Educacao, sexo e raca no mercado de trabalho brasileiro na decada de 1990:uma avaliacao da politica de expansao educacional

June 6, 2017 | Autor: Flavio Cireno | Categoria: Education, Education and Labor Markets, Labor Market
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS Dom Walmor Oliveira de Azevedo G-C Eustáquio Afonso Araújo R Dom Joaquim Giovani Mol Guimarães V- João Francisco de Abreu P-  P   P-

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M F J A B N Organizadores

Editora PUC M B H 2007

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© 2007, Murilo Fahel e Jorge Alexandre Barbosa Neves Este livro ou parte dele não pode ser reproduzido por qualquer meio sem autorização escrita do Editor. _____________________________________________________________________________________________ G393

Gestão e avaliação de políticas sociais no Brasil / Murilo Fahel, Jorge Alexandre Barbosa Neves, organizadores. Belo Horizonte: PUC Minas, 2007. 428p.

ISBN 978-85-60778-17-1 Bibliografia. 1. Política social – Brasil. 2. Assistência social – Brasil – Avaliação. I. Fahel, Murilo. II. Neves, Jorge Alexandre Barbosa. CDU: 36.01(81) _____________________________________________________________________________________________ Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

C  Carolina Proietti Imura C  Cláudia Teles de Menezes Teixeira A  Maria Cristina Araújo Rabelo R Bárbara Sampaio Costa Flecha Maria Lina Soares Souza D Danielle de Freitas Mourão C Maria Aparecida dos Santos Mitraud P  Cássio Ribeiro | [email protected]

Editora PUC M Rua Pe. Pedro Evangelista, 377 Coração Eucarístico 30535-490 Belo Horizonte/MG Brasil Tel. 55 (31) 3375-8189 Fax 55 (31) 3376-6498 www.pucminas.br/editora [email protected]

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Educação, sexo e raça no mercado de trabalho brasileiro na década de 1990: uma avaliação da política de expansão educacional Flávio Cireno Jorge Alexandre Barbosa Neves

O mercado de trabalho no Brasil sofreu, a partir de meados da década de 1980 e durante toda a década de 1990, uma grande mudança no que diz respeito tanto aos fatores estruturais quanto às características dos indivíduos que compõem a demanda por postos de trabalho. Para a elaboração deste artigo, definiram-se dois pontos no tempo que melhor representassem as mudanças ocorridas no País, naquele período, em especial no que tange ao mercado de trabalho. Assim, os anos de 1988 e 1998 foram escolhidos como objeto de estudo e, através da análise dos dados das Pesquisas Nacionais por Amostra de Domicílio (Pnads) de 1988 e 1998, serão investigadas as transformações ocorridas no perfil dos trabalhadores e do mercado. Com a finalidade de avaliar o impacto das transformações sobre o capital humano e outras variáveis, serão propostos dois modelos de equações mincerianas1 para os dois anos. Em um segundo momento, será apresentada uma decomposição dinâmica dos coeficientes das referidas equações. 1

A equação minceriana tem este nome por causa do trabalho clássico de Jacob Mincer (1974), no qual o autor apresenta um modelo funcional para testar a teoria do capital humano.

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A decomposição dinâmica dos coeficientes das equações mincerianas terá como principal objetivo fazer uma análise dos efeitos da política de expansão do acesso à educação no Brasil na década de 1990 – em particular, da universalização do ensino fundamental ocorrida no período – sobre o mercado de trabalho. Mais especificamente, se buscará entender que efeitos essa política teve sobre a relação entre educação (principal fator de capital humano) e rendimentos do trabalho.

M      B     Durante a década de 1990, o Brasil sofreu um grande impacto na estrutura do mercado de trabalho, com conseqüências importantes sentidas até hoje. A conjunção singular de fatos, como a abertura do País ao mercado externo e o aparecimento de novas tecnologias, e fatores macroeconômicos desfavoráveis provocou uma grande transformação na estrutura ocupacional no mercado de trabalho, e o desemprego cresceu de forma preocupante. Isso se mostrou uma condição nova em um país que raras vezes teve problemas de desemprego e que, até meados da década de 1970, tinha como principais problemas a baixa qualificação do trabalhador e, conseqüentemente, a sua produtividade2 insuficiente. Uma das principais mudanças que ocorreram durante a década de 1990 no País foi a diminuição da interferência do Estado3 na economia. Até então, a atuação do Estado na economia pautava-se por um forte intervencionismo e protecionismo de mercado. Também agia como um grande empregador, através da estrutura burocrática e de empresas estatais, onde, salvo honrosas exceções, a indicação política era mais importante do que o mérito pessoal. Porém, no início da década de 1990, iniciou-se uma mudança radical na própria função do Estado e na forma pela qual este atua na economia. A abertura radical do País às importações e a reforma do Estado, com a venda de 2

