Dores sociais e resistência nas páginas da Revista Argumento (1973-1974)

June 15, 2017 | Autor: Cairo Barbosa | Categoria: Historia Intelectual, Ditadura Civil-Militar, Teoria da História
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Dores sociais e resistência na Revista Argumento (1973 – 1974)
Renata Lopes Marinho[1]
Cairo de Souza Barbosa[2]

Introdução
Diversas pessoas e intelectuais têm se preocupado em colocar em voga
discussões relacionadas à ditadura e seu impacto econômico, político,
social e cultural para a população e para o país. Nesse contexto, o artigo
em questão tem por objetivo debater a "experiência dolorosa" vivenciada no
Brasil durante a ditadura empresarial-miliar no período de 1964 a 1985 –
termo ainda impreciso, mas empregado justamente para ser posto em debate,
discutindo questões custosas e problemáticas à história do país na época e
ainda na atualidade a partir da análise de algumas relações teóricas e
práticas que se colocam entre o pensamento sobre o país e as vivências
sócio-históricas violentas ou dolorosas. Trataremos de temas como o
enfrentamento da perplexidade, a noção de "trauma sócio-histórico" e o
desenvolvimento do país no período, partindo do estudo de caso de dois
artigos específicos contidos na primeira edição da Revista Argumento.
O primeiro deles, intitulado "Literatura e Subdesenvolvimento", traz
claramente a interação entre sociologia e arte, marca de autor. No texto, o
crítico literário Antonio Cândido disserta sobre três etapas da história
latino-americana que se podem identificar no século XX: a de consciência
amena do atraso, datada das primeiras décadas do século XX; a de
consciência catastrófica do atraso, incorporadas no pós Segunda Guerra
Mundial; e a de consciência dilacerada do atraso, pensadas a partir da
década de 1960. Seu foco principal está no tema do subdesenvolvimento na
América Latina e de como isso se aplica à questão literária, fazendo uma
análise comparativa entre diversos autores latino-americanos e a influência
dos países centrais em suas obras.
O segundo artigo retirado da primeira edição da Revista Argumento é
do economista Celso Furtado, intitulado "O mito do desenvolvimento e o
futuro do terceiro mundo", no qual o autor traça, dentre outras coisas, um
esboço da discussão sobre como funcionou o processo de subdesenvolvimento
da periferia do sistema capitalista e sua relação e condição de
dependência. Para tanto, busca falar também do processo de
industrialização, consequência da crescente modernização do século XX, que
deu lugar à expansão de mercados e à necessidade de manter uma estrutura
comercial em escala mundial.
Dessa forma, é interessante observar que, em ambos os artigos, um
sintoma corrente é a tentativa de enfrentar a "perplexidade" causada pela
violência experimentada no regime ditatorial e também suas consequências em
todos os aspectos da sociedade e, ainda, podemos notar uma autoconsciência
dolorosa da condição de país periférico e proporcionalmente atrasado.
Assim, os autores fazem uma análise dos efeitos, tanto diretos quanto
indiretos, no que tange à estruturação do país neste período da ditadura.

A Revista Argumento (1973-1974)
As décadas de 1960 e 1970, no Brasil, são fruto de inúmeros debates
nos mais diversos campos de conhecimento, muito por conta da efervescência
política e cultural -- que questionava as desigualdades tradicionais do
país, agravadas pelo desenvolvimento do capital a partir dos anos 1950,
trazendo à baila mazelas históricas, numa vivência ceifada por um regime
ditatorial. Isso fica evidente ao falarmos de um livro de Caetano Veloso,
chamado Verdade Tropical, de onde Marcelo Ridenti tira a reflexão de que
somente este contexto social, político e cultural, que formou esta geração,
poderia construir uma ideia de "nação falhada", como afirma o músico
baiano. (RIDENTI, 2003: 151). Neste contexto surgiram diversas publicações
que reuniam uma vasta gama de intelectuais, dentre elas a Revista
Argumento, publicada em quatro números entre os anos de 1973 e 1974, e que
foi retirada de circulação pela ditadura. Através do slogan central,
"contra fato há argumento", sua primeira edição, de outubro de 1973,
segundo seu editorial, procurava entregar ao intelectual brasileiro, aquele
que "foi arrancado de seu mundo", um terreno onde pudesse novamente criar
raízes. A intenção de preencher certo vazio ou vácuo cultural era clara:
"sempre haverá um papel a ser cumprido pelo intelectual que resolva sair da
perplexidade e se recusar a cair no desespero" (ARGUMENTO, 1973, n.1)
O grupo que compunha a revista era formado por diversas figuras
reconhecidamente importantes no âmbito intelectual, dentre elas Antonio
Cândido, Celso Furtado, Fernando Henrique Cardoso, Francisco Weffort etc,
contando ainda com colaborações de críticos literários, como Roberto
Schwarz, Ángel Rama e Davi Arrigucci Junior. O foco da publicação estava na
preocupação com o âmbito social, demonstrando descontentamento e inquietude
perante a situação do país, ou seja, a revista tinha um apelo ao
engajamento político, às questões ligadas ao regime ditatorial, à percepção
do subdesenvolvimento, da dependência e das demais questões que permeavam
as críticas à condição do Brasil. Suas discussões, portanto, valorizavam "a
análise que buscasse o contexto, o todo, e, nesse sentido, recusava a arte
não-engajada (...) e a neutralidade comum à época, e, ao mesmo tempo,
proclamava sua morte" (COTA, 2001: 33)
Outro ponto fortemente desenvolvido pela revista, e também encontrado
nos artigos de Cândido e Furtado, é sobre a formação de uma identidade
nacional, juntamente à consciência da necessidade de haver uma cultura de
resistência, tanto em relação ao estrangeirismo quanto às podas realizadas
pelo regime militar, tudo isso sob a forma de artigos e resenhas
absolutamente críticos. Assim, podemos observar que o maior esforço da
revista era o de produzir uma análise sóbria tanto no que referia ao regime
militar tanto no que significava uma autoanálise das situações brasileira e
latino-americana, esperando ultrapassar o tempo de sua publicação, podendo
ser ainda no futuro fonte de reflexão e produção de conhecimento.

Dores sociais e resistências na Revista Argumento
Cândido também irá desenvolver a ideia de pátria, mostrando o quanto
esta, na America Latina, está vinculada à ideia de natureza, se
justificando nela. Assim, ambas conduziriam a uma literatura que arriscaria
discutir o atraso material e a debilidade das instituições através da
supervalorização dos aspectos regionais. Entretanto, a consciência do
subdesenvolvimento despertaria uma gama de fatores relacionados ao
pessimismo do presente e problematizando ainda mais o futuro. Com esse novo
entendimento, então, passa-se a garantir a força da luta quase utópica para
acabar com o subdesenvolvimento e encontrar uma nova realidade promovida
pelos intelectuais engajados politicamente.
Essa consciência quanto ao subdesenvolvimento, todavia, só começa a
ser construída após a Segunda Guerra Mundial, e manifesta-se mais
claramente a partir dos anos de 1950. E, com essas mudanças, ocorridas
desde a década de 1930, a visão romanceada que prevaleceu no século XIX
adquire uma reestruturação e, agora, torna-se desmistificadora, sofrendo
uma tomada de consciência do que se passava no país, inclusive quanto às
questões econômicas e políticas, estando pronta para exercer algum tipo de
ação frente ao que esteja errado, ou seja, tornar-se uma força de denúncia.

Cândido desenvolve também a temática do analfabetismo, explicando que
o mesmo contribui para enfraquecer as estruturas de um país e ainda discute
a questão do idioma, afirmando que os países da América Latina formam o
único conjunto de países subdesenvolvidos que falam idiomas europeus, e
provêm culturalmente de metrópoles ainda hoje subdesenvolvidas, onde a
relação para com a literatura era restrita a determinados grupos sociais,
condenando, dessa forma, o escritor latino-americano a ser um produtor
destinado às minorias, ou seja, a grupos restritos dispostos a participar
da experiência da leitura. No caso brasileiro, especificamente, a cultura,
exceto a literatura de fato, é basicamente voltada para os meio de
comunicação de massa, e esse seria um dos principais motivos para que a
alfabetização não tenha tanto destaque frente ao processo literário. Dessa
maneira, pode-se dizer que o objetivo da literatura na América Latina é de
se proteger para não ser substituída por instrumentos e valores da cultura
de massa.
O problema, entretanto, consiste no fato de que quanto mais se
afastava das massas, mais as impedia de chegar a ele, construindo um
círculo vicioso incapaz de encontrar uma mudança na situação. Desta forma,
o autor tenta provar que analfabetismo e requinte, cosmopolitismo e
regionalismo, na verdade, estão relacionados a um movimento pendular entre
a realidade e a utopia, muitas vezes de cunho ideológico, e dialoga
diretamente com a questão da incultura e seu esforço por superá-la. Ou
seja, ambos são fatores e consequências de seus próprios pares.
O texto de Celso Furtado, por sua vez, mais voltado à questão
econômica, procura discutir a concepção de economia-mundo a partir da
percepção dos desenvolvidos de que a expansão dos países terceiro-mundistas
poderá gerar um colapso global. O autor salienta ainda a ilusão criada em
torno do "mito" desenvolvimentista, que seria a possibilidade de haver
equiparação entre países periféricos e centrais. Esta percepção parece
estar em diálogo com a Teoria Marxista da Dependência e com a concepção de
economia desenvolvida na CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina e
o Caribe), da qual o economista fez parte nos anos 1950 e 1960, e seu foco
está na autoconsciência da condição de país periférico perante a economia
mundial.
Neste artigo, a perplexidade parece se ligar à consciência da condição
de país periférico face ao desenvolvimento dos países dominantes, ao passo
que essa autoconsciência do subdesenvolvimento terceiro-mundista é
devastadora por conceber a ideia de que ela é uma condição permanente, cuja
finalidade é manter a estrutura econômica mundial, isto é, evidencia-se a
impossibilidade de equiparação entre ricos e pobres, de modo que se
constitui, na periferia, um mito do desenvolvimentismo. Celso Furtado,
portanto, parece sentir as "dores sociais" de um país ceifado pela escolha
de um modelo econômico falho e pela condição de dependente das nações mais
avançadas.

A natureza do golpe de estado
O ano de 1964 inaugurou um período obscuro da história do Brasil, onde
uma conspiração de classe interrompeu a efervescência política de um dos
períodos mais democráticos de nossa história. Como explica Demian Bezerra
de Melo, a leitura do cientista político uruguaio Armand Dreifuss aponta
para a consolidação, através da união entre o Instituto de Pesquisas e
Estudos Sociais (Ipês) e o Instituto Brasileiro de Ação Democrática (Ibad),
de um "Estado Maior da burguesia multinacional e associada", que construiu
uma ação estratégica que a conduzisse ao poder (MELO, 2013: 118). Ocorre
que esse momento de um modelo calcado no trabalhismo e nas reformas de
base, um regime plenamente democrático, que resultou no fatídico 1º de
Abril de 1964, é resultado do aumento real da organização das classes
subalternas, em apoio a João Goulart, com o objetivo de realizar o projeto
político da esquerda. Assim, fica claro que "o complexo Ipes/Ibad, aliado
ao aparato militar (em especial membros da ESG), forma o verdadeiro partido
político dessa nova burguesia." (MELO, 2013: 120). Nestes termos, a partir
da leitura de Dreifuss, cunha-se o conceito de "Ditadura civil-militar",
que hoje é recolocado, e debatido, também por Demian Bezerra, como
"ditadura empresarial-militar".
Essa percepção encontra ecos em outra obra clássica da historiografia
brasileira, construída por Jacob Gorender, e sobre a qual Carlos Fico
disserta a partir da noção de que a burguesia industrial, defrontada com a
crise econômica que perdurou de 1962-1965, solicitava uma receita
recessiva, com governo forte e capaz de não ceder à pressão da massa
trabalhadora. Por isso, havia uma espécie de núcleo dessa burguesia que,
vinculada ao capital estrangeiro, percebia os riscos dessa efervescência no
afã pelas reformas de base e formulou, alternativamente, a ideia de um
modelo alternativo de "modernização", agora calcada na conservação da
estrutura, opção que se vinculou à inspiração golpista (FICO, 2004: 49). A
"síntese" do pensamento de Gorender é assim delineada: de um lado, o
estágio em que se encontrava o capitalismo brasileiro; de outro, o caráter
preventivo da ação, calcado na ideia de que se poderia conter uma "ameaça
revolucionária à esquerda".
A partir destas duas leituras, evidencia-se a natureza da conspiração
golpista que derrubou a democracia brasileira. Daqui decorrem duas
consequências drásticas para a história do país: uma diz respeito à "opção"
por uma "modernização conservadora", que tem efeitos perceptíveis até os
dias de hoje, como a condição ou o estado de país
periférico/subdesenvolvido. Por outro lado, a implementação de um regime
ditatorial que suprimiu liberdades gerou "danificações" e "traumas
históricos" na estrutura social brasileira, isto é, causou "dores sociais"
que correspondem a uma vivência calcada na incomensurabilidade diante do
processo histórico violento que cindiu o país (VIEIRA, 2011). As
consequências destes dois processos são perceptíveis em nossa fonte, a
Revista Argumento, mais especificamente nos dois artigos que nos propomos a
analisar, os de Celso Furtado e Antonio Candido.


As danificações: modernização conservadora, violência e estado de sítio
O primeiro processo, a "modernização conservadora", abarca uma série
de características próprias à sua construção. Na leitura de José Mauricio
Domingues, este programa dirigido necessitava de uma conjugação entre
elites agrárias e seu interesse na agroexportação e as elites industriais,
que eram responsáveis por garantir o baixo custo da força de trabalho
através do controle político, sobretudo através do sindicalismo. A
proposição era clara: modernizava-se, mas sem conceder uma liberdade real
(DOMINGUES, 2002: 461). Contudo, no período pré-1964, esse modelo dava
sinais de esgotamento, porque não havia mais o controle do processo. Assim,
a própria modernização parecia ter criado uma nova gama de subjetividades
contrárias também às próprias distorções de seu processo. Na leitura de
Marildo Menegat, como desdobramento da perversidade da modernização
conservadora, a ditadura tinha um caráter contrarrevolucionário preventivo,
cujo objetivo era completar, via medidas autoritárias e antipopulares, o
nosso modelo de substituição de importações, iniciado na grande crise do
capitalismo mundial dos anos 1930. Este processo intensivo de
industrialização e urbanização contribuiu para a construção e para o
desenvolvimento das relações sociais burguesas num país periférico. Por
isso,

O séquito de perversões e patologias da sociedade
brasileira não é, como crê certo pensamento sociológico
vulgar, determinado pela falta de capitalismo, ou por
desvios de uma classe dominante de cultura católica,
demasiado inapta à ética do trabalho, mas a configuração
plena deste tipo de sociedade como resultado da história
de um país retardatário, recheada de atrocidades cruéis.
(MENEGAT, 2008: 6).

É evidente, portanto, que as "danificações" são fruto, por um lado,
deste avanço capitalista que permeou as mudanças e continuidades nas
estruturas econômica e social do país. Mas, especificamente no caso dos
dois artigos aqui analisados, fica latente também a percepção de uma
"perplexidade" ante a violência do regime instaurado em 1964, período em
que fica claro que "o projeto repressivo baseado numa 'operação limpeza'
violenta e longeva estava presente desde os primeiros momentos do golpe",
em que "o AI-5 foi o amadurecimento de um processo que se iniciara muito
antes, e não uma decorrência dos episódios de 1968, diferentemente da tese
que sustenta a metáfora do 'golpe dentro do golpe'" (FICO, 2004: 34). Esse
"corte" inaugurou um período de transformação das relações entre liberdades
individuais, direitos políticos e civis. Mais do que isso, representou a
implementação daquilo Paulo Arantes chama de "estado de sítio", onde uma
comunidade política, utilizando-se do discurso do medo à desordem pública,
é temporariamente submetida à existência de um regime jurídico excepcional,
ao passo que se "conferem poderes extraordinários às autoridades
governamentais, ao mesmo tempo em que se restringem ou suspendem as
liberdades públicas e certas garantias constitucionais" (ARANTES, 2007:
155). Assim, legaliza-se a suspensão da legalidade. Também nas palavras de
Giorgio Agamben, aquilo que é denominado "estado de exceção" é utilizado
através de uma medida "ilegal" – justamente por não ser um dispositivo
prévio constitucional, mas que passa a ser perfeitamente "jurídica e
constitucional" ao se calcar na criação de novas normas ou em uma nova
ordem jurídica.
É em meio a esse quadro de uma "modernização conservadora", uma
ditadura violenta e cerceadora que, após o duro golpe da
institucionalização do Ato nº5, em 1968, a sociedade se vê ceifada e passa
a se envolver nessa "perplexidade". Inicia-se uma experiência dolorosa e
problemática, na qual traumas se evidenciam na falta de recursos
interpretativos, analíticos e mesmo imagísticos etc. Constata-se, portanto,
a presença destas dores e tristezas de toda uma geração, não apenas no
sentido etário, mas sujeitos de várias idades afetados pelo impacto da
ditadura em seus diversos aspectos: político, econômico, intelectual,
cultural, policial, repressivo.


A dificuldade de se compreender e definir o que se vivia e
sofria, de resto comum para quem está imerso em seu
momento histórico, tornava-se particularmente densa
perante os disfarces ideológicos do governo e seu grupo de
apoio, as artimanhas jurídicas e eleitorais, os discursos
invertidos (como defender os Atos Institucionais que
suprimiam direitos políticos em nome da "democracia"),
além dos prazerosos efeitos imediatos do "milagre
econômico" (cuja crise se desdobrou posteriormente por
duas décadas, senão até hoje), e de uma certa incapacidade
por parte de setores menos intelectualizados e politizados
da população de sequer imaginar o horror que passava nos
"porões" da ditadura (VIEIRA, 2013).


Neste quadro, não é de espantar que se encontre com frequência a
palavra "crise" nos textos da época que tentavam analisar o seu tempo
presente. Todavia, é a noção de "perplexidade" que mais chama a atenção,
por se apresentar ainda mais repetidamente nos diversos tipos de fontes. Em
nosso objeto, especificamente, esta palavra encontra-se logo no editorial
de abertura, revelando que é mais do que necessário que se discuta essa
questão. Frente a essa experiência dolorosa, sobrava "a angústia de existir
cerceado política e culturalmente, bem como a tensão de 'viver na corda
bamba', entre a impotência cimentada pelo Estado e o desejo pulsante de
agir no e sobre o mundo" (VIEIRA, 2006: 2). Ao anunciar que se pretendia
como meio de resistência ao processo vigente, a Revista Argumento, contudo,
ainda era lugar destas dores sociais, como fica evidente em seus dois
artigos aqui em pauta.

Conclusão

A experiência cruel da ditadura deixou marcas que ainda hoje são
sentidas. Nas palavras de Beatriz Vieira,


Não se tratou de um trauma político 'apenas', mas o início
de um tipo de experiência que nos anos subsequentes
adquiriu formas de continuidade dolorosa e problemática,
pois traumas se transmitem como falhas, faltas, silêncios,
de modo que passaram a nos faltar alguns recursos
hermenêuticos necessários para dar sentido à realidade.
(VIEIRA, 2013: 57).

Neste sentido, a revista Argumento, tendo por foco resistir às
atrocidades do regime militar, também serviu como um meio de elaboração de
questões dolorosas dos indivíduos e da sociedade de modo geral. Antonio
Cândido, ao discutir a literatura latino-americana, percebeu como é
catastrófica a autoconsciência do atraso do país, ao passo que se pode
categorizar que essa condição foi aprofundada justamente no período em que
o texto foi escrito, sob a égide do governo empresarial-militar. Celso
Furtado, ao discutir a questão econômica, também procura falar dos efeitos
da condição de país periférico perante o capitalismo mundial. Fica claro,
portanto, que a revista concedeu-lhes um espaço de resistência, mas também
que estes autores foram capazes de elaborar questões absolutamente
delicadas referentes às mazelas do país.
Fonte:

REVISTA ARGUMENTO. Edição nº1, 1973.



Referências Bibliográficas:

AGAMBEN, Giorgio. Estado de Exceção. São Paulo: Boitempo, 2004.

ARANTES, Paulo Eduardo. Extinção. 1. ed. São Paulo: Boitempo, 2007. v.1.
315p.

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FICO, Carlos. Versões e controvérsias sobre 1964 e a ditadura militar.
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MELO, Demian Bezerra. Revisão e revisionismo historiográfico: os embates
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Revista do NIEP Marx, v. 1, p. 49-74, 2013.

MENEGAT, Marildo. Sem lenço nem aceno de deus: formação de massas em tempo
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Vermelha (UFRJ), v. 18, p. 146-177, 2008.

RIDENTI, Marcelo. Cultura e política: os anos 1960-1970 e sua herança. In:
FERREIRA, Jorge e NEVES, Lucília. (Org.). O Brasil republicano, vol. 4 -
O tempo da tempo da ditadura. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
2003, v. 4, p. 135-166.

VIEIRA, Beatriz de Moraes. A espiar o mundo... experiência histórica na
leitura poética da geração 70. Fenix: revista de historia e estudos
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VIEIRA, Beatriz de Moraes. A Palavra Perplexa: experiência histórica e
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VIEIRA, Beatriz de Moraes. (Des)memória de perplexidades: Brasil, década de
1970. CONFLUENZE. Vol. 5, No. 1, 2013, pp. 48-65, ISSN 2036-0967,
Dipartimento di Lingue, Letterature e Culture Moderne, Università di
Bologna.

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[1] Graduanda em História pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(UERJ).

[2] Graduando em História pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(UERJ). Bolsista IC-FAPERJ.
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