Educando pelas Trilhas do Cerrado Um roteiro de ações para introduzir a EA.pdf

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Descrição do Produto

Mery Lucy do Vale e Souza Andréia Cassilha Andrigueto Regina Célia Pereira Fernandes de Souza Autores:

Ana Patrícia Oliveira Ramos Siqueira Andréia Cassilha Andrigueto Bruna Cardoso Evangelista José Rozalvo Andrigueto Lêda Bhadra Bevilacqua Maria Tereza Leite Montalvão Mery Lucy do Vale e Souza Priscila Bernades Álvares Regina Celia Pereira Fernandes de Souza Rodrigo Gerhardt Ronei Alves da Silva Rosângela Azevedo Corrêa Virgílio Braz de Queiroz Junior

2a edição

Rede de Sementes do Cerrado Brasília 2015

Proibida a venda

Organizadores:

2a edição DIRETORIA DA REDE DE SEMENTES DO CERRADO Presidente Regina Célia Pereira Fernandes de Souza Vice-Presidente Maria Magaly Velloso da Silva Wetzel Tesoureira Angelika Bredt Conselho Consultivo Alba Evangelista Ramos Cássia Beatriz Rodrigues Munhoz Manoel Cláudio da Silva Júnior Sarah Cristina Caldas Oliveira Conselho Fiscal Ana Palmira Silva Germana Maria Cavalcanti Lemos Reis Marcelo Kuhlmann Peres Mery Lucy do Vale e Souza Coordenador do Projeto Semeando o Bioma Cerrado José Rozalvo Andrigueto Coordenação de Educação Ambiental Associação dos Amigos das Florestas (AAF) Educando pelas trilhas do Cerrado - Um Roteiro de Ações para Introduzir a Educação Ambiental em Escolas e Comunidades/Compilação de ideias sobre educação ambiental – 2a ediçãoBrasília-2015 Organizadores Mery Lucy do Vale e Souza Andréia Cassilha Andrigueto Regina Célia Pereira Fernandes de Souza Apresentação Regina Célia Pereira Fernandes de Souza Prefácio José Rozalvo Andrigueto Projeto gráfico, diagramação e ilustração Heraldo Lima e Renato Mendes - RP Comunicação Integrada Revisão Yana Maria Palankof

S729 e 2015

Souza, Mery Lucy do Vale. EDUCANDO pelas trilhas do cerrado: um roteiro de ações para introduzir a educação ambiental em escolas e comunidades / organizadores, Mery Lucy do Vale e Souza, Andréia Cassilha Andrigueto, Regina Celia Pereira Fernandes de Souza. – Brasília : Rede de Sementes do Cerrado, 2015. 160 p. : il. color. ; 21 cm x 30 cm. Projeto Semeando o Bioma Cerrado. ISBN 978-85-99887-11-0 1. Bioma Cerrado. 2. Desenvolvimento sustentável. 3. Educação ambiental. I. Souza, Mery Lucy do Vale e. Andrigueto, Andréia Cassilha. III. Título. Souza, Regina Celia Pereira Fernandes de. IV. Título. CDD 375.0083

QUEM SOMOS REDE DE SEMENTES DO CERRADO A Rede de Sementes do Cerrado (RSC) foi constituída em 2004 como uma associação civil, pessoa jurídica de direito privado, com natureza e fins não lucrativos e sem caráter político-partidário. Foi qualificada em 2005 como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) e tem como objetivo principal a defesa, a preservação, a conservação, o manejo, a recuperação, a promoção de estudos e pesquisas e a divulgação de informações técnicas e científicas relativas ao meio ambiente do Cerrado, especialmente no Brasil Central. É mantida com recursos provenientes dos projetos executados, com as contribuições de seus associados, a comercialização de sementes nativas e a venda dos livros que publica. A Rede busca ainda o fomento equilibrado da oferta e da demanda de sementes e mudas de plantas nativas do Cerrado por meio de cursos de capacitação e da divulgação de informações técnicas, com o intuito de ampliar os conhecimentos e garantir a proteção, a valorização e a preservação desse bioma. Esses cursos de capacitação vêm sendo desenvolvidos em várias localidades do Distrito Federal, de Goiás (Alto Paraíso de Goiás, Cavalcante, Goianésia, Goiânia e Pirenópolis), de Minas Gerais (Arinos e Rio Pardo de Minas) e de Mato Grosso (Sinop), para os mais diversos profissionais e pessoas interessadas de assentamentos, pequenas comunidades e entidades públicas e privadas. Os cursos abordam temas como identificação de árvores nativas do Cerrado; qualidade de madeiras, e seleção e marcação de árvores matrizes; coleta e beneficiamento de sementes e produção de mudas. Além disso, oficinas de educação ambiental têm sido desenvolvidas, pois não se preserva um bioma só com plantio de árvores. É preciso resgatar atitudes e valores e agregar ações como força impulsionadora capaz de desencadear ações e atitudes transdisciplinares em defesa do Cerrado para o reposicionamento do ser humano. Nessas oficinas, a semente é um símbolo com o qual a criança se identifica nas diversas etapas de sua vida, descobrindo-se e estabelecendo uma relação com o mundo que a rodeia. Essas ações são voltadas também aos anseios de professores de determinadas escolas, que buscam nessas atividades suporte para projetos que envolvam toda a comunidade escolar, uma vez que com a ecopedagogia se trabalha a fundamentação teórica da “cidadania planetária”, cuja ideia é dar sentido para a ação dos homens como seres vivos que compartilham com as demais vidas a experiência do planeta Terra. A Rede de Sementes do Cerrado mantém parceria com instituições públicas e privadas comprometidas com a conservação e a recuperação do Cerrado: Associação dos Amigos das Florestas, Câmara dos Deputados, Centro de Referência em Conservação da Natureza e Recuperação de Áreas Degradadas (Crad/UnB), Clube da Semente do Brasil, Embrapa Agrossilvipastoril (Sinop/MT), Escola da Natureza, ICMBio/Parna Chapada dos Veadeiros, Instituto Brasília Ambiental (Ibram), Instituto Oca Brasil (Alto Paraíso de Goiás), Instituto Chico Mendes/Floresta Nacional de Brasília, Secretaria de Estado de Agricultura e Desenvolvimento Rural do Distrito Federal (Seagri), Universidade Federal de Goiás (UFG, Goiânia-GO), entre outros.

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Associação dos Amigos das Florestas (AAF) A Associação dos Amigos das Florestas foi fundada em 2005. É uma organização sem fins lucrativos, pessoa jurídica de direito privado, certificada pelo Ministério da Justiça como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip), amparada pela Lei n. 9.790, de 23 de março de 1999. Foi instituída com a proposta de criar atividades de educação ambiental, pesquisas e experiências que conduzam as comunidades do entorno das Unidades de Conservação ao desenvolvimento sustentável. O objetivo da AAF é a promoção da relação harmoniosa do homem com a natureza, utilizando recursos de mobilização social e educação para a cidadania ecológica. Também busca o incentivo à proteção, à fiscalização, à conservação, à recuperação e ao manejo sustentável do meio ambiente, além de propor a capacitação de agentes multiplicadores da mensagem ecológica de sustentabilidade para diversas comunidades. Sua equipe técnica é multidisciplinar e utiliza tecnologias alternativas de plantio e sensibilização de crianças e jovens e, com a ecopedagogia utiliza práticas pedagógicas do aprender a fazer fazendo. A valorização dos saberes populares e todas as formas de comunicação social são usadas em seus trabalhos, com linguagem e veículos adaptados ao público determinado, enfocando e vinculando sempre conservação e desenvolvimento como ferramenta fundamental para se conter o processo de degradação ambiental nas áreas em que atua. A AAF desenvolve, desde sua fundação, diversas atividades, como oficinas, palestras, minicursos e atividades de lazer em parceria com o Núcleo de Educação Ambiental (NEA) do Parque Nacional de Brasília (PNB), a Escola da Natureza, a Rede de Sementes do Cerrado, a Casa do Ribeirão Sobradinho, entre outros, atuando também em eventos e em instituições de ensino com o objetivo de mobilização social para a inclusão do bioma Cerrado como patrimônio nacional na Constituição brasileira. Desde 2008 a AAF atua nas dependências da Associação dos Produtores do Núcleo Rural Lago Oeste (Asproeste), no Núcleo Rural Lago Oeste, entorno do Parque Nacional de Brasília (PNB) e da Reserva Biológica da Contagem (Rebio), com atividades de educação ambiental para os estudantes da região e para a comunidade. Em sua sede de campo mantém um viveiro educador como modelo de instrumento pedagógico e área de capacitação da comunidade. O viveiro é referência para a produção de mudas de espécies nativas do Cerrado utilizadas para reposição da vegetação da região e em projetos de recuperação de áreas degradadas. Trabalha também com comunidades que interferem diretamente nos recursos naturais da região. Os projetos da AAF buscam resgatar o encantamento pela vida, em sintonia com as disciplinas elencadas pelas escolas, agregando valores aos conteúdos aplicados às diversas etapas na construção do conhecimento. Com vivências em campo, a Associação busca fomentar discussões a respeito dos impactos causados ao ambiente natural e ao ser humano relacionados à concepção de produção e consumo e ao conceito de necessidades humanas impostos pelo avanço da tecnologia, pela massificação da mídia e também por outras questões que comprometem a qualidade de vida no planeta. A Associação vincula a prática de esportes ao meio ambiente, em uma perspectiva transdisciplinar, como estratégia de mobilização e promoção social, tendo como apoiador o Instituto Joaquim Cruz. Outra realização da Associação é a promoção de capacitação de professores e jovens, o incentivo à produção e ao plantio de árvores nativas, montagens de oficinas ecopedagógicas com reaproveitamento de resíduos, oferecendo dessa forma oportunidades de atividades sustentáveis de renda para os participantes e seus familiares, além de proporcionar visitas educativas que disseminam informações, conhecimentos e vivências para a prevenção, o cuidado e o uso correto dos recursos naturais, bem como para o respeito e a proteção aos animais. Atuar no planejamento, na coordenação e na execução das atividades de educação ambiental no Projeto Semeando o Bioma Cerrado é uma grande oportunidade para o alcance do objetivo institucional da Associação dos Amigos das Florestas.

Autores *Ana Patrícia Oliveira Ramos Siqueira: É professora com formação em Teologia. Cursa Pedagogia na Faculdade de Educação/UnB. Especializada em artes, atua em oficinas de desenhos, pinturas de painéis e construção de brinquedos a partir de sucatas. É também, contadora de histórias. Para incentivar a proteção e sustentabilidade do Cerrado ela usa e abusa da criatividade e sensibilidade para passar conhecimentos de uma das maiores riqueza, o Cerrado. *Andréia Cassilha Andrigueto Venturoli: É bióloga, pela Universidade Federal de

Uberlândia-MG e mestre em Desenvolvimento Sustentável pelo CDS/UnB. Atuou na coordenadoria de Apoio à Sustentabilidade, Qualidade e Gestão Ambiental da Embrapa, empresa onde trabalha desde 2010. Mora e convive com as histórias do Cerrado desde pequena, aprendendo a amar e a defender as suas árvores tortas e animais exóticos. Também dá aula e orienta alunos na área de Educação Ambiental em curso de pós-graduação no UniCEUB, Brasília. Recebeu a honrosa missão de contribuir na revisão e organização dessa publicação, em sua segunda edição.

*Bruna Cardoso Evangelista: É Graduanda em Engenharia Florestal/UnB e Estagiária na Embrapa na Coordenadoria de Apoio à Sustentabilidade, Qualidade e Gestão Ambiental. Consultora da Empresa Júnior de Consultoria Florestal-ECOFLOR. *José Rozalvo Andrigueto: É graduado em Engenharia Agrônomica pela Universidade Federal do Paraná, mestrado em Tecnologia de Sementes pela Universidade Federal de Pelotas-RS e Doutorado em Seed Technology pela Mississippi State University. Pós- doutorado pela Universidade de Lleida-Espanha. Há quatro anos coordena o Projeto Semeando o Bioma Cerrado da Rede de Sementes do Cerrado.

*Lêda Bhadra Bevilacqua : É professora, foi membro da Escola da Natureza e esteve a frente de sua direção por 10 anos. Facilitadora titular de biodança, especialista em educação ambiental e educação biocêntrica.

*Maria Tereza Leite Montalvão: É graduanda em Engenharia Florestal/UnB.

Possui avançados conhecimentos na área de Geoprocessamento. Estagiária na Coordenadoria de Apoio à Sustentabilidade, Qualidade e Gestão Ambiental/ Embrapa. Presidente da Empresa Junior de Consultoria Florestal-ECOFLOR. *Mery-Lucy do Vale e Souza: É Presidente da Associação dos Amigos das FlorestasAAF. Bacharel em Comunicação Social pela Universidade Católica de Pelotas/ RS, especializada em jornalismo - professora/Educadora Ambiental-pós graduada em Metodologia de Ensino Superior, pela Universidade Católica de Pelotas/RS, em Gestão Ambiental, pela Escola Nacional de Administração Pública, Brasília/DF e Marketing para Serviços Públicos e Privados, pela Fundação Getúlio Vargas, Brasília/ DF. Especialista em Realidade Educacional Brasileira, pela Faculdade de Educação e Centro de Treinamento do Sul Pelotas-RS, capacitada em Agroecologia, Ecopedagogia, Educação Humanitária e Bem Estar Animal, pela Escola da Natureza/DF.

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*Priscila Bernades Álvares: graduada em Turismo pelo Centro Universitário de Brasília - UniCEUB, Mestrado em Desenvolvimento Sustentável pelo Centro de Desenvolvimento Sustentável/UnB. Foi professora adjunta da Faculdade de Ciências Sociais e Tecnológicas – FACITEC. Trabalhou no WWF-Brasil no Programa de Educação para Sociedades Sustentáveis. Atualmente é pesquisadora da Universidade de Brasília e trabalha com o Plano Regional de Saneamento Básico da RIDE-DF e Entorno. É professora colaboradora no UNICEUB-DF (priscilabernardes.unb@ gmail.com ). *Regina Celia Pereira Fernandes de Souza: é goiana de nascimento e cerratense de coração. Com formação acadêmica em Física do Estado Sólido, foi professora na Universidade de São Paulo e da Universidade de Brasília, tendo trabalhado também na área de Tecnologia da Informação. Apaixonada pelo Cerrado e defensora do meio ambiente, atuou na ONG Ambiental da Cafuringa e na Associação dos Amigos das Florestas. É associada mantenedora da Rede de Sementes do Cerrado desde 2007 e ocupa atualmente o cargo de Presidente. *Rodrigo Gerhardt: É jornalista, especialista em Gestão da Sustentabilidade pela Fundação Getúlio Vargas e editor do Planeta Sustentável, uma multiplataforma de comunicação para a sustentabilidade, liderada pela Editora Abril. *Ronei Alves da Silva: É presidente da Central de Cooperativas de Materiais Recicláveis do Distrito Federal e Entorno – CENTCOOP/DF; É estudante de Direito com formação em Cooperativismo pela Organização das Cooperativas do Distrito Federal – OCDF e Corporación Cooperativa Mondragón – MCC na Espanha; representante da Comissão Nacional do Movimento Nacional de Catadores de Materiais Recicláveis – MNCR; Membro do Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA; Membro do Conselho de Administração da Organização das Cooperativas do Distrito Federal; Representante no Conselho do Projeto do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES para promoção da inclusão social e produtiva de catadores na capital federal. (ras.brasil@hotmail. com). *Rosângela de Azevedo Corrêa: Cerratense de nascimento, corpo e alma. Doutora em Antropologia Social. Professora na Área de Educação Ambiental e Ecologia Humana na Faculdade de Educação da Universidade de Brasília. Coordenadora do Programa Educação Ambiental nas Escolas Públicas do DF. *Virgílio Braz de Queiroz Junior: É empregado da Embrapa, formado em Engenharia

Florestal com Mestrado em Ciências Florestais. Atua na área de sementes, gestão ambiental no Cadastro Ambiental Rural das propriedades da Embrapa. Atua também como Consultor Ambiental, Perito, Agrário e Geomensor, desenvolvendo serviços e estudos ambientais para adequação e regularização ambiental de propriedades rurais.

Dedicatória Dedicamos este livro a todos aqueles que, independentemente da formação, são disseminadores de conhecimentos e podem e devem tornar-se educadores ambientais, utilizando a transversalidade do tema em todas as suas ações de convivência harmoniosa com o planeta e, em especial, àqueles que interagem com a desconhecida diversidade do Bioma Cerrado na difícil tarefa de contribuir para sua conservação e proteção. “Enquanto a sociedade feliz não chega, que haja pelo menos  fragmentos de futuro em que a alegria é servida como sacramento, para que as crianças aprendam que o mundo pode ser diferente. Que a escola, ela mesma, seja um fragmento do futuro...”

Rubem Alves

(Retirado do site: www.releituras.com/rubensalves_bio.asp)

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AGRADECIMENTOS Aos colaboradores Em primeiro lugar, agradecemos sinceramente a todos os colaboradores que permitiram a inclusão de seus artigos, pesquisas, textos, fotografias e ilustrações como contribuição a este trabalho voltado à introdução do tema ambiental em escolas e comunidades. A nova edição, além de revisar e atualizar os textos de 2012, foi estruturada em duas partes para facilitar a leitura e a aplicação dos instrumentos aqui sugeridos.

À Mãe Natureza “Nossos agradecimentos Por todos os mistérios da terra, do fogo, do ar, da água  Nossos profundos agradecimentos à Mãe Terra por todos os mistérios que seguram este planeta Terra, que sustenta toda a vida nele  Nossos agradecimentos a todas as árvores, a todos os animais, a todo ser vivo que respira o mesmo ar, que bebe a mesma água, que se alimenta do mesmo Sol, que se nutre com toda a vida  Nossos agradecimentos pelo coração da Mãe Terra, que bate incessantemente mantendo toda a vida do planeta e mantendo todos os corações que batem  Nossos agradecimentos pela respiração do planeta.  Nossos agradecimentos humildes por não compreendermos nada  Nossos humildes agradecimentos à sabedoria, a maior sabedoria de sabermos que nada sabemos  De saber profundamente que nada somos diante do mistério da vida, de todos os mistérios que comandam os rumos do planeta e todas as vidas  Nossa gratidão por esta sabedoria, a sabedoria de nada saber.” (Palavras de um índio, em um dia de lua cheia, setembro de 2007. Disponível em: )

Aos Parceiros A Rede de Sementes do Cerrado agradece ainda às instituições que mantêm contratos e termos de cooperação técnica: Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa); Centro de Referência em Conservação da Natureza e Recuperação de Áreas Degradadas (Crad/UnB); Universidade Federal de Goiás (UFG); Instituto Oca Brasil; Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento do Distrito Federal (SEAGRI-DF); Escola da Natureza; Cooperativa de Agricultores Familiares Agroextrativistas de Água Boa II Ltda.; Reserva Ecológica Centro Caraívas; Centro Espírita Aprendizes do Evangelho; Organização Social Cristã Espírita André Luiz (ProjetoTransformar.org); Associação Córrego Barriguda; e Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos (Finatec) (termo de apoio). Agradece também a cooperação com a Câmara dos Deputados, o Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do Distrito Federal Brasília Ambiental (Ibram), o Instituto Federal de Brasília (IFB), a Administração da Floresta Nacional de Brasília, a Casa do Ribeirão Sobradinho, a Associação dos Produtores Rurais do Lago Oeste, a Administração da Cidade da Fraternidade (Alto Paraíso de Goiás) e o Jardim Botânico de Brasília, entre outros. Agradece às escolas nas quais foram realizadas as oficinas de educação ambiental: Escola Classe Rua do Mato, Fercal-DF; Centro de Ensino Fundamental Professor Carlos Mota, Núcleo Rural Lago Oeste-DF; Escola Municipal Zeca de Farias e Escola Municipal Casa da Vovó, Alto Paraíso de Goiás-GO; Educandário Humberto de Campos, Assentamento Sílvio Rodrigues, Alto Paraíso de Goiás-GO; Escola Classe ETA 44, Núcleo Rural Sarandi, PlanaltinaDF; Escola Municipal Dom Emmanoel Gomes de Oliveira, Educandário Municipal Dom Bosco e Escola Municipal Luciano da Silva Peixoto, Pirenópolis-GO; Escola Classe Altamir, Planaltina-DF; Centro de Ensino Fundamental 08, Sobradinho II-DF; Escola Classe 314 Sul, Brasília-DF; Centro de Ensino Especial 01 de Santa Maria; Centro de Ensino 03 de Sobradinho; Escola Meninas e Meninos do Parque/PROEN, Brasília-DF; Centro Educacional 04 de Taguatinga; Escola Classe 02 de Vicente Pires. Agradece ainda à Associação dos Amigos das Florestas (AAF) pela coordenação das oficinas de educação ambiental e aos inúmeros profissionais oficineiros que realizaram as criativas oficinas. Um agradecimento especial à Petrobras, por intermédio do Programa Petrobras Sócioambiental, pelo patrocínio do Projeto Semeando o Bioma Cerrado. Àqueles que citamos e àqueles cujos nomes não ficaram expostos, mas que carregam com bravura a nobre missão de proteger, com recursos próprios (intelectuais, pessoais, ideais), o ambiente em que vivem e, em especial, o nosso querido Cerrado. Sabemos que sem amor nada tem sentido e nada se faz.

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SUMÁRIO PRÓLOGO – Educação para a sustentabilidade 17 APRESENTAÇÃO – Mudando hábitos 18 PREFÁCIO: “Brincadeira séria” 19 Visão da educação ambiental no Projeto Semeando o Bioma Cerrado 21 Por que inserir educação ambiental em um projeto técnico 21 O que se busca para a preservação do Cerrado 21

PARTE I 22 CAPÍTULO 1 – Cerrado, Nossa Casa 23 O Cerrado 23 Flora do Cerrado 24 Formações Campestres 25 Formações savânicas 26 Formações Florestais 27 Um pouco mais sobre Veredas 29 Fauna do Cerrado 30 Dispersão no Cerrado e dispersores ameaçados 31 Interações entre plantas e morcegos 32 Ajude a proteger o meio ambiente 34 Para saber mais.... 34 Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção 34 Livro Vermelho da Flora do Brasil 35 Para que servem os nomes científicos? 35 O que são unidades de Conservação? 36 O que é uma Cadeia Alimentar 36 A teia da vida: Seres vivos que habitam a Terra estão todos interligados em uma grande rede 37

CAPÍTULO 2 – A construção do discurso da sustentabilidade 39 Salve o planeta – a formação da consciência ecológica

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Pensar globalmente, agir localmente – o ambientalismo no poder Carbono zero e a ciência do aquecimento global

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Fazer mais com menos – a sustentabilidade como vantagem competitiva Principais movimentos para a sustentabilidade

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Por que se realizam COPs?

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Quem faz as negociações na COP do Clima? Protocolo de Kyoto

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Mecanismos de redução de emissões

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O que é Redd e qual sua relação com as emissões de carbono Como o Brasil lida com a questão do clima? Um novo acordo global pós-2020

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Conferência sobre o Meio Ambiente Humano

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Conferência sobre Educação A mbiental em Tbilisi

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Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD)

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Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio-92) Rio + 20

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Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC) – Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima

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CAPÍTULO 3 – Analisando a educação ambiental por diferentes abordagens 51 Definições de educação ambiental por diferentes autores Aprofundando a abordagem

51

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CAPÍTULO 4 – Legislação ambiental brasileira no contexto do desenvolvimento sustentável 56 56

Constituição Federal Capítulo I

56

Capítulo II - Do Meio Ambiente

57

Título I - Lei de Diretrizes e Bases Da Educação (LDB)

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Título II - Dos Princípios e Fins da Educação Nacional

58

Título III - Da Organização da Educação Nacional

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Política Nacional de EA – ressaltando princípios e objetivos

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CAPÍTULO 5 – A transversalidade da educação ambiental com outras disciplinas 61 62

Educação humanitária

Alcance do cultivo sólido – Criação da espaçonave Metodologia indicada

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Estratégias transversais Referências

63

63

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CAPÍTULO 6 – Capacitação de professores e comunidades 65 Sensibilizando professores para a corresponsabilidade socioambiental Metodologia

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Educação inclusiva

66

Fortalecendo comunidades

67

65

Sensibilização para recuperação de áreas degradadas

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68

Conhecer para proteger

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Alfabetização ecológica: ABCerrado

CAPÍTULO 7 – Problemas Ambientais : causa, consequências e possíveis soluções 74 Entre a teoria e a prática Metodologia utilizada

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75

Desmatamento A água

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Gestão de recursos hídricos, resíduos sólidos- o desafio de um entendimento sistêmico da questão O Lixo dentro de uma concepção de Agenda 21

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Consumismo na sociedade atual e os problemas ambientais resultantes

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O Lixo dentro de uma concepção do plano de gerenciamento de resíduos sólidos - PGRS

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80

Transformação Visão ambiental

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Visão socioeconômica

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Visão cultural e artística Visão jurídica

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Visão de catador de materiais recicláveis

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Novo Código Florestal e implicações em sala de aula

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Iniciando a discussão do Código-a importância das relações Conhecendo e aplicando a lei Conclusão

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Referências

91

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PARTE II 93 CAPÍTULO 8 – Instrumentos de Educação Ambiental Usados nas Oficinas 94 Descrição dos instrumentos sugeridos DVD-ABCerrado ABCerrado

94

Bibliografia

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EcoMuseu do Cerrado

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Origem do Ecomuseu do Cerrado

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Ecomuseu do Cerrado Laís Aderne

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O que se espera do Ecomuseu do Cerrado Laís Aderne Objetivos do Ecomuseu do Cerrado Agenda

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O que vamos agendar

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O Que é a Agenda 21 Escolar?

Requisitos básicos para a elaboração da Agenda 21 Escolar Implementação da Agenda 21 Escolar

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Elaboração prática da Agenda 21 Escolar – passo a passo

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Avaliação da Agenda Escolar Instrumento: horta pedagógica

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O que é uma horta pedagógica?

E se a escola não tem terreno para o plantio?

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Horta suspensa

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Horta orgânica

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Ações transversais possíveis A sementinha vira planta

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Comida da semente Irrigação

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Acompanhamento dos trabalhos

Horta pneu

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Cuidados com a plantinha

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Preparando a terra

Harmonia e variedade É tempo de colheita

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Espaço de suporte para a horta Compostagem Minhocário

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Dicas para montar uma sementeira com recursos mínimos Viveiro educador

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Plantas que ajudam a acabar com a poluição

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Algumas plantas são bonitas, mas também perigosas Colaboração com a preservação do meio ambiente Cuidar com cuidados e atitudes Por que plantar árvores

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121

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CAPÍTULO 9 – Síntese das Oficinas 123 Importância da escolha dessas metodologias Oficina de música e dança

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Pintura de rosto, brincadeiras, contação de histórias

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Oficina de trilhas interpretativas

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Oficina de maquete do bioma Cerrado Oficina de pegadas de animais

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Oficina de culinária – redescobrindo aromas e sabores do Cerrado

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Oficina de viveiro educador

Oficina de monotipia – pigmentos do Cerrado

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Oficina “O luxo do lixo” – reaproveitamento de resíduos sólidos Pintura de painéis do Cerrado

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Fontes de energia: use corretamente o que a natureza oferece Oficina de jogos e brincadeiras – aprenda com a natureza Oficina ecoesporte – jogando com a natureza

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Brincando e aprendendo – contos, cantos e encantos do Cerrado

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132

Como é nosso bioma? Terra

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129

Passarinhos do Cerrado – argila e origames

Conto 1: A ema emo

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Conto 2: O planeta sonho

Cantos – letras adaptadas por Ana Patrícia às antigas músicas do folclore brasileiro

CAPÍTULO 10 – Textos de Apoio Ao Professor 138 Conservação dos recursos naturais Ecologia e o bioma Cerrado

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Principais biomas do Brasil

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Tipos de vegetação do bioma Cerrado Recursos hídricos Fogo

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141

141

Unidades de conservação

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Categorias das unidades de conservação Conhecendo as Belezas do Cerrado Poema – “A horta”

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Cerrado que não mais se vê Sites interessantes

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Sugestões Bibliográficas para consulta 154

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PRÓLOGO Educação para a sustentabilidade Na primeira edição da publicação Educando pelas trilhas do Cerrado, inspiramo-nos em Fritjof Capra, físico, teórico, autor e organizador de duas obras básicas para a nossa escrita: EcoAlfabetização e a Teia da vida. Capra é defensor da ideia de que o Proteja o sustentável deve ultrapassar a noção do senso comum. Utilizando uma linguagem simples e própria da educação ambiental (EA), Chega de desmatamento!!! propomos ao longo desta edição a revisão do termo em sua essência com o emprego de significados e aprofundamentos em novos contextos. Nos trabalhos realizados no Projeto Semeando o Bioma Cerrado, a Associação dos Amigos das Florestas (AAF), com ações de sensibilização e conscientização, canaliza esforços para a mudança comportamental dos indivíduos e a construção de comunidades sustentáveis. Defendemos que são de fato sustentáveis aqueles capazes de satisfazer suas necessidades e aspirações sem diminuir as oportunidades das gerações futuras. Para isso, utilizando a educação humanitária, buscamos o resgate da essência do conhecimento em sua origem e a modificação de comportamentos equivocadamente incorporados aos métodos de produção. Procurando o fortalecimento e a humanização da educação, entramos pelas trilhas do Cerrado para constatar que a diversidade étnica e cultural do povo do Cerrado exerce o mesmo papel que a biodiversidade exerce num ecossistema. Ali, encontramos os mesmos modelos das diferentes relações e das diferentes abordagens de um mesmo problema ambiental que ameaça a sustentabilidade da teia da vida.

CERRADO

Nesta segunda edição do Educando pelas trilhas do Cerrado, a AAF, em parceria com a Rede de Sementes do Cerrado, propõe um roteiro de ações para introduzir a educação ambiental em escolas e comunidades, incentivando a preservação da vida por meio da cooperação, de parcerias e de participações em rede. As ações de educação voltadas para a sustentabilidade, vivenciadas nas diversas atividades do Projeto Semeando o Bioma Cerrado, dirigidas a um público infanto-juvenil, a professores e à comunidade em geral, repassam, por meio de uma abordagem transdisciplinar, princípios básicos da ecologia, mas, acima de tudo, estimula um profundo respeito pela natureza. Nossa pretensão com esta publicação, a exemplo da sua primeira edição, não é elaborar um manual, mas sim reunir as informações colhidas em nossos trabalhos e estudos, sugerindo um roteiro por onde começar, estruturando pensamentos e ações, colaborando, desse modo, com aqueles que buscam a formação da cidadania ecológica com diversidade, mas também com interdependência.

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APRESENTAÇÃO Mudando hábitos Regina Célia Pereira Fernandes de Souza Em 2010, a Rede de Sementes do Cerrado, associação sem fins lucrativos que visa ao fomento do comércio e à melhoria da qualidade das sementes e mudas de espécies nativas do Cerrado, apresentou à Petrobras a proposta do Projeto Semeando o Bioma Cerrado. Com sua aprovação, pudemos agregar valores às iniciativas de incentivo e promoção da conservação e da recuperação do Cerrado, aumentando a prestação de serviços referentes a estudos e pesquisas com foco na conservação, na promoção e na exploração sustentada de plantas nativas do Cerrado, promovendo também a divulgação de informações técnicas e científicas nessa área. O projeto levou à Rede a exigência de novos trabalhos, ampliando o foco da pesquisa científica “para a sutileza e o encanto da educação ambiental, na qual a atuação do professor tem papel fundamental na construção de novos valores e posturas éticas despertadas pela curiosidade, pela criatividade e pela sensibilidade, estimulando os seres humanos para uma relação harmoniosa com a natureza”, como afirmou na época a então presidente da Rede de Sementes do Cerrado, Magaly Wetzel. Embora cada vez mais a ecologia esteja presente na educação, inclusive na Educação Infantil, de uma forma bastante afirmativa, sabemos que existe uma grande carência de materiais para se trabalhar com as crianças, que precisam de uma abordagem própria, adequada à sua idade. Por isso, com a parceria estabelecida com a Associação dos Amigos das Florestas, uma instituição especializada em comunicação, Educação Ambiental e Educomunicação, a Rede de Sementes do Cerrado, com o apoio de colaboradores, publicou a cartilha Semeando ideias e valores para preservar o Cerrado e o livro Educando pelas trilhas do Cerrado, contendo um conjunto de informações e um roteiro de ações para introduzir o tema ambiental em escolas e comunidades, e do qual agora apresentamos a 2a edição. As sugestões de atividades apresentadas na 1a edição do Educando pelas trilhas do Cerrado e ajustadas nesta edição são algumas das ações vivenciadas nas oficinas, nos cursos e nos eventos promovidas pelo Projeto Semeando o Bioma Cerrado, com trocas de saberes e fazeres entre professores, monitores, gestores ambientais e, naturalmente, crianças, em diversas escolas, que comprovaram a eficácia dos instrumentos sugeridos. Este trabalho, que traz valiosas informações sobre o movimento ambiental no mundo, legislação, textos para reflexões e sugestões de ações rotineiras com metodologias apropriadas à sensibilização para a mudança comportamental, é fruto do apoio, da colaboração e da parceria de diversas pessoas e instituições. Ele concentra a energia da união necessária para a educação ambiental, que, sem dúvida, faz parte de um processo por meio do qual o indivíduo e a coletividade constroem valores, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas à conservação do meio ambiente, que é um bem de uso comum, essencial à qualidade de vida das pessoas e sua sustentabilidade. Esta é a meta do nosso trabalho, e esperamos que este roteiro, em sua 2a edição, contribua com o professor e com quem mais desejar se dedicar ao desafio de formar cidadãos comprometidos com a proteção e a conservação do bioma Cerrado e do nosso planeta.

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Educando pelas Trilhas do Cerrado: um roteiro de ações para a educação ambiental em escolas e comunidades

PREFÁCIO Brincadeira séria José Rozalvo Andrigueto O Projeto Semeando o Bioma Cerrado tem como objetivo principal estimular os elos da cadeia produtiva de sementes e mudas florestais de espécies nativas do Cerrado. Desse modo, fomos sensibilizados sobre o fundamental papel da Educação Ambiental, tanto para um público adulto específico, que se envolveria com atividades de mapeamento de áreas de coleta de sementes e de marcação de árvores matrizes, como na capacitação de pessoas para as áreas de coleta, beneficiamento, armazenamento de sementes e produção mudas florestais, mas também, para as crianças e jovens. Nesse circuito, naturalmente, entrou o professor como foco de nosso trabalho. Ele, como outros agentes educacionais, não pode ignorar que a degradação ambiental é um problema crescente em todo o mundo, uma vez que a interferência humana continua a extrapolar a capacidade do meio ambiente de se recuperar, ainda que se pense a Terra como um sistema ou organismo auto-regulável. A Petrobrás, patrocinadora do projeto é igualmente, bastante sensível para a importância do processo educativo em ações voltadas para a preservação de todos os recursos naturais. Por isso, cientes de que não é possível estimular os elos da cadeia produtiva sem um trabalho sistêmico da educação ambiental como força impulsionadora capaz de desencadear ações e atitudes transdisciplinares em defesa do Cerrado que queremos preservar, buscamos parceria com a Associação dos Amigos das Florestas AFF e sob sua coordenação, a Educação Ambiental ocupou espaço com concepção do projeto e a preservação passou a ser vista também como “coisa” e responsabilidade sim de crianças. A AAF demonstrou com metodologia apropriada e dinâmico trabalho, que enquanto elas brincam, muitas coisas importantes ocorrem, como assimilação e apropriação da realidade humana; construção de hipóteses; elaboração de soluções para problemas; e enriquecimento da personalidade. Com a ecopedagogia trabalhando o “sentido das coisas, o brincar passa a ser o cultivo da imaginação e da criatividade e brincando, a criança começa a se descobrir e a estabelecer uma relação mais harmoniosa como o mundo que a rodeia. Não se preserva o bioma Cerrado somente com ações isoladas de plantio de árvores, o projeto vai bem mais além, iniciando os trabalhos básicos a partir das sementes sob todos os aspectos técnicos e humanitários onde semear também ideias e valores é tão importante quanto plantar árvores para a preservação desse tão ameaçado bioma brasileiro. Educando pelas Trilhas: Durante os quatro anos de execução do projeto técnico, foram demarcadas 101 áreas para Coleta de Sementes, cerca de 1010 hectares, georreferenciadas e catalogadas 6.096 Árvores Matrizes, identificadas 338 espécies florestais nas áreas de Cerrado, nos municípios de Alto Paraíso de Goiás, Cavalcante, Pirenópolis, Barro Alto, Ceres, Goianésia, Santo Antônio do Descoberto e Goiânia/GO, nos municípios de Sinop, Cláudia, Sorriso/ MT e no Distrito Federal. Nessas áreas foram identificadas 9 espécies ameaçadas de extinção. Capacitou tecnicamente 1.249 pessoas por meio de 37 cursos no setor de sementes e mudas nativas. Estruturou 7 Unidades de Capacitação para Produção de Mudas e Beneficiamento e Armazenamento de Sementes Florestais, promoveu a recuperação de 7 hectares de vegetação nativa no Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros/GO com plantio de 7000 mudas e 2 toneladas de sementes de 37 espécies. Os cursos de capacitação técnica foram realizados em seis áreas temáticas: 1) Identificação de Árvores do bioma Cerrado (que deu origem à publicação do livro: Guia do Observador de Árvores) e Identificação de Madeira (que deu origem a um Atlas de Madeira) 2) Seleção e Marcação de Árvores Matrizes (que deu origem a cartilha técnica) 3) Coleta e Manejo de Sementes (que deu origem a cartilha técnica) 4) Beneficiamento, Embalagem e Armazenamento (que deu origem a cartilha técnica) 5) Produção de Mudas Florestais Nativas (que deu origem a cartilha e um manual técnico) 6) Viveiros: Projeto, Instalação, Manejo (que deu origem a cartilha técnica). Ciente de que a degradação ambiental é um problema crescente em todo o mundo, devido a interferência humana que continua a extrapolar a capacidade da natureza se recuperar, o Projeto Semeando o Bioma Cerrado não poderia ignorar a importância da Educação Ambiental. Por isso, concomitantemente às atividades técnicas e às de cunho científico, foram realizadas também, atividades de sensibilização em oficinas específicas de Educação Ambiental para crianças, lideranças comunitárias e professores nas áreas de abrangência do projeto,

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em Brasília e entorno, Alto Paraíso de Goiás e Pirenópolis. Somente na segunda fase do projeto, em 2 cursos de capacitação para 70 membros de comunidades rurais, nasceram multiplicadores da informação ecológica para um Cerrado que pede socorro. Mas também o professor precisa de instrumentos específicos que o auxilie na difícil tarefa de trabalhar a transversalidade e interdisciplinalidade para de fato formar cidadãos ecológicos. Assim, em 5 oficinas especiais, trocamos saberes e fazeres com 234 professores, com importantes parcerias estabelecidas. A promoção de 1 encontro de educadores ambientais, mobilizaram 123 professores e agentes comunitários. Foram 18 oficinas de Educação Ambiental em escolas rurais e urbanas nas quais 2.386 crianças e jovens literalmente, “pintaram e bordaram” apoiados na ecopedagogia, para com mudanças comportamentais ajudarem na difícil tarefa de resgatar com ética e valores, o planeta Terra. O Projeto Semeando o Bioma Cerrado tem compromisso com a questão social, trabalhando com públicos diversos envolvidos no processo de consecução de suas iniciativas. Foram 10 públicos-alvo alcançados pelas ações de EA desenvolvidas: alunos de escolas rurais e urbanas de Ensino Infantil, Fundamental e Ensino Especial; alunos em situação de vulnerabilidade social de dois programas do governo; professores da rede pública, educadores e agentes ambientais, e membros de comunidades rurais do DF e GO. Almeja-se com essas ações educativas fornecer também, uma nova opção de geração de renda, reforçando o sentimento de engajamento e pertencimento em suas comunidades e áreas de vegetação nativa. Nosso Patrocinador: Por ser tema transversal, a EA está presente em todos os projetos aprovados pelo Programa Petrobrás Socioambiental que visam o desenvolvimento territorial de longo prazo, em áreas de influência e territórios estratégicos da Petrobras, por meio de iniciativas sistêmicas e multi-institucionais de fusão de experiências, conhecimentos e metodologias. Neste eixo, destacam-se as seguintes ações: incubação de projetos; iniciativas que fomentem a valorização do capital social e fortalecimento do protagonismo da governança local; formação de atores e organizações locais; construção de redes territoriais e centros de referência esportiva. Inicialmente, o projeto contou com o apoio dos seguintes parceiros: Universidade Federal de Goiás (UFG), Centro de Referência em Conservação da Natureza e Recuperação de Áreas Degradadas da Universidade de Brasília (CRAD/UnB); a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), em especial Embrapa Cerrados e Embrapa Agrossilvipastoril; Instituto Oca Brasil; Associação dos Amigos das Florestas e Escola da Natureza. Ao reeditarmos esta publicação utilizada com sucesso nos trabalhos de sensibilização do Projeto Semeando o Bioma Cerrado, contendo sugestivas ações e um farto material informativo e reflexivo, esperamos contribuir com os professores e demais apoiadores desse trabalho.

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Educando pelas Trilhas do Cerrado: um roteiro de ações para a educação ambiental em escolas e comunidades

Visão da educação ambiental no Projeto Semeando o Bioma Cerrado “A raça humana não pode prosperar enquanto não aprender que há tanta dignidade em cultivar campos quanto em escrever um poema.”

Booker Washington

(www.oassab.org.b/index.php/pensamentos/23-pensamentos-do.../)

Por que inserir a educação ambiental em um projeto técnico O Projeto Semeando o Bioma Cerrado tem como objetivo estimular os elos da cadeia produtiva de sementes e mudas florestais deste tão ameaçado bioma brasileiro. Esse processo exige muito mais que instrumentalizar pessoas para o exercício das atividades do setor de produção de sementes e mudas nativas, exige o despertar do interesse pelo tema e o reconhecimento de que seus problemas e os problemas do mundo nascem da ausência de valores éticos e do não reconhecimento do papel de cada um na importante rede que chamamos de “teia da vida”. Para preservar é preciso conhecer, e é almejando esse conhecimento que reconhecemos melhores formas de preservar a vida. A definição de comunidade sustentável como aquela “capaz de satisfazer suas necessidades e aspirações sem diminuir as chances das gerações futuras”, constante do Relatório nosso futuro comum, que inspirou vários autores com os quais trabalhamos, é, sem dúvida, uma valoração moral importante, pois nos lembra da nossa responsabilidade em deixar um mundo com pelo menos as mesmas oportunidades com as quais o herdamos. A aspiração de um mundo com as mesmas oportunidades das gerações que nos antecederam ainda é uma definição que limita a preservação da vida, pois não instrumentaliza pessoas para a construção de uma comunidade de fato sustentavelmente ecológica. Comunidades desafiadas a aprender a preservar mais e cidadãos conscientes de problemas, mas focados em soluções e não em “pontos zeros”, tenderão a construir os meios para resolver as questões-chave para a conservação ambiental sem serem limitados por elas. A Rede de Sementes do Cerrado, em parceria com a AAF e a Escola da Natureza, inseriu a educação ambiental no projeto com o propósito de “semear ideias e valores para preservar o bioma Cerrado”, buscando superar a visão antropocêntrica, na qual o homem se julga o centro de tudo, esquecendo a importância da natureza, da qual é parte integrante. O objetivo é também ampliar a abrangência de perspectiva, incorporando a esta a proteção e o uso sustentável dos recursos naturais. A proposta tem como foco a construção de sociedades sustentáveis, com a compreensão sistêmica e a organização da vida como rede ou teia, abrangendo todos os ciclos ecológicos sustentados pelo fluxo da energia proveniente do sol. O público-alvo dessas ações de educação ambiental no projeto eram inicialmente escolas rurais. No entanto, em face da demanda, tivemos de ampliar nosso campo de ação, agregando também escolas urbanas, educação inclusiva, crianças e jovens em situação de risco e em defasagem em idade escolar. A teia da vida, os ciclos da natureza e o fluxo de energia constituem a linha de ação defendida por Fritjof Capra, e são esses os fenômenos que as crianças vivenciam, exploram e entendem em suas experiências por meio das metodologias propostas para as oficinas de educação ambiental no Projeto Semeando o Bioma Cerrado.