3

Para uma revisão das mudanças enfrentadas no mercado de trabalho na década de 1990, Cf. Ramos (2002), Camargo (1997), Amadeo (1997) e Cireno (2002 e 2004), entre outros. Durante o governo Collor de Melo, 1990-1992, foram efetuadas as principais medidas de abertura, juntamente com a restrição das contratações para o governo, só autorizadas com concurso público, a partir da Constituição de 1988.

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E,            ...

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estatais, foram sentidas em toda a estrutura produtiva e tiveram como resultado imediato o desemprego. A paridade do dólar em relação ao real, a partir de 1994, com pequenas valorizações até 1998, juntamente com um modelo econômico monetarista e restritivo,4 causou uma segunda onda de impactos no mercado de trabalho, culminando na desvalorização do real, em dezembro de 1998, após a crise da Rússia. Dentro deste contexto, como explicar as mudanças ocorridas nos postos de trabalho no período? A literatura especializada em mercado de trabalho acredita que alguns componentes, como o conjunto de habilidades dos trabalhadores, bem como características pessoais, como gênero e raça, são considerados preponderantes na explicação das variações das recompensas do trabalho. Fatores como experiência, educação, gênero e raça, bem como as características geográficas e de setores produtivos, conseguem razoavelmente explicar os retornos monetários do trabalhador.5 Entre os fatores explicativos dos retornos de renda, o mais universal de todos eles é, sem dúvida, a educação. A partir da teoria do capital humano, este se tornou talvez o assunto mais discutido na literatura de sociologia do mercado de trabalho e da economia do trabalho. Para o caso do Brasil, Coelho e Courseuil (2002) apresentam um panorama dos retornos econômicos da educação. Analisando vários trabalhos das décadas de 1970 a 1990, eles constatam que os retornos da educação para a equação minceriana de renda apresentam-se entre 10% a 18% sobre o salário do indivíduo por ano de educação.

M Para operacionalizar o trabalho, foram utilizadas os dados das Pnads dos anos de 1988 e 1998, das quais foram selecionados os casos e as variáveis de interesse para integrar o modelo. Durante o processo de trabalho com 4

5

Para uma crítica ao modelo adotado pelo Brasil durante o governo Cardoso e outros países da América Latina, o chamado consenso de Washington ou modelo neoliberal, como é conhecido vulgarmente, ver Portes e Hoffman (2002) e Kaztman (2002), que fornecem subsídios para a discussão. Para uma revisão do papel desses fatores sobre os retornos do trabalho, cf. Mincer, (1974), Becker (1964), Schultz (1973), Telles (1993 e 1994) e Sakamoto e Chen (1992), entre outros.

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microdados, optou-se por utilizar uma amostra constituída de pessoas entre 18 e 65 anos que estivessem trabalhando na semana de referência, chegando-se a um total de 99.903 casos para o ano de 1988 e 118.931 observações para o ano de 1998.

O   MQO O método de regressão utilizado foi o de Mínimos Quadrados Ordinários (MQO), a partir do qual, para os dois anos, foram calculados os rendimentos de todos os trabalhos em número de salários mínimos.6 Para cada um dos dois pontos no tempo em questão foi estimada uma função de regressão de MQO, com a seguinte especificação do modelo: LN(Y) = α + β1 RAÇA + β2 SEXO + β3 REGIÃO + β4 IDADE + β5 IDADE2 + β6 EDUCAÇÃO + ε

Onde: LN(Y) = Logaritmo neperiano do número de salários mínimos recebidos mensalmente por todos os trabalhos; RAÇA = Variável indicadora para raça do entrevistado, dividida entre brancos e negros7 atribuindo-se o valor 1 para os brancos; SEXO = Variável indicadora para o sexo do entrevistado, atribuindo-se o valor 1 para o homem; REGIÃO = Série de variáveis indicadoras para as regiões do país (Norte, Nordeste, Sul, Centro-Oeste e, ainda, uma para o Distrito Federal), sendo a Região Sudeste a categoria de referência; IDADE = Idade8 do indivíduo em anos; 6

