Doença de Alzheimer

August 5, 2017 | Autor: Ana Fernandes | Categoria: Alzheimer Dementia, Dementia and Alzheimer, Alzheimer
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Doença de Alzheimer A doença de Alzheimer pertence ao grupo das demências consideradas irreversíveis, pois como refere Figueiredo (2007) dá-se de forma gradual provocando perda de memória, alterações no comportamento e personalidade e deterioração do pensamento. Ela constitui a causa mais frequente de demência na população idosa, nomeadamente, entre os 65 e os 95 anos de idade. Devido à natureza implacável desta doença, o prognóstico é o mesmo para todos os pacientes. Contrariamente, o início e a progressão podem variar muito de doente para doente. Os sintomas que um indivíduo com doença de Alzheimer apresenta também são muito variáveis. Para além dos deficits cognitivos, muitas pessoas com a doença de Alzheimer apresentam, em alguma altura no decorrer da doença, sintomas comportamentais e psicológicos que especificarei mais adiante.

Estruturas cerebrais afetadas: A principal manifestação clínica, que se prende com o déficit de memória para factos recentes e deterioração progressiva de outras funções cognitivas como alterações de linguagem, raciocínio, desorientação visuo-espacial, sugere uma disfunção temporo-parietal. Tem uma evolução progressiva restringindo o idoso ao leito e à morte num período de 8 a 10 anos, aproximadamente. Ambos os sexos são afetados igualmente. Alguns estudos revelaram existir enfraquecimento cortical e dilatação ventricular resultantes da perda neuronal de uma forma mais intensa e clara das observadas num idoso sem demência. Também o hipocampo se encontra afetado na doença de Alzheimer verificando-se, a perda neuronal e os novelos neurofibrilares que se formam em placas neuríticas. Este aparenta uma dilatação dos cornos temporais dos ventrículos laterais com relevo das fissuras silvianas e hipocampais. Pedro, T. (2011) investigou a relação entre a cognição e áreas cerebrais afetadas pela doença de Alzheimer. Com recurso a exames de ressonância magnética estrutural, avaliou a relação entre as funções alteradas (problemas cognitivos como dificuldade de memória, linguagem, orientação, etc.) as estruturas cerebrais afetadas (córtex entorrinal, hipocampo e tálamo) de pacientes com Alzheimer.

Assim, verificou que estas estruturas cerebrais se encontravam reduzidas nos doentes de Alzheimer. O córtex entorrinal e o hipocampo apresentaram correspondência com a memória, ou seja, quanto menor o volume do hipocampo e do córtex entorrinal, pior o desempenho da memória episódica. No que se refere ao corpo caloso, observou a sua relação com a atenção. O tálamo foi identificado como responsável pela cognição global, linguagem e memória episódica. Estudos realizados por Lezak et al. (2004); Nestor, Scheltens, & Hodges, (2004) já haviam revelam que a doença de Alzheimer tem como etiologia uma doença degenerativa que se caracteriza pela presença de formações neurofibrilares e/ou de placas neuríticas e pela perda de neurónios em regiões específicas do córtex cerebral. No que se refere às formações neurofibrilares, constituem formações intra neuronais formadas, em 95% dos casos, por filamentos em espiral emparelhados que resultam de alterações na proteína tau, responsável pela espessura do citoesqueleto neuronal. Esta proteína é encontrada nos axónios e é a responsável pela estabilização dos microtúbulos que na doença de Alzheimer se apresenta hiperfosforilada, não cumprindo a sua função estrutural e originando que os corpos celulares das células formem “tranças” (Moreira & Oliveira, 2005). Estas malformações, que tendem a aumentar no decorrer do processo neuro degenerativo, localizam-se no córtex entorrinal, hipocampo e outras regiões adjacentes ao lobo temporal (Grilo, 2009), essenciais para a capacidade de transformar a experiência diária em memórias duradouras. Por outro lado e relativamente às placas neuríticas ou senis que são constituídas por agregados da proteína ß-amiloide, estudos apontam que se organizam na doença de Alzheimer em função de um desequilíbrio progressivo e crónico entre a produção e eliminação dos fragmentos dessa proteína, provocando um aumento dos seus níveis no cérebro e formando placas que arruínam gradualmente a capacidade de comunicação entre os neurónios. Estas placas encontram-se sobretudo no córtex e, em menor número, nas áreas subcorticais, nomeadamente, no tálamo, hipotálamo e corpos mamilares. Outra caraterística da doença de Alzheimer prende-se com a perda de neurónios colinérgicos (neurónios que segregam acetilcolina, responsável pelo controlo da atenção, aprendizagem e memória) comprometendo, assim, a funcionalidade das regiões afetadas, principalmente o hipocampo e o neocórtex (Lezak et al., 2004; Moreira & Oliveira, 2005). Foster (1997) refere que a sequência temporal das estruturas cerebrais afetadas nesta demência (das temporais e parietais para as pré-frontais) é coerente com as alterações precoces

observadas na memória episódica. Apesar disso, também têm sido observadas, precocemente, alterações na região pré-frontal e seus circuitos nervosos em idosos que apresentam maior comprometimento das funções executivas.

Alterações comportamentais e psicológicas: A doença de Alzheimer geralmente apresenta alterações comportamentais e psicológicos que podem ser extremamente angustiantes para o próprio doente e para os seus cuidadores e, atualmente, não existem tratamentos adequados disponíveis para estes sintomas. Foi sugerido que os pacientes com doença de Alzheimer que exibem sintomas comportamentais ou psicológicos podem ter uma condição geneticamente diferente dos pacientes com doença de Alzheimer que não apresentam alterações comportamentais ou psicológicos. Essas alterações podem incluir agitação e agressividade. Antidepressivos e tranquilizantes são, muitas vezes, prescritos para o controlo de sintomas psicológicos de demência, no entanto, a sua eficácia no tratamento destes sintomas implica efeitos secundários, como o aumento da sonolência ou o retraimento social. Assim, as alterações comportamentais e psicológicas tendem a ser vistas como um problema à parte. Não há evidencias cientificas que apontem razões claras para a elevada percentagem de alterações comportamentais e psicológicas que se verificam nos doentes de Alzheimer. A Sociedade de Alzheimer financiou um estudo de três anos realizado na Queen's University Belfast pelo professor Peter Passmore (Craig, D., Hart, D. J., Carson, R., McIlroy, S. P. & Passmore, P., 2004). O objetivo geral deste estudo foi identificar as diferenças genéticas nos principais genes envolvidos no desenvolvimento de comportamentos e que se pensa estarem associadas ao desenvolvimento de sintomas comportamentais e psicóticos nos doentes suscetíveis à doença de Alzheimer. O estudo incidiu numa amostra de 435 pacientes com diagnóstico de provável doença de Alzheimer e sintomas presentes por pelo menos três anos. Com recurso a entrevistas aos cuidadores destes pacientes, foram avaliadas 12 alterações comportamentais e psicológicas: apatia, comportamento motor aberrante, distúrbios do apetite, irritabilidade, agitação /agressividade, distúrbios do sono, depressão, ansiedade, delírios, desinibição, alucinações e euforia e, recorrendo a amostras de sangue dos pacientes, foi possível identificar diferenças genéticas entre pacientes com doença de Alzheimer com ou sem alterações comportamentais e psicológicas.

Os resultados obtidos neste estudo revelam que os sintomas comportamentais e psicológicos são comuns com início estre 45 a 50 meses após o diagnóstico de presumível doença de Alzheimer, o que pode indicar que para que estes ocorram é necessária uma certa degeneração neurológica. Por outro lado, verificou-se que as alterações supra citadas estavam presentes em mais de 50% dos casos, sendo o sintoma mais comum a apatia que se encontrou em 75% dos pacientes em qualquer fase da doença. As alucinações, desinibição e euforia foram também encontradas em todas as fases mas numa menor percentagem (30%). Delírios, alucinações e irritabilidade foram os únicos sintomas que variaram de forma significativa com o deficit cognitivo apresentado. A partir destes dados e após uma análise mais aprofundada da prevalência destes 12 sintomas foi possível estabelecer quatro padrões ou clusters de sintomas distintos, representativos de comportamentos mais comuns. Assim, distinguiram um padrão Afetivo constituído por alterações comportamentais e psicológicas evidenciando depressão, ansiedade, irritabilidade e agitação /agressão; outro de Apatia e Comportamento Motor Anómalo, evidenciando distúrbios do sono e distúrbios do apetite; um padrão de Psicose onde predominavam delírios e alucinações, e um padrão semelhante à Hipomania, consistindo em desinibição e exaltação /euforia. Da análise genética das amostras de sangue, verificaram que a serotonina e a dopamina (neurotransmissores envolvidos na modulação de comportamentos e emoções) sofrem variações genéticas em doentes de Alzheimer. Por exemplo, o neurotransmissor triptofano hidroxilase, envolvido na síntese de serotonina que tem sido associado ao predomínio da agressão e da raiva em indivíduos sem demência, revela-se, também nestes doentes, alterado. A partir da identificação desta e de outras variações genéticas observadas, como a correlação positiva entre o alelo C do gene IL-1ß e o padrão psicótico ou a maior probabilidade de um individuo vir a sofrer de doença de Alzheimer com tendência a sintomas de agressividade e agitação quantas mais cópias do gene da ApoE4 possuir, fundamentam a teoria de que a agressividade caraterística da doença de Alzheimer pode ter uma componente genética. As variações nos genes envolvidos no comportamento e emoções podem estar envolvidos no desenvolvimento de alterações comportamentais e psicológicas em pacientes com doença de Alzheimer.

Quadro clínico e diagnóstico:

Antes de apresentar o quadro clínico, importa referir as fases de desenvolvimento da doença de Alzheimer que constituem linhas orientadoras dos padrões mais evidentes que foram observados no decorrer da doença. Assim podemos dividi-la numa fase inicial onde começam a ser evidentes as dificuldades de linguagem, a desorientação no tempo e no espaço e uma significativa perda de memória, o doente pode apresentar dificuldade na tomada de decisão, manifestar sinais de depressão e agressividade e perder o interesse por atividades e distrações. Na fase intermédia, a perda de memória sofre um agravamento, nomeadamente, para acontecimentos recentes e nomes de pessoas), o idoso torna-se incapaz de viver sozinho e de ser autónomo, pode mesmo, perder-se dentro da sua própria casa. Finalmente, a fase tardia caracteriza-se pela total dependência e inatividade. Há um comprometimento evidente de todas as funções executivas e a grave perda de memória compromete qualquer interação, pois não consegue interpretar as situações. Numa breve revisão de literatura sobre esta temática são apontados como sintomas mais frequentes os deficits na memória episódica. Backman (2004) e Grilo (2009) encontraram evidências da tendência para descrever a doença como puramente amnésica e, consequentemente, empreender procedimentos de avaliação neuropsicológica onde o foco principal é a memória. De facto, as alterações nos outros domínios cognitivos são descritas, na maioria dos textos em fases mais adiantadas da doença que se caracterizam por um comprometimento global do funcionamento cognitivo. No entanto, estudos recentes têm apresentado provas de que as funções executivas estão comprometidas na fase inicial da doença, tal como a memória, e que este comprometimento é responsável por muitas das limitações funcionais observadas, como por exemplo, a perda de capacidade de gestão financeira muitas vezes observada no doente de Alzheimer (Grober et al., 2008). Este e outros comprometimentos são muitas vezes observados antes mesmo da aplicação de baterias breves de avaliação cognitiva, como o MEEM, confirmarem o diagnóstico. Há pois que ter em conta, no diagnóstico da doença de Alzheimer, os deficits das funções executiva. Um estudo realizado em 2008 por Bisiacchi que pretendia comparar o desempenho da memória e do funcionamento executivo de idosos saudáveis, idosos com Deficit Cognitivo Ligeiro e idosos com a doença de Alzheimer obteve resultados indicativos de que as alterações mnésicas pontuais que se verificam em idosos saudáveis podem apontar uma predisposição para o Deficit Cognitivo Ligeiro, enquanto que, um quadro compartilhado por alterações mnésicas e executivas parece constituir um indicador da doença de Alzheimer. Não obstante, os domínios executivos mais afetados ainda não são claros. Há estudos que referem ser mais evidente o comprometimento da capacidade de abstração (Shulman, 2000 e Saur, Eschweilei,

& Milian, 2011), outros os mecanismos de inibição (Baudic et al., 2006), outros ainda referem ser o planeamento (Canali, Bruck, Bertolucci & Bueno, 2011) e Belleville, Chertkow, & Gauthier (2007), sugerem ser o comprometimento da memória operatória. Os distúrbios de linguagem, ainda que esta esteja geralmente preservada na fase inicial, também são uma característica evidente da doença de Alzheimer. Os primeiros sinais de disfunção da linguagem, muitas vezes, incluem a redução da conversação, dificuldades na escrita ou redução do vocabulário. À medida que a doença progride, o paciente torna-se cada vez mais não-fluente podendo chegar à afasia global. A disfunção visuo-espacial pode verificar-se no facto do doente se perder ou na dificuldade com as figuras de um desenho. A apraxia, ou a incapacidade de produzir movimentos propositais apesar da força e da coordenação normal, leva-o a ter dificuldades em utilizar utensílios, ou em se vestir. A agnosia que muitas vezes aparece mais tarde no curso da doença manifesta-se na incapacidade de reconhecer os seus entes queridos. A disfunção executiva, como resultado do envolvimento do lobo frontal, resulta em deficits de resolução de problemas, abstração, raciocínio, tomada de decisão e julgamento. Por exemplo, estes doentes podem apresentar dificuldades na organização de tarefas complexas, como a planificação das férias. Também as alterações comportamentais e psiquiátricas são frequentes no doente de Alzheimer. Ainda que a depressão maior seja pouco provável, os sintomas depressivos podem ocorrer em metade dos pacientes. A psicose geralmente ocorre mais tarde no curso da doença e sugere uma interdependência com o agravamento dos deficits executivos. Podem ocorrer alucinações (geralmente visuais) e, mais comummente delírios paranoides. Outros sintomas comportamentais incluem agitação, perambulação, e distúrbios do sono. O diagnóstico diferencial da doença de Alzheimer deve ser confirmado, no que respeita à avaliação das funções cognitivas, em duas ou mais áreas das quais se destaca a memória. De acordo com o DSM-IV, esta deve apresentar alterações evolutivas de pelo menos um ano de duração e em intensidade suficiente para interferir na vida social, familiar e profissional do doente. Para além desta afetação da memória deve, ainda, evidenciar-se pelo menos um dos deficits cognitivos (agnosia, afasia, apraxia ou comprometimento das funções executivas). Os critérios NINCDS-ADRDA (National Institute of Neurological and Communicative Disorders and Stroke; Alzheimer’s Disease and Related Disorders Association Work Group) apresentam-se mais detalhados, classificando a doença de Alzheimer em níveis definitivos, prováveis e possíveis de certeza do diagnóstico. A categoria Definitivo é reservado para

pacientes com Alzheimer provável comprovando evidência patológica de biópsia ou autópsia. A categoria Provável é o nível máximo de segurança possível sem confirmação patológica. Esta categoria exige que o declínio tenha início insidioso e progressivo na memória com a participação de pelo menos um outro domínio cognitivo que é estabelecida por meio de exame clínico e confirmado por testes neuropsicológicos. O paciente deve ter um nível de consciência preservado com exclusão de outras condições que poderiam explicar os sintomas. Outras características do diagnóstico Provável incluem deterioração progressiva da linguagem, práxis e reconhecimento visual com as atividades de vida diária comprometidas, história familiar, e os resultados normais no exame do líquido cefalorraquidiano, eletroencefalograma e neuroimagem. O diagnóstico de Possível é dado quando o curso de declínio cognitivo é atípico, achados neurológicos focais são evidentes, ou doenças coexistentes que por si só podem produzir demência estão presentes. No que se refere à utilização de testes neuropsicológicos para avaliação provável ou possível da doença de Alzheimer há que salientar o Mini Exame do Estado Mental (MEEM) (Folstein et al.,1975); a Escala de Avaliação da Doença de Alzheimer (ADAS); e o Teste do Relógio (Sayeg, 2010) O MEEM é teste mais difundido e considerado de maior validade para uma primeira análise do estado cognitivo. Permite-nos avaliar os domínios de orientação espacial, temporal, memória imediata e de evocação, cálculo, linguagem-nomeação, repetição, compreensão, escrita e cópia de desenho, fornecendo um indicador razoavelmente aceitável da possibilidade de demência. O Teste do Relógio é utilizado na avaliação das competências visuopercetivas e visuomotoras, exigidas para conseguir representar internamente o mostrador do relógio e traduzir essa representação mental numa representação motora (Peters & Pinto, 2008). Para além disso, podemos inferir sobre a capacidade de raciocínio e memória, uma vez que muita da informação sobre o conceito de relógio que deve ser recordada é abstrata e complexa. Finalmente, a Escala de Avaliação da Doença de Alzheimer (ADAS) traduzida e aferida para a população portuguesa por Guerreiro et al. (2007) investiga, de forma padronizada, funções cognitivas e não cognitivas. A avaliação das funções cognitivas divide-se em 11 secções que objetivam avaliar a memória, a linguagem e a praxia. A parte da avaliação das funções não cognitiva dividida em 10 secções pretende avaliar o humor e as perturbações do comportamento. Nos doentes de Alzheimer é esperado um declínio de 10% /ano. A escolha dos instrumentos requer bom senso do avaliador pois os resultados podem ser enviesados por vários fatores, como por exemplo, nível de escolaridade, cultura, deficits de visão ou audição ou a própria atitude psicológica do avaliado. Há, pois, que reforçar a

complementaridade destas avaliações e não prescindir de uma prévia anamnese pormenorizada em colaboração com um familiar ou cuidador do doente. ANA CLÁUDIA FERNANDES, 2014

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