O que se busca para a preservação do Cerrado Estes são os objetivos almejados com a educação ambiental no Projeto Semeando o Bioma Cerrado: 1) contribuir para a formação de crianças saudáveis e para o desenvolvimento de sua capacidade de aprender a aprender, estimular sua capacidade de pensar e estabelecer as bases para a formação de uma pessoa ética, capaz de conviver na sua comunidade de forma ambientalmente correta e socialmente justa; 2) promover um conjunto de conhecimentos sobre o Cerrado e desenvolver habilidades, atitudes e valores ambientais de forma adequada a cada faixa etária, rompendo a passividade do aluno em relação à sua formação e transformando-o em agente participante ativo no processo de construção da sustentabilidade desse bioma; 3) possibilitar ao aluno vivenciar experiências ricas, como coleta de sementes, plantio de árvores e hortas, contato com animais, coleta e produção de alimentos, orientação sobre alimentação saudável, nutrição e educação do movimento. O movimento corporal é uma importante dimensão do desenvolvimento humano, e nas crianças ele está intrinsecamente ligado ao desenvolvimento da inteligência. Nesse sentido, a exploração do ambiente e do espaço por meio do movimento é estimulada em atividades ao ar livre e sempre de forma lúdica. São jogos, circuitos, oficinas de reciclagem e reaproveitamento de materiais, danças, brincadeiras, iniciação de práticas esportivas utilizando recursos da artepedagogia para a transferência do conhecimento a respeito da natureza e da sociedade. Em suma, a finalidade do Projeto Semeando o Bioma Cerrado é contribuir para a formação de uma comunidade investigativa na qual os participantes possam expor suas ideias e escutar as de outros, questionando e comparando pontos de vista.

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PARTE I A primeira parte desta publicação abrange um conjunto de oito capítulos. Neles, a visão de cientistas, legisladores e professores foi repassada de maneira que fossem apresentados diferentes aspectos contextualizadores das ações apresentadas na segunda parte do livro – os instrumentos de EA usados no Projeto Semeando o Bioma Cerrado que embasaram as ações de educação ambiental realizadas nas diversas oficinas do projeto com suas distintas expertises e abordagens.

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CAPÍTULO 1 Cerrado, Nossa casa Regina Célia Pereira Fernandes de Souza

O Cerrado Um dos mais antigos biomas a se estruturar no continente americano, o Cerrado surgiu em algum momento do período Cretáceo Superior, mas foi no Terciário Médio, há mais ou menos 60 milhões de anos, que ele começou a desenvolver o estoque genético que lhe deu a conformação atual. Segundo maior bioma brasileiro, concentra 1/3 da biodiversidade nacional e 5% da flora e da fauna mundiais. A região do Cerrado, considerando seu aspecto natural, tem uma importância significativa para o equilíbrio de toda a plataforma sul-americana. A água acumulada nos lençóis freáticos do Cerrado do Centro-Oeste abastece nascentes que dão origem a seis das oito maiores bacias hidrográficas brasileiras: Parnaíba, Paraná, Paraguai, Tocantins-Araguaia, São Francisco e Amazônica. O potencial hídrico do Cerrado dá ao bioma o título de “Berço das Águas”. Até mesmo a bacia hidrográfica do Amazonas recebe as águas que brotam no Cerrado. Fica bem no meio do mapa e faz conexões com outros importantes biomas: ao norte, a Amazônia; a nordeste, a Caatinga; a sudoeste, o Pantanal; e a sudeste, a Mata Atlântica. Isso faz com que o Cerrado mantenha importantes relações ecológicas com os biomas vizinhos. O resultado dessa interação é a existência de uma fauna e uma flora muito ricas em diversidade biológica. O Cerrado influi e recebe influência dos demais biomas, constituindo um habitat único no mundo, sendo também base de sobrevivência cultural e material de um sem-número de habitantes, comunidades tradicionais, indígenas, quilombolas, geraizeiros, dentre outros, que têm no uso de seus recursos naturais a fonte de sua subsistência. As águas também são importantes atrativos turísticos na região, com grande influência na economia de vários municípios. Cachoeiras, cascatas, cânions, lagos, rios e riachos conjugam-se à paisagem do Cerrado, criando atrações para visitantes de vários cantos do Brasil e do mundo. São cenários de beleza incomparável para os que buscam lazer, esportes ou o contato profundo com a natureza. Essa abundância hídrica, além de ser importante para a vegetação, permite o intercâmbio de sementes, pólen e mesmo a dispersão da fauna através das matas de galeria que acompanham córregos e rios, possibilitando que indivíduos do Cerrado se acasalem com representantes da Amazônia, da Mata Atlântica e da Caatinga, o que contribui para aumentar a variabilidade genética das espécies.Um dos mais antigos biomas a se estruturar no continente americano, o Cerrado surgiu em algum momento do período Cretáceo Superior, mas foi no Terciário Médio, há mais ou menos 60 milhões de anos, que ele começou a desenvolver o estoque genético que lhe deu a conformação atual. Segundo maior bioma brasileiro, concentra 1/3 da biodiversidade nacional e 5% da flora e da fauna mundiais. A típica vegetação do Cerrado se caracteriza pelos troncos tortuosos, baixo porte, ramos retorcidos, cascas espessas e folhas grossas. É importante ressaltar que a vegetação não apresenta essa característica em decorrência da escassez de água, já que o Cerrado abriga densa rede hídrica, mas devido a outros fatores edáficos, notadamente o desequilíbrio no teor de micronutrientes, a exemplo do alumínio.

Brasília é bom em riachos de entre grotas: corguinhos d’agua, vertentes, fios de prata, do sem fim das planuras, que a cidade fotografa e retoca o ano inteiro, entre secas de julho, e águas de janeiro. Trecho do poema Brasília, caminhos de sair (para Hugo, um de lá), no livro “O vento de agosto no pé de Ipê “

Carlos Rodrigues Brandão Estação Ecológica de Águas Emendadas, Brasília-DF

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O bioma Cerrado é um dos que mais sofreu com a ocupação humana, sendo superado apenas pela Mata Atlântica. A pressão crescente para o desmatamento de novas áreas para expansão agropecuária está levando à exaustão progressiva dos recursos naturais da região. As florestas do Cerrado são também tremendamente afetadas pela extração predatória para produção de carvão. A conjugação desses fatores posiciona o Cerrado como um “hotspot” de biodiversidade e desperta especial atenção para a conservação dos seus recursos naturais. A grande riqueza de espécies no Cerrado, associada à heterogeneidade na distribuição das mesmas, faz com que as estratégias de conservação “in situ”, particularmente com a expansão das áreas protegidas sob a forma de Unidades de Conservação da Natureza, se deparem com enormes desafios. Além das conhecidas ameaças a conservação da biodiversidade, as peculiaridades do Cerrado tornam muitas áreas do seu domínio como espaços únicos e insubstituíveis, o que remete a necessidade de grande esforço para ampliar o nosso conhecimento sobre a riqueza biológica que esse bioma abriga, e assim superar as lacunas nas estratégias de conservação. Extraido de: CHAVES, M. R. UFCER – uma universidade no cerrado e para o cerrado. São Paulo: Ciência e Cultura,v.63, n.3, 2011. ISPN - Instituto Sociedade, População e Natureza: No coração do Brasil, o berço das águas - http://www.ispn. org.br/o-cerrado/no-coracao-do-brasil-o-berco-das-aguas/ BRASIL. MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Ministério do Meio Ambiente. Secretaria de Biodiversidade e Florestas. Guia de Campo Vegetação do Cerrado 500 espécies. Brasília, 2011.

Flora do Cerrado A flora do Cerrado é considerada a mais rica dentre as savanas do mundo. Cerca de 40% das espécies é endêmica, ocorrendo apenas no bioma, cuja destruição provocaria a eliminação da própria espécie. Ocupa mais de 22% das terras brasileiras e é formado por um conjunto de vários tipos de vegetação, na qual pode-se encontrar, em meio às formações características, algumas formações pertencentes a outros biomas. Este mosaico de fisionomias é extremamente importante do ponto de vista da biodiversidade, pois reúne uma grande variedade de plantas e animais. No Brasil essa vegetação savânica é denominada “cerrado”, que significa fechado. O nome é usado em três versões: Cerrado, com letra maiúscula, para designar o bioma que ocorre nos 22% do território nacional, Cerrado Sentido Amplo ou lato sensu, que inclui as formações da vegetação desde o Cerradão até os Campos e, ainda, Cerrado Sentido Restrito ou stricto sensu (s.s.), um dos tipos fisionômicos que ocupava, originalmente, mais de 60% da área desta região. Essa vegetação, com mais de 12 mil espécies de plantas vasculares, se apresenta em fitofisionomias classificadas como se segue: Formações Campestres - árvores ausentes ou esparsas na área. Campo Limpo ou Sujo, Úmidos ou Secos conforme posição no relevo e Rupestre nos afloramentos de rochas. Formações Savânicas - cobertura arbórea entre 5-70%. Cerrado Sentido Restrito e suas variações: Denso, Típico, Ralo e Rupestre e, ainda, os Palmeirais e as Veredas. Formações Florestais - cobertura arbórea entre 50-95%. Matas de Galeria Inundáveis e Não Inundáveis acompanhando pequenos cursos de água, Matas Ciliares nos médios e grandes cursos de água, Matas Secas, Decíduas, Semidecíduas e Sempre-Verdes, de acordo com o substrato, afloramentos de rochas e posição no relevo e, ainda, o Cerradão.

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Formações campestres Campo Limpo - comunidade herbácea, sem árvores e raros arbustos. Apresenta densa cobertura de gramíneas entremeadas por ervas, subarbustos e samambaias. Comum nas encostas, chapadas e como vizinhas de nascentes, veredas e matas de galeria. Ocorre em solos arenosos rasos ou duros, onde frequentemente apresenta afloramento do lençol subterrâneo de água. Inclui as variações: Seco, Úmido e, ainda, com Murundus.

Campo Limpo - Foto: Manoel Claudio da Silva Junior

Campo Sujo - comunidade arbustivo-herbácea com arbustos e pequenas árvores esparsas na paisagem - o que dá o aspecto de campo, “sujo” com árvores. Geralmente ocorre em solos mais rasos, eventualmente com pequenos afloramentos rochosos, ou em solos profundos de baixa fertilidade ou ainda em áreas de Cerrado que sofreram forte perturbação antrópica. Inclui as variações: Seco, Úmido e, ainda, com Murundus. Campo com Murundus - campos ocupados por elevações de terra, às vezes regularmente espaçadas. As maiores elevações podem ser formadas por cupinzeiros, onde há maior aeração nos solos, o que permite a colonização de arbustos e pequenas árvores típicas do cerrado sentido restrito. Ocorre como variações no Campo Limpo e Campo Sujo. Campo Rupestre - comunidade herbáceo-arbustiva, raro com arvoretas, que ocorre sobre afloramentos de rochas nas encostas das chapadas e serras, frequentes acima dos 900m de altitude. Ventos constantes e grandes variações diárias na temperatura são típicos nestas áreas. As árvores concentram-se nas fendas entre as rochas, e a densidade arbórea é variável e dependente do volume de solo. Há casos em que as árvores podem dominar a paisagem, enquanto em outros a flora arbustivo-herbácea predomina, embora as árvores continuem presentes.

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Formações Savânicas Cerrado Sentido Restrito ou sensu stricto (s.s.) - tipo de cerrado em que a cobertura arbórea varia entre 5 e 70% sem formação de dossel. As árvores são baixas, tortuosas, com cascas espessas e folhas geralmente coriáceas e pilosas. A luz solar alcança a superfície do solo onde se desenvolve exuberante comunidade herbácea com alguns arbustos. Apresenta-se com as variantes: Denso, Típico, Ralo e Rupestre.

Cerrado Sentido Restrito - Foto: Manoel Claudio da Silva Junior

Parque de Cerrado - árvores que cobrem entre 50 e 70% do terreno, agrupadas em pequenas elevações chamadas Murundus. As árvores estão praticamente ausentes nas depressões vizinhas. Veredas - em solos saturados com grupos descontínuos de Buritis (Mauritia flexuosa), com cobertura arbórea entre 5-10%, em meio à comunidade arbustivo-herbácea. Frequentemente circundadas por Campo Úmido. É comunidade precursora das Matas de Galeria.

Vereda - Foto: Manoel Claudio da Silva Junior

Palmeiral - área com domínio (30-70% de cobertura) de espécie única de palmeira arbórea com dossel descontínuo. Nos solos bem drenados ocorrem: Babaçual - Attalea speciosa, Guerobal - Syagrus oleraceae e Macaubal - Acrocomia aculeata. Nos solos mal drenados ocorre o Buritizal - Mauritia flexuosa.

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Formações Florestais Cerradão - se comparado com o cerrado s.s. apresenta árvores esclerófilas, com maior altura, 12 a 15m, e em maior densidade, 50 a 90% de cobertura. O subosque esparso, com arbustos, ervas e poucas gramíneas resulta da reduzida incidência da luz na superfície do solo. Inclui espécies do cerrado s.s. e das matas. A fertilidade dos solos define os subtipos: Distrófico e Mesotrófico.

Cerradão - Foto: Manoel Claudio da Silva Junior

Matas de Galeria - comunidades ribeirinhas, sempre-verdes com 70 a 95% de cobertura, associadas aos menores cursos de água. Inclui os subtipos: inundável e não inundável de acordo com o período de afloramento do lençol freático. São muito variáveis por incluir mais de 30% da flora vascular em apenas 5% do território que ocupam no bioma.

Mata de Galeria - Foto: Manoel Claudio da Silva Junior

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Matas ciliares - comunidades ribeirinhas, decíduas ou semidecíduas com 50% (seca) a 90% (chuvas) de cobertura, associadas aos maiores cursos de água. Sua composição florística difere daquela em matas de galeria. Sua largura, raro maior que 100m, depende da topografia.

Mata Ciliar - Foto: Manoel Claudio da Silva Junior

Matas secas - florestas decíduas, semidecíduas ou sempre-verdes, distantes de cursos de água, em solos mais férteis com ou sem afloramentos de rochas calcárias. O dossel (15-25m de altura) contínuo ou com clareiras, resulta em cobertura de 50% (seca) a 95% (chuvas).

Mata Seca - Foto: Manoel Claudio da Silva Junior

Extraído de: SILVA JUNIOR, M.C. 100 Árvores do Cerrado sentido restrito - Guia de Campo. Brasília,DF. Ed. Rede de Sementes do Cerrado, 2012.

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Um pouco mais sobre Veredas As veredas no Brasil Central em geral, ocupam os vales pouco íngremes ou áreas planas do fundo do vale, acompanhando linhas de drenagem mal definidas. Também são comuns em posição intermediária do terreno, próximas às nascentes (olhos d’água), ou nas bordas das cabeceiras de matas de galeria. São encontradas em solos minerais hidromórficos, pertencentes à ordem dos gleissolos, glei pouco húmícos e glei húmicos, saturados durante a maior parte do ano. A manutenção da vegetação nativa nas veredas é um importante fator para a contenção de erosão nos solos hidromórficos com elevado teor de matéria orgânica. A paisagem da vereda é formada por dois estratos de vegetação: um herbáceo-graminóide que ocupa a maior parte de sua área, formado principalmente por espécies das famílias Cyperaceae, Eriocaulaceae, Lentibulariaceae, Xyridaceae e Poaceae, com várias espécies típicas de vereda e outro arbóreo-arbustivo com predominância de espécies das famílias Lamiaceae, Melastomataceae e Rubiaceae e do buriti (Mauritia flexuosa L.f.). O buriti é uma espécie de palmeira ereta, de porte arbóreo com altura de até 25 metros que apresenta folhas grandes em formato de leque que se destacam no ápice de seu caule. Apresenta inúmeras flores distribuídas ao longo de uma grande inflorescência pêndula saindo da base de suas folhas. O fruto de coloração externa castanho-avermelhada, quando maduro, apresenta-se revestido por escamas rígidas e coriáceas que lembram a pele de cobra, possui polpa carnosa amarelada. Floresce ao longo de todo o ano e apresenta pico de frutificação entre os meses de junho e outubro.

Vereda - RPPN Linda Serra Topázios - GO. Foto: Cassia Munhoz

Eiten (2001) classifica a vereda como uma unidade de vegetação formada por três faixas paralelas de diferentes tipos vegetacionais, a primeira representada por campo úmido sazonal, alagado somente no auge das chuvas, a qual o autor denomina brejo estacional graminoso; na segunda faixa apresenta-se o campo úmido alagado permanentemente, tendo sido denominada brejo permanente graminoso e por último a faixa de buritizal, também sob solo saturado. Brandão et al. (1991) e Araújo et al. (2002), também reconhecem três zonas de vegetação relacionadas à topografia e a drenagem do solo, designando-as de: borda onde o solo é mais seco, e em meio à vegetação campestre podem ocorrer arbusto e pequenas árvores isoladas; meio com solo com alagamento sazonal e vegetação predominantemente herbáceo-subarbustiva; e fundo que apresenta solo permanentemente saturado com água, brejoso, onde ocorrem os buritis, muitos arbustos e arvoretas adensadas. Segundo estes autores estas zonas são floristicamente diferenciadas, cujos reflexos emergem sobre a flora zonal. As duas primeiras zonas correspondem à faixa tipicamente campestre e o fundo corresponde ao “bosque sempre-verde” de Magalhães (1966). Por estas características peculiares, autores como Brandão et al. (1991) se referiram a vereda como “comunidade geral” e Araújo et al. (2002) sugeriram que esta deve ser considerada como um “complexo vegetacional”, isto é, um tipo de vegetação formado por manchas com diferentes características estruturais e florísticas. Em fases mais avançadas da vereda, podem ser encontradas ilhas de vegetação lenhosa junto aos buritis. Quando os vales tornam-se mais encaixados e o lençol freático é rebaixado, as veredas dão lugar às matas de galerias.

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Supõe-se que a vereda seja um dos estágios para a formação ou expansão da mata de galeria, tendo como base a ausência de buritis jovens nas matas estabelecidas, a inexistência de um dreno ou carrego definido na vereda e outras condições, como pouco sombreamento, que permitam a ocupação de outras espécies arbóreas. É um ecossistema de grande relevância na região do Cerrado e tem papel reconhecido no equilíbrio geoecológico e hidrológico do bioma. Além de proteger nascentes e fornecer água, as veredas exercem papel fundamental na manutenção da fauna do bioma, funcionando como local de pouso para as aves, atuando como refúgio, abrigo, fonte de alimento e local de reprodução também para a fauna terrestre e aquática. Pode-se ainda destacar o seu valor paisagístico, e o seu papel social para pequenas comunidades de agricultores que exploram sustentavelmente a palmeira buriti, para diversas finalidades. São reconhecidas como área protegida por lei, ou seja, Área de Preservação Permanente. Extraído de: MUNHOZ, C.B.R.; EUGÊNIO, C. U. O.; OLIVEIRA, R.C. Vereda - Guia de Campo. Brasília, DF. Ed. Rede de Sementes do Cerrado, 2011.

Fauna do Cerrado O grande ornitólogo Helmut Sick, que estudou profundamente a fauna do Cerrado, afirmava que não é fácil estabelecer o conceito de “fauna típica” do mesmo, pois muitos animais que vivem nesse bioma podem ser encontrados também em outros tipos de paisagens. No entanto, há certo grau de endemismo principalmente com relação às aves e roedores. Os estudos sobre insetos ocorrentes no Cerrado revelam que essa fauna é muito diversificada. Os insetos desempenham uma função muito importante na natureza, polinizando inúmeras plantas e servindo de alimento para muitos animais. Os insetos são considerados o grupo dominante dos animais da Terra, podendo ser encontradas cerca de 1.000 espécimes em um quintal de tamanho regular. No ecossistema Cerrado existem milhares de espécimes distribuídos em cada uma das suas fitofisionomias; ali existe uma grande quantidade de características estruturais e fisiológicas, além da capacidade de adaptação a condições extremamente adversas. Os insetos são fonte de proteína para outros animais do Cerrado e que os têm como base da sua dieta alimentar. São os chamados insetívoros, onde se incluem várias espécies de anfíbios, répteis, aves e mamíferos, além dos próprios insetos chamados predadores naturais, que funcionam como reguladores populacionais. Inseridos na cadeia alimentar, os insetos ocupam uma posição de destaque na manutenção do equilíbrio ambiental do Cerrado. Mesmo assim, eles usam uma estratégia muito importante para tentar escapar da predação natural - o mimetismo, ou seja, eles se misturam com a vegetação e com os substratos do ambiente na tentativa de enganar os seus predadores. A polinização da flora é outra função importante dos insetos. Abelhas, besouros, vespas, borboletas, marimbondos e outros, cumprem essa função. Polinizadas, as espécies vegetais são fecundadas e produzem frutos e sementes que serão dispersas no ambiente. Alguns insetos produzem alimentos que podem ser usados diretamente pelo ser humano, tais como mel, própolis, cera, seda e outros, despontando como um grupo animal de interesse econômico. Outros insetos são importantes na decomposição da matéria orgânica animal e vegetal, e na aeração do solo, fazendo com que este se torne mais rico em nutrientes, além de possibilitar o melhor enraizamento das plantas e infiltração mais eficiente das águas em ambientes com maior adensamento populacional. Estão presentes nesses ambientes, algumas espécies de formigas, cupins, besouros, baratas silvestres e outros. Devemos ressaltar, cada vez mais, a importância dos insetos como peça fundamental na manutenção do equilíbrio do ecossistema Cerrado e de todos os outros, nos quais estão sempre presentes em grande diversidade de espécies e com uma densidade populacional muito elevada. Extensas áreas do Cerrado permanecem desconhecidas ou pouco estudadas com relação aos grupos de peixes e anfíbios. Contudo, os poucos levantamentos já realizados mostram que essa fauna é muito rica. Com relação aos répteis, é sabido que muitas cobras e lagartos do Cerrado vivem quase todo o tempo em galerias subterrâneas, a salvo do calor escaldante da superfície. O Cerrado apresenta uma fauna de répteis e anfíbios de grande diversidade, sendo que muitas espécies novas foram descritas recentemente. Atualmente, são registradas para o Cerrado 10 espécies de quelônios (cágados, jabutis e tartarugas), 5 de jacarés, 47 de lagartos, 103 de serpentes e 113 de anfíbios. Segundo especialistas, um dos fatores determinantes na diversidade da herpetofauna do Cerrado é a estratificação horizontal de “habitats”, ou seja, existe um mosaico de diferentes tipos de

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vegetação justapostas, cada uma contendo uma composição distinta de espécies. Entretanto, essa diversidade vem sendo ameaçada por impactos causados pela atividade humana, como desmatamentos, queimadas e urbanização. Podem ser encontradas no Cerrado 837 espécies de aves, das quais, 30 são endêmicas, isto é, só ocorrem neste bioma. Dentre as aves mais típicas podemos destacar a ema (Rhea americana), a maior ave das Américas. Ela se alimenta de uma grande variedade de itens, entre eles insetos, minhocas, lagartos, cobras, rãs, folhas, frutos e sementes. Para ajudar na trituração dos alimentos, costumam ingerir pequenas pedrinhas. É uma ave terrícola e excelente corredora, vive em bandos de cerca de 30 indivíduos que se deslocam constantemente à procura de alimento. As asas servem para dar equilíbrio e mudar a direção durante a corrida, quando ela pode atingir uma velocidade superior a 60 km/hora. A seriema (Cariama cristata) é outra ave bem típica do Cerrado, tanto que sua vocalização é conhecida como “a voz do Cerrado”. Andam aos pares ou em pequenos grupos, sendo vistas com facilidade nos Campos Sujos e Cerrado Típico. São comuns também o tucano (Ramphastos toco), o papagaio-galego (Amazona xanthops) e araras, entre elas a belíssima arara-azul (Anodorhynchos hyacinthinus) e a canindé (Ara ararauna), encontradas corriqueiramente nos buritizais. Os mamíferos são representados por 200 espécies, das quais pouco menos de 20 são endêmicas, ou seja, somente ocorrem no Cerrado. Muitos deles têm hábito noturno, ficando escondidos em tocas ou outros abrigos durante o dia. Essa é uma estratégia que os ajuda a escapar dos predadores e também das condições extremas de temperatura. Há muitos animais interessantes, como o tamanduá-bandeira (Myrmecophaga tridactyla), ameaçado de extinção devido à caça e destruição do seu ambiente. Este animal ainda pode ser visto em alguns lugares do Cerrado, principalmente nas Unidades de Conservação, alimentando-se de cupinzeiros e ninhos de formigas. O tímido lobo-guará (Chrysocyon brachyurus), que é uma espécie de canídeo endêmico da América do Sul, também ameaçado de extinção, tem hábitos crepusculares e noturnos e se alimenta de pequenos animais e frutos diversos. O cachorro-vinagre (Speothos venaticus) é um dos membros menos conhecidos da família dos canídeos, alimentase de presas de pequeno porte, mas pode caçar em grupo para abater animais maiores – como emas ou capivaras. Apesar de ter uma grande área de distribuição (Américas Central e do Sul) a população segue em declínio. Destruição e fragmentação do habitat, abate por cães e humanos e doenças transmitidas por animais domésticos são as principais ameaças. Está na categoria vulnerável na Lista de Espécies da Fauna Brasileira Ameaçadas de Extinção, elaborada pelo ICMBio. Encontram-se ainda no Cerrado a onça-pintada (Panthera onca), a anta (Tapirus terrestris), o veado-campeiro (Ozotocerus bezoarticus), o veado-catingueiro (Mazama gouazoubira), entre outros. O mico-estrela (Callithrix penicillata) pode ser visto nas matas ciliares e cerradões, enquanto que o bugio (Alouatta caraya) é muito comum nas matas ciliares, de vegetação mais fechada. A conversão das áreas de vegetação natural em pastagens e lavouras é o principal problema do Cerrado, pois diminui o habitat disponível para animais e plantas, afetando a funcionalidade do ecossistema e ameaçando de extinção centenas de espécies. O prejuízo para os seres humanos é incalculável. O Cerrado tem potencial para oferecer uma gama de benefícios ao homem, entre eles o aproveitamento de plantas e animais de interesse agropecuário e a descoberta de novos remédios. Entretanto, se as porções mais significativas desse bioma continuarem a ser destruídas, esse precioso patrimônio biológico poderá desaparecer antes que se descubram usos para as espécies até agora desconhecidas. Extraído de: CEMIG. Guia Ilustrado de Animais do Cerrado de Minas Gerais. 2ª edição. Editora Empresa das Artes, 2003

Dispersão no Cerrado e dispersores ameaçados A manutenção da integridade de um ecossistema depende das interações da fauna e flora entre si, tendo a dispersão de sementes papel fundamental (Jordano et al. 2006). A frugivoria (animais que comem frutos) é um processo central em populações de plantas que dependem da dispersão de sementes por animais para sua regeneração natural, sendo que a evolução das plantas e características dos seus frutos e sementes responde diretamente às interações planta-frugívoro (Fleming & Kress 2013). A fragmentação de hábitat e a perda de animais frugívoros, principalmente daqueles de grande porte que são mais sensíveis ao desmatamento como o lobo-guará e a anta, compromete de maneira drástica a distribuição das espécies e a estrutura genética da população de plantas (Galetti et al. 2013). Estima-se que um terço de todas as espécies de plantas do bioma Cerrado dependa da fauna para dispersão das sementes, principalmente espécies de ambientes com formações mais fechadas como o Cerrado Denso e as Matas (Kuhlmann & Fagg 2012).

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Entre as espécies arbóreas do bioma, cerca de 70% produzem frutos que são atrativos para fauna. Sem dispersores, as sementes que caem sob a planta mãe ficam sujeitas a altas taxas de competição e predação, prejudicando o sucesso reprodutivo dos vegetais (Howe et al. 1985). Cerca de metade de todas as espécies de aves, morcegos e mamíferos não voadores que ocorrem no Cerrado incluem frutos na sua dieta, sendo potenciais dispersores de sementes (Fleming & Kress 2013). Assim, é de extrema importância a conservação da fauna para a vida da vegetação e manutenção dos serviços ecológicos que contribuem para o ciclo de regeneração natural das plantas do Cerrado. Referências: FLEMING, T. H., & KRESS, W. J. The ornaments of life: coevolution and conservation in the tropics. University of Chicago Press, 2013. GALETTI, M., GUEVARA, R., CÔRTES, M. C., FADINI, R., VON MATTER, S., LEITE, A. B., & JORDANO, P. Functional extinction of birds drives rapid evolutionary changes in seed size. Science, 340(6136), 1086-1090, 2013. HOWE, H. F., SCHUPP, E. W., & WESTLEY, L. C. Early consequences of seed dispersal for a neotropical tree (Virola surinamensis). Ecology, 66(3), 781-791, 1985. JORDANO, P., GALETTI, M., PIZO, M. A., & SILVA, W. R. Ligando frugivoria e dispersão de sementes à biologia da conservação. Biologia da conservação: essências. São Paulo: Editorial Rima, pp. 411-436, 2006. KUHLMANN, M. & FAGG, CW. Frutos e Sementes do Cerrado Atrativos para Fauna - Guia de Campo. Brasília, DF. Ed. Rede de Sementes do Cerrado, 2012.



Interações entre plantas e morcegos

E por falar em morcegos... quem são essas vítimas do nosso desconhecimento, lembrados como criaturas sinistras, demoníacas e indesejáveis, tão amaldiçoados, perseguidos e mortos? Mitos e lendas cercam estes seres noturnos que, dificilmente nos faz acreditar que são exímios caçadores de insetos, polinizadores e dispersores de sementes. Gratuitamente eles realizam importantes serviços ambientais! São os únicos mamíferos com capacidade de voar uma vez que seus 4 longos dedos dão a asa a estrutura de uma mão, daí serem denominados de quirópteros (palavra que vem do grego e significa: quiro=mão e ptero=asa). No mundo existem cerca de 1.200 espécies de morcegos, distribuídos em dois grupos: 1) os Megaquirópteros, também conhecidos por “raposas voadoras”, que se alimentam apenas de frutos e flores, ocorrem na Ásia, África e Oceania e alcançam até 1,70m de envergadura e 2kg de peso e, 2) os Microquirópteros, que apresentam ampla distribuição mundial, são geralmente pequenos, podendo variar de alguns gramas de peso até 200g e de 10 a 80cm de envergadura. No Brasil ocorrem cerca de 175 espécies, todas do grupo dos microquirópteros.

Raposa voadora (Pteropus vampyrus). Foto: Wilson Uieda

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Quanto ao hábito alimentar, das 1.200 espécies de morcegos, 70% são insetívoras (alimentam-se somente de insetos), 27% são fitófagas (alimentam-se de frutos, pólen, néctar e folhas) e, as demais, de peixes e pequenos vertebrados. Apenas 3 espécies alimentam-se de sangue: duas alimentam-se do sangue de aves e apenas uma única espécie alimenta-se do sangue de aves e de mamíferos (incluindo os humanos). As relações entre os morcegos fitófagos e as plantas de cujos produtos eles se alimentam geralmente influenciam a distribuição geográfica e a abundância de ambos os grupos, bem como seus períodos de reprodução. Quando essas interações são mutualistas, os morcegos são beneficiados pela obtenção de alimento e as plantas pelo uso de agentes para o transporte de pólen ou de sementes. As relações mutualistas ligadas a polinização e a dispersão de sementes estão intimamente associadas à evolução das angiospermas (plantas com flores e sementes contidas em frutos). Em suas interações com os morcegos, as angiospermas se especializaram em atrair os seus visitantes, levando-as às síndromes de quiropterofilia (polinização) e de quiropterocoria (dispersão). As flores das plantas que fazem parte de sistemas de polinização por morcegos, em geral, abrem no período noturno, com a ântese (abertura da flor, pronta para ser fecundada) ocorrendo após o por do sol e duram apenas uma noite. São brancas ou pálidas, de odor forte, produzem grande quantidade de pólen e néctar diluído e têm suas flores posicionadas externamente à folhagem. Como exemplo, podemos citar os pequizeiros e os jatobás. As plantas que fazem parte de sistemas de dispersão por morcegos têm, em geral, cores opacas e seus frutos ficam expostos, como o landim, caqui-do-cerrado, coquinho-jerivá, pebanheira, barú, os angelins, entre tantos outros.

Morcego nectarívoro com face coberta de pólen. Foto: Wilson Uieda

Morcego nectarívoro visitando a flor do jatobá-docerrado. Foto: Paulo Eugênio Oliveira

Morcego frugívoro comendo coquinho-jerivá. Foto: Angelika Bredt

Os morcegos fitófagos destacam-se no processo de recomposição da vegetação de áreas desmatadas por dispersarem as sementes de mais de 500 espécies de angiospermas. Além disso, mais de 1.000 espécies de plantas são polinizadas por morcegos na região neotropical. Trabalhos recentes têm sugerido que morcegos e aves são de fato os principais dispersores de sementes de plantas na região Neotropical, sendo responsáveis por até 80% das sementes que caem no solo de algumas florestas e savanas. Os “serviços” de dispersão de sementes por morcegos e aves parecem ser complementares, já que os morcegos cuidam mais de plantas pioneiras (embaúbas, figueiras, jaborandis e pimentas selvagens, joás e jurubebas) e as aves das intermediárias e tardias.

Morcego frugívoro comendo fruto de uma figueira. Foto: Sérgio Bernarde

Extraido e modificado de: BREDT, A.; UIEDA, W.; PEDRO, W. A. Plantas e Morcegos na recuperação de áreas degradadas e na paisagem urbana. Brasília, DF. Ed. Rede de Sementes do Cerrado, 2012

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Ajude a proteger o meio ambiente É muito importante que levemos a sério nosso compromisso de preservar o patrimônio natural do Brasil, que é um bem de uso comum de todos os brasileiros, garantindo que as futuras gerações possam conhecê-lo e amá-lo em sua forma mais natural. A exploração desordenada do território brasileiro é uma das principais causas das extinções das espécies. Fatores como o avanço da fronteira agrícola, a caça de subsistência e a caça predatória, a venda de produtos e animais procedentes da caça, captura ilegal na natureza, de plantas e animais, a construção de barragens, grandes ou pequenas, que modificam completamente o ambiente, participam de forma efetiva dos processos de extinção. As leis contra crimes ambientais são instrumentos criados para proteger os ecossistemas brasileiros - fauna, flora, ar, solo e água - e garantir agilidade e eficácia na punição aos infratores do meio ambiente. A legislação brasileira é bastante ampla e podemos destacar a “Lei dos Crimes Ambientais” - Lei nº 9.605/98, de 12 de fevereiro de 1998, que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente e o Decreto nº 3.179/99, de 21 de setembro de 1999, que dispõe sobre a especificação das sanções aplicáveis às condutas e atividades lesivas ao meio ambiente (regulamenta a Lei nº 9.605/98).

Sugestões, reclamações, informações e denúncias podem ser feitas através da Linha Verde. A ligação é gratuita, telefone 0800-61-8080 ou via email: [email protected]

Para saber mais.... Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção O Brasil abriga mais de 13% de toda a biota mundial, sendo um dos países de maior biodiversidade do planeta. No entanto, em todos os seus seis biomas continentais e também no ambiente marinho é possível encontrar sinais de ameaça à vida da fauna decorrente dos processos de fragmentação de habitat e atividades humanas sem controle. De acordo com a última lista do Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção (2008) e categorias da IUCN (International Union for Conservation of Nature), 627 táxons estão em situação de ameaça, sendo 67% de vertebrados e 33% de invertebrados. Proporcionalmente ao total de espécies do país, o grupo dos mamíferos é o mais ameaçado, com 10% das espécies brasileiras constando na lista. A Mata Atlântica contém o maior número de espécies na lista vermelha (380), seguido do bioma Cerrado (111). Assim, como detentor de tamanha megadiversidade, é grande também a responsabilidade do país em assegurar a sua manutenção, seja por meio de políticas públicas para conservação das espécies, contribuições de ONGs conservacionistas e da participação da sociedade como um todo. Referência: Machado, A. B. M., Drummond, G. M., & Paglia, A. P. Livro vermelho da fauna brasileira ameaçada de extinção. Ministério do Meio Ambiente-MMA, 2008.



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Livro Vermelho da Flora do Brasil Atualmente são reconhecidas para a flora brasileira mais de 45 mil espécies de plantas (Lista de Espécies da Flora do Brasil, 2015), sendo que não é tarefa fácil elaborar uma lista vermelha em um país megadiverso como o Brasil. Exige uso intenso de dados e colaboração de profissionais em diversas áreas para reunir e validar as informações. No atual Livro Vermelho da Flora do Brasil (CNCFlora 2013), foram avaliados 4.617 espécies de plantas, das quais mais de 45% foram classificadas como ameaçadas. Quase 95% das espécies avaliadas são Angiospermas, sendo as 10 famílias botânicas mais ameaçadas: Asteraceae, Bromeliaceae, Orchidaceae, Fabaceae, Myrtaceae, Cactaceae, Melastomataceae, Poaceae, Malpighiaceae e Rubiaceae. Os três gêneros mais ameaçados, proporcionalmente, são Xyris, Begonia e Mimosa. A Mata Atlântica é o bioma com maior número de espécies ameaçadas (1.544), seguido do Cerrado (645). A maioria das espécies ameaçadas encontra-se nessa situação devido em grande parte à perda de habitat, principalmente decorrente das práticas de agricultura e silvicultura intensiva. Ainda há um longo caminho para compreensão da real situação de ameaça da flora brasileira, uma vez que apenas 10% da flora foram avaliadas, mas o impulso inicial foi dado em prol da conservação das plantas. Referência: CNCFlora-Centro Nacional de Conservação da Flora. Livro vermelho da flora do Brasil. 2013. Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Lista de Espécies da Flora do Brasil. Disponível em: . Acesso em: Maio 2015.

Para que servem os nomes científicos? O nome de uma planta é a chave para toda sua literatura, sendo a correta identificação o passo inicial para seu estudo e conhecimento. O nome de um organismo fornece um meio para a comparação de observações e experiências. O primeiro sistema de classificação conhecido nasceu provavelmente com Aristóteles (370 a.C.) porém, foi Lineu (1707-1775) quem revolucionou a sistemática propondo a nomenclatura científica com terminologia binária. Assim, o nome de uma espécie é baseado em dois nomes em latim, sendo que o primeiro designa o gênero ao qual pertence aquele organismo, e o segundo nome refere-se a espécie que o caracteriza. Os nomes científicos são importantes para padronizar e globalizar a comunicação, uma vez que nomes populares variam de uma região para outra e não conferem segurança à correta identificação. Referência: MARTINS-DA-SILVA, R. C. V., da SILVA, A. S. L., FERNANDES, M., & MARGALHO, L. Noções morfológicas e taxonômicas para identificação botânica. Embrapa Amazônia Oriental, Livros Científicos, 2014.

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O que são unidades de Conservação? Atualmente no Brasil há 370 Unidades de Conservação (UC), que são geridas pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Popularmente conhecidas como parques e reservas essas unidades estão divididas em duas categorias principais, a de “Proteção Integral” e a de “Uso Sustentável”, e são áreas de rica biodiversidade e beleza cênica. Estão espalhadas em todos os biomas brasileiros, sendo 111 na Amazônia, 28 na Caatinga, 52 no Cerrado, 115 na Mata Atlântica, 3 no Pantanal, 2 no Pampa e 59 em ecossistemas Marinhos. O conjunto de UC federais, estaduais e municipais corresponde ao Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), que tem entre seus objetivos contribuir para a conservação de espécies, promover o desenvolvimento sustentável, promover meios para a pesquisa científica e valorizar econômica e socialmente a diversidade biológica. Referências: http://www.icmbio.gov.br/portal/biodiversidade/unidades-de-conservacao/biomas-brasileiros.html http://www.mma.gov.br/areas-protegidas/unidades-de-conservacao

O que é uma Cadeia Alimentar Parte da energia que chega a um ser vivo é gasta em suas atividades de sobrevivência – no crescimento e na reprodução, por exemplo. Portanto, para o nível seguinte da cadeia alimentar passará sempre menos energia do que entrou. É por isso que os carnívoros superiores, que ocupam posições terminais nas cadeias alimentares, estão sempre em risco de extinção. Para eles sobra sempre uma parcela pequena de energia disponível. Além disso, qualquer quebra na cadeia alimentar coloca sua posição em risco. As espécies que vivem em um mesmo ambiente estão ligadas entre si, como elos de uma grande corrente. O motivo que as une é o alimento: uns servem de alimento aos outros, transferindo-lhes a matéria que forma seus corpos e a energia que acumulam para realizar as suas funções vitais. O primeiro elo dessa “cadeia alimentar” é formado pelos vegetais, que usam a luz do sol, na fotossíntese, para produzir energia. Por conta de serem os primeiros a receber a energia do sol – a única fonte externa de energia em nosso planeta – e a transformá-la, os vegetais são chamados de produtores. Os elos seguintes da cadeia alimentar são formados pelos consumidores – seres vivos que, incapazes de produzir o próprio alimento, conseguem-no comendo outros seres vivos. Existe uma ordem entre os consumidores: os consumidores primários, ou de primeira ordem, são os que se alimentam dos produtores; os secundários, ou de segunda ordem, alimentam-se de consumidores primários e os terciários… Bem, essa cadeia pode ter muitos elos de consumidores, dependendo da riqueza de espécies que convivem no mesmo ambiente. Há ambientes tão diversificados que as cadeias alimentares acabam se tornando complexas teias alimentares. Nas cadeias alimentares, além dos produtores e consumidores, há também o importante elo dos decompositores, seres que se alimentam de plantas e animais em decomposição. São capazes de degradar substâncias orgânicas, tornando-as disponíveis para serem assimiladas pelos produtores. Com eles, a cadeia alimentar é realimentada e pode perpetuarse. Matéria e energia passam de um elo a outro da cadeia alimentar: dos produtores aos consumidores e, destes, aos decompositores. Parte da energia é consumida em cada elo, pelas atividades que os seres vivos desenvolvem para sobreviver; aos últimos elos sobram parcelas cada vez menores de energia. Daí falarmos em fluxo de energia. No caso da matéria, falamos em ciclo da matéria, uma vez que não há perda ao longo do trajeto.

Cadeia Alimentar

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A teia da vida: Seres vivos que habitam a Terra estão todos interligados em uma grande rede

Existem na Terra milhões de espécies de seres vivos, cada uma desempenhando um papel único em relação ao todo. Toda essa “multidão” de seres vivos que os cientistas chamam de biosfera está comprimida em uma estreita faixa de terra, água e ar de cerca de um quilômetro de espessura e espalhada por cerca de meio bilhão de quilômetros quadrados de superfície. Entre os seres vivos que habitam esse planeta, podemos encontrar os mais diversos tipos e variações. E - tal qual uma história sem fim - os cientistas tentam exaustivamente enquadrar e classificar essa imensa variedade de seres em grupos, para melhor estudá-los e entendê-los. Há desde pequenas bactérias até as grandes baleias; como há também desde os que produzem seu próprio alimento, como as plantas, até aqueles que dependem do alimento produzido pelos outros, como os animais. Não é à toa que se diz que a biodiversidade nesse planeta é imensa. Temos mesmo uma diversidade de formas de vida impressionante. Mas temos também um problema: toda essa imensa variedade de seres vivos está interligada como uma imensa teia viva e depende da energia do sol que chega à superfície do nosso planeta. Para piorar nossa situação, há uma agravante: a energia do sol que chega é pequena – apenas cerca de 10% – e conforme vai sendo usada pelos seres vivos vai diminuindo. Vivemos, portanto, em constante “luta” em busca de energia e nossa forma de obtêla é nos alimentarmos daqueles que a armazenam em seu organismo. Quando chega à superfície da Terra, a energia é fixada pelos vegetais, através da fotossíntese. Depois, a energia passa para os insetos ou outros herbívoros que se alimentam das plantas; dos insetos, a energia vai para os camundongos ou outros carnívoros inferiores que se alimentam de herbívoros; dos camundongos, a energia passa para cobras, que deles se alimentam e, assim por diante, vai se formando uma cadeia alimentar – em que matéria e energia vão passando de ser vivo a ser vivo até chegarem aos carnívoros superiores, como as águias, os tigres e os tubarões brancos. Ocupando o ponto extremo da cadeia alimentar, essas espécies só são consumidas por parasitas – as bactérias e os fungos especializados em decompor cadáveres. Referência: COSTA V. R. Por dentro das cadeias alimentares. Revista Ciência Hoje OnLine - http://chc. cienciahoje.uol.com.br/por-dentro-das-cadeias-alimentares/

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Capítulo 2 A construção do discurso da sustentabilidade Rodrigo Gerhardt

Salve o planeta – a formação da consciência ecológica Primavera silenciosa, obra de Rachel Carson publicada em capítulos pela revista New Yorker e depois lançada em livro em setembro de 1962, é considerada o primeiro grande manifesto ambientalista e a semente da sustentabilidade. A denúncia de Carson contra os pesticidas químicos – e a reação da indústria sobre ela – desencadeou um debate nacional nos Estados Unidos sobre a responsabilidade da ciência, os limites da tecnologia e a relação do indivíduo com a natureza, levando à proibição da produção doméstica do DDT e à criação de um movimento popular de proteção ao meio ambiente que passou a exigir mais regulações estaduais e federais, o que viria a fortalecer organizações recém-criadas, como World Wide Fund for Nature (WWF). As décadas de 1960 e 1970, efervescentes do ponto de vista social e político, seriam marcadas pelo aprofundamento de uma consciência ecológica e base do ambientalismo. Em 1961, o russo Yuri Gagarin é o primeiro ser humano a ir ao espaço e dar uma volta em torno do planeta, decretando: “A Terra é azul, e eu não vi Deus”. Em 1967, o Summer of Love de São Francisco, nos Estados Unidos, marcou o ápice da revolução hippie, um fenômeno social de contracultura que protestava contra a Guerra do Vietnã e pregava um estilo de vida alternativo ao American Way of Life: pacifista, com ideais anarquistas, comunitário, espiritualista, adepto do vegetarianismo e em comunhão direta com a natureza. Em 1969, a fotografia Earthrise, tirada pelo astronauta William Anders, retratando nosso planeta como um oásis de vida em meio a um universo frio e escuro foi amplamente utilizada para catalisar campanhas ambientais. Em 1970, o químico inglês James Lovelock publica sua influente “Hipótese de Gaia”, ou hipótese biogeoquímica, considerando o planeta Terra o único organismo vivo. Nesse mesmo ano, 20 milhões de americanos ocuparam ruas, parques e auditórios em uma das maiores manifestações já organizadas – o primeiro Dia da Terra (Earth Day), uma demonstração de força da consciência emergente sobre a situação do ambiente natural. No ano seguinte, 1971, o Greenpeace é fundado em reação aos testes nucleares americanos. Em 1972, a Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano, a Conferência de Estocolmo, introduz na pauta internacional a preocupação ambiental, sobretudo com poluição do ar e fenômenos como chuva ácida e ilhas de calor. Nesse período, mais precisamente no início dos anos 1970, a consciência ecológica alcança também o pensamento econômico. Em 1971, o matemático e economista romeno Nicholas GeorgescuRoegen publica o livro A lei da entropia e o pensamento econômico, baseado na segunda lei da termodinâmica, estabelecendo a natureza como limite da economia. “Em algum momento do futuro, a humanidade deverá apoiar a continuidade do seu desenvolvimento na retração, isto é, com o decréscimo do produto. O oposto do sucedido nos últimos 10 mil anos” (VEIGA, 2005). No ano seguinte, o Clube de Roma lançou a obra Limites do crescimento, um alerta sobre a contradição entre o crescimento econômico exponencial e a finitude dos recursos naturais. O relatório teve grande efeito sobre a Conferência de Estocolmo, realizada no mesmo ano, expondo claramente e pela primeira vez a oposição entre países desenvolvidos

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e em desenvolvimento com os impactos ambientais da industrialização. Com a mensagem “a pior poluição é a da pobreza”, o Brasil deixou clara sua posição. O meio ambiente passa a ser visto como entrave ou obstáculo ao pleno desenvolvimento dos países, desenvolvimento este circunscrito ao entendimento de progresso ou crescimento material. “No início da década de 1970, um comercial do automóvel Fusca mostrava várias árvores da Floresta Amazônica sendo arrancadas por tratores e máquinas para a abertura da rodovia Transamazônica; em um dos trecho da estrada ainda sendo aterrada surgia o automóvel, provando que era bom em qualquer terreno. A mídia não hesitava em retratar o meio ambiente brasileiro como um desafio ao progresso da Nação” (GIACOMINI FILHO, 2004, p. 163-164). Durante esse período, a comunicação para a sustentabilidade é estritamente focada no aspecto ambiental, embora o movimento ecológico, descentralizado e multiforme, partilhasse da ebulição social do período promovida pelos movimentos feminista, estudantil e em prol dos direitos civis dos negros. Como expressão, reflete a visão preservacionista predominante à época, que tem o meio ambiente como sinônimo de “natureza”, ou seja, uma concepção naturalista ou ecologizada. O componente humano é percebido em oposição ao meio natural, sendo responsável pela destruição e pelo uso indiscriminado dos recursos naturais (DIEGUES, 2004). Para isso, vale-se do ativismo e da militância predominante à época, com ações coordenadas em passeatas e protestos ou ações de confronto, como as promovidas pelo Greenpeace, cujas imagens e relatos eram divulgados para a imprensa. As mensagens agressivas, em tom de denúncia, têm como mote a poluição do ar, da água e dos solos, a proteção à vida selvagem, o fim da caça às baleias e focas e a interrupção dos testes nucleares. “Em torno deste tempo, mais e mais pessoas estavam vendo cenas de desastres ambientais nas novas TVs, lendo sobre assuntos internacionais e se comunicando através das culturas. A imagem da Terra vista do espaço foi se tornando um símbolo da necessidade de pensar e agir – de forma diferente” (DAUVERGNE; LISTER, 2013). Governos, empresas e consumidores foram os primeiros alvos das campanhas. Apontadas como as grandes vilãs, as corporações assumiram primeiramente uma postura de contra-ataque para, em seguida, uma altamente defensiva, por meio do controle de informações por intermédio dos departamentos de relações públicas. “Quem ama, preserva” e “Salve o planeta!” são expressões-símbolos cunhadas no período e que atravessaram os anos, fazendo-se presentes em campanhas de engajamento até os dias atuais.

“Pensar globalmente, agir localmente”– o ambientalismo no poder Até então restrito à esfera marginal dos movimentos sociais, o meio ambiente passa a ser inserido nas questões políticas e de poder. Em 1979, o Partido Verde era fundado na Alemanha – chegou ao Brasil em 1986 –, e a expressão “pensar globalmente, agir localmente” seria cunhada pelo estrategista de negócios Frank Feather. Ao longo da década de 1980, vários países e Estados estabelecem departamentos, secretarias e até ministérios ambientais para atuar na promoção de leis domésticas e internacionais de maior proteção do meio ambiente e de regulação das corporações. Se essa departamentalização organizou e fortaleceu ações de enfrentamento para as questões ambientais, por outro lado é importante notar que contribuiu para segregá-las das questões econômicas e sociais, enfraquecendo sua abordagem multidisciplinar. Ao mesmo tempo, o conceito de desenvolvimento seria reelaborado. Em 1987, o relatório Nosso futuro comum ou Relatório Brundtland apresentou a definição de desenvolvimento sustentável como “aquele que encontra as necessidades atuais sem comprometer a habilidade das futuras gerações de atender suas próprias necessidades”. Tal conceito seria consagrado cinco anos depois durante a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro, um marco político, científico e de comunicação do ambientalismo ao reunir mais de cem chefes de Estado em torno da discussão sobre a conciliação do desenvolvimento socioeconômico com a proteção ambiental. Vinte anos após a Conferência de Estocolmo, a oposição entre países desenvolvidos e em desenvolvimento foi novamente manifestada, com avanços ao se reconhecer “responsabilidades históricas, porém diferenciadas” da contribuição dos países em relação aos danos ambientais e conquistas científicas, como o estabelecimento das Convenções-Quadro para Mudanças Climáticas e da Biodiversidade, além de compromissos de ação e engajamento por meio de documentos como a Agenda 21, de forte influência para o fortalecimento da educação ambiental nas escolas. Destaca-se, no entanto, como um dos legados da Eco-92, como a conferência se tornou conhecida, a midiatização do ambientalismo, iniciada meses antes e continuada após sua realização.

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“[...] foi a partir da ECO-92 que a pauta ambiental se incorporou de uma forma mais contínua nos meios de comunicação e abriu espaço para um novo tipo de jornalismo especializado. O fenômeno da ‘superexposição ambiental” (RAMOS, 1996, p. 148). Seja no volume de notícias e reportagens seja na abrangência de temas tratados, o meio ambiente foi apropriado pela comunicação de massa. Editorias, cadernos, seções e programas especializados em meio ambiente foram criados nos grandes veículos de comunicação, como o semanário Globo Ecologia, na Rede Globo de Televisão, e o Repórter Eco, exibido diariamente no horário nobre na TV Cultura de São Paulo. Um jornalismo menos preocupado com o fato e sim com sua tradução e interpretação para o público leigo, e não apenas para o gueto dos ecologistas (VILLAR; TOSSI, 2001). Temas como efeito estufa, desertificação, reciclagem de lixo, desmatamento, poluição, economia de água e de energia e o crescimento desordenado das cidades são tratados de forma didática pelos veículos de comunicação. Um momento no qual se observa um maior reconhecimento da responsabilidade do cidadão – especialmente o indivíduo urbano – em relação ao impacto ambiental de seu estilo de consumo e seu papel na contribuição para a preservação. Promove-se uma sensibilização ambiental, considerada um dos principais pré-requisitos para o comportamento ecologicamente responsável, mas sem compromisso com a solução de problemas socioambientais. Uma abordagem comportamentalista, na qual a educação é entendida em sua dimensão individual, baseada em vivências práticas; foco na redução do consumo de bens naturais, descolando essa discussão dos modos de produção; baixa problematização da realidade e pouca ênfase em processos históricos” (LOUREIRO, 2005). O Relatório Brundtland e a Eco-92 são pontos de virada na relação das corporações com o ambientalismo global e as regulamentações. As corporações são convocadas a atuar em prol do crescimento sustentável e a desenvolver uma economia verde, o que se dá inicialmente de forma voluntária, na esfera da Responsabilidade Social Empresarial (RSE). O ambientalismo global tem mudado significantemente desde os anos 1960. Não mais nas franjas da política, ele suavizou e tornou-se uma força global em moldar leis internacionais, políticas de Estado, práticas de negócios e a vida comunitária em todos os lugares” (DAUVERGNE; LISTER, 2013). Observa-se durante toda a década de 1990 o estabelecimento de códigos de conduta, adesão a programas de ecocertificação e qualidade e investimentos sociais sem qualquer vínculo com a natureza dos negócios. É dentro da perspectiva da RSE que um novo termo é cunhado e fortemente midiatizado: o triple bottom line, ou tripé da sustentabilidade, baseado na integração das esferas ambiental, social e econômica. Até então em silêncio, corporações começam a comunicar, ainda que de forma reativa, suas boas práticas. É o início da comunicação da sustentabilidade, que, como novidade, surge marcada pela confusão de conceitos, sob questionamentos de assistencialismo, simples filantropia e baixa credibilidade perante o público. Uma comunicação ainda pouco planejada, predominantemente institucional, voltada à disseminação de posicionamentos, com mensagens óbvias e preliminares sobre as boas práticas realizadas. Neste período predominam como elementos iconográficos da ideologia sustentável uma onipresença de folhas, árvores, animais e ambientes paradisíacos envoltos em sufocantes verdes e azuis ou suas aparentes antíteses apocalípticas (gigantescas névoas de poluição, montanhas de lixo, imagens de mortandade de animais, etc.), separadas ou mescladas (STOLARSKI; LINS, 2010). No final da década, organizações voltadas à promoção e à normatização da responsabilidade social empresarial, como o Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, no Brasil, e o Global Report Iniciative (GRI), na Holanda, estabelecem parâmetros e indicadores para o planejamento, a execução, a avaliação e a comunicação das práticas empresariais em responsabilidade socioambiental.

Carbono zero e a ciência do aquecimento global Em 2006, a questão ambiental de maior gravidade já vista pela humanidade ganharia as telas do mundo: o documentário An inconvenient thruth, dirigido por Davis Guggenheim, abordava a campanha do ex-vice-presidente norte-americano Al Gore para alertar os cidadãos sobre o aquecimento global. O documentário ganhou o Oscar de sua categoria, e Gore recebeu o Prêmio Nobel da Paz. No ano seguinte, o caráter antropogênico das mudanças climáticas seria comprovado pelo quarto relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), um momento proposto por setores da comunidade científica como a definição de uma nova era geológica: o antropoceno. O anúncio do relatório do IPCC tem grande impacto nos veículos de comunicação de massa. O senso de urgência recomendado pelos cientistas no enfrentamento do aquecimento global é tratado de forma alarmista e catastrófica. Campanhas de mobilização ganham novo fôlego ao evidenciar imagens de eventos extremos: tempestades,

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inundações, secas, o derretimento de geleiras, com ursos polares sobre pequenos blocos de gelo e cidades “afogadas”. De outra parte, a incorporação das mudanças climáticas à causa ambiental traz consigo termos e conceitos da ciência do clima para o discurso da sustentabilidade que aumentam a complexidade de entendimento do tema. Entre o setor privado, no entanto, o senso de urgência tem reflexo em um maior engajamento corporativo, motivado, sobretudo, pela percepção da elevação do risco em suas cadeias de valor e, frequentemente, como estratégia de marketing, seja por ganho de reputação seja no posicionamento de mercado como provedor de soluções ambientalmente amigáveis. A possibilidade de quantificação do impacto ambiental em níveis individual, por empresa, organização ou país, por meio do cálculo de emissões de carbono equivalente de cada atividade produtiva e de consumo realizada, possibilita e estimula a criação de mecanismos e políticas de compensação e neutralização de emissões tanto por meio de mercados instituídos de venda de créditos de carbono quanto, no âmbito do varejo, pela oferta de produtos e serviços de baixo impacto ou “verdes”. Proliferam-se, assim, campanhas e anúncios comerciais de produtos com atributos “ecoamigáveis”, relacionados diretamente ao crescimento de um novo nicho de consumo, denominado consumo verde. Paralelamente, intensificam-se as denúncias de greenwashing, motivadas por maior fiscalização de organizações não governamentais militantes como também de empresas concorrentes. O termo foi cunhado pelo ativista americano Jay Westerveld em 1986, quando inicialmente não incluía reivindicações específicas ou mensagens de marketing; em vez disso, eram mais imagens de golfinhos brincando, florestas tropicais exuberantes e flores ao lado do logotipo da empresa para transmitir uma impressão de ecoamigável. “Por meio do uso cotidiano cada vez mais frequente, ao que parece, a palavra sustentável tornou-se sinônimo para o adjetivo igualmente vago e inquantificável verde, sugerindo algum valor ambiental indefinido, assim como em crescimento verde ou empregos verdes. Frases como ‘design sustentável’, ‘carros sustentáveis’ e até ‘roupas íntimas sustentáveis’ espalham-se pela mídia. De acordo com algumas métricas, isso poderia ser considerado um sucesso. Um uso tão frequente da palavra sustentável indica que um conceito ambiental importante ganhou valor na cultura popular. O ‘blablablá’ da sustentabilidade, porém, tem um alto custo. Pelo uso excessivo, as palavras sustentável e sustentabilidade perdem sentido e impacto” (ENGELMAN, 2013, p. 3-4). Com a detecção do uso abusivo de argumentos ambientais e a proliferação de termos vagos, inverídicos ou absolutos, como “carbono zero”, como atributos de venda e até autoproclamações de “empresa sustentável”, o greenwashing passou a ser o alvo de ONGs militantes. Críticas abertas às empresas cujos investimentos em comunicação e marketing eram superiores aos das ações socioambientais divulgadas e a criação de códigos e guias de identificação de sinais de “maquiagem verde” pelos consumidores foram algumas das táticas utilizadas como forma de reduzir os impactos negativos da publicidade a partir de uma preocupação crescente com as ações de promoção dos temas ambientais. Iniciativas como o GreenwasghingSpy.com, um site de patrulha que publica casos de greenwashing relacionados a produtos biodegradáveis, multiplicam-se, exigindo maior transparência das corporações. Na sociedade civil de consumo, ampliam-se campanhas educativas que objetivam empoderar o consumidor utilizando sua capacidade crítica de escolhas de compra, uso e descarte, com base em informação e valores de cidadania, como agente indutor de RSE. Trata-se, como aponta Fontenelle (2010), de propor uma série de produtos e medidas que “amenizem a culpa” pelo consumo em uma sociedade permeada pelo discurso do aquecimento global. Assim, o consumidor não precisaria preocupar-se ao consumir produtos que já trouxessem a garantia de que ele fez a escolha certa: ao consumir produtos ecologicamente corretos, ele poderia se eximir da culpa porque alguém já teria se responsabilizado por ele. Ele teria de ser responsável apenas na hora de tomar a decisão sobre qual produto ou marca comprar, ou, depois do consumo, sobre como neutralizar suas pegadas ecológicas. Por suas possíveis consequências e predominância atual no discurso da sustentabilidade, tal abordagem será vista em outros temas nesta publicação.

Fazer mais com menos – a sustentabilidade como vantagem competitiva Simultaneamente à maior propagação do consumo consciente – o que contribui para legitimar os esforços e os investimentos de gestão ambiental e modernização na cadeia de valor das empresas –, no âmbito corporativo o entendimento da RSE atrelada ao cerne do negócio, por meio do conceito de “valor compartilhado”, tem ampliado a visão da sustentabilidade como fator fundamental de vantagem competitiva para as empresas e não mais como obstáculo ao lucro, ao contrário. Dauvergne e Lister argumentam que o alcance do Eco-Business está acelerando em grande parte porque mais marcas e corporações transnacionais reconhecem seu valor para melhorar o desempenho das cadeias de suprimento. Isso os está ajudando a aumentar seu controle sobre o fornecimento de recursos, a qualidade do produto, a confiabilidade, a produção e os custos de entrega, bem como os preços de centenas de milhares de produtos de marca que fluem por meio de cadeias de valor globais para as prateleiras de varejo – um controle mais essencial do que nunca para ganhar vantagem competitiva e sustentar o crescimento na economia global de hoje. Fundamentalmente, as grandes marcas estão adotando o Eco-Business para aumentar seu poder de ter o produto certo para o cliente certo, na hora, no lugar e com o preço certos, com o uso mais eficiente dos recursos como forma de sustentar seu poder de varejo.

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Nesta década, o setor corporativo vem assumindo, portanto, um protagonismo que se esperava desempenhado pelos Estados nas discussões para o avanço da agenda da sustentabilidade. Reunidas por meio de fóruns, associações e iniciativas, como Global Compact, das Nações Unidas, World Businness Council for Sustainable Development (WBCSD) e Dow Jones Sustainability Index, “as corporações têm pautado a sustentabilidade para os negócios por meio de exercícios de visão em relatórios, câmaras técnicas e congressos que as ajudam a moldar os limites das soluções e a apresentar uma imagem de empresas cidadãs responsáveis” (DAUVERGN; LISTER, 2013). Tal visão ainda é a da sustentabilidade fraca, que Muller (2007) define como a baseada no entendimento da economia neoclássica de que todo capital natural é não essencial. Uma perspectiva predominantemente “técnica” e utilitária sustentada pela crença objetiva de que a tecnologia e o conhecimento acumulado são suficientes para resolver os impasses ambientais e de que o progresso tecnológico sempre impedirá que os recursos naturais imponham um limite ao crescimento. Baseia-se, portanto, fortemente, na transição energética dos combustíveis fósseis para os renováveis, na eficiência energética, de insumos e de produtividade, na modernização tecnológica e na inovação como caminhos para se alcançar a prosperidade em uma economia verde de baixo carbono, porém em um cenário business as usual, sem questionar os limites do crescimento, as estruturas dinâmicas de negócios e os comportamentos de consumo. Outra abordagem a ser considerada, como destaca Gioielli (2012), citando Porter e Kramer (2006), está no engajamento de temas e causas de grande atenção da opinião pública – sobretudo de seus consumidores ou clientes – como forma de atender a novas expectativas de seus públicos e assim agregar valor a seus produtos e seu posicionamento de mercado em uma sociedade civil cada vez mais interconectada em rede e influente na tomada de decisões. Em 2013, segundo o Social Media Sustainability Index, 233 empresas, entre 475 corporações globais analisadas, comunicaram ações de sustentabilidade por meio de mídias sociais. Um aumento crescente nos últimos anos – de 120 em 2011 e 176 em 2012. Apesar da explosão no número de empresas comprometidas a falar de sustentabilidade, muito poucas parecem ter uma boa ideia de com quem eles estão falando e que histórias eles deveriam estar contando (YEOMANS, 2013). Referências: DAUVERGNE, Peter; LISTER, Jane. Eco-Business: a big-brand takeover of sustainability. Londres: The MIT Press, 2013. DIEGUES, Antonio Carlos Sant’ana. O mito moderno da natureza intocada. v. 5. São Paulo: Hucitec, 2004. ENGELMAN, Robert. Além do blablablá da sustentabilidade. Estado do mundo 2013: a sustentabilidade ainda é possível? Washignton: Worldwatch Institute, 2012. ERWOOD, Steve. The Greenpeace chronicle: 40 years of protecting the planet. Amsterdam: Greenpeace International, 2011. FONTENELLE, Isleide Arruda. O fetiche do eu autônomo: consumo responsável, excesso e redenção como mercadoria. Psicologia & Sociedade, ed. 22, n. 2, p. 215-224, 2010. GIACOMINI FILHO, Gino. Ecopropaganda. São Paulo: Senac, 2004. GIOIELLI, Rafael Luis Pompéia. Empresa, sociedade e comunicação: debates e tendências na transição pósmoderna. São Paulo: USP, 2012. 327 p. PORTER, Michael; KRAMER, Mark R. Creating shared value. Harvard Business Review, Harvard, jan./fev. 2011. RAMOS, Luis Fernando Angeramim. Meio ambiente e meios de comunicação. São Paulo: Annablume, 1996. STOLARSKI, André; LINS, Rico. Mostra sustentabilidade: e eu com isso? 29ª Bienal de São Paulo. São Paulo: Fundação Bienal, 2010. TOSI, Roberto; BELMONTE, Roberto Villar. Jornalismo ambiental: onde estão as faculdades de comunicação? Revista Ecos, Porto Alegre, n. 19, ano VIII, 2001. Disponível em: . VEIGA, José Eli da. Desenvolvimento sustentável: o desafio do século XXI. Rio de Janeiro: Garamond, 2010. YEOMANS, Matthew. The social media sustainability index. Sustainly, 2014. Disponível em: . Acesso em: 30/03/2014.

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Principais movimentos para a sustentabilidade Mery-Lucy Souza, Andréia Cassilha Andrigueto e Rodrigo Gerhardt O movimento ambientalista surgiu em épocas distintas em vários lugares do mundo, e por diferentes motivos. Assim, não temos um marco definido de onde e quando se iniciou. As primeiras preocupações socioambientais de que se tem conhecimento surgiram a partir de meados do século XIX. Segundo John McCormick, elas se iniciaram nos Estados Unidos devido a problemas locais e de “custos mais imediatos e pessoais da poluição, da caça ou da perda das florestas”. George Perkins Marsh, em 1864, publicou o livro Man and nature, considerado por muitos um marco do ambientalismo americano. A obra enfocava questões do aumento do desperdício e da destruição como razões da destruição do planeta, tornando-o assim inabitável para todos os seres humanos. Foi nos Estados Unidos também que surgiram, próximo ao fim do século XIX, duas vertentes deste movimento: os preservacionistas e os conservacionistas, contrapondo-se aos preceitos desenvolvimentistas. “O movimento preservacionista, fundado por JohnMuir, é considerado mais radical, por acreditar que a interferência humana é essencialmente nociva ao meio ambiente. Protegendo a natureza contra o desenvolvimento moderno, industrial e urbano, faz reverência à natureza no sentido da apreciação estética e espiritual da vida selvagem, assegurando a intocabilidade de parques destinados para este fim. Para ele, animais, plantas e ecossistemas teriam um valor em si mesmos, independentemente da utilidade que pudessem ter para o homem.  Já os conservacionistas consideram o ser humano capaz de utilizar esses recursos de forma controlada, equilibrada e, muitas vezes, mais eficazmente do que se permanecessem “intocados, como propõe a outra vertente. Movimento criado por Gifford Pinchot, engenheiro florestal treinado na Alemanha, ditava que a conservação deveria basear-se na prevenção de desperdícios e o uso dos recursos naturais para benefício da maioria dos cidadãos, incluindo as gerações futuras (MCCORMICK, John, Rumo ao paraíso: a história do movimento ambientalista, 1964).

Por que se realizam COPs? Fonte: Planeta Sustentável, Editora Abril A COP, ou Conferência das Partes, é o encontro de 193 países que fazem parte da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima, assinada durante a Eco-92, no Rio de Janeiro. Ela é realizada anualmente, sempre em busca de um consenso nas políticas globais para lidar com as mudanças climáticas. Paris, na França, sediará a 21a edição, na primeira quinzena de dezembro de 2015, com o grande objetivo de estabelecer um novo acordo global para a redução de emissões, com metas para todos os países. A dificuldade é chegar ao consenso, principalmente entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, pois qualquer medida aprovada na COP tem reflexos na política e na economia dos países. A mesma Eco-92 também lançou as bases da Convenção Quadro sobre Diversidade Biológica. As COPs de Biodiversidade ocorrem a cada dois anos.

Quem faz as negociações na COP do Clima? As negociações são feitas em blocos, como o Grupo Africano, a Aliança Bolivariana para Povos da Nossa América (Alba) e os Países Menos Desenvolvidos (PMD), que juntos somam cerca de 120 países com interesses comuns, defendidos em conjunto. No entanto, eles não possuem tanto poder de decisão como os blocos de países mais ricos – os maiores emissores –, que incluem Canadá, EUA, Japão e União Europeia, e os grupos liderados por emergentes, como China, Índia, Brasil, África do Sul, entre outros.

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Protocolo de Kyoto O famoso Protocolo, que define metas para a redução de gases de efeito estufa (GEE), foi instituído em 1997, em Kyoto, no Japão, no âmbito da Convenção Quadro das Nações Unidas para as Mudanças do Clima. No entanto, só foi ratificado sete anos depois, em fevereiro de 2005, após a adesão da Rússia, quando obteve as assinaturas necessárias de países responsáveis por 55% das emissões do planeta. Ao ser ratificado, o Protocolo passaria a vigorar entre 2008 e 2012, prazo para que as nações desenvolvidas (37 países industrializados e a União Europeia) reduzissem em 5% suas emissões de GEE em relação aos níveis que emitiam em 1990. As metas não foram homogêneas. Reconhecendo que os países desenvolvidos são os principais responsáveis pelos altos níveis atuais de emissões de gases de efeito estufa na atmosfera, como resultado de mais de 150 anos de atividade industrial, o Protocolo estabeleceu níveis diferenciados de compromisso. Enquanto nações desenvolvidas tiveram metas obrigatórias de redução, os países em desenvolvimento foram incentivados a estabelecer suas metas, mas voluntariamente, sob o princípio de “responsabilidades comuns, porém diferenciadas”. No entanto, Estados Unidos, na época o maior emissor do planeta, não assinou o Protocolo justificando o grande impacto que isso teria em sua economia. Em 2011, as Nações Unidas conseguem renovar o Protocolo de Kyoto para uma segunda fase, na qual os países se comprometem a reduzir suas emissões de gases de efeito estufa em pelo menos 18% abaixo dos níveis de 1990, no período entre 2013 e 2020.

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Mecanismos de redução de emissões A criação do Protocolo de Kyoto instituiu alguns mecanismos, entre eles o Mercado de Desenvolvimento Limpo (MDL), que estabelece que países desenvolvidos promovam reduções em países em desenvolvimento por meio de compensações baseadas em créditos de carbono. O mercado de crédito de carbono chegou a movimentar 7,5 bilhões de dólares entre 2007 e 2008, embora com a crise financeira internacional esse número tenha caído para 1,5 bilhão de dólares em 2010. O sistema permite que empresas e nações reduzam seus índices de emissão por um sistema de compensação: uma empresa que não consegue reduzir suas emissões pode comprar esse “bônus” de terceiros que conseguiram. Para que uma empresa tenha direito de vender créditos de carbono, precisa contribuir para o desenvolvimento sustentável e adicionar alguma vantagem ao ambiente, seja pela absorção de CO2 (por exemplo, pelo plantio de árvores), seja evitando seu lançamento na atmosfera. A redução da emissão de outros gases igualmente geradores do efeito estufa, como o metano, também pode ser convertida em créditos de carbono – um crédito de carbono equivale a uma tonelada de dióxido de carbono tirado da atmosfera.

O que é Redd e qual sua relação com as emissões de carbono Quando se desmata uma floresta, grande quantidade de gás carbônico é lançada à atmosfera. Estima-se que 10% de todas as emissões atuais sejam causadas pelo desmatamento – isso é mais do que as emissões de todos os carros do planeta juntos. Para reduzir esse impacto, a Convenção do Clima da ONU instituiu o Redd – Redução de Emissões de Desmatamento e Degradação florestal. É um mecanismo internacional de incentivos a projetos que mantenham a floresta nativa em pé, ou seja, impedem que o carbono estocado nas árvores e no solo seja liberado para a atmosfera. Assim, esses projetos de preservação podem transformar esse carbono evitado em créditos ou doações. Na sequência, o Redd teve dois desdobramentos: o Redd+, que passou a incluir o papel da conservação, com projetos de manejo sustentável das florestas e o aumento dos estoques de carbono das florestas em países em desenvolvimento; o Redd++, que soma tudo isso à agricultura, com garantia de melhores práticas em prol do não desmatamento.

Como o Brasil lida com a questão do clima? Entre as metas da Política Nacional sobre Mudanças do Clima, aprovadas em 2009, estão reduzir em 80% o índice de desmatamento anual da Amazônia até 2020; ampliar o consumo interno de etanol em 11% ao ano nos próximos dez anos; dobrar a área de florestas plantadas para 11 milhões de hectares em 2020, sendo 2 milhões de hectares com uso de espécies nativas. Também prevê planos para que os diferentes setores econômicos desenvolvam ações de mitigação e adaptação. Com tudo isso, o Brasil comprometeu-se a reduzir suas emissões em 70% até 2015 em relação a 2005.

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Um novo acordo global pós-2020 Além da segunda fase do Protocolo de Kyoto, a Convenção do Clima em Durban (COP 17) aprovou também a criação de um novo acordo de redução de emissões de gases de efeito estufa, dessa vez com força legal para todas as partes, ou seja, países desenvolvidos e em desenvolvimento. O objetivo é definir as novas metas até 2015, quando serão aprovadas durante a Cúpula do Clima, em Paris, para que entrem em vigor a partir de 2020, quando se encerra o Protocolo de Kyoto. Para conhecer uma análise sobre os 15 anos do Protocolo de Kyoto acesse: .

Conferência sobre o Meio Ambiente Humano A I Conferência sobre o Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo no ano de 1972, foi o primeiro grande evento sobre o tema, resultado da crescente preocupação ambiental. Esse evento abriu os olhos do mundo para os problemas do meio ambiente e trouxe à tona os impactos do modelo desenvolvimentista adotado à época. A Conferência é considerada um marco nas discussões sobre o meio ambiente, pois introduziu o tema na agenda política internacional. A Conferência de Estocolmo mostrou que a natureza não poderia mais ser encarada como um recurso inesgotável, sendo necessária a preservação do meio ambiente em prol do bemestar das gerações futuras. Foram estabelecidos 23 princípios com o intuito de amenizar os impactos ambientais causados pelas intervenções humanas na natureza.

Conferência sobre Educação Ambiental em Tbilisi Em 1977 foi realizado um dos mais importantes eventos sobre educação ambiental: a Conferência sobre Educação Ambiental em Tbilisi, na Geórgia, organizada em conjunto pelo Programa de Meio Ambiente da ONU (Pnuma) e pela Unesco. Nesse encontro foi deliberado que a educação ambiental era um fator determinante para a solução dos problemas do meio ambiente. Assim como na Conferência de Estocolmo, na Conferência de Tbilisi foram criados princípios norteadores para a educação ambiental, tais como: processo dinâmico interativo – a educação ambiental foi definida como “um processo permanente no qual os indivíduos e a comunidade tomam consciência do seu ambiente e adquirem o conhecimento, os valores, as habilidades, as experiências e as determinações que os tornam aptos a agir individual e coletivamente para resolver problemas ambientais”; transformadora – a educação ambiental possibilita a aquisição de conhecimentos e habilidades capazes de induzir mudanças e atitudes. Objetiva a construção de uma nova visão das relações do homem com seu meio e a adoção de novas posturas individuais e coletivas em relação ao ambiente. A consolidação de novos valores, conhecimentos, competências, habilidades e atitudes refletirá na implantação de uma nova ordem ambientalmente sustentável e participativa: a educação ambiental atua na sensibilização e na conscientização do cidadão, estimulando a participação individual nos processos coletivos; abrangente – a importância da educação ambiental extrapola as atividades internas da escola tradicional; deve ser trabalhada continuamente em todas as fases do ensino formal, envolvendo ainda a família e a coletividade. A eficácia virá à medida que sua abrangência atingir a totalidade dos grupos sociais; globalizadora – a educação ambiental deve considerar o ambiente em seus múltiplos aspectos e atuar com visão ampla de alcance local, regional e global; permanente: a educação ambiental tem um caráter permanente, pois a evolução do senso crítico e a compreensão da complexidade dos aspectos que envolvem as questões ambientais se dão de modo crescente e continuado, não se justificando sua interrupção. Despertada a consciência, ganha-se um aliado para a melhoria das condições de vida no planeta; contextualizadora – a educação ambiental deve atuar diretamente na realidade da comunidade, sem perder de vista sua dimensão planetária. A Conferência de Tbilisi estabeleceu como deveria ser realizado um processo de educação ambiental no mundo, mostrando que, por meio dela, despertar-se-ia a consciência ambiental no sentido da preservação dos recursos naturais a fim de evitar um colapso futuro.

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Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD) A Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD) desenvolveu em 1987 o Relatório Brundtland (conhecido também como Relatório nosso futuro comum). Na época, a degradação ambiental e social crescia meteoricamente, e a CMMAD chamou a atenção para tal situação no Relatório nosso futuro comum. Foi informado também que o meio ambiente era um bem econômico. As críticas ao modelo de desenvolvimento em voga aumentavam cada vez mais, apontando como parte desse modelo o uso irracional dos recursos naturais, por meio de tecnologias que impactavam negativamente o meio ambiente. Além disso, a pobreza e a desigualdade socioeconômica cresciam rapidamente, e isso requeria a implantação de políticas socioambientais para tentar amenizar esse grave problema. Foi nesse contexto que surgiu no Relatório Brundtland a definição de “desenvolvimento sustentável”, no qual se expunham ações que promoveriam a harmonia entre o desenvolvimento econômico e a utilização dos recursos naturais. O desenvolvimento deve ocorrer com o mínimo de prejuízo possível à natureza, garantindo, desse modo, a qualidade de vida para as gerações futuras por meio do equilíbrio socioambiental. Assim, foram abertos os caminhos para a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. Ressalta-se o papel do Estado como grande estimulador dos olhares e das preocupações da sociedade acerca do meio ambiente. No Brasil, segundo o professor Carlos Hiroo Saito (2015, contato pessoal), reforça-se o olhar individual sobre as questões que envolviam o meio ambiente na época do regime militar. O país foi marcado por uma onda de repreensão a movimentos coletivos. Nessa época, surgiram disciplinas para repassar informações de higiene pessoal, como escovar os dentes, lavar as mãos, como se o indivíduo fosse o grande responsável pelas doenças que deveria evitar. Disciplinas como OSPB, Educação Moral e Cívica também surgiram a fim de pregar o patriotismo e o “Ame-o ou deixe-o”. Foi a época marcada pelo exílio e pela censura. Assim, não foi por acaso que a EA dessa época no Brasil enveredou por esses rumos: de estimular ações individuais em prol de um meio ambiente limpo e sadio. Em 1985, com desejo de romper as regras do militarismo no Brasil, Tancredo Neves é eleito presidente do Brasil por meio de eleições indiretas. No entanto, morre sem assumir. Coube a José Sarney e a seu melhor amigo, Ulysses Guimarães, realizar o sonho de Tancredo no ano de 1988: fazer, com a forte participação popular e legislativa, a nova “Constituição Cidadã”. Promulgada por Ulysses, ele pronunciou: “Declaro promulgado o documento da liberdade, da democracia e da justiça social do Brasil”. Foi o início de uma nova época para o Brasil e a educação. Referências: . . Acesso em: 28/03/2015. Para saber como a Constituição Federal criada à época resume esse novo olhar, consulte o capítulo de Legislação deste livro.

Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio-92) A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento foi realizada no ano de 1992 na cidade do Rio de Janeiro, com a participação de vários chefes de Estado e de diversas ONGs. À época, as universidades ficaram de fora do debate. Foi esta a conferência a iniciar as discussões ambientais na década de 1990. A partir da Rio-92 aumentaram os debates sobre as questões socioambientais. Dentre os documentos gerados na Rio-92 destacam-se: Agenda 21; Declaração de Princípios sobre Florestas; Nossa Agenda; Convenção sobre Diversidade Biológica; Carta da Terra; Convenção sobre Mudança do Clima; além de diversos relatórios nacionais. A Agenda 21 é um documento de destaque, pois concilia o crescimento econômico com o desenvolvimento sustentável, além de tratar da conservação ambiental e da gestão dos recursos naturais.

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Rio + 20

Após sediar a Rio-92, a cidade do Rio de Janeiro foi mais uma vez a anfitriã da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, no período de 13 a 22 de junho de 2012. Garantir o compromisso político internacional para o desenvolvimento sustentável, este foi o principal objetivo da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, realizada na cidade do Rio de Janeiro em junho de 2012. Também chamado de Rio + 20, o encontro marca o vigésimo aniversário da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, ocorrida na capital carioca em 1992, e os dez anos da Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável, realizada em Johanesburgo (África do Sul) em 2002. Baseada em três pilares-econômico, social e ambiental-, a Rio + 20 tratou basicamente de dois temas: a “economia verde”no contexto da erradicação da pobreza e a estrutura de governança para o desenvolvimento sustentável no âmbito das Nações Unidas. Foi uma conferência de alto nível, com a participação de chefes de Estado, representantes de dezenas de países, de empresas e da academia. A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável foi organizada em conformidade com a Resolução 64/236 da Assembleia Geral da ONU, de março de 2010. Além de renovar o compromisso mundial em torno da sustentabilidade, o evento foi uma oportunidade de se avaliar o progresso alcançado nos últimos vinte anos, detectar as lacunas na implementação dos acordos internacionais e identificar os desafios ainda existentes. Embora a Rio + 20 não tenha sido planejada como um evento focado no meio ambiente e sim no desenvolvimento sustentável, o tema foi um de seus pilares. Os organizadores e o Ministério do Meio Ambiente (MMA) enfatizavam um novo conceito em moda, o da “economia verde”. Sem um conceito único balizador, em síntese implicava uma mudança nos atuais padrões de produção e consumo, com foco na agenda econômica do país visando à sustentabilidade sem comprometer o crescimento. Segundo informações do MMA, o Brasil já vem pautando suas políticas e estratégias de desenvolvimento na sustentabilidade. Sabe-se que tais iniciativas não são exclusividade do Ministério do Meio Ambiente – o desenvolvimento sustentável hoje está na pauta de diversos agentes econômicos e sociais. São diferentes ações, muitas delas em diferentes graus ou estágios de implementação, e a Rio + 20 constituiu uma excelente oportunidade para se demonstrar que, apesar de ser uma conferência da ONU, o Brasil, como país sede do evento, desempenhou papel fundamental nas negociações e nos acordos costurados. A Rio + 20 foi também uma ocasião para os países membros das Nações Unidas fazerem um balanço dos resultados obtidos nos últimos vinte anos, desde a Rio-92, e das falhas enfrentadas ainda hoje em relação ao que foi decidido entre as lideranças mundiais em 1992. Renovar o compromisso político assumido à época foi primordial, pois o planeta espera que essa conferência tenha reavivado o que em 1992 ficou conhecido como o “espírito do Rio” – uma forte mobilização política que possibilitou a adoção de importantes acordos multilaterais na área do meio ambiente e do desenvolvimento sustentável. Os resultados acerca da Rio + 20 não podem ainda ser aferidos. Como um processo social, as contribuições do evento à nossa sociedade virão no longo prazo, como as decorrentes da conferência anterior, com o desenvolvimento sustentável sendo incorporado ao longo dos vinte anos subsequentes à Rio-92. Todavia, pode-se inferir o impacto gerado nas mídias sociais e na imprensa. Há vinte anos não havia internet nem tantos jornalistas cobrindo o evento. Hoje, diversas profissões foram desafiadas a tecer, cada qual em sua área, considerações a respeito do encontro, em tempo real, em jornais, revistas, boletins específicos – o que não

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ocorreu na Rio-92. Observou-se também na Rio + 20 a necessidade de aprofundamento científico nos temas, colocando as discussões de nível mais acadêmico para o entendimento do grande público. Pretendeu-se não apenas dar a notícia, mas fazer com que fosse entendida. No campo político, no entanto, foram poucos avanços. Para quem compareceu ao evento e de acordo com os relatos divulgados pelos grandes jornais à época, as considerações políticas poderiam ter sido mais aprofundadas, chegando-se a decisões efetivas. A expectativa era que se conseguisse determinar metas para o desenvolvimento sustentável em distintas áreas, mas isso não ocorreu. O documento cita que o anseio é que elas sejam criadas em 2015. Destaca-se o fato de o secretário-geral da ONU em menos de 24 horas ter mudado seu discurso acerca do texto do documento final da Rio + 20, em razão, parece, de pressões diplomáticas. Em lugar de um texto no qual se liam “poucos avanços”, foi apresentado um discurso de vitória, de sucesso. Além disso, a Rio +20 foi marcada pela setorização de eventos em detrimento de um local único de discussões Isso favoreceu a logística do evento (com maior segurança e transporte público), mas pulverizou as aglomerações, dando menor peso aos protestos que ocorreram ao longo do período. A restrição do acesso da sociedade civil aos locais de decisão política foi outro marco da Rio +20. Outro ponto que merece destaque é a importância dada à educação em prol da sustentabilidade em detrimento da educação ambiental. A palavra educação é citada trinta vezes no texto, embora a “educação ambiental” não apareça. Em 73% das vezes em que aparece no relatório final da ONU O futuro que queremos, a educação surge como condição ao desenvolvimento sustentável ou é associada em seu contexto. O ano de 2014 marca o fim da Década da Educação para a Sustentabilidade da ONU (2005-2014). Refletimos que talvez não tenha sido por acaso que isso tenha acontecido. Torçamos para que a educação ambiental volte a ganhar força, uma vez que abarca como condição sine qua non o tripé da sustentabilidade: ambiente, economia e sociedade (e suas variantes: cultural, política, religiosa, etc., defendidas por autores de peso, como Ignach Sachs, em sua obra Desenvolvimento: includente, sustentável, sustentado. Rio de Janeiro: Garamond, 2008). Fonte: .

Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC) – Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima O IPCC é um órgão criado pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e pela Organização Meteorológica Mundial (OMM) em 1988 para estudar o problema das mudanças climáticas, reunindo 2.500 cientistas de mais de 130 países. A missão deste Painel é avaliar a informação científica disponível sobre os efeitos das mudanças climáticas, destacar seus impactos ambientais e socioeconômicos e traçar estratégias para dar respostas adequadas ao fenômeno. Cada governo possui um grupo de especialistas para coordenar as atividades relacionadas ao painel no seu respectivo país. O IPCC está aberto a todos os países membros do Pnuma e da OMM. A cada sete anos o IPCC publica seu relatório com base na literatura técnico-científica sobre as mudanças climáticas (AR – Assessment Reports), examina os efeitos das mudanças climáticas e desenvolve estratégias de combate, subsidiando as Partes da Convenção. Em 1990, o IPCC publicou seu primeiro relatório (First Assessment Report – AR1) afirmando que as atividades humanas poderiam estar causando o aumento do efeito estufa. O estudo foi a base para as discussões durante a ECO-92, no Rio de Janeiro, quando foi assinada a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. O IPCC dispõe de três grupos de trabalho para a elaboração de suas publicações (GT-I, II e III) e de uma equipe especial para estoques nacionais de gases efeito estufa. O GT-I avalia os aspectos científicos do sistema climático e do fenômeno das mudanças do clima. O GT-II examina a vulnerabilidade dos sistemas humanos e naturais ante o impacto das mudanças climáticas, as consequências dessas mudanças e as possibilidades de adaptação a elas. E o GT-III, por sua vez, avalia as possibilidades de mitigação das mudanças climáticas e a limitação das emissões de gases de efeito estufa. Os grupos de trabalho e a equipe especial contam com dois presidentes, um de um país desenvolvido e outro de um país em desenvolvimento, além de uma unidade de apoio técnico. O IPCC elabora relatórios de avaliação, relatórios especiais, documentos técnicos em geral e guias de metodologia nos seguintes temas: informação científica a respeito de mudança climática; impactos ambientais e socioeconômicos da mudança climática; e formulação de estratégias de resposta (mitigação e adaptação). O IPCC tem autonomia para decidir sua estrutura, seus princípios e procedimentos e seu programa de trabalho, além de eleger seu presidente e os integrantes de sua mesa diretora. Fonte: ; .

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Capítulo 3 Analisando a educação ambiental por meio de diferentes abordagens Andréia Cassilha Andrigueto A forma de se fazer educação ambiental (EA) como um roteiro é inovadora, uma vez que, geralmente, os artigos científicos abordam apenas a descrição de processos já ocorridos (ou sua forma de fazê-los), sem descrever outras metodologias de trabalho que transcendam aquela utilizada em seu artigo. Além disso, fica a cargo de cada um que trabalha com EA fazer de seu jeito uma prática estimulante para quem participa dela. A análise do processo de EA fica, assim, em segundo plano. Nesse sentido, refletir acerca de como fazer EA baseando-se em um roteiro parece ser um bom caminho para criar uma ferramenta educacional. No entanto, é necessário ressaltar que cada prática envolve peculiaridades muito específicas de cada realidade/tempo/local, ressaltadas por autores como Morin (2004) e Sachs (2004), que precisam ser observadas na adaptação dos projetos de EA. Então, analisar a EA por diferentes abordagens levando-se em conta sua realidade específica é o objetivo deste capítulo, oferecendo ao monitor/educador/profissional a percepção de como encaixar sua prática na proposta que mais se adeque aos objetivos que ele se propõe a alcançar. Apresentar a amplitude de uma ação educativa pela teoria proporcionada por diferentes autores visa a levar o leitor a refletir sobre sua prática. Porém, ressaltamos que as abordagens aqui apresentadas não se baseiam em um olhar unicamente acadêmico, pautam-se em autores de referência em EA e respaldados na vivência do educador informal. Tiramos assim da “bagagem do educador” alguns conceitos que podem ser retrabalhados em atividades que agreguem valores às questões ambientais. Tudo o que será descrito a seguir leva em conta o que preconiza a política de EA, estabelecida pela Lei no 9.795/1999, a saber, incentivar a construção de ferramentas de EA, considerando-se que a EA ainda é um conceito em construção.

Definições de educação ambiental por diferentes autores Além das leis tratadas em capítulos a parte, queremos mostrar ao leitor como diferentes acadêmicos e profissionais enxergam a EA. No nosso entendimento, cada visão, cada forma de entender e abordar a EA (em salas de aula ou fora delas) dependerá do que o educador/profissional leva para sua prática, como faz isso e por que o faz. Acreditamos que cada educador/profissional leva para as aulas de EA sua história e sua trajetória de vida, seu modo de perceber o mundo e de ser estimulado por ele, muito mais do que por visões estritamente acadêmicas e/ou profissionais. Suas vivências moldarão seu desempenho em salas de aula ou em processos educativos de forma particular e individualizada. Fomos estimulados de diferentes maneiras para o caminho profissional que escolhemos seguir e respondemos a esses estímulos de diversas maneiras. Portanto, vários e distintos podem ser os entendimentos acerca da EA pelos profissionais e educadores que trabalham com ela. Na nossa forma de entender, o que o educador/profissional traz para sua prática depende de como ele a exerceu anteriormente: se foi crítico e contestador, se refletiu conceitos repassados, se construiu novos conceitos, se experienciou na prática o que disse na teoria. O caráter educativo deve, nesse sentido, ser estimulado e vivido, e não ser apenas teórico. Cabe também ao profissional e ao educador munir-se de ferramentas adequadas para sua prática. Cremos que todo educador é um pouco do que ensina. Embora a EA seja um processo de sensibilização e conscientização, a atuação nessa área, aparentemente simples, não é, ou pelo menos não deve ser, para amadores. O ensino de EA requer preparo, didática, conhecimento e percepção das limitações e dos anseios do grupo, e isso demanda estudo constante. Investimentos em capacitação individual são fundamentais, a fim de que o educador ambiental possa discutir conceitos e tendências com o grupo, bem como estimular sua consciência crítica e um debate saudável e enriquecedor. Um espírito libertador e a vontade de fazer a diferença tanto para seu mundo individual como para o do outro deveriam fazer parte da formação de um bom educador ambiental. Educação Ambiental não é nada mais do que “ensinar para a vida”, e é justamente por isso que se fundamenta em comportamentos, atitudes e hábitos. Todos os agentes de EA deveriam pautar-se em conceitos, dados e histórias para poderem repassar informações embasadas que deem segurança a interlocutores, educandos e a todos os envolvidos com tal prática. Em nossa reflexão sobre o assunto deparamos com a seguinte questão: no que consiste a EA para os diferentes profissionais? O método de análise de conteúdo, proposto por Laurence Bardin, irá auxiliar a análise da descrição de cada autor, refletindo acerca dos termos que aparecem no discurso de cada um deles. Os termos mais recorrentes são utilizados para ler e tentar interpretar suas definições.

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Valéria Sucena Hammes e José Maria Gusman Ferraz (2003) A educação ambiental é o instrumento apontado para auxiliar a sociedade a incorporar novos conceitos e a colaborar para a viabilização do desenvolvimento sustentável. Para formar a sociedade sustentável é imperativo conscientizar os diversos setores – público, privado e sociedade civil. De maneira geral, há competências e legislação específicas relacionadas a esses setores. Para conscientizar cada grupo é preciso capacitar pessoas interessadas em atuar como agentes multiplicadores, desenvolver projetos. Elaborar documento síntese com as intenções do grupo em desenvolver atividades de educação ambiental na escola e na comunidade é essencial ao estabelecimento de parcerias, capacitação de recursos e como elemento de avaliação. A Política Nacional de EA, Lei n. 9.795/1999, parece ser utilizada por esses autores como base para suas ideias. Aliado a isso, quanto à elaboração de projetos, complementam seu discurso com elementos indicados também, por exemplo, pela Fundação Fonte para o Desenvolvimento Social e pelo Instituto Ethos. Essas organizações compartilham nossa visão quanto à necessidade de capacitação de recursos e de avaliação do processo, elementos primordiais para que bons projetos saiam do papel, tornem-se realidade e façam a diferença. Naná Mininni Medina (2002) A EA é um processo que permite ao indivíduo e à comunidade participar da construção de novos valores sociais e éticos, desenvolvendo atitudes, competências e habilidades voltadas para a conservação e a utilização adequadas dos recursos naturais. Ao buscar a construção de novas formas de pensar, interpretar e agir no mundo, a educação ambiental apresenta-se como uma alternativa de transformação da educação. Assim, muitas vezes a educação ambiental é desenvolvida de forma simplista, reduzindo-se à sensibilização de alunos acerca dos problemas ambientais a partir do ensino de conteúdos ecológicos ou em atividades pontuais no Dia do Meio Ambiente, do Índio, da Árvore ou, ainda, por visitas a parques ou reservas ecológicas. Apesar de essas atividades serem necessárias, elas não são suficientes para a mudança dos valores pessoais. A sensibilização é uma etapa inicial da educação ambiental, e os conteúdos ecológicos são essenciais para o avanço desse processo. O autor discorre acerca do cuidado que se deve ter em se fazer educação ambiental. A EA feita de forma simplória, com “achismos” e opiniões sem ciência, sendo reduzida à ecologia e a presunções de verdades pessoais e antropocêntricas. O professor Paulo Eugênio de Oliveira, da Universidade Federal de Uberlândia-MG, já em 2002 defendia que a maior parte das pessoas que trabalham com EA peca ao não utilizar a ciência (e conceitos ecológicos) em suas práticas. A EA vai além da ecologia, mas precisa dela como base para a construção do pensamento ambiental. No nosso entendimento, esse deve ser o bem mais precioso para a vida profissional de educadores ambientais: ensinar com base na ciência, além da lei e de realidade. Para Medina (2002), ações isoladas não constroem processos educativos. É necessário constância, permanência, habilidades “de atuar e agir no mundo” para transformar indivíduos em sujeitos ecologicamente alfabetizados. David W. Orr (2006) Toda educação é educação ambiental, e com ela, por inclusão ou exclusão, ensinamos aos jovens que somos parte integrante ou separada do mundo natural. A meta não é o mero domínio das matérias específicas, mas estabelecer ligações entre a cabeça, a mão, o coração e a capacidade de reconhecer os diferentes sistemas, aquilo que Gregory Bateson chama de “padrão que interliga”. Para ser ecologicamente alfabetizada, uma pessoa precisa ter no mínimo conhecimentos básicos de ecologia, de ecologia humana e dos conceitos de sustentabilidade, bem como meios necessários para a solução dos problemas. O padrão que reconecta é citado em outros exemplos, que podem aqui ser utilizados para ilustrá-lo. Do filme Avatar (dirigido por James Cameron) à teoria do re-ligar, defendida por Nicolescu (1999), passando por metodologias educacionais, como as desenvolvidas por organizações não governamentais, como o The Tracking Project (www.thetrackingproject.org) e o Instituto Pegadas Brasil (www.top.listona.com/InstitutoProjeto-Pegadas-Brasil), o propósito de dar um sentido a essa existência é alcançado pelo reconectar-se com algo aparentemente perdido. É fundamental que a EA possa nos trazer de volta a um estado natural, resgatando ensinamentos ancestrais e formas mais simples de se relacionar com a natureza, mas não menos complexas (ver a esse respeito “Sensibilização”, no capítulo 3).

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Marina Silva (2005) A EA, integrada às demais políticas públicas setoriais, assume destacada posição para o diálogo, a parceria e a aliança e pauta-se pela vertente crítica e emancipatória da educação, estimulando a autonomia do educando e desenvolvendo não apenas a ética ecológica no âmbito individual, mas também o exercício da cidadania. Esse modo de fazer EA requer dos educadores aprofundamento teórico e um aprendizado para interagir com os educandos, que são necessários para traduzir o sentido crítico e emancipatório da educação ambiental em suas práticas pedagógicas. Como política e ex-ministra do Meio Ambiente, Marina Silva (2005) apresenta uma forma estratégica de se trabalhar com EA. Refere-se a posições e direcionamentos – estar no lugar “certo” falando com a “pessoa certa” – para auxiliar naquele dado problema, que geralmente vai impactar na proposição de programas setoriais ou de políticas públicas para preencher determinada lacuna. A prática, para a autora, requer atuação, saber como exercer autonomia e como atuar em sociedade. A emancipação, vista por meio do conceito de educação de Paulo Freire (1979), é aqui evocada para reforçar a tese de que nenhuma prática é livre de uma intenção. O profissional/educador deve saber que ao mesmo tempo em que ensina aprende, ao mesmo tempo em que influencia é influenciado pelo seu ambiente de prática. Luiz Augusto Passos e Michèle Sato (2002) Não há como negar a dimensão política da educação ambiental. E é exatamente por seu caráter transformador que ela também encerra outras dimensões que ultrapassariam seu enfoque e suas relações como ciência da criação e da arte e se deteria numa vivência dela, da experiência sensorial ou emocional do cotidiano das pessoas. Para isso, os autores citam o caráter libertador e revolucionário da educação de Freire (2000): “O educador libertador deve ser dotado de um poder quase mágico, capaz de esbarrondar por terra todas as orientações da ‘ordem do dia’ e lançar-se na liberdade. A educação em sonho deve invadir a arte, a filosofia, a ciência e a técnica. Há de vencer a resistência dos tempos, de suas disciplinas, de seus quadros fechados e de sua lógica estranguladora. Há de vencer a padronização hegemônica que tem impedido a trajetória da diversidade educativa”. Tanto Luiz Augusto Passos e Michèle Sato (2002) como Marina Silva (2005) atribuem à EA uma almejada ótica política da transformação. Experiências pessoais e sensoriais também são evocadas para contribuir com práticas libertadoras que visam a ultrapassar a visão tradicional da educação, aqui criticada. Vejamos: por que será que Paulo Freire geralmente é citado em toda prática educacional? É porque ele é um autor de base cuja leitura é primordial para a formação do profissional/educador. Ex-pesquisadores que hoje trabalham com EA apresentam diferentes olhares acerca dos processos educativos, como, por exemplo, Wetzel (2011) e Andrigueto (2011). Maria Magaly Wetzel (2011) Educação ambiental – sutileza e encanto, na qual a atuação do professor é de fundamental importância para que a criança possa construir uma imagem positiva de si mesma e do ambiente em que vive, mediante a exploração de diferentes movimentos e posturas, para que seja despertada para sua curiosidade, sua criatividade e sua sensibilidade, estimulando-a a uma relação harmoniosa com a natureza. Wetzel defende uma linha lúdica e inclusivista da EA. Segundo ela, a EA serviria como ferramenta de inclusão social e reforço ou desenvolvimento da autoestima e da afetividade, muito presentes em projetos da área. José Rozalvo Andrigueto (2012) Educação ambiental – força impulsionadora capaz de desencadear ações e atitudes transdisciplinares em defesa do Cerrado que queremos preservar. Preservação também é coisa de criança, enquanto elas brincam muitas coisas importantes ocorrem, como a assimilação e a apropriação da realidade humana: construção de hipóteses, elaboração de soluções para problemas e enriquecimento de personalidade. É brincando que ela, desde os primeiros meses, começa a se descobrir e a estabelecer uma relação com o mundo que a rodeia.

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Por sua vez, Andrigueto apresenta uma visão da EA pautada numa linha científica (de teste e construção de hipóteses pelo participante) voltada para a preservação ambiental de forma interessante. Ele coloca movimento, energia e apropriação do sujeito ecológico em seu próprio contexto social – o despertar, a curiosidade que faz o participante alcançar o que a prática transdisciplinar propõe. Requer a participação para a aquisição do conhecimento por meio de oficinas, estímulo à leitura e a uma consciência crítica, mas, principalmente, envolve o “aprender fazendo”. Para ensinar crianças, poder-se-ia dizer que o autor tomou emprestado de Piaget esse sentido. Suzana Pádua (1999) A educação ambiental surge como uma nova forma de perceber o papel do ser humano no mundo. Na medida em que parte de reflexões mais aprofundadas, ela é bastante subversiva. Na busca de soluções que alterem ou subvertam a ordem vigente, propõe novos modelos de relacionamentos, mais harmônicos com a natureza, novos paradigmas e novos valores éticos. Com uma visão holística e sistêmica, adotará posturas de integração e participação, em que cada indivíduo será estimulado a exercitar plenamente sua cidadania. A educação ambiental poderá aparecer como um despertar de uma nova consciência solidária a um todo maior. É com a visão do global e com o desejo de colaborar para um mundo melhor que se pode propor um agir local novo. Daí a importância de integrar conhecimentos, valores, capacidades que possam levar a comportamentos condizentes com este novo pensar. Em um mundo mais ético, todas as espécies têm direito à vida e a relações humanas mais justas. Suzana Pádua reúne diversos elementos já mencionados por outros autores e reforça o discurso da EA integradora, holística e sistêmica. A autora aborda o propósito educacional colocado na Política Nacional de EA, bem como uma visão ética da EA. Como trabalha com pesquisa e educação, é capaz de tratar a EA de maneira bem complexa, mas em um dizer simples, que envolve tanto conscientização como ação. Lúcia Legan (2007) Ecoalfabetização é a compreensão dos princípios básicos da sustentabilidade, sendo capaz de refleti-los na vida diária das comunidades humanas. Os seis pontos relevantes para a educação de uma cultura sustentável são: economia local, segurança alimentar, água, energia e tecnologia, espécies e ecossistema, comunicação e cultura. Lúcia Legan, australiana casada com brasileiro e radicada no Brasil, considera a EA uma prática diária. O cuidado com o meio ambiente está atrelado à sua maneira de viver, que é baseada no viver em comunidade e na produção de alimentos. Ela precisou buscar, e o fez muito habilmente, todos os elementos necessários à sobrevivência de uma família ou grupo de pessoas numa pequena ou média propriedade. A agricultura permanente e os recursos primordiais e necessários à manutenção da saúde e a uma forma simples e sustentável de conviver parecem ter sido considerados em sua descrição do aprender a ser ecologicamente instruído. De qualquer maneira, mesmo reunindo as visões dos diferentes autores para inferir a nossa própria, será difícil escaparmos dos rumos do nosso próprio caminhar ecológico. Assim, com base em conceitos e experiências com EA, podemos estimular a reflexão da educação ambiental no seguinte contexto: de curiosidade-descoberta-desafio. Assim como a ciência, a educação ambiental teve origem no processo de observação da natureza. Educar quanto ao meio ambiente não é exclusividade da sociedade moderna. Povos nativos educavam seus filhos para preservar os recursos naturais, tão necessários à construção de abrigo, à alimentação e às práticas espirituais e sociais. Porém, ao investigar o meio em que vivemos, percebeu-se que, nas últimas décadas, foram registradas mais acentuadamente na sociedade moderna mudanças nos padrões de resposta do meio, diferentes dos padrões naturais que seriam “esperados cientificamente” em ambientes controlados ou sem a interferência direta do homem. A educação ambiental surge em resposta aos problemas ambientais atuais, propondo a quebra de paradigmas e pautando-se pelo consumo consciente, pela inclusão social e pela defesa e preservação do meio ambiente. Ela desafia os modelos econômicos, sociais e ambientais tradicionais e insere-se em vários contextos e por intermédio de vários atores. Ainda não possui uma metodologia específica, estando em fase de construção. Em nível individual, a EA nasce de pequenos processos de sensibilização, na ressignificação do papel do ser humano e da natureza, no despertar para relações mais harmônicas e coletivas, em atividades na natureza, em salas de aula e fora dela, na mídia, em grupos e como política de Estado. É um processo educativo, por isso deve ser contínuo e permanente, inter e transdisciplinar.

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Aprofundando a abordagem O homem contemporâneo, ao investigar o meio em que vive, nas últimas décadas percebeu e registrou mais acentuadamente mudanças nos padrões de resposta do meio. As respostas “esperadas cientificamente” passaram a dar lugar a um ambiente de incertezas e catástrofes anunciadas. Embora a ciência e a tecnologia tenham progredido a passos largos, a educação moderna ainda não foi capaz de dar repostas fundamentais à essência humana que estabeleçam a vida de maneira permanente e saudável. Ao mesmo tempo em que evolui intelectualmente, o ser social, o Eu, se perde nos comportamentos e nos valores individualistas, tão cultuados na mídia. Perde o contato com a natureza e a noção intrínseca de dependência de todos os elementos e relações ecológicas que o mantêm vivo. Recorre a diversas categorias de profissionais – psicólogos, cientistas, médicos, advogados, etc. – a fim de obter as respostas que justifiquem suas atitudes e ações para que possa continuar degradando seu próprio meio. Mas, mesmo assim, sente-se sozinho e inseguro. A educação ambiental (EA) tem um papel único nesse processo. Ela não surge apenas em resposta aos problemas ambientais atuais. Resgatar a essência da vida, os valores que fazem sentido serem cultivados, os papéis cooperativos, a autoestima individual e coletiva (de comunidades tradicionais, grupos, professores) são alguns dos objetivos da EA dos novos tempos. É o tempo de vivenciarmos uma nova postura coletiva em prol da conservação do nosso ambiente. Saímos da noção do indivíduo para içar o conjunto. É o tempo de propormos uma onda coletiva do bem. Como começar? Olhando o passado e projetando o futuro com base nos conhecimentos que já alcançamos.

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Capítulo 4 Legislação ambiental brasileira no contexto do desenvolvimento sustentável Andréia Cassilha Andrigueto Não há como se falar em EA sem falar da evolução do marco jurídico ambiental no Brasil nos últimos 27 anos. Para a construção do que será apresentado, tomaremos por base a Constituição Federal do Brasil de 1988 e alguns de seus artigos, em especial o art. 225, em seu § 1o, inciso VI; a Lei no 9.394, de 20/12/1996, que estabelece as diretrizes e as bases da educação nacional; a Lei no 9.795, de 27/04/1999, que dispõe sobre a educação ambiental e institui a Política Nacional de Educação Ambiental; e, por fim, o Decreto no 4.281, de 25/06/2002, que regulamenta esta última lei. Essas são as bases norteadoras de nosso estudo. Limitamos nosso escopo, neste capítulo, aos aspectos ligados intrinsecamente ao ensino. Deixaremos de fora, por ora, dessa análise a relação da EA com o novo Código Florestal, Lei n. 12.651, de 25/05/2012, e a Lei n. 12.305/2010, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), apresentados em capítulos mais à frente. Para que a questão ambiental fosse incorporada à economia e à nova sociedade que emergia com o fim do regime militar, o Brasil precisou reformular o tratamento dado ao meio ambiente. Assim, a Constituição Federal Brasileira de 1988 previu avanços em relação à questão ambiental, definindo direitos e deveres. Em seu artigo 225, está claro que proteger o meio ambiente é dever não só do Estado, mas de todos os cidadãos do país (Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: ). Neste capítulo apresentaremos inicialmente a Carta Maior, que rege nosso arcabouço legal, para depois discorrer sobre leis específicas e ordinárias criadas para tratamento e regulamentação de temas particulares, relacionadas ao meio ambiente. O objetivo deste capítulo não é discorrer sobre legislação, apenas indicar os dispositivos legais que o professor pode utilizar para embasar as suas práticas.

Constituição Federal

Capítulo I Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência; O que nos fala a Constituição Federal acerca das competências dos entes federativos União, Estados, DF e Municípios: Art. 21. Compete à União: XIX - instituir sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos e definir critérios de outorga de direitos de seu uso; Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: IV - águas, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão; Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: VI - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas; VII - preservar as florestas, a fauna e a flora; Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: V - produção e consumo;

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VI - florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição; VII - proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico; VIII - responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico; IX - educação, cultura, ensino e desporto; Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: III - promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos; §1º - A legitimação do Ministério Público para as ações civis previstas neste artigo não impede a de terceiros, nas mesmas hipóteses, segundo o disposto nesta Constituição e na lei. Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação (redação dada pela Emenda Constitucional no 42, de 19/12/2003.) Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente. Todos os artigos e incisos citados referem-se a objetos tratados pela educação ambiental e justificam por si sós sua validade como ferramenta de conscientização e sensibilização da sociedade civil e dos governos. Porém, de todos os artigos, o que trata mais especificamente da questão ambiental e de sua ligação direta com o ensino sem dúvida é o art. 225, vejamos o porquê.

Capítulo II – Do Meio Ambiente Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e as futuras gerações. § 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e à manipulação de material genético; III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente; VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais à crueldade. § 2º - Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei. § 3º - As condutas e as atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

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§ 4º - A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais. Infelizmente o bioma Cerrado ainda não foi contemplado na Constituição Federal, e é por isso que a Rede de Sementes do Cerrado, por intermédio do Projeto Semeando o Bioma Cerrado, se preocupa em fortalecer a ideia de semear o bioma Cerrado. Entendemos que para preservar é preciso educar, e para ensinar é preciso conhecer o bioma em que vivemos. A educação ambiental é parte complementar e fundamental do processo de defesa da vida desse bioma tão rico, diverso e instigante. Cabe-nos promover sua defesa por meio do ensino. O fomento da educação ambiental no ensino formal (nas escolas e nos currículos escolares) e a conscientização pública, seja ela não formal (fora do ambiente escolar) ou informal (na trajetória de vida dos que aprendem), são aqui colocados como forma de preservar o meio ambiente. No ambiente escolar, fora dele ou ao longo de suas vidas, pessoas, grupos e instituições podem auxiliar a preservar o bioma Cerrado conhecendo, ensinando, multiplicando o que aprende. Continuando nosso caminhar pelas bases jurídicas da questão ambiental e da defesa do Cerrado, podemos mencionar a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e as bases da educação nacional. Antes de tudo, deve-se ter em mente que educação ambiental é um processo, apresentado recentemente dessa forma no documento final das Nações Unidas na Conferência sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio +20. A palavra educação aparece 33 vezes no texto, no entanto educação ambiental não aparece nenhuma vez (disponível em: ; ). Entendemos que isso se deve à maneira intrínseca como a educação ocorre no tripé do desenvolvimento sustentável (DS) defendido pelas Nações Unidas. Outro olhar destaca o fortalecimento de uma corrente de educação para a sustentabilidade. Inserida ou não no paradigma da sustentabilidade, a educação não poderia estar dissociada das bases ambiental, econômica e social do DS. De todo modo educar só faria sentido dentro de uma lógica mais sistêmica, integrada.

Título I – Lei de Diretrizes e Bases Da Educação (LDB) Apresentaremos a seguir os arts. 1º, 2º, 3º, 8º e 9º da Lei nº 9.394/1996, pois são eles que embasam o entendimento inicial do que é a educação ambiental nas escolas, que, como vimos, é uma parte do processo educacional, mas não o único. Art. 1º A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais, nas organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais. § 1º Esta Lei disciplina a educação escolar, que se desenvolve, predominantemente, por meio do ensino, em instituições próprias. § 2º A educação escolar deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à prática social.

Título II – Dos Princípios e Fins da Educação Nacional Art. 2º A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Art. 3º O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I - igualdade de condições para o acesso e a permanência na escola; II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber; III - pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas; IV - respeito à liberdade e apreço à tolerância; V - coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;

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VI - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais; VII - valorização do profissional da educação escolar; VIII - gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino; IX - garantia de padrão de qualidade; X - valorização da experiência extraescolar; XI - vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as práticas sociais.

Título III – Da Organização da Educação Nacional Art. 8º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão, em regime de colaboração, os respectivos sistemas de ensino. Art. 9º A União incumbir-se-á de: IV - estabelecer, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, competências e diretrizes para a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio, que nortearão os currículos e seus conteúdos mínimos, de modo a assegurar formação básica comum; V - coletar, analisar e disseminar informações sobre a educação; VII - baixar normas gerais sobre cursos de graduação e pós-graduação.

Política Nacional de PNEA – ressaltando princípios e objetivos Tendo estabelecido o marco legal, pela constituição e a LDB, podemos apresentar a Política que dispõe sobre Educação Ambiental no Brasil, Lei no 9.795, de 27 de abril de 1999. Art. 1º Entende-se por educação ambiental os processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade. Art. 4º São princípios básicos da educação ambiental os enfoques humanista, holístico, democrático e participativo; a concepção do meio ambiente em sua totalidade, considerando a interdependência entre o meio natural, o socioeconômico e o cultural, sob o enfoque da sustentabilidade; o pluralismo de ideias e concepções pedagógicas, na perspectiva da inter, da multi e da transdisciplinaridade; a vinculação entre a ética, a educação, o trabalho e as práticas sociais; a garantia de continuidade e a permanência do processo educativo; a permanente avaliação crítica do processo educativo; a abordagem articulada das questões ambientais locais, regionais, nacionais e globais; o reconhecimento e o respeito à pluralidade e à diversidade individual e cultural. Como objetivos fundamentais da educação ambiental, o art. 5o da lei que institui a Política Nacional de Educação Ambiental estabelece: Art. 5º O desenvolvimento de uma compreensão integrada do meio ambiente em suas múltiplas e complexas relações, envolvendo aspectos ecológicos, psicológicos, legais, políticos, sociais, econômicos, científicos, culturais e éticos; a garantia de democratização das informações ambientais; o estímulo e o fortalecimento de uma consciência crítica sobre a problemática ambiental e social; o incentivo à participação individual e coletiva, permanente e responsável, na preservação do equilíbrio do meio ambiente, entendendo-se a defesa da qualidade ambiental como um valor inseparável do exercício da cidadania; o estímulo à cooperação entre as diversas regiões do País, em níveis micro e macrorregionais, com vistas à construção de uma sociedade ambientalmente equilibrada, fundada nos princípios da liberdade, igualdade, solidariedade, democracia, justiça social, responsabilidade e sustentabilidade; o fortalecimento da cidadania, autodeterminação dos povos e solidariedade como fundamentos para o futuro da humanidade. Segundo a Lei no 9.795/1999, a educação ambiental é um componente essencial e permanente da educação nacional, devendo estar presente, de forma articulada, em todos os níveis e modalidades do processo educativo, em caráter formal e não formal (art. 2o), como também preceitua a Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Apesar de a política que discorre sobre a EA se limitar a esses dois aspectos do processo educativo, é na sua trajetória de vida que os sujeitos, que aqui chamaremos de “sujeitos ecológicos” – uma determinação atribuída por Laís Mourão Sá (2005), constroem seu processo educativo. Também é no contato com o outro Zanetti

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(2009) que o processo de aprendizado ecológico é erigido. Portanto, também existe um caráter informal do processo de educação ambiental, vivenciado socialmente por meio das relações humanas. Embora estimulantes e desafiadores, não levamos em conta os processos informais na construção do ensino da EA, limitando-nos a abordá-la em seus aspectos formais, conforme os currículos escolares. E isso precisa mudar, devemos perguntar ao aluno sobre sua bagagem ambiental, o que carrega de aprendizado pelas experiências anteriores aquele momento de ensino. A educação ambiental, no atual processo de ensino, não é implementada como disciplina específica no currículo dos ensinos fundamental e médio. Entretanto, nos cursos de pós-graduação e extensão e nas áreas voltadas ao aspecto metodológico é facultada sua criação como disciplina, o que permite sua análise não apenas nos aspectos descritivos, mas metodológicos, de implementação. Para concluir, ha outras leis importantes a serem pesquisadas: Lei de Crimes Ambientais; Legislação sobre Sementes e Mudas Nativas – Instrução Normativa no 56 (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento); Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Pnapo).

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Capítulo 5 A transversalidade da educação ambiental com outras disciplinas Mery-Lucy do Vale e Souza As problemáticas sociais são integradas na proposta dos Parâmetros Curriculares Nacionais como temas transversais. Não constituem novas áreas, mas um conjunto de temas que aparecem transversalizados nas áreas definidas, permeando a concepção, os objetivos, os conteúdos e as orientações didáticas de cada área no decorrer de toda a escolaridade obrigatória. A transversalidade pressupõe um tratamento integrado das áreas e um compromisso das relações interpessoais e sociais escolares com as questões envolvidas nos temas das disciplinas a fim de que haja coerência entre os valores experimentados na vivência que a escola propicia aos alunos e o contato intelectual com tais valores. Segundo o Ministério da Educação, todos os temas transversais (ética, saúde, meio ambiente, pluralidade cultural, orientação sexual, trabalho e consumo) destinados a alunos do 2o ao 9o ano são de abrangência nacional; podem ser compreendidos por crianças na faixa etária proposta; permitem que os alunos desenvolvam a capacidade de se posicionar perante questões que interferem na vida coletiva; podem ser adaptados à realidade de cada região. A ideia de que a matemática, por exemplo, é uma matéria difícil, reduzida a contas e fórmulas, provoca o distanciamento de muitos alunos dessa ciência fundamental. Nas oficinas propostas pelo Projeto Semeando o Bioma Cerrado as atividades encorajam a exploração de uma variedade de ideias matemáticas relativas a números, medidas e geometria, conservando o prazer e a curiosidade. Para isso, aproveitamos situações cotidianas significativas, como jogos que envolvem contagem e operações aritméticas, que possibilitam desenvolver o raciocínio lógico. Essa metodologia é usada para contextualizar a educação ambiental em todas as disciplinas, utilizando a filosofia para estimular a curiosidade e as habilidades, pois a educação infantil é um momento especialmente favorável para estimular o pensamento filosófico. Ao permitir que os alunos desenvolvam um posicionamento perante questões que interfiram na vida coletiva, a educação ambiental estimula nesses alunos uma postura cidadã, ou seja, um posicionamento crítico e respeitoso em relação a seus compromissos com o meio em que vivem. Capacitar em educação ambiental, independentemente do público-alvo, é, em um primeiro momento, levar o indivíduo a repensar sua relação com o meio a fim de garantir mudanças de atitude em prol da melhoria da qualidade de vida de sua sociedade. Para o mundo alcançar a desejada sustentabilidade é preciso mudança comportamental. Mas para que essa mudança ocorra é fundamental que o indivíduo se reconheça como parte integrante do ambiente, sensibilize-se com os problemas e sinta-se responsável por eles. Mais do que direitos e deveres, cidadania ecológica implica compromisso. O sentido de cidadania deve estar presente sempre, norteando decisões, atitudes e ações concretas.

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Educação humanitária Se quisermos mudar atitudes, é preciso que as pessoas sejam sensibilizadas para estar conscientes das sensações e dos sentimentos de outros seres, aumentando assim a probabilidade de elas pensarem sobre o efeito de seus atos. A educação humanitária não trata apenas da obtenção de conhecimento, mas também do desenvolvimento de atitudes positivas e de zelo. Isso é particularmente importante no que diz respeito ao bem-estar dos animais, pois esta é uma área frequentemente negligenciada em muitos sistemas educativos. Ao adotar atitudes de zelo na infância, os alunos agirão da mesma forma ao longo da vida e serão capazes de tomar decisões baseadas na informação e na compaixão. O termo “educação humanitária” é habitualmente aplicado ao ensino relacionado a tratamento adequado e respeito pelos animais. Entretanto, a definição verdadeira estende-se à compaixão com animais, pessoas e o meio ambiente. É importante entender que o respeito pelos animais e pelas pessoas está interligado, pois não faz sentido proteger espécies em extinção se seu habitat não estiver sendo protegido e se as pessoas não forem incentivadas a se conscientizar das necessidades dessas espécies. A educação humanitária é importante para desenvolver cidadãos responsáveis, pois torna as pessoas sensíveis às sensações/sentimentos de outros seres e, portanto, provavelmente mais conscientes do impacto de suas ações sobre os outros. Ela pode ser encarada como um investimento, pois os custos de uma sociedade indiferente e negligente podem ser imensos. A manutenção dos sistemas judiciário e penitenciário é cara. Existe uma conexão entre crueldade com animais e crueldade com seres humanos? Os estudos revelam que sim. Há uma considerável quantidade de pesquisas (nas sociedades ocidentais) que relacionam maus-tratos a crianças com maus-tratos a animais. A teoria é que em lares onde animais são abusados ou negligenciados há probabilidade de ocorrer também abuso e negligência com crianças. Diversos estudiosos defendem que para interromper o ciclo de maus-tratos é fundamental uma legislação rigorosa para os casos de crueldade com animais. Contudo, proponentes da educação humanitária sugerem que sejam adotadas nas escolas estratégias para mudar o comportamento das pessoas em relação a outros seres, empregando para isso valores morais e filosóficos que sempre guiaram e moldaram a estrutura e o funcionamento das famílias. São esses os valores que conformam nosso comportamento em face de outros seres. Assim, a educação humanitária pode ser a forma de interromper quase totalmente o ciclo de violência, podendo ser mais efetiva em longo prazo que a utilização de legislações que não são cumpridas. Embora a educação humanitária se estenda ao público em geral, ela está direcionada principalmente aos jovens, pois é nesta fase do desenvolvimento humano que se formulam e se questionam conceitos e atitudes. A educação humanitária formal nas escolas é especialmente importante, pois contribui para o desenvolvimento de atitudes compassivas nas futuras gerações de cidadãos. A investigação indica haver uma ligação entre a socialização e as experiências da criança e suas subsequentes atitudes e comportamentos. A educação humanitária beneficia desde crianças até adultos, tendo em vista que os ajuda a desenvolver uma dimensão ética de pensamento que pode ser aplicada em situações de trabalho presentes ou futuras, como no caso da introdução de formação em bem-estar animal nos cursos de medicina veterinária/zootecnia. A educação humanitária pode ser introduzida por meio da promoção e da divulgação de vídeos, histórias, palestras e conferências relacionadas; do desenvolvimento de ações de divulgação, educação e sensibilização; do desenvolvimento de programas e materiais de ensino para professores, estudantes e profissionais de apoio da escola; da educação informal; da colaboração com organizações nacionais e internacionais em projetos que visem a essa modalidade de educação. Elizabeth MacGregor, gerente de Desenvolvimento da WSPA – Sociedade Mundial de Proteção Animal, ressalta que “a formação de educadores humanitários contribui de forma decisiva para disseminar no ambiente escolar o conhecimento, a compreensão, as habilidades, as atitudes e os valores necessários à promoção do respeito a todas as formas de vida”. Segundo ela, “valores como compaixão, respeito, tolerância, solidariedade e empatia em relação a outros seres são fundamentais para a formação de cidadãos gentis, atenciosos, cuidadosos e amorosos, contribuindo, assim, para quebrar o ciclo da violência, dando lugar a uma sociedade mais justa e harmoniosa – uma sociedade que respeite a vida na sua totalidade”.

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Alcance do cultivo sólido – Criação da espaçonave Com a posse do conhecimento é ampliada a percepção do planeta Terra como uma espaçonave girando no universo e onde não existem passageiros, pois todos nós somos tripulantes. É bastante procedente a observação feita por Ernest Callenbach, do Centro de Ecoalfabetização, de que “os problemas ecológicos que estamos enfrentando são problemas de valores. É difícil mudar os valores dos adultos, mas nota-se que as crianças nascem com certos valores intactos, ou seja, o sentimento de espanto ou reverência e com afinidade com a natureza”, o que o biólogo David W. Orr chama de *“biofilia”. Ele afirma que todos nós temos essa capacidade, mas ela é mais acentuada nas crianças, e, quando pequenas, essa capacidade mantém-se inalterada. David W. Orr vai além, afirmando que “quando bem nutrida, a biofilia pode ser transformada em alfabetização ecológica e acabar produzindo uma sociedade mais sustentável”. Em longo prazo, a educação para a sustentabilidade representa a escolha de pensar além da sobrevivência pessoal e de valorizar todas as formas de vida na Terra. A decisão de focalizar certos princípios ecológicos – aqueles pelos quais a natureza sustenta a vida – é também uma escolha de valores.

*A biofilia é o amor à natureza. Este termo foi popularizado por Edward Osborne Wilson, num livro com o mesmo nome publicado pela Harvard University Press em 1984. Em seu livro, Wilson descreve a biofilia como uma tendência natural a voltarmos nossa atenção às coisas vivas.

Metodologia indicada Com o uso da ecopedagogia e de outras metodologias diferenciadas que valorizam não só o meio físico, mas a “essência das coisas”, o público-alvo do Projeto Semeando o Bioma Cerrado é sensibilizado bem mais além das técnicas que envolvem o sistema de produção das sementes. A educação ambiental trabalhada no projeto está relacionada à prática de tomadas de decisões, promovendo brincadeiras para o aprender a fazer fazendo, conduzindo o ser humano à ética e à construção de valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente a partir da preservação do bioma Cerrado.

Estratégias transversais As séries devem ser subdivididas para que os conteúdos curriculares sejam trabalhados em oficinas específicas, nas quais os alunos vivenciarão atividades aplicando a transversalidade da educação ambiental em ações práticas de reconhecimento, preparação do solo, plantio, observação e, sobretudo, reflexão com a utilização de técnicas pedagógicas associadas ao lazer, promovendo ao mesmo tempo aprendizado e brincadeiras.

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Exemplos para as séries iniciais: estudos práticos específicos e direcionados para cada turma de acordo com os projetos realizados pelos professores de cada disciplina. a) Animais – tamanho, peso, cor, cobertura (couro, pelo, penas, escamas), número de patas/pés, boca, dentes, o que comem, onde vivem, como se reproduzem e nascem, como se locomovem, diferenças entre macho e fêmea e utilidade para o homem. Horta orgânica pedagógica – produção de adubo orgânico pelo aproveitamento do lixo, compostagem, minhocário, construção de canteiros, semeadura, colheita de verduras e legumes, diferença de cores e textura das plantas e irrigação; conhecimento desde a semeadura até a colheita; produção de alimentos e controle do equilíbrio ecológico para melhorar a qualidade de vida e preservar a natureza na escola e em seu entorno.

b)

c) Pomar e tipos de árvores – ornamentais, nativas, reflorestamento, exóticas, vegetação natural e cultivada; exame de folhas, caules, frutas, sementes, raízes; degustação de frutas da época e cuidados no cultivo orgânico, cuidados para preservar a Terra.

Sons – identificação dos diferentes sons produzidos por animais, pássaros, vento; iniciação a números (unidade, dezena, dúzia, litro, tamanho, peso) e letras (placas com nomes de animais e aves).

d)

e) Brinquedos – de acordo com o centro de interesse da turma, construção de brinquedos com materiais descartados (madeira ou material natural) e com a reutilização de materiais descartados como lixo. f) Palestras/vídeos – integração homem x natureza – vantagens e desvantagens da vida no campo e na cidade; interdependência das duas; alimentos, animais, aves e área de preservação ecológica e ambiental. g) Lazer – teatro ambiental, dança, apresentação musical, pinturas, desenho.

Referências BRASIL. Lei da Educação Ambiental. Política Nacional de Educação Ambiental. Lei no 9.795, de 27/04/1999. Disponível em: . BRASIL. Lei Lei de Diretrizes e Bases. Lei no 9.394, de 20/12/1996. Estabelece as diretrizes e as bases da educação nacional. CAPRA, Fritjof et al. Alfabetização ecológica. Prefácio à edição brasileira: Mirian Duailibi. Tradução: Carmen Fischer. São Paulo: Cultrix, p. 9-11, 312 p, 2006.

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Capítulo 6 Capacitação de professores e comunidades Sensibilizando professores para a corresponsabilidade socioambiental Lêda Bhadra Bevilacqua Toda proposta de formação de educadores ambientais trabalhada pela AAF, em parceria com a Escola da Natureza, privilegia a abordagem socioambiental, cujos princípios estão definidos na Política Nacional de Educação Ambiental, por meio da Lei n. 9795/1999, na Política Distrital de Educação Ambiental, por meio da Lei n. 3233/2006, nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), na Carta da Terra e nas Metas para o Milênio, estabelecidas pela ONU. Esses documentos orientam para a formação de Programas de Educação Ambiental nos âmbitos federal e local, por meio da articulação interinstitucional entre instituições governamentais e não governamentais. Para essa capacitação foram estabelecidas diretrizes visando à solução de problemas práticos da realidade local escolar, contextualizando ao Distrito Federal, por meio de diagnósticos e avaliações das práticas em educação ambiental aplicadas nas instituições públicas de ensino, tendo como referência as experiências da Escola da Natureza – Centro de Referência em Atividades de Educação Ambiental da Secretaria de Educação do DF. As ações realizadas foram voltadas aos anseios de professores de determinadas escolas que buscam na Escola da Natureza suporte para projetos que envolvam toda a comunidade escolar em defesa dos parques ecológicos da região, situados próximos as suas instituições de ensino, que podem ser transformados em Centros de Referência em Educação Ambiental, a exemplo da própria Escola da Natureza. Nesse sentido, a capacitação desses professores está focada na busca da instrumentalização e da sensibilização, por meio de oficinas temáticas, como modelos de atividades a serem desenvolvidas com seus alunos, um desdobramento de uma natural parceria com quem está realmente disposto a contribuir com a mudança de conduta e com o olhar sensível para a natureza.

Professores do Centro de Ensino Especial 01de Santa Maria-DF, integrados ao Projeto Semeando o Bioma Cerrado

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O mérito das parcerias entre a AAF, a Rede de Sementes do Cerrado, a Escola da Natureza, o Núcleo de Educação Ambiental da Faculdade de Pedagogia da UnB, entre muitas outras instituições, é que contempla a abordagem social da educação ambiental, centrada exatamente em promover uma nova postura do cidadão em relação ao ambiente local (leitura da realidade onde vive) e global. O que se pretende construir por meio desse processo formativo é o cidadão ético e ambientalmente comprometido, numa perspectiva de conhecimento que valoriza o trabalho coletivo, a transdisciplinaridade e o respeito ao ritmo e às diferenças individuais. Dessa forma, fomenta-se o intercâmbio com organizações locais envolvidas com projetos de educação ambiental; fortalece-se o aperfeiçoamento profissional como mecanismo que permita consolidar o processo em rede de formação em educação ambiental. As atividades oportunizam conhecimentos acerca de temas relacionados a preocupações locais e mundiais, como: sustentabilidade ecológica, diversidade cultural, resíduos sólidos, energia e suas fontes, recursos hídricos, agricultura orgânica, bioma Cerrado, acrescentando a sensibilização por meio da arte, da corporeidade e da trilha sensitiva, tendo como base o meio ambiente, seu contexto sócio-histórico e os valores culturais da população, privilegiando o processo de construção do conhecimento. Cada prática faz parte de um processo, não sendo um fim em si mesma, e representa um instrumento por meio do qual as questões específicas locais são levantadas e inseridas em um contexto mais amplo, como resgate de uma visão mais integrada da realidade, com destaque para a abordagem socioambiental. Nesse contexto, o ambiente torna-se um espaço de formação e informação no qual a aprendizagem dos conteúdos necessariamente favorece a inserção dos participantes no dia a dia das questões sociais e em um universo cultural maior. Os participantes são estimulados nas dimensões da mente e do corpo, das emoções e dos sentimentos, integrando-se ao meio. Acreditamos que a formação oferecida oportuniza os diversos segmentos da comunidade escolar a participarem de temas diversificados, relacionando-os ao cotidiano vivenciado nas instituições de ensino, permitindo o exercício da cidadania vinculado à ética ecológica e à corresponsabilização social. Para isso, torna-se necessária a formação de professores, bem como dos integrantes da comunidade escolar e de seus alunos, de forma que cresçam juntos nesse novo contexto de ensino e aprendizagem e dessa forma se tornem agentes formadores em suas localidades.

Metodologia A exemplo das atividades voltadas às crianças, também para os professores a metodologia adotada é a ecopedagogia, conceito criado por Francisco Gutiérrez, pesquisador do pensamento de Paulo Freire, seguindo os princípios da Carta da Terra, documento anunciado em março de 2000 pela Unesco e adotado pela ONU desde 2002 com o mesmo valor da Declaração dos Direitos Humanos. A Carta da Terra foi aprovada por um fórum da sociedade civil, com representantes de todos os povos, e por isso conseguiu o status de documento da “cidadania planetária”. A ecopedagogia trabalha com a fundamentação teórica dessa “cidadania planetária”, cuja ideia é dar sentido para a ação dos homens como seres vivos que compartilham com as demais vidas a experiência do planeta Terra. Trata-se da pedagogia orientada para a aprendizagem do sentido das coisas a partir da vida cotidiana, ou seja, constitui-se em um verdadeiro movimento político e educativo cujo objetivo é mudar as atuais relações humanas, sociais e ambientais. Assim, oferece uma educação que desenvolve, prioritariamente, processos reflexivos, criativos e críticos voltados para o desenvolvimento da autonomia, da criatividade e da solidariedade. A ecopedagogia e as abordagens metodológicas da educação integral orientam as atividades dessa formação. Tratase de uma abordagem vivencial e construtivista que se sustenta em processos participativos e emancipatórios e no compartilhamento de significados e visão de mundo. Cada encontro dos participantes integra três momentos indissociáveis: as práticas de corporeidade – sensibilidade e movimentos para enraizar ideias; apresentação de conteúdos teóricos para gestão sustentável e exploração criativa de conceitos pedagógicos.

Educação inclusiva Mery-Lucy Souza A educação especial é uma educação organizada para atender específica e exclusivamente alunos com determinadas necessidades especiais. De modo geral, a educação especial lida com fenômenos de ensino e aprendizagem que não têm ainda encontrado espaço no sistema de educação regular, mas nas últimas décadas vêm entrando na pauta do movimento de educação inclusiva. Historicamente, a educação especial vem lidando

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com a educação e o aperfeiçoamento de indivíduos que ainda não se beneficiaram dos métodos e procedimentos usados pela educação regular. Considerando-se que o termo “educação especial” denomina tanto uma área de conhecimento quanto um campo de atuação profissional, e que no Brasil se inclui em educação especial desde o ensino de pessoas com deficiências, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação, passando pelo ensino de jovens e adultos até o ensino de competências profissionais; considerando-se que o sistema regular de ensino precisa ser adaptado e pedagogicamente transformado para atender de forma inclusiva também as questões ambientais; considerando-se a necessidade de tornar reais os requisitos para que a escola seja verdadeiramente inclusiva, e não excludente; considerando-se que a educação especial se desenvolve em torno da igualdade de oportunidades, em que todos os indivíduos, independentemente de suas diferenças, deverão ter acesso a uma educação capaz de responder a todas as suas necessidades; considerando-se o pressuposto que aprender é fazer e que as oficinas de educação ambiental da AAF privilegiam o “aprender a fazer fazendo” como um elemento pedagógico capaz de facilitar a estruturação de um trabalho com condições propícias para a construção do conhecimento, viabilizando a descoberta pelo próprio aluno; A AAF, em parceria com a Escola da Natureza, aceitou o desafio, a partir de um trabalho piloto, de levar as questões ambientais ao Centro de Ensino Especial de Santa Maria (SEDF) com instrumentos pedagógicos que possam contribuir para a inclusão desses alunos e a difusão da informação sobre a importancia da preservação do bioma Cerrado, por entender que essa preservação pode começar com pequenas atitudes individuais do ser humano, independentemente de suas limitações. Mais uma vez a ecopedagogia foi a metodologia utilizada com sucesso, por trabalhar com a fundamentação teórica da “cidadania planetária”, cuja ideia é dar sentido para a ação dos homens como seres vivos que compartilham com as demais vidas a experiência do planeta Terra a partir da vivência cotidiana, facilitando processos reflexivos, criativos e críticos que, mesmo nas limitações pessoais, contribuíram para o desenvolvimento da autonomia, da criatividade e, principalmente, da solidariedade. As oficinas propostas, respeitando as limitações, permitiram que os alunos fossem estimulados nas dimensões da mente e do corpo, nas suas emoções e sentimentos, e se percebessem como sujeitos ativos da própria aprendizagem, integrando-se ao meio. Referências: FREIRE, Paulo. Educação e mudança. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979. GIORDAN, André; VECCHI, Gerard de. As origens do saber: das concepções dos aprendentes aos conceitos científicos. Porto Alegre: Artmed, 1996. portal.mec.gov.br/index.php?

Fortalecendo comunidades O desenvolvimento integral de crianças e jovens não pode ser visto como responsabilidade apenas da escola e da família. Sem dúvida, quanto maior for o envolvimento da comunidade maiores são as possibilidades de a educação se tornar integral e inclusiva. Porém, é necessário que todo o entorno da escola se torne efetivamente um território educador, permitindo que os alunos aprendam a toda hora, em diferentes lugares e com as mais variadas pessoas, cada qual contribuindo com uma parcela da sua formação e/ou informação. Esta tem sido a missão da AAF e da Rede de Sementes do Oficina de aproveitamento culinário de frutos do Cerrado Cerrado com as comunidades da área de abrangência do Projeto Semeando o Bioma Cerrado, buscando o comprometimento de lideranças locais na busca de soluções de problemas ambientais que colocam em risco a sustentabilidade planetária a partir de uma visão global com ações locais.

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Sensibilização para recuperação de áreas degradadas Sensibilizar moradores de áreas rurais para o melhor conhecimento do potencial natural do local em que vivem e para cuidados especiais em áreas de nascentes foi o desafio do Projeto Semeando o Bioma Cerrado, da Rede de Sementes do Cerrado, que esteve na região do Lago Oeste, Sobradinho-DF e na Cidade da Fraternidade, Alto Paraíso de Goiás realizando cursos práticos e teóricos sobre a grande importância dos recursos hídricos dessas regiões, apresentando ainda técnicas conservacionistas e atitudes individuais que permitam a estas comunidades conservar suas nascentes e, se necessário, recuperar suas áreas degradadas com plantios orientados.

Conhecer para proteger O objetivo é mais que capacitar pessoas em simples procedimentos de recuperação de áreas degradas, mas, sim, fortalecer um movimento baseado em valores para a transformação do cidadão na sua relação com a natureza. As equipes de educação ambiental da Associação dos Amigos das Florestas (AAF) escolhem para os cursos que ministram temas entre os objetivos da Carta da Terra, tais como: “Conheça mais sobre o lugar em que vive”, “Utilize com cuidado o que a natureza oferece”. Esses cursos podem ter continuidade se inseridos à Agenda 21 de escolas dessas comunidades, pois a proteção das nascentes dessas regiões sem dúvida precisa ser fortalecida. Entre os diversos recursos que a natureza disponibiliza, a água é o mais essencial à vida do homem e de todas as espécies de plantas e animais que habitam as várias partes do nosso planeta, é, indiscutivelmente, um recurso natural de altíssimo valor econômico, estratégico e social, sendo considerada também um importante regulador do clima na Terra. A construção de horta comunitária, com o envolvimento, inclusive, de igrejas, aproximou pessoas, estimulou o respeito às diferenças de crenças e fortaleceu objetivos coletivos de produção de alimentos, de segurança e, principalmente, de manutenção da qualidade de vida que ainda desfrutam por estarem mais próximos da natureza. A capacitação de membros da comunidade não deve ser vista como isolada da escola, e sim integrada a ela, com permanentes trocas de saberes e fazeres entre todos. Com oficinas voltadas à comunidade, o que se pretende é formar multiplicadores da mensagem ecológica e aproximar professores, alunos, pais e lideranças como uma forma positiva de se estabelecer uma rotina de aprendizagem e de respeito à natureza, com abordagem multidisciplinar baseada na experiência e na participação do coletivo.

Alfabetização ecológica: ABCerrado Profa. Dra. Rosângela Azevedo Corrêa A ecologia surgiu no campo das ciências da vida como uma área voltada para o estudo das relações entre os seres vivos. Daí nasceu também a noção de ecossistema, quando se colocou a necessidade de não ver os seres vivos de modo isolado, mas perceber as interações que ocorrem nas trocas de energia e matéria entre o meio e os seres vivos, formando ciclos e fluxos contínuos. Aplicada às ciências humanas, esta noção permite enfocar a relação entre os processos culturais e as condições Prof. Rosângela prepara Educadores para a alfabetização ecológica ambientais neles envolvidas, mostrando a importância dos processos criativos da cultura que orientam as relações entre humanos e o ambiente que habitam, o seu oikos, palavra grega que significa o espaço ocupado e o modo de ocupá-lo. No campo da psicologia, por exemplo, a noção de ecologia permitiu ver a pessoa humana como um conjunto de dimensões e funções psíquicas que integram os níveis físico, emocional, mental e espiritual numa totalidade complexa.

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Aplicada a visão transformadora da educação em situações de crise, a noção de ecologia aponta para a busca de compreensão das causas que geram o desequilíbrio nas relações entre os seres vivos, incluindo os comportamentos destrutivos dos seres humanos. Como fundamento para uma ação educativa, essa compreensão permite identificar os pontos em que os modos humanos de compartilhar o espaço habitado com os demais seres vivos foram desviados do equilíbrio do todo. Esses modos humanos desorganizadores incluem, por exemplo, as formas como lidamos com as águas, a agricultura, a infraestrutura das cidades, a extinção das espécies vegetais e animais, inclusive a própria saúde humana. Se a educação for encarada como uma relação humana voltada para promover a autoeducação e a cidadania entre aqueles que compartilham de uma mesma situação socioambiental, poderemos então falar de um trabalho de ecologia humana e dizer que toda educação é uma ação ecológica. A visão ecológica, portanto, implica rever a nossa ética, isto é, valores que orientam as nossas ações pessoais e coletivas, aquilo que julgamos certo e errado, o que valorizamos ou desprezamos em nós mesmos e na natureza. Uma maneira de repensarmos nossas ações, especialmente aquelas que vivemos nos grandes centros urbanos, é conhecer e aprender com outras culturas diferentes da nossa o que no passado e também no momento presente elas criaram e ainda preservam em termos de modelos ecológicos de compartilhamento do espaço ambiental em perfeito equilíbrio dinâmico, dentro da preocupação de proteger a vida. Ética e ecologia são inseparáveis, como mostram, por exemplo, as sociedades nas quais a natureza é alvo de uma reciprocidade em que os sentimentos, os afetos e os gestos humanos se dirigem aos demais seres vivos, tidos também como portadores de subjetividade.

Professores da rede de ensino do DF sendo capacitados na Escola da Natureza para semear o bioma Cerrado

Nas sociedades nas quais existe respeito recíproco e solidariedade entre humanos, os mesmos valores são transpostos para as relações de trabalho ou para qualquer outra atividade em que existam trocas recíprocas entre humanos e natureza. É claro que onde domina a violência e a exploração egoísta do mundo e do outro não poderá existir equilíbrio ecológico. Por isso, a questão ética, a mudança de valores, o criar interiormente as condições afetivas e racionais para novos valores é um ponto fundamental da educação ambiental. Não podemos separar a sociedade da natureza como se fossem duas coisas distantes e desconectadas, pois a natureza não é um grande supermercado à nossa disposição para satisfazer os nossos desejos, afinal, nossas vidas dependem da natureza porque fazemos parte dela. Criamos necessidades artificiais representadas pela mídia, que tenta nos vender felicidade por meio do “ter”, e acreditamos que é assim que as coisas devem ser; contaminamos nossos sentimentos e percepções, assim como nossas relações com a família, com o território, com a comunidade e com nossa história pessoal e comunitária. Hoje, todos podemos reconhecer que existem inumeráveis problemas socioambientais urbanos e rurais no mundo inteiro, como crescimento desordenado e a enorme pegada ecológica por meio da produção de alimentos em larga escala, insumos externos como água, lixo, energia, extração de matérias-primas, impermeabilização

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do solo, emissão de gases, etc. O discurso dos governos, especialmente no Brasil, é que precisamos crescer para que possamos nos tornar um país desenvolvido, mas é válido crescer a qualquer preço? De acordo com Sachs (1988), não se trata de crescer menos ou negar o desenvolvimento de um país, mas reconhecer que o limite é uma categoria necessária para planejar as ações futuras. Portanto, temos de considerar os aspectos sociais, econômicos, ecológicos, espaciais, culturais e políticos no planejamento de políticas públicas para uma efetiva sustentabilidade no planeta Terra. Além disso, precisamos “pensar local (mas conhecendo os vínculos com o global) e agir local” para que possamos encontrar soluções para os problemas imediatos e urgentes que atingem diretamente as pessoas e todas as formas de vida. Ringquist (1997) reconhece que a observação da realidade local e o consequente enfoque dos problemas existentes auxiliam a percepção dos sujeitos sociais mais expostos ao risco ambiental. É por essa razão que insistimos na necessidade de a escola trabalhar sobre a realidade de seu entorno para que os estudantes e suas famílias possam perceber a necessidade de participar na solução dos problemas locais. No Brasil, a Lei no 9.795, de 27/04/1999, dispõe sobre a educação ambiental e institui a Política Nacional de Educação Ambiental, definida como: Processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade.

Os princípios básicos desta lei são: enfoque humanista e participativo; concepção do meio ambiente em sua totalidade; pluralidade de ideias e concepções pedagógicas, na perspectiva de inter, multi e transdisciplinaridade; vinculação entre a ética, a educação, o trabalho e as práticas sociais; garantia de continuidade e permanência do processo educativo; abordagem articulada das questões ambientais locais, regionais, nacionais e globais; reconhecimento e respeito à pluralidade e à diversidade individual e cultural. A educação ambiental é definida neste documento como um processo dinâmico integrativo, transformador, participativo, abrangente, globalizador, permanente e contextualizador. Mas existe um aspecto praticamente negligenciado nessa definição: conceber a educação como um instrumento no processo de gestão ambiental. As primeiras propostas de se considerar a educação como um instrumento para a gestão ambiental surgem no Brasil a partir de 1995 com um documento elaborado por José da Silva Quintas e Maria José Gualda, educadores da Divisão de Educação Ambiental do Ibama, no qual a gestão ambiental é compreendida como um processo de mediação de conflitos de interesses (IBAMA, 1997). Essa concepção de educação ambiental surge como resposta a um momento histórico específico, quando a questão ambiental no Brasil começava a explicitar sua face política de modo mais evidente pela radicalização dos conflitos e pela percepção mais aguda e participante dos movimentos sociais e dos agentes do poder público envolvidos nas situações de gestão ambiental. As soluções que temos para os problemas passam necessariamente pela participação política de todos os indivíduos para a superação das carências cotidianas. Entendemos o político como a forma de participação de todos os cidadãos na solução dos problemas locais na busca do bem comum, o que não exige necessariamente o envolvimento dos partidos políticos, que muitas vezes estão atrelados a acordos entre partidos, campanhas eleitorais produzidas pela mídia, produção midiática de candidatos e da opinião pública, etc. Há necessidade de se criar mecanismos de participação social direta no nível local. Isso significa que precisamos criar espaços de exercício do poder cidadão para a gestão ambiental para exercer uma cidadania planetária, o que implicaria se prever formas de compartilhamento das informações necessárias à compreensão da complexidade dessas questões com as populações locais envolvidas nas questões ambientais, bem como a criação de espaços de decisão quanto às políticas públicas a serem adotadas. A participação das pessoas não é algo que acontece apenas devido a um convite ou espontaneamente. Numa sociedade em que prevalece o individualismo devemos pensar em processos educativos que venham a superar a dicotomia entre indivíduo e coletividade, atuando na rede de significados que é a própria cultura e reforçando a percepção dos interesses comuns compartilhados, que são a essência da cidadania e do poder local. Acreditamos, como Mourão (2002), que [...] a tarefa transformadora da educação implica gerar um efeito turbilhonar na consciência coletiva e pessoal, atuando sobre o imprinting cultural que organiza os princípios inconscientes, propiciando o contexto de novas interações que permitam reorganizar nossos comportamentos, nossas premissas de compreensão do mundo, a organização de nossas ideias.

Quando sabemos o que está acontecendo e o porquê, só temos duas saídas: fechar os olhos para os problemas e esperar que alguém os resolva ou juntar-se a outras pessoas para solucionar os problemas dentro das nossas possibilidades, potencialidades e expectativas, mas para termos o desejo de mudança é preciso que cada um tenha o desejo de participar. E a participação só pode ser aprendida e aperfeiçoada se for praticada. Existem três

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aspectos que devem ser obrigatoriamente contemplados para que haja participação: 1) o sentimento de pertencimento ao grupo; 2) diálogo baseado em uma escuta sensível; 3) determinação das necessidades coletivas. Daí nossa preocupação com os problemas ambientais locais, que, sem excluir a escola, a expande e a incorpora dentro da comunidade como um ator que, sensível à crise ambiental e à urgência de mudar os padrões de distribuição e uso dos recursos naturais, consegue pensar, questionar e agir além das necessidades imediatas para a resolução de conflitos socioambientais.

A educação para a gestão ambiental ocorre, então, por meio de um processo participativo no qual o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, adquirem conhecimentos, atitudes e competências voltados para a conquista e a manutenção de um meio ambiente ecologicamente equilibrado. Loureiro (2002, p. 103) salienta que: A educação ambiental é um trabalho que exige continuidade e constantes reflexões relativas à qualidade de vida. Assim, é necessário que, cada vez mais, se expanda o número das pessoas que acreditam ser capazes de criar uma consciência conservacionista por meio de seu trabalho, atitudes e palavras. Essas pessoas vão muito além do educador formal. Elas podem ser estudantes, donas de casa, aposentados, crianças, adultos ou técnicos de qualquer profissão.

Portanto, a ação educativa só se justifica com o envolvimento da comunidade e sua orientação para as possíveis soluções de problemas comunitários. Como Gadotti (2000, p. 251) explicita, a educação deve: Amar o conhecimento como espaço de realização humana, de alegria e de contentamento cultural; [...] selecionar e rever criticamente a informação; formular hipóteses; ser criativa e inventiva (inovar); ser provocadora da mensagem e não pura receptora; produzir, construir e reconstruir conhecimentos elaborados. E mais: numa perspectiva emancipadora da educação, a escola tem que fazer tudo em favor dos excluídos. Não discriminar o pobre. Ela não pode distribuir poder, mas pode construir e reconstruir conhecimentos, saber, que é poder. Numa perspectiva emancipadora da educação, a tecnologia não é nada sem a cidadania.

Consequentemente, a prática da educação voltada para a gestão ambiental chama a atenção para os problemas ambientais locais em detrimento dos globais, não menos importantes, mas menos prioritários. É nesse sentido que Ribeiro (1992) reforça a ideia de que o eixo da gestão ambiental deve se localizar na ação local. Também nesse sentido, a Organization for Economic Co-Operation and Development (OECD) julga que a apropriação do contexto local para a educação ambiental permite o desenvolvimento do senso de responsabilidade entre os educandos (CERI, 1995). Que metodologia desenvolver para atender às expectativas de participação social de uma dada comunidade? Primeiro, é preciso convidar as pessoas para se conhecerem e e, assim, possibilitar a criação de um sentimento de pertencimento a essa comunidade. Entendemos “comunidade” como um grupo de pessoas que têm um objetivo em comum, uma ação e uma identidade em comum; a escola pode ser considerada uma comunidade. Assim, as reuniões entre professores e pais não podem ficar restritas apenas à entrega de notas e a relatórios comportamentais dos alunos dentro da escola. Um segundo passo seria o conhecimento da comunidade sobre sua própria realidade para que todos possam contribuir na elaboração de um diagnóstico socioambiental local, pois apesar de as pessoas viverem numa comunidade nem sempre têm uma escuta sensível para as coisas que acontecem no lugar. É preciso traçar o mapa político local, identificando quem é quem, quais as lideranças comunitárias mais expressivas e quais dessas lideranças podem influenciar positiva ou negativamente na consecução de um projeto. É muito importante fazer com que os mais diferentes setores da comunidade estejam envolvidos, comprometidos e atuantes em seus próprios espaços com a produção, a criação e a preservação da qualidade socioambiental. É preciso estimular para que cada vez mais os diversos setores venham a se tornar atores proativos no gerenciamento ambiental. Um dos assuntos que a maioria das escolas brasileiras elege para trabalhar em projetos de educação ambiental é a coleta seletiva de resíduos sólidos. Raramente esses projetos chamam a atenção dos estudantes para o consumo exacerbado e a produção indiscriminada de embalagens não recicláveis (multiplicadas principalmente pelo sistema de franquias), os hábitos alimentares artificializados (fast-food e congelados), o hábito de jogar o lixo no chão, nas praias e nos rios, menos numa lixeira, etc.; tampouco estimulam os estudantes a conhecerem a natureza das fontes geradoras de resíduos, seus impactos na população e no ambiente urbanos, especialmente na realidade local em seus aspectos socioeconômicos, políticos, pessoais e coletivos, além de articulá-los com

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os impactos da dimensão global para que se obtenha uma visão real da complexidade da questão. Além disso, a escola nunca considera a inserção dos catadores, que se encontram sempre sob o controle da indústria da reciclagem, com pouca ou nenhuma margem de negociação quanto aos preços de mercado, permanecendo em condições de trabalho e de vida desumanas e inaceitáveis. Muitas pessoas acham que a implantação da coleta seletiva de lixo seria suficiente para resolver o problema, mas não conseguem ver que os poucos projetos implantados pelo poder público no Brasil se restringem aos aspectos técnicos do sistema de gestão, descuidando-se da dimensão educativa/comunicativa, que é o instrumento básico para priorizar o repensar a forma como estamos vivendo, o recusar alimentos industrializados com alto teor de sódio e açúcar que afetam nossa saúde, o reduzir a compra de coisas supérfluas, reutilizar resíduos sólidos ou produtos como roupas, latas, garrafas pets, etc. e destinar os resíduos sólidos como lâmpadas, pilhas e celulares para as empresas produtoras utilizando a logística reversa. Dessa forma, tanto as unidades familiares, que geram lixo por meio do consumo, quanto as empresas, cujo lixo gerado advém do processo de produção e colocação no mercado, não são atingidas por propostas concretas de mudança dos hábitos de consumo e produção. Quem são os segmentos envolvidos na gestão dos resíduos sólidos em uma cidade? São os consumidores, os produtores, os catadores, o poder público, os serviços privados, os intermediários e as empresas que utilizam os resíduos como matéria-prima. Desse modo, deveria haver um diálogo entre todos os atores e os setores envolvidos no sentido de integrar a todos na gestão dos resíduos sólidos. Entretanto, o que assistimos na maioria dos municípios brasileiros é à incapacidade das políticas públicas de tocar na essência da crise ambiental, que se deve à insustentabilidade dos padrões de consumo exacerbado e da relação socioambiental vigentes. Só a reciclagem de resíduos sólidos não será suficiente para solucionar a questão do lixo hoje no mundo, é imprescindível a discussão das causas desse problema em suas dimensões política, econômica, social e cultural. Se persistirmos na neutralidade ideológica, omitindo-nos quanto à criação de demandas por políticas públicas voltadas ao enfrentamento concomitante dos problemas ambientais e da injustiça social, nada poderá avançar a contento. Educador que só fica em sala de aula perde a oportunidade de contribuir com a construção de um mundo melhor. Por isso acreditamos que a educação ambiental é muito mais que ações pontuais de como fazer horta na escola ou coleta seletiva de lixo. Precisamos sensibilizar, envolver, mobilizar, estimular, ouvir as pessoas para que qualquer projeto não seja apenas de um professor bem intencionado; a educação ambiental só dará certo quando o projeto for coletivo. Como nos ensinou Paulo Freire (1976, p. 66): Somente os seres humanos que podem refletir sobre sua própria limitação são capazes de libertarse, desde, porém, que sua reflexão não se perca numa vaguidade descomprometida, mas se dê no exercício da ação transformadora da realidade condicionante. Desta forma, consciência de e ação sobre a realidade são inseparáveis constituintes do ato transformador pelo qual homens e mulheres se fazem seres de relação. A prática consciente dos seres humanos, envolvendo reflexão, intencionalidade, temporalidade e transcendência, é diferente dos meros contatos dos animais com o mundo.

A educação atual não pode ser apenas um instrumento de informação sem implicar transformações significativas nos indivíduos no sentido da construção de um novo padrão social, de um novo pacto civilizatório, estimulando a capacidade dos seres humanos em ler o mundo e produzir sentidos. Não queremos continuar simplesmente alertando as pessoas com discursos catastróficos sobre o fim do planeta ou destacando os desastres ambientais que geram medo e impotência nas pessoas, como fazem os meios de comunicação. A informação é importante, mas o fundamental é o investimento na educação do sujeito ecológico, capaz de agir no mundo com base em valores éticos e estéticos. Partimos do pressuposto de que o processo educativo é um “ato político no sentido amplo, isto é, como prática social cuja vocação é a formação de sujeitos políticos, capazes de agir criticamente na sociedade” (CARVALHO, 2006, p. 186). As pessoas precisam se ter noção de que fazer horta na escola e/ou coleta seletiva de lixo não resolverá o problema do mundo, é preciso ir além da “consciência” dos problemas e da vontade de fazer alguma coisa. Consideramos que uma proposta de educação ambiental deve ser: […] um processo educativo eminentemente político, que visa ao desenvolvimento nos educandos de uma consciência crítica acerca das instituições, atores e fatores sociais geradores de riscos e respectivos conflitos socioambientais. Busca uma estratégia pedagógica do enfrentamento de tais conflitos a partir de meios coletivos de exercício da cidadania, pautados na criação de demandas por políticas públicas participativas, conforme requer a gestão ambiental democrática (LAYRARGUES, 2002, p. 169).

Algumas pessoas até estão preocupadas com a crise ambiental, mas a “consciência” e a vontade não são suficientes para mudar o quadro atual, pois existe uma contradição profunda entre a intenção e o comportamento das pessoas, porque existe uma descontinuidade entre o comportamento e as atitudes, entre o pensamento e a ação cotidiana, entre os valores e as atitudes. Temos boas intenções, no entanto nossas ações não condizem com aquilo que sabemos que precisamos mudar, como o consumo exacerbado e o individualismo.

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Apenas reconhecer os problemas socioambientais não é suficiente. É preciso exercer nossa cidadania, que tampouco se resume a direitos e deveres; é algo muito maior, é agir junto com o outro. Precisamos, como Carvalho sugere, “desenvolver capacidades e sensibilidades para identificar e compreender os problemas ambientais, para mobilizar-se, no intuito de fazer-lhes frente e, sobretudo, para comprometer-se com a tomada de decisões, entendendo o ambiente como uma rede de relações entre sociedade e natureza” (2006, p. 181). Partimos do conceito de cidadão como aquele que “é capaz de identificar os problemas e participar dos destinos e decisões que afetam seu campo de existência individual e coletivo” (2006, p. 187); é a possibilidade de “fazer a própria história” e criar novas formas de conviver com absoluto respeito à diversidade e à alteridade. Mudar não é fácil porque implica criarmos um novo padrão social, um novo pacto civilizatório. Racionalmente podemos até pensar em mudar a nós mesmos, mas o que nos impede de mudar diante de situações tão sérias, como a que estamos vivendo, de desintegração social e degradação ambiental? Todos sabem que vivemos uma crise séria e urgente. Estamos vendo desastres ambientais no Brasil e no mundo. Isso pode nos levar a uma visão apocalíptica – o mundo vai acabar –, e aceitamos pacificamente tal determinação, o que gera medo e impotência. A outra possibilidade é reagirmos e agirmos. Considerando-se a proposta de educação ambiental, quando damos ênfase à ecologia humana estamos ressaltando o fato de que cabe à espécie humana a responsabilidade pela preservação ou pela destruição da vida no nosso planeta. A crise atual é fruto de condições patológicas, isto é, de uma espécie de doença coletiva que contaminou a consciência humana, levando-nos a destruir nossas condições de sobrevivência e reprodução, assim como as dos outros seres do planeta. Como escrevemos em outro artigo, a intervenção pedagógica da educação ambiental vem propor uma cura dessa patologia, atuando nos três níveis em que ela se manifesta. Primeiro, nas pessoas humanas individualmente, levando a atitudes de autoconhecimento e incentivando a capacidade criativa e autotransformadora, gerando novos hábitos e atitudes. Segundo, nas relações entre as pessoas, fazendo surgir uma verdadeira cidadania, baseada em laços de cooperação e ajuda mútua, superando os efeitos nocivos da competição, da violência e do individualismo egoísta. Terceiro, nas relações entre os humanos e os demais seres vivos, compartilhando das trocas energéticas e dos ciclos que formam os ecossistemas, na preservação da saúde do planeta. Assim, podemos falar de três ecologias, quer dizer, de uma ação educativa simultânea em três níveis, visando à correção dos modos de ser doentios que causaram a crise atual. Uma nova ética vai aos poucos sendo cultivada, trazendo a consciência humana para uma percepção atenta e inteligente do momento atual, estendendo a visão restrita dos “direitos humanos” para a defesa dos direitos de todos os seres vivos (MOURÃO; CORRÊA, 1998). A educação ambiental, com essa visão transformadora, exige um novo educador, não mais um mero repassador de informações (pois a internet já pode substituí-lo nesse papel), mas um agente de mudanças. A atuação do educador deve incluir também o aspecto da pesquisa científica, pois ele precisa estar constantemente conhecendo e reconhecendo a realidade à sua volta, integrando sua experiência de vida à vivência coletiva, contribuindo assim para a busca de soluções aos problemas existentes. O educador deve ser alguém capaz de contribuir para o enfrentamento das questões concernentes à qualidade de vida da comunidade, sendo um facilitador de sua organização política, no sentido de dinamizar as formas de cooperação e a criação coletiva de soluções comuns. Portanto, precisamos de projetos político-pedagógicos que incluam a dimensão da ecologia humana proposta neste artigo. Vivemos em um mundo no qual muitas pessoas estão apartadas, atomizadas, privadas da esfera das relações históricas e sociais coletivas, seres sem história e sem vínculos. Numa sociedade em que prevalecem a exclusão e o não reconhecimento do outro, estamos privados da luta por um mundo melhor, que nunca será perfeito porque não somos seres perfeitos, mas nosso desafio como humanidade é sempre buscar vivermos melhor. Em muitos aspectos, vivemos melhor que no começo do século XX, quando as mulheres não podiam estudar e eram obrigadas a aceitar a violência dos maridos porque não existia proteção às mulheres. Hoje existe a Lei Maria da Penha, e somos maioria nas universidades. É claro que temos muito por fazer, mas nada que seja impossível. Por isso acreditamos que a luta ecológica é uma luta cidadã em busca de uma sociedade mais justa e ambientalmente sustentável. Compreendemos que a educação ambiental deve promover a compreensão dos problemas socioambientais em suas múltiplas dimensões: geográfica, histórica, biológica, social, cultural e espiritual, considerando o meio ambiente como o conjunto das inter-relações entre o mundo natural e o mundo social, mediado por saberes locais e tradicionais, além dos saberes científicos. É preciso proporcionar condições para o diálogo entre as áreas disciplinares, saberes e fazeres dentro da escola e com os diferentes atores sociais envolvidos com a gestão ambiental. Os professores, como homens e mulheres da prática educacional, em vez de serem apenas os consumidores da pesquisa realizada por outros, deveriam transformar suas próprias salas de aula em objetos de pesquisa.

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Capítulo 7 Problemas Ambientais: causas, consequências e possíveis soluções Mery-Lucy do Vale e Souza O meio ambiente aparece não mais como um mero fornecedor de recursos e matérias-primas, é, antes de tudo, um condicionador da existência humana. A conscientização disso nos leva a estudar,entender, evitar e solucionar os problemas que assolam o planeta Terra desde há muito, os quais, se vêm intensificando pelas ações antrópicas. Entretanto, antes de listar os principais problemas ambientais a serem trabalhados nas escolas e nas comunidades é importante que o educador ambiental observes algumas lições de educação sob a ótica de Paulo Freire em sua Metodologia da Problematização. a) Paulo Freire ensinou que a educação deve servir para a libertação do ser humano. A Libertação da ignorância, da escravidão, da dependência da submissão, libertação de diversas formas de opressão. Uma educação problematizadora é voltada para servir de libertação do ser humano pelo conhecimento e pela ampliação da consciência. b) O homem só transforma a sua realidade quando ele próprio se transforma A metodologia da problematização permite a transformação do sujeito que dela participa.

O educador deve fazer sua ação educativa a partir das razões do aprendiz. Colocar o aluno para observar a realidade, decidir o problema de estudo, dar a palavra ao aluno, permitindo sua expressão e valorizando-a.

c)

d) A vigilância do educador democrático é a de buscar a coerência entre o seu discurso e sua ação, entre a teoria e a pratica. Pela metodologia da problematização, chega-se a ação pratica transformadora, fruto da teoria trabalhada, passando antes pelas hipóteses de solução elaboradas pelos próprios alunos.

O aluno só aprende quando se envolve profundamente com a situação. Esse envolvimento o leva a fazer a relação entre a teoria e a pratica, saindo de uma pratica observada para uma nova pratica, elaborada pelos alunos.

e)

f) Formar é muito mais que treinar – O homem é um ser inconcluso – Buscar alterar a realidade, pela transformação.

A aprendizagem é facilitada se os novos conhecimentos são associados aos conhecimentos anteriores. Essa associação é possível de ser feita quando se parte de um ponto real, do pensamento e do conhecimento existente nas pessoas.

g)

Fazer a observação, definindo um problema, perguntando sobre as causa e os determinantes, fazendo a teorização, a analise, para se chegar a uma nova ação.

h)

Para Freire, é na incidência de ação transformadora dos homens sobre o mundo que resulta a sua própria humanização. Referência: FREIRE, P. A Educação para a Autonomia. 1983. - A metodologia da problematização e os ensinamentos de Paulo Freire fep.if.usp.br/~profis/arquivos/ivenpec/Arquivos/Orais/ORAL019 AH! NÃO DISSE? A ESCOLA NÃO É LUGAR PARA ESSAS COISAS!

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Educando pelas Trilhas do Cerrado: um roteiro de ações para a educação ambiental em escolas e comunidades

Entre a teoria e a prática Andréia C. Andrigueto Sugerimos nessa parte do livro enfocar a relação sinérgica de dois aspectos específicos que interferem no equilíbrio do planeta: resíduos (líquidos e sólidos) e a preservação de remanescentes de vegetação nativa. Para isso almejamos trazer a luz o desafio de um pensamento integrador, que estimula o não pensar a capacidade de suporte da natureza e falar das relações ecológicas por trás de conceitos, do papel de uma água de boa qualidade para a saúde do ser humano e da Terra.

Metodologia utilizada E para isso foram criados os capítulos problematizadores. O objetivo das seções a seguir é auxiliar o professor, o educador ambiental e o leitor a contextualizar temas gerais que podem ser abordados nas práticas educativas dentro e fora de sala de aula. A metodologia da educação problematizadora defendida pelo educador Paulo Freire (1979), parte do princípio de que questões cotidianas (conflitos latentes e necessidades apresentadas pelas comunidades) são a base para propor soluções a problemas reais. É nesse dialogar com o mundo real da criança, jovem ou adulto que processos de ensino-aprendizagem tornam-se efetivos e duradouros. Outros autores que apoiam e caminham juntos a essa visão problematizadora de Freire são Frei Beto, Domenico de Masi e o professor universitário Carlos Hiroo Saito. Frei Betto é escritor religioso conhecido por seu grande engajamento em movimentos pastorais e sociais. Domenico de Masi é um sociólogo italiano contemporâneo que escreveu junto com Frei Betto a obra : “Diálogos criativos” e é famoso pelo seu conceito de “ócio criativo”, um conceito que torna positivo o ócio enquanto estimulador da criatividade pessoal. Carlos Hiroo Saito é professor universitário no Departamento de Ecologia/UnB e no programa de pós-graduação em Desenvolvimento Sustentável/UnB, referência em Educação Ambiental no Brasil. No período de 2008 a 2010 auxiliou o Ministério do meio Ambiente na produção de material didático no âmbito do Projeto de Conservação e Utilização Sustentável da Diversidade Biológica Brasileira (PROBIO). A coragem de tentar mudar um pouco a história como as coisas são explicadas em sala de aula, defendida pelos autores citados, serviu de inspiração para a escrita das seções a seguir. A utilização em primeiro lugar de uma linguagem mais simples, cotidiana para fazermos menção científica é o pano de fundo para auxiliar o professor em seu diálogo com o mundo do aluno. Frei Beto e Domenico de Masi (2002), defendem ainda que esse diálogo leva os alunos a refletir suavemente, mas compromissadamente, encarando o desafio de não nos deixarmos levar pela apatia e pelo silêncio. É ter a coragem de assumir que a responsabilidade perante os grandes desafios que temos de enfrentar, não pertence ao outro, mas a cada um de nós.

Desmatamento e queimada Entre os problemas que assolam o planeta Terra, o desmatamento, tendo em vista que sem cobertura vegetal não há absorção de CO2, favorecendo o efeito estufa. Esse procedimento diminui a umidade e consequentemente a dinâmica pluvial, ou ciclo hidrológico, o que aumenta a probabilidade de inundações. Também há perda do solo naqueles locais, resultado disso a curto e médio e longo prazo é a diminuição das áreas cultiváveis, o que pode gerar até mesmo uma crise no abastecimento de alimentos. Contudo, talvez algo mais preocupante que isso seja a perda da biodiversidade. Imagine quantas espécies da fauna e da flora ainda não foram descobertas e que poderão ser muito úteis à humanidade. Deve-se levar em consideração também como cada animal e cada planta interferem na dinâmica de uma região. A retirada de algum deles pode gerar desequilíbrio para aquele ecossistema. Somam-se a essa problemática as queimadas, que destroem a área verde, do Cerrado e de muitas outras regiões. O índice pluviométrico – ciclo das chuvas – desses ecossistemas está ameaçado, bem como o sequestro de carbono. Outra ameaça para o Cerrado são as monoculturas, que avançam em sua direção.

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A água Rara, escassa e cara, a água é um recurso que deve ser cada vez mais preservado, pois não se vive sem ela. Apenas 2/3 da água do planeta é doce, sendo a maior parte encontrada em lençóis freáticos. Apesar de isso ser de conhecimento geral, o desperdício e o mau uso desse bem são constantes. A água que passa por processos químicos para torna-se potável ou própria para o consumo é chamada de “água nobre”. O processo de potabilidade da água, além de caro, requer a utilização de muita energia. E despropositadamente essa água nobre é utilizada em sanitários, calçadas, carros, usos que poderiam ser servidos por outro “tipo” de água: a que vem do céu. A chuva é fonte de muita água, que pode ser direcionada para estes e outros serviços. Como regar o jardim. O Brasil deveria aproveitar mais essa fonte, haja vista ser um país tropical, em que a incidência de chuvas é maior do que em outras regiões do planeta. Vale lembrar que as cidades, ou o meio urbano, se vêm expandindo (geralmente sem planejamento) tanto no Brasil como em outros países em desenvolvimento. Isso é em parte um problema, porque com mais áreas asfaltadas e sem estrutura adequada para o escoamento da água da chuva (muitas ruas asfaltadas não têm bueiros) aumentam as chances de alagamentos. É lógico que essa situação ocorre também em razão do descarte de lixo nas ruas, que entope os bueiros. O fato é que com “o terreno impermeabilizado, a água da chuva cai no cimento ou no asfalto e não em direção a um riacho” (TRIGUEIRO, 2005, p. 121). Outra encrenca é o despejo de esgotos sem tratamento: “Apenas 20% deles recebe tratamento”(TRIGUEIRO, 2005, p. 123). Deve-se considerar também o lixo não tratado, cujo chorume (parte líquida do lixo) polui o solo e as águas subterrâneas; os agrotóxicos, que são pulverizados nas plantações e podem contaminar rios e lagoas.

Gestão de recursos hídricos, resíduos sólidos-o desafio de um entendimento sistêmico da questão O corpo humano possui a mesma proporção hídrica que o planeta Terra. Enquanto o nosso planeta é formado por 2/3 de água (aproximadamente 66%), o corpo humano, formado por milhares de células com água dentro, é composto por 70% desse mesmo recurso natural. Coincidência? Não acreditamos no acaso nessa relação. Assim como o planeta é formado por milhões de rios que o compõe, o nosso corpo é entrelaçado por veias, e tecidos que movimentam partículas, ar, formas de vida. Em nosso corpo, o conjunto de tudo que chamamos de sistema circulatório é composto na verdade por dois sistemas: linfático e cardiovascular (Yokochi et al. 1992). Anatomicamente, é o sistema cardiovascular o responsável em um nível macro a fazer com que o oxigênio, possam ser transportado alimentando as células do corpo e fazendo com que o gás carbônico possa ser levado de dentro para fora do nosso corpo. Microscopicamente, o sistema linfático transporta as células que fazem a defesa do nosso corpo. Como fazer isso ser assimilado em sala de aula? Podemos usar metáforas, como o fazem Milano et al. (2006). Esses autores abaixo, ressaltam fortes enfermidades que afetam o nosso sistema imunológico global e as nossas estratégias de defesa, utilizando-se para isso de um princípio conhecido como Teoria de Gaia (Lovelock, 1995, 2006). Podemos exemplificar o que foi apresentado acima da seguinte forma: Se a Terra for vista como um organismo vivo, cada iguarapé, córrego e rios são vasos, veias e artérias; pântanos são os rins; o mar, considerando a sua evaporação dentro do ciclo da água, atua como o coração que bombeia o sangue da Terra a todos outros tecidos através das chuvas. Cada bioma, como um tecido, possui sua influência e função no sistema de vida do planeta todo. (Milano et al., 2006: 176)

O aquecimento global, nesse sentido, é a febre que anuncia um planeta doente. E ela pode ser trabalhada por meio de diversas relações. Um delas é trabalhar o consumo consciente com os alunos. Levando a discussões do tipo recursos infinitos versus finitos, a quantidade de planetas serão necessários para se manter o padrão de consumo de cada país, pegada ecológica, etc. O professor pode instigar o aluno a repensar hábitos, comportamentos e atitudes para consumir menos, repensar mais, reutilizar, reciclar, fazer compostagem com o resto de alimentos de seu dia-a-dia. Para problematizar o professor pode-se valer da ideia de contrapor o Ter e o Ser, difundida por exemplo pelo escritor alemão, Erich Fromm (1982), que embora seja do século passado aborda questões ainda bem atuais. Ter e Ser aparecem em logo no início de sua obra, Lao-Tsé como ser “o modo de fazer”, e Ter, nas palavras de Karl Marx, como manifestação da ausência da essência do ser, tornando o homem mais alienado.

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Educando pelas Trilhas do Cerrado: um roteiro de ações para a educação ambiental em escolas e comunidades

Para problematizar ainda mais a discussão entre o Ter e o Ser, o professor pode instigar os alunos a refletirem sobre desejos e necessidades. Para onde levará o nosso desejo de consumir cada vez mais? Abordar o consumo nas relações com o planeta pode ser desenvolvida por meio de diversas atividades. Ao estabelecer relações de poder por meio da obtenção de artefatos, por exemplo Gordon (2006) defende que populações tradicionais1, - por meio do poder do “Ter”, tentaram preencher um vazio existencial de uma separação da nossa natureza individual (o “SER”) com o mundo. Tais relações dicotômicas podem ser trabalhadas em atividades de sensibilização ambiental, trabalhando o aspecto lúdico: contação de histórias com fantoches, figuras, pinturas, maquetes de animais da fauna silvestre que visam despertar sentimentos de pertencimento (Sá, 2005) à natureza empoderamento (Friedman, 1992; Pinto, 1998) e resgatando a responsabilidade individual que cada um de nós temos com a preservação do nosso ambiente. Para isso, o professor poderá utilizar-se das atividades sugeridas nos capítulos da parte 2 desse livro. Trazendo o contexto para uma problematização mais regional e local, pode-se levar os alunos a refletirem sobre dados que são divulgados sobre o saneamento básico em sua região. Precisamos compreender as relações entre saneamento, meio ambiente e saúde pública para falarmos de outras questões que envolvem a saúde do nosso planeta. Presenciamos uma saída da concepção clássica sanitária, de se tratar problemas de saúde com aulas conscientizando indivíduos sobre a importância de pequenos cuidados com a higiene-como lavar a mão, escovar os dentes (Saito, 2015, apresentação oral) para uma abordagem multirreferencial, que visa a promoção da saúde do ser humano e a conservação do meio físico e biótico (Soares et al., 2002). Precisamos assim, conhecer o aparato que regulamenta a questão sanitária no Brasil. A Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007, que estabelece diretrizes nacionais de Saneamento Básico no Brasil e introduz a noção de saneamento básico, englobando a gestão de recursos hídricos e resíduos sólidos. Saneamento básico, pela lei é composto por tratamento (abastecimento de água potável, esgotamento sanitário, limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos, drenagem e manejo das águas pluviais urbanas). Em outras palavras, água encanada, tratamento de esgoto e resíduos sólidos. O que a falta de saneamento básico traduz é o perigo de contaminação das águas. Por não terem tratamento adequado, as famílias recorrem ao esgoto urbano caseiro, que contribui para o assoreamento de rios, lagos e lagoas, além de ser foco da disseminação de doenças. Como espécie de lixão líquido a céu aberto, os moradores das regiões não atendidas com condições mínimas de saneamento básico, convivem com doenças como cólera, hepatite A, febre tifoide, gastroenterite (Silva et al., 2008). Esses enteropatógenos, como bactérias do gênero Enterococcus, são importantes indicadores epistemiológicos contidos nas águas. as redes de esgoto não tratado de 11 grandes cidades brasileiras, vão direto para o mar (Serra et al., 2003, Correio Braziliense, Brasil, 31/5/2008). Outro desafio em âmbito local publicado em primeira página pelo Jornal da Comunidade de Brasília, em junho de 2008: “DF é o que mais agride o meio ambiente no país”. Ao divulgar a pesquisa “Indicadores de Desenvolvimento Sustentável” do ano, realizada pelo IBGE2, o DF apresentou o pior índice de qualidade do ar, a maior incidência de queimadas em reservas ecológicas e elevados patamares de uso de agrotóxicos e fertilizantes, apesar de ser, no entanto, a menor unidade da federação. Outro aspecto abordado pela matéria do jornal local em Brasília discorre acerca da relação entre o uso de agroquímicos, poluição dos solos e em efeito cascata, a degradação dos lençóis freáticos da região. O uso destes agroquímicos no Distrito Federal agrava a poluição de rios e lagos e grande parte disso vai para dentro da bacia do rio Descoberto, que abastece 62% desse quadradinho no Cerrado. Além disso, pode o professor problematizar sobre a questão de saúde do planeta discorrendo sobre o lixo, como veremos a seguir. Referencias: CORREIO BRAZILIENSE, Brasil. Barros, Hércules. Saneamento básico. Segundo o IPEA, 22,2% dos habitantes das áreas urbanas não teêm acesso ao serviço no país. Populaçao negra é a mais prejudicada. 31/5/2008. DE MASI, D.; FREI BETTO. Diálogos criativos. Mediação e comentários José Ernesto Bologna. São Paulo: DeLeitura Editora, 148p, 2002. FRETWEEL, H. Environmental Education: the Science of fear. Disponível em: www.percreports.org. 2009. Acessado em: FRIEDMAN, J. Empowerment: The Politics of the Alternative Development. Cambridge: Blackwell Publishers, 1992 FROMM, E. Ter ou Ser? Rio de Janeiro: Zahar editores. Trad. Nathanael C. Caixeiro, 4 ed, série World Perspectives. 1982. Sugestão de leitura: Gordon, Cesar. Economia selvagem : ritual e mercadoria entre índios Xikrin-Mebêngôkre. São Paulo: Editora Unesp:ISA; Rio de Janeiro:NUTI, 2006. 452p.2 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

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LOVELOCK, J. E. Gaia: um novo olhar sobre a vida na Terra. Lisboa: Edições 70, 1995. LOVELOCK, J. E. Gaia: cura para um planeta doente. São Paulo: Cultrix, 2006. YOKOCHI, C.; ROHEN, J. W.; WEINREB, E. L. Anatomia fotográfica do corpo humano. Tradução: Orlando Jorge Aidar. São Paulo: Manole, 140p, 1992. YOUNG, R. Apresentação. In: Bologna, J.E. Diálogos criativos: Domenico de Masi: Frei Betto/mediação e comentários José Ernesto Bologna. São Paulo: DeLeitura Editora, 148p, 2002. MILANO, M.; MENDES, T.; ANDRIGUETO, A. Hot spots do amor, enfermidades da Terra e o sistema imunológico global: Devaneios sobre juventude, meio ambiente e políticas públicas. In: juventude, cidadania e Meio Ambiente: subsídios para a elaboração de políticas públicas. Órgão gestor da Política Nacional de Educaçao Ambiental; Ministério do Meio Ambiente; Ministério da Educação.- Brasília: Unesco, 2006. PINTO, C.C.G. Empowerment: uma prática de serviço social. In: Barata, O.S. (org): Política Social. Lisboa: ISCSP, pp.245-277, 1998. SERRA C.L.M.; CAVALCANTE, P.R.S.; ALVES, L.M.C.; NASCIMENTO, A.R.; DINIZ, S.C.C.S. Avaliação de parametros físicos e químicos e pesquisa de Vibrio parahaemolyticus em águas do estuário do rio Anil (São Luís, Estado do Maranhão). Acta Sci.Biol. Sci., Maringá, v. 25, n.2, p.261-266, 2003. SILVA, V.C.; NASCIMENTO, A.R.; MOURÃO, A.P.C.; NETO, S.V.C.; COSTA, F.N. Contaminação por Enterococcus da água das praias do município de São Luís, Estado do Maranhão. Acta Sci.Technol. Maringá vol.30,n.2, p.187-192, 2008. SOARES, S.R.A.; BERNARDES, R.S.; NETTO, O.M.C. Relações entre saneamento, saúde pública e meio ambiente: elementos para a formulação de um modelo de planejamento em saneamento. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 18 (6): 1713-1724, nov-dez, 2002.

O Lixo dentro de uma concepção de Agenda 21 “O Brasil, apesar de ter uma das legislações mais avançadas do planeta, é o paraíso dos sacos plásticos. Essa realidade, que tanto preocupa os ambientalistas do país, já justificou mudanças importantes na legislação e na cultura – de vários países europeus TRIGUEIRO, (2005, p. 48).

O lixo é outro desafio que precisa ser solucionado. A falta de educação e conscientização ambiental, a produção industrial de embalagens de difícil degradação, o não comprometimento com o lixo gerado pela própria indústria, a má gestão e a falta de um bom planejamento urbano são as principais causas geradoras do problema lixo. Acostumados a ter o serviço de limpeza urbana da prefeitura retirando o lixo ou limpando a cidade, não nos preocupamos em jogar lixo na lixeira, pois sabemos que alguém o fará. Esse pensamento, que está na cabeça de muitas pessoas em países subdesenvolvidos, há muito vem deixando de existir nos cidadãos europeus, americanos, japoneses e outros. A consciência de que o lixo representa má qualidade de vida e de que é importante separá-lo (coleta seletiva em lixeiras públicas distribuídas pela cidade) facilita muito a vida de quem trabalha diretamente com ele (garis e catadores). Também é interessante a informação de que o lixo gera trabalho e renda para o país. Ou seja, a questão

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Educando pelas Trilhas do Cerrado: um roteiro de ações para a educação ambiental em escolas e comunidades

do lixo não diz respeito somente ao gari, ao catador individual ou ao catador associado em cooperativas. Ele é um desafio para toda a população. Esses atores prestam um serviço ao Estado e a sociedade, ao recolher o que nós chamamos de lixo. Para eles, há matéria prima envolvida no descarte. Além de garantir o seu sustento e o de suas famílias, gera renda e empregos. Precisamos, nós, “produtores de lixo”, toda sociedade, aprender a dizer não ao consumo sem limites (recusar), a refletir sobre as causas de nosso desejos pelas coisas e ter diariamente um comportamento ecologicamente correto: preferir os produtos a granel e regionalizados, produzidos e transportados com menos combustível e embalagens individualizadas, dar preferência a produtos cujas embalagens não agridam o meio ambiente, exijir que seus condomínios ou residências façam a coleta seletiva, exigir dos governos municipais e estaduais e no DF a coleta seletiva em dias certos e alternados. Em relação ao lixo gerado pelo consumidor, algumas indústrias de bens duráveis, como de aparelhos de refrigeração e pneus e, até mesmo a indústria de alimentos, como a do óleo de cozinha, são responsáveis pelo destino final do lixo, mas são raríssimas as que têm essa preocupação. A “guimba” ou “bituca” de cigarro ainda é encontrada nas ruas e nas praças das cidades. No entanto, talvez poucos saibam que ela gera um grave problema ambiental, pois é revestida de uma espécie de resina – o acetato de celulose –, que dificulta a sua decomposição. No Brasil, inclusive no DF já existe a reciclagem de bituca de cigarro (procure se informar). A solução para o problema do lixo passa pelos três Rs da sustentabilidade: reduzir (o uso de matérias-primas e energia, a quantidade de material a ser descartado); reutilizar (os produtos usados, dando a eles novas funções) e reciclar (retornar o que foi utilizado no ciclo de produção).

Consumismo na sociedade atual e os problemas ambientais resultantes “A terra pode oferecer o suficiente para satisfazer as necessidades de todos os homens, mas não a ganância de todos” (Mahatma Gandhi). Essa é uma sábia frase para se introduzir a abordagem de um dos principais problemas para o meio ambiente: o superconsumo ou o consumo excessivo. O consumo em si não é problema, precisamos consumir para satisfazer nossas necessidades básicas. No entanto, a avassaladora farra consumista desencadeada na Revolução Industrial, potencializada com o avanço tecnológico dos meios de produção e universalizada pela mídia na era da globalização, está custando caro ao planeta. Segundo o relatório Planeta Vivo 2008, divulgado pela organização não governamental WWF, o consumo de recursos naturais já supera em 20% ao ano a capacidade do planeta de regenerá-los. “Há fortes sinais de que o consumo excessivo está prejudicando a qualidade de vida, como o atual nível de obesidade e dívida pessoal, menos tempo livre e meio ambiente danificado” (Estado do Mundo, 2004, do Worldwatch Institute). Esse estilo de vida é mais típico de países desenvolvidos, os quais têm níveis de consumo altíssimos. Em países como o Brasil, onde a maioria da população (165 milhões) não tem a opção de consumir mais do que o necessário, o bombardeio de propagandas que invade a casa das pessoas torna-as angustiadas, frustradas, ansiosas, depressivas e, em alguns casos, há uma grande possibilidade de gerar violência. Só uma minoria é capaz de arcar com as despesas geradas por suas vontades . O que contribui muito para a baixa autoestima, as ansiedades e a depressão são a mídia, o marketing, a publicidade. Antigamente os publicitários se preocupavam em explicar o que era e para o que servia determinado produto. Hoje, a publicidade apela não para a informação, mas para o sonho. Quem tem dinheiro banca esse sonho, quem não tem fica frustrado ou endivida-se. Então, a melhor orientação é consumir conscientemente. Devemos saber diferenciar o que realmente necessitamos do que é puro consumismo. Não podemos nos deixar hipnotizar pela propaganda. Além disso, devemos observar se o produto a ser comprado respeita normas ambientais, é gerado sem mão de obra escrava ou infantil, sem gerar maus-tratos aos animais. Uma maneira de fomentar o consumo consciente é por meio da educação. Após a Rio- 92 houve um grande movimento de educação ambiental, e as escolas aderiram a ele em maior ou menor grau, até que se chegasse aos Parâmetros Curriculares Nacionais. O programa Vamos Cuidar do Brasil com as Escolas, do MEC, tem como material básico o livro “CONSUMO SUSTENTÁVEL: Manual de educação”, publicado pelo MMA/MEC/IDEC. (portal.mec.gov.br/dmdocuments/publicacao8.pdf) Referências: LEGAN, L. A escola sustentável: eco-alfabetizando pelo ambiente. 2. ed. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo. MAIA, A.G.; PIRES, P.S. Uma compreensão da sustentabilidade por meio dos níveis de complexidade das decisões organizacionais. Rev. Adm. Mackenzie, v.12, n.3, 2011.

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O Lixo dentro de uma concepção do plano de gerenciamento de resíduos sólidos - PGRS Priscila Bernardes e Ronei Alves “Na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma” (Antoine Lavoisier).

Transformação! A palavra transformação, segundo Ferreira (2008), quer dizer “ato ou efeito de transformar (-se) ou modificação do estado de um sistema”. Com base nessa ideia, convidamos o leitor a transformar sua visão sobre as diversas dimensões que os resíduos sólidos podem assumir. Eles podem ser vistos como desafio latente a ser enfrentado por gestores públicos nos municípios brasileiros, ou os resíduos podem ser vistos com diversas outras interpretações. O que buscamos aqui é mostrar o poder que os resíduos sólidos têm para construir novas visões de mundo. Tudo depende do valor que damos a eles antes de depositá-los nas lixeiras. Aparentemente, para muitas pessoas, os resíduos sólidos são desprovidos de valor. O que na maioria das vezes é visto como um problema, nós desafiamos o leitor a olhar a questão sob outros pontos de vista.

RESÍDUOS SÓLIDOS TRANSFORMAÇÃO Diferentes Olhares Ambiental

Socioeconômico

Cultural e Artístico

Jurídico

Catador

Educador

Diferentes Cenários

Cenário Urbano

Cenário Rural

Transformação de hábitos, Conceitos e Preconceitos

Mesmo Foco

Distrito Federal

A figura acima representa os diversos cenários e olhares que temos que ter em mente quando mencionamos em sala de aula os resíduos sólidos presentes no Cerrado. Hoje ele está presente tanto nas cidades quanto nas áreas rurais e por isso exige um olhar mais integrado e sistêmico. Curiosidade: você sabia que no Brasil, os resíduos orgânicos representam mais da metade de todos os resíduos produzidos?

50%

Materiais Reciclaveis Orgânicos

35%

Recicláveis Secos 45% Plásticos 13% Papéis 4% Vidros 3% Metais

15% Rejeito

Ao olhar os resíduos domiciliares das áreas urbanas e das áreas rurais há de se perceber que eles possuem diferenças em sua composição. Usualmente, nas áreas rurais, a composição dos resíduos é majoritariamente orgânica e também há presença dos resíduos perigosos, tais como as embalagens de agrotóxicos. Este tipo de resíduo tem legislação específica que define o destino final dos resíduos e embalagens. Procure aprofundar-se na questão lendo a Lei nº 9.974, de 6 de junho de 2000.

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Educando pelas Trilhas do Cerrado: um roteiro de ações para a educação ambiental em escolas e comunidades

Na área urbana, devido à facilidade ao acesso aos bens de consumo, observa-se que há presença de muitos materiais recicláveis, tais como: vidros, metais, papeis, plásticos, dentre outros. O aumento na produção de resíduos recicláveis, também denominados de resíduos secos, em áreas rurais também tem crescido. Hoje, mesmo as pessoas que habitam em áreas rurais têm cada vez mais acesso e facilidade aos bens de consumo que geram resíduos após utilizados. Em área urbana ou rural, existem alguns tipos de resíduos que devemos conhecer para separar bem todos eles:

RESÍDUOS VOLUMOSOS

RESÍDUOS SECOS Papéis, plásticos, metais e videos, todos juntos numrecepiente grande e com tampa. devem ser colocados na calçada no dia e horário da coleta seletiva! Confira seu dia no mapa.

Sofás, camas, mesas, cadeiras, colchões, móveis velhos ou pedaços de móveis e eletrodomésticos quebadospodem ser levados até os ECOPONTOS. A OPERAÇÃO CATA-BAGULHO também tem uma programação de coleta desses materiais, aos sábados.

RESÍDUOS ÚMIDOS

ÓLEO DE COZINHA USADO

Sobras de frutas e verduras cruas, guardanapos sujos, cascas de ovos, borra de café e folhas secas. Podem ser compostados nos minhocários e transformados em adubo.

Guarde o óleo de cozinha em uma garrafa com tampa e leve aos pontos de coleta. verifique no mapa os pontos mais próximos da sua residência!

RESÍDUOS PERIGOSOS DE SERVIÇOS DE SAÚDE

RESÍDUOS PERIGOSOS

Entregue medicamentos vencidos, agulhas, ampolas e seringas usadas nas farmácias e Unidades de Saúde. veja no mapa os pontos mais próximos da sua residência!

Eletroeletrônicos, pilhas, baterias e lâmpadas fluorescentes. Separar em local reservado, pois podem causar contaminação do solo e da água, danos à saúde humana e ao meio ambiente, incêndios, corrosão e reações tóxicas, caso não sejam descartados de forma correta. Procure no mapa o local mais próximo para o descarte.

RESÍDUOS DE REFORMAS, PODAS E VOLUMOSAS

VAMOS APRENDER COMO SEPARAR OS RESÍDUOS

Entulho, areia, cimento, azulejos, podas de árvores, madeira, geladeiras, fogões, colchões. Entregue nos ECOPONTOS. Cada pessoa pode descartar gratuitamente até 1m3 de entulho por dia, ou seja,o equivalente a uma caixa d’água de 1.000l.

Resíduos Perigosos

100 l Resíduos Secos

30 l Resíduos Úmidos

Rejeitos

Óleo de cozinha

10 l

Estes são os tamanhos adequados dos recipientes para armazenar os resíduos para descarte.

Fonte: Consumo Sustentável e Ação. Prefeitura de São Paulo, 2008. Realização Instituto 5 Elementos

Agora que apresentamos um pouco mais sobre os vários tipos de resíduos, desafiamos o leitor a olhá-lo de maneira diferenciada, buscando investigar desafios e soluções.

Visão ambiental Desde a extração de matérias-primas para a fabricação de produtos, já temos problemas com a geração de resíduos. É preciso repensar os impactos causados pela geração de resíduos e toda a interferência no meio ambiente. Os resíduos sólidos, se depositados em qualquer lugar e sem cuidados necessários (se não ensacados separadamente entre úmidos, secos e rejeitos depositados dentro das lixeiras), podem provocar graves problemas ambientais. Considerando todos os biomas, principalmente o Cerrado, quem nunca ouviu falar de animais mortos por ingestão de resíduos jogados em matas, estradas, nas ruas? E o fogo causado por resíduos depositados em meio ao cerrado, aquela típica prática de colocar fogo nos resíduos produzidos em casa ou jogar bitucas de cigarros nas matas? Na área rural, o problema é mais grave. Deve-se ficar atento ao manuseio das embalagens de agrotóxicos. Eles devem ter local específico para serem armazenados e devolvidos ao fabricante. Adultos devem manter essas embalagens longe do alcance de crianças! Resíduos depositados na terra em grande volume geram um líquido escuro e mal cheiroso chamado de chorume. Essa substância líquida é resultado da decomposição de matérias orgânicas do lixo e se ele não for tratado, há risco grave de poluição de lençóis freáticos, rios, córregos e demais recursos hídricos (SERAFIM, 2003). Já pensou num grande rio de resíduos? Você gostaria de beber dessa água? Tomar banho com ela? O que você acha de regar as hortaliças com água contaminada? Ou seja, não são os resíduos que provocam danos ambientais, mas sim a falta de cuidado, educação e consciência das pessoas que não destinam seus resíduos para os locais corretos.

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Problematização-Sugestão de trabalhos em sala de aula: Só queria me livrar desta sujeira!

E como você pode auxiliar a minimizar essas questões ambientais que não são causadas diretamente pelos resíduos, mas sim por quem os coloca em lugares errados? É fácil, muito fácil! A primeira ação que você pode ter em mente é contribuir para a realização da coleta seletiva. Separe os seus resíduos em úmidos, secos e os rejeitos dentro da sua casa, no seu local de trabalho, na sua escola. Entregue os resíduos recicláveis para as associações e cooperativas de catadores de materiais recicláveis, caso tenha em sua cidade. O recolhimento dos resíduos nos distritos rurais também é obrigação do poder público! Você já procurou saber se na sua cidade ou na área rural onde você mora existem associações ou cooperativas de catadores de materiais recicláveis? A doação desses materiais recicláveis pode gerar renda para essas associações. Quanto à separação dos resíduos sugerimos a separação em 3 categorias. São elas: lixo seco, lixo úmido e o rejeito. Eles podem ser depositados nos locais corretos indicados pelo serviço de limpeza urbana da sua cidade. Fazendo essa ação você estará contribuindo para o retorno de diversos tipos de materiais para a indústria da reciclagem. Mas perguntamos a você: o que é a reciclagem? De acordo com a Lei 12.305/10, a reciclagem é o “processo de transformação dos resíduos sólidos que envolve a alteração de suas propriedades físicas, físico-químicas ou biológicas, com vistas à transformação em insumos ou novos produtos, observadas as condições e os padrões estabelecidos pelos órgãos competentes do Sisnama e, se couber, do SNVS e do Suasa”. Nesse sentido, notoriamente, os benefícios ambientais a partir da reciclagem são associados minimização dos impactos sobre o meio ambiente a partir da diminuição ao consumo de energia, às emissões de gases de efeito estufa (GEEs), a minimização do consumo de água e à perda de biodiversidade (IPEA, 2010). Por falar em reciclagem, vamos então visualizar a questão dos resíduos sólidos na dimensão socioeconômica?

Visão socioeconômica Despoluir recursos hídricos custa muito dinheiro. A recuperação de áreas degradadas pela disposição final errada de resíduos sólidos também custa caro3 . Fica oneroso aos cofres públicos municipais desentupir bueiros e manter ações de limpeza de bocas-de-lobo entupidas. A destinação e a disposição errada dos resíduos causam prejuízos aos cofres e à saúde pública. No Brasil, segundo o relatório do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - Ipea4, o país perde anualmente R$ 8 bilhões por ano por deixar de reciclar o lixo que hoje vai para lixões e aterros sanitários. Nesse sentido, a coleta seletiva e a reciclagem são elementos fundamentais e indispensáveis ao sistema de gestão integrada de resíduos sólidos não só por questões ambientais, mas também por questões financeiras. O Ipea (2010) afirmou que o país gerava em torno de R$ 12 bilhões por ano com a reciclagem. Olhando pela vertente econômica, resíduos destinados para locais incorretos acarretam danos aos cofres públicos e malefícios para a saúde da população. Se os resíduos forem encaminhados para a destinação correta, automaticamente você estará contribuindo para a geração de emprego, renda e riquezas dentro do país. Olhando pelo viés social, é a partir da reciclagem que, atualmente, se tem a estimativa do Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR)5, o número de 800 mil catadores de materiais recicláveis em atividade no Brasil, entre os quais 70% são mulheres e em sua maioria, pertencentes à raça negra. Assim, quando você destina seus resíduos para o local correto, você auxilia na inserção socioprodutiva dos catadores de materiais recicláveis6.

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Online. Fundação Estadual do Meio Ambiente. Disponível em: . Acesso em 29.03.2015

Online. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Pagamento por Serviços Ambientais Urbanos para Gestão de Resíduos Sólidos. Disponível em: . Acesso em 29.03.2015

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5 Online. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Pagamento por Serviços Ambientais Urbanos para Gestão de Resíduos Sólidos. Disponível em: . Acesso em 29.03.2015

Você pode assistir ao vídeo: Prêmio reconhece boas práticas de inclusão de catadores de materiais recicláveis. Disponível em: e o catador Tião Santos https://www.youtube.com/watch?v=p1knM0h1ZE0. Acesso em: 31.03.2015

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Ainda há que se destacar que atualmente é possível o poder público municipal contratar as associações e cooperativas de catadores com dispensa de licitação para coleta, processamento e comercialização de resíduos sólidos urbanos recicláveis ou reutilizáveis, em áreas com sistema de coleta seletiva de lixo7 .Caso você resolva estudar mais sobre os benefícios econômicos da reciclagem, você poderá verificar o quanto reciclar economiza em consumo de recursos naturais – principalmente na minimização da extração de matérias-primas da natureza - e gasto de energia. Ah! E se você for um pouquinho mais curioso, não deixe de ler esse artigo: O Cinismo da Reciclagem8. Problematização-Sugestão: colocar desenhos ou fotos dos problemas e soluções destacados acima. Ex: a importância dos catadores/ o quanto o país perde em dinheiro por não reciclar/geração de emprego e renda a partir da reciclagem. Para representar essa realidade o professor pode buscar fotografias de catadores no lixão, foto de catadores e de cooperativas e fazer perguntas que estimulem a reflexão da turma, como, “qual é o melhor lugar para se trabalhar?”

Reciclagem

Ambientalmente e socioeconomicamente já ressaltamos algumas questões dos resíduos sólidos. E quanto a outros aspectos, é possível ter uma visão cultural e artísitca a partir do lixo nosso de cada dia?

Online. BRASIL, 2007. LEI Nº 11.445, de 5 de Janeiro de 2007. Disponível em: ou Lei Nº 8.666, de 21 de Junho de 1993. Disponível em: . Acesso em 31/03/2015.

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Online. LAYARGUES, Philippe (2002). O Cinismo da Reciclagem: o significado ideológico da reciclagem da lata de alumínio e suas implicações para a educação ambiental. Disponível em: .

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Visão Cultural - Artística O lixo e a arte também são companheiros! É possível criar verdadeiras obras de arte a partir do lixo. Este, já serviu de inspiração para diversas artes do movimento, dentre as quais podemos citar: a dança, música, teatro, cinema, poesia, dentre outras. Também já serviu para inspirar as artes estáticas, onde se tem: arquitetura, pintura, escultura, fotografia, dentre outras. Atualmente, é possível encontrar vários artesãos que utilizam o “lixo” como matéria-prima para suas criações. Não deixe de visitar o site Fala Cultura onde você poderá ver obras incríveis a partir de objetos que podem ser reaproveitados com outra finalidade. O documentário sobre o trabalho no maior lixão da América Latina ficou conhecido mundialmente em 2011, graças ao brilhantismo da arte do artista plástico Vik Muniz por meio do documentário Lixo Extraordinário. Porém, antes desse documentário, outros cineastas já haviam divulgado trabalhos a partir do descarte de resíduos sólidos. Ilha das Flores, documentário do cineasta Jorge Furtado, de 1989, já abordada a questão de desigualdades sociais e catação de resíduos. Temos também um dos mais importantes documentaristas do Brasil, Eduardo Coutinho, que produziu Boca de Lixo em 1993 sobre catadores de materiais recicláveis de São Gonçalo/RJ; Estamira, foi outro documentário brasileiro dirigido por Marcos Prado em 2005 e que retratou a vida de uma catadora de materiais recicláveis do lixão de Jardim Gramacho e recebeu vários prêmios; o documentário A Margem do Lixo de 2008 dirigido por Evaldo Mocarzel também traz uma notoriedade sobre a vida e rotina dos catadores de papel e materiais recicláveis na cidade de São Paulo. Destaque para o documentário francês “Os catadores e eu” (Les Glaneurs et la Glaneuse), de AgnèsVarda lançado em 2000 e internacionalmente agraciado por críticas muito positivas. Na literatura é possível garimpar ótimos livros que retratam a relação entre os resíduos e pessoas que sobrevivem deles, tais como: Quarto de Despejo: Diário de uma favelada9 , dentre outros.

Visão Jurídica No Brasil desde a década de 1980 já existiam legislações que mencionavam a importância do cuidado com a disposição final dos resíduos. Citaremos alguns marcos normativos de suma importância que aborda a questão de resíduos sólidos. Começamos por ressaltar a nossa Carta Magna - Constituição Federal 1988 que no Capítulo VI, dedicado ao Meio Ambiente, Art. 225 que “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.” Abaixo estão destacadas outros marcos regulatórios que destacam a questão dos resíduos sólidos importantes de serem conhecidos: Lei Nº 6.938, de 31 de Agosto de 1981: Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências; Lei Nº 9.605, de 12 de Fevereiro de 1998: Dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências; Decreto Nº 5.940, de 25 de Outubro de 2006: Institui a separação dos resíduos recicláveis descartados pelos órgãos e entidades da administração pública federal direta e indireta, na fonte geradora, e a sua destinação às associações e cooperativas dos catadores de materiais recicláveis, e dá outras providências; Lei nº 11.445, de 5 de Janeiro de 2007: Estabelece diretrizes nacionais para o saneamento básico; altera as Leis nos 6.766, de 19 de dezembro de 1979, 8.036, de 11 de maio de 1990, 8.666, de 21 de junho de 1993, 8.987, de 13 de fevereiro de 1995; revoga a Lei no 6.528, de 11 de maio de 1978; e dá outras providências; Lei Nº 12.305, de 2 de Agosto de 2010: Institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos; altera a Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998; e dá outras providências; JESUS, Carolina Maria de. Quarto de despejo – diário de uma favelada. São Paulo: Ática, 1993. Série Sinal Aberto.

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A Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS demorou 21 anos para ser aprovada no Congresso Nacional. Um dos seus principais objetivos destaca a “não - geração, redução, reutilização, reciclagem e tratamento dos resíduos sólidos, bem como disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos.” Outro artigo que merece atenção é sobre a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos que destaca as “atribuições individualizadas e encadeadas dos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, dos consumidores e dos titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos, para minimizar o volume de resíduos sólidos e rejeitos gerados, bem como para reduzir os impactos causados à saúde humana e à qualidade ambiental decorrentes do ciclo de vida dos produtos, nos termos desta Lei.” Como se pode perceber, toda a sociedade é responsável pela geração, destinação e disposição final dos resíduos sólidos. Cumpre ressaltar que no Brasil, durante a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (Cnumad), realizada em junho de 1992 no Rio de Janeiro, a discussão sobre minimização de resíduos foi mais difundida com a Agenda 21 (www.mma.gov.br/responsabilidade-socioambiental/agenda-21). A importância do trabalho realizado pelos Catadores de Materiais Recicláveis foi e está sendo cada dia mais evidenciada dentro dos marcos legais. E os resíduos, como são vistos por esses atores? Problematização-Sugestão: aulas utilizando vídeo-documentários e as leis abordadas.

Visão de Catador de Materiais Recicláveis O trabalho realizado pelos catadores de materiais recicláveis é antigo. Atualmente, esse trabalho tem tido mais visibilidade devido a aprovação da Lei 12.305/10. Mas o fato é que o trabalho realizado pelos catadores aumentou a vida útil de vários lixões e aterros sanitários do país, uma vez que milhares de toneladas de materiais recicláveis que seriam simplesmente enterrados, desprovidos de valor econômico, aumentando “as montanhas de lixo” e os problemas ambientais já existentes, foram retirados a tempo, separados (triados) e vendidos para a indústria da reciclagem. O trabalho dos catadores reforça o retorno dos materiais recicláveis ao ciclo produtivo da reciclagem, trazendo valor econômico aos materiais que poderiam ser apenas vistos como rejeito (lixo) e teriam ficado perdidos nos lixões e aterros sanitários do país demorando muitos e até milhares de anos para se decomporem. Como citado nos objetivos da PNRS, esse trabalho tem o papel importante, uma vez que ele reforça a proteção ambiental; a importância da limpeza pública; a cadeia da reciclagem e a geração de trabalho e renda. O centro da atenção é a efetiva implementação da PNRS com a coleta seletiva sendo executada em todos os municípios brasileiros, o apoio para a construção de centrais de triagem destinada aos catadores para que eles tenham melhores condições de trabalho e a destinação de todos os resíduos secos provenientes da coleta seletiva disponibilizada nas centrais de triagem, reforçando a gestão integrada de resíduos sólidos. Na visão dos catadores, cada material reciclável significa trabalho e renda. Um dos aspectos mais importantes destacados na fala de Ronei Alves (Catador de Material Reciclável) é que não há necessidade de aumentar a quantidade de materiais recicláveis descartados para aumentar a renda dos catadores. A grande importância está na qualidade do material destinado para as cooperativas e associações dos catadores de materiais recicláveis. Para melhorar a vida dos catadores é necessário que a população se conscientize da importância do resíduo separado corretamente e quando possível, limpo. Lembre-se: O reflexo do trabalho dos catadores de materiais recicláveis, muitas vezes, chamados erroneamente de catadores de lixo, traz significantes melhorias para a gestão dos resíduos sólidos e, consequentemente, minimiza a poluição ambiental, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida urbana e rural. Os catadores de materiais realizam um importante papel às cidades, pois prestam um serviço ambiental à população ao retirar sucatas, restos de obras depositados em terrenos baldios e embalagens das ruas que poderiam agravar o problema de entupimento de bueiros (como já vimos ocorrer em Brasília).

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De todas as questões relacionadas anteriormente, uma delas merece um destaque especial, pois é a base necessária para que ocorra uma verdadeira transformação na maneira com que as pessoas lidam com os resíduos sólidos. Ela é a educação! Problematização-Sugestão: conhecer o PGRS elaborado por seu município, se ele existe. Discutir sobre o papel da escola na não geração ou segregação correta de resíduos. Outra visão de educação e resíduos sólidos: Pode ser vista nos instrumentos educacionais minhocário e compostagem apresentados na parte 2 desse livro. A perspectiva da criação de novas atitudes sociais com o intuito de prevenir os impactos ambientais advindos do consumismo exarcebado é possível por meio da TRANS-FORM-AÇÃO de nossos conceitos, preconceitos e hábitos em relação ao lixo que produzimos todos os dias! É a nossa ação com o descarte dos resíduos que pode melhorar a nossa própria qualidade de vida! É necessário transformar nossos hábitos e mudar atitudes! Você já foi instigado a olhar para o lixo sob tantos aspectos diferentes? Qual outra visão que como educador você considera importante ser tratado com relação aos resíduos que não foram tratados nesse capítulo? Repense os resíduos produzidos por você em sua casa, no local de trabalho, estudo, região. Exercite sua imaginação e busque ferramentas adequadas para tornar algo que lhe incomode em relação ao lixo em algo produtivo, dinâmico, inovador. Referências: HOFFMANN, W.A.; MOREIRA, A.G. The Role of Fire in Population Dynamics of Woody Plants. In: OLIVEIRA, P.S.; MARQUIS, R.J. (Eds.) The Cerrados of Brazil: Ecology and Natural History of a Neotropical Savanna. Nova York: Columbia University Press, 2002. FERREIRA, A.B.H. O Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. Edição eletrônica autorizada à POSITIVO INFORMÁTICA LTDA.Editora Positivo, 2008. SERAFIM, A.C.; GUSSAKOV, K.C.; SILVA, F.; CONEGLIAN, C.M.R.; BRITO, N.N.; SOBRINHO, G.D.; TONSO, S.; PELEGRINI, R. Chorume, Impactos Ambientais e Possibilidades de Tratamentos. Disponível em: http://ftp-acd.puc-campinas.edu.br/pub/ professores/ceatec/demanboro/Material10%2805Out%29/Tratamento_Chorume.pdf INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA – IPEA. Pesquisa sobre Pagamento por Serviços Ambientais Urbanos para Gestão de Resíduos Sólidos – PSAU. Brasília, 2010.

Novo Código Florestal e implicações em sala de aula Andréia Andrigueto, Maria Tereza Montalvão, Bruna Cardoso, Virgílio Braz O objetivo deste capítulo é fomentar a discussão em sala de aula, apresentando dois conceitos de preservação específicos do Código Florestal: a Reserva Legal e as Áreas de Preservação Permanente. E como a partir deles podemos refletir sobre as relações legais e ecológicas envolvidas. Outro aspecto, envolve a metodologia que escolhemos para apresentar as informações. Optamos por envolver duas disciplinas: as Ciências Biológicas e a Engenharia Florestal de maneira que o trabalho interdisciplinar possa trazer elementos novos para a reflexão de forma transversal com áreas específicas do saber. Também procuramos nos basear na apresentação do tema central de maneira simples, contextualizada, sem um rebuscamento técnicocientífico inicialmente. Como objeto estimulador do pensamento crítico, nos inspirando também, no trabalho de Saito et al (2012) “Imagem como ponto de partida para uma educação ambiental dialógico-problematizadora”, que utiliza do recurso “fotografia” para instigar a reflexão do professor e do aluno em alguns aspectos que serão elencados na discussão do tema central, como: a importância da preservação da vegetação nativa e suas relações sinérgicas com outros temas, como a da extinção de espécies da fauna, por exemplo.

Iniciando a discussão do Código-a importância das relações Entendemos como vegetação nativa para fins deste capítulo os remanescentes intactos da flora a serem identificados e preservados em propriedades rurais ou urbanas que desenvolvem atividade rural. Esse conceito é importante para situarmos o leitor a respeito da importância dessas áreas para a conservação da vida, possível somente com a manutenção das florestas, da água, do solo e das relações entre os diversos recursos presentes nas propriedades e entorno. Ao contrário da flora, a fauna representada por animais que rastejam, voam, nadam, pulam, correm, caminham locomove-se em outros territórios. Enquanto aves migratórias percorrem longos quilômetros atrás de alimento e locais mais aquecidos, as árvores não podem correr do fogo ou da geada. Por isso precisam adaptar-se a condições presentes em seu território.

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Pensemos na relação das plantas com seu território. As árvores são fixas geograficamente, limitadas territorialmente por raízes10. Elas precisam adaptarem-se às condições onde estão, desenvolvendo soluções para sobreviverem. No Cerrado, são as cascas e folhas grossas que evitam a perda d´água das plantas. E mais, sementes e gramíneas “adormecem” para rebrotar quando as condições se tornarem propícias. Nessas duas situações, observa-se relações de profunda dependência e sinergia. Os animais dependem das árvores, arbustos e espécies rasteiras para abrigo, alimento, reprodução. Nelas protegem-se de predadores, fazem seus ninhos, buscam suas presas ou outros alimentos (folhas, flores, néctar, frutos), camuflam-se para fugir de inimigos ou como forma de alimentarem-se (ver imagens abaixo). É nesse sentido que preservar a flora é também preservar os animais que dela dependem.

Bicho-pau. Foto: Wikimedia Commons / CC-BY-SA 3.0

Anfíbio camuflado

Referências: http://www.infoescola.com/biologia/camuflagem-e-mimetismo. imagem de anfíbio: Disponível em: http://www.ich.pucminas.br/pged/db/wq/cb/2007-1/2-4/index.htm. imagens de aranhas. Disponível em :https://yupi3000.wordpress.com/2008/09/10/aranhas-camufladas.

Aranha camuflada com as cores da pétala. Foto: Hannes Mitchell

Aranha camuflada atacando sua presa após confundi-la. Foto: Américo Rui Pacheco

As primeiras regras referentes ao uso do solo e a exploração florestal no Brasil datam do período colonial, quando diversas normas foram estabelecidas para manter o estoque de madeira para utilização geral. Em 1934, por meio do Decreto 23.793 foi instituído o primeiro Código Florestal Brasileiro que iniciou o conceito de florestas protetoras. Nessa época, porém o foco versava na questão de disponibilização madeireira para assegurar o fornecimento de recursos para fins energéticos. Já a Lei Federal 4.771 de 1965 com suas posteriores medidas provisórias e alterações criou o conceito de Áreas de Preservação Permanentes (APP´s) e as Reservas Legais (RL´s) trazendo uma visão mais conservacionista para o código, ao estabelecer restrições para o uso da propriedade em termos ambientais.

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Entretanto ocorre a dispersão de sementes através do vento, da própria força de gravidade e por meio da ação de animais que carregam os frutos, além dos agentes polini-



zadores que visitam as flores permitindo assim a troca de características genéticas entre plantas localizadas em distintos territórios.

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Em 24 de agosto de 2001, o Presidente da República, no uso da atribuição que lhe confere o art. 62, e tendo em vista o disposto no art. 225, § 4o, da Constituição, adota a seguinte Medida Provisória, M.P No 2.166-67 com força de lei, e apresenta importantes definições quanto à áreas destinadas à preservação de remanescentes de vegetação nativa no Brasil. Em seu Art. 1o, apresenta os seguintes entedimentos: III - Reserva Legal: área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, excetuada a de preservação permanente, necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à conservação e reabilitação dos processos ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora nativas; Os outros capítulos da MP incluem ainda outras questões que envolviam as RL, como os percentuais que incluemse no código vigente. A saber: Art. 16. As florestas e outras formas de vegetação nativa, ressalvadas as situadas em área de preservação permanente, assim como aquelas não sujeitas ao regime de utilização limitada ou objeto de legislação específica, são suscetíveis de supressão, desde que sejam mantidas, a título de reserva legal, no mínimo: I - oitenta por cento, na propriedade rural situada em área de floresta localizada na Amazônia Legal; II - trinta e cinco por cento, na propriedade rural situada em área de cerrado localizada na Amazônia Legal, III - vinte por cento, na propriedade rural situada em área de floresta ou outras formas de vegetação nativa localizada nas demais regiões do País; e IV - vinte por cento, na propriedade rural em área de campos gerais localizada em qualquer região do País. Quanto à localização da reserva legal, “esta devia ser aprovada pelo órgão ambiental estadual competente (o que ocorre até hoje), ..., devendo ser considerados, no processo de aprovação, a função social da propriedade, e os seguintes critérios e instrumentos, quando houvesse: I - o plano de bacia hidrográfica; II - o plano diretor municipal; III - o zoneamento ecológico-econômico; IV - outras categorias de zoneamento ambiental; e V - a proximidade com outra Reserva Legal, Área de Preservação Permanente, unidade de conservação ou outra área legalmente protegida” (Brasil, 2001). A ainda uma segunda definição importante apresentada pela M.P No 2.166-67, de 2001, que diz respeito a: II - área de preservação permanente: área protegida ..., coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas; A M.P No 2.166-67, de 2001, passou a admitir pelo órgão ambiental competente, que as APPS pudessem entrar no cálculo da porcentagem de RL necessária, mas desde de que novas áreas não fossem destinadas para o uso alternativo do solo. Em 25 de maio de 2012, com a entrada em vigor da Lei 12.651, no Código Florestal mantiveram-se normas gerais sobre a proteção da vegetação nativa e outras disposições referentes as áreas de preservação, mas houve um tratamento diferenciado sobre instrumentos e critérios das Reservas Legais-RLs no Brasil. Em termos de Reserva Legal, a conta continua sendo 80% do total da propriedade mantida como RL se estiver localizada na Amazônia e 20% de RL se fora do bioma Amazônico (aí compreendidos o Cerrado, a Caatinga, os Campos Sulinos, a Mata Atlântica). Caso a propriedade esteja localizada geograficamente na Amazônia Legal11 devem ser preservados 35% em fisionomias de Cerrado. Em outras palavras, caso o Cerrado exista numa região de predominância de vegetação amazônica (como as áreas de transição), deve-se preservar uma proporção maior do que em outras regiões do país. Por esses cálculos e retrocedendo um pouco na regulamentação das reservas legais no Brasil, pode-se ter o entendimento de que as áreas de RL são fundamentais para a preservação dos biomas brasileiros, pois seus parâmetros versam sobre a localização da RL nos biomas. Extrai-se assim, que espécies de dada região (endêmicas) poderiam assim ser protegidas por meio desse arcabouço legal.

Preservar RL é = a conservar o bioma



Área de transição entre o bioma Cerrado e Amazônia, território que compreende outros biomas fora o Amazônico e abarca ao todo 9 estados nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

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Por outro lado, quando se trata de APP é necessário levar em consideração os diferentes critérios para estabelecer sua existência. As APP´s podem ocorrer associadas aos recursos hídricos, como nascentes, margens de córregos e rios, veredas, ou ligadas a declividade do solo e altitudes. As APPs hídricas são entendidas como remanescentes de vegetação nativa que protegem nascentes, cursos d´água, áreas alagadas e veredas. Os outros “tipos” de APPs existem em razão de outros fatores que justifique o termo “preservação permanente”, como por exemplo: a declividade do terreno (em áreas acima de 45º de declividade equivalente a 100% na linha de maior declive), altura do terreno (se situado acima de 1800m), áreas de borda de chapada e áreas de topo de morro, além das áreas de manguezais e restingas.

Preservar APP é = a conservar água, solo, qualidade de vida A Preservação dessas áreas irá influenciar positivamente a qualidade e manutenção dos recursos hídricos e bacias hidrográficas. Com a aprovação do Código Florestal em 2012 e a partir do avanço das geotecnologias, ferramentas que possibilitam a análise e modelagem de dados espaciais, criam-se instrumentos para monitorar as áreas de remanescentes de vegetação nativa nas propriedades rurais e urbanas. Problematizando: Professor, a Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012, o atual Código Florestal , dispõe sobre a proteção da vegetação nativa e dá um importante passo para que o governo federal gerencie e fiscalize remotamente áreas protegidas ou restritas no Brasil. O instrumento utilizado para isso é o Cadastro Ambiental Rural (CAR) que com sua implantação permitirá que os processos de licenciamento ambiental, créditos rurais e transmissão de títulos sejam facilitados por vincular a propriedade ao Órgão Ambiental responsável. Áreas de vegetação nativa e Reservas Legais passaram a ter a seu favor ferramentas de SIG12 e sensoriamento remoto13 para localizá-las espacialmente e quantificá-las para sua inserção no sistema e regularização. O processo de registro das RL, antes chamado de averbação, ocorria documentando-se a existência daqueles percentuais anteriormente descritos (de 80%, 35% ou 20%) na matrícula da propriedade em cartório. Item que passou a ser substituído por processos digitais (por programas baixados na rede de computadores). Áreas a serem preservadas (RLs, APPs, remanescentes de vegetação nativa) passaram a ser identificadas por imagens de satélite nas propriedades rurais, assim como áreas consolidadas, reservatórios artificiais, lagoas naturais e nascentes que precisaram ser também demarcadas por exigência da nova lei.

Conhecendo e aplicando a lei Para a reflexão, indicamos um estudo publicado pela ONG internacional WWF que buscou modelar o uso das terras agrícolas no Brasil. Segundo o estudo, em nosso país há cerca de 537 milhões de hectares de remanescentes de vegetação natural. Desse número, apenas 59 milhões de hectares (11%) atenderiam aos critérios de áreas de preservação permanente quando na verdade, este número deveria ser próximo dos 103 milhões de hectares (fonte: http://www.wwf.org.br/wwf_brasil/24940/ Estudos-ressaltam-importancia-ambientaldo-Codigo-Florestal, 2010.) Será que estamos assegurando o direito das presentes e futuras gerações a um meio ambiente ecologicamente equilibrado? Será que estaremos preservando o suficiente para resguardá-las, como preceitua o art. 225 da Constituição Federal Brasileira?

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SIG: Sistemas de Informações Geográficas que através de procedimentos computacionais permite a analise, manipulação e representação do espaço e seus fenômenos.

Sensoriamento Remoto: conjunto de técnicas que possibilita a obtenção de informações de objetos na superfície terrestre por meio de registros de sua interação com os diferentes tipos de radiação eletromagnéticas. 13

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Dos serviços ecossistêmicos prestados pelas florestas- incluídas nesse rol as APPS e RLs, Fasiaben et al. (2011) destacam a possibilidade do uso sustentável nas RL, de explorar as espécies nativas lá existentes. Ou seja, a existência da Reserva Legal fomenta e monitora projetos destinados à conservação, proteção e regularização, visando o equilíbrio ambiental, podendo ser utilizada para fins sustentáveis (a extração de produtos florestais e a passagem de animais na área são alternativas) sendo vedadas atividades como a supressão de toda a vegetação na área, exploração para fins comerciais entre outros. Uma das alterações mais evidentes ao longo dos anos em relação as mudanças nos códigos florestais foi a medida provisória 2.166/67, de 2001 que passou a exigir a manutenção, em todas as propriedades rurais, de áreas a título de reserva legal, excluídas as APPs, nas proporções colocadas e ainda válidas no atual Código Florestal: “80% para as áreas de Floresta na Amazônia, 35% para as áreas de Cerrado na Amazônia e 20% para as demais regiões do Brasil”. Em casos especiais em que não se encontra o mínimo exigido para esse cálculo, é possível computar APPs para compor RL. Pelo entendimento da lei, ainda é possível: 1. Recompor a RL na propriedade, mediante o plantio de espécies nativas; 2. Conduzir a regeneração da vegetação natural da RL; 3. Compensar a RL fora da propriedade (BRASIL, 2001 apud Fasiaben et al. 2011 ). De acordo com o Código de 1965, a compensação de RL era possível desde que ocorresse no mesmo ecossistema e na mesma microbacia hidrográfica. Hoje, o Código tornou-se mais flexível, indicando que a esta compensação pode ocorrer no mesmo bioma sem a necessidade de estar inserido na mesma bacia, estendendo as possibilidades de recuperação ambiental. Ao aplicar a lei, destacamos o cálculo que os proprietários devem fazer para estabelecer os percentuais mínimos de RL exigidos. Deve ser feito em cima da área líquida da propriedade (devem ser descontadas, portanto estradas estaduais ou federais que passem no limite ou dentro das áreas, bem como linhas de transmissão, obras públicas no interior da propriedade e outras atividades declaradas como de interesse social pelo Poder Público, chamadas como ‘áreas de servidão administrativa’). Por outro lado, há outros serviços ambientais existentes motivados pela presença de demais áreas de preservação nas propriedades. De acordo com a Lei 12.651/12 as APPs compreendidas ao redor de nascentes, cursos de rio, áreas alagadas visam preservar a biodiversidade, os recursos naturais, o solo, o fluxo gênico (Freitas et al 2013), a qualidade da água (Roquim & Filho, 2009). Essas questões ambientais, possibilitam e potencializam o uso do solo para demais questões, como para a agricultura. A existência de APP na lei federal ocorre de acordo com alguns requisitos: 1. São consideradas APP´s convencionais as faixas de proteção de recursos hídricos de acordo com as tabelas abaixo: Tabela 1

Tabela 3

Faixas de APP para diferentes larguras de rios Largura do Rio

Faixade APP

Até 10 m

30m

De 10m a 50m

50m

De 50m a 200m

100m

De 200 a 600m

200m

De 200 a 600m

500m

Faixa de APP para lagoas naturais Lagoas naturais Em áreas rurais Em áreas urbanas

Tabela 2

Faixade APP

* Qualquer que seja seu diâmetro

50m, no mínimo

30 m, no mínimo 100m, no mínimo

Tabela 4

Faixa de APP para nascentes Existência da nascente

Faixade APP

Faixa de APP para lagoas naturais Reservatórios artificiais

Faixade APP

As faixas de APP são definidas em licenças ambientais expedidas pelo órgão ambiental

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2. Um outro tipo de APP está vinculado ao gradiente das vertentes (declividade das encostas) onde declividades acima de 45 graus devem ser consideradas áreas de proteção permanente. Topos de morro com altura mínima de 100m e inclinação média superior a 25 graus, regiões acima de 1800m de altura independente de sua vegetação predominante também são consideradas áreas de APP. 3. Outras situações específicas como veredas acima de 50m de largura e outros tipos de áreas alagadas como manguezais, também são consideradas APP´s e receberam regras especificas para atividades comerciais. É importante ressaltar que pelo atual código, é permitida a supressão de vegetação em APP´s em casos de ser declarada como de utilidade pública ou de interesse social. Além disso, o novo código não proíbe, e sim, restringe atividades em áreas com inclinação entre 25 e 45 graus, mediante Plano de Manejo Florestal aprovado pelo Órgão Ambiental. Professor, como sugestão para a sala de aula, procure baixar imagens de propriedades rurais próximas à escola. Considerando a dificuldade de se trabalhar em ferramentas de programas técnicos de georreferenciamento, indicamos ao professor o Google Earth ou Google Earth Pro como ferramentas fáceis e acessíveis para baixar imagens de municípios, locais vizinhos à escola ou bairro de alunos para poder trabalhar a questão de preservação de vegetação nativa. Caso queira visualizar como o CAR funciona, ressaltamos o cuidado e atenção em não fornecer, gravar e enviar informações de teste ao sistema. Ressaltamos que o CAR deve ser utilizado exclusivamente para o cadastro de áreas por quem detem a posse, titularidade da propriedade ou por cadastrantes treinados e habilitados para tal. Cuidado para não enviar informações ao sistema. Sugerimos a sua utilização apenas como consulta à legislação em www.car.gov.br. O Google Earth e o Google Earth Pro já forneceram imagens suficientemente boas para o trabalho de visualização de remanescentes de vegetação nativa. Observe os rios limítrofes à escola ou que passam pela escola, reflita sobre os riscos e oportunidades de se conscientizar proprietários vizinhos sobre a preservação de APPs, nascentes e da qualidade dos rios para usufruto dos alunos da escola. Outra forma de abordar isso é fazer essa atividade conjunta com os alunos como, dar uma área, mapeada e solicitar que observem a área. Posteriormente as percepções e observações empíricas dos alunos darão lugar aos conceitos de área consolidada, degradada, remanescente de vegetação nativa, APP, RL. Para concluir, reflita em sala de aula sobre as características que foram observadas para cada área e propostas reais para reverter situações de degradações existentes. Busque para isso- fazer parcerias, motive colaboradores para a causa!

Conclusão Esse capítulo traz ao professor e educador ambiental, elementos para fortalecer o discurso de preservação ambiental em salas de aula. E nesse caminhar, percorrer alguns conceitos, trajetórias legais que motivem pequenos, médios e grandes produtores rurais a preservarem a vegetação nativa em suas propriedades. O papel do professor nessa intermediação é fundamental, para que seja possível preservar a “floresta em pé’, a água, a fauna existente, o solo e a qualidade de vida das presentes e futuras gerações. O nosso objetivo é facilitar o entendimento, retirar dispositivos da lei para desmistificar que a preservação é algo difícil, complicado ou inalcançável. Além da preservação dessas áreas ser uma exigência legal, há muitos aspectos sociais e ecológicos envolvidos que justificam o cuidado dentro e fora das salas de aula, com práticas criativas, e outras formas de olhar para a questão da preservação ambiental no Brasil.

Referências Saito, C.H; Lunardi, D.G; Porto, C.B; Germanos, E.; Saito, I.T.; Barbosa, R.G. Imagem como ponto de partida para uma educação ambiental dialógico-problematizadora. Revista Espaço e Geografia, vol.15, n. 2, 491-516. 2012. Brasil, Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012, que dispõe sobre Proteção da Vegetação Nativa e dá outras providências. Brasil, MEDIDA PROVISÓRIA No 2.166-67, DE 24 DE AGOSTO DE 2001. Altera os arts. 1o, 4o, 14, 16 e 44, e acresce dispositivos à Lei no 4.771, de 15 de setembro de 1965, que institui o Código Florestal, bem como altera o art. 10 da Lei no 9.393, de 19 de dezembro de 1996, que dispõe sobre o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural - ITR, e dá outras providências. Revogado pela Lei nº 12.651, de 2012.

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FREIRE, P. Extensão ou comunicação? Rio de Janeiro: Paz e Terra, 93p. 1969. FREITAS, E.P, MORAES, J. F.L, FILHO, A.P., STORINO, M. Indicadores ambientais para áreas de preservacão permanente. Revista Brasileira de Engenharia Agricola e Ambiental. 17.4 (Apr. 2013): p443.Disponível em: http:// www.agriambi.com.br/. Acesso em 28 Apr. 2015. FASIABEN, M.C.R. et al. Impacto econômico da reserva legal sobre diferentes tipos de unidades de produção agropecuária. Rev. Econ. Sociol. Rural, Brasília , v. 49, n. 4, p. 1051-1096, Dec. 2011. Disponível em . Acesso: 28 Apr. 2015 RONQUIM, C.C, FILHO R.A. Limitação ao uso agrícola da propriedade rural pela instituição da reserva legal florestal.Ver.Uniara, v. 12, n. 2, dez. 2009. Disponível em: http://www.alice.cnptia.embrapa.br/handle/doc/874419. Acesso: 28 Apr. 2015. VIEIRA, Raphael Ricardo Menezes Alves. Matas ciliares como área de preservação permanente. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3725, 12 set. 2013. Disponível em: . Acesso em: 26 maio 2015. Rede de Sementes do Cerrado - Projeto Semeando o Bioma Cerrado 2013-2015. Projeto apresentado à Petrobras Ambiental.

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II PARTE

A segunda parte deste livro abrange os capítulos de 9 e10 e apresenta a descrição de instrumentos e metodologias utilizados nas oficinas de educação ambiental do Projeto Semeando o Bioma Cerrado, com sucesso, na difusão do conhecimento de temas variados, além de permitir a interação do ser humano com a natureza e melhor compreensão da biodiversidade.

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CAPÍTULO 8 Instrumentos de Educação Ambiental Usados nas Oficinas Equipe da AAF e colaboradores As sugestões de atividades com propostas de transversalidade apresentadas nesta publicação apontam ao professor uma forma de estruturar o trabalho no sentido de permitir o desenvolvimento dos princípios básicos da educação ambiental. Para isso, preconiza-se a inclusão dos mais variados temas e a utilização de dinâmicas e metodologias atraentes, em que o aprender a fazer fazendo incorpora valores éticos e cooperativos, despertando nas crianças e nos jovens o sentimento de pertencimento ao bioma onde vivem. A implementação da Agenda 21 na escola/comunidade e a criação de uma horta pedagógica como instrumentos básicos podem desencadear questões diversas que possibilitam a reflexão sobre as especificidades de cada tema/ disciplina, permitindo a observação de como esses temas se relacionam. Muitos professores ainda se perguntam o porquê de se trabalhar a educação ambiental na escola e, principalmente, como. Nossas sugestões de Agenda 21 e horta pedagógica têm o objetivo de estimular o professor a buscar a interdisciplinaridade por meio da realização de projetos com a integração da comunidade à escola e da valorização das diferentes linguagens no processo educativo. Para sensibilizarmos os indivíduos para essas questões, é preciso criar elos afetivos com o meio e perceber a natureza – ao mesmo tempo forte e frágil. Como? com a prática da observação e do questionamento; com a percepção dos inter-relacionamentos e dos ciclos; com o planejamento por meio de projetos; por meio de oficinas de vivências práticas de educação ambiental que fortaleçam o projeto para a preservação do Bioma Cerrado e sensibilizem crianças, jovens, professores e lideranças comunitárias, pois transmitem conhecimentos sobre o Bioma Cerrado, estimulam a curiosidade infantil pelos fenômenos naturais, situam as crianças e os jovens no seu universo natural, estimulam o desenvolvimento de capacidades de observação, incentivam o trabalho cooperativo, promovem o uso de tecnologias da comunicação em educação, despertam o sentimento de “pertencimento” ao meio ambiente. Semear ideias e valores nas oficinas é fundamental para que brotem no interior de cada um as perguntas básicas mobilizadoras das transformações comportamentais: Afinal, o que estou fazendo de errado? Como posso minimizar o impacto de minhas ações e do meu estilo de vida sobre o meio ambiente? Por que o tema ambiental é importante? Por que devo colaborar com essa causa?

Descrição dos instrumentos sugeridos DVD-ABCerrado Utilizado graças a parceria da Rede de Sementes do Cerrado com a professora Rosângela da Faculdade de Educação/UnB, responsável por sua produção. Rosângela Azevedo Corrêa

ABCerrado Os livros didáticos não servem como fonte inspiradora de práticas educativas quanto às questões ambientais, especialmente quanto ao Cerrado. Isso porque são essencialmente informativos e poucos contribuem para a formação de atitudes positivas em relação ao Cerrado. Além disso, muitos trazem informações equivocadas e até preconceituosas a respeito do Cerrado. Uma constatação importante é que a Floresta Amazônica é o bioma brasileiro mais citado nos livros didáticos de geografia e ciências e está relacionado às questões ambientais como desmatamento, poluição,

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queimadas, caça predatória e preservação da biodiversidade. Por sua vez, o Cerrado quase nunca está relacionado a tais temas nem a outros que transmitam afeição e preocupação com a natureza. Normalmente é um bioma ligado às questões climáticas e às atividades agropecuárias, frequentemente com um enfoque meramente econômico, sem que nenhum impacto seja relacionado. Contudo, em relação às atividades agropecuárias no Cerrado, vale lembrar que, como observa Medeiros (1998), apesar de a modernização da agricultura, em especial da cultura da soja, ter contribuído para a elevação do PIB agrícola, também contribuiu substancialmente para a deteriorização do meio ambiente, ocasionando perda da biodiversidade, erosão, compactação dos solos e contaminação do ambiente por agrotóxicos. Além disso, o rápido progresso econômico da região ocasionou fortes implicações sociais, não garantindo a distribuição equitativa dos resultados do crescimento nem o abastecimento de alimentos no Brasil, acentuando o êxodo rural para as cidades (DUARTE, 1998). Não se trata de questionar a importância da Amazônia no contexto socioambiental brasileiro, mas de explicar o motivo pelo qual o Cerrado é desprezado, quando em realidade é um ambiente de marcante beleza cênica e riquezas naturais. Em relação à diversidade biológica, notou-se que a flora do Cerrado, como a brasileira de modo geral, é praticamente ignorada, enquanto a flora domesticada é dominante nos livros didáticos. Nenhuma espécie vegetal brasileira, muito menos nativa do Cerrado, é apresentada considerando as possibilidades de seu uso econômico, aspecto bastante explorado nas pesquisas atuais sobre o Cerrado (ALMEIDA, 1998). Em relação aos animais, a fauna exótica, especialmente a africana, recebe especial destaque. Apesar de várias ilustrações contemplarem a fauna brasileira, poucas informações adicionais são dadas sobre os animais do Brasil e praticamente nenhuma relação é estabelecida entre os animais e o Cerrado. Este fato contribui para o desconhecimento generalizado da população brasileira sobre a fauna nativa e pode refletir sobre o interesse dos estudantes no Cerrado (BIZERRIL; ANDRADE, 1999). Outras ilustrações tratam de temas ambientais que também podem ser relacionados ao Cerrado, como hidrelétricas, a questão indígena, morte de animais silvestres e êxodo rural. Apesar de os livros não fazerem referência nem relacionarem essas ilustrações ao Cerrado, é possível fazer conexões em sala de aula desde que o professor tenha domínio sobre o assunto, a fim de identificar quando e como poderá realizar essas ligações. Sem competência para abordar o tema, o professor pode possivelmente perder essas oportunidades. Curiosamente, com todos os aspectos desfavoráveis dos livros didáticos em relação ao Cerrado, há pouco uso de livros paradidáticos pelos professores. Isso talvez ocorra porque livros dessa natureza são pouco frequentes no mercado, apesar de alguns estarem disponíveis especialmente no DF, como é o caso das publicações da Embrapa. Entretanto, ocorre que essas publicações parecem ser pouco acessíveis aos professores e aos alunos do ensino fundamental tanto pela circulação restrita como pela linguagem técnica dos textos. Alguns professores nos indicaram a falta de material educativo sobre o Cerrado como um entrave para o desenvolvimento do tema na escola. Conforme afirma Bezerril (2001, p. 33): A revisão dos atuais livros didáticos em relação a sua abordagem sobre o Cerrado assim como a produção de livros paradidáticos voltados para a conservação do Cerrado se fazem necessárias para subsidiar a ação do professor: tanto como uma fonte de informações pouco divulgadas ao grande público como para fomentar o debate acerca dos impactos causados pelos modelos de desenvolvimento estabelecidos na região, visando a mudanças futuras e à formação de atitudes positivas em relação ao Cerrado. As informações científicas produzidas nas universidades brasileiras são técnicas e de difícil compreensão para os leigos. Com isso procuramos oferecer no DVD Alfabetização Ecológica: ABCerrado, disponível neste livro, um leque de informações gerais sobre o Cerrado para que os professores possam elaborar um projeto de educação ambiental que envolva todos os atores da escola numa perspectiva transversal e interdisciplinar. O Método da Educação Ambiental e Ecologia Humana é uma construção dinâmica que incorpora elementos de Pedagogia Vivencial e Simbólica e pesquisa-ação, traduzindo-os de forma particular para o contexto das ações de sensibilização e mobilização social e a construção de processos de criação coletiva, conforme o texto

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que apresentamos no centro da mandala no DVD. Ao redor da mandala apresentamos textos e vídeos sobre a fauna, a flora, as águas, o solo, o fogo e os impactos da ação humana no Cerrado, mas queremos destacar que nesse bioma existe gente como os povos tradicionais: vazanteiros, geraizieros, quilombolas, veredeiros, raizeiros, ciganos, quebradeiras de coco, extrativistas, comunidades ribeirinhas e os povos indígenas, como Avá-canoeiros, Xavantes, Karajás, Xerentes, Tapuias, Javaés, Timbiras, Kayapós, Bororos, Krahos, Xacriabás. Os saberes-fazeres dos povos do Cerrado possuem uma relação direta, prática e emocional com a natureza. A diversidade biológica do Cerrado, ainda pouco estudada pelos cientistas, é mutuamente dependente da diversidade cultural local, o que constitui hoje um patrimônio biocultural do Brasil. Existe um Cerrado profundo (parafraseando o antropólogo mexicano Guillermo Bonfil) que precisa ser reconhecido e valorizado na e pela sociedade brasileira, caso contrário, esses povos continuarão na marginalidade, na exploração, na injustiça e na falta de reconhecimento dos seus direitos coletivos. O Cerrado possui uma rica sociobiodiversidade e uma eco-história que não são reconhecidas nem valorizadas quer pelas políticas de proteção ambiental, quer pelas próprias populações que nele habitam, especialmente as urbanas. Com isso, neste DVD pretendemos contribuir para a form-Ação dos participantes de uma comunidade – professores, mães e pais das famílias locais, estudantes, lideranças locais, agentes ambientais, funcionários municipais, etc. – para elevar o conhecimento sobre o Cerrado e valorizar a riqueza da sua sociobiodiversidade e/ou compartilhar informações sobre esse ecossistema, revertendo a médio e a curto prazos os efeitos de devastação que podem ser detectados no presente em nível local, enquanto ainda podemos fazer alguma coisa pela nossa casa: o Cerrado. Partimos da ideia de que uma educação deve se dar por meio da natureza; em vez de a escola simplesmente ensinar as leis e os conceitos sobre a natureza, ela deve aproximar-se do postulado da ecoformação, que sustenta o entendimento de que a natureza possui uma dimensão formadora. Isso subverte a forma de tratar a relação ser humano/natureza no cerne de um processo educativo: não se trata de educar o ser humano para o domínio e a apropriação da natureza, mas de educar a humanidade para ser capaz de trocar e de aprender com a natureza. O DVD também oferece planos de aula prontos de acordo com o alfabeto de plantas e animais do Cerrado e a matomática (a matemática do mato); além de informações nos seguintes tópicos: glossário, projetos, biblioteca, música, vídeos, links de instituições públicas e privadas que trabalham com a questão ambiental, assim como modelos de oficinas que poderão ser incluídas nos planos de aula. Reafirmamos a necessidade de produzir materiais didáticos que popularizem os novos conhecimentos sobre o meio ambiente em linguagem acessível, porém sem perder o compromisso com o rigor científico, como é o caso deste livro. Por intermédio deste DVD, temos a oportunidade de transmitir conhecimentos técnico-científicos e humanos para serem aplicados no espaço da escola e multiplicados posteriormente no ambiente comunitário para que possamos construir um mundo mais fraterno, humano, solidário.

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Bibliografia BIZERRIL, M. X.; ANDRADE, T. C. S. Knowledge of urban people about fauna: comparison between Brazilian and exotic animals. Ciência & Cultura Journal of Brazilian Association for the Advancement of Science, v. 51, n. 1, p. 38-41, 1999. BIZERRIL, Marcelo Ximenes. O Cerrado e a escola: uma análise da educação ambiental no ensino fundamental do Distrito Federal. Tese (Doutorado em Ecologia). Brasília, Universidade de Brasília, Departamento de Ecologia, 2001. BOFF, Leonardo. Saber cuidar: ética do humano, compaixão pela terra. Petrópolis:Vozes, 1999. CAPRA, Fritjof. A teia da vida: uma nova compreensão dos sistemas vivos. São Paulo: Cultrix, 1997. CARVALHO, Isabel Cristina Moura. Educação ambiental: a formação do sujeito ecológico. São Paulo: Cortez, 2004. . Educação, natureza e cultura: ou sobre o destino das latas. In: ZARZKZEVSKI, S.; BARCELOS, V. (Org.). Educação ambiental e compromisso social: pensamentos e ações. Erexim: Edifapes, 2004. p. 163-174. CORREA, Rosângela A. Caderno do professor: Cerrado. Projeto Tom da Mata. Rio de Janeiro: Fundação Roberto Marinho; Instituto Antônio Carlos Jobim; Furnas, 1999. DUARTE, L. M. G. Globalização, agricultura e meio ambiente: o paradoxo do desenvolvimento do Cerrado. In: DUARTE, L. M. G.; BRAGA, M. L. S. (Org.). Triste Cerrado: sociedade e biodiversidade. Brasília: Paralelo 15, 1998. p. 11-22. GADOTTI, Moacir. Pedagogia da Terra. São Paulo: Peirópolis, 2000. QUINTAS, José Silva. Educação ambiental e cidadania. Ciclo de Palestras sobre Meio Ambiente. Brasília: MEC; Secretaria de Educação Fundamental, 2001. p. 41-46. SÁ, Lais Mourão; CORREA, Rosângela. O que é educação ambiental e ecologia humana. Brasília: Universidade de Brasília; Faculdade de Educação; Programa de Educação Ambiental e Ecologia Humana, março, 1998 (mimeo). SECRETARIA DO MEIO AMBIENTE DE SÃO PAULO. Conceitos para se fazer educação ambiental. São Paulo: Coordenadoria de Educação Ambiental, 1997

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EcoMuseu do Cerrado

Rosângela Azevedo Corrêa O Cerrado não são apenas árvores retorcidas, é o segundo maior bioma da América do Sul, com uma área de aproximadamente 2 milhões de metros quadrados, correspondente a 24% do território brasileiro, o que equivale à Espanha, à França, à Alemanha, à Itália e ao Reino Unido juntos. A área contínua do Cerrado estende-se sobre os Estados de Goiás, Tocantins, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Bahia, Maranhão, Piauí, Rondônia, Paraná, São Paulo e Distrito Federal, além de encraves no Amapá, em Roraima e no Amazonas. Segundo Barbosa (2014), o Sistema Biogeográfico do Cerrado, que ocupa desde a aurora do Cenozoico até a parte central da América do Sul, também é conhecido como o “berço das águas” ou a “cumeeira” do continente porque é distribuidor das águas que alimentam as grandes bacias hidrográficas da América do Sul: Amazônica-Tocantins, São Francisco e Prata e das águas subterrâneas do imenso aquífero Guarani, que vai de Mato Grosso ao extremo Sul do país. A localização central do Cerrado, combinada com a elevação topográfica e a alta concentração de nascentes, favorece a biodiversidade, onde estão concentradas 5% da flora e da fauna mundiais, com 12.365 espécies de plantas nativas catalogadas, 199 espécies de mamíferos, 837 de aves, 1.200 de peixes e 330 de répteis e anfíbios, 13% dos tipos de borboletas, 35% de abelhas e 23% de cupins dos trópicos, mas apesar dessa riqueza é um dos biomas mais ameaçados do Brasil. A vegetação original do Cerrado está cedendo espaço para plantios de soja, algodão e cana-de-açúcar, além de pecuária extensiva, geração de energia e urbanização. Saem do Cerrado 25% da produção nacional de grãos, quatro de cada dez cabeças do rebanho bovino e metade das quase 10 milhões de toneladas de carvão vegetal produzidas por ano no país para abastecer as grandes siderúrgicas. A lei brasileira permite, em média, o desmate de oito em cada dez hectares das propriedades rurais no Cerrado, enquanto na Amazônia é permitido desmatar dois em cada dez hectares de floresta. Enquanto um proprietário de terras é obrigado a proteger 80% da floresta se sua fazenda estiver na Amazônia, no Cerrado essa porcentagem cai para 35% (se esse Cerrado estiver incluído na Amazônia legal) e 20% nas demais localidades. A consequência do desmatamento no Cerrado é perda da biodiversidade, ocupação desenfreada, expansão do agronegócio, empobrecimento do solo, emissão de gás carbônico na atmosfera, alterações climáticas, queimadas e incêndios florestais, erosões e o aumento nas emissões de gases de efeito estufa, responsáveis pelo aquecimento global, entre outros. O Cerrado tem apenas 8,21% do seu território protegido em Unidades de Conservação como parques nacionais e estaduais, estações biológicas e ecológicas, além de terras indígenas. Além disso, 137 espécies da fauna estão ameaçadas de extinção, segundo o Ministério do Meio Ambiente. Junto a toda a riqueza do Cerrado convivem diferentes populações humanas, como os povos tradicionais, que incluem os povos indígenas, quilombolas, camponeses, geraizeiros, vazanteiros, veredeiros, pescadores, sertanejos, ribeirinhos, raizeiros, etc. Não somente as paisagens, mas também os modos de vida de suas populações estão ameaçados. As transformações no Cerrado e a necessidade de preservar sua riqueza ambiental e sociocultural desafiam universidades, promotores culturais, movimentos sociais e poder público a defenderem o patrimônio material e imaterial, por esse motivo decidimos criar o EcoMuseu do Cerrado Laís Aderne.

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Origem do Ecomuseu do Cerrado O conceito de ecomuseu surgiu na década de 1970, inicialmente na França, pela necessidade de uma nova visão de museu como uma instituição com função social para a comunidade e que valorizasse a cultura material e imaterial, sem deixar de considerar as necessidades econômicas e as organizações sociais. Um “ecomuseu” é o modelo contemporâneo de museu, seguindo os atuais paradigmas científico-filosóficos em oposição ao modelo tradicionalista cartesiano. Esta referência ao termo “ecomuseu” foi feita por Poujade durante a 9a Conferência Geral do Icom (Conselho Internacional de Museus), mas o criador da palavra “ecomuseu” teria sido Hugues de Varine ou Georges Henri Rivière. Esta nova concepção de museus teve a contribuição de Varine, que incorporou a dimensão ecológica à concepção dos museus (“museu ecológico”) no sentido de aliar ser humano, natureza e um território sobre o qual vive uma população. De acordo com Rivière, o conceito de ecomuseu é evolutivo, e como tal não pode ser definido de forma estática, deve acompanhar a evolução da sociedade e ser uma instituição dinâmica. Ele caracterizava o ecomuseu como um museu de um novo gênero, tendo por base três noções: a interdisciplinaridade baseada na ecologia/união com a comunidade e a participação dessa comunidade na sua construção e no seu funcionamento (trecho extraído do Projeto Ecomuseu, Pedra Fundamental, apresentado ao MPU em maio de 2013 – Irineu Tamaio). Em 1997, o Ecomuseu do Cerrado surgiu por intermédio do Instituto Huah do Planalto Central, agregando educadores, ecologistas e organizações governamentais e não governamentais, inspirado em similares existentes na Europa, no Canadá e nos Estados Unidos. Sete municípios do Entorno do DF integraram o Ecomuseu: Abadiânia, Águas Lindas, Alexânia, Corumbá de Goiás, Cocalzinho, Pirenópolis e Santo Antônio do Descoberto, numa área de cerca de 8 mil quilômetros quadrados. Mais que um museu ao ar livre, a proposta era desenvolver linhas de ação em espaços rurais e urbanos, de predomínio do Bioma Cerrado, contemplando um vasto programa nas áreas de educação, ecologia, cultura e economia autossustentável. O Projeto Ecomuseu do Cerrado tinha por objetivo construir uma coalizão social dos sete municípios que constituem seu território visando à conservação da natureza, ao uso sustentável dos recursos naturais e à distribuição equitativa das riquezas geradas pela sociedade. A metodologia de trabalho empregada no projeto foi o planejamento e a gestão biorregional, indicada para os projetos biorregionais, ecorregionais, corredores ecológicos e bacias hidrográficas. O Instituto Huah quis contribuir para o desenvolvimento autossustentável do Planalto Central por meio de ações sistêmicas desenvolvidas no projeto do EcoMuseu. A idealizadora do Projeto EcoMuseu do Cerrado foi Laís Aderne, mineira, natural de Diamantina, pintora, gravadora, professora, arte-educadora e curadora. Em 1956 iniciou estudos na Escola de Belas-Artes de Belo Horizonte e concluiu seus estudos na Enba sob a orientação de Osvaldo Goeldi, no Rio de Janeiro, em 1961. Trabalhou na Escolinha de Arte do Brasil, onde organizava cursos de gravura, pintura e desenho para adolescentes e adultos. Entre os anos de 1964 e 1967 viajou a estudos para a Espanha com bolsa do governo espanhol. De volta ao Brasil, transfere-se para Brasília, onde cursou a pós-graduação na área da educação e em 1989 assumiu a função de secretária da Cultura do Distrito Federal. Foi professora na Universidade de Brasília; criadora do curso de Educação Artística na Universidade Federal da Paraíba; criadora da Feira do Troca de Olhos D’Água, no município de Alexânia-GO, em 1974; diretora da Escolinha de Arte do Brasil; diretora teatral e autora de arte e educação da comunidade. Foi presidente do Instituto Huah do Planalto Central e é quem nos inspirou na construção do EcoMuseu do Cerrado, por este motivo queremos prestar-lhe uma homenagem por ter sido uma celebração permanente do cerrado e suas culturas.

Ecomuseu do Cerrado Laís Aderne A ideia é que toda ação/projeto individual, coletivo ou institucional para a conservação e a preservação da sociobiodiversidade faça parte desse museu, que será do tamanho do Cerrado, pois entendemos que ele transpõe muros e se torna um espaço/território para que as comunidades se encontrem e se expressem no seu habitat, constituindo-se em uma rede diversificada de sonhos e ações. Para isso, cada membro do EcoMuseu irá mostrar sua leitura sobre o Cerrado, divulgando suas atividades, como calendários culturais com apresentações musicais, saraus, rodas de poesia, exposições de artesanato e artes visuais, trilhas, oficinas educativas, piqueniques, recreação, seminários, pesquisa, publicações, oficinas, lançamento de livros e debates sobre os fazeres culturais da sua região. Dessa forma as pessoas poderão visitar os diferentes locais do EcoMuseu, além da divulgação de conhecimentos sobre a sociobiodiversidade do Cerrado.

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O que se espera do Ecomuseu do Cerrado Laís Aderne Um ecomuseu é um espelho no qual a população olha para si mesma para se reconhecer. Um espelho que essa mesma população estende a seus hóspedes, para se fazer melhor entender no seu trabalho, seus comportamentos, sua intimidade. É um museu vivo do homem, de sua cultura e da natureza onde está inserido. Não se trata de um simples museu ao ar livre. Trata-se de 0um museu descentralizado, dinâmico, constituindo-se em uma rede diversificada ligada à história social, às realizações e aos anseios dos seus habitantes (INSTITUTO HUAH DO PLANALTO CENTRAL, s/d). É o lugar onde se encontram aqueles que agem sobre o ambiente, aqueles que sofrem sua ação e aqueles que refletem sobre ele; é uma exigência de emanação de uma comunidade de vizinhança que é simultaneamente sujeito e objeto; é uma comunidade com um objetivo: o desenvolvimento dessa comunidade, e uma pedagogia ampla que se apoia no seu patrimônio natural e cultural, no tempo e no espaço; é um modelo de organização cooperativa com vistas ao desenvolvimento de um processo crítico de avaliação e de correção contínuas; é um exercício de cidadania para a construção da identidade por meio de um profundo senso de lugar e de continuidade histórica; é uma instituição que estuda e explora com fins científicos, educativos e culturais o patrimônio material e imaterial de uma determinada comunidade, que compreende o ambiente natural e cultural de um lugar, e emprega todos os recursos e métodos de que dispõe para que se apreenda, analise, critique e domine de maneira livre e responsável os problemas que se apresentem em todos os domínios da vida; é um espaço/tempo de pedagogia integradora, experimental e de pesquisa em processo contínuo com a realidade local; é um centro gerador de ideias e de formação humana, assegurando projetos multidisciplinares e transculturais de solidariedade e intercâmbio entre os seres humanos; é um local de preservação cultural e ambiental da região do EcoMuseu do Cerrado; é um núcleo gerador de integração de saberes e difusão de conhecimentos, com foco no desenvolvimento sustentável embasado nas culturas locais; é um laboratório humano de criação e superação individual e coletiva na perspectiva da harmonia e do bemestar do ser humano e do seu ambiente em processo de estudo/reflexão contínuo; é um trabalho de preservação e reencontro de identidades para a promoção da educação ambiental e patrimonial.

Objetivos do Ecomuseu do Cerrado Resgatar a história das cidades e a eco-história do Cerrado, tendo como foco a educação ambiental e a ecologia humana, incentivando a visão sistêmica sobre as inter-relações entre sociedade, cultura e natureza; contribuir para preservar, conservar e resgatar o Sistema Biogeográfico do Cerrado e sua identidade cultural, com base no planejamento biorregional e por meio de ações planejadas cooperativamente, voltadas para a conservação do Cerrado e o uso sustentável dos recursos naturais; preparar os professores para assumirem os novos paradigmas da educação, que pressupõem a integração entre o Fazer, o Pensar e o Sentir para interagir com as comunidades locais; promover a preservação patrimonial – natural, material e imaterial – a partir de acervos bibliográficos, videográficos, fonográficos e monográficos; divulgar pesquisas sobre o Cerrado do ponto de vista histórico, social, cultural, ambiental, geográfico, biológico, arqueológico e geológico; resgatar a memória pessoal, social, ambiental e a identidade das comunidades/cidades por meio do diálogo de saberes e a manutenção e a valorização de seus fazeres, saberes e tecnologias, atentos ao envolvimento, à inclusão e à interação das diversidades; partilhar e trocar sementes, receitas, remédios e conhecimentos entre as comunidades/cidades; verificar as vocações profissionais para formar recursos humanos e estimular a produção local para o ecoturismo;

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sensibilizar as comunidades quanto ao ambiente em que moram e mostrar que sua produção tem valor socioambiental para garantir a melhoria da qualidade de vida das populações locais; gerar conhecimento transdisciplinar por meio de atividades e pesquisa nas áreas de cultura, educação, sociedade e natureza, tecnologias tradicionais e contemporâneas para criar multiplicadores para uma ecologia ambiental, humana, social e planetária; construir uma rede de especialistas de diferentes áreas do conhecimento, não somente doutores, mas também grandes mestres com outros níveis de conhecimento não acadêmico. O EcoMuseu do Cerrado Laís Aderne é uma nova abordagem da museologia, ao mesmo tempo em que é um desafio conceitual voltado para a tríade território, patrimônio e comunidade, em que os recursos naturais e culturais são valorizados e assegurados por meio de um ambiente equilibrado, da identidade cultural e da autoestima da população. A natureza e a cultura devem ser trabalhadas como fatores de identidade comum para o Cerrado e também devem ser encaradas como mananciais de recursos que contribuirão para a sobrevivência e a melhoria da qualidade de vida desta e das futuras gerações. O Ecomuseu não terá um único prédio senão que sem paredes, ele ficará hospedado no site do Museu Virtual de Ciência e Tecnologia da Universidade de Brasília, que é um espaço de divulgação científica que, na internet, traz exposições, atividades lúdico-educativas e conteúdos sobre ciência e tecnologia. Dessa forma as pessoas do Brasil e do mundo inteiro poderão visitar nossos museus sem sair de casa. O endereço é: . Acreditamos, como Laís Aderne, que “o EcoMuseu do Cerrado será o maior museu aberto do mundo”.

Agenda O mais poderoso meio de comunicação é, sem dúvida, a conversação, portanto incentive o aluno a tirar suas dúvidas sempre antes de iniciar uma tarefa, conversando com o coordenador. Para isso, é bom criar um espaço de conversação.

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O que vamos agendar Meio ambiente A Carta de Terra, já na época de seu lançamento, afirmava, e continua válida sua constatação, que “este é um momento crítico na história da Terra, com um superaquecimento global e tantos desastres provocados pelo uso errado que o ser humano faz dos recursos naturais. Estamos em uma época em que a humanidade deve escolher seu futuro, pois existem benefícios na natureza que nascem para assegurar a sobrevivência humana no planeta, onde não existem proprietários, somos todos partes integrantes desse universo”. Cerrado O Bioma Cerrado é um desses benefícios que vêm sendo depredados, apesar de ser o berço das águas de todo o Brasil. É preciso que cada um assuma a responsabilidade por sua proteção, tomando atitudes respeitosas em sua rotina de vida. Começando pela escola – agenda escolar lixo seletivo; água; luz; papel; jardim; reaproveitamento de materiais; alimentação saudável; conduta ética; eventos comemorativos; arrecadação de fundos para a caixa escolar. O trabalho de implementação da Agenda 21 nas escolas visa a tratar do tema meio ambiente no atual contexto da globalização, considerando a importância dada ao assunto nos dias atuais, com o chamado desenvolvimento sustentável, noção associada à ideia de incorporar a questão ambiental à economia. Desse modo, deve-se tratar dos principais problemas ambientais, relacionados ao esgotamento do modelo desenvolvimentista, buscando conectar o assunto meio ambiente ao contexto econômico presente, que aponta para uma situação de globalização, com o auxílio da produção científica já existente sobre o tema. Fonte: A proposta de Agenda 21 Escolar, aqui apresentada com seu passo a passo, é o resultado de um trabalho feito pela Secretaria de Educação do Estado da Bahia, que, por sua qualidade, tem servido como orientação para as ações desenvolvidas pela Associação dos Amigos das Florestas (AAF), adaptada para o Projeto Semeando o Bioma Cerrado, podendo igualmente ser ajustada aos problemas enfrentados por qualquer escola que se propuser a realizá-la.

Agenda Escolar

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Agradecemos aos técnicos da Secretaria de Educação do Estado da Bahia (SEC-BA) pela disponibilização deste trabalho na internet pelo site , contribuindo assim para a difusão da importância da Agenda 21 Escolar em comunidades diversas.

O Que é a Agenda 21 Escolar?

A Agenda 21 Escolar é a formatação do texto com base na Agenda 21 Local para aplicação no meio de influência da escola, tanto nos recintos escolares como no meio familiar e social onde tal influência é exercida. Visa, da mesma forma que as demais agendas, à sustentabilidade social e econômica, atendendo às necessidades humanas para uma vida digna, e à proteção do meio ambiente, tanto o ambiente utilizado pelos cidadãos como aqueles formados pelos ecossistemas da região.

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Requisitos básicos para a elaboração da Agenda 21 Escolar Adoção de uma metodologia de trabalho que deverá ser buscada por consenso entre representantes do estabelecimento escolar, dos alunos, da coletividade em sua área de influência, do poder público e de organismos não governamentais, voluntários, técnicos, líderes comunitários e religiosos, em reuniões previamente designadas para tal fim. Realização de pesquisas para apurar os problemas existentes na área de atuação da Agenda, englobados os problemas de saúde da população local, de degradação do meio ambiente ou riscos ambientais, de segurança, problemas sociais diversos, como desemprego, alcoolismo, uso de drogas, etc. Avaliação técnica, por pessoal habilitado, e consenso popular, por meio de reuniões, das soluções para estancar, reverter ou pelo menos amenizar os problemas, buscando os meios de sustentabilidade econômica da população, a melhora de sua qualidade de vida e a melhoria ambiental, com preservação de áreas, melhoria dos elementos já implantados e, essencialmente, educação de cunho social e ambiental. Apuradas as ações necessárias, verificar os respectivos custos e os meios de financiamento. Envolvimento do poder público, por meio das negociações necessárias, na busca de soluções para os problemas de sua exclusiva competência e para que colabore com a solução de outros que estejam dentro de suas obrigações governamentais “A escola é uma comunidade que tem influência efetiva não apenas dentro de seus muros, nos momentos de instrução a seus alunos, mas também em toda a comunidade, formada pelos respectivos familiares e moradores de seu entorno” (autor desconhecido). A Agenda 21 Local é um processo de desenvolvimento de políticas de ações para o desenvolvimento sustentável e de construção de parcerias entre a escola, a comunidade, autoridades e lideranças locais, entre outros, para implementá-la. A implantação da Agenda 21 Local não é um único acontecimento, documento ou atividade, e sim um processo contínuo no qual a comunidade aprende sobre suas deficiências e identifica inovações, forças e recursos próprios ao fazer as escolhas que a levarão a se tornar uma comunidade sustentável. Uma Agenda 21 Local bem-sucedida mobilizará consciências e granjeará apoio público e vontade política para fazer essas escolhas. É essencial que seus objetivos estejam sempre absolutamente claros para todos os envolvidos no processo. Sua base é a criação de sistemas de gerenciamento que levem o futuro da sobrevivência humana no planeta em consideração. Não há uma “receita” pronta, mas existem ingredientes comuns em todas as experiências bem-sucedidas. Tomemos como exemplo o envolvimento da comunidade; a identificação das principais questões e das metas para a área; os objetivos explícitos para o meio ambiente como indicadores de qualidade de vida; a organização de setores com definição de quem fará o que e quando; a determinação de formas de avaliação do desempenho e do progresso alcançado; a execução de projetos piloto que possam ser postos em prática rapidamente para se tornar exemplos na comunidade. É importante lembrar que a Agenda 21 não dever ser apenas um documento, e sim um marco no processo de busca da sustentabilidade. Esse gerenciamento deverá: ser um projeto de destaque da escola, inserido no projeto pedagógico; integrar planejamento e políticas; envolver todos os setores da comunidade escolar e do seu entorno; focalizar resultados no médio e no longo prazos.

Implementação da Agenda 21 Escolar Crie um ambiente positivo. Tenha respeito por seus companheiros e por todas as formas de vida na terra. A colaboração é um esporte coletivo. No grupo, todos possuem inteligência, e na vida poucas atividades exigem apenas um tipo. Todos são iguais e têm direito ao mesmo tratamento, detendo os mesmos direitos e deveres. Todos fazem parte de uma equipe, que é um conjunto de pessoas organizadas para atingir objetivos comuns. Um grupo torna-se equipe quando todos os membros são interdependentes, ou seja, usam as habilidades, as competências e os recursos de todos os seus membros para planejar suas atividades com o intuito de obter os melhores resultados, com disciplina. Nesse caso, disciplina é o domínio de si mesmo para ajustar sua conduta às exigências do trabalho e de convivências próprias do grupo. Assim, observe o horário para o início das atividades, lembrando que você faz parte de uma equipe. As ordens determinadas devem ser seguidas com atenção. Promova a mobilização dos setores da sociedade que de alguma forma possam auxiliar na concretização dos projetos relativos à solução dos problemas detectados. Dar andamento às ações de correção, reversão e erradicação de tais problemas.

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Elaboração prática da Agenda 21 Escolar – passo a passo 1º passo: realizar fórum, convocado de maneira oficial, para início dos trabalhos de implementação da Agenda 21 do estabelecimento educacional em que for implantada. Nesse fórum deverão ser escolhidos os participantes da respectiva comissão, que será presidida por um coordenador técnico, com o resumo dos trabalhos anotados por um relator. A comissão deverá contar, na medida do possível, com elementos da escola – tanto do corpo discente como do corpo docente –, da comunidade, do poder público, das lideranças locais, de entidades não governamentais. 2º passo: buscar a participação popular para o fórum e as reuniões periódicas da Agenda, para o auxílio na detecção de problemas e em sua erradicação ou minimização. Buscar o auxílio dos órgãos de imprensa para apoio educacional e jornalístico e de órgãos do poder público ligados aos problemas apontados. 3º passo: promover ações na escola, envolvendo os alunos, para pesquisar situações prejudiciais ou degradantes. 4º passo: elaborar concursos de redação e poesia sobre temas correlatos, tais como: “Como posso colaborar para que minha escola e meu bairro melhorem”; gincanas educativas e construtivas; jogos cooperativos; atividades que possam despertar o sentimento de amor pela comunidade e de patriotismo, como ações voluntárias de ajuda. 5º passo: trabalhar com ações práticas e economicamente viáveis em um processo de educação ambiental entrelaçado com criação de hortas comunitárias, hortas individuais, coleta seletiva de lixo, comercialização do lixo reciclável, economia de água e luz, reaproveitamento de materiais diversos, consumo consciente, cursos sobre compostagem dos resíduos orgânicos e sua aplicação nas hortas comunitárias ou individuais, saneamento e tratamento de resíduos nas áreas rurais. 6º passo: identificar os temas que serão incluídos no documento inicial a ser elaborado pela comissão escolhida e que se chamará “Agenda 21 Escolar”, devendo esses temas ser identificados pela comissão e pela comunidade participante do fórum. Os temas não deverão ultrapassar 10 ou 12, para que não se impossibilite a realização de tarefas em todas as frentes. É conveniente que sejam escolhidos especialistas ou professores das respectivas áreas para que, de início, façam um relatório da situação atual da comunidade a ser trabalhada, ou seja, o cenário inicial dos trabalhos, assim como um cenário do passado e uma projeção de um cenário ideal em um determinado prazo, cinco anos, por exemplo, dando publicidade a esse levantamento. 7º passo: elaborar projetos e/ou planos estratégicos, ou seja, discriminar, passo a passo, as atividades necessárias à realização dos objetivos previstos em cada um dos temas selecionados para a Agenda, com cálculo de custos e de recursos tanto materiais como humanos. 8º passo: implementar, de forma prática, etapa por etapa, o que foi previsto nos projetos e/ou planos estratégicos, que são os processos de organizações para definir seus rumos por meio de um direcionamento que possa ser monitorado nas suas ações concretas, além de angariar os recursos necessários com base no plano de ação para que atenda às necessidades de cada etapa em andamento.

Acompanhamento dos trabalhos Reuniões periódicas dos coordenadores dos projetos implantados, sugerindo-se que ocorram mensalmente para troca de informações e experiências, que serão levadas aos respectivos fóruns permanentes. Realização periódica de seminários e cursos de atualização e capacitação para os participantes efetivos e demais interessados, buscando envolver o pessoal dos órgãos governamentais, como o Ministério do Meio Ambiente, secretarias estaduais de Meio Ambiente e Saúde, administrações regionais e as regionais de Educação, além de órgãos de proteção à infância e à adolescência, entre outros.

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Lembre-se de que: A Agenda deverá ter sempre em mira a sustentabilidade econômica da comunidade, a preservação de Unidades de Conservação e do Bioma Cerrado, com o cunho permanente de educação individual, familiar, social e ambiental, sob o enfoque das ações previstas na Agenda; o trabalho cooperativo, a criação de núcleos de apoio social, o fortalecimento das lideranças comunitárias. A Agenda 21 nunca termina: ela é sempre reconstituída, reconstruída, repassada, corrigida em fóruns de discussão e de acordo com a avaliação dos rumos dos trabalhos, as fontes de financiamento, as parcerias, novos problemas que possam surgir, novas soluções encontradas, etc. A Agenda deverá estar sempre aberta à participação de todos os membros da comunidade, do poder público, da imprensa, de entidades de apoio, de patrocinadores, enfim, de todos – quem pretende servir, quem recebe apoio humano, material ou financeiro. A Agenda poderá ter início com ações de menor impacto, dependendo de suas possibilidades, sendo enriquecida posteriormente pela experiência dos participantes. O sucesso da implantação da Agenda 21 Escolar depende apenas do empenho das pessoas que a apoiarem, e no âmbito de influência de cada escola, da disposição da administração (direção, corpo docente e funcionários) de ver os resultados da Agenda como benefício para a comunidade escolar e para a comunidade influenciada – alunos, familiares e coletividade, incluindo o povo, a nação, o país e, por extensão, todo o planeta Terra, nosso lar comum na imensidão infinita do cosmos. As mãos que se puserem à obra plantarão milhares de sementes para reflorestar a vida.

Avaliação da Agenda Escolar O alcance dos objetivos da Agenda 21 Escolar poderá ser medido pelos seguintes resultados: redução do consumo de água e de energia; redução de gastos com telefones; redução de material de limpeza; redução de cópias xerox; redução de papel; campanhas sociais para doação do lixo para cooperativas de catadores; promoção de eventos culturais na escola/comunidade; incorporação da educação humanitária; mudança de comportamento nas relações humanas e com o meio ambiente; mudança de hábitos alimentares; manutenção de hortas e jardins nas escolas.

Fonte: Secretaria de Educação do Estado da Bahia (SEC-BA). Disponível em: .

Instrumento: horta pedagógica “Uma horta é uma festa para os cinco sentidos: boa de cheirar, ver, ouvir, tocar e comer. É coisa mágica, erótica, o cio da terra provocando o cio dos homens” (Rubem Alves, “O quarto do mistério”). Com a introdução da educação ambiental como tema transversal e/ou como disciplina específica no currículo escolar, são necessárias a criação de ambientes mais flexíveis e, principalmente, a sensibilização do professor para esse trabalho. A proposta é criar na escola um espaço que se pretende interativo. A horta pedagógica permitirá às crianças um contacto mais direto com aspectos da natureza, estimulando uma aprendizagem ativa e uma maior consciência ecológica. No cotidiano do trabalho, em uma horta é possível promover condições de observação, análise, experimentação, reflexão, levantamento de hipóteses, sistematização e outras possibilidades que o contato com a terra faculta. É uma excelente oportunidade para o desenvolvimento de conceitos e práticas ambientais, convidando o participante a cultivar experiências únicas, com resultados sempre surpreendentes.

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O que é uma horta pedagógica? laboratório de biologia; laboratório de matemática; instrumento de iniciação científica; campo de atividade física em grupo; campo de produção alimentícia.

E se a escola não tem terreno para o plantio? Quando não há espaço físico para o plantio de uma horta, pode-se trabalhar com diversas opções de formato e com hortaliças que se multiplicam por mudas, feitas em pequenos canteiros chamados de sementeiras, ou recipientes tipo bandejas de isopor ou copinhos de plástico ou em outros materiais encontrados na natureza. Para preencher a sementeira e os recipientes, a mistura deve ser feita com terra de mata ou esterco e areia, peneirados e misturados. As mudinhas também devem ser pulverizadas com caldas naturais, como, por exemplo, com uma mistura feita de água, fumo de rolo e álcool.

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Horta pneu A iniciativa de utilizar pneus como canteiros é bem-vinda, pois a retirada desse lixo das ruas diminui focos de dengue, evita sua queimada e traz a certeza do consumo de alimentos sem a influência de agrotóxicos. Diversas escolas usam esse material como alternativa para a construção de suas hortas. Materiais necessários para a montagem de cada canteiro Um pneu velho; uma tábua de madeira ou madeirite; uma faca bem afiada; adubo orgânico; sementes de hortaliças; palha seca. Modo de fazer Cortar uma lateral do pneu com uma faca e retirá-la. Em seguida, pegar uma metade do pneu e virá-la do avesso, formando uma bacia côncava. Virando o pneu ganhar-se-á mais cinco dedos de raio. Mas ele pode ser deixado ao natural. Fazer um fundo com a madeira. Depois colocar a terra. A quantidade de terra irá depender do que se deseja plantar. Se for uma raiz, deverá ser utilizada mais terra, enquanto a hortaliça exigirá menos terra. Acrescentar o adubo. Para um pneu de carro (aro 13) deverá ser utilizado um quilo de adubo orgânico. Se o pneu for de uma camionete (aro 20), por exemplo, precisará de três quilos de adubo. Misturar o adubo com um pouco da terra do pneu, cerca de cinco centímetros. O ideal é deixar o adubo e a terra três dias sem plantar nada para que a semente germine com mais facilidade. Passados os dias, o pneu estará pronto para receber uma raiz ou uma semente para o cultivo. Cavar meio centímetro de berço para alojar três sementes. Se estas forem enterradas em uma profundidade maior a planta não crescerá. Depois de germinado, deixar apenas uma semente. Em um período de cerca de vinte dias a muda ficará grande e o canteiro deverá ser coberto com palha seca, deixando a muda de fora. Este processo, por não expor o solo, evita a perda de água por evaporação.

Horta suspensa A falta de espaço não é problema nem desculpa para quem quer montar uma horta. Diversas opções podem ser usadas, desde garrafas pets até canos de PVC, que podem ser colocados em qualquer lugar: pendurados no teto ou fixados em muros. A horta suspensa, como é chamada, é simples de fazer e econômica. Neste formato de horta, pode-se plantar de tudo um pouco: verduras, legumes, condimentos e até plantas medicinais, só é preciso tomar cuidado para não cultivar hortaliças que não cresçam muito para que não atrapalhem o desenvolvimento das outras plantas. Com uma calha de 1,20 m é possível plantar 12 pés de alface com espaçamento de 20 cm. Além de consumir o que produz, pode representar uma renda adicional para o dono. Materiais necessários Mudas de plantas (pode ser tomate, feijão verde ou qualquer outro legume); garrafas de refrigerante grandes; um perfurador; fita adesiva; estilete ou faca afiada; terra vegetal suficiente para preencher as garrafa; palha ou casca de jardim; cordas, pregos e/ou ganchos para o suporte.

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Modo de fazer Abrir uma lateral das garrafas; forrar a parte cortada com fita adesiva para prevenir cortes e dar maior estabilidade ao plástico quando estiver pendurado; encher a garrafa com terra vegetal; colocar a muda na garrafa tomando cuidado para não machucá-la; tentar espalhar ao máximo a raiz para que ela não se prenda a espaços; prender a garrafa com o cordão; preencher a parte de cima da garrafa com palha ou casca de arroz ou outro substrato; fixar a garrafa em um local ensolarado; pronto! Agora é só molhar a plantinha e esperar que ela floresça ou dê frutos! Canteiros e mobilidade A construção de canteiros poderá ser feita com diversos materiais que atendem a vários aspectos da educação ambiental, como, por exemplo: a mobilidade de espaços, permitindo a criação e o desenvolvimento de estruturas de canteiros que possibilitem sua retirada para outras atividades.

Horta orgânica É uma maneira de plantar e cuidar das hortaliças com técnicas que não poluem a terra e a água e não contaminam plantas, plantadores e consumidores. Podemos dizer que é uma maneira de cultivar imitando a natureza, como, por exemplo, a utilização de adubos orgânicos em substituição aos produtos químicos. A horta orgânica inserida num espaço escolar formal ultrapassa os limites do simples plantar e colher, pois se apresenta de forma flexível e articulada a outros projetos pedagógicos, permitindo a interação entre diversos trabalhos e linhas filosóficas na construção de um novo saber ambiental. Referências: EMBRAPA HORTALIÇAS. Disponível em: ; .

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Ações transversais possíveis Preparação do espaço físico destinado ao projeto. Realização de trabalhos na horta (semear, regar, cuidar, colher). Pesquisas documentais sobre os produtos semeados com a utilização de suportes de leitura diversificados. Observação e registro (medição do crescimento das plantas, da temperatura e da umidade, condições propícias e limitadoras quanto às espécies plantadas). Organização e tratamento da informação recolhida (textos, desenhos, cartazes, gráficos, enciclopédias, fotografias, vídeos) e sua inserção no site da escola. Intercâmbio de experiências com escolas que desenvolvam projetos sobre a mesma temática. Divulgação do projeto para a comunidade (jornal escolar, colóquios, exposições).

A sementinha vira planta Para germinar, toda semente precisa de água, nutrientes, luz, oxigênio, espaço e calor. Quando colocamos a semente na terra úmida e quente, estamos dando a ela as condições de que precisa para se desenvolver. Existem sementes de todos os tamanhos, formas e cores. Algumas são tão grandes e outras tão pequeninas que quase não conseguimos vê-las. Um dos grandes motivos de insucesso em hortas domésticas está na má escolha das sementes. Compramos envelopes de sementes de marcas idôneas e bem conceituadas, e mesmo assim nossas plantinhas teimam em não se desenvolver. O problema mais frequente é que compramos sementes não adaptadas ao clima e ao solo da nossa região. Atualmente, as sementes de hortaliças e flores contêm alta tecnologia na sua produção. Por exemplo: hoje é possível plantar couve-flor, uma hortaliça típica de inverno em regiões de clima quente, graças a essa tecnologia. O mesmo acontece com o repolho, a beterraba, a alface e uma infinidade de hortaliças. É essencial que as sementes tenham procedência confiável e regulamentada – este é um fator de garantia de boa colheita. Mas é bom lembrar que as sementes para hortas são diferentes das sementes nativas do Cerrado. As pessoas que desejarem ajudar na recuperação de áreas degradadas precisam ficar atentas à legislação.

Comida da semente Dentro da semente existe uma reserva de alimento que faz com que ela se mantenha saudável e em condições de buscar o que mais precisa para crescer. Germinação: quando colocamos a semente na terra, a água entra nela e ela começa a inchar. Ela cresce para baixo a procura de água e nutrientes do solo – crescimento radicular. Depois, ela cresce para cima a procura de luz para continuar se desenvolvendo – crescimento vegetativo.

Irrigação Cada hortaliça tem sua exigência de época e de forma de plantio e necessidades de adubação, mas todas precisam de cuidados básicos, como irrigação (fornecimento de água às plantas), adubação de cobertura (aplicação de estercos ou compostos nas plantas após o plantio) e manejo do mato (capinar em volta das plantas e roçar nos meios) e controle biológico (permitir que predadores naturais existam e controlem os comedores do nosso alimento). A dica é criar um sistema de irrigação dentro da área da horta onde pode ser colocada uma caixa d’água de 500 litros para que os alunos possam usar pequenos regadores para molhar a horta. Essa prática também ajuda, em muito, a rever as concepções de utilização da água. Esse tipo de irrigação faz com que os alunos transitem perto da extensão da horta.

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Cuidados com a plantinha Assim como as crianças precisam de amor e carinho, as plantas são seres vivos e também precisam de cuidados especiais. Elas gostam de ambiente tranquilo e até de música tranquila. Pesquisas demonstram que as plantas também sentem e reagem às emoções e aos comportamentos daqueles que mantêm contato com elas.

Preparando a terra Para começar a plantar corretamente é muito importante conhecer primeiramente o solo. Se colocarmos um pouco de terra em um microscópio veremos que na terra há vida. Existem bolhas de água, de ar, minúsculos seres vivos, como fungos, bactérias, minhocas e, pedras e rochas que viram pó com o passar do tempo. Essas são as partes básicas do solo. Isso é que dará à planta o que ela precisa para viver, além de ajudá-la a ficar firme, bem fixada. Uma terra equilibrada é a base para a produção orgânica de hortaliças. É preciso conhecê-la para poder corrigir suas carências, quando houver. A terra deve ser protegida com plantios em nível, construção de terraços, plantio de quebra-ventos, cobertura com palhadas, além de respeitar a preservação das áreas protegidas por lei. Na adubação devem ser sempre utilizados produtos naturais (calcários, fosfatos naturais, esterco de animais, restos de plantas). É aconselhável também o cultivo de plantas que melhoram o solo, como feijão-de-porco, crotalária, feijão-guandu, mucuna-preta, girassol, entre outras. Em algumas escolas é comum a construção de canteiros de alvenaria, muitas vezes pintados com tinta ou cal, porém não é aconselhável a adoção dessa técnica, pois a tinta ou a cal passam para o subsolo por meio das chuvas, contaminando-o e comprometendo a qualidade do alimento cultivado.

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Harmonia e variedade Na horta orgânica é importante plantar várias hortaliças no mesmo canteiro para criar um ambiente diversificado. Isso favorece a vida de insetos bons e dificulta a vida dos ruins e a aparição de manchas, causadas por fungos, bactérias ou falta de nutrientes. Essa variação também permite um melhor aproveitamento dos nutrientes do solo. É recomendado o plantio de faixas de plantas de tamanho médio (milho, girassol, cana) dentro e ao redor da horta para harmonizar ainda mais o ambiente. A horta é um espaço de relação com a natureza e importante instrumento para se trabalhar a transversalidade do tema ambiental com todas as disciplinas, mas com certeza outros espaços existem na escola ou em seu entorno onde o plantio aprendido na horta pode ser reaplicado para a preservação do bioma Cerrado. Direta ou indiretamente ele está presente na comunidade. A escola ou a comunidade podem querer ir além da horta e recuperar áreas degradadas ou plantar árvores nativas no jardim da escola, nas ruas de acesso ou em outros locais. Isso exigirá um pouco mais de esforço, com a preparação de um viveiro específico de árvores nativas ou ainda sistemas agroflorestais. Aqui no Cerrado procure conhecer as iniciativas das ecovilas ou dos institutos que trabalham com a permacultura (são alguns exemplos: Ipoema, Asa Branca, Ecocentro Ipec).

É tempo de colheita Tudo a seu tempo. Cada hortaliça tem o ponto certo de ser colhida, denunciado pelo tamanho, pela cor, pelo sinal ou pela idade. Para colhê-la são usadas facas, tesouras e outras ferramentas, de preferência pela manhã ou à tardinha. As hortaliças para alimentação devem ser lavadas e consumidas no mesmo dia. Pode ser desenvolvido um projeto de “feirinha”, com as hortaliças sendo colocadas em caixas ou outras embalagens próprias para venda. Após a feirinha, é necessário contabilizar a venda, e o lucro pode ser investido em algo que reverta para os alunos ou para a escola. Outra sugestão é uma colheita coletiva, envolvendo os familiares dos alunos.

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Espaço de suporte para a horta Sementeira Para mexer com plantas, primeiro é necessário aprender a fazer uma sementeira. Um caixote de madeira, ou mesmo um vaso, pode ser uma solução para escolas que não possuam espaços. Modo de fazer Forrar o caixote com um plástico grosso, não esquecendo de fazer os furos para a saída do excesso de água. Colocar a terra preparada em partes iguais, areia de construção e adubo, até dois dedos da borda do caixote. Com a ajuda de uma vareta ou mesmo com os dedos, fazer pequenos furos na terra, bem rasos – são os berços. Manter a distância de 15 cm um do outro. Colocar três sementes em cada buraquinho e cobrir com um pouco de terra. Deixar o caixote em um local arejado, que não pegue sol, e não esquecer de regar todos os dias. Quando as sementes germinarem e estiverem com umas cinco folhinhas, é hora de transplantá-las para os vasos ou canteiros. Se nascer mais de uma muda em cada buraco, retirar as mais fracas e deixar somente a mais bonita para ser plantada. Sementes voadoras São aquelas que quando o vento bate se soltam e flutuam no ar. O dente-de-leão é um exemplo desse tipo de semente. Os pássaros, as cutias e os morcegos também são ótimos plantadores do Cerrado, pois quando comem as frutas deixam cair sementes em vários lugares, fazendo com que surjam novas plantas.

Compostagem Se a escola produz matéria orgânica e a descarta como lixo comum, pode-se optar por construir um minhocário e uma área de compostagem. Folhas das árvores, cascas de frutas e demais insumos podem ser colocados em uma área próxima à horta para depois serem distribuídos nas áreas de compostagem. Os restos orgânicos (cascas e restos de comida), quando decompostos corretamente em composteiras, têm potencial para serem reutilizados como adubo para um solo fértil. A seguir, como implantar esta medida na escola. Materiais necessários: Buraco no solo com cerca de 1m3 (1m altura x 1m largura x 1m profundidade) ou recipiente de madeira ou tijolos com a mesma medida; sobras de alimentos – é sempre bom evitar carnes, pois estas exigem cuidados muito especiais para não atrair animais; papéis, papelão e palha; água; tampa de madeira ou lona para cobrir a composteira; uma pá. Como fazer 1) No buraco no solo ou em um recipiente de madeira ou tijolos, colocar os resíduos na proporção de 25% de restos de comida e 75% de materiais secos – papéis, papelão e palha. É preciso respeitar essas quantidades para que os alimentos não se tornem uma massa compacta e malcheirosa. Pequenos espaços entre a comida e os materiais secos garantem o ar necessário para o processo de decomposição acontecer. 2) Colocar mais material seco em cima da pilha; umedecer bastante com água e depois cobrir a composteira. 3) Deixar descansar por cerca de 15 dias. Depois desse tempo, revirar o material com a ajuda da pá mais ou menos uma vez por semana e acrescentar água sempre que a mistura estiver seca demais. 4) A duração do processo pode variar em função da quantidade de resíduos e da umidade disponível, entre outros fatores. Por isso, é importante estar atento à transformação que passa a acontecer – o lixo começa a ganhar o aspecto de solo fértil. Quando isso ocorrer, o novo solo pode ser usado para cultivo de hortaliças, plantas e flores. Se a muda for muito pequena e a aparência do solo estiver ruim, recomenda-se peneirá-lo antes do uso. O buraco para fazer a composteira também pode ser substituído por caixotes escuros, que ajudam a acelerar o processo de decomposição e evitar a proliferação de patógenos. O mesmo procedimento e as mesmas proporções anteriormente exemplificadas devem ser utilizados.

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Minhocário Processar os restos de alimentos da escola é bom para se ter um minhocário. Para quem não sabe, um minhocário (ou composteira) é uma fazenda de minhocas que ajuda a reciclar os restos de comida e a transformar o substrato em húmus, um composto muito rico que pode ser usado como biofertilizante em hortas e jardins. Pode-se optar por uma solução caseira, mas há também empresas que vendem modelos prontos em caixas plásticas que podem ser usados até em apartamentos. Além de caixas plásticas, um minhocário pode também ser montado em tambores, cestas de frutas, canteiros e outros. A estrutura mais prática para a montagem Minhocário - Escola da Natureza do minhocário e para a compostagem em escolas com pouco espaço são as caixas plásticas empilhadas. O tamanho varia conforme a necessidade da horta e o local disponível para o minhocário. Inicialmente podem-se usar três caixas plásticas empilhadas com pequenas aberturas para manter a estrutura oxigenada (isto é importante). O elemento principal do minhocário são as minhocas, que podem ser encontradas em hortas ou em certas empresas que apresentam várias opções para adquirir uma colônia de minhocas. Outra possibilidade é usar o húmus de minhoca encontrado em lojas de jardinagem, que sempre apresenta vários ovos misturados à terra, que podem dar origem às nossas amigas aeradoras. Passo a passo Fonte: Elaine Costa. Disponível em: .

Materiais necessários Três caixas em cor escura, tipo contêiner, que possam ser empilhadas sem o apoio das tampas; torneirinha de bebedouro; pedaço de tela de arame grossa; pedaço de manta permeável; minhocas (é necessário pesquisar sobre as principais espécies, pois há diferenças básicas); substrato (inicialmente um saco de 20 kg); jornal sem cor; restos de comida. Cortar o fundo de duas das caixas mantendo uma borda de 3 a 5 cm. Numa das caixas fixar a tela de arame grossa, que deve estar na medida do fundo da caixa. Para facilitar, colocar a tela de arame dentro da caixa. Na outra caixa, fixar a manta permeável. Neste caso, é mais fácil fixar a manta por fora da caixa com fita vinílica ou similar. Na caixa restante cortar lateralmente um orifício na mesma medida da torneirinha, fixando-a (é bom usar silicone para evitar vazamentos). A estrutura proposta usa somente uma tampa, que deve possuir algumas perfurações para permitir a oxigenação. A estrutura do minhocário apresentada a seguir é a mesma encontrada na monografia de Renato Velloso Magrini Soluções sustentáveis: permacultura urbana, Universidade Federal de Uberlândia, 2009. Colocar o substrato umedecido na caixa do meio e, em cima dele, as minhocas. Após três dias acrescentar o substrato na caixa superior e os restos de alimentos. Cobrir com o jornal sem cor. O período médio para a produção do húmus é de 45 dias. Então, colocar uma peneira grossa no topo do substrato com restos de comida, que vão atrair as minhocas, que passarão pela peneira, facilitando a retirada do húmus.

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Tampa com orifícios

Restos de comida, substrato e jornal sem cor

Tela de arame substrato e minhocas Manta permeável

Chorume Fonte: Elaine Costa-http://www.maiscommenos.net/blog/2009/04/como-fazer-um-minhocario-domestico/

Observações As minhocas não gostam de sol e calor excessivos. Por isso, o minhocário deve ser mantido em lugar à sombra e arejado. Também é importante manter a terra úmida. O grande benefício do minhocário é permitir que as crianças e os jovens observem a rotina da escola em relação aos alimentos, principalmente sobre o grande desperdício. Quando identificamos quanto de lixo geramos, passamos a ter mais critério, tanto para comprar quanto para usar, reduzindo o consumo exagerado.

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Infraestrutura necessária a) Um galpão ou um local adequado e seguro para guardar os equipamentos e os insumos e para executar tarefas, como encher os saquinhos; b) um reservatório de água na parte mais alta do terreno (facilita as regas); c) um espaço aberto e sombreado, especial para estocar terra, areia e fertilizantes orgânicos.

Viveiro - Escola da Natureza

Maquete de Viveiro - AAF

Dicas para montar uma sementeira com recursos mínimos Delimitar uma área de 10 m x 1 m com tábuas ou tijolos, ou de preferência materiais reutilizados; preencher o fundo desta área com uma camada de brita grossa e, sobre ela, outra de brita fina (garante boa drenagem); preencher com substrato composto por areia (90%) e húmus (10%). Preparando a sementeira Uma sementeira, ou berçário, é essencial para a maior parte das espécies, pois além de facilitar muito o trabalho economiza recursos, tendo em vista que somente será preciso transferir para os saquinhos as plantas que nascerem. Para a maior parte do ano, basta construir uma sementeira (ou berçário) a céu aberto. A semeadura em estufa é recomendada em regiões de inverno rigoroso, especialmente nas épocas frias.

Viveiro educador O conceito desse espaço vai além do simples cultivo de espécies botânicas, pois o Viveiro Educador é bem mais que um simples espaço de apoio para a horta, uma vez que ali são produzidas e repassadas as informações que, associadas às práticas vivenciais, contribuem muito para a construção do conhecimento, para a sensibilização ambiental e a popularização da ciência de forma lúdica e interativa. A convivência com o cuidado de espécies de plantas permite o contato com experiências diferenciadas que envolvem o reino vegetal, seus diferentes grupos e formas variadas, possibilitando uma riqueza de instrumentos pedagógicos para o trabalho da transversalidade e da interdisciplinaridade. Semeadura A semeadura poderá ser feita diretamente nas sacolas, previamente cheias e arrumadas em canteiros ou em germinadores. Neste último caso, serão obtidas sementes pré-germinadas, a serem repicadas para as sacolas já encanteiradas. A maior vantagem da pré-germinação está na possibilidade de seleção das melhores plântulas, descartando-se aquelas defeituosas; em contrapartida, é necessário maior cuidado com a mão de obra empregada. A pré-germinação é feita em um substrato de areia (ou serragem curtida) de cerca de 5 cm de espessura, onde as sementes são enterradas superficialmente e mantidas em umidade e sombreamento. A repicagem deverá ser feita quando a radícula despontar, caracterizando o “pontinho branco”. Há necessidade de cerca de 7 kg de sementes despolpadas por m2 de germinador.

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Na semeadura direta, a semente é enterrada superficialmente, uma em cada sacola. A semeadura poderá ser feita na época da colheita, quando a oferta de sementes é abundante. Algumas sementes, apesar das condições ambientais favoráveis (água, temperatura e oxigênio), não germinam temporariamente. A esse fenômeno da-se o nome de dormência, causado por algum mecanismo inerente ao embrião ou a casca da semente. Pode-se obter as mudas aptas ao plantio no período de novembro a janeiro. Durante todo esse tempo deverá ser mantida a umidade adequada e eliminadas as ervas invasoras. Semeando Sementes menores – vão para o berçário. Sementes maiores – como as do jatobá; a semeadura de uma semente por saquinho após a escarificação. Atualmente a produção de mudas da grande maioria das espécies do Cerrado é feita a pleno sol, sem a necessidade de qualquer tipo de cobertura. Apenas para as espécies mais sensíveis das Matas de Galeria recomenda-se a produção de mudas em cobertura por sombrite (50%). Transferência das mudas para os saquinhos Ao atingirem de 10 a 12 cm, as mudas devem ser repicadas, ou seja, transferidas para saquinhos, com cuidado especial para a raiz manter-se reta, pois se a ponta se enrolar a planta pode não se desenvolver. Passo a passo: a) Transferir as mudas para os saquinhos – repetir o procedimento seguinte com cada muda, sem esquecer-se de molhar bem a sementeira antes para ficar mais fácil arrancá-las. b) No saquinho, fazer um buraco com o dedo no substrato de mais ou menos 1 cm de diâmetro, onde a muda será colocada: retirar uma muda do berçário, com muito cuidado para a raiz não quebrar; colocar a muda no saquinho, com atenção para que a raiz entre reta; completar o espaço vazio com o substrato; colocar o saquinho no canteiro. c) Os saquinhos serão levados aos canteiros, sendo dispostos no chão um ao lado do outro, ocupando o menor espaço possível. Escolha do local do viveiro O local deve: ser plano; ser aberto, sem sombreamento; ser de fácil acesso à água; ter boa drenagem do solo; ficar sem receber vento; ser de fácil acesso a pessoas e veículos. A área do viveiro deverá ser bem drenada, com pequena declividade (até 3%). A disponibilidade de água e a proximidade do local do plantio são condições a considerar. No caso de se construir a estrutura do viveiro, este deverá estar localizado em uma área que receba pleno sol, fazendo-se o controle do sombreamento apenas com a cobertura artificial. Construção do viveiro Para o viveiro natural, basta fazer a limpeza da área sombreada naturalmente, organizando a posição dos canteiros de forma que os tratos e o trânsito sejam facilitados. A sombra inicial não deverá ser maior do que 50%. Dentre os inconvenientes do viveiro natural, destacam-se: dificuldade de uniformização do sombreamento; impacto do gotejamento, que pode prejudicar o início do desenvolvimento das mudas, quando as copas das árvores sombreadoras são muito altas; dificuldade ou mesmo impossibilidade de redução do sombreamento para propiciar a aclimatação das mudas; maior probabilidade de prejuízos pela ação de animais silvestres e pela quebra de galhos; falta de uniformidade das mudas. Como maior benesse se destaca o baixo custo da instalação. Recomenda-se sua utilização para pequenos plantios. O viveiro construído possui uma estrutura principal formada de moirões de madeira de lei, com 3 m de comprimento e 20 cm de diâmetro aproximadamente e espaçamento de 3 m entre si.

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Após a fixação no solo (60 cm), define-se a altura livre de 2,40 m para o viveiro. Na cobertura poderá ser utilizada a estrutura de ripas (madeira bruta ou bambu) ou arame e cobertura de folhas de palmeira. O sombreamento inicial deverá ser de 50%, o que se consegue colocando-se as folhas abertas, de forma que os folíolos fiquem sobrepostos em aproximadamente um terço do seu comprimento. Tamanho e organização do viveiro As dimensões do viveiro deverão corresponder ao espaço necessário para acomodar o total de mudas que se pretende produzir. Em cada m2 de canteiro será possível acomodar oitenta mudas, já espaçadas o suficiente para seu máximo desenvolvimento. Considerando-se as áreas de circulação, o número ideal de mudas por canteiro será de cinquenta unidades por m2 de viveiro. Para a obtenção de cerca de 3 mil mudas aptas para o plantio de 10 ha, deverá ser construído um viveiro de 78 m2, que corresponde à largura de 6 m e comprimento de 13 cm. A orientação do comprimento deverá ser na direção norte-sul, bem como a disposição das folhas da cobertura, portanto as ripas ou arames deverão ficar paralelos à lateral menor de 6 m. Serão necessários 17 moirões (cinco em cada lateral de 13 m e mais 4 na linha central) e 39 m de “linhas”, que formarão a estrutura superior, onde transversalmente serão colocadas as ripas ou arames para apoio da cobertura de folhas. A distância entre ripas ou arames deverá ser de aproximadamente 1,4 m, o que define a necessidade de dez transversais, equivalente a 60 m. Lateralmente o viveiro deverá ser protegido por palha, organizando-se uma parede para proteção de ventos e excesso de luz nos canteiros externos. Os canteiros deverão ter seu comprimento na direção paralela ao eixo maior do viveiro, divididos em duas partes, com uma passagem central de 1,5 m de largura. Entre os canteiros será mantida uma passagem de 0,6 m, definindo-se três passarelas no sentido do comprimento. Dessa forma serão organizados oito segmentos de canteiros, cada um com 5,75 m de comprimento e aproximadamente 1 m de largura. Os dois moirões do interior do viveiro deverão ser fixados na lateral do canteiro para não comprometer a circulação, por isso não ficarão exatamente centralizados. A área útil total de encanteiramento será de 48 m2, correspondendo, portanto, à capacidade de acomodação para 3.480 mudas, provendo-se a produção de 3.072 mudas aptas para o plantio (aproveitamento de 80%). Os canteiros resultam da arrumação das mudas já envasadas, distribuindo-as em oito fileiras isoladas entre si por ripas ou sustentadas por arames no sentido do comprimento do canteiro. Assim, nas entrelinhas se garante algum espaço entre as sacolinhas, que se mantêm juntas nas linhas. Montando os canteiros O ideal é que cada canteiro – um espaço delimitado para abrigar os saquinhos com mudas – tenha 1 m de largura por 10 m de comprimento. Para delimitá-lo, colocar em cada canto uma pequena estaca de madeira e ligar essas estacas com um barbante ou cordinha, formando um retângulo. Deixar sempre corredores de aproximadamente 1 m de largura entre os canteiros para facilitar as atividades rotineiras.

10 m 10 m 10 m

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m

Dica importante – construir os canteiros no sentido leste-oeste garante melhor insolação. Preparando os saquinhos Escolher os saquinhos de um ou dois litros (pode-se reaproveitar sacos ou caixas de leite, desde que tenham sido muito bem lavados para evitar fungos prejudiciais), enchendo-os até quase a borda com substrato. O substrato é a mistura utilizada para encher as sacolas plásticas. De um total de cinco partes, três serão de terra argilosa retirada da camada de cerca de 20 cm de profundidade; uma parte de areia média e uma parte de material orgânico. Como matéria orgânica mais indicada poderão ser utilizados serragem, palha de café ou esterco bovino. O material orgânico deve estar bem decomposto (curtido) em qualquer dos casos. A cada metro cúbico da mistura deverá se acrescentar 500 g de calcário, 400 g de superfosfato simples, 200 g de cloreto de potássio e 30 g de um complexo de micronutrientes. A aclimatação deverá se iniciar sessenta dias antes do transporte para o plantio definitivo e se fará em três etapas, a cada vinte dias, garantindo-se os seguintes percentuais de sombra: 35%, 20% e 0%, ficando as mudas a pleno sol nos

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últimos vinte dias que antecederem o plantio. Também a irrigação deverá ser reduzida ou eliminada em função da frequência das chuvas nesse período. Com a aclimatação adequada, o estresse da muda no plantio será muito reduzido. Após o quarto mês de idade deverá se verificar a necessidade de remanejamento na posição das sacolas com o intuito de evitar o enraizamento das plantas no solo. Receita para o substrato dos saquinhos Ingredientes: 60% de terra; 20% de esterco curtido; 20% de areia. Preparo: Misturar bem e passar por uma peneira de tela grossa (vãos de 2 cm de diâmetro, aproximadamente) para eliminar torrões. Usando estacas em vez de sementes Para algumas espécies, como amora e pata-de-vaca, é possível usar estacas, isto é, fragmentos de uma planta adulta, em geral galhos de 20 a 25 cm de comprimento. A coleta dessas estacas pode ser feita com uma tesoura de poda, usando-se o mesmo procedimento da poda. Verificar com um viveirista que tipo de ramo se transforma numa boa estaca, pois isso varia de espécie para espécie. Há quem recomende fazer esse procedimento na lua nova para garantir o enraizamento e a brotação. O processo de plantio é simples Colocar uma estaca por saquinho, já com o mesmo substrato indicado na receita acima. Inicialmente, deixar os saquinhos à meia sombra (cobertos com tela plástica ou na sombra de uma árvore) para impedir que fiquem sob o sol direto. Nos períodos e nas regiões de muito frio, vale a pena mantê-los numa estufa. Após a formação da raiz e da brotação, os saquinhos com mudas podem ser colocados a pleno sol, recebendo os mesmos cuidados que as outras mudas, até atingirem o porte ideal para a transferência para o local definitivo. Cuidados com as mudas nos canteiros Esta é a rotina de trabalho para o adequado desenvolvimento das mudas:

1) irrigar diariamente; 2) trocar os saquinhos de lugar quando as raízes começarem a pegar na terra; 3) proteger as mudas do sol usando tela ou equivalente logo após a repicagem (até a muda firmar), ou permanentemente para determinadas espécies, como a peroba; 4) trocar de saquinhos quando estes começarem a rachar.

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Está na hora de a muda ir embora Como saber o ponto certo de transferir a muda para o local definitivo? Para áreas rurais – as mudas produzidas neste processo estão prontas quando atingem 70 cm de altura. Para a cidade – as mudas têm de chegar a 1,80 m para adquirir resistência suficiente, especialmente se forem plantadas em praças públicas ou calçadas. Os viveiristas ensinam que antes de sair do viveiro as mudas devem ganhar resistência, ficando alguns dias totalmente expostas ao sol, com menos água.

Aula de Educação Ambiental

Três erros comuns Plantar a espécie errada para o local, por exemplo, espécie de árvore que fica muito alta sob fiação elétrica, de raízes muito compridas e que tendem a arrebentar calçadas e tubulações, plantar espécies visitadas por morcegos, mariposas e pássaros em locais de muita circulação de pessoas e carros, provocando a matança indevida desses animais, o que é crime ambiental. Na hora de plantar, não retirar o saquinho: as raízes podem se enovelar e a planta, morrer. Não buscar orientação correta na hora de plantar. Embalagem Os sacos de polietileno preto, nas dimensões de 20 cm x 35 cm e espessura de 0,15 mm, são os indicados. Podese também utilizar caixas de leite e suco, lavando-as bem para evitar contaminação. Enxertia A enxertia é uma alternativa para se viabilizar uma cultura mais uniforme, com plantas de alto potencial genético, reproduzindo o desempenho das matrizes de comprovado valor agronômico. A viabilização de mudas enxertadas exige acompanhamento técnico para verificação das condições adequadas para o sucesso da prática, bem como de mão de obra especializada para sua correta execução.

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Transporte Os cuidados com o transporte deverão ser suficientes para se evitar a quebra do torrão, a queima das folhas pelo vento e pelo excesso de manuseio das mudas. Preferencialmente deverão ser utilizadas caixas que acomodem várias mudas e evitem pressão irregular sobre o torrão. O transporte manual nunca deve ser feito pegando-se as mudas pelo caule, mas sim pelo torrão. Ciclo lunar Tudo o que existe passa por transformação. Nada permanece sempre igual. Essa transformação é chamada de ciclo. Você já viu que a lua se transforma, não é? Temos a lua cheia, a minguante, a nova e a crescente. Essa mudança é o ciclo lunar, e os lavradores respeitam esse ciclo para plantar suas sementes. Todo mundo deveria respeitar os ciclos da natureza. Os monges levam esse assunto muito a sério, eles veem com respeito o trabalho da natureza, pois essas mudanças ou ciclos são importantes para a saúde do nosso planeta Terra. Qual é a época certa de semear e de replantar? Seja responsável, pesquise!

Plantas que ajudam a acabar com a poluição A natureza é perfeita. Além da sua beleza, ela nos fornece alimentos, oxigênio e ainda nos ajuda a resolver um sério problema criado por nós mesmos – a poluição do ar. As plantas despoluidoras de ambiente ajudam a tornar menos sujos os ambientes onde existem fumaça de cigarro, gases e aquele cheiro nada agradável de materiais de limpeza. Essas plantas absorvem as substâncias tóxicas e as transformam em nutrientes por meio de bactérias que vivem de suas raízes. E o melhor é que elas podem ser cultivadas em casa em vasos que enfeitam o ambiente. Algumas dessas plantas são conhecidas pelos nomes de babosa, crisântemo, espada-de-são-jorge, jibóia, clorofito, entre outras.

Algumas plantas são bonitas, mas também perigosas Em caso de problemas com plantas deve-se imediatamente procurar um médico, e, de preferência, levar a planta que provocou o problema junto. Eis algumas plantas que podem trazer riscos à saúde: comigo-ninguém-pode – provoca irritação e inchaço; mamona – provoca vômito, dor de barriga e diarreia; alamanda – mesmo sendