Diversificação Produtiva da Fumicultura no Alto Vale do Rio Tijucas: Opiniões e Expectativas de Fumicultores e Ex-Fumicultores

June 6, 2017 | Autor: Fernanda Maschietto | Categoria: Santa Catarina, Agricultura Organica, Fumicultura, Diversificação Produtiva
Share Embed


Descrição do Produto

Relatório de Pesquisa para o Master Agronomie et Agroalimentaire da Escola Superior de Agronomia de Montpellier realizado em Santa Catarina sob a coordenação do Cepagro

Diversificação Produtiva da Fumicultura no Alto Vale do Rio Tijucas: Opiniões e Expectativas de Fumicultores e Ex-Fumicultores

Fernanda Leopoldo e Silva Maschietto

Florianópolis, 18 de Julho de 2014

SUMÁRIO 1.

APRESENTAÇÃO .............................................................................................................................. 2 1.1.

Entrevistas............................................................................................................................... 2

2.

ÁREA DE ESTUDO ............................................................................................................................ 4

3.

CONTEXTUALIZAÇÃO SOBRE A AGRICULTURA E A FUMICULTURA NA REGIÃO ............................. 5

4.

RESULTADOS DAS ENTREVISTAS: FUMICULTORES ......................................................................... 6

5.

4.1.

O que pensam sobre diversificação produtiva ....................................................................... 6

4.2.

Experiências e tentativas com diversificação para complementação de renda ..................... 7

4.3.

Experiência com orgânicos ..................................................................................................... 8

4.4.

O que pensam dos ex-fumicultores que hoje produzem alimentos orgânicos ...................... 8

RESULTADOS DAS ENTREVISTAS: EX-FUMICULTORES .................................................................... 9 5.1.

Histórico da diversificação: estratégias, incentivos e etapas de transição ............................. 9

5.2.

Expectativas antes da diversificação e grau de satisfação.................................................... 10

5.3.

Expectativas em relação a diversificação de mais agricultores ............................................ 10

5.4.

Recomendações aos fumicultores interessados em realizar a diversificação ...................... 10

6. RESULTADOS DAS ENTREVISTAS: COMPARAÇÃO ENTRE RESPOSTAS DOS FUMICULTORES E EXFUMICULTORES ..................................................................................................................................... 11 6.1.

Motivações para a diversificação .......................................................................................... 11

6.2.

Desafios para a diversificação ............................................................................................... 11

6.3.

Fatores que podem favorecer a diversificação ..................................................................... 13

6.4.

Organizações identificadas como promotoras de diversificação ......................................... 14

6.5.

Rede de relacionamentos por conta da agricultura ............................................................. 14

6.6.

Renda além da lavoura ......................................................................................................... 14

6.7.

Planos visados para as unidades familiares nos próximos anos ........................................... 15

7.

ANÁLISE DOS RESULTADOS E CONCLUSÃO................................................................................... 15

8.

REFERÊNCIAS................................................................................................................................. 17

1

1. APRESENTAÇÃO Esta pesquisa foi desenvolvida durante atividade de estágio de mestrado entre os meses de Junho e Julho de 2014 na região do Alto Vale do Rio Tijucas, em Santa Catarina. O estágio foi possibilitado pelo Centro de Estudos e Promoção da Agricultura em Grupo (Cepagro) 1, que trabalha na região com apoio técnico para a diversificação produtiva da fumicultura e com a mobilização da organização dos produtores orgânicos através do Núcleo Litoral Catarinense da Rede Ecovida de Agroecologia2. Em Julho de 2014, o Cepagro deu início a um projeto de diversificação produtiva3 com 100 famílias fumicultoras do Alto Vale do Rio Tijucas (em comunidades nos municípios de Angelina, Leoberto Leal, Major Gercino e Nova Trento). Ou seja, durante dois anos, as famílias receberão assistência para realizar a transição da fumicultura para a produção de alimentos orgânicos a fim de integrar a Rede Ecovida de Agroecologia, que soma 3.000 famílias de produtores orgânicos na região sul do Brasil. Neste contexto, o objetivo desta pesquisa foi identificar e documentar as opiniões e expectativas dos fumicultores da região sobre a diversificação produtiva, com foco na agricultura orgânica, assim como o de ex-fumicultores que hoje produzem e comercializam alimentos orgânicos. Através de entrevistas, foi-se captando a percepção destes sobre a diversificação produtiva da fumicultura e a produção orgânica na região. Este material pode servir de base para as ações do projeto do Cepagro e para monitoramentos ao longo do tempo. 1.1. Entrevistas Foram feitas visitas e entrevistadas 20 famílias de agricultores familiares dos municípios de Major Gercino e Nova Trento, sendo 15 fumicultores e 5 ex-fumicultores4. Os 15 fumicultores estão entre as 100 famílias a serem contempladas pelo projeto do Cepagro, e os 5 ex-fumicultores fazem parte do grupo de 10 agricultores na região do Alto Vale do Rio Tijucas que são membros da Rede Ecovida. Com a ajuda de agricultores da região, os 20 entrevistados foram escolhidos de maneira à retratar pontos de vista diferentes, ou seja, priorizou-se entrevistar pessoas de famílias distintas, localidades tanto isoladas quanto mais próximas dos centros, agricultores mais jovens e mais velhos, em melhores e piores situações financeiras e, por fim, mais ou menos diversificados. Todos os entrevistados são originários do local onde vivem ou de comunidade próximas, e as famílias são proprietárias de suas terras. Estas variam de 10 a 68 ha, com média de 32,7 ha cada propriedade. O número de residentes variou entre 2 a 9 pessoas, dando em média 4 pessoas por propriedade. A idade dos entrevistados variou de 23 a 60 anos, com média de 37 anos. Município Nova Trento

Comunidade Rio Veado Barra Negra Boa Esperança Diamante Nova Galícia Pinheiral

Major Gercino

Total

Fumicultores 4 4 2 2 3 15

Ex-fumicultores 2 2 1 5

1

Mais informações sobre o Cepagro e seus projetos: www.cepagro.org.br Rede comprometida com o desenvolvimento da agroecologia. Mais informações: www.ecovida.org.br 3 Este projeto é financiado pelo Ministério Público Federal e está sendo realizado no âmbito do Programa Nacional de Diversificação em Áreas Cultivadas com Tabaco, do Ministério do Desenvolvimento Agrário, seguido da ratificação pelo Brasil da Convenção Quadro para Controle do Tabaco. Mais informações no link. 4 A maioria das entrevistas foi feita com os pais de família, mas em algumas estavam presentes também as esposas e filhos. Para fins de simplificação, durante este documento eles serão citados como “fumicultores” e “ex-fumicultores”. 2

2

3

2. ÁREA DE ESTUDO As 6 comunidades em que as entrevistas foram feitas estão situadas nas proximidades da Serra do Veado, que faz a divisa entre os municípios de Major Gercino e Nova Trento. A Serra do Veado pertence à formação das Serras do Leste Catarinense, marcada pelo Embasamento Cristalino, e apresenta o relevo acidentado caracterizado por vales profundos e encostas íngremes em serras subsequentes, que vão se tornando mais baixas de forma gradativa na direção do litoral. A comunidade do Diamante, mais à sudoeste das outras comunidades, encontra-se na transição entre as Serras do Leste e a Unidade Geomorfológica Planícies Fluviais, que são regiões mais planas, e na porção ocidental afloram rochas sedimentares da Cobertura Sedimentar Quaternária e Gonduânica (Rocha e Marimon, 2011). Na região, são caracterizados solos das ordens dos Argissolos, Cambissolos, e Litólicos (Embrapa, 2004). O clima é mesotérmico úmido, com verão quente. A altitude da área de estudo varia de 80 metros até 600 metros acima do mar, variando também a temperatura nestes diferentes pontos. A temperatura anual média da região é de 20°C. O relevo é originalmente ocupado por Floresta Ombrófila Densa pertencente ao domínio do bioma Mata Atlântica. Tal diversidade é restringida pelas altitudes acima de 400m. Nessa região encontram-se também remanescentes de Florestas de Araucárias Gonduânica (Rocha e Marimon, 2011). As áreas de vegetação nativa representam um mosaico de unidades em diferentes estágios sucessionais, devido à mudança do uso da terra e recorrentes desmatamentos e reflorestamentos com eucaliptos, muitas vezes para o uso da lenha nas estufas de secagem do fumo. Finalmente, a região é rica em nascentes de água, que representam parte dos recursos hídricos que formam a bacia do rio Tijucas. Em estudo feito com 64 famílias em 7 comunidades no Alto Vale do Rio Tijucas, foram citadas 240 nascentes de água dentro das unidades familiares (Pinto, 2014).

Fotos das comunidades visitadas: Acima, Boa Esperança e Rio Veado apresentam relevo bem mais acidentado que abaixo nas comunidades de Diamante e Barra Negra, onde se encontra criação de gado de leite.

4

3. CONTEXTUALIZAÇÃO SOBRE A AGRICULTURA E A FUMICULTURA NA REGIÃO A região sul do Brasil foi palco de movimentos migratórios vindos da Europa a partir de 1850, com o objetivo de criar núcleos de produção agrária de subsistência. As regiões mais altas de Major Gercino e a comunidade do Rio Veado, na divisa de Nova Trento com Major Gercino, foram colonizadas por imigrantes poloneses a partir de 1891 (Rocha e Marimon, 2011). Houve também uma onda de imigração italiana e alemã, que deixou respectivamente a viticultura e a criação de gado de leite como legado cultural e agrícola até os dias atuais, como se vê nas áreas mais planas de Major Gercino. A agricultura tradicional era feita em sistema de coivara, com o plantio de milho, feijão, arroz sequeiro, formentão, aipim, mandioca, cana-de-açúcar, batata-doce e batata-inglesa, e a economia agrícola expandiu-se com o ciclo de exploração madeireira na década de 1930 (Pinto, 2014). A partir da década de 60, a região foi alvo do interesse da indústria fumageira que promoveu a fumicultura inserindo as tecnologias de produção da Revolução Verde, como os fertilizantes químicos e mais tarde os herbicidas (Pinto, 2014). Outro aliado desta produção foi o sistema integrado, que se dá por contratos através dos quais a indústria fornece assistência técnica e insumos ao produtor e garante a compra da produção, determinando o preço ao final da safra. Apesar da garantia de compra que atraiu facilmente os agricultores, o controle de todo o sistema de produção por parte da indústria os coloca em um ciclo de subordinação, dependência e endividamento (Bonato, 2007). Hoje, a fumicultura predomina na região, contribuindo para que o Estado de Santa Catarina atinja a posição de segundo maior produtor nacional de tabaco, tendo por volta de 50 mil famílias na atividade e compreendendo aproximadamente 140 mil hectares, dentro de um país que recebe o título de segundo maior produtor e maior exportador de fumo no mundo (Afubra, 2007). Embora a produção de tabaco seja enaltecida como uma atividade que gera riqueza e desenvolvimento, a realidade é diferente. Uma pesquisa com mais de mil produtores de tabaco realizada pelo DESER (Departamento de Estudos Sócio-Econômicos Rurais) apontou que 73% deles gostariam de abandonar a fumicultura, seja pela sua baixa rentabilidade, altos danos à saúde ou excessiva carga de trabalho, mas não visualizam alternativas. A principal justificativa para seguir no fumo é a já citada garantia de mercado conferida pela indústria do tabaco (Bonato, 2007). O mesmo ocorre na região pesquisada, onde a maioria dos fumicultores planta fumo desde a infância. Os que decidem parar o fumo tentam se manter no campo com outros cultivos dificultados pela instabilidade de mercado ou vivem de aposentadoria, mas a grande maioria vai buscar emprego em outras cidades. No Alto Vale do Rio Tijucas, as condições precárias de trabalho e vida no campo e a falta de apoio governamental levam à um grande êxodo rural dos agricultores em direção aos grandes centros urbanos do estado (Rocha e Marimon, 2011). Hoje, Major Gercino tem uma população em declínio de 3.279 habitantes (IBGE, 2010) em uma área de 286 km². Existem aproximadamente 600 propriedades rurais onde são cultivados uva, fumo, milho, mandioca, oleaginosos e criadas aves, suínos e bovinos de corte e de leite. A principal economia do município é o turismo e a fabricação artesanal de vinhos e frisantes (PMMG, 2014). O município de Nova Trento tem uma população de 12.190 habitantes (IBGE, 2013) em uma área de 431 km² e, depois do turismo religioso, tem na agricultura a principal atividade econômica com os cultivos de fumo, mandioca, milho, feijão e o reflorestamento a base de eucaliptos e pinos (PMNT, 2014). Neste cenário, o projeto de diversificação produtiva do Cepagro busca dar suporte aos produtores que escolheram sair do fumo para que possam continuar na agricultura. Esse suporte se dá por meio do apoio técnico para a produção de alimentos que promova a saúde do produtor e do consumidor e respeite o meio ambiente, e do apoio na organização e abertura de canais de comercialização em conjunto com os produtores da Rede Ecovida de Agroecologia.

5

4. RESULTADOS DAS ENTREVISTAS: FUMICULTORES 4.1. O que pensam sobre diversificação produtiva Entre os 15 fumicultores, 11 apresentaram interesse em diversificar a produção, enquanto 4 se disseram satisfeitos em trabalhar apenas com o fumo. Alguns relatos estão a seguir. Tem interesse: “Tenho interesse em diversificar para dar mais renda. No momento não tenho interesse em diminuir o fumo. Primeiro tem que se adaptar as outras coisas para depois parar com o fumo. Tenho interesse em aprender a plantar noz pecã e castanha portuguesa.” (Rio Veado) “Nunca pode ir só numa plantação. Se uma não dá, a outra dá. Nós temos opinião de plantar verdura e diminuir o fumo. Sobre os orgânicos, depende do mercado.” (Nova Galícia) “Não dá para viver apenas de uma cultura. É importante ter algo mais além do fumo. Se tivesse outra opção que tivesse a garantia de venda do fumo, a gente diversificaria. Às vezes perco o sono, tá na hora de parar. A princípio não tem o que mudar, mas a gente pensa em coisa para mudar. Algo melhor que aparecer. Queremos arrumar uma segunda cultura para ajudar na renda.” (Pinheiral) “Só vou fazer mais um ano e vou parar o fumo, quando a última parreira começar a produzir. Se não tivesse uva, estaríamos no fumo. O que fico pensando é sair do fumo e plantar outra lavoura. Pensando também no futuro dos filhos. Fico pensando muito na batata doce ou cebola que vão muito bem no comércio, só que nunca plantei. Mas para isso tenho que achar os compradores certo. Tudo que se come, vende. Tenho muita vontade de plantar orgânico, pois faz bem à saúde.” (Pinheiral) “Se não fosse a estufa de fumo hoje, eu ficaria só no leite e batata ou outra coisa. Mas vou fazer uso deste capital que tenho. Agora já tá tudo ali, pronto, vamos usar. Mas já temos quase 50 anos e não teríamos condições de tocar o fumo, teríamos que procurar outra alternativa. Se eu for trabalhar com hortaliças, seria na estufa, como no Rio Veado. Aquilo seria uma praticidade para cultivar no enxuto, com gotejamento, produzindo o ano todo e controlando a temperatura.” (Barra Negra) “Pode ser uma boa. Vou parar o fumo. Esse ano vou plantar batata salsa. Quem sabe se a batata salsa não der certo, plantamos outra coisa.” (Diamante)

Não tem interesse: “Não tenho interesse em participar. Estou muito satisfeito com o fumo, com a renda e a segurança que o fumo traz. Agora, por exemplo, o contrato de fumo mudou de 1 para 5 anos de garantia de compra.” (Rio Veado) “Já ouvi falar sobre isso, mas eu sou mais o fumo. Se fizer fumo e verdura ao mesmo tempo, não dá, muito trabalho.” (Rio Veado) “Hoje o fumo é a única coisa que dá dinheiro. Não compensa vender verduras. Tem que ter quantidade, senão não funciona. Se você tem uma atividade muito grande, você não pode correr atrás de coisa miúda. É uma coisa ou nada. Para fazer várias coisas tem que ter mão de obra e tempo.” (Nova Galícia) “Não tenho interesse, não dou conta. Não tem mão de obra. O fumo já era para ter parado, é muito serviço. Mas meu marido fala que somos viciados no fumo, não conseguimos parar! Sou contra verdura, tem altos e baixos. Teria até caminhão para ir até o CEASA, mas não sou muito chegada. Também não quero começar agora, estamos sozinhos.” (Diamante)

6

4.2. Experiências e tentativas com diversificação para complementação de renda Dos 15 fumicultores, são 14 que tem o fumo como renda principal. Mas já são 13 que buscam outras formas de renda para complementar o fumo, diferentemente de alguns anos atrás em que eram estritamente produtores de fumo. No Rio Veado, 3 fumicultores estão investindo no eucalipto. Já em Major Gercino, são 8 fumicultores entrevistados que estão começando a plantar batata salsa para complementar a renda; alguns começaram há 2 anos, outros acabaram de começar e ainda não venderam a primeira safra. Outras opções de diversificação são a uva e o gado de leite, principalmente em Major Gercino, onde este tipo de agricultura já existe desde a época da colonização do território. Dois agricultores continuam a produzir o queijo colonial (queijo não pasteurizado) informalmente. Nos últimos anos, alguns também tiveram experiência de diversificação com repolho e gengibre, mas que não se sustentou. Eucalipto: “A Epagri incentivava a plantar eucalipto. Faz uns 15 anos, veio dinheiro de fundo perdido para quem queria começar a plantar. Na época tava bom, agora baixou um pouco o que ganha com o eucalipto, mas ainda vale a pena, dá para tirar um dinheirozinho. ”(Rio Veado) “No eucalipto sempre tem, o ano inteiro, e não dá despesa, vive-se mais tranquilo.” (Rio Veado) Uva: “Comecei a produzir uva faz 2 anos por incentivo da Epagri, para fazer suco. Fiz curso e está dando mil maravilhas. Peguei empréstimo no banco para fazer o investimento inicial. A motivação foi porque abriu-se a fábrica de sucos, e tem também fábrica na Nova Galícia. Estou plantando sem veneno e está indo bem.” (Rio Veado) “Com a uva foi um investimento grande e ninguém tinha coragem de investir. Foi um cara de Nova Trento que veio, queria uva para indústria de vinho e sucos Girola. Aí um colono vai aprendendo do outro. Depois de 3 anos, quando começou a produzir e foi possível nos manter um pouquinho, começamos a diminuir o fumo. O preço da uva está estável desde os 8 anos que começamos e eles compram tudo. A uva é bem equilibrada, por isso deu pra diminuir o fumo.” (Pinheiral) Batata salsa: “Chegaram uns comerciantes do Paraná e perguntaram – porque vocês não produzem coisas para comer? Mas o feijão e milho davam pouquinho de renda, o aipim também e demora dois anos para colher. Aí eles trouxeram mudas para os colonos e todo mundo começou a plantar e a batata salsa vende super bem. Outra vantagem é que não estraga. Dá para esperar para vender mais tarde, quando o mercado está mais favorável.” (Pinheiral) “Um vizinho falou para o outro, veio da comunidade do Rio Fortuna, em Angelina. O ano que vem o preço vai diminuir, tem muita oferta. A vantagem é que se não vender, pode usar como trato para os animais, e o fumo não. Outra coisa é que decidimos pela praticidade, não precisa limpar, secar, classificar, como fazemos com o fumo. É só colocar no caminhão e vai embora.” (Barra Negra) “A batata salsa eu planto, mas não tenho coragem de colocar na boca, tem muito mais veneno que o fumo. Aqui, quando um vai bem no fumo, no ano seguinte tem mais seis plantando. Com a batata está assim: foi bom e todo mundo começou a plantar, mas não sei até quando vai estar bem.” (Barra Negra) Gado de Leite: “Trabalhamos com o gado de leite antes mesmo do fumo, é a nossa renda principal. Antes fazíamos o queijo colonial, mas com a fiscalização, hoje só vendemos o leite in natura para 7

um laticínio em Biguaçu. Para fazer o produto transformado é muita burocracia. Agora tem trator e é mais prático para trabalhar com o silo para as vacas, senão, não faríamos. Mas esse trabalho é uma prisão, um compromisso que não pode falhar, todos os dias e noites, e o laticínio paga merreca.” (Barra Negra) Repolho: “Começamos a plantar para uma renda a mais, mas não tinha comerciante e não conseguimos vender. Não tem telefone então fica difícil. Mas a produção foi 100% boa.” (Pinheiral) “Já tentamos plantar repolho para fazer uma renda para o inverno, mas não tinha comprador e foi tudo para as vacas.” (Nova Galícia) Gengibre: “Em 2004, tentamos o gengibre em 1 ha e fizemos dinheiro com isso, mas dependia de exportação. Foi um pessoal de Curitiba que começou. De 3 anos, 2 foram bons. Foi uma época de vacas gordas – o fumo junto com o gengibre. Durante o fumo, não tem muito trabalho com o gengibre, tem despesa com adubo e pouco serviço. Teve gente que ganhou tudo e perdeu tudo. Investiu muito alto e não teve retorno. Foi um problema de venda, as exportações caíram.” (Pinheiral) Fora da agricultura, a complementação da renda vem da aposentadoria, que é vista como uma boa quantia pelos agricultores. Nas comunidades de Major Gercino, também foram mencionados serviços com caminhão e empregos na cooperativa de energia, escola ou prefeitura.

4.3. Experiência com orgânicos Um dos fumicultores entrevistados está plantando uva orgânica em sua propriedade, incentivado por um produtor da região que participa da Rede Ecovida. Dos 15 fumicultores entrevistados, 14 tem uma horta onde plantam verduras para consumo próprio, e 12 disseram que não usam produtos químicos na horta por motivos de saúde. Muitos dizem “detestar os venenos”. Há uma visão comum de que para produzir em grande quantidade, ou seja, além da horta, é necessário o uso de agrotóxicos. A maioria deles diz que seria preferível trabalhar sem agrotóxicos na lavoura, mas não acreditam que seja possível controlar as pragas sem estes produtos e temem ter mais serviço e “ter que voltar a trabalhar com a enxada”.

4.4. O que pensam dos ex-fumicultores que hoje produzem alimentos orgânicos Dos 15 fumicultores entrevistados, 5 desconheciam agricultores na região que produzem orgânicos. Estes 5 agricultores são das comunidades de Barra Negra e Diamante. Os outros 10 comentaram os desafios de trabalhar com verduras pela instabilidade de preços e o risco de perdas na produção; pelo alto custo de investimento que é necessário para a parreira de uva, e pela maior exigência de trabalho quando não se usa os agrotóxicos. Reconheceram também o valor agregado do produto orgânico, a vantagem de fazer bem à saúde do produtor e do consumidor e a oportunidade de mercado que há com a Coopertrento e com a venda dos produtos em escolas, que logo deve exigir mais produção orgânica.

8

5. RESULTADOS DAS ENTREVISTAS: EX-FUMICULTORES Os 5 ex-fumicultores entrevistados participam do Núcleo Litoral Catarinense da Rede Ecovida de Agroecologia através de um associação local chamada Associada, fundada em 2011, e que abrange 10 produtores agroecológicos e duas agroindústrias de pequeno porte da região de Major Gercino, Nova Trento e Leoberto Leal. Eles vendem a produção orgânica através da Coopertrento (cooperativa de alimentos de Nova Trento) para o mercado institucional (merenda escolar através do PNAE - Programa Nacional de Alimentação Escolar), feiras públicas, restaurantes, mercados domésticos, e distribuidoras (incluindo espaço próprio para os orgânicos no CEASA de Florianópolis).

5.1. Histórico da diversificação: estratégias, incentivos e etapas de transição A história da diversificação produtiva de cada família tem suas especificidades, mas foram bastante influenciadas umas pelas outras. A tabela abaixo resume um pouco as estratégias de cada família, seguido de um breve relato de suas histórias. As motivações para a diversificação serão apresentadas na seção 6.1. Famílias

Anos sem fumo

Estratégia de diversificação produtiva

A. Will (4 p.) Rio Veado

14

Criação da CWL

Al. Will (6 p.) Rio Veado

5

Produção de olerícolas e serviços para CWL

Storlacsk (6 p.) Pinheiral

25

Vitivinicultura

M. Battisti (4 p.) Boa Esperança

10

Produção de eucalipto e bananas

A Battisti (2 p.) Boa Esperança

4

Produção de eucalipto, frutas e verduras

Etapas para diversificação agroecológica Transição do fumo à Transição para outra cultura orgânicos Direta: Pararam o fumo Depois fizeram Iniciativa no mesmo ano que transição com própria inaugurou CWL. apoio do Cepagro. Demanda de Contínua: Iniciaram a Depois fizeram produção da produção de verduras transição com CWL concomitante ao fumo. apoio do Cepagro. Vizinhos bem Direta: Pararam o fumo Depois fizeram sucedidos e iniciaram a viticultura transição para com com apoio de renda biodinâmico com viticultura externa. apoio IBD. Contínua: Iniciaram a Desde o início Incentivo produção de bananas produziram familiar concomitante ao fumo. bananas orgânicas. Direta: Pararam o fumo Desde o início e se dedicaram ao produziram frutas e Incentivo eucalipto. Depois verduras orgânicas. familiar iniciaram a produção de frutas e verduras. Incentivo para diversificar

A história da diversificação produtiva da família Will tem como base a iniciativa pioneira e visão do Sr. Antonio Will que, ao plantar mudas de pessegueiros e ameixeiras doadas por um prefeito, decidiu vender esses frutos e parar o fumo. Devido à distância até a cidade, as frutas chegavam estragadas até o consumidor, então surgiu a ideia de criar uma pequena indústria de conservas, a chamada Conservas Will (CWL) no ano 2000. Para a transição para os orgânicos, houve apoio técnico do Cepagro e apoio financeiro do Cepagro e da Arquidiocese de Florianópolis na compra de materiais para a agroindústria. No início de 2012, o Sr. Antonio reativou a Coopertrento e desde então também é responsável pela logística e comercialização de alimentos em conserva e in natura nos mercados e escolas. A criação da CWL foi um grande incentivo para sair da fumicultura entre os familiares do Sr. Will. Foram 4 famílias, 2 irmãos e 2 sobrinhas e suas respectivas famílias, que pararam o fumo para produzir verduras para a CWL e Coopertrento ou para trabalhar dentro destas organizações. Todos eles fazem parte do grupo Associada.

9

A história dos Storlacsk é diferente. Eles pararam de uma vez com o fumo e o pai da família foi trabalhar na cidade por 10 anos. Aos poucos, foram investindo na vitivinicultura e só voltaram à agricultura como atividade principal quando a uva começou a dar renda estável. Em 2009, começaram a produzir de acordo com o método biodinâmico por incentivo do Instituto Biodinâmico (IBD), que passou a comprar a uva in natura. Em 2012, foram convidados por membros da Associada para fazer parte da rede Ecovida e vender suco de uva orgânico. Além da agricultura, um filho trabalha na prefeitura de Major Gercino. No caso da família Battisti, eles já tinham renda com o eucalipto enquanto eram fumicultores. Começaram a produzir bananas e foram dois anos até parar com o fumo e o eucalipto, conforme iam ganhando mercado com as bananas. Já o sobrinho, parou de uma vez com o fumo para produzir apenas eucalipto e faz um ano que começou a plantar frutas e verduras orgânicas. A participação deles na rede Ecovida foi incentivada por membros da Associada. Além da agricultura, as esposas trabalham com a indústria de pequeno porte Doces e Salgados Battisti, e um dos Battisti é vereador.

5.2. Expectativas antes da diversificação e grau de satisfação A diversificação foi um grande desafio para estes produtores que tiveram que ser inovadores para abandonar o fumo. Eles relatam que não sabiam ao certo no que iam dar seus esforços, já que não tinham experiência no novo mercado e não havia muitos outros produtores que haviam feito o mesmo. As expectativas mencionadas foram: conseguir ter renda suficiente para se manter na nova atividade e ter um padrão de vida melhor do que levavam com o fumo, incluindo mais saúde. No caso da agroindústria CWL, a vizinhança dizia que seria complicado achar mercado para os produtos por causa da concorrência. Esta dificuldade para achar mercado não sucedeu como esperavam. As conservas tiveram uma boa aceitação no mercado e atualmente o problema é o oposto. Há mais demanda do que oferta e há uma falta de produção de olerícolas na região. Apesar dos desafios, todos responderam que as expectativas foram alcançadas, trazendo um melhor padrão de vida, saúde, e renda suficiente, ou quase suficiente, para se manter no campo. O grau da satisfação vai de muito satisfeitos (3 agricultores) à médio satisfeitos (2 agricultores). Nenhum se definiu como pouco satisfeito. Todos reconhecem que estão em um processo contínuo de melhorias, sempre trabalhando para aprender novas práticas de manejo, aumentar a produção de orgânicos, e incluir mais agricultores orgânicos no grupo.

5.3. Expectativas em relação a diversificação de mais agricultores Todos estão de acordo que, quanto mais gente produzindo, melhor para a venda dos orgânicos:   

Haverá maior oferta de alimentos e “compradores aparecem quando há produtos”. Haverá maior frequência no transporte dos produtos até o CEASA e, portanto, mais vendas. Haverá mais produção para a CWL, que poderá comprar os alimentos nas proximidades. 5.4. Recomendações aos fumicultores interessados em realizar a diversificação

    

“Começar com pequenas áreas. Não se consegue 1 ha na primeira instância.” “Não pensar em fazer tudo achando que vai dar conta. Começar com área pequena para fazer experiência e, se um dia quiser sair do fumo, saber como funciona, senão desanima.” “Misturar, plantar coisa junto, para ir se acostumando.” “Não pode pensar somente no quanto vai ganhar no final, isso é ter olho grande. Quem pensa assim, no final desiste.” “Tem que ter paciência para ir do convencional para o orgânico.” 10

   

“Seguir a produção orgânica. É mais difícil, mas é mais valorizada e tem mais garantia.” “Mesmo se não for fazer orgânico, fazer um produto mais limpo e diminuir os agrotóxicos.” “Começar a participar de um grupo como o dos orgânicos para se informar sobre o que pode vender e para quem.” “Buscar assistência técnica.”

6. RESULTADOS DAS ENTREVISTAS: COMPARAÇÃO ENTRE RESPOSTAS DOS FUMICULTORES E EX-FUMICULTORES 6.1. Motivações para a diversificação Quando questionados, quais as motivações para a diversificação, os fumicultores responderam:         

Ter mais uma fonte de renda além do fumo Começar aos poucos uma nova atividade para tentar substituir o fumo à longo prazo Plantar o fumo faz mal para a saúde do produtor Há muito serviço com o fumo Há pouca mão de obra para o fumo O fumo não produz como antigamente A despesa com o fumo é alta Insatisfação com o sistema de classificação do fumo e pagamento baixo Plantar verduras porque sempre teve vontade

Em relação aos ex-fumicultores, as motivações foram muito parecidas. Um deles parou o fumo por motivos econômicos, enquanto os outros disseram que estavam satisfeitos com a renda do fumo, porém tinham problemas de saúde, muito trabalho, falta de mão de obra e, além disso, o fumo não era alimento. A grande diferença é que no caso dos ex-fumicultores, o objetivo inicial sempre foi parar o fumo e não apenas ter uma renda complementar à fumicultura – motivação mais citada pelos fumicultores. Quanto às motivações dos ex-fumicultores para plantar alimentos de forma orgânica, estas foram prioritariamente de caráter econômico já que havia demanda de compradores por esta produção, o valor agregado era maior e havia a credibilidade de uma certificação. Além disso, a motivação de ter uma forma de vida mais saudável e produzir alimentos saudáveis também foi levada em conta.

6.2. Desafios para a diversificação Quando questionados os fumicultores sobre os desafios para plantar outros cultivos além do fumo, a primeira coisa que todos falaram foi ter a garantia de venda (ou compra certa) como existe na relação do produtor com a fumageira que, mesmo que o pagamento daquele ano venha baixo, eles sabem que receberão uma quantia no final da safra. Outro fator bastante mencionado foi a falta de mercado na região e a distância com os centros consumidores. Os ex-fumicultores mencionaram desafios presentes no processo de diversificação mas que já foram superados e desafios atuais. Entre estes, falou-se da dificuldade de ter a propriedade 100% orgânica e desafios atuais para as agroindústrias de pequeno porte, já que o governo não faz distinção entre pequenas e grandes e não existe linha de capital de giro para estas organizações, assim como existe para o pequeno produtor que quer investir na lavoura. Os desafios em comum listados por fumicultores e ex-fumicultores estão marcados com asterisco (*) na tabela abaixo:

11

DESAFIOS

Técnicoprodutivos

Econômicos

Comerciais

Sociais

Fumicultores

Ex-fumicultores (desafios superados e desafios atuais)

            

Terreno é muito inclinado Falta espaço para lavoura, áreas protegidas pelo Ibama Verão seco e falta de irrigação Clima desfavorável para certos cultivos Necessidade de mão de obra Perdas na produção com verduras Falta de seguro para produção de verduras Orgânico exige mais serviço Orgânico exige mais mão de obra Orgânico produz menos Trabalhar sem agrotóxicos é mais difícil Impossibilidade de combater as doenças sem agrotóxicos Desconhecimento das práticas orgânicas e quais insumos utilizar

 



Investimento inicial grande sem garantia do retorno (na viticultura)



Falta de dinheiro para investir (caso da viticultura)

       

Ter garantia de venda Falta de comprador/ mercado na região Distância das cidades, potenciais mercados e de Florianópolis Dificuldade para transportar os produtos, má condição das estradas Receber preço justo pelo produto vendido Ausência de prazo para receber Preço instável das verduras no mercado Burocracia para vender laticínios

    

Falta de comprador na região (caso da viticultura)* Perdas de mercado, ex: cheque sem fundo Falta de experiência no mercado Alto custo de produção para agroindústria familiar Falta de continuidade da produção na região para abastecer agroindústria Baixa frequência do transporte até comércio, para aumentar vendas e garantir qualidade da verdura

   



  

Falta de conhecimento sobre o novo cultivo Perdas na produção devido a secas ou geadas e ausência de seguro* Necessidade de mão de obra* Perdas na produção devido a eventos climáticos* Isolamento do terreno para evitar contaminação do vizinho Formação e assistência técnica aos produtores que ainda estão em transição

Começar algo do zero Incerteza sobre êxito do processo Incerteza sobre o que iam vender

12

6.3. Fatores que podem favorecer a diversificação A pergunta feito aos fumicultores foi sobre quais fatores poderiam ser favoráveis à um processo de diversificação da fumicultura, enquanto que aos exfumicultores a pergunta foi sobre quais fatores favoreceram o processo de diversificação conforme suas experiências. As respostas estão abaixo:

FATORES FAVORÁVEIS

Fumicultores  

Técnicoprodutivos

   



Plantio de culturas na época do ano em que não há muito trabalho com o fumo Plantio de culturas no inverno, porque verão é muito seco e não tem irrigação Mão de obra disponível Apoio técnico Aprender a combater pragas sem usar agrotóxicos Manejo, nova tecnologia ou produto para ajudar no orgânico

      

Apoio dos vizinhos que compartilhavam conhecimento Cursos da Epagri sobre outras culturas e como beneficiar alimentos Conhecimento da técnica de produção, sem necessidade de apoio técnico Apoio do Cepagro e reuniões com o grupo Associada Clima favorável para a cultura escolhida Terreno não tão acidentado Terreno isolado evitou perigo de contaminação da produção orgânica com agrotóxicos vizinhos

   

Renda fora da lavoura permitiu investir na agricultura Investimento inicial com 3 sócios da família para construir o primeiro galpão Apoio financeiro da Arquidiocese de Florianópolis e do Cepagro Houve apoio do Pronaf para o começo da indústria

 

Existência do grupo Associada na região é visto como uma garantia de venda Existência da Conservas Will e Coopertrento e a consequente demanda por produção

 

Contatos e boas relações atraíram financiadores e apoio técnico de ONGs Força de vontade

Econômicos



Ter benefícios ou incentivos econômicos para diversificar o fumo Ter insumos para plantar (“assim como há no fumo”)

Comerciais

  

Ter garantia de venda Presença de compradores Parceria com cooperativa (a Coopertrento foi citada)

Sociais

Ex- fumicultores

13

6.4. Organizações identificadas como promotoras de diversificação Entre os 15 fumicultores, 10 não reconhecem nenhuma ação de diversificação promovida por organizações, os outros 5 reconhecem o CEPAGRO, a UNITAGRI e a EPAGRI. Além destas organizações, os comerciantes que vem em busca de produtos alimentícios também foram reconhecidos como promotores de diversificação produtiva, pois incentivam o agricultor a produzir outras coisas que poderão trazer renda. Entre os 5 ex-fumicultores, as organizações reconhecidas são o CEPAGRO em uma atuação já de alguns anos na região e, desde maio de 2014, a UNITAGRI. Em relação aos fumicultores, a fumageira promove o cultivo de milho e feijão na safrinha com o objetivo de rotacionar culturas diferentes no solo, e eucalipto para o uso da lenha nas estufas de secagem do fumo. O milho é comumente usado para a alimentação dos animais da propriedade, e alguns tentam vender o feijão, mas os preços não são satisfatórios.

6.5. Rede de relacionamentos por conta da agricultura Entre os fumicultores, as trocas de informação sobre práticas agrícolas, novos cultivos e agricultura em geral se dão principalmente entre familiares e vizinhos. Sobre o fumo, recebem informações durante a visita do técnico da fumageira 2 vezes por mês. Há um contato menos frequente com a Epagri para assessorar sobre outras culturas. A participação em reuniões é muito rara. Apenas 1 agricultor mencionou participar da reunião da Coopertrento, Afubra e sindicato. E este e mais 2 mencionaram reunião recente com a Unitagri sobre diversificação produtiva na fumicultura. Um dos entrevistados é secretário da agricultura do município de Major Gercino, presidente de uma associação de produtores de leite e também participa da Associação dos Agricultores Pecuaristas de Major Gercino. Entre os ex-fumicultores entrevistados, apesar de serem apenas 5 agricultores, a quantidade de grupos e organizações citadas foi muito maior que a dos fumicultores. Além dos familiares e vizinhos, foram elencados:           

Agroindústria Conservas Will Agroindústria Vill Sucos Ambac – Associação do Baixo Capivara Associação Associada da Rede Ecovida de Agroecologia Núcleo Litoral Catarinense da Rede Ecovida de Agroecologia Associação da região (vai além do grupo Associada, não são só os orgânicos) Cepagro Coopertrento Coopermajor (está sendo criada) Epagri Sindicato dos trabalhadores rurais

Os produtores orgânicos membros da Associada se reúnem a cada 15 dias e a participação de todos é obrigatória, prática difundida entre os grupos da Rede Ecovida. Existem também encontros que reúnem todos os grupos do Núcleo Litoral Catarinense da Rede e também uma reunião com toda a Rede Ecovida de Agroecologia.

6.6. Renda além da lavoura Entre os fumicultores, 4 mencioraram renda além da lavoura com emprego na escola do Pinheiral, secretaria de agricultura de Major Gercino, cooperativa de energia de Major Gercino, serviço de transportes com caminhão e aposentadoria. Os outros 11 fumicultores tem renda além 14

do fumo, mas esta se limita à lavoura, ou seja, a renda vem da comercialização do eucalipto, uva, batata salsa e leite, mas não participam da transformação ou entrega destes produtos. Já no caso dos ex-fumicultores entrevistados, todos têm renda além da lavoura. Parte dos familiares trabalha nas agroindústrias Conservas Will ou Doces e Salgados Battisti em atividades como a transformação e industrialização dos alimentos, ou com o transporte dos alimentos e o gerenciamento da Coopertrento. Outras atividades citadas foram a de vereador e emprego na área de agricultura da prefeitura local.

6.7. Planos visados para as unidades familiares nos próximos anos Apesar do interesse de 11 fumicultores na diversificação produtiva, os planos continuam fortemente ligados à fumicultura, com espaço para outros cultivos a fim de complementar a renda. Entre os 8 fumicultores que começaram a produzir batata salsa em Major Gercino, 7 estão dependendo do resultado desta produção nos próximos anos para ver se vale a pena continuar com a batata salsa e, em alguns casos, diminuir o fumo. Um jovem agricultor mencionou que, se o preço pago na batata não for satisfatório, ele gostaria de arrumar serviço fora ou fazer uma faculdade. Apenas 1 dos 8 está decidido a parar com o fumo no próximo ano e pretende continuar com a uva, batata salsa e continuar a diversificar. Outro fumicultor da comunidade do Rio Veado, que também tem produção diversificada com uva e eucalipto, pretende continuar a diversificar até ver resultados financeiros positivos com outras culturas, para poder ir diminuindo com o fumo. Dos 4 fumicultores que disseram não ter interesse em diversificar, 2 pretendem continuar no fumo, enquanto 1 pensa em comprar um trator e um caminhão e viver do eucalipto, e 1 pensa em trabalhar na construção civil caso desista do fumo. Entre os ex-fumicultores e atuais agricultores orgânicos, há um consenso em aumentar a produção orgânica e continuar a diversificar. Eles acreditam em uma contínua valorização dos orgânicos e “com o crescimento da demanda por orgânicos, tudo indica que o governo vai mandar mais projetos e incentivos para esse ramo”. Sendo assim, acreditam que haverá mais opções de venda. “Só a Coopertrento é muito pouco, é necessário mais investimento”, diz um agricultor. Os viticultores orgânicos do Pinheiral pretendem melhorar a unidade de produção e investir na fabricação de vinho colonial e fazer geleia orgânica. O objetivo é agregar valor. Seus planos incluem a entrada para licitação para vender os produtos como merenda escolar.

7. ANÁLISE DOS RESULTADOS E CONCLUSÃO Ao analisar os resultados das entrevistas, percebe-se que os fumicultores estão interessados em diversificar a produção e gostariam de diminuir o fumo, mas são muitos os desafios elencados. O que se destaca é uma insegurança generalizada quanto à garantia de mercado de outros cultivos e quanto às práticas agrícolas sem insumos químicos proposta pela produção orgânica de alimentos, fazendo com que muitos prefiram continuar na praticidade do sistema integrado da indústria fumageira, apesar de seus defeitos. A primeira insegurança está no nível da comercialização e envolve más experiências com a produção de outros cultivos na região devido à falta de compradores, instabilidade dos preços, e a distância dos centros consumidores. Ao mesmo tempo, eles arriscam a diversificação, à exemplo da batata salsa. Entretanto, os próprios fumicultores avaliam que a produção da batata não é sustentável. Ela segue as mesmas linhas da experiência com o gengibre, que vendeu bem por dois anos e depois fracassou. Os agricultores já dizem que o preço da batata tem caído, provavelmente pelo constante aumento da oferta de produção na região. A lição a ser tirada destas experiências é que não adianta sair de uma monocultura como o fumo e mudar para outra. Para haver segurança 15

na produção e comércio, é recomendável ter uma diversidade de cultivos; dessa maneira, pode-se ter produção o ano inteiro e, caso uma cultura não alcance uma boa safra, há outras alternativas. A segunda insegurança está no nível da produção, quando se fala de diversificar para a produção de verduras e, possivelmente, orgânicas. Os desafios mais citados são o aumento da carga de trabalho, a instabilidade da produção de verduras, e a falta de conhecimento sobre o manejo agroecológico, além dos mitos de que a agricultura orgânica não é possível ou produz menos. O isolamento das comunidades, tanto pela distância quanto pela precariedade das estradas, é um agravante destas inseguranças. A interação e a troca de informações de forma organizada entre os agricultores se torna imprescindível neste cenário, para que eles possam mobilizar esforços conjuntos para a região. Infelizmente, a maneira como a indústria fumageira trabalha com os agricultores promove o individualismo e desfavorece a comunicação entre eles. Por outro lado, o caminho da diversificação produtiva através da promoção da agricultura orgânica e da posterior inclusão dos agricultores na Rede Ecovida de Agroecologia responde justamente à essas duas grandes inseguranças e promove a comunicação. Afinal, a agroecologia vai além da produção orgânica e tem na sua base conceitual princípios como a auto-suficiência energética e de produção de insumos; promoção do associativismo; implantação local de pequenas unidades de beneficiamento de alimentos; e o estímulo à comercialização direta (Sagaz, 2006). Na região do Alto Vale do Rio Tijucas, o grupo Associada responde ao problema da comercialização ao apresentar opções de mercado para os orgânicos com as 2 agroindústrias, CWL e Vill Sucos, e através da Coopertrento para o transporte e a venda em mercados institucionais, privados e distribuidoras em centros urbanos. Para complementar, está se formando a Coopermajor, que é mais um indicativo de que a economia local está se fortalecendo. Assim como foi mencionado pelos membros da Associada, quanto maior a quantidade de produtores orgânicos na região, mais compradores aparecerão. Outras vantagens do associativismo é poder organizar em grupo a quantidade e a variedade da produção em função da demanda do mercado, além de não depender de atravessadores, o contrário do que acontece hoje com a produção do fumo ou da batata salsa. Esta mesma vantagem de trabalhar em grupo responde aos desafios da produção orgânica na lavoura. Os produtores tem mais oportunidade de trocar informações entre si, e ajudar uns aos outros. Isso não substitui a importância da formação e apoio técnico que estão na base para a transição agroecológica, mas é importante lembrar que na agroecologia o conhecimento é gerado na fusão dos conhecimentos do agricultor e do técnico, e o intercâmbio entre os agricultores pode servir para diminuir a dependência destes para com a presença de técnicos no campo. Antes de concluir, outro ponto relevante que veio à tona com as entrevistas foi o fato de que todos os ex-fumicultores, atuais produtores orgânicos, tem renda além da lavoura. A complementação de renda através das agroindústrias ou outros serviços no meio rural também é interessante de ser considerada em ações de diversificação da fumicultura visando o desenvolvimento local, assim como mecanismos de pagamento para a conservação ambiental. Finalmente, qualquer situação de mudança gera insegurança, e a diversificação da fumicultura não foge à regra. Quando os fumicultores falam que os fatores que podem favorecer a diversificação é a garantia de mercado ou a oferta de insumos para plantar, o que eles buscam é o pacote tecnológico do fumo formatado para a agricultura orgânica, mas é preciso comprender que esta tem outra lógica. Segundo Weid (2001), “a agroecologia exige desenhos específicos de sistemas produtivos para cada situação específica de cada agroecossistema e, até, de cada agricultor” e completa Burg (2006) “é, portanto, uma abordagem intensiva no uso de conhecimento em que ele não pode ser produzido de forma homogênea para uso maciço. Trata-se, desta forma, de uma perspectiva oposta àquela dos “pacotes tecnológicos””.

16

8. REFERÊNCIAS AFUBRA – Associação dos Fumicultores do Brasil. Dados da Fumicultura na Região Sul e Câmara Setorial do Fumo. Disponível em: www.afubra.com.br BONATO, Amadeu. Perspectivas e desafios para a diversificação produtiva nas áreas de cultivo de fumo – a realidade da produção de fumo na região Sul do Brasil. Curitiba: DESER. 2007. BURG, Inês. A construção do conhecimento em Agroecologia em: LOVATO, Paulo Emílio; e SCHMIDT, (Orgs.). Agroecologia e sustentabilidade no meio rural: experiências e reflexões de agentes de desenvolvimento local. Chapecó: Argos, 2006. EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA - EMBRAPA. Solos do Estado de Santa Catarina. Boletim técnico N. 46. Rio de Janeiro: Centro Nacional de Pesquisa de Solos, 2004. IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em: www.ibge.gov.br PINTO, Marina Ferreira Campos. Redes de troca de sementes e capacidade adaptativa de sistemas agroecológicos das encostas da Serra Catarinense. UFSC, 2014. PMMG - Prefeitura Municipal de Major Gercino. Disponível em: http://www.majorgercino.sc.gov.br PMNT - Prefeitura Municipal de Nova Trento. Disponível em : http://www.novatrento.sc.gov.br ROCHA, Isa de Oliveira; e MARIMON, Maria Paula Casagrande (organizadoras). Diagnóstico socioambiental do alto vale do Rio Tijucas (Santa Catarina): algumas proposições de planejamento territorial – Florianópolis : Ed. da UDESC, 2011. SAGAZ, Danilo. A comercialização de alimentos ecológicos e a sensibilização do público urbano para a Agroecologia em: LOVATO, Paulo Emílio; e SCHMIDT, (Orgs.). Agroecologia e sustentabilidade no meio rural: experiências e reflexões de agentes de desenvolvimento local. Chapecó: Argos, 2006. WEID, J.J. Qual é a estratégia para o desenvolvimento rural? Rio de Janeiro: AS-PTA, 2001. .

17

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.