7 8

Os valores reais do salário mínimo para os dois anos de referência são muito próximos, sendo de R$ 242,43 em setembro de 1988 e de R$244,00 em setembro de 1998, mês anterior ao de referência da PNAD, apresentando uma diferença real de apenas 0,65% entre eles. Foi considerada população negra a soma de negros e pardos, excluídos os indígenas e amarelos. A mensuração da experiência pela idade é controversa, sendo amplamente debatida entre os pesquisadores que utilizam equações mincerianas. Todavia, Fernandes, Neves e Haller (1999) encontraram uma correlação acima de 0,9 entre as variáveis, a partir de dados brasileiros. Isso indica ser consistente utilizar a idade como proxy para a experiência.

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E,            ...

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IDADE2 = Idade do indivíduo em anos elevada ao quadrado; Escolaridade = Número de anos de estudo concluídos com sucesso (de 0 a 15).9

D    Em um segundo momento foi realizada a decomposição dinâmica dos coeficientes de ambas as regressões, uma vez que é possível fazê-lo sem perda da lógica da regressão, como justificado em Sakamoto e Chen (1992), quando afirmam que: ... uma das propriedades da regressão de mínimos quadrados é esta, quando a regressão estimada é avaliada pela média das variáveis independentes, o valor predito para a variável dependente é igual à média.10

Ou seja, uma vez que as regressões por MQO são baseadas nas médias e o valor predito em cada um dos termos da equação é dado pelo produto da posse por parte de cada um dos indivíduos das características dos termos da equação, podemos utilizar a média geral e os valores dos coeficientes para decompô-los da seguinte maneira:

(98Y’ - 88Y’) = (α98- α88) + Σ β88 (98X’ - 88X’) + Σ 88X’ (β98- β88) + Σ (98X’ - 88X’) (β98- β88) Onde: Y’: média da variável dependente; X’: média de uma variável independente; 98: indica que a medida diz respeito ao ano de 1998; 88: indica que a medida diz respeito ao de 1988; α: constante; β: coeficiente de regressão referente a uma variável independente.

9

10

Os escores de educação com mais de 15 anos de idade foram convertidos para 15 anos, para evitar problemas de heterocedasticidade no modelo. Tradução nossa.

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O primeiro componente do lado direito da equação diz respeito à constante, o segundo à média da variável de interesse, o terceiro ao coeficiente e o último ao termo interativo. Isto se dá porque, ao decompormos um termo matemático multiplicativo, em que ambos variam durante o tempo, a simples diferença entre os dois indicadores não explica a diferença no período, tendo a diferença no produto que ser levada em consideração. O termo interativo pode ser visto como um fator estrutural não explicado pela variação da média ou dos coeficientes, ou seja, pode ser interpretado como uma adequação maior ou menor das variáveis de interesse na mudança estrutural decorrente do período, pois se houvesse uma adequação significativa, ou seja, uma preparação, o termo interativo tenderia a zero e, em situações de maior inadequação, o termo interativo tenderia a crescer. Esta interpretação contradiz a interpretação correntemente apresentada por alguns pesquisadores de que apenas o aumento da média de educação faria com que o efeito de cada ano da escolaridade diminuísse no Brasil.

A     Nesta seção, serão analisadas as mudanças ocorridas, inicialmente a partir de estatísticas univariadas e bivariadas, mostrando os efeitos das variáveis de interesse no mercado de trabalho e na empregabilidade das pessoas. Em um segundo momento, serão analisadas as duas equações de Mincer, e depois será analisada a decomposição destas equações.

R    B: ,    Durante a década de 1990, os rendimentos do trabalho se alteraram de maneira significativa em relação à medida utilizada aqui (rendimento recebido de todos os trabalhos), principalmente no que diz respeito às razões entre os grupos de gênero e raça utilizados. Como mostra o G. 1, os valores em número de salários mínimos do rendimento do trabalho para a população aumentam, passando em média de

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E,            ...

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4,57 para 6,41 entre os homens brancos, que têm os rendimentos mais altos, e de 1,31 para 2,10 entre as mulheres negras, que têm os rendimentos mais baixos. Isto mostra, ao menos relativamente, que a diferença entre os rendimentos médios das mulheres e dos homens diminuiu. Os homens obtiveram um aumento médio de 40%, no caso dos brancos, e 35%, no caso dos negros, ao passo que entre as mulheres os aumentos foram de 63% e 60% para as brancas e negras, respectivamente.

Rendimento em salários mínimos

Rendimento médio por sexo e raça

G 1 – Salário médio pago, por sexo e raça – Brasil, 1988-1998 Fonte: Pnad/IBGE – elaboração própria.

Os resultados apresentados no G.1 indicam aumentos médios nos rendimentos do trabalho de todos os quatro grupos resultantes das combinações de classificações de sexo e raça. Todavia, quando observados os rendimentos através das razões11 entre os dois períodos, pode-se notar uma queda relativa da diferença de salário com relação ao sexo (queda de aproximadamente 23%), pois os homens recebiam aproximadamente duas vezes mais que as mulheres e passam a perceber aproximadamente uma vez e meia a mais. Com relação à raça a tendência é inversa, com um aumento de 13% na razão 11

As razões de rendimento foram postas de maneira que o grupo presente no denominador apresente desvantagem com relação ao grupo do numerador, fazendo assim com que os resultados sejam sempre maiores que um e os efeitos percentuais sejam compreendidos mais facilmente.

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dos salários dos brancos sobre os negros, saindo de 78% de vantagem para 100% entre os dois períodos, como mostrado na T. 1. T 1 Razões de rendimento por sexo e raça – Brasil, 1988-1998 Razões

1988

1998

Variação %

Homens/mulheres

1,96

1,51

-23,07%

Brancos/negros

1,78

2,01

12,66%

Homens brancos/ homens negros

1,98

2,05

3,52%

Homens brancos/mulheres negras

3,48

3,05

-12,30%

Homens brancos/mulheres brancas

1,81

1,55

-13,98%

Homens negros / mulheres negras

1,75

1,49

-15,28%

Mulheres Brancas / mulheres negras

1,93

1,96

1,95%

Mulheres Brancas/ homens negros

1,10

1,32

20,34%

Fonte: Pnad/IBGE, elaboração própria.

Este efeito é corroborado quando observamos as razões de sexo e raça dos quatro grupos, nas quais as variações entre os dois períodos dentro dos grupos de sexo permanecem aproximadamente constantes (variações positivas de 3,5% entre os homens e 2% entre as mulheres, em favor dos brancos) enquanto que, nos casos nos quais as razões envolvem sexos diferentes, nota-se uma queda significativa, com uma diminuição das razões variando entre 12% e 15%, aproximadamente. Por outro lado, nota-se um aumento de 20% da vantagem das mulheres brancas sobre os homens negros, saindo de um diferencial médio de 10% para 32%, em favor do primeiro grupo. Com isto, podemos observar que, no período estudado, os diferenciais de rendimento entre homens e mulheres caíram significativamente, enquanto que os diferenciais de rendimento entre os grupos de negros e brancos permaneceram praticamente inalterados. Isto se deve, provavelmente, a uma melhor inserção das mulheres no mercado de trabalho, juntamente com o fechamento de muitos postos de trabalho em ocupações tipicamente masculinas, como ocorreu no setor industrial, que remunerava bem e exigia um baixo índice de escolaridade.

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E,            ...

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E      1990 A distribuição dos retornos da educação durante o período estudado apresenta características interessantes. O G. 2 mostra que a conclusão do Ensino Fundamental (ou seja, o oitavo ano de escolaridade) passa a ser uma credencial com efeito mais forte e visível em 1998 do que era em 1988. Ao mesmo tempo, a conclusão do primeiro ciclo deste nível de ensino (do quarto ano) parece perder importância. Ou seja, o mercado passa a reconhecer como credencial o Ensino Fundamental completo e a remunerar de forma diferenciada os indivíduos com este grau de escolaridade, ao passo que a conclusão da primeira metade deste nível de ensino perde importância. Vale a pena ressaltar, também, que os dados de 1998 mostram um diferencial de rendimento do trabalho bem menor entre os que concluíram o Ensino Fundamental e os que concluíram o Ensino Médio do que em 1988. Renda média por anos escolaridade (1988 - 1998)

Anos de escolaridade

G 2 – Distribuição do rendimento médio por escolaridade – Brasil, 1988-1998 Fonte: Pnad/IBGE – Elaboração própria.

