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May 28, 2017 | Autor: B. De Carvalho | Categoria: Direito Empresarial, Contratos, Estabelecimento Comercial
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É válida a Cláusula de não concorrência por tempo indeterminado, ainda que a norma conste em contrato de trespasse?

Inicialmente, cabe a análise do dispositivo legal ligado à matéria: “Art. 1.147. Não havendo autorização expressa, o alienante do estabelecimento não pode fazer concorrência ao adquirente, nos cinco anos subseqüentes à transferência.” Nota-se que o presente dispositivo legal prevê um lapso temporal de cinco anos para que, o alienante de estabelecimento trespassado, prática recorrente e ordinária no direito empresarial, possa retornar a atividade trespassada. A lógica de tal dispositivo é que o vendedor, chamado de trespassatário, não possa utilizar do seu know-how (uso de contatos, conhecimento e fornecedores), para realizar concorrência desleal com o trespassante (comprador). Entretanto, em uma lógica de liberdade contratual, o trespassante pode, dado acordo entre as partes, não se submeter à regra, por expressa determinação contratual – tal entendimento é inconteste da simples leitura do art 1.147 do Código Civil. Entretanto, em uma lógica inversa, pode por uma determinação contratual, o alienante

abster-se de, para sempre exercer a atividade

trespassada? O parágrafo único do mesmo artigo afirma que, em caso de de arrendamento ou usufruto do estabelecimento, a proibição prevista no artigo 1.147 do Código Civil, persistirá durante o prazo do contrato. Assim, o art. 421 do C.C. positivou o princípio da função social dos contratos como limitador da liberdade de contratar, inexistindo violação a essa norma, no estabelecimento da cláusula de "não restabelecimento", usual na realidade empresarial para coibir a concorrência desleal. Entretanto, é abusiva a vigência por prazo indeterminado da cláusula de "não restabelecimento", pois o ordenamento jurídico vigente no brasil, salvo

raríssimas exceções, não admite a ausência de limite temporal em cláusulas restritivas ou de vedação do exercício de direitos. Dessa forma, deve-se afastar a limitação por tempo indeterminado, fixando-se o limite temporal de vigência por cinco anos contados da data do contrato, critério razoável adotado no art. 1.147 do Código Civil de 2002. O lapso de cinco anos é fruto de reiteradas decisões judiciais no Superior Tribunal de Justiça – STJ, como por exemplo no Recurso Especial (REsp.) 680.815/PR, de Relatoria do Ministro RAUL ARAÚJO: “4. Mostra-se abusiva a vigência por prazo indeterminado da cláusula de "não restabelecimento", pois o ordenamento jurídico pátrio, salvo expressas exceções, não se coaduna com a ausência de limitações temporais em cláusulas restritivas ou de vedação do exercício de direitos. Assim, deve-se afastar a limitação por tempo indeterminado, fixando-se o limite temporal de vigência por cinco anos contados da data do contrato, critério razoável adotado no art. 1.147 do CC/2002.” – nosso grifo. O prazo de cinco anos foi inicialmente vislumbrado em casos de ações renovatórias de aluguel não residencial, quando a própria lei de alugueis, lei 8245 de 1991 admitiu que, para o ato são necessários pelo menos cinco anos de atividade empresarial ininterrupta naquele estabelecimento – conforme afirma o art. 51, II: “Art. 51. Nas locações de imóveis destinados ao comércio, o locatário terá direito a renovação do contrato, por igual prazo, desde que, cumulativamente: I - o contrato a renovar tenha sido celebrado por escrito e com prazo determinado; II - o prazo mínimo do contrato a renovar ou a soma dos prazos ininterruptos dos contratos escritos seja de cinco anos.” No REsp 1.323.410 – MG, de Relatoria da Ministra Nancy Andrighi, a magistrada afirmou que:

“3. A Lei 8.245/91 acolheu expressamente a possibilidade de “accessio temporis”, ou seja, a soma dos períodos ininterruptos dos contratos de locação para se alcançar o prazo mínimo de 5 (cinco) anos exigido para o pedido de renovação, o que já era amplamente reconhecido pela jurisprudência, embora não constasse do Decreto n.º 24.150/1934. 4. A renovatória, embora vise garantir os direitos do locatário face às pretensões ilegítimas do locador de se apropriar patrimônio imaterial, que foi agregado ao seu imóvel pela atividade exercida pelo locatário, notadamente o fundo de comércio, o ponto comercial, também não pode se tornar uma forma de eternizar o contrato de locação, restringindo os direitos de propriedade do locador, e violando a própria natureza bilateral e consensual da avença locatícia. 5. O prazo 5 (cinco) anos mostra-se razoável para a renovação do contrato, a qual pode ser requerida novamente pelo locatário ao final do período, pois a lei não limita essa possibilidade. Mas permitir a renovação por prazos maiores, de 10, 15, 20 anos, poderia acabar contrariando a própria finalidade do instituto, dadas as sensíveis mudanças de conjuntura econômica, passíveis de ocorrer em tão longo período de tempo, além de outros fatores que possam ter influência na decisão das partes em renovar, ou não, o contrato. 6. Ouando o art. 51, caput, da Lei 8.2145 dispõe que o locatário terá direito à renovação do contrato “por igual prazo”, ele está se referido ao prazo mínimo exigido pela legislação, previsto no inciso II do art. 51, da Lei 8.245/91, para a renovação, qual seja, de 5 (cinco) anos, e não ao prazo do último contrato celebrado pelas partes. 7. A interpretação do art. 51, caput, da Lei 8.245/91, portanto, deverá se afastar da literalidade do texto, para considerar o aspecto teleológico e sistemático da norma, que prevê, no próprio inciso II

do referido dispositivo, o prazo de 5 (cinco) anos para que haja direito à renovação, a qual, por conseguinte, deverá ocorrer, no mínimo, por esse mesmo prazo. 8. A renovação do contrato de locação não residencial, nas hipóteses de “accessio temporis”, dar-se-á pelo prazo de 5 (cinco) anos, independentemente do prazo do último contrato que completou o quinquênio necessário ao ajuizamento da ação. O prazo máximo da renovação também será de 5 (cinco) anos, mesmo que a vigência da avença locatícia, considerada em sua totalidade, supere esse período. 9. Se, no curso do processo, decorrer tempo suficiente para que se complete novo interregno de 5 (cinco) anos, ao locatário cumpre ajuizar outra ação renovatória, a qual, segundo a doutrina, é recomendável que seja distribuída por dependência para que possam ser aproveitados os atos processuais como a perícia.” Assim sendo, dada toda a incompatibilidade da perpetuidade da proibição do exercício de direitos, por mais que haja uma disposição contratual nesse sentido, a cláusula é abusiva e não deve perseverar. Os direitos fundamentais no Brasil tem aplicação vertical e horizontal, e por isso, o direito de exercício da atividade empresária não pode ser cerceada por um contrato, ainda que ocorra pela livre pactuação da vontade.

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