Ditadura do sertão: apoio e consenso da ditadura civil-militar na música sertaneja

May 24, 2017 | Autor: Gustavo Alonso | Categoria: Música Caipira, Música Sertaneja, Música Popular Brasileira, Ditadura Militar, Mpb, ufanismo
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ALONSO, Gustavo . «Ditadura do sertão: apoio e consenso da ditadura civil-militar na música sertaneja.» IN : Cordeiro, Janaina; Leite, Isabel C.: Silveira, Diego Omar; Reis, Daniel AarãoÀ sombra das ditaduras - 1. ed. Rio de Janeiro: Mauad, 2014. v. 1. 232p .

DITADURA DO SERTÃO: apoio e consenso da ditadura civil-militar na música sertaneja Gustavo Alonso

Na década de 70 a música chamada sertaneja ainda não havia se nacionalizado. Seus ouvintes se concentravam em regiões interioranas do Centro-Sul do Brasil e nas periferias das capitais. Não obstante, seu público era bastante considerável e uma dupla em especial sintonizou-se com as multidões: Leo Canhoto & Robertinho. Esta dupla começou a carreira em 1969, um ano após o AI-5, inovando no gênero sertanejo. Foi a primeira dupla que, influenciada pelos Beatles e pelo rock da Jovem Guarda, colocou guitarras na canção rural. Ao longo da década de 70 sua popularidade só fez crescer. É possível que muitos leitores sequer tenham ouvido falar em Leo Canhoto & Robertinho, sobretudo se forem de classe média-alta das capitais. De fato, a música sertaneja não tocava nos rádios FM destas classes sociais; mas já atingia os rádios AM de suas empregadas domésticas e dos porteiros de seus prédios. A música sertaneja só romperia a barreira de classe nas grandes cidades nos anos 90, diante da ascensão popular de Chitãozinho & Xororó, Zezé Di Camargo & Luciano e Leandro & Leonardo. De qualquer forma, pode-se dizer que Leo Canhoto & Robertinho antecedem, em popularidade e vanguardismo estético, as duplas dos anos 90. Ao pesquisar a carreira da dupla e os significados de sua popularidade para minha tese de doutorado intitulada “Cowboys do Asfalto: música sertaneja e modernização brasileira”, deparei-me com diversas canções de Leo Canhoto, o compositor da dupla, que eram apologias ao “Brasil grande” tão propalado pelos ditadores. Uma das primeiras canções de Canhoto, “Minha pátria”, gravada em 1968 por Zilo & Zalo, não deixava dúvidas: “Mostrando que a minha raça é destemida e varonil/ Quero cantar, quero gritar eternamente/ Viva, viva para sempre minha pátria, meu Brasil”.1 Em 1971 outra canção de título parecido, “Minha pátria amada”, mantinha o nacionalismo vivo: “Sou brasileiro, digo

1 “Minha Pátria” (Léo Canhoto). Zilo & Zalo, LP Guardarei teu coração (1968) RCA Camden CALB 5162.

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de coração/ Esta nação ninguém mais pode segurar”.2 Em “Soldado sem farda”, de 1970, Canhoto comparou o camponês ao militar: “Você lavrador é um soldado sem farda/ Desta nossa pátria você é a raiz”.3 Em 1972 a sintonia entre camponeses e o regime era retratada na canção “Meu irmão da roça”: “Lavradores, vocês estão construindo/ Nossa Pátria, nosso querido Brasil”. Seguindo a linha da aliança das classes sociais e o regime, em “Operário brasileiro” (1971), Canhoto se mostrou um entusiasta: “O militar é um soldado da justiça/ E você, meu operário, é um soldado do progresso” 4. Na canção “O presidente e o lavrador”, de 1976, Leo Canhoto se mostrava respeitoso diante do chefe máximo da nação: “Excelentíssimo senhor presidente/ Aqui estou na vossa frente/ Com muita admiração”.5 Essas e várias outras canções de Leo Canhoto me fizeram refletir sobre um tema pouquíssimo estudado pela historiografia: a apologia à ditadura. Com frequência ela é subestimada pelos historiadores da música popular, quando não simplesmente ignorada. E não foram apenas Leo Canhoto & Robertinho que cantaram afinados ao regime, mas também diversos cantores sertanejos. Em 1964 a dupla Moreno & Moreninho apoiaram o golpe daquele ano e pediram para a população ajudar financeiramente o governo participando da campanha de doação de metais preciosos para os cofres públicos. Compuseram então a canção “Doe ouro para o bem do Brasil”6. Em 1971, Moreno e Moreninho, a dupla conhecida como “a mais ouvida do Brasil”, cantavam a união nacional: “Todas as profissões unidas/ nosso mundo vai para frente/ união que faz a paz/ para um povo independente/ vamos todos com amor/ abraçar nossa bandeira/ Viva o nosso presidente!/ Viva a pátria brasileira!”

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Com o povo

unido, o progresso também era possível para Belmonte & Miltinho que em 1971 cantaram “Brasil caboclo exportação”, regravada por Jacó & Jacozinho em 1973: “Cada dia que passa o Brasil vai crescendo/ No estrangeiro agora é Brasil/ ... / Meu amigo caboclo não perca a esperança/ sua vida tão cedo irá se modificar/ O progresso virá trazendo a bonança/

2 “Minha Pátria Amada” (Léo Canhoto). Leo Canhoto & Robertinho, LP Buck Sarampo (1971) RCA Camden, CASB 5344. 3 “Soldado sem farda” (Leo Canhoto). Leo Canhoto & Robertinho, LP Rock Brasil chegou para matar (1970) RCA Camden 106.0033. 4 “Operário Brasileiro” (Léo Canhoto/Benedito Seviero), LP Leo Canhoto e Robertinho, RCA Camden, 1974, 106.0065. 5 “O Presidente e o Lavrador” (Léo Canhoto), Leo Canhoto & Robertinho, LP O valentão da rua Aurora RCA Camden, 1975, 106.0074. 6 “Ouro Para o Bem do Brasil” (Moreno e Moreninho) Cp. 06/1964, Sertanejo, CH-10418. 7 “Unido para o progresso do Brasil” (Moreno/Moreninho) LP O Balanço Da Rêde, Continental, 1971, CLP9.113.

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em seu rancho distante vai/ o conforto chegar”.8 Em 1971 Liu & Leo cantaram em “Transamazônica”: “Meu Brasil por ti me interesso/ Mediante o progresso meu país é forte...”.9 Em “Herói da pátria”, Biá & Dino Franco se empolgavam: “Pode ver que o Brasil se agiganta/ A exemplo de um grande labor”. Em 1974 Chitãozinho & Xororó, então ainda jovens à procura de espaço no meio musical, gravaram “Pequeno estudante”: “Sou filho de uma pátria abençoada/ Onde a paz e a alegria fez morada/ Paraíso de um encanto juvenil/ Tenho orgulho em dizer: Brasil!”. Em 1973 o gaúcho Teixeirinha lançou a explícita “Presidente Médici”: “Quem é aquele gaúcho/ Que subiu pra presidência/ Dotado de inteligência/ Prá governar o país/ É bom chefe de família/ De respeito e de bondade/ Nos deu a tranquilidade/ Fez nossa pátria feliz/ Ele nasceu no Sul/ É o presidente Médici/ Emilio Garrastazu!”.10 O entusiasmo com o regime ia dos modernos aos tradicionais. Os então veteranos Tonico & Tinoco também cantaram afinados ao regime desde 1964, quando gravaram “Esperança do Brasil”: “Lá no alto uma bandeira/ Representando a beleza/ Desta terra brasileira”11. O clima de união nacional em 1971 levou Tonico & Tinoco a cantarem uma ode a Transamazônica, mais um elogio à tão cantada estrada: “Um governo trabalhando, o nosso Brasil que avança,/ a estrada Transamazônica transporta nossa esperança”.12 Seguindo as odes à união nacional, em 1971 Tonico & Tinoco cantaram “Salve, salve brasileiro”, elogio aos diversos Estados da nação que termina percebendo no regime ditatorial o laço de união nacional: “Um governo varonil, unindo de Sul à Norte,/ De mãos dada e braço forte, vamos prá frente Brasil”.13 Em 1975 Tonico & Tinoco regravaram “Motorista do progresso”, toada original de 1965, do compositor gaúcho Teixeirinha: “Vai rodando escoando a produção/ E o progresso da nação aumenta de hora em hora”14. Sintetizando a euforia do milagre, o sanfoneiro gaúcho Teixeirinha compôs ao conterrâneo “Presidente Médici”: Quem é aquele gaúcho/ Que asfaltou o Rio Grande/ Que

8 “Brasil Caboclo Exportação” Continental, 1973, CLP=9179.

(Miltinho), LP Belmonte e Miltinho,1971;

LP Jacó & Jacozinho,

9 “Transamazônica” (Tapuã/Geraldo Aparecido Borges), LP Minha Terra, 1971, RCA, 5328. 10 “Presidente Médici” (Teixeirinha), LP O internacional, Continental, 1973, LPS 22001. 11 "Esperança do Brasil" (Nhô Crispim e Tonico) LP 20 ANOS, Continental, 1964, PPL=12281 - CLP=9024. 12 “Transamazônica” (Tonico e José Caetano Erba), LP Luar do sertão, Continental, 1971, CLP=9126 LP=2.11.405.696. 13“Salve, Salve Brasileiro” (Eduardo Araújo), LP Salve, salve brasileiro. Continental, 1971, LDC-13.018. 14 LP Vou voltar a Mato Grosso, Continental, 1975, LP=1.03.405.183; Teixeirinha gravou-a no LP Disco de ouro, Chantecler, 1965, CMG 2402.

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Deus saúde lhe mande/ Por tudo que ele tem feito/ Graças a ti presidente/ Hoje o Brasil é um luxo”.15 Mas o principal apoio musical dos artistas sertanejos ao regime se deu em função do apoio governamental aos trabalhadores e demandas dos camponeses brasileiros.

Em

1972 a dupla Jacó & Jacozinho cantaram a sintonia com o regime na música “Plante que o governo garante”. Apropriando-se de um slogan famoso do governo ditatorial, Jacó & Jacozinho viam o Brasil “progredindo”: “Plante que o governo garante/ Essa frase quer dizer progresso/ O que temos é muito abundante/ E por isso nossa produção/ Nesse caso já aumentou bastante/ Eu me sinto muito orgulhoso/ Quando ouço a frase elegante/ Que transmito ao homem do campo Plante que o governo garante”. A música de Jacó & Jacozinho fazia referência à propaganda do governo ditatorial de ajudar aos trabalhadores do campo. Que ajuda concreta é essa, aceita e incorporada pela canção? A canção “Lei Agrária”, de Goiá e Francisco Lázaro, pode ajudar a tornar palpável o que os camponeses e migrantes louvavam acerca da política agrária do governo ditatorial: “Lá nas alturas, o Senhor Onipotente/ Deu ao nosso Presidente a sublime inspiração/ De dar amparo ao caboclo brasileiro,/ O querido herói roceiro, que não tinha proteção/ Com o Mobral, nossos caros lavradores/ Já conhecem bem as cores da bandeira da nação/ Você, caboclo, neste Sesquicentenário,/ Foi o beneficiário, com a Lei do Lavrador/ Daqui pra frente, não será mais um meeiro,/ Ninguém vai ganhar dinheiro explorando seu suor/ E seu produto, tendo preço tabelado,/ Você não será lesado pelo astuto comprador”. Esta canção foi gravada pela primeira vez em 1971 pela dupla Os Dois Goianos (Durval & Davi). Representativa da esperança dos artistas sertanejos e seu público, a canção foi regravada em diversos momentos: em 1974, por Zilo & Zalo 16, e duas vezes por Mizael & Waldery: uma em meados da década de 70 e outra em 1981.17 Estas canções são bastante significativas acerca da forma como os sertanejos compreendiam o regime ditatorial. Para além da louvação apologética, os sertanejos e seu 15 “Presidente Médici” (Teixeirinha), LP O internacional, Continental, 1973, LPS 22001. 16 Zilo & Zalo, LP Minha gratidão, Continental, 1974, CLP=9184. 17 Consta na discografia uma "inversão" do nome da dupla: há um LP de "Mizael e Waldery" (com mudança na grafia do nome artístico de José Rodrigues de Carvalho, trocando as letras V por W e I por Y) intitulado "Caminhos de Minha Infância" (CL-4164), gravado pela Califórnia, não constando o ano da gravação. Curiosamente, esse LP de "Mizael e Waldery" possui o mesmo repertório, com a mesma ordem e as mesmas gravações das faixas do LP homônimo de "Valderi e Mizael" intitulado "Caminhos de Minha Infância" (COELP=41569), gravado pela Copacabana em 1981. Observa-se no entanto, que as fotos da dupla no LP de "Mizael e Waldery" são mais antigas, evidenciando que a dupla adotou primeiro o nome "Mizael e Waldery", tendo mudado depois para "Valderi e Mizael".

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público viram realizada uma demanda concreta dos lavradores pelo governo: os direitos de pensão e aposentadoria implementados pela lei que instituiu o ProRural no governo Médici em 1972. A ditadura reabilitou planos que já existiam antes do golpe de 1964, mas que não puderam ser efetivados. Houve, no entanto, pressões a favor e contra o ProRural entre os próprios quadros partidários do regime. Claro está que o governo não tinha, quando do golpe em 1964, uma opinião unânime acerca da questão agrária. Em 2 de março 1963, o último presidente democraticamente eleito, João Goulart, havia promulgado o Estatuto do Trabalhador Rural, que regulamentava pela primeira vez o trabalho no campo.18

Previa direitos previdenciários aos camponeses e direitos

trabalhistas como férias e pensões. Foi criado nessa época o FUNRURAL, o fundo público que arrecadaria a contribuição previdenciária dos trabalhadores rurais e se encarregaria de pagar os direitos sociais.

Era a primeira vez na história do campo

brasileiro que os trabalhadores rurais ganhavam direitos previdenciários. Em 13 de março de 1964, diante da radicalização da situação política, o presidente João Goulart assinou um decreto prevendo a desapropriação, para fins de reforma agrária, das terras localizadas numa faixa de dez quilômetros ao longo das rodovias, ferrovias e açudes construídos pela União. No dia 15 de março, em mensagem ao Congresso Nacional, propôs uma série de providências consideradas "indispensáveis e inadiáveis para atender às velhas e justas aspirações da população”. A primeira delas, a reforma agrária. E veio o golpe na noite do dia 30 de março, consolidado no dia 1º de abril. No entanto, numa amostra do comportamento reacionário do levante, a ditadura cedo modificou as leis de acordo com o interesse golpistas. Antes mesmo do ano acabar estabeleceu-se o Estatuto da Terra, em 30 de novembro de 1964, que tinha dois objetivos básicos anunciados: a execução de uma reforma agrária e o desenvolvimento da agricultura.19 Em vez de dividir a propriedade, porém, num primeiro momento a nova legislação simplesmente transformou o Estatuto do Trabalhador Rural de Goulart em peça da reação, desarticulando as ambições reformistas. E os direitos sociais, anunciados pelo ex-presidente mas não concretizados, foram deixados de lado. Na prática a reforma agrária anunciada ficou para escanteio. Os direitos sociais não foram implementados.20

18 LEI Nº 4.214 - DE 2 de março de 1963 - DOU DE 22/03/63. 19 Estatuto da Terra - Lei 4504/64 | Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964. 20 Para uma discussões das leis agrárias brasileiras até 1964, ver JONES, 2003.

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Este primeiro momento do regime ditatorial se caracterizou pela hegemonia dos liberais sob o governo Castello Branco que, tendo como guia o economista Roberto Campos no Ministério do Planejamento, não viam a concessão de direitos sociais aos trabalhador como fundamentais para o campo brasileiro, muito menos a reforma agrária.21 No entanto, houve mutações no regime militar e outras concepções vieram à tona. Com o “milagre brasileiro”, a modernização do campo tornou-se uma questão central para a ditadura, que queria ver o campo em compasso com o dinamismo industrial.

O

capitalismo impulsionado pelo regime militar brasileiro promoveu a modernização do latifúndio, por meio do crédito rural fortemente subsidiado e abundante. Para favorecer a agricultura capitalista de alta eficiência foi criada em 26 de abril de 1973 a EMBRAPA, cujos objetivos eram a produção de conhecimento científico e desenvolvimento de técnicas de produção para a agricultura e a pecuária brasileira. O dinheiro farto e barato, aliado ao estímulo à cultura da soja - para gerar grandes excedentes exportáveis - propiciou a incorporação das pequenas propriedades rurais pelas médias e grandes. Nesse contexto de modernização do campo cabia repensar a situação do trabalhador e refletir sobre a situação “pré-capitalista”, ou pouco moderna, de algumas regiões do Brasil. Este tornou-se o alvo dos ditadores. É preciso atentar para o fato de que qualquer tentativa de mudança no panorama da estrutura agrária do Brasil, mesmo feita pelos ditadores, era prontamente repudiada por setores mais conservadores. No ano de 1972 o governo tentou através do programa ProTerra – Programa de Redistribuição de Terras e do Estímulo à Agro-Indústria do Norte e do Nordeste – realizar a ocupação organizada e produtiva da região amazônica e uma modestíssima reforma agrária no Nordeste. O plano previa a utilização de recursos do ProTerra para financiar (com juros de 5% ao ano, por um prazo entre doze e vinte anos e com três de carência) lavradores que desejassem comprar terras em regiões escolhidas pelo INCRA – Instituo Nacional de Colonização e Reforma Agrária - , órgão criado em 1970. O governo então selecionou determinadas regiões que considerou aptas a reforma. Nestas regiões selecionadas os proprietários que possuíssem entre mil e 5 mil hectares teriam que vender, num prazo de seis meses, de 20% a 50% do total de suas terras, correndo o risco de ser desapropriado caso não obedecesse. Foi o bastante para que um

21 Para uma análise deste primeiro momento liberal da ditadura, ver REIS FILHO, 2000.

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festival de críticas conservadoras se levantasse, rachando o partido dos ditadores, a Aliança Renovadora Nacional - ARENA. O senador da ARENA de Pernambuco, Paulo Pessoa Guerra, defendeu os interesses próprios: “Longe, no alto do sertão do São Francisco, quando passo por lá em minhas viagens, sinto vontade de chorar ao ver tanta terra abandonada. Por que não vão distribuir terra por lá?”. Outro deputado da ARENA, Cardoso de Almeida de São Paulo, atestou seu conservadorismo quando disse: “Não é justo que o Brasil faça reforma agrária. Devíamos incentivar os outros países a fazerem, porque assim se enfraqueceriam e nós teríamos mais mercado para nossos produtos agrícolas”.

Siqueira Campos, da ARENA de Goiás

também foi contrário a modestíssima divisão do campo: “Porque desapropriar terras que têm dono, se existem terras devolutas?”. E completou cinicamente: “embora um pouco distantes.”22 O plano de reforma agrária da ditadura era modestíssimo. Colocava o lavrador sem–terra como financiador do processo, dando ao proprietário o pagamento por suas terras mal utilizadas socialmente. Desarticulava assim as demandas mais radicais, já debilitadas desde o golpe de 1964, que tinham como demanda a desapropriação direta das terras devolutas e grandes latifúndios. Diante das polêmicas, o Ministro da Agricultura Luiz Fernando Cirne Lima, veio a público fazer esclarecimentos, deixando claro o tom da reforma: “Não é verdade que esteja implícita no programa a política de pulverização da propriedade rural. Os proprietários de minifúndios podem obter crédito para ampliar suas propriedades.

Não se vão criar

minifúndios, que serão combatidos, mas pequenas e médias propriedades, sempre em condições de alcançar níveis de produtividade satisfatórios”.23

O presidente Médici

embasou o discurso produtivista do ministro e defendeu a leve mudança agrária em direção a melhoria técnica da produção: A construção de uma sociedade livre, autônoma e desenvolvida, no Brasil, o desafio da integração nacional e a revolução agrícola exigem medidas corajosas e de grande alcance, sem as quais não será possível criar a infra-estrutura necessária ao nosso pleno desenvolvimento econômico e social. O programa de Redistribuição de Terras e de Estímulo a Agro-Indústria do Norte e do Nordeste, tal como se acha concebido no decreto-lei que ora promulgo, é fruto da decisão inabalável, que anima os Governos da Revolução, de introduzir na sociedade brasileira as mudanças estruturais exigidas pelo imperativo de conjugar o

22 “Uma distribuição difícil”, Veja, 16/08/1972, p. 84. 23 Idem.

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crescimento da economia com o estabelecimento de ordem social mais próspera, mais humana e mais justa.24

O objetivo da ditadura era integrar o homem do campo ao capitalismo que se acelerava no país. Segundo o presidente Médici, “o PRORURAL vem concorrendo para a progressiva incorporação do homem do campo à sociedade de consumo”. Alguns músicos sertanejos viram isso positivamente, como Jacó & Jacozinho, que em 1975 gravaram a canção “Soja e trigo”: “Eu já fui um bom empregado honrado/ No meu querido sertão/ Trabalhei de tratorista/ fui orgulho do patrão/ Um dia Deus me ajudou/ Quem sabe preparar a terra/ Não erra/ É lucro que não tem fim/ Tô plantando e tô colhendo/ a coisa virou pra mim/... / Foi o trigo e foi a soja/ Que me fez virar patrão/ Negócio bom do momento é esse meu amigo/ Tiro o trigo e planto soja/ Tiro a soja e planto o trigo”.25 A possibilidade de mobilidade social acenada pelo regime foi bem vista pelos sertanejos.

Pode se argumentar que a multiplicação de possibilidades diante do

crescimento do Brasil promovia uma “ilusão” de que havia muitas oportunidades. No entanto este raciocínio nega autonomia à interpretação das classes populares que visivelmente apoiaram estas medidas. A questão essencial a ser respondida, dessa forma, é outra: por mais que a construção do capitalismo no campo tenha trazido a proletarização dos camponeses, isto não foi visto pelos músicos sertanejos como algo ruim. Porque isso aconteceu? Parece-me que para responder a esta pergunta há de se aceitar que o camponês pensa por padrões próprios que não devem ser simplesmente ignorados. Nesse sentido há de se buscar entender sua lógica, e tentar desvendar sua maneira de pensar. Penso que a resposta positiva a capitalização do campo tem a ver com o otimismo dos sertanejos em relação a entrada do Estado nas áreas rurais. O Estado ditatorial era bem visto, não por ser ditatorial, mas para além disso (embora por isso também). Era o Estado brasileiro finalmente mediando as relações sociais que antes eram simplesmente mediadas pela força. Pela primeira vez os camponeses eram contemplados juridicamente com leis que os beneficiavam com uma justiça que estava para além da alçada direta do patrão. Explica-se assim também as contantes louvações às Forças Armadas e às forças policiais, especialmente nas canções de Leo Canhoto.

24 Discurso intitulado PROTERRA, feito perante o Ministério, no Palácio do Planalto, anunciando a instituição do PROTERRA, em 06/06/1971. 25 “Soja e trigo” (Moacyr dos Santos e Jacó) Jacó & Jacozinho, LP Ninho de cobra, Continental, 1975, LP=1.03.405.176.

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Seguindo as pegadas do sociólogo Max Weber, parece correto pensar que a burocratização estatal trouxe certas mudanças que foram julgadas “positivas” pelos sertanejos. A chegada do Estado ao campo trouxe a estatização de serviços legais e jurídicos aos camponeses, mudando as relações sociais tradicionais da hierarquia rural. Através da burocratização, trâmites técnicos, jurídicos e legais, além dos direitos sociais, passaram a mediar as relações sociais rurais.

Weber destaca que o processo de

racionalização da atividade econômica também envolve a passagem de uma racionalidade material - na qual a vida econômica está submetida a valores de ordem ética ou política para uma racionalidade formal, ou seja, na qual a lógica impessoal das atividades econômicas e lucrativas se torna predominante (WEBER, 2006). A capitalização do campo, ao trazer a proletarização do trabalhador, também acenou com a possibilidade da burocratização e racionalização do poder. Ou seja, outra relação de poder foi instaurada, não mais mediada pura e simplesmente pelos senhores da terra. Entre o senhor de terra e o trabalhador passou a existir os direitos sociais e a burocracia estatal. É isso que é louvado pelos sertanejos. Antes, o trabalhador não era respaldado pelo Estado e, na prática, era obrigado a se submeter ao dono da terra. Após a chegada das leis trabalhistas no campo, o sertanejo se viu respaldado pela lei, que embora não tenha se efetivado em muitos lugares, o próprio fato de esta passar existir já era um indício claro de sintonia com seus interesses. Mais do que as forças repressivas enquadradoras, o que era realmente reconhecido e louvado pelos sertanejos era a concessão dos benefícios sociais advindos da burocratização, sobretudo os direitos previdenciários – obtidos pelo ProRural. O decreto que criou o ProRural foi assinado em 25 de maio de 1971. Tratava-se de um programa que garantia aos camponeses direitos sociais como aposentadoria, pensões, auxílio doença, maternidade e outras garantias sociais já comuns aos trabalhadores urbanos. O presidente Médici defendeu a legitimidade social dos camponeses excluídos até então da Previdência Social e dois anos mais tarde, em 1973, também incluiu as empregadas domésticas26 e os pescadores artesanais nos mesmos direitos, visto que estes grupos historicamente estavam excluídos da legislação do trabalhador urbano:

26 É de se demarcar que nos anos 70 vários artistas “cafonas” cantaram o cotidiano sofrido das domésticas, entre eles Waldick Soriano (“Uma empregada vai ser mãe dos meus filhos”), Jean Marcel (“Você não vai ser minha empregada) e Luiz Carlos Magno (“Quarto de empregada”). O artista Odair José ficou conhecido como o “cantor das empregadas” por compor canções como “Deixe essa vergonha de lado”, no qual relatava o amor por uma doméstica. Mais do que simplesmente cantar, Odair José se engajou na luta pelos direitos das empregadas domésticas e participou de passeatas em defesa desta classe trabalhadora. Em 1973, ano em Odair José que lançou a canção “Deixe essa vergonha de lado”, o presidente Médici finalmente incluiu as

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Aí esta o PRORURAL, que, a esta altura, já assegurou aposentadoria a mais de 800 mil trabalhadores do campo, dando-lhes, afinal, o que eles jamais tiveram e assegurando-lhes uma velhice menos cheia de tristeza e de preocupação. Aí está a decisão do governo, que estendeu a grupos sociais, antes esquecidos e marginalizados, as vantagens da Previdência, como foram os empregados domésticos e os pequenos pescadores de nossas praias, numa demonstração viva de que nosso pensamento, fiel aos postulados da Revolução, é o de não deixar sem o amparo do Estado nenhum de nossos irmãos em cidadania, que concorrem com seu trabalho para o engrandecimento do país.27

É preciso compreender o peso desta medida para os camponeses brasileiros, pois foi através destes direitos outorgados e de seu consequente prestígio simbólico que o regime ditatorial conseguiu angariar apoio massivo entre estes artistas e público sertanejos. Nunca antes da ditadura militar os moradores de áreas rurais haviam sido contemplados, na prática, com os mesmos benefícios dos trabalhadores urbanos. Além disso, é importante frisar que grande parte do apoio do homem do campo à ditadura também se deve ao reconhecimento não apenas de direitos sociais, mas sobretudo ao reconhecimento social e simbólico dos camponeses. Para efeito de comparação é preciso relembrar o período do governo Getulio Vargas de 1930 a 1945. A Constituição varguista de 1934 foi a primeira carta brasileira a conter a expressão “previdência” em seu texto, e a garantir direitos a gestantes e aposentadoria, além do voto direto. Com o Estado Novo (1937-1945) foi abolido o voto direto. Não obstante, durante a ditadura varguista foi criada a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que regulava o trabalho urbano e gratificava o trabalhador com os direitos previdenciários. Aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, a CLT reunia todas as resoluções tomadas pelo governo de Getúlio Vargas na área trabalhista: salário mínimo, carteira profissional, limitação da jornada, férias, normas de segurança e regulamentação da Justiça do Trabalho. Tudo isso foi conquistado pelos trabalhadores urbanos. No entanto, em 1943 cerca de 30% da população brasileira estava nas cidades, como pode ser visto nos gráficos abaixo. Os trabalhadores rurais, maioria de 70% da população, ficaram a ver navios. Apesar de a maior parte da população brasileira não ter sido atingida pela CLT do Estado Novo, Getúlio Vargas foi louvado pela memória popular como o “melhor

domésticas na CLT. Para a luta pelos direitos das empregadas e a participação de Odair José, ver capítulo “Os sons que vem da cozinha”, In: ARAÚJO, 2003, pp. 317-334. 27 Mensagem do Presidente Médici aos trabalhadores intitulada “Os anônimos construtores”, lida pelo Ministro Júlio Barata, do Trabalho e Previdência Social, em 1º de maio de 1973 (MÉDICI, 1973).

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presidente” da história do Brasil. Em grande parte isso se deveu ao fato de que foi em Vargas que as aspirações de longa data de parte dos trabalhadores conseguiram se exprimir. Em 1971, quando foram instauradas as leis de Previdência Social no campo, havia cerca de 45% da população em zonas rurais, ou seja, mais pessoas do que havia nas cidades na época de Vargas e das CLTs, proporcional e numericamente. De forma que o apoio que o regime ditatorial conseguiu ao se colocar como porta voz de um grande contingente da sociedade brasileira não pode ser desprezado. Dois anos mais tarde, em 1973, Médici demarcou que um dos objetivos do programa de concessão de direitos trabalhistas aos camponeses era evitar a migração massiva: “Medidas dessa natureza poderão, a médio e longo prazo, contribuir para que diminua o êxodo rural, para que se elimine das cidades o triste espetáculo da indigência e para que se venha a superar o desequilíbrio entre a cidade e o campo, onde ainda se concentra a maior parte de nossa população”.28 Apesar da importância dos direitos sociais concedidos ao trabalhador do campo é sintomático que grande parte da bibliografia prefira se silenciar sobre este acontecimento, preferindo analisar “apenas” a proletarização e crescente exploração do trabalhador do campo durante a ditadura. O livro “O Bóia-fria: acumulação e miséria” de Maria da Conceição d´Incaio, publicado em 1976, sequer cita o ProRural ou o FunRural (D´INCAO, 1978). Em livros intitulados “Ditadura e agricultura” e “A luta pela terra”, ambos do final da década de 70, Octávio Ianni tampouco citou o programa de previdência obtido pelos trabalhadores rurais (IANNI, 1978; 1979). Otávio Guilherme Velho no livro “Capitalismo autoritário e campesinato”, publicado em 1979, também nada fala (VELHO, 2009). A primeira tese acadêmica sobre o tema só veio em 1983. Intitulada “Funrural: a previdência vai ao campo”, a dissertação foi defendida na faculdade de Medicina (!) da Bahia, por José Gilson de Andrade (ANDRADE, 1983). Apesar da importância do tema para se entender o Brasil atual, a tese não fez escola. Os trabalhos sobre a agricultura e trabalho rural no Brasil quase sempre batem na tecla da exploração do trabalhador e a miséria instaurada pelo capital, ignorando a repercussão das medidas previdenciárias entre os trabalhadores rurais. Em grande parte esta lacuna persistiu. No livro “Os camponeses e a política no Brasil: as lutas sociais no campo e seu lugar no processo político”, de José de Souza Martins, publicado em 1981, não há uma 28 Discurso “Permanente preocupação” feito por Médici perante o Ministério reunido no Palácio do Planalto, a 6/09/1973. In: MÉDICI, 1973b.

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linha sequer sobre o ProRural. Aliás o assunto não é tratado em nenhum dos livros analisados de José de Souza Martins porque aparentemente o autor considera a concessão de aumentos salariais e direitos sociais uma forma de “dividir” a luta dos trabalhadores.29 O livro de Carlos Minc “A reconquista da terra: Estatuto da Terra, lutas no campo e reforma agrária”, de 1985, também nada fala dos direitos sociais concedidos por Médici (MINC, 1985). No livro “A questão agrária no Brasil: Programas de reforma agrária 19462003”, organizado por João Pedro Stedile, economista ligado ao Movimento dos SemTerra (MST), também não há referência à lei que criou o ProRural (STÉDILE, 2005). No artigo "A questão agrária no Brasil pós-1964 e o MST" Mario Grynszpan trata a questão de forma totalmente corriqueira em apenas um parágrafo e meio, num texto que tem 33 páginas no total (GRYNSZPAN, 2003).

Mais grave ainda, nenhum verbete sobre o

Funrural ou o ProRural foram encontrados no "Dicionário da Terra", organizado pela pesquisadora Marcia Motta, obra que conta com cerca de 176 verbetes sobre temas rurais escritos por 86 diferentes pesquisadores especialistas no tema (MOTTA, 2003). Embora alguns historiadores da música popular tenham percebido a existência dessas canções, subestimaram o poder destas na consolidação do regime e passaram ao largo de um entendimento mais aprofundado do camponês. Analisando a canção “Lei agrária” sociólogo uspiano Waldenyr Caldas chegou a conclusão de que o sertanejo estava “alienado” durante a ditadura (CALDAS, 1977).

Para o sociólogo paulista, o camponês

não deveria ficar contente com nenhuma lei do regime, pois esta seria sempre insuficiente a suas necessidades: “Por fim destacamos o caráter tendencioso do título da canção. Por 'Lei Agrária' pode-se entender uma lei que venha reestruturar o modo de produção agrária de um país, e não apenas outorgar alguns direitos ao homem do campo que, a bem da verdade, só trazem medidas paliativas” (CALDAS, 1977, p. 134). Opinião semelhante possui José de Souza Martins. Em seu artigo “Musica Sertaneja: a Dissimulação na linguagem dos humilhados”, julga a música sertaneja como um todo uma deturpação dos valores camponeses verdadeiros, valores “caipiras”. Por consequência, a alienação dos reais interesses do trabalhador do campo seria a tônica das canções sertanejas (MARTINS, 29 Para Martins a concessão de direitos contribui para a desmobilização da luta agrária: “Essa vitória das esquerdas [Martins se refere ao Estatuto do Trabalhador Rural de João Goulart] cindiu a luta no campo, esvaziando significativamente o empenho dos que lutavam pela terra ou cuja luta tinha ainda mais sentido como luta pela reforma agrária do que por direitos trabalhistas. (...) A ação das esquerdas, já antes do golpe de 1964, dividiu e enfraqueceu a massa dos trabalhadores rurais, segmentando-a em dois grupos com interesses desencontrados: os que lutam pelo salário e pelos direitos trabalhistas de um lado, e os que lutam pela terra, de outro” (MARTINS, 2004, p. 97) Entre as obras analisadas de Martins, constam: MARTINS, 1982; MARTINS, 1975; MARTINS, 1981.

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1975b). O sociólogo julga saber uma verdade inatingível ao camponês, preso nas malhas da indústria cultural. Esta visão se manteve nas mais recentes obras sobre a música rural, seja a produzida na academia ou fora dela.30 A consequência lógica é que qualquer manifestação deste camponês é sempre manipulação e desvio de suas vontades. De forma que o discurso sertanejo tem pouca ou nenhuma validade. Recentemente foi defendida uma dissertação muito completa sobre as negociações no Congresso para efetivação do ProRural (GARCIA, 2010). Muito bem feito, o trabalho de Nicole Garcia analisa sobretudo fontes oficiais do Congresso Nacional, além de reportagens da grande imprensa e dos movimentos organizados, como sindicatos rurais e entidades de direitos do trabalhador. Não obstante, ainda hoje falta uma análise profunda sobre os direitos dos camponeses e o significado desta conquista para os próprios interessados. Mais do que concessão de direitos, o governo ditatorial mostrou reconhecer o trabalhador rural como personagem desprestigiado da história do trabalho no Brasil. O presidente Médici sempre enfatizava este aspecto, como fez no discurso intitulado “Permanente preocupação”, em 1973: “As normas de justiça social, que não se concretizam apenas na distribuição mais equânime da riqueza coletiva, mas ainda no tratamento humano daqueles que vivem do trabalho, no sol-a-sol da lavoura”.31

O

reconhecimento do homem do campo era uma constante nos discursos presidenciais. Em reunião com o seu ministério em março de 1971, Médici demarcara a importância daquelas medidas que considerava históricas: Convoquei esta reunião do Ministério – a primeira deste ano – para o exame de importantes medidas de interesse para a nação. Entre estas se encontra a que diz respeito à instituição do Programa de Assistência ao Trabalhador Rural. (...) Ao assumir a presidência da República, proclamei fé no homem do campo, acentuando que o dever desta hora é a integração do homem do interior no processo de desenvolvimento nacional. “Isso não se faz” – lembrei então – “não somente dando terra a quem não tem, e quer, e pode ter”. Mas se faz levando ao campo, entre outras coisas, a assistência médica e a previdência rural. Por outro lado, reconhecia que “desde os anos de 50, nosso esforço desenvolvimentista vem sendo predominantemente industrial e de forma desequilibrada em relação ao setor agrícola. Para a correção desta anomalia, era e é necessário considerar o homem, inclusive e primordialmente o homem do campo, a primeira das nossas infra-estruturas básicas”. (...)

30

Na maior parte das vezes a recente bibliografia sobre a música sertaneja/caipira sequer trata do tema, fazendo eco a bibliografia musical em geral. Para bibliografia sobre música rural, ver: SANTOS JUNIOR, 2010; SCHOUTEN, 2010; MORAES, 2006; ALÉM, 1996; NEPOMUCENO, 1999; ULHÔA, 1995. 31 Discurso “Permanente preocupação” feito por Médici perante o Ministério reunido no Palácio do Planalto, a 6/09/1973. MÉDICI, 1973, p. 68.

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Trata-se de instituir programa de assistência especial ao trabalhador rural e seus dependentes, ampliando também os serviços de saúde já concedidos pelo Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural ou FUNRURAL.32

No dia 1º de maio de 1971, dia do trabalho, Médici pronunciou-se novamente em rede de rádio e televisão. Novamente valorizou o trabalhador do campo e enfatizou que era algo inédito que os direitos sociais chegassem ao campo: O fato novo que deve ser assinalado no Dia do Trabalho, e há de marcar o segundo ano de meu governo, é o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural. Pela primeira vez, na história deste país, dar-se-á ao homem do campo aquilo que nunca lhe fora concedido: aposentadoria, auxílio-invalidez e pensão, além de outros benefícios para a proteção de sua saúde e estabilidade de sua posição social. Levar-se-ão ao campo, de maneira concreta, e não como simples promessa, melhorias reais, suprimindo-se a desigualdade de tratamento, que até agora concentrava na cidade a maior soma de medidas tutelares dos direitos do trabalhador.33

Em seus discursos, o então presidente Emilio Garrastazu Médici parece sempre enfatizar a “bondade” extrema do governo em dar esses direitos ao trabalhador. Expressões como “meu governo”, direitos “nunca antes concedidos”, benesses “levadas” ao campo, parecem sugerir a crença do ditador de que estas concessões foram uma dádiva do regime para os trabalhadores rurais.

Essa interpretação esquemática se parece,

paradoxalmente, com as interpretações teóricas do populismo.34

Ou seja, as relações

acontecem de cima para baixo, de Estado para sociedade, de presidente para camponês.35 No entanto, não é assim que os músicos sertanejos interpretam as ações do governo ditatorial. Para estes, o governo é reconhecido não porque tomou a dianteira do processo de concessão dos direitos, mas porque era expressão da vontade popular esperada.

Na

canção “Plante que o governo garante” fica patente que a postura do governo é acessória ao trabalhador: “Me orgulho em ser brasileiro/ em morar neste país gigante/ .../ Nesta terra o que se planta colhe/ o progresso temos adiante/ Lavradores se sentem amparados/ Plante que o governo garante/ .../ Para nós o que é muito importante/ O governo está nos ajudando/ Plante que o governo garante”. Na canção “A vida do Operário”, de 1968, o cantor Teixeirinha também enfatiza que o Brasil cresce devido aos trabalhadores e louva a Deus pelo operário que “sustenta o 32 “Uma vida melhor”, mensagem de Médici lida pelo próprio na reunião ministerial no Palácio do Planalto, em 29/03/1971. MÉDICI, 1971, p. 59-60. 33 Discurso intitulado “O grande dia da esperança”, pronunciado por Médici através de rede nacional de rádio e televisão, no dia 01/05/1971. MÉDICI, 1971. 34 As interpretações sobre o populismo, ganharam vulto e espectro concreto através da obra O populismo na política brasileira, de Francisco Weffort. Em sua teoria para explicar a manipulação do líder populista Weffort sinaliza que os migrantes haviam sido os responsáveis pela desarticulação política das esquerdas. Ao emigrar do campo para a cidade, sem tradição de luta sindical, teriam contribuido para a alienação do operariado revolucionário. WEFFORT, 1980. 35 Para uma crítica da teoria do populismo, ver FERREIRA, 2001.

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Brasil”: “Às sete e meia ele pega/ Lá na sua construção/ E o Brasil vai crescendo/ Com o calo da sua mão/ .../ Lá vai ele sorridente/ Pegado na construção/ Levando o Brasil pra frente/ Se não fosse o operário/ Não existia grandeza/ O nosso Brasil não era/ Um gigante de riquezas/ Que Deus não deixe operário/ Faltar pão na sua mesa”.36 Na continuação da canção “Lei Agrária” os compositores Goiá e Lázaro louvam o regime e a “lei agrária” como expressão do povo, justamente por referendar um desejo do homem do campo por direitos sociais: “A Lei Agrária, que por nós era esperada,/ Foi agora assinada pelo chefe da nação/ E na doença vem a Lei da Previdência,/ Você vai ter assistência e também sua pensão/ Irmão do campo, brindo aqui o seu sucesso!/ Viva o Brasil-progresso! Viva a revolução!/.../ Coisas sublimes acontecem nesta terra,/ Onde a paz venceu a guerra e o bem ganhou do mal/ Como me orgulho de você, Brasil querido,/ o exemplo a ser seguido para a paz universal” (grifo meu). A “lei agrária” não caiu do céu ou das mãos do presidente, mas era “esperada” pelos camponeses. Essa sutileza não foi captada pelos analistas da música sertaneja, ou pelos analistas do regime militar ou da questão agrária. Um dos poucos autores a dar importância aos direitos no campo foi Wanderley Guilherme dos Santos em seu clássico livro “Cidadania e Justiça”, de 1979 (SANTOS, 1979).

Seguindo seus passos, o cientista político José Murilo de Carvalho também

analisou o peso decisivo das leis agrárias em seu compêndio “Cidadania no Brasil: longo caminho” (CARVALHO, 2013).

Apesar de perceberem a força de tais medidas na

consolidação do regime, ambos demarcam que a cidadania nos anos 70 foi construída de cima para baixo, com pouca ou nenhuma participação popular, e que os direitos foram concessões dos ditadores.

Embora seja inegável que os limites desta ampliação da

cidadania civil fosse ditada pelos ditadores, não se pode esquecer que os artistas e seu público apoiavam o regime não pelos seus limites e deficiências, mas por ver efetivado por aqueles governantes suas próprias demandas, se não em sua totalidade, ao menos em grande parte. Como vimos, ao se analisar o discurso sertanejo, seus músicos e público se sentem partícipe de tal projeto, e não ignoravam que o governo realizava então uma medida longamente desejada pelos homens do campo.

36 “A Vida do Operário” (Teixeirinha), LP Doce coração de mãe, Copacabana, 1968, CLP 11530.

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Não se trata aqui de endossar o comportamento muitas vezes autoritário, antidemocrático, ufanista e repressor de grande parte da população, mas de tentar entender, e não necessariamente aceitar, sua lógica de pensamento. Analisar a música sertaneja como fonte para os anos ditatoriais nos ajuda a perceber que a sociedade não estava simplesmente “dominada” pelo governo autoritário, mas, e principalmente, estava em uma íntima relação com este. Não obstante, uma determinada historiografia sobre a ditadura tendeu a enfatizar muito a ruptura que a instauração da ditadura significou, adotando epítetos como “período de exceção”, “época do terror”, “anos de chumbo”, “ditadura das torturas”.37 A adoção destas nomenclaturas acabou transformando o apoio à ditadura em algo “bizarro”, apagando a normalidade e a frequência com que a apologia, ufanismo e sintonias de fato aconteceram. Poderia se perguntar se o “povo” estaria na mesma balada de seus compositores. Este pensamento, no entanto, remete novamente a ideia de que o povo viveu a ditadura como “sonífero”, e que a “alienação” era a forma de se “sobreviver” diante de um período de “terror”. É o contrário do que estou dizendo aqui. A grande quantidade de canções demonstra que esta estética nacionalista era uma forma artística vista como válida tanto por artistas, quanto pela “indústria cultural” e o público. Era uma forma de atuar no mundo e disputar seu lugar no meio sertanejo. Os ditadores obtiveram lucros simbólicos e políticos disso, é claro, mas não apenas repressivamente, mas construindo elos com as demandas de longa data. Os opositores do regime talvez não tenham percebido isso. O historiador Daniel Aarão Reis conseguiu ir no ponto principal do que está sendo dito aqui ao demarcar que a luta armada em nenhum momento conseguiu convencer a sociedade pois o povo não estava “alienado”, como diziam os guerrilheiros, mas estavam acordados e participativos: Os projetos ofensivos e revolucionários dos que pretendiam alcançar a libertação nacional e o socialismo com armas na mão não conseguiram reunir mais do que algumas poucas milhares de pessoas. Não encontrando ressonância na sociedade, foram destruídos sem apelação. De nada valeram as campanhas e as denúncias para desmacarar a ditadura, pois aquele povo parecia não querer despertar ou então estava bem acordado e fazia outros cálculos e avaliações (AARÃO REIS, 2001, p. 362)38

37 Devo a análise das palavras ao texto de AARÃO REIS, 2004. Para uma crítica desta memória historiográfica na música popular, ver: ALONSO, 2011. 38 Segundo Aarão Reis, baseado na pesquisa de Denise Rollemberg, as campanhas de denúncias empreendidas no exterior contra a ditadura ao longo dos anos 1970 prosseguiram na linha do desmascaramento até o fim do exílio, sem grandes sucessos no convencimento popular. ROLLEMBERG, 1999.

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Resta tentar entender que outros cálculos e avaliações são estes. Cálculos que, não raro, passam ao largo dos planos mais revolucionários das esquerdas da época, e dificilmente conseguem espaço para serem compreendidos, ou sequer analisados e trabalhados, na academia ainda nos dias de hoje. Curiosamente, não seria impossível que, se um eventual governo revolucionário à esquerda ascendesse no cenário político e de fato concretizasse os direitos sociais no campo, depois de vencer os militares na luta armada, é possível que obtivesse o mesmo respaldo de setores rurais que os ditadores conseguiram. Ambiguidades e paradoxos possíveis de um Brasil profundo, raras vezes analisado. A música sertaneja abre esta janela de compreensão do Brasil profundo.

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Resumo : A partir da produção musical ufanista do regime ditatorial pós-64, busca-se uma compreensão mais eficaz do dilema resistência e cooptação de variados setores da sociedade brasileira. O texto focará na produção musical de artistas rurais (caipiras e sertanejos) que cantaram odes à ditadura Médici, congratulando-se com a chegada da CLT ao campo, medida que garantiu muita popularidade aos ditadores. Questiona-se uma variada bibliografia historiográfica que, baseada no conceito de “hegemonia cultural da esquerda”, proposto seminalmente por Roberto Schwarz em 1969, buscou polarizar o debate cultural e apagou o entusiasmo da sociedade brasileira com o governo ditatorial. Exemplifica-se e problematiza-se parte desta enorme produção musical que se ufanou do regime e questiona-se o silêncio sobre este tipo de produção nos dias de hoje. Palavras-chave: música popular; ufanismo; ditadura; música sertaneja; MPB.

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