Do texto para a tela tradução intersemiótica da morte de Sherlock Holmes

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XIX Encontro de Iniciação à Pesquisa Universidade de Fortaleza 21 à 25 de Outubro de 2013

Do texto para a tela: tradução intersemiótica da morte de Sherlock Holmes 1*

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Beatriz Memória Rodrigues Okubo (IC), Lívia Priscilla da Frota Araújo (IC), Márcio Persivo Alcântara 4* 5 (IC), Warna Martins Macambira (IC), Gabriela Frota Reinaldo (PQ). 1. Universidade Federal 2. Universidade Federal 3. Universidade Federal 4. Universidade Federal 5. Universidade Federal

do Ceará – Publicidade e Propaganda e bolsista do PETCom. do Ceará – Jornalismo e bolsista do PETCom. do Ceará – Publicidade e Propaganda e bolsista do PETCom. do Ceará – Publicidade e Propaganda. do Ceará – Doutorado em Comunicação e Semiótica pela PUC (2002).

[email protected], [email protected], [email protected], [email protected]

Palavras-chave: Comunicação. Semiótica. Tradução intersemiótica. Adaptação.

Resumo Este trabalho tem como objetivo propor a tradução intersemiótica da morte de Sherlock Holmes no livro e na série, a partir da análise do conto “O problema final”, de Arthur Conan Doyle, publicado em 1893, bem como do episódio “The Reichenbach Fall”, exibido em 2012, e integrante da série britânica “Sherlock”. Para a fundamentação teórica, escolhemos os textos de Julio Plaza, Thaís Flores Nogueira Diniz e Marcel Pinheiro Barreto Silva sobre tradução intersemiótica e adaptação, bem como a obra de Katia Maciel para orientar o estudo sobre cinema e suas técnicas. Como resultados, percebemos que a série foi além dos signos verbais presentes no conto, própria do meio audiovisual, a partir da utilização de técnicas cinematográficas, com a mudança de narrador, temporalidade e uso de recursos tecnológicos, já que no livro a história de Sherlock Holmes se passa no século XIX, enquanto na série se passa neste século XXI.

Introdução A tradução intersemiótica consiste na tradução de um sistema de signos para outro sistema semiótico, conforme Diniz (1998). Ou seja, ao realizar a tradução de um trecho de um livro para um filme, percebe-se quais signos foram utilizados em cada situação. De acordo com Plaza (2008), a tradução “consiste na interpretação dos signos verbais por meio de sistemas de signos não verbais” ou “de um sistema e signos para outro” (JAKOBSON, 1970 apud PLAZA, 2008). Uma das maneiras mais comuns de tradução intersemiótica é a de signos verbais para visuais, muito utilizado na tradução de um livro para um filme ou série. Conforme Diniz (1998) o sistema cinematográfico pode se utilizar não apenas de imagens, mas de “palavras, signos impressos, música e ruídos”. Além dos aspectos já mencionados, a tradução intersemiótica tem outro aspecto que é o cultural. Segundo Cavalcante e Reinaldo (2012), “a transcriação intersígnica se dá dentro de um processo de tradução intercultural”. Os autores também afirmam que esse relacionamento entre o novo e o velho está na essência da tradução intersemiótica, e é isto que é percebido no objeto deste trabalho. Em tradução, há a sincronia e a diacronia, identificados por Plaza (2008). De acordo com ele, a primeira é próxima do processo poético, enquanto a segunda se liga ao historicismo. Ele explica que “Se, num primeiro momento, o tradutor detém um estado do passado para operar sobre ele” sendo esta a sincronia, a diacronia ocorre em um segundo momento quando “ele reatualiza o passado no presente e vice-versa através da tradução carregada de sua própria historicidade, subvertendo a ordem da ISSN 18088449

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sucessividade e sobrepondo-lhe a ordem de um novo sistema e da configuração com o momento escolhido”. Como exemplo, pode-se citar o jogo de xadrez. Se um observador considera o jogo a partir do momento exato em que chegou, mesmo após o início deste, a posição das peças lhe dará uma noção da situação do jogo naquele momento específico. Esta ocorrência estática, sem levar em consideração procedimentos anteriores é a sincronia. Por outro lado, se houvesse uma ocorrência de dinamicidade, ou seja, da situação em que o observador conhecesse todos os movimentos da peça até chegar àquela posição atual, ele conheceria o processo, sendo esta a diacronia. Por fim, “a adaptação é tanto o processo quanto o resultado da criação de uma obra artística a partir de uma fonte reconhecível de outro meio de expressão”, segundo Silva (2011). Desta forma, podemos observar a tradução a partir de três perspectivas: adaptação como produto, adaptação e seu processo criativo e adaptação como processo de recepção. Stam (2008) também fala que no processo de adaptação é preciso definir o que será transposto para o novo meio e quais convenções de gênero precisam ser “descartadas, suplementadas, transcodificadas ou substituídas”. Ou seja, no processo de adaptação é definido de que maneira ocorrerá a tradução dos signos de uma obra para outra.

Metodologia A pesquisa sobre Tradução Intersemiótica teve início através de estudos sobre a linguística de Saussure e pesquisas mais abrangentes sobre os estudos realizados por Peirce. Primeiro houve um estudo sobre Semiótica, para depois aprofundar a pesquisa sobre Tradução Intersemiótica. A duração completa do trabalho, incluindo o presente artigo, foi de, aproximadamente, seis meses desde o começo da pesquisa, passando pela escolha da temática e do objeto, à tradução e finalização do artigo. O objeto escolhido - a morte de Sherlock Holmes, traduzida do conto de Arthur Conan Doyle “The Final Problem” para o episódio “The Reichenbach Fall”, da série Sherlock, da BBC - foi estudado durante três meses, para garantir que seria extraído o máximo possível das duas obras e para que a imersão no tema gerasse resultados positivos para o estudo. O trabalho foi dividido entre quatro integrantes, sendo dois destes para pesquisar mais sobre a Teoria da Tradução Intersemiótica, Sincronia e Diacronia e Teoria da Adaptação, aprofundando o conhecimento sobre os conceitos que ajudariam a traduzir. As outras duas pessoas responsabilizaram-se por estudar as duas obras (o conto “The Final Problem” de Conan Doyle e o episódio “The Reichenbach Fall” da série de televisão da BBC) e a vida de seus autores e diretores. Afinal, pesquisando sobre a história de quem escreveu e dirige tais obras, é possível encontrar elementos marcantes que completam o sentido na hora de traduzir o texto para a tela. Apesar de haver a divisão citada acima, todos da equipe estudaram sobre os autores, diretores, obras e teorias, apenas houve a divisão de trabalho, o conteúdo não foi dividido, todos estudaram todas as temáticas, alguns com mais profundidade a fim de realizar melhor sua tarefa. Sobre a Tradução Intersemiótica, foram analisadas quatro partes do episódio do seriado, comparando com diversos trechos dos contos. As quatro partes são: uma conversa entre Sherlock e Moriarty (25:25), a morte de Moriarty (1:15:55), o telefonema - bilhete de Sherlock (1:18:37) e a visita de Watson ao túmulo de Sherlock (1:26:00). Cada integrante ficou com uma das quatro partes. Para traduzir é necessário embasamento teórico, tanto das obras mais antigas, como os escritos de Peirce, já citado, além de estudos mais recentes que condizem com a realidade da tradução de textos para a tela e para realizações cinematográficas. Portanto, foi necessário um estudo a respeito de cinema, de câmeras e da ISSN 18088449

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atividades dos atores, autor, diretores e produtores. Para tal embasamento, utilizamos o livro “Transcinemas” - conforme consta na bibliografia. Tal livro deu-nos conhecimento sobre câmera subjetiva, sobre quem é o narrador no cinema (se é narrador - personagem ou narrador onipresente, por exemplo), sobre a intenção do autor e diretor do filme/seriado ao adaptarem os textos de formas que seria, talvez, impossível de ser retratado em palavras novamente. Além do livro “Transcinemas”, foram utilizados artigos científicos, também citados na bibliografia, sobre tradução, sobre as técnicas de adaptação etc. Além de pesquisas em livros e artigos científicos, foram feitas entrevistas com uma professora de Semiótica na graduação e de Tradução Intersemiótica no mestrado, ambos na Universidade Federal do Ceará (UFC) - Gabriela Reinaldo. Foram também entrevistados dois alunos da graduação do curso de Jornalismo da UFC que são monitores da disciplina e atualmente estudam a temática, pois estão produzindo suas monografias sobre Tradução Intersemiótica - Victor Ramalho e Caroline Portiolli.

Resultados e Discussão O livro e a série possuem algumas características semelhantes e outras que foram adaptadas para o contexto de uma Londres contemporânea. Algumas características dos personagens, além de cenas da série e trechos do livro serão analisadas, em especial o nosso objeto, a morte de Sherlock Homes. No livro o narrador é em 1ª pessoa, na perspectiva do Watson, na série o narrador é onipresente. O personagem de Sherlock na 1ª temporada da série é antissocial e frop, ao contrário do livro. Durante a 2ª temporada, há um processo de humanização do personagem. Em relação ao personagem de Watson, há uma adaptação temporal de sua “invalidez”. No livro, sua condição é resultante da Segunda Guerra Anglo-Afegã (18781880) enquanto na série a personagem regressa do serviço militar no Afeganistão. No livro, Moriarty é um renomado professor, com conhecimento elevado de matemática, um intelectual admirado na época. Na série, Moriarty é um gênio da tecnologia, o que é admirado nos dias de hoje. Em comparação, a personagem nas duas obras é o que há de exemplo de genialidade em determinado contexto. Outro exemplo de mudanças de características é que o Sherlock do livro fuma cachimbo, o da série usa adesivo de nicotina, por causa da temporalidade e das mudanças de hábitos e atitudes da sociedade. Além disso, na série há utilização de tecnologias atuais, assim como no conto Sherlock se utiliza de todas as tecnologias existentes na sua época. Mas a Londres moderna exerce na série o mesmo fascínio que a Londres vitoriana do livro. Em uma cena da série (25:25), observamos um diálogo entre Sherlock e Moriarty. Moriarty diz que quer resolver o problema deles, o problema final. Essa fala remete ao nome do conto do livro no qual Sherlock morre. Depois, o vilão diz que a queda está perto de acontecer e que cair é como voar, só que com um destino permanente. Essa parte tem ligação com a morte de Sherlock, na qual ele cai de um abismo, nas cachoeiras de Reichenbach. O nome do episódio na série é “The Reichenbach fall”, tendo a palavra fall um sentido polissêmico, tem tanto o significado de queda como de catarata. Assim, a queda com destino permanente não seria a queda do sucesso de Sherlock Holmes, como alguns que não conhecem a história do livro poderiam pensar, mas sim a queda que o levaria a sua morte. A cena da morte de Sherlock Homes é o auge do episódio. No alto de um prédio, cujo nome é “Reichenbach”, na cena (1:15:55), Sherlock encontra Moriarty e eles iniciam outro diálogo. Os dois se comparam, então o vilão diz que eles não são iguais, pois Sherlock está do lado dos anjos. Então, a câmera mostra o Sherlock de baixo pra cima, o colocando como superior, e como um ser bom, pois aparece uma luz por trás dele, mostrando que ele realmente está do lado dos anjos. Essa luz faz Moriarty ISSN 18088449

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fechar os olhos e isso o incomoda. Esta cena se compara com o trecho do conto “O Problema Final”, na 3ª página, na qual há uma conversa entre Sherlock e Watson, onde há uma comparação sua com Moriarty, ou seja, que eles são praticamente iguais, mas que o vilão usa as suas competências intelectuais para o mal. Outro fato observado é a relação entre Sherlock e Watson, que é mais próxima na série, já que eles se chamam pelo primeiro nome e mostram maior proximidade, ao contrário do livro, onde se tratam pelos sobrenomes. Chantageado por Moriarty e obrigado a se jogar do prédio, morrendo na decadência de sua carreira, Sherlock conversa por celular com Watson, na cena (1:18:37). Ao se desculpar com ele, Sherlock diz que esse telefone é o seu bilhete. Essa fala remete ao bilhete que ele deixou no conto para Watson, antes de morrer. Então, Sherlock se joga do prédio, caindo para sua morte como no livro. Na série, há uma cena (1:26:00) de Jonh (Watson) no caixão de Sherlock. John não acredita que Sherlock morreu e que ninguém o convenceria que ele contou uma mentira. Ele também demonstra mais emoção e luto pela morte de Sherlock que no livro. No bilhete do conto, Sherlock pede para Watson nunca deixar de acreditar nele e é o que acontece na série, o que mostra a ligação entra as duas obras. Essa cena tem ligação com o seguinte trecho do livro: "E se fui agora compelido a fazer uma exposição clara de sua carreira, isto deve-se a certos propagandistas injustos, que se têm esforçado por lhe apagar a memória pelo processo sinuoso de atacar aquele que sempre considerei como o melhor e o mais sábio homem que jamais conheci". Isso mostra que, mesmo sobre ataque da mídia, Sherlock sempre foi e sempre será uma personagem admirada e contemplada.

Conclusão A Tradução Intersemiótica é um tema que pode ser explorado de diversas formas e possui teorias que podem estudar variados tipos de traduções. Traduzir não é plagiar, não é reproduzir de maneira muito similar à obra a qual faz referência. Traduzir é manter uma essência, porém, renová-la, trazer significados para outro meio semiótico. Renovar a essência sem perdê-la. A análise das obras comparadas serviu para observamos como a temporalidade influenciou o nosso objeto de estudo. No livro, percebemos alguns elementos da época, como Moriarty ter prestígio por ser matemático e um bilhete escrito ser o método escolhido por Sherlock. Com a tecnologia atual, a série mostra ligação com o que já foi contado no livro, servindo de elo entre ela e o conto. O presente artigo traduziu a morte de Sherlock Holmes do conto para uma reprodução cinematográfica,

utilizando

Teorias

da

Tradução,

da

Adaptação

e

pesquisas sobre

técnicas

cinematográficas. No entanto, por existir um campo teórico vasto, com nosso trabalho não se esgotam as reflexões teóricas derivadas desse tema. Sugerimos que outros enfoques sejam dados em trabalhos posteriores, que possam privilegiar novos aspectos da obra.

Referências CAVALCANTE, João Victor; REINALDO, Gabriela Frota. Sobre meninos e heróis: reflexões sobre as poéticas tradutoras em Onde Vivem os Monstros. In: CONGRESSO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO NA REGIÃO NORDESTE, 14, 2012, Recife. DINIZ, Thaís Flores Nogueira. Tradução intersemiótica: do texto para a tela. Cadernos de Tradução. Vol. 21, nº 3. Santa Catarina, 1998. ISSN 18088449

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DOYLE, Arthur Conan. Memórias de Sherlock Holmes. São Paulo: L&PM Pocket, 2005. MACIEL, Katia (Org). Transcinemas. Ed. Contra Capa. Rio de Janeiro, 2009. PLAZA, Julio. Tradução intersemiótica. São Paulo: Perspectiva, 2008. SILVA, Marcel Pinheiro Barreto. Adaptação intercultural: o caso de Shakespeare no cinema brasileiro. 2011. 351 f. Tese (doutorado em comunicação). Instituto de Artes e Comunicação Social, Universidade Federal Fluminense, Rio de Janeiro, 2011. SHERLOCK. Direção: Steven Moffat e Mark Gatiss. Interpretes: Benedict Cumberbatch e Martin Freeman. Reino Unido: BBC, 2010 (90 minutos). STAM, Robert. A literatura através do cinema: realismo magia e a arte da adaptação. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008.

Agradecimentos Agradecemos à Gabriela Reinaldo, professora de Semiótica no Instituto de Cultura e Arte da Universidade Federal do Ceará, e aos monitores da disciplina, Caroline Portiolli e Victor Ramalho.

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