Porém, observando mais atentamente as curvas de rendimentos com relação ao sexo do trabalhador, podemos notar uma queda relativa na remuneração dos indivíduos do sexo masculino com o Ensino Fundamental completo em

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diante, e uma diminuição da diferença salarial nesta faixa com relação às mulheres, que aumentam os seus retornos, como mostra o G. 3. Razão de rendimentos: gêneros por anos de escolaridade

Anos de escolaridade

G 3 - Distribuição da razão do rendimento médio por sexo e anos de escolaridade – Brasil, 1988-1998 Fonte: PNAD/IBGE – Elaboração própria.

Com relação às médias de escolaridade, quando comparadas aos retornos de rendimento, um dos diferenciais do período foi o aumento destas, como mostra a T. 2. Particularmente, em um grupo específico – os homens brancos (com um aumento de 20% na média de escolaridade) –, isso se observou de forma ainda mais marcante. Todavia, esse aumento na escolaridade não foi acompanhado pelo retorno em rendimento que se suporia, o que indica que simplesmente o aumento desta média não trouxe retornos para todos os grupos populacionais. Talvez, mais uma vez, esta diferença se deva ao tipo de ocupação, com uma barreira de entrada para os homens de baixa escolaridade, cujas ocupações desapareceram.

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E,            ...

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T 2 Número médio de anos de escolaridade por sexo e raça – Brasil, 1988-1998 Sexo

Raça

1988

1998

Diferença

Masculino

Negra

4,16

5,09

0,93

Branca

6,19

7,38

1,20

Negra

5,32

6,44

1,12

Branca

7,63

8,74

1,11

Feminino

Fonte: PnadD/IBGE – Elaboração própria.

Finalizando, podemos apresentar algumas indicações para a análise multivariada, uma vez que com relação aos grupos de sexo/raça e a educação, o grupo que teve o maior aumento da média de escolaridade, tanto relativa quanto absoluta, obteve o menor retorno em rendimento, quando comparado aos outros grupos de interesse. Ou seja, a relação entre escolaridade e retornos de rendimento está mediada por variáveis sociais de caráter individual, como sexo, ou estrutural do mercado de trabalho, não discutidas neste artigo.

A  Como descrito na seção anterior, os retornos de educação atuam de forma diferente com relação aos grupos de sexo/raça durante o período escolhido. Por causa deste efeito, optou-se por uma estratégia de utilizar duas equações mincerianas de MQO e, em um segundo momento, fazer a decomposição destas, indicando assim qual o efeito real da variação dos coeficientes e da média, levando em consideração o termo interativo. O Valor de Predição (R2) dos modelos descritos anteriormente foi de aproximadamente 0,47 para 1988 e 0,48 para 1998. Para todos os preditores em ambos os modelos, foi conseguido um p-valor abaixo de 0,001, e foram testados possíveis problemas de heterocedasticidade e endogeneidade, o primeiro através de análise gráfica e o segundo através do teste de Hausman, com resultados negativos para ambas. Na análise dos coeficientes apresentados na T. 3, vai-se concentrar nos coeficientes de escolaridade, raça, sexo e região, uma vez que o termo da idade só se torna analisável para cada uma das idades determinadas, e a análise para a média da distribuição não traria grande poder heurístico ao trabalho.

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35,80

0,8610

Xbar

B

0,0916

-2,256

1998

5,69

0,65

0,53

0,16

0,29

0,09

0,03

0,10

β2 GÊNERO

β1 RAÇA

β3 REGIÃO S

β3 REGIÃO NE

β3 REGIÃO N

β3 REGIÃO DF

β3 REGIÃO CO

-0,0875

0,1988

-0,0347

-0,3958

-0,0492

0,1799

0,7738

0,1364

0,09

0,03

0,07

0,29

0,18

0,54

0,62

6,83

-0,1041

0,2815

-0,1489

-0,3673

-0,0495

0,1706

0,5627

0,1270

1344,57 -0,0013 1413,79 -0,0010

β6 EDUCAÇÃO

β5 IDADE2

0,1199

34,73

β4 IDADE

B

-3,2515

0,3882

Xbar

1988

¡

LN(Y)

VARIÁVEIS NO MODELO 1998

-0,01

0,01

0,00

-0,11

-0,01

0,10

0,50

0,78

-1,77

4,16

-0,01

0,01

-0,01

-0,10

-0,01

0,09

0,35

0,87

-1,35

3,28

-3,252 -2,256

1988

TERMO DA EQUAÇÃO

0,00

0,00

-0,01

0,01

0,00

0,00

-0,15

0,09

0,42

-0,88

0,995

0,4728

DIF COEF.

-0,0534

0,4886

5,50%

34,90%

72,39%

-8,53%

12,15%

-4,08%

-0,0016

0,0023

-0,0097

0,0082

0,0000

-0,0049

-44,02% -0,1371

10,58%

-31,39%

-26,89% -0,9803

VAR. PERC.

T 3 Decomposição dinâmica dos coeficientes da equação de Mincer

INT.

0,0009

0,0005

0,0005

0,0002

0,0002

0,0015

0,0008 -0,0001

-0,0010 0,0000

0,0013 -0,0001

-0,0227 0,0062

0,1560 -0,0107

-0,0911 0,0252

0,1285 -0,0303

0,9951

0,4728

MÉDIA

-0,0005

0,0029

-0,0078

0,0089

-0,0011

-0,0037

-0,1536

0,0918

0,4227

-0,8820

DIFERENÇA

DECOMPOSIÇÃO

338 F C | J A B N

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E,            ...

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Para o ano de 1988, a média de anos de escolaridade encontrada foi de 5,7 anos. Pode-se observar que, controlado pelos outros fatores, cada ano a mais de educação tem um efeito de aproximadamente 13,6% no rendimento do trabalho. Com relação ao ano de 1998, a média de escolaridade aumenta em cerca de 1,1 ano, quando comparada ao ano de 1988, chegando-se a uma média de 6,8 anos. Em 1998 cada ano a mais de educação gera um acréscimo de 12,7% no rendimento do trabalho. Isto demonstra uma queda no retorno salarial da educação, o que leva imediatamente a atribuir este efeito ao aumento da média. Porém, quando se observa a decomposição, nota-se que a variação real é bem menor com relação ao efeito da média, de cerca de 15% no rendimento do indivíduo médio, enquanto que o efeito do coeficiente, que é negativo, gera um diferencial de 5%. O termo interativo da equação gera uma diferença geral para o indivíduo com educação média de 9,18%, em termos positivos, com uma variação não explicada de 2,52%. Embora os sinais se mantenham da mesma forma, pode-se observar que as mudanças no coeficiente e na média são menores nas diferenças simples, com um baixo grau de influência de fatores externos (termo interativo). De outra maneira, podese dizer que a variação “real” do termo total é dada pelo aumento da média e diminuição (embora pequena) do coeficiente, e um baixo grau de variação não explicada. Já com relação ao sexo do indivíduo, em 1988 pode-se interpretar que pertencer ao sexo masculino implica um diferencial de salário de aproximadamente 77,4% a mais, controlando-se pelas outras variáveis. Os homens ocupavam aproximadamente 65% no mercado de trabalho. Em 1998, há uma diminuição na proporção de homens no mercado de trabalho, de aproximadamente três pontos percentuais, com uma diminuição na vantagem de ser homem, de cerca de 21 pontos percentuais. Para as proporções da distribuição, os homens teriam, em média, uma massa salarial cerca de 50% maior em 1988, o que é reduzido para uma vantagem de cerca de 35%. Ao observar-se esta diferença, pode-se dizer que as mulheres têm um diferencial positivo com relação à qualidade da ocupação, em termos de rendimento do trabalho, mesmo controlando-se pela educação. Com relação à raça, observa-se que houve uma pequena diminuição de negros no mercado de trabalho, de 47% para 46%. Cada ano a mais de escolaridade representava para os brancos, em 1988, um acréscimo 17,9% no rendimento do trabalho. Em 1998 este percentual caiu para menos de

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17,1%. Com relação à região, como nas equações anteriores, o fato de ser da região Nordeste reduz o rendimento do trabalho em cerca de 40% em 1988 e 37% em 1998, em relação à região Sudeste, com uma diminuição de três pontos percentuais aproximadamente, ou 7,5%, e o fato de ser do Distrito Federal aumenta o rendimento do trabalho em cerca de 28% em relação à região Sudeste em 1998, um acréscimo de cerca de oito pontos percentuais, em relação a 1988, ou quase 42%. Isto não levou a uma diferença significativa com relação às estruturas regionais, havendo uma relativa estabilidade nas regiões, embora haja um pequeno aumento na proporção da participação da região Norte e Centro-Oeste na composição da amostra e um ligeiro aumento na região Sul.

