotivação ou à perda de habilidades previamente adquiridas. O quadrante superior esquerdo, por fim, relaciona-se ao trabalho de baixas exigências ou de baixo estresse, em que há baixa demanda e alto controle. Embora permitam o relaxamento, as atividades compreendidas por essa modalidade de trabalho são em geral desinteressantes e configuram experiências que podem gerar algum risco de doença devido ao estresse psicológico, já que o controle a ele associado não costuma ser utilizado (Karasek & Theorell,1990). Em síntese, os trabalhos de alta exigência e de baixa exigência são os que oferecem maior risco de doenças físicas e psicológicas,

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enquanto o trabalho ativo e o passivo podem levar, respectivamente, ao desenvolvimento de novos comportamentos ou à desmotivação (Karasek & Theorell, 1990). Percebendo que, muitas vezes, a latitude de decisão dependia dos diversos relacionamentos

(com

colegas,

supervisores

e

clientes)

que

os

indivíduos

frequentemente estabelecem em seu local de trabalho, Karasek e Theorell (1990) propuseram a expansão do modelo original. Nesse sentido, irão agregar ao mesmo uma nova dimensão, qual seja o suporte social, que envolve as relações sócio-afetivas, isto é, as relações expressas no ambiente de trabalho e que se mostram importantes para a manutenção da saúde e bem estar, bem como à aquisição de novos conhecimentos (Henry & Stephens, 1977, citados por Karasek & Theorell, 1990). Dois tipos de suporte social são preconizados por Karasek e Theorell (1990): suporte sócio-emocional, que envolve a integração social e emocional, assim como a confiança entre os colegas de trabalho, supervisores e demais pessoas, e suporte sócioinstrumental, que se refere à assistência recebida dos colegas e supervisores, seja na realização das tarefas, seja no fornecimento de recursos para o desempenho das mesmas. A partir da inclusão do suporte social, o modelo passou então a ser designado de demanda - controle – suporte. Postula-se, assim, que a sobrecarga e as exigências ou pressões psicológicas, combinadas com o baixo poder decisório sobre o trabalho e a falta de suporte social, podem se tornar mediadores de desequilíbrios na saúde física e mental, levando, consequentemente, a reações de estresse. Cumpre ressaltar, porém, que nem todas as exigências mostram-se capazes de afetar o estado físico e emocional do indivíduo, mas tão somente aquelas que forem por ele percebidas como psicologicamente pesadas, isto é, situações em que a alta demanda,

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o baixo controle e a ausência de suporte social interagem de modo a trazer conseqüências prejudiciais ao desenvolvimento do trabalho (Karasek & Theorell, 1990). Em síntese, na perspectiva do modelo de demanda-controle-suporte, o trabalho saudável é aquele que adequa a demanda, o controle e o suporte social, de forma a minimizar os efeitos das condições de altas ou baixas exigências no trabalho que envolvem riscos de adoecimento.

2.2.5 O Modelo de Desequilíbrio Esforço-Recompensa Na tentativa de explicar o estresse em uma variedade de cenários ocupacionais, Siegrist (1998) desenvolveu o modelo de Desequilíbrio Esforço-Recompensa. De acordo com o referido modelo, o alto esforço despendido e a baixa recompensa implicam um desequilíbrio que leva ao estresse ocupacional (Figura 5).

INTRÍNSECAS

SUPER DEDICAÇÃO Necessidade de controle

Pessoal

EXTRÍNSECAS ESFORÇO

RECOMPENSAS

Situacional Demandas / Obrigações

Salário / Estima Segurança, Oportunidade

Figura 5: Esquema do Modelo Desequilíbrio Esforço – Recompensa (Fonte: Guimarães & Grubits, 2004)

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O alto esforço no trabalho pode decorrer de fontes extrínsecas (exigências do trabalho propriamente ditas) e/ou intrínsecas (motivações individuais do trabalhador diante de uma situação de exigência). Em ambos os casos, o fato de o indivíduo se dedicar ao trabalho leva-o a esperar feedbacks associados a algum tipo de recompensa (Guimarães & Grubits, 2004), por considerar que seus esforços pessoais estão se mostrando capazes de superar as exigências estabelecidas, isto é, que ele está apresentando “superdedicação”. Tais recompensas podem ser de natureza subjetiva, ou seja, o indivíduo precisa se sentir recompensado ou valorizado, como forma de manter sua auto-estima, ou ainda de natureza social, quando o status, o dinheiro ou as oportunidades de carreira constituem aspectos relevantes para o trabalhador. Quanto maior a discrepância entre os esforços empenhados e as recompensas recebidas no trabalho (isto é, quando há alto esforço e baixa recompensa), maior será a tensão do indivíduo e, consequentemente, maior o estresse no trabalho, manifesto em reações físicas e emocionais (Siegrist, 1999, citado por Guimarães & Grubits, 2004). Nesse sentido, mudanças ocupacionais forçadas, a mobilidade descendente no cargo, a ausência de perspectivas de promoção e os empregos pouco exigentes e instáveis podem desencadear reações de tensão. Tal desequilíbrio entre esforço e recompensa costuma ser mais comum entre os trabalhadores de nível operacional, os trabalhadores industriais, os prestadores de serviços e os trabalhadores que desenvolvem atividades que demandam contato direto com o cliente. Em contrapartida, as situações nas quais há reciprocidade entre esforço e recompensa e as que tendem a proporcionar mudanças na vida social não costumam gerar efeitos adversos à saúde, já que, nesses casos, o trabalho assume um papel de auto-regulamentação emocional e motivacional. Em síntese, o modelo em questão concentra-se nas demandas físicas e psicológicas, ou seja, na carga de trabalho total e

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nas ameaças ou violações de recompensas legítimas que ferem o princípio da reciprocidade social (Karasek & Theorell, 1990).

2.3 Antecedentes e conseqüentes do estresse ocupacional Um dos modelos mais referenciados na literatura para a abordagem dos antecedentes e conseqüentes do estresse ocupacional é o modelo de Cooper & cols. (2001). Tal modelo será, portanto, o adotado no presente trabalho para a abordagem de tal temática. De acordo com esses autores, as fontes de estresse no trabalho ou estressores podem ser alocadas em seis categorias: fatores intrínsecos ao trabalho, papéis organizacionais, relacionamento no trabalho, desenvolvimento da carreira, fatores organizacionais e interface trabalho-família (Figura 6).

Fontes de Estresse no Trabalho

Reações do Estresse FISIOLÓGICA

Fatores intrínsecos ao trabalho Papéis organizacionais Relacionamento no trabalho

PESSOA

Desenvolvimento de carreira

PSICOLÓGICA COMPORTAMENTAL

Fatores organizacionais Interface trabalho-família

Figura 6: Esquema de fontes e reações de estresse no trabalho (Fonte: Cooper & cols., 2001)

Os fatores intrínsecos ao trabalho associam-se ao conteúdo do trabalho em si e ao contexto no qual ele se desenvolve, envolvendo, assim, as demandas físicas e ambientais a que o indivíduo é submetido, a sobrecarga de trabalho e o grau de controle sobre as tarefas (Ferreira & Assmar, 2008). No que tange às demandas físicas e

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ambientais, o barulho, as vibrações, a temperatura e a exposição a riscos constituem alguns dos exemplos desse tipo de estressor que podem alterar o funcionamento neurológico e psicológico do indivíduo (Cooper & cols., 2001). A sobrecarga de trabalho, denominada por Karasek (1979) de estressores psicológicos, diz respeito às demandas que são colocadas ao empregado em função da frequência e intensidade de trabalho. Quando tais demandas excedem a capacidade do indivíduo executar certo número de tarefas, em determinado período de tempo, considera-se que esta sobrecarga é quantitativa. Já a sobrecarga mental ou qualitativa associa-se à superação dos limites de seus conhecimentos, habilidades ou aptidões (Ferreira & Assmar, 2008). Na atualidade, as principais demandas enfrentadas pelo trabalhador costumam estar associadas à expansão tecnológica e à velocidade das informações que vêm implicando no aumento do volume de trabalho, em maiores exigências quanto às habilidades a serem usadas e na maior pressão em relação ao tempo de realização das tarefas e à necessidade de bons resultados em termos de produtividade. Todas essas demandas afetam a saúde do empregado e costumam ocasionar exaustão, queda de desempenho, insatisfação no trabalho, depressão, angústia e ansiedade (Karasek,1979; Ferreira & Assmar, 2008). O grau de controle ou latitude de decisão sobre o próprio trabalho diz respeito à autonomia do trabalhador para tomar decisões relacionadas a seu trabalho e ao uso de suas habilidades na execução do mesmo. Trabalhadores com maior grau de controle sobre o trabalho, isto é, que possuem maior latitude de decisão e influência sobre o próprio trabalho, podem fazer melhor uso de suas habilidades e aprender coisas novas no desenvolvimento de suas atividades laborais. Desse modo, mostram-se mais propensos a minimizar os impactos das demandas prejudiciais à saúde e,

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consequentemente, a se sentirem mais satisfeitos no trabalho (Karasek & Theorell, 1990). Um segundo grupo de estressores preconizado por Cooper e cols. (2001) associa-se aos papéis organizacionais, que dizem respeito aos comportamentos esperados em uma determinada função. Desse modo, quando o indivíduo não tem clareza sobre seu papel, quando há demandas conflituosas ou competitivas em relação a este papel, quando o número de papéis que ele precisa exercer é excessivo ou quando eles implicam em alta responsabilidade sobre tarefas ou pessoas (em especial se esta responsabilidade estiver associada à vida ou a segurança de outras pessoas), ele costuma vivenciar o estresse (Ferreira & Assmar, 2008). O relacionamento no trabalho configura-se como um estressor quando é pautado na competitividade, falta de confiança, comunicação truncada, hostilidade e conflitos entre as pessoas, isto é, quando resulta na falta de suporte social (Ferreira & Assmar, 2008). As pessoas necessitam sentir-se valorizadas e aceitas por colegas, superiores e subordinados, ou seja, integradas ao contexto social do trabalho, em função de as redes sociais proverem-nas com experiências positivas que aumentam sua auto-estima e bemestar. Se isso não ocorre, elas costumam vivenciar o estresse. Em outras palavras, quando as pessoas não recebem suporte social adequado no ambiente de trabalho, acabam por apresentar uma variedade de sintomas físicos e psicológicos do estresse (Ferreira & Assmar, 2008). Assim, por exemplo, os comportamentos imprudentes e desatenciosos por parte de um supervisor, bem como as relações pouco amistosas entre colegas, podem contribuir significativamente para o surgimento do estresse laboral (Cooper & cols., 2001). De acordo com Ferreira e Assmar (2008), o suporte social pode se manifestar de quatro diferentes formas, quais sejam: emocional, instrumental, informacional e

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avaliativo. O suporte emocional consiste no fornecimento de ajuda para que o outro lide de forma mais adequada com suas emoções negativas. Já o suporte instrumental manifesta-se na colaboração de colegas que contribuem para a melhoria do desempenho do indivíduo. O suporte informacional diz respeito aos conselhos, sugestões e orientações fornecidas ao empregado por seus colegas de trabalho. O suporte avaliativo, por fim, caracteriza-se pelo fornecimento de feedback destinado a melhorar a autoestima do colega ou do subordinado. Outro fator que pode provocar o estresse laboral é o desenvolvimento de carreira. Assim é que as situações nas quais o profissional se sente inseguro em relação ao cargo, profissão ou função que ocupa, por entender que não tem possibilidades de progresso ou desenvolvimento na carreira, costumam suscitar reações de estresse. Nesse sentido, os processos de fusão e incorporação, os avanços tecnológicos, a vivência da possibilidade de desemprego e o trabalho sem carteira assinada constituem situações que costumam impactar negativamente a saúde física e mental do indivíduo (Ferreira & Assmar, 2008). Características organizacionais como a estrutura hierárquica, o clima organizacional, a cultura e a política da empresa também podem contribuir para o estresse. Assim, por exemplo, a tentativa de alguns funcionários promoverem seus próprios interesses, bem como o clima de cinismo e desconfiança prevalente em uma organização, costumam levar ao aumento da tensão do empregado (Cooper & cols., 2001). A sexta e última fonte de estresse abordada no modelo de Cooper e cols. (2001) é a interface trabalho-família, que se encontra associada aos vários papéis que o indivíduo acumula dentro e fora do trabalho, já que as mudanças na estrutura da família ou do trabalho tendem a se influenciar mutuamente. Os principais conflitos dessa

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natureza associam-se a exigências de tempo, a comportamentos incompatíveis e ao próprio estresse (Ferreira & Assmar, 2008). No primeiro caso, o tempo gasto no desempenho dos papéis do trabalho acaba por impedir o desempenho adequado dos papéis familiares ou vice-versa. O conflito com base em comportamentos diz respeito à incompatibilidade entre as atitudes, valores e normas exigidos pelos dois papéis, como no caso de um trabalhador que precisa ser agressivo e competitivo no trabalho e amoroso e colaborador em casa. Por fim, o conflito com base no estresse caracteriza-se pela transferência de reações provenientes do contexto laboral para o ambiente familiar, como, por exemplo, nos casos em que uma briga ou insegurança provocada pelo trabalho acaba por interferir no relacionamento familiar (Cooper & cols., 2001). No que diz respeito às reações ao estresse ocupacional, Cooper e cols. (2001) enfatizam que elas podem ser de natureza fisiológica, psicológica e comportamental. Entre as reações de ordem fisiológica encontram-se os problemas psicossomáticos associados a dores de cabeça, náuseas, vômitos, dores lombares, dificuldades no sistema digestivo, dores musculares, baixa imunológica, hipertensão, doenças cardiovasculares e dificuldades de respiração e de sono, entre outras (Favassa, Armiliato & Kalinini, 2005; Karasek, 1979). As reações psicológicas ao estresse costumam se manifestar no âmbito cognitivo e emocional. O comprometimento da atenção, da memória, da rapidez de resposta e da capacidade de organização e planejamento, entre outros aspectos, são exemplos de reações cognitivas. Já as reações psicológicas de ordem emocional relacionam-se aos sentimentos ou emoções provocados pela tensão psicológica, tais como a ansiedade, a depressão, o pânico e as dores imaginárias que interferem na saúde e bem-estar do indivíduo (Favassa & cols., 2005).

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No contexto laboral, duas reações psicológicas ao estresse estudadas com freqüência têm sido a insatisfação no trabalho e a depressão. A insatisfação no trabalho consiste em um construto subjetivo caracterizado por sentimentos negativos em relação ao trabalho, que podem ser provocados por situações geradoras de estresse (Karasek, 1979). Já a depressão decorrente do estresse laboral pode ser identificada pela redução da capacidade de resolver problemas ou enfrentar desafios no trabalho, pela desmotivação, pela tristeza e pelo sentimento de desamparo que quase sempre encontram-se associados à diminuição da produtividade (Karasek, 1979). Atendo-se por fim às reações comportamentais ao estresse, França e Rodrigues (2007) afirmam que elas passam não apenas pela dificuldade de expressão verbal, como também pela diminuição do entusiasmo na realização das atividades cotidianas. Assim é que, no caso do estresse laboral, os índices de atrasos e faltas com base em desculpas relacionadas a doenças reais ou imaginárias costumam aumentar, bem como o uso de álcool, medicamentos, cafeína, nicotina e drogas ilícitas que, em geral, acabam por comprometer o desempenho no trabalho (Cooper & cols. 2001; Karasek & Theorell, 1990). O estresse ocupacional constitui-se, portanto, em um processo dinâmico, provocado por um conjunto de estressores presentes no contexto do trabalho que costumam desencadear uma série de reações no indivíduo. Em outras palavras, quando o empregado percebe que necessita realizar algum tipo de adaptação física, psicológica ou comportamental a seu ambiente laboral, de modo a atender às demandas por ele provocadas, o estresse no trabalho começa a se instalar. Caso o indivíduo consiga superar as demandas que lhe são impostas, tal processo acaba por finalizar sem provocar sérios prejuízos à sua saúde física e emocional. No entanto, quando essa adaptação não se mostra bem sucedida, as reações ao estresse tendem a se prolongar e a

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comprometer não apenas a saúde, o bem-estar e a vida pessoal dos empregados, mas também seu entorno social e a organização como um todo. O presente trabalho tem como foco o estresse em uma categoria ocupacional específica, qual seja a dos advogados. Desse modo, o próximo capítulo irá se deter mais especificamente nas características dessa profissão, assim como nos estressores e reações que costumam ser encontrados com maior freqüência nesse grupo de trabalhadores, segundo os estudos empíricos que vêm sendo desenvolvidos nessa área.

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CAPÍTULO TRÊS O ESTRESSE EM ADVOGADOS: ESTUDOS EMPÍRICOS

O presente capítulo realiza inicialmente uma contextualização da profissão do advogado, no que tange a suas funções, características e responsabilidades. Em seguida, procede a uma revisão dos estudos nacionais e internacionais voltados à análise do estresse em advogados.

3.1 Caracterizando a profissão do advogado e o estresse nesses profissionais A advocacia nasceu da necessidade de uma pessoa defender a outra da injustiça, da violência e da fraude, por meio da razão e da palavra. O advogado é, portanto, um profissional indispensável à justiça, que tem como responsabilidade patrocinar e pleitear os direitos e interesses de terceiros, em juízo ou fora dele. Conflitos conjugais; desentendimentos dos pais com os filhos ou a respeito destes; desentendimentos entre irmãos e parentes consangüíneos e questões relacionadas à posse, exploração, cultivo, aquisição, perda ou restrição de propriedade e tributação de bens, rendas e incentivos são alguns dos tipos de ações propostas aos advogados, por seus clientes (Paulo Filho, 2005). O advogado costuma também atuar como consultor, ao fornecer orientações preventivas destinadas a evitar demandas judiciais futuras (Elwork, 2007). Os advogados são, assim, chamados nos momentos mais difíceis e conflituosos, em função de trabalharem principalmente com os dramas e os sofrimentos humanos motivados por razões econômicas e sociais (Brun, 1988). Nesse sentido, sua função é eminentemente social, na medida em que contribui para o avanço das lutas sociais e consolidação das conquistas coletivas. Consequentemente, a prática da advocacia tem

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implicações não apenas para a sua profissão, mas também para as políticas públicas e para a sociedade em geral (Daicoff, 1999). Inicialmente, a oratória constituía-se no principal instrumento de trabalho do advogado, já que os trâmites processuais desenrolavam-se oralmente, fazendo com que o domínio dos gestos, da voz e do sistema nervoso fossem características essenciais à profissão. Nessa época, a parte escrita dos processos ficava a cargo dos dicógrafos ou logógrafos responsáveis por escrever os discursos efetivados nas tribunas ou praças públicas. Atualmente, porém, ambas as funções, isto é, falar e escrever são qualidades essenciais ao exercício da advocacia (Paulo Filho, 2005). Outras características também fundamentais ao advogado, segundo Paulo Filho (2005), são a honestidade, humildade, lealdade, magnanimidade, paciência, descrição, companheirismo e coragem. A essa lista, Chaves (2007) acrescenta a capacidade de argumentação, a penetração psicológica, a inteligência, a prudência, a boa memória e o raciocínio lógico, além de habilidades pessoais relativas ao bom relacionamento e à posse de valores humanos e morais. Uma parcela considerável dos advogados costuma atuar como autônomo e, em consequência, não precisa obedecer a ninguém, a não ser à sua própria consciência, já que nessa modalidade de atuação não existem graus ou níveis de hierarquia ou subordinação, embora a consideração recíproca entre advogados e magistrados esteja prevista no Estatuto da Advocacia. No entanto, muitas vezes o cliente passa a ser um patrão que determina o tempo de trabalho do advogado, mediante parâmetros contratuais previamente acordados (Catão & Melo Sobrinho, 1982). Por ser em geral um profissional liberal, ele não dispõe dos benefícios trabalhistas recebidos pelos profissionais com vínculo empregatício, assemelhando-se, portanto, a um trabalhador sem carteira assinada, o que faz com que nos períodos de

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recessão ou de aceleração da atividade econômica, ocorram diferenças significativas em seus ganhos e oportunidades de trabalho (Cruz, 2005). Assim é que, um estudo da Universidade Jonhs Hopkins, realizado com 104 ocupações, observou que a incidência de depressão motivada por fatores sócio-econômicos entre advogados era quatro vezes maior que em outros profissionais (Daicoff, 2008). Apesar de atuar principalmente como um profissional liberal, o advogado, mesmo assim, ainda se vê, com certa freqüência, cerceado em seus limites de atuação, em função dos resultados de seu trabalho dependerem do judiciário. Em outras palavras, seu trabalho é concretizado por terceiros no âmbito do contraditório. Em consequência, ele por vezes é considerado um mau profissional, apesar de nem sempre ser o responsável pela morosidade da justiça (Paulo Filho, 2005). Outra característica da profissão é o fato de que nela não costuma haver honrarias ou promoções por antiguidade e merecimento. Além disso, nem mesmo a experiência e a antiguidade podem poupar o advogado da derrota em juízo para um advogado mais novo e inexperiente. Cumpre ressaltar, ainda, o fato de o advogado em certas ocasiões sentirse autor ou réu das ações propostas e não simplesmente representante do caso em questão (Paulo Filho, 2005). Em síntese, a profissão de advogado costuma ser exaltada por alguns e desprezada por outros, além de seus ocupantes estarem frequentemente sujeitos à incompreensão e ingratidão de clientes que se sentem perseguidos, injustiçados, extorquidos ou vilipendiados, a depender dos resultados das sentenças (Daicoff, 2008). Assim é que, fazem parte do dia a dia profissional dos advogados: a constante pressão de prazos e decisões; a crescente complexidade da legislação e dos procedimentos legais; a necessidade de estar constantemente atualizado quanto à jurisprudência, à doutrina e às leis; o alto nível de exigência dos clientes; a concorrência

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com os colegas; o sentimento negativo para com outros advogados; a oposição de outros advogados e juízes; as longas horas de trabalho; o afastamento da família devido ao trabalho; a atividade eminentemente intelectual; a constante convivência com conflitos, agressões e acusações; a necessidade de lidar com pessoas difíceis e as decepções decorrentes de processos acusatórios e contraditórios que promovem a agressão e a exigência de manter um perfil agressivo, analítico, crítico, racional e perfeccionista (Elwork, 2007). Eles convivem, ainda, com o fato de terem pouco ou nenhum tempo para realizar atividades físicas, manter hábitos de alimentação adequada, desenvolver atividades de lazer ou tirar férias (Allen, 1998). Tal contexto tem afetado sobremaneira a saúde mental dos advogados, levandoos a vivenciar níveis cada vez mais altos de estresse. Nesse sentido, para dar conta de toda a demanda a que costumam ser submetidos, eles têm sofrido problemas constantes de insônia, aumento da pressão arterial e anulação da vida pessoal/familiar (Brinton, 2009). Além disso, eles vêm recorrendo com freqüência ao uso do álcool e de outras drogas, para relaxar e esquecer os males que os afetam (Reichert, 2000), o que acaba por interferir em sua saúde física e emocional, inclusive no que diz respeito ao comprometimento de suas funções intelectuais (Elwork, 2007). Assim, por exemplo, Seligman (2009) salienta que os advogados possuem risco de depressão muito maior que a maioria da população em geral, em função principalmente das exigências e da baixa latitude de decisão que vivenciam em seu cotidiano. Corroborando tal asserção, Elwork (2007) enfatiza que mais de 70% dos advogados reclamam que o principal problema em suas vidas é o estresse excessivo com o qual são obrigados a conviver. De acordo com Daicoff (2008), o estresse em advogados tem gerado três problemas centrais: a falta de profissionalismo, evidenciada pelas frequentes queixas de que eles vêm se tornando cada vez mais competitivos, grosseiros, descorteses e rudes,

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reforçando assim o desprezo da opinião pública por sua profissão; os baixos níveis de satisfação pessoal e laboral e um grande sofrimento emocional, manifesto em sentimentos de depressão, angústia, ansiedade e hostilidade. Em síntese, as decepções constantes por verem seus esforços de argumentação, raciocínio, paixão e capricho de formular uma defesa serem desconsiderados ou menosprezados nas decisões judiciais, algumas vezes de forma desdenhosa, impactam negativamente a saúde e o bem-estar dos advogados, no que tange a seus aspectos comportamentais, psicológicos e emocionais (Daicoff, 2008; Paulo Filho, 2005; Seligman, 2009;). Na tentativa de elucidar o processo de estresse em advogados, Elwork (2007) propôs um modelo no qual considera que o estresse laboral em advogados está associado a estressores ambientais e a características individuais (Figura 7). Em relação aos estressores, o autor classifica-os em genéricos e específicos. Os genéricos associam-se à pressão do tempo, à sobrecarga de trabalho, à competitividade e ao fato de lidar com pessoas difíceis. Já os específicos referem-se ao conflito de papéis, ao ambiente contraditório no qual ele está envolvido e às dificuldades inerentes às áreas em que eles atuam (tributária, trabalhista, cível, criminal, etc.). No que diz respeito aos aspectos demográficos, são apontados a idade, o gênero e a etnia, enquanto nos traços de personalidade, Elwork (2007) inclui o perfeccionismo, a racionalidade e os valores pessoais. Complementando a abordagem anterior, Paulo Filho (2005) cita o autoritarismo, os pensamentos negativos e a necessidade de aprovação como características de personalidade que também podem eliciar o estresse na profissão de advogado. A essa lista, Daicoff (2008) acrescenta o materialismo e a motivação financeira associada à profissão.

47 Estressores Ambientais

Características Individuais

Genéricos Pressão do tempo Sobrecarga de trabalho Competitividade Lidar com pessoas difíceis

Personalidade Perfeccionismo Racionalidade Valores Pessoais Aspectos Demográficos Idade Gênero Etnia

Específicos Conflitos de papéis Ambiente contraditório Área de prática

Figura 7: Esquema do modelo de estresse em advogados (Fonte: Elwork, 2007)

O destaque que tais características assumem no contexto da advocacia talvez seja a razão pela qual o curso de Direito costuma fomentar o desenvolvimento de traços voltados a um excessivo controle das emoções, de modo a que elas não interfiram na análise dos direitos e deveres legais (Daicoff, 2004). Nesse sentido, estudos empíricos realizados com estudantes de direito evidenciam que, desde a faculdade, eles são preparados para se tornarem profissionais com excesso de confiança em seus pensamentos e com capacidades de raciocínio objetivo e dedução racional, bem como para tomar decisões com base no racional (ao invés de se concentrarem nas emoções ou nas consequências humanistas da decisão), o que também pode acabar gerando maior predisposição ao estresse laboral (Daicoff, 2008). Adicionalmente, os advogados que possuem perfil marcado pela competitividade e necessidade de realização, isto é, caracterizado por um “desejo insaciável para o sucesso”, em geral atrelado ao workaholism e ao perfeccionismo, costumam ser inicialmente recompensados pelo sucesso profissional e financeiro, obtendo, assim, realização, posição, dinheiro e prestígio. Ao longo do tempo, porém, estes benefícios frequentemente não mais os satisfazem e em geral também contribuem para o estresse na profissão (Elwork, 2007), conforme exposto na próxima seção.

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3.2 Estudos empíricos sobre o estresse em advogados A presente seção faz uma breve revisão de estudos empíricos internacionais e nacionais com foco no estresse em profissionais do meio jurídico, com especial atenção aos advogados. Assim é que, Benjamin, Darling e Sales (1990), com o objetivo de verificar a prevalência de depressão e de uso de álcool e cocaína entre advogados norteamericanos, realizaram uma pesquisa, por solicitação da Americam Bar Association, que contou com a participação de 1184 advogados experientes de Washington, estratificados de acordo com seu tempo de prática em 5 grupos: até 2 anos de experiência, de 2 a 5 anos de experiência, de 5 a 10 anos de experiência, de 10 a 20 anos de experiência e com mais de 20 anos de experiência. A coleta de dados efetivou-se por meio do BSI (Brief Symptom Inventary), que avalia a depressão, e do MAST (Michigan Alcoholism Screening Test- Revised), que avalia o uso abusivo ou dependente de álcool. O uso de cocaína foi avaliado por meio de perguntas especificamente formuladas para esse fim. A análise dos resultados evidenciou que: 19% da amostra apresentavam níveis elevados de depressão, em comparação à taxa de 3 a 9% apresentada pela população em geral dos países industrializados; 18% apresentavam problemas de abuso de álcool, em contraste com a taxa de 10% de prevalência de abuso de álcool entre adultos norte-americanos; 5% sofriam ao mesmo tempo de alcoolismo e depressão; menos de 1% encontrava-se acima do ponto de corte de abuso de cocaína, em contraste com os 3% da população adulta, e que 26% já havia feito uso da cocaína em algum momento de suas vidas, em comparação com 29% da população geral. Foi observada, ainda, uma diferença significativa no que tange ao abuso de álcool, com os advogados de 20 anos ou mais de prática apresentando um percentual de 25% de uso de álcool, em contraste com os 18% observados no grupo de 2 a 20 anos de prática. Concluiu-se, assim, que os advogados

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com maior tempo de prática pareciam ser mais suscetíveis a problemas relacionados ao abuso de álcool. Em estudo similar, Eaton, Anthony, Mandel e Garrison (1990) procuraram identificar, em um conjunto de 104 ocupações, aquelas nas quais prevaleciam a desordem depressiva. Para tanto, mensuraram a desordem depressiva maior em 3000 pessoas de diferentes profissões, por meio do Diagnóstic Interview Schedule (DIS/DSMIII). Os resultados revelaram que os trabalhadores de três profissões – advogado, professor e secretária – atingiram o critério do DIS/DSM-III para o diagnóstico de desordem depressiva, além de apresentarem prevalência significativamente maior da desordem depressiva maior, quando comparados aos demais trabalhadores. Os autores atribuíram tal resultado à discrepância entre as demandas da situação e a capacidade individual ou grupal para lidar com as mesmas confortavelmente, uma vez que a autonomia individual, o controle sobre o ambiente e a capacidade de planejar o próprio trabalho atuam como fatores preditores da depressão. Em outra pesquisa de natureza descritiva, Wallace (2002) explorou as demandas da vida pessoal, familiar e profissional de 121 advogados canadenses, bem como as estratégias por eles utilizadas para lidar com tais demandas. A coleta de dados compreendeu entrevistas por telefone contendo perguntas abertas e múltipla escolha. A análise dos dados revelou que os participantes colocavam sua atividade profissional como primeira prioridade durante todo o tempo, razão pela qual costumavam trabalhar em média 50 horas semanais, o que em geral envolvia as noites e finais de semana. Tal sobrecarga, em sua opinião, decorria da necessidade de responder às demandas dos clientes e às expectativas profissionais e financeiras, o que se constituía em uma das principais fontes de estresse em suas vidas, por lhes deixar insatisfeitos com o fato de tal situação não lhes permitir despender tempo suficiente com o lazer e a família. Para lidar

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com o estresse da profissão, as estratégias em geral utilizadas eram a busca de suporte social da família e amigos ou a prática de trabalho em casa. A despeito, porém, de tais depoimentos, a maioria dos entrevistados reportou estar em geral satisfeita com a carreira, além de manifestar o desejo de manter a situação atual de emprego. Com o propósito de investigar as relações do sofrimento psíquico e da insatisfação no trabalho com a ética entre advogados, Daicoff (2008), coletou dados com advogados atuantes em Columbus, Ohio, e em uma conferência de advogados em Lindborgh, Kansas. Os instrumentos utilizados foram o Brief Symptom Inventory (BSI), o Moral Orientation Scale (MOS), o Keirsey Temperament Sorter II, uma medida de satisfação com os ganhos financeiros, prática da profissão e carreira ao longo da vida e um questionário para levantamento de informações sócio-demográficas. Os resultados constataram que nem o sofrimento psíquico e nem a insatisfação no trabalho se correlacionaram à ética. Em contrapartida, confirmou-se que a angústia estava correlacionada com a insatisfação no trabalho. Um dos estudos preditivos internacionais localizados foi o de Beck, Sales e Benjamin (1996), que avaliaram a relação de variáveis demográficas individuais e psicossociais com o estresse e com problemas associados ao uso de álcool. A amostra foi composta por dois grupos de advogados que cursavam pós graduação nas cidades do Arizona (802 indivíduos) e de Washington (1184 indivíduos), os quais responderam a várias escalas de auto-relato. A análise dos resultados evidenciou que o estresse psicológico global foi predito por níveis elevados de raiva e de estresse percebido, e por níveis baixos de suporte social. Foi verificado ainda que os advogados homens e os de mais idade apresentavam maiores problemas relacionados ao uso de álcool. Um resultado adicional foi o de que uma percentagem de advogados bem acima do esperado

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na população normal reportou a vivência de sintomas de estresse e de problemas relacionados ao uso de álcool. Outro estudo preditivo é o de Wallace (1999), que investigou se o envolvimento no trabalho (motivação para o trabalho e horas de trabalho por semana), os estressores de papéis (sobrecarga e prática orientada pelo lucro e sucesso) e o contexto do trabalho (escritório de advocacia ou não e percentual de mulheres no local de trabalho) afetavam os conflitos trabalho x família com base no tempo (falta de tempo para família e amigos) e no estresse (dificuldades de relaxar quando fora do trabalho), bem como as diferenças de gênero nessas variáveis. A amostra foi composta por 512 advogados de ambos os sexos, de um total de 1300 profissionais ativos em uma cidade do Oeste do Canadá, que responderam à solicitação de colaboração com a pesquisa, preenchendo os instrumentos destinados a avaliar as variáveis do estudo. A análise dos resultados evidenciou que não foram observadas diferenças de gênero em relação à motivação para o trabalho e aos níveis de conflito trabalho x família com base no tempo. No entanto, os homens reportaram trabalhar um número significativamente maior de horas que as mulheres, enquanto estas últimas afirmaram vivenciar significativamente maior sobrecarga de trabalho, em comparação aos homens. Foi verificado, ainda, que a sobrecarga de trabalho foi o mais importante preditor positivo e significativo de ambos os conflitos trabalho-família. Já a prática orientada pelo lucro predisse positivamente apenas o conflito com base no tempo. Por fim, o trabalho em escritório de advocacia predisse positivamente ambos os tipos de conflitos, mas apenas entre as mulheres. No Brasil, Lipp e Tanganelli (2002) realizaram uma pesquisa com 75 magistrados da justiça do trabalho de ambos os sexos, com o objetivo de averiguar seus níveis de qualidade de vida, fontes de estresse e estratégias de enfrentamento, bem como as diferenças de gênero entre essas variáveis. A coleta de dados efetivou-se por meio de

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cinco inventários destinados a avaliar as variáveis compreendidas pelo estudo, incluindo o Inventário de Fontes de Stress em Juízes (IFSJ), especialmente elaborado para a pesquisa. A análise dos dados revelou que a profissão de juiz podia ser considerada altamente estressante, na medida em que 71% da amostra apresentaram sintomas de estresse (82% das mulheres e 56% dos homens), com 1,3% encontrando-se na fase de exaustão e somente 29% não apresentando sintomas de estresse. Foi verificado, ainda, que 80% dos avaliados apresentavam dificuldades quanto à sua qualidade de vida, em termos de saúde, relações afetivas e sociais e desempenho profissional, o que levou à conclusão de que a amostra encontrava-se bastante prejudicada em relação a esse aspecto. No que tange às estratégias de enfrentamento, 69% dos juízes alegaram que, para minimizar os impactos do estresse, buscavam conversar com o cônjuge ou com alguém a quem estivessem afetivamente ligados. Para investigar as fontes desencadeantes de estresse nos magistrados, Silva (2005) realizou pesquisa descritiva, conduzida por análise documental, junto a uma população de 930 magistrados do Tribunal de Justiça do estado de Minas Gerais (TJMG). Os dados foram coletados nos arquivos do TJMG, por meio de um questionário fechado, usado para obter informações sobre idade, estado civil, local de trabalho, tempo de afastamento do trabalho por licença médica nos dois últimos anos e número de profissionais que ingressaram na magistratura neste período. A análise dos dados obtidos revelou que as mudanças sociais, o avanço tecnológico e a globalização constituíram-se em fatores que contribuíam para o acúmulo de trabalho dos judicantes e podiam, assim, desencadear o estresse. Foi verificado, ainda, que a mobilidade, as promoções de carreira, as funções administrativas e o primeiro ano de exercício profissional eram situações vivenciadas como estressantes pelos Magistrados. Adicionalmente, o número

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de dias de afastamento do trabalho, devido a licenças médicas, sugeriu um alto grau de adoecimento na população pesquisada. Chaves (2007), no único estudo brasileiro de natureza preditiva conduzido com advogados, procurou investigar em que medida os valores humanos explicavam o bemestar subjetivo de 239 advogados (entre outros profissionais) da cidade de João Pessoa. A coleta de dados efetivou-se por meio de um questionário que possuía uma medida dos valores humanos e quatro diferentes medidas do bem-estar, além de ficha sóciodemográfica. A pesquisa concluiu que, entre os advogados, o valor normativo constituiuse no único preditor do bem-estar subjetivo, enquanto o valor existência bio-social apresentou relação direta com a vitalidade e inversa com a depressão. Em síntese, as pesquisas sobre o estresse em advogados têm sinalizado que diferentes fatores, presentes no ambiente de trabalho e no indivíduo, podem provocar o estresse nesses profissionais. Uma síntese de tais resultados será realizada no próximo capítulo, como forma de contextualizar as hipóteses da pesquisa.

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CAPÍTULO QUATRO MODELO DE PESQUISA, OBJETIVOS E HIPÓTESES DE PESQUISA

O estresse ocupacional vem ganhando destaque nas pesquisas científicas, especificamente na área organizacional, em função de se tratar de um fenômeno que pode trazer graves prejuízos físicos e psicológicos ao trabalhador, à organização e à sociedade em geral. Por essa razão, diferentes modelos têm sido desenvolvidos nos últimos anos para explicar tal fenômeno. Dentre eles, cabe destacar o modelo de demanda-controle-suporte de Karasek e Theorell (1990), que considera as demandas psicológicas do trabalho, a latitude de decisão ou grau de controle e o suporte social como os principais deflagradores do estresse ocupacional. Postula-se, assim, que a sobrecarga e as exigências ou pressões psicológicas, combinadas com o baixo poder decisório sobre o trabalho e a falta de suporte social, podem se tornar mediadores de desequilíbrios na saúde física e mental e provocar, assim, diversas reações ao estresse ocupacional. Tais reações podem ser de natureza fisiológica, psicológica e comportamental (Cooper & cols., 2001). No contexto do trabalho, porém, duas das reações psicológicas ao estresse estudadas com maior frequência têm sido a insatisfação no trabalho e a depressão. A insatisfação no trabalho consiste em um construto subjetivo, caracterizado por sentimentos negativos em relação ao trabalho, que podem ser provocados por situações geradoras de estresse (Karasek, 1979). Já a depressão decorrente do estresse laboral pode ser identificada pela redução da capacidade de resolver problemas ou enfrentar desafios no trabalho, pela desmotivação, pela tristeza e pelo sentimento de desamparo

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que quase sempre se encontram associados à diminuição da produtividade (Karasek & Theorell, 1990). Nesse sentido, alguns estudos empíricos têm apontado uma alta incidência de depressão e de uso de álcool entre advogados (Benjamin & cols, 1990; Eaton & cols. 1990). Outrossim, tem-se verificado que a sobrecarga de trabalho constitui-se em importante fonte de estresse em advogados (Wallace, 2002), contribuindo para predizer diversos tipos de conflito entre o trabalho e a família (Wallace, 1999). Outros estudos têm também revelado que o suporte social funciona como um fator de amortecimento ou inibição dos sintomas de estresse (Beck & cols., 1996). No entanto, os estudos internacionais com foco no estresse em advogados ainda são poucos (Daicoff, 2008), especialmente no que diz respeito ao impacto produzido por diferentes fatores do ambiente laboral nas manifestações do estresse. No Brasil, o tema nem parecer ter despertado, ainda, o interesse dos pesquisadores, já que no levantamento realizado em bases de dados nacionais, foi encontrado um único estudo nacional sobre o bem-estar em advogados (Chaves, 2007). Contudo, ele se deteve na influência de uma variável pessoal (valores) sobre o bem-estar subjetivo, e não nos efeitos do ambiente laboral sobre as reações ao estresse. Justificam-se, dessa forma, estudos adicionais sobre o estresse em advogados brasileiros, capazes de contribuir para o aprofundamento da compreensão acerca dos inúmeros fatores que levam à sua ocorrência. Fundamentando-se em tais considerações, o objetivo da presente dissertação foi investigar o poder preditivo de sete fontes de estresse (latitude de decisão, suporte social de colegas, demandas psicológicas do trabalho, demandas físicas do trabalho, relacionamento com os clientes, estressores inespecíficos, insegurança no trabalho) em três reações a tal fenômeno (depressão, insatisfação no trabalho e problemas psicossomáticos), em advogados.

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Para tanto, o modelo de demanda-controel-suporte de Karasek e Theorell (1990) foi adotado como estrutura de referência teórica. Tal escolha deu-se em virtude de os construtos de demandas psicológicas, latitude de decisão ou controle e suporte social preconizados pelo referido modelo terem sido considerados bastante apropriados ao estudo do estresse entre advogados, em função das características peculiares a essa profissão. A Figura 8 resume, assim, o modelo efetivamente adotado na pesquisa. Cumpre registrar que alguns dos estressores incluídos no mesmo, não constavam sob essa forma no modelo teórico original da pesquisa, mas emergiram após a realização das análises fatoriais conduzidas em um dos instrumentos de coleta de dados. INSATISFAÇÃO NO TRABALHO

LATITUDE DE DECISÃO DEMANDAS PSICOLÓGICAS DO TRABALHO

DEPRESSÃO

DEMANDAS FÍSICAS DO TRABALHO SUPORTE SOCIAL DE COLEGAS RELACIONAMENTO COM CLIENTES

PROBLEMAS PSICOSSOMÁTICOS

ESTRESSORES INESPECÍFICOS INSEGURANÇA NO TRABALHO

Figura 8: Modelo da pesquisa Apoiando-se então no modelo da pesquisa, nos pressupostos teóricos de Karasek e Theorell (1990) e nas evidências fornecidas pelos estudos empíricos aqui revisados, foram formuladas, as seguintes hipóteses: 1. Quanto maior a latitude de decisão e o suporte social e quanto melhor o relacionamento com o cliente, menor a insatisfação no trabalho.

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2. Quanto maiores as demandas psicológicas do trabalho, as demandas físicas do trabalho, os estressores inespecíficos e a insegurança no trabalho, maior a insatisfação no trabalho. 3. Quanto maior a latitude de decisão e o suporte social e quanto melhor o relacionamento com o cliente, menor a depressão. 4. Quanto maiores as demandas psicológicas do trabalho, as demandas físicas do trabalho, os estressores inespecíficos e a insegurança no trabalho, maior a depressão. 5. Quanto maior a latitude de decisão e o suporte social e quanto melhor o relacionamento com o cliente, menores os problemas psicossomáticos. 6. Quanto maiores as demandas psicológicas do trabalho, as demandas físicas do trabalho, os estressores inespecíficos e a insegurança no trabalho, maiores os problemas psicossomáticos.

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CAPÍTULO CINCO MÉTODO

O presente capítulo descreve o método utilizado na pesquisa, iniciando-se com a descrição dos participantes e passando, em seguida, para a caracterização dos instrumentos utilizados na coleta de dados. Por fim, detalha os procedimentos adotados na realização da pesquisa propriamente dita.

5.1 - Participantes Participaram desta pesquisa 702 advogados, sendo 53,7% do sexo masculino. Do total de participantes, a maioria situava-se nas faixas etárias de 20 a 30 anos (34,9%) e de 31 a 40 anos (31,3%), era casada (46,0%) e residia na região sudeste do país (84,3%). O tempo de profissão desses advogados situou-se principalmente nas faixas de 1 a 5 anos (45,8%) e de 6 a 10 anos (23,5%). Em relação ao tipo de vínculo profissional, grande parte era de advogados autônomos (64,2%). No que tange às áreas de atuação, foi observado que apenas 31,2% atuavam em somente uma área, com o restante atuando em mais de uma área simultaneamente. Dentre elas, as três mais citadas foram a área cível (32,5%), a de direito de família (18,3%) e a trabalhista (16,9%). A Tabela 1 resume os dados descritivos dos participantes do estudo.

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Tabela1: Dados descritivos dos participantes do estudo Variável Gênero Idade

Masculino Feminino

Frequência 377 325

Porcentagem 53,7 46,3

20 a 30 anos 245 34,9 31 a 40 anos 220 31,3 41 a 50 anos 124 17,7 51 a 60 anos 87 12,4 Mais de 60 anos 26 3,7 Estado civil Solteiro 244 34,8 Casado 323 46,0 Separado/divorciado 60 8,5 Viúvo 7 1,0 Outros 68 9,7 Região de Região sul 43 6,1 Residência Região sudeste 592 84,3 Região norte 7 1,0 Região nordeste 37 5,3 Região centro-oeste 23 3,3 Tempo de 1 a 5 anos 321 45,8 Profissão 6 a 10 anos 165 23,5 11 a 15 anos 69 9,8 16 a 20 anos 57 8,1 21 a 25 anos 41 5,8 26 a 30 anos 32 4,6 31 a 53 anos 17 2,4 Tipo de Autônomo 451 64,2 Vínculo Carteira assinada 41 5,8 Escritório de terceiros 128 18,3 Carteira assinada e também atua por conta própria 66 9,4 Outro 16 2,3 Quantidade de 1 área 229 32,5 áreas de 2 áreas 122 17,4 148 21,1 atuação 3 áreas 4 áreas 125 17,8 5 áreas 41 5,9 3,3 6 áreas 23 Mais de 6 áreas 14 2,0 Principais Cível 552 31,2 áreas de Trabalhista 299 16,9 atuação Criminal 117 6,6 informadas (*) Direito de Família 324 18,3 Tributária 88 4,9 Imobiliária 125 7,2 Administrativa 137 7,7 Comercial 125 7,2 (*) O total nessa variável excede o número de integrantes da amostra em função desta pergunta permitir mais de uma resposta.

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5.2 Instrumentos A coleta de dados foi realizada por meio do Job Content Questionaire (JCQ), desenvolvido por Karasek (1985). O referido instrumento é autoexplicativo e tem como objetivo mensurar as estruturas psicológicas e sociais das situações de trabalho, em especial as dimensões de latitude de decisão, demanda psicológica e suporte social, derivadas a partir do modelo de Demanda – Controle – Suporte, que se constituiu no referencial da presente pesquisa. Em seu formato padrão, o questionário compõe-se de 49 questões e é o mais recomendado pelo autor, tendo sido inclusive já validado no Brasil por Araújo e Karasek (2008). Este formato inclui sete escalas: utilização de habilidades, autoridade de decisão, demandas psicológicas do trabalho, demandas físicas do trabalho, insegurança no trabalho, suporte social do supervisor e suporte social de colegas. Posteriormente, porém, o autor desenvolveu escalas adicionais que ainda não foram validadas no exterior ou no Brasil. Considerando as especificidades da presente amostra, optou-se por excluir do instrumento de coleta de dados da presente pesquisa uma das escalas que compõe o formato padrão do questionário de Karasek (1985), qual seja a de suporte social de supervisor, em função de grande parte dos advogados não trabalhar sob supervisão de outra pessoa. Por outro lado, foram incluídas algumas das escalas adicionais posteriormente desenvolvidas por Karasek (1985). Em relação aos estressores, foi adicionada a escala de relacionamento com clientes. Desse modo, a parte do questionário associada às demandas das situações de trabalho (estressores) ficou composta de itens associados às seguintes sub-escalas: latitude de decisão, demandas psicológicas do trabalho, demandas físicas do trabalho, insegurança no trabalho, relacionamento com clientes, estressores inespecíficos e suporte social de colegas (Anexo A). Já no que tange às reações ao estresse, foram incluídas três das escalas

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adicionadas ao instrumento original padrão, as quais mensuravam a insatisfação no trabalho (Anexo B), a depressão (Anexo C) e problemas psicossomáticos (Anexo D). Tais inclusões, aliadas ao fato de as características da amostra anterior de validação do instrumento serem bem diferentes das características da atual amostra, implicou a necessidade de validação prévia de todas as escalas do estudo, antes que as mesmas pudessem ser adotadas na análise definitiva dos dados. Tais resultados serão apresentados no capítulo 6. O instrumento de coleta de dados contou ainda com perguntas destinadas à coleta de informações sócio-demográficas sobre os participantes (Anexo E). O instrumento possuía diferentes formas de respostas aos itens. Nesse sentido, os itens relacionados aos estressores eram respondidos em escalas de 4 pontos, variando de “discordo fortemente” (1) a “concordo fortemente” (4). Apenas um item relativo à insegurança no trabalho era respondido em escala de 4 pontos, também, porém variando de “muito improvável” (1) a “muito provável” (4). Já nos itens referentes à insatisfação com o trabalho, as respostas eram dadas em escalas de 3 pontos, variando de “muito insatisfeito” (1) a “muito satisfeito” (3), de “não” (1) a “recomendo” (3), de “com certeza escolheria” (1) a “definitivamente não” (3), de “muito provavelmente” (1) a “nenhuma probabilidade” (3) ou de “sim” (1) a “não” (3). Os itens da escala de depressão foram respondidos em escalas de 7 pontos, em cujos extremos havia um par de palavras opostas, relacionadas, respectivamente, a um “sentimento positivo” (1) e a um “sentimento negativo” (7) em relação à vida. Por fim, os itens referentes a problemas psicossomáticos eram respondidos em escalas de 4 pontos, variando de “frequentemente” (1) a “nunca” (4). Uma versão completa do instrumento de coleta de dados encontra-se no Anexo F.

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5.3 Procedimentos Em virtude de o JCQ não poder ser utilizado sem autorização prévia, foi necessário que a autora do presente trabalho entrasse inicialmente em contato com Robert Karasek, por meio do JCQ Center, que pertence à University of Massachusetts Lowell (UMASS). Tal procedimento permitiu a obtenção de um contrato de uso do instrumento (Anexo G), que requer o envio da planilha final de dados da pesquisa ao autor. Posteriormente, o projeto de pesquisa foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UNIVERSO (Anexo H). Para a efetivação da coleta de dados propriamente dita, utilizou-se uma ferramenta do Google Docs que permite a elaboração do questionário por meio eletrônico e favorece o acesso mais rápido ao mesmo em diferentes horários. Além disso, o uso desta ferramenta possibilita a redução de erros de digitação e economiza tempo no levantamento de dados, uma vez que estes são enviados diretamente para uma planilha em Excell, além de eliminar possíveis ausências de respostas, já que o programa não permite a falta de respostas a qualquer item. Em síntese, o questionário on-line apresenta a vantagem de não permitir ausência de respostas e de facilitar o acesso de um público maior a ele. Adotando tais procedimentos, foi criado o site para a pesquisa (www.pesquisaadvogados.blogspot.com), que entrou no ar em 01 de fevereiro de 2010. Ainda com a finalidade de obter uma amostragem maior, foram feitos contatos com a OAB/RJ, de modo a que a parceria com esta instituição favorecesse o acesso direto à pesquisa por advogados de diversas regiões do estado. Assim é que, em 20 de abril de 2010, a OAB/RJ, na seção de notícias de seu site (www.oab-rj.org.br), divulgou a pesquisa e orientou os advogados a acessarem o site da pesquisa (Anexo I ). Dias depois, a notícia foi colocada como banner na primeira página no site, o que

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permitiu que a pesquisa pudesse ser diretamente acessada pelo banner (Anexo J), que permaneceu no site da OAB/RJ até a data de 17 de maio de 2010. A divulgação no site da OAB/RJ fez com que a OAB/Federal também divulgasse em seu site (www.oab.org.br) uma notícia sobre o assunto (Anexo K), viabilizando, assim, maior participação de advogados de outros estados e regiões do país. Considerando o fato de que as notícias postadas no site da OAB/Federal ganham destaque em todas as regionais, a notícia sobre a pesquisa acabou sendo também divulgada nos sites das regionais dos estados da Bahia, Espírito Santo, Minas Gerais, São Paulo, Paraná e Goiás. Ela foi ainda divulgada em um site de divulgação de informações e jurisprudências (Anexo L), em um site sobre saúde e segurança do trabalhador (Anexo M), em um site sobre informações associadas a área jurídica (Anexo N) e em um artigo do secretário geral da Escola Superior de Advocacia do Pará (Anexo O). Ao clicar no link para a pesquisa postado no banner do site da OAB/RJ, ou acessar

diretamente

o

endereço

do

site

da

pesquisa

www.pesquisaadvogados.blogspot.com, o participante deparava-se com uma primeira tela em que obtinha informações referentes ao objetivo da pesquisa, à instituição em que ela estava sendo desenvolvida, à forma de preenchimento e ao pesquisador responsável e seu contato. Além disso, ele era informado que, ao responder a pesquisa, concordava com os dizeres do termo de consentimento livre (Anexo P), que também se encontrava postado no site. Em seguida, ele deveria clicar no link “participar da pesquisa”, situado do lado direito da tela (Anexo Q), para que a página do questionário propriamente dito se abrisse. Esta página permitia o acesso a todas as questões do questionário, mediante a utilização da barra de rolagem (Anexo R). Ao finalizar o preenchimento do

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questionário, o participante devia clicar no botão “enviar”. Neste momento, ele era informado, caso houvesse deixado alguma questão sem marcar, que deveria rever o questionário, de modo a identificar as partes sinalizadas em vermelho, que indicavam questões não respondidas (Anexo S). Ao responder a todas as questões, o envio do questionário efetivava-se imediatamente e o respondente recebia uma mensagem de agradecimento por sua participação (Anexo T).

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CAPÍTULO SEIS RESULTADOS Neste capítulo são trazidos os resultados do estudo, iniciando-se com a análise preliminar dos dados e passando-se, em seguida, à etapa de validação das escalas do JCQ incluídas no estudo. Posteriormente, são apresentadas as estatísticas descritivas, os coeficientes de precisão e as correlações das escalas finais que permaneceram na pesquisa. Na sequência, são analisados os pressupostos para a realização das análises de regressão múltipla linear hierárquica e os resultados daí decorrentes.

6.1 Análise preliminar dos dados Os dados obtidos foram inicialmente alocados em uma planilha de Excell, por meio do Google Docs. Posteriormente, eles foram inseridos em uma planilha do software SPSS, versão 15. Dando prosseguimento às análises, foi necessário efetuar a validação das escalas do JCQ, em virtude de elas ainda não terem sido submetidas a tal processo de validação em amostras brasileiras de características semelhantes à amostra da presente investigação.

6.2 Validação do Job Content Questionnaire (JCQ) 6.2.1 Escala de Demandas das Situações de Trabalho (Estressores) No processo de validação das escalas de estressores do JCQ, compostas originalmente por 41 itens, foram inicialmente verificados os pressupostos da análise fatorial, por meio da medida de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO), que apresentou resultado igual a 0,84, indicando assim, a adequação dos dados à análise. Do mesmo modo, o

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teste de esferecidade de Barlett foi significativo (χ²= 8626,91; p < 0,001), numa evidência de que as correlações entre os itens permitiam a realização da análise fatorial. Neste sentido, a matriz de intercorrelações entre os itens foi inicialmente submetida à análise dos componentes principais, que extraiu 10 fatores com valores próprios (eingenvalue) maiores que 1, responsáveis por 56,6% da variância total do instrumento. Contudo, o teste gráfico (scree plot) revelou um número máximo de seis a oito fatores interpretáveis (Figura 8).

Figura 9: Teste gráfico (scree plot) da Escala dos Estressores do JCQ

Considerando-se, no entanto, que o modelo original do instrumento previa a existência de sete fatores, foi realizada, então, uma análise fatorial por meio do método de componentes principais e rotação oblimin, com solução antecipada de sete fatores. Tal solução mostrou-se totalmente interpretável e adequada à estrutura interna da escala. Esses sete fatores foram responsáveis por 47,7% da variância total do instrumento e

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neles foram retidos os itens que apresentavam carga fatorial acima de 0,30 em apenas um fator e demonstravam, além disso, similaridade conceitual com os demais itens do fator. O primeiro fator compôs-se de 8 itens, tendo obtido eingenvalue igual a 5,98. Seus itens associam-se à extensão com que o indivíduo faz uso de suas habilidades e seu grau de autoridade decisória, ou seja, o quanto ele tem liberdade individual para tomar decisões e influenciar os resultados e os grupos de trabalho (Karasek & Theorell, 1990). Nesse sentido, ele foi denominado de “latitude de decisão”, por reunir itens das escalas originais de utilização de habilidades e de autoridade de decisão. A Tabela 2 contém as comunalidades e cargas fatoriais desse fator.

Tabela 2: Cargas fatoriais e comunalidades da Escala de Latitude de Decisão Itens 1 – Meu trabalho requer que eu aprenda coisas novas. 3 – Meu trabalho requer que eu seja criativo. 4 – Meu trabalho permite que eu tome muitas decisões por minha conta. 5 – Meu trabalho exige um alto nível de habilidade. 8 - Em meu trabalho, eu tenho pouca liberdade para decidir como eu devo fazê-lo. 7 - Em meu trabalho, posso fazer muitas coisas diferentes. 8 - O que tenho a dizer sobre o que acontece no meu trabalho é levado em consideração. 9 – No meu trabalho, eu tenho oportunidade de desenvolver minhas habilidades especiais.

h² 0,40 0,39 0,30 0,48 0,39

Cargas Fatoriais 0,57 0,60 0,55 0,66 - 0,46

0,40 0,29

0,59 0,40

0,52

0,61

O segundo fator obteve eingenvalue igual a 4,39 e ficou com 8 itens, referentes aos níveis de exigências psicológicas que o trabalhador enfrenta em seu contexto de trabalho, razão pela qual foi denominado de “demandas psicológicas do trabalho”, de modo similar à Karasek (1979). Na Tabela 3 são apresentadas as comunalidades e cargas fatoriais desse fator.

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Tabela 3: Cargas fatoriais e comunalidades da Escala de Demandas Psicológicas do Trabalho Itens



2 - Meu trabalho envolve muita repetitividade. 10 - Meu trabalho requer que eu trabalhe muito rapidamente 11 - Meu trabalho requer que eu trabalhe muito 13 – Eu não sou solicitado a realizar um volume excessivo de trabalho 14 - O tempo para a realização das minhas tarefas é suficiente. 18 - Meu trabalho exige longos períodos de intensa concentração nas tarefas. 19 - Muitas vezes minhas tarefas são interrompidas antes que eu possa concluílas, adiando para mais tarde a sua continuidade. 20 - Meu trabalho é desenvolvido de modo frenético.

0,20 0,52 0,58 0,47 0,59 0,40 0,34 0,56

Cargas Fatoriais 0,30 0,68 0,72 - 0,73 - 0,77 0,37 0,35 0,57

Com 6 itens e eingenvalue igual a 2,63, o fator 3 compreendeu aspectos relativos à integração social e emocional, assim como à confiança e apoio recebidos na realização das tarefas, por parte dos colegas de trabalho. De modo consistente com Karasek e Theorell (1990), ele foi assim denominado de “suporte social de colegas”. A Tabela 4 apresenta as comunalidades e cargas fatoriais desse fator.

Tabela 4: Cargas fatoriais e comunalidades da Escala de Suporte Social de Colegas Itens



29 - As pessoas com quem eu trabalho são competentes na realização de suas atividades. 30 - As pessoas com quem eu trabalho interessam-se pelo que acontece comigo. 31 - Eu estou exposto (a) a conflitos e hostilidade por parte das pessoas com quem trabalho. 32 - As pessoas no meu trabalho são amigáveis. 33 - As pessoas com quem trabalho encorajam umas as outras a trabalharem juntas. 34 - As pessoas com quem trabalho são colaborativas na realização das atividades.

0,56

Cargas Fatoriais 0,77

0,67 0,28

0,83 - 0,43

0,66 0,75

0,79 0,84

0,57

0,75

O quarto fator ficou com eingenvalue igual a 2,03, tendo sido composto por 3 itens que se associam à utilização de esforço físico na realização das atividades laborais,

69

tendo sido assim, denominado de “demandas físicas do trabalho” (Karasek, 1985). Na Tabela 5 são apresentas as comunalidades e cargas fatoriais desse fator.

Tabela 5: Cargas fatoriais e comunalidades da Escala de Demandas Físicas do Trabalho Itens



12 - Meu trabalho exige muito esforço físico. 15 – Sou frequentemente solicitado a mover ou levantar cargas pesadas no meu trabalho. 16 -Meu trabalho exige atividade física rápida e contínua.

0,64 0,65

Cargas Fatoriais 0,74 0,76

0,77

0,86

As demandas relativas aos problemas associados ao contato com clientes agregaram-se no fator 5, que obteve eingenvalue igual 1,66 e ficou com 6 itens. Ele foi designado de “relacionamento com clientes” (Karasek, 1985) e as comunalidades e cargas fatoriais de seus itens encontram-se na Tabela 6.

Tabela 6: Cargas fatoriais e comunalidades da Escala de Relacionamento com Clientes Itens



36 - De uma maneira ou de outra, eu costumo obter informações/feedback dos clientes sobre meu trabalho 37 - Tenho oportunidade de conhecer meus clientes pessoalmente no meu trabalho 38 - De alguma maneira meus clientes influenciam na maneira como desenvolvo meu trabalho 39 - Eu posso afetar o interesse dos clientes 40 - Satisfazer o cliente é uma importante fonte de desafio no meu trabalho 41 - Eu estou sujeito a hostilidade ou abuso dos clientes

0,33

Cargas Fatoriais 0,45

0,57

0,67

0,46

0,70

0,44 0,44

0,65 0,65

0,35

0,44

O sexto fator compôs-se de 5 itens, tendo obtido eingenvalue igual a 1,44. Seus itens associam-se à estabilidade no emprego, ou seja, ao quanto o trabalho do indivíduo lhe possibilita promoções de carreira ou mesmo apresenta a possibilidade de levá-lo ao

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desemprego. Dessa forma, ele foi denominado de “insegurança no trabalho” (Karasek, 1985). A Tabela 7 contém as comunalidades e cargas fatoriais desse fator.

Tabela 7: Cargas fatoriais e comunalidades da Escala de Insegurança no Trabalho Itens

h

24 – Minha estabilidade no emprego é boa. 25 - Durante o ano passado, você esteve desempregado ou em trabalho temporário? 26 - Algumas pessoas perdem permanentemente os empregos que gostariam de manter. Qual a possibilidade de nos próximos 2 anos você vir a perder seu emprego atual? 27 - Minhas possibilidades de desenvolvimento na carreira e promoções são boas. 28 – Em 5 anos, minhas qualificações ainda continuarão válidas

0,58 0,47

Cargas Fatoriais - 0,68 0,65

0,52

0,66

0,40

- 0,33

0,30

- 0,50

O sétimo e último fator compôs-se de 3 itens e ficou com eingenvalue igual a 1,43. Seus itens dizem respeito a posições fisicamente incômodas por longos períodos no exercício do trabalho e à espera do trabalho de terceiros para a conclusão do próprio trabalho. No instrumento de Karasek (1985), dois desses itens aparecem como demandas físicas isométricas, enquanto um terceiro situa-se no fator de demandas psicológicas no trabalho. No presente estudo, porém, eles se juntaram em um único fator que foi dessa forma denominado de “estressores inespecíficos”. A Tabela 8 contém as comunalidades e cargas fatoriais desse fator. Tabela 8: Cargas fatoriais e comunalidades da Escala de Estressores Inespecíficos Itens



21 -.Frequentemente meu trabalho exige que eu mantenha meu corpo, por longos períodos, em posições fisicamente incômodas. 22 – Meu trabalho exige, por longos períodos, que eu mantenha minha cabeça ou meus braços em posições fisicamente incômodas 23 – Muitas vezes esperar pelo trabalho de outras pessoas ou departamentos torna meu trabalho mais lento.

0,81

Cargas Fatoriais 0,89

0,80

0,92

0,32

0,52

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A validação da escala de estressores implicou, portanto, em algumas alterações nas escalas originalmente previstas no JCQ. No entanto, elas mantiveram, ainda assim, a estrutura básica do modelo teórico que fundamentou a presente pesquisa.

6.2.2 Escala de Insatisfação no Trabalho No processo de validação da Escala de Insatisfação no Trabalho, os pressupostos da análise fatorial foram verificados por meio da medida de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO), que apresentou resultado igual a 0,77, indicando, assim, a adequação dos dados à análise. De modo semelhante, o teste de esferecidade de Barlett foi significativo (χ²= 808,02; p
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