Educação em Lutero: um brevíssimo sumário

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Educação em Lutero: um brevíssimo sumário. George Carlos Felten1

Martinho Lutero (1483-1546) foi, sem a menor sombra de dúvidas, uma personalidade marcante na história, a ponto de influenciar o pensamento de várias nações em muitas áreas. Uma dessas áreas é a educação. Porém, para entender minimamente a percepção de Lutero nesse assunto, precisamos primeiramente compreender um pouco da história deste que foi o maior líder da reforma protestante do século XVI. Filho de agricultores que posteriormente acenderam socialmente mudando suas atuações para o minério, Lutero teve uma das melhores educações possíveis da época na Alemanha. Seus pais, embora muito rigorosos (até demais, segundo o próprio Lutero), sempre demonstraram muita preocupação com os estudos de seu filho. Em 1501 ele ingressa na Universidade de Erfurt, mas, contrariando a vontade do pai em vê-lo um jurista bem casado, Lutero ingressa em um mosteiro em 1505, onde vive uma vida de monge celibatário. Antes disso, no entanto, Lutero teve uma educação rigorosa: severidade, açoites e punições, por vezes, excediam os limites do “necessário”. Conta ele que a relação entre os professores e os alunos era como a de carrascos tratando com ladrões. Punições como açoites com varas e humilhações perante a classe eram comuns ao mínimo erro de leitura ou ao uso do alemão ao invés do latim. Porém nem tudo era tão ruim. Lutero ressalta que as imagens relacionadas ao conteúdo ensinado eram muito bonitas. Anjos com belas asas e os reis magos com a estrela de Belém foram marcantes nos primeiros anos de educação de Martinho. Além disso, ele ressalta a beleza dos cânticos que as crianças entoavam na escola, trazendo sempre a emoção para os seus corações. É importante ressaltarmos que, até então, não havia uma separação efetiva entre a Igreja e Estado na Alemanha e, por isso, os conteúdos nas salas de aula giravam em torno do assunto religioso. A imagem de um Deus irado, julgador e carrasco era transmitida pelos professores, pois os próprios mestres se apresentavam dessa forma. Isso reflete os ensinamentos da Igreja na época, que já vinha assustando as pessoas com sua inquisição há alguns bons anos.

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Bacharel em Teologia pela Universidade Luterana do Brasil (ULBRA); Aluno do programa de Licenciatura em Letras pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); Professor de Ensino Religioso do Colégio Luterano Concórdia, Porto Alegre – RS.

Lutero, pode se dizer, é um dos precursores no pensamento separatista entre Igreja e Estado. A educação pertence à relação do homem com o homem (exterior), enquanto a religiosidade pertence à relação de Deus para com o homem. Nesse sentido, educação e religião devem dialogar, mas não devem ser misturadas. Portanto, a partir do seu “histórico escolar”, Lutero passa a pensar em uma escola um pouco menos rigorosa, voltada mais para as pessoalidades e necessidades dos alunos. Não devemos pensar, porém, que Lutero era contra o rigor na disciplina das crianças. Pelo contrário, em determinado momento, Lutero fala que uma “vara de carvalho”, quando bem usada, pode ser um “bálsamo espiritual contra a doença da alma, isto é, a desobediência contra seu pai e mãe”. A pedagogia defendida por Lutero era a de uma educação lúdica, onde, com músicas e danças, os jovens pudessem aprender de forma mais prazerosa. É perceptível até mesmo um tom de interdisciplinaridade. Por exemplo: ele diz que as crianças poderiam aprender a música por meio da matemática (e vice-versa). Baseando-se em alguns métodos dos gregos, Lutero defende que a educação deve ser relevante, apaixonante, leve e lúdica (tudo, porém, com “ordem e decência” – 1 Co 14.40). Uma grande ênfase do pensamento luterano é o estudo das artes. É nelas, segundo Martinho, que a juventude consegue se libertar das coisas que os aprisionam. A música, principalmente cristã, é vista por Lutero como a chave para uma vida mais leve. Talvez disséssemos hoje: “Quem canta, os seus males espanta”. Também no conteúdo de uma escola cristã, a Bíblia deveria ser a mais costumeira lição. A Escritura Sagrada como base poderia gerar alunos preparados para o serviço de Deus tanto no âmbito secular como no eclesiástico. Aqui é importante relembrar que a educação, para Lutero, não é fonte de fé, pois esta é ação pura e exclusiva de Deus. No entanto, a escola cristã, por meio da educação pode ser um instrumento usado por esse Deus para o fortalecimento e conhecimento das revelações sobre a salvação plena conquistada por Cristo. No quesito prático, Lutero sugere que o professor imite o exemplo de Deus, que, para ensinar a humanidade, se fez homem na pessoa de Jesus Cristo, o grande mestre. Assim, o professor que quer ser um facilitador na vida de uma criança, deve “se tornar uma criança”, colocando-se no lugar do aluno e evocando lembranças da própria educação infantil. Linda é, para Lutero, a tarefa do professor! Ele tanto a eleva que a coloca na mesma altura de um ministro da Palavra de Deus, dizendo que jamais será possível recompensar ou agradecer suficientemente a um professor pelo seu trabalho.

Lutero se preocupa com uma educação não tão imediatista e pragmática, mas que preze pela qualidade e não tanto pela quantidade. Contra esse pensamento puramente pragmático, ele faz uso de uma comparação: as cidades não se fazem apenas com muros bonitos, casas bem ornamentadas e coisas do tipo, mas de pessoas bem instruídas, honestas e bem educadas. Aos cidadãos simples, uma educação comum. Porém, aos destaques, uma formação continuada para que também se tornem professores e professoras. A famosa frase atribuída a Lutero (“ao lado de cada igreja, uma escola cristã”) poderia sumarizar a importância que este pensador dá à educação. Para ele, o fim da educação é “ajudar e socorrer o mundo com pessoas qualificadas” (Lutero, 2011. P. 320). A vida do ser humano, como um todo (incluindo sua educação), é importante para Deus e, por isso, através dos dons de cada um, Ele nos guia nessa tarefa tão sublime e que deve ser o primeiro fundamento das escolas cristãs: levar Cristo para todos! Fontes: WACHHOLZ, Wilhelm. Lutero: legados pedagógicos e comunitários. In: BRANDENBURG, Laude E.; WACHHOLZ, Wilhelm (org.). Contribuições do luteranismo para a educação. São Leopoldo: Sinodal/EST, 2010. RIETH, Ricardo Willy. Reforma Luterana e educação cristã: fundamentos e perspectivas. Resumo da palestra proferida no dia 23/04/2015, no “II Fórum de Educação Cristã”, realizado no Seminário Concórdia – São Leopoldo.

LUTERO, Martinho. Aos Conselhos de Todas as Cidades da Alemanha para que criem e mantenham escolas cristãs. Trad.: Ilson Kayser. In: Obras Selecionadas, v.5. São Leopoldo: Sinodal, Porto Alegre: Concórdia Editora, 2011. Pp. 302- 325.

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