C Após a análise dos dados no período, tanto da análise das estatísticas descritivas quanto das equações de Mincer e da decomposição dinâmica, pode-se afirmar que, com relação à educação, o mercado de trabalho tornou-se mais seletivo, principalmente com relação aos setores que exigiam escolaridade mais baixa, como apresentados na análise gráfica. Isto se deve ao aumento da escolaridade média e também ao fechamento de postos de trabalhos de baixa qualificação. Nota-se também uma estabilidade desconcertante com relação aos coeficientes de raça nas equações, bem como na escolaridade dos indivíduos. Pode-se dizer que a escolaridade média das pessoas no Brasil foi aumentada no período de maneira uniforme com relação à raça – bem como mantidos seus efeitos no mercado de trabalho –, o que não se pode dizer que seja um indicador muito positivo com relação à universalização do acesso à educação fundamental ocorrida no período, visto que a estrutura de extrema desigualdade educacional entre pessoas de cor branca e de cor negra praticamente se manteve inalterada. A grande mudança no período se deveu à entrada das mulheres no mercado de trabalho, visto que, controlando-se pelos outros fatores nas equações, conseguiram diminuir em 15% o diferencial de rendimento do trabalho em relação aos homens. Isto se dá, como se pôde ver anteriormente, pela

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E,            ...

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diminuição dos aumentos de rendimentos do trabalho associados aos anos de escolaridade, especificamente nas ocupações que exigem menor e maior escolaridade. Uma análise mais aprofundada deverá mostrar que isto se deve a uma queda na disponibilidade das ocupações masculinas que exigiam baixa escolaridade e traziam retornos mais altos, bem como pela diminuição da diferença dos salários dessas mulheres em relação aos homens, no que diz respeito a ocupações mais qualificadas, a partir dos 11 anos de escolaridade. Porém, para corroborar estes resultados, seria necessária a realização de um estudo mais específico em relação à estrutura ocupacional, levando em consideração a questão de gênero. Finalmente, uma última e importante conclusão que se pode tirar das análises apresentadas é a de que há pouca (ou nenhuma) evidência para se afirmar que a queda na taxa de retorno salarial da educação ocorrida no Brasil durante os anos 1990 se deveu à elevação da média dos anos de escolaridade da População Economicamente Ativa. Os resultados da decomposição dinâmica das equações mincerianas de 1988 e de 1998 mostram que esta é uma hipótese muito pouco plausível. Isto mostra que, a política educacional de universalização do Ensino Fundamental não teve o impacto positivo esperado (por quem a concebeu) sobre o mercado de trabalho. A queda da taxa de retorno se deveu, provavelmente,12 à falta de dinamismo do mercado de trabalho, que não conseguiu gerar empregos de qualidade para absorver uma mão-de-obra mais qualificada. Portanto, pode-se concluir que os resultados aqui encontrados evidenciam as limitações das políticas educacionais para atuar sobre o mercado de trabalho. A expansão da educação tem vários efeitos desejáveis para a sociedade, porém parece ser pouco provável que ela sozinha13 consiga causar maiores impactos positivos sobre o mercado de trabalho.

12

13

Este “provavelmente” aqui colocado é deveras importante, pois neste capítulo não se tem uma única evidência para se chegar a esta conclusão. Trata-se, portanto, apenas de uma hipótese. A palavra “sozinha” aqui também merece um comentário, pois o que se está querendo afirmar é que políticas de expansão educacional podem até ter efeitos positivos sobre o mercado de trabalho, porém apenas se acompanhadas por um processo robusto de geração de empregos de qualidade. Como afirma Thurow (1975), só há trabalhadores qualificados com salários adequados quando há empregos de qualidade.

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F C | J A B N

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E,            ...

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