Educação e currículo: reflexões sobre o repertório musical no ensino de música

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Mesas Temáticas para propostas e debates

Educação e currículo: reflexões sobre o repertório musical no ensino de música Autor: Fábio Amaral da Silva Sá 1 e-mail: [email protected]

País: Brasil Autor: Eliane Leão 2

e-mail: [email protected] País: Brasil Temário: Procesos pedagógicos musicales en distintos contextos (Educación General, Escuelas de Música, Proyectos Sociales). Recursos, abordajes y reflexiones;

Resumen: El objetivo de este trabajo es discutir el concepto de plan de estudios con el fin de tratar de comprender cómo la lucha de intereses y relaciones de poder interfiere en su construcción, especialmente en el área de la música. Se utilizó la revisión de la literatura y la metodología de la investigación. El trabajo se divide en tres partes, seguidas por las palabras de clausura. La primera parte trata de comprender la educación a partir de los aportes teóricos clásicos de la sociología como Durkheim (1965) y Marx y Engels (2004). La segunda parte está diseñado para pensar la relación entre el rendimiento escolar y la meritocracia, a partir de las reflexiones de Bourdieu (1998) y Dubet (2004). A continuación se presenta un análisis de concepto de currículo de Silva (2007), Sacristán (2000) y Young (2007, 2014). Por último, habrá una reflexión sobre las aportaciones teóricas en el campo de la educación y el currículo, a pensar en la construcción de repertorio musical en clases de música en Brasil. Se encontró que la educación y el plan de estudios consta de una construcción social permeada por las relaciones de poder y que se puede observar en diversas áreas del conocimiento y por lo tanto en la música. Se encontró que la construcción del repertorio musical se debe realizar con la conciencia de que la selección de géneros y estilos musicales incluidos en el plan de estudios también se guía por las relaciones de poder y que el estudiante debe dar la oportunidad de conocer más de regular, ordinario y familiar. Por lo tanto, se cree que la educación musical debe proporcionar nuevas experiencias musicales, sin dejar de considerar el discurso musical de los estudiantes.

Palavra-Chaves: Educación, Currículo, Directorio de Música.

1

Fábio Amaral da Silva Sá, Graduado em Educação Musical pela UFG. Especialista em Docência do Ensino Superior pela Sociedade Brasileira de Educação e Cultura. Aluno bolsista (CNPq) no Programa de Mestrado em Música da UFG, com pesquisa na área de Ensino Coletivo de Violão. Professor de Música e Ensino Coletivo de Violão na Secretaria Estadual de Educação do Estado de Goiás. 2

Dra. Eliane Leão, doutora pela UNICAMP. Mestre pela Purdue University. Pós-doutora pela Auburn University/CNPq. Editora de música do Art Research Journal, representante da ANPPOM. Professora no Mestrado em Música da EMAC/UFG. Pesquisadora na área de Desenvolvimento Cognitivo Musical, Metodologias de Ensino da Música, Criatividade, Ensino Coletivo e Interdisciplinaridade. Autora do livro Pesquisa em Música: apresentação de metodologias, exemplos e resultados, da Editora CRV.

O objetivo deste trabalho é refletir sobre o conceito de currículo a fim de compreender como a luta de interesses e as relações de poder interferem na sua construção, sobretudo, na área da música, a partir da escolha do repertório musical. Partese da sociologia clássica e contemporânea, com o objetivo de refletir sobre suas contribuições para o ensino da música na contemporaneidade. É importante dizer que embora os autores da sociologia clássica não utilizem o termo currículo, eles apontam discussões importantes sobre conteúdos e objetivos da educação, o que configura parte integrante da construção do currículo escolar. Esse trabalho 3 se justifica pela importância da escolha do repertório musical para o processo metodológico a ser utilizado nas aulas de músicas, já que muitos currículos são construídos a partir da escolha do repertório musical. É importante salientar que em certos casos o repertório musical pode estar diretamente atrelado ao nível de interesse e desempenho dos alunos. Foi utilizada a revisão bibliográfica como metodologia de pesquisa. Tal metodologia caracteriza-se como “[...] aquela que se realiza a partir do registro disponível, decorrente de pesquisas anteriores, em documentos impressos, como livros, teses etc.” (SEVERINO, 2007, p. 122). A primeira parte deste texto é dedicada a uma breve discussão sobre as contribuições da sociologia, especificamente os autores Durkheim (1965), Marx e Engels (2004), a fim de entender como a educação e o conteúdo é contemplado no sistema de ensino. Além disso, realiza-se uma reflexão sobre a influência tanto da sociedade como da comunidade na formação do indivíduo por meio de contribuições de Mannheim (1974), considerado um contemporâneo clássico. A segunda parte é destinada a pensar a relação entre o desempenho escolar e a meritocracia, a partir das reflexões de Bourdieu (1998) e Dubet (2004). Em seguida, busca-se realizar uma análise do conceito de currículo a partir de Silva (2007), Sacristán (2000) e Young (2007, 2014), bem como a relação do jogo de poder e de interesses na sociedade e no sistema educacional. Por fim, realiza-se uma reflexão sobre as contribuições teóricas no campo da educação e do currículo, para pensar a construção do repertório musical em aulas de música no Brasil. 3

Esse texto integra uma pesquisa de mestrado em música, em andamento na UFG, que visa estudar a aprendizagem musical a partir de uma proposta metodológica por meio de aulas coletivas de violão.

MARX, ENGELS, DURKHEIM E MANNHEIM: CONTRIBUIÇÕES DOS AUTORES CLÁSSICOS PARA PENSAR O CURRÍCULO NO ENSINO DE MÚSICA Para Durkheim (1965, p. 40-41), a existência de uma sociedade está atrelada a uma certa homogeneidade entre os membros que a integram. Para ele, a educação seria a maneira de permitir o funcionamento de toda estrutura da sociedade através da preparação das crianças pelas gerações adultas, criando as condições necessárias para administrar sua própria existência e para exercer a vida social. A educação é vista pelo teórico como função social, cabendo ao Estado a obrigação de gerir o sistema educacional, fiscalizando a esfera privada. A análise dessa perspectiva permite compreender que a discussão sobre os objetivos da educação a serem trabalhados nas instituições de ensino leva à discussão do conteúdo a ser ensinado, remetendo-nos às reflexões sobre o currículo escolar. Para Karl Marx, o indivíduo que passa horas com a mesma ocupação perde a oportunidade de desenvolver sua inteligência. Em seu pensamento "a subdivisão do trabalho é o assassinato de um povo" (MARX; ENGELS, 2004, p. 32). Por esse motivo, o indivíduo deveria se dedicar a várias ocupações para evitar o seu embrutecimento e, assim, alcançar o desenvolvimento de suas potencialidades intelectuais, físicas e técnicas. Na área educacional percebe-se que, para que essa possa ser considerada universal, o conteúdo a ser ensinado deveria ser igual para todas as camadas da sociedade. Segundo estes pressupostos, a educação das crianças deveria contemplar, em sua estrutura, conteúdos que garantissem o desenvolvimento corporal, intelectual e tecnológico. A aprovação da Lei n. 11.769/2008, que implementa a música como conteúdo obrigatório nas escolas de ensino regular no Brasil, vem contribuir com o pensamento de que o ensino da música não deve ser relegado apenas à conservatórios e cursos técnicos ou ainda àqueles indivíduos que possuem condições de pagar uma aula particular. Com a aprovação da lei há a possibilidade de oportunizar o acesso ao ensino da música a todas as crianças do país, estudantes de escolas públicas e particulares. Para Marx e Engels (2004), o processo educativo está relacionado à formação da sociedade e ao preparo da mão de obra, aspectos que permeiam o currículo escolar. É a partir da definição dos conteúdos ensinados nas unidades escolares que seria possível,

inclusive, contemplar a formação para o mercado de trabalho. Outro ponto a ser mencionado diz respeito à importância que a comunidade pode exercer no processo educativo. Se para Durkheim (1965, p. 81) a sociedade era a responsável por exercer a maior influência sobre o indivíduo, para Mannheim e Stewart (1974, p. 41) a comunidade executava esse papel. Para este, a educação é fruto da sociedade e o indivíduo é modelado visando atender a um determinado grupo. Dessa forma, a comunidade é apresentada como um "agente educativo" central, em que o processo educativo é operado de acordo com as ideias e os padrões dominantes no interior da comunidade em que o indivíduo vive. Portanto, é possível perceber que a escola não tem o poder exclusivo da educação, pois o convívio na comunidade contribui de forma direta com todo o processo educacional. Mannheim e Stewart (1974, p. 42) destacam a centralidade da comunidade, da democracia e do meio social para pensar a educação. Enfatiza a necessidade de pensá-la inserida em um contexto social, político e comunitário. Dessa forma, no caso do ensino da música, não é possível pensar o currículo a ser ministrado sem refletir sobre os interesses que permeiam a comunidade em que a escola está inserida. Para os autores, a criança sofre influências em certas conjunturas muito mais profundas do meio em que vive, em contato com seus pais e amigos, do que participando de uma formação educacional institucionalizada. As discussões realizadas acima trouxeram reflexões sobre os objetivos da educação e sobre a importância da seleção de conteúdos, a fim de reproduzir e/ou transformar a sociedade. A próxima parte será destinada a uma reflexão sobre a relação entre desigualdade e educação. BOURDIEU E DUBET: UMA REFLEXÃO SOBRE O DESEMPENHO ESCOLAR Para Bourdieu (1998, p. 53), a escola é um fator de conservação social, pois ela exige, consciente e inconscientemente dos alunos, uma vivência cultural anterior que se aproxima muito mais dos alunos originários da elite do que dos provenientes das camadas da pequena burguesia, operárias e camponesas. Nesse aspecto, alunos provenientes de famílias cultas já chegam à escola com vantagens em relação aos demais, pois já aprenderam de maneira

osmótica no seio familiar o gosto pelo bom gosto, bem como, os códigos linguísticos, culturais e até mesmo atitudes e posturas que são valorizadas pelo sistema de ensino e pela sociedade. Esses valores implícitos transmitidos pela família de forma indireta acabam por permanecer de forma interiorizada, guiando a conduta dos alunos, o que configura a formação de um ethos como denomina Bourdieu (1998, p. 48). Tudo isso vem desmistificar a crença no dom ou nas qualidades naturais, ao revelar todos esses mecanismos que estão por trás do êxito escolar dos alunos provenientes das famílias das classes cultas. Para o autor, tanto o capital cultural 4 como o ethos, colaboram para determinar os comportamentos dos alunos. As vantagens ou desvantagens sociais irão favorecer a longo prazo as vantagens e desvantagens escolares. (BOURDIEU, 1998, p. 52). Assim, a escola não é uma instituição neutra, que transmite seus valores de modo universal e igual. Os estilos e gêneros musicais valorizados no sistema de ensino, bem como as disciplinas consideradas de maior valor, são muitas vezes reflexo do gosto da cultura dominante. Constata-se nessa perspectiva que a construção do "[...] currículo da escola está baseado na cultura dominante: ele se expressa na linguagem dominante, ele é transmitido através do código cultural dominante" (SILVA, 2004, p. 35). Desse modo, é possível afirmar que a escola é um agente reprodutor de desigualdades "[...] na medida em que os alunos que já trazem da família o capital cultural exigido na escola terminam por ter melhor desempenho escolar, pois aprendem com maior facilidade os códigos que lhe são ensinados" (SÁ; LEÃO, 2014, p. 137). François Dubet (2004) analisa a desigualdade no sistema de ensino a partir da perspectiva de justiça escolar em sociedades democráticas, onde a meritocracia é eleita como uma competição justa entre os desiguais. Ele a considera "[...] um princípio essencial de justiça" (DUBET, 2004, p. 541). Para o autor a simples existência de "[...] um espaço de competição escolar objetiva não elimina as desigualdades" (Ibid., p. 542). O autor mostra, tal qual Pierre Bourdieu, que as desigualdades sociais acabam tendo uma grande influência no desempenho escolar e consequentemente também nas desigualdades escolares. Dessa forma, o modelo meritocrático acaba legitimando os resultados. Os alunos que não conseguiram êxito mediante todas as chances oferecidas pelo sistema de ensino acabam tendo que arcar sozinhos com a responsabilidade do seu próprio fracasso. 4

Capital cultural é uma expressão cunhada e utilizada por Bourdieu para analisar situações de classe na sociedade. De uma certa forma o capital cultural serve para caracterizar subculturas de classe ou de setores de classe.

Ao mesmo tempo em que o autor parte da concepção de meritocracia como uma forma importante de justiça, ele apresenta suas limitações. As formas compensatórias aparecem como uma proposta de promover a justiça escolar perante as falhas do modelo meritocrático (DUBET, 2004, p. 545). Tal discussão aponta para a necessidade da busca de outros princípios de justiça a serem aplicados no sistema de ensino. Esses autores destacam a necessidade de se pensar a educação como um sistema que pode ser reprodutor de desigualdades. O currículo integra o processo educacional e será discutido a seguir. SILVA, SACRISTÁN E YOUNG: REFLEXÕES SOBRE O CURRÍCULO Para Silva (2007, p. 22), o currículo define o que será ensinado a partir da seleção de um universo amplo de conhecimentos. Essa seleção influencia diretamente a construção da identidade daqueles que estão envolvidos no processo de ensino aprendizagem. Assim, o currículo pode ser considerado um elemento de poder a partir de um jogo de interesses, definindo o que será e o que não será contemplado dentro da sala de aula. Ou seja, toda teoria do currículo esbarra na escolha de quais conhecimentos e conteúdos ensinar e, consequentemente, no dilema de que perfil de identidades se quer construir. Para Sacristán (2000, p. 13), o conceito de currículo é recente em nosso meio, no entanto, no que se refere à teorização, o termo não está adequadamente sistematizado. Diante das várias definições de currículo existentes o autor salienta que [...] não podemos esquecer que o currículo supõe a concretização dos fins sociais e culturais, de socialização, que atribui à educação escolarizada [...] As funções que o currículo cumpre como expressão do projeto de cultura e socialização são realizadas através de seus conteúdos, de seu formato e das práticas que cria em torno de si. Tudo isso se produz ao mesmo tempo: conteúdos (culturais e intelectuais e formativos), códigos pedagógicos e ações práticas através dos quais se expressam e modelam conteúdos e formas. (SACRISTÁN, 2000, p. 15-16).

Através do currículo realiza-se os fins da educação no sistema de ensino, desse modo, compreender o objetivo da instituição de ensino passa pelo exame do currículo, por meio da análise dos conteúdos, pois o currículo acaba refletindo os valores que vigoram na instituição de ensino e também os conflitos de interesses existentes.

Já Young (2007) acredita que a comunidade não possui a centralidade da educação como acreditava Mannheim e Stewart (1974, p. 42), pois, para o autor, as escolas "[...] podem capacitar jovens a adquirir o conhecimento que, para a maioria deles, não pode ser adquirido em casa ou em sua comunidade" (YOUNG, 2007, p. 1294). O autor ao buscar responder a pergunta “para que servem as escolas?”, nos apresenta a diferenciação entre dois tipos de conhecimento: o primeiro, dito conhecimento dos poderosos, está ligado aos indivíduos de maior poder na sociedade e, consequentemente, com privilégio de acesso a certos tipos de conhecimento. O segundo, conhecimento poderoso, sendo um conhecimento especializado, geralmente não disponível em casa, transmitido pelas escolas por meio de conteúdos pré-selecionados através de um currículo escolar. (YOUNG, 2007, p. 1294). Young (2007, p. 1297) nos alerta que "não há nenhuma utilidade para os alunos em se construir um currículo em torno da sua experiência, para que este currículo possa ser validado e, como resultado, deixá-los sempre na mesma condição." Nesta perspectiva, Canen (2010) nos mostra ainda os perigos da guetização cultural, quando professores consideram apenas a cultura do aluno e não apresentam novas possibilidades culturais. Para a autora "a guetização curricular implica uma perspectiva em que grupos ou identidades étnicos-culturais optam (ou são levadas a optar) por propostas curriculares que se voltam exclusivamente ao estudo de seus padrões culturais específicos" (CANEN, 2010, p. 185). Um currículo que se comporta dessa maneira, não oferece oportunidade do aluno ter acesso ao dito conhecimento poderoso e assim acaba por prendê-lo no gueto de sua particularidade, isolando-o. Neste ponto da discussão, é preciso ressaltar a tendência dos professores de música de somente ensinar a música de interesse dos alunos, aquela a que estão expostos no ambiente em que estão inseridos. Não é oferecido ao aluno a chance de aprender novos conteúdos ou mesmo, os elementos da complexidade musical; ampliando o seu conhecimento musical. Dando a eles a oportunidade de sair dos contextos deste gueto cultural. O pensamento de Young (2014) entende o currículo como uma forma especializada de saberes que podem ser desenvolvidos de forma a expandir as oportunidades para o aprendizado. O currículo tem um papel normativo, essa afirmação possui dois significados distintos. O primeiro faz referência às regras ou normas que norteiam a construção do

currículo. O segundo "[...] refere-se ao fato de que a educação sempre implica valores morais sobre uma boa pessoa e uma "boa sociedade". (YOUNG, 2014, p. 194). Entende-se, a partir das reflexões realizadas, que um professor de música não deve impor seu conhecimento, tão pouco, ensinar apenas o que os alunos desejam. Deve existir um equilíbrio entre considerar e valorizar os conhecimentos trazidos pelos alunos e a criação de espaços e condições para novos aprendizados. CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao identificar a educação e o currículo como uma construção social permeada por relações de poder presente nas diversas áreas do conhecimento, constata-se que a construção do currículo no campo da música deve ser realizada com consciência de que a seleção de gêneros e estilos musicais perpassa essas relações de poder e que se deve dar ao aluno a oportunidade de conhecer mais do que o regular, comum e familiar. As teorias em torno do currículo permitem perceber que as relações de poder podem estar presentes na escolha de um repertório musical, como parte integrante das aulas de música. Ao pensar na seleção do repertório musical é possível observar que o professor poderá selecioná-lo objetivando reproduzir um determinado tipo de cultura ou romper com tal reprodução e valorizar a diversidade cultural que existe na sociedade. Identifica-se a necessidade da escola contribuir com a ampliação da visão de mundo dos alunos, oferecendo-lhes novas perspectivas, possibilitando-lhes entrar em contato com novos gêneros e estilos musicais que não fazem parte do meio em que vivem. Ao obsevarmos como ocorre essa seleção de repertório musical nas aulas de músicas nas escolas nota-se uma disputa de poder em relação ao tipo de repertório que deve ser ensinado. Em uma parcela de instituições percebe-se que há a valorização, de forma quase exclusiva, de um repertório de músicas eruditas de origem europeia. Em outras, há a busca da definição do repertório a partir do gosto musical dos alunos. Quando se trabalha exclusivamente com o repertório musical predominante na comunidade deixa-se de oferecer aos alunos novas possibilidades culturais, praticadas em outros contextos. Observa-se em algumas escolas que a questão da escolha do repertório é secundária.

Visam somente atender às necessidades referentes às datas comemorativas, como a seleção das músicas para o dia das mães, para a páscoa, para as festas juninas e para o natal. É o que definimos como ensino de música para o palco. Ou seja, a música é utilizada como adorno, como um pano de fundo para os trabalhos pedagógicos desenvolvidos nas referidas datas, cumprindo uma função meramente cívica, depreciando sua importância como conteúdo sério na formação integral dos estudantes. O currículo pode ser construído com diferentes objetivos a partir do jogo de interesses e de poder. Da mesma forma, práticas pedagógicas do ensino de música, fundamentadas em princípios do desenvolvimento do talento e do “dom”, podem contribuir para o privilégio de poucos, menosprezando o fato de que aprender música é um direito de todos. Desse modo, concorda-se com Swanwick (2003, p. 67) e Queiroz (2004, p. 102) que afirmam que a educação musical deve proporcionar novas experiências musicais, sem nunca deixar de considerar o discurso musical dos próprios alunos. Acredita-se, como Fernandes (2003, p. 128), que o cotidiano que o adolescente vive, como as músicas populares e da mídia, devem fazer parte da prática musical. REFERÊNCIAS BOURDIEU, Pierre. A Escola conservadora: as desigualdades frente à escola e à cultura. In: NOGUEIRA, M. A. e CATANI, A. (Eds.). Escritos de Educação. Tradução de Aparecida Joly Gouveia. Petrópolis: Vozes, 1998, p. 39-64. CANEN, Ana. Sentidos e dilemas do multiculturalismo: desafios curriculares para o novo milênio. In: LOPES, A. C. e MACEDO, E. (Org.). Currículo: debates contemporâneos. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2010. p. 174-195. DUBET, François. O que é uma escola justa? Cadernos de Pesquisa, v. 34, n. 123, p. 539-555, set./dez. 2004. FERNANDES, José Nunes. Educação Musical: temas selecionados. Curitiba: CRV, 2013. DURKHEIM, Émile. Educação e Sociologia. Tradução de Lourenço Filho. 6 ed. São Paulo: Melhoramentos, 1965. MANNHEIM, Karl; STEWART, W.A.C. Introdução à Sociologia da Educação. Tradução de Octaviano Mendes Cajado. 3.ed. São Paulo: Cultrix, 1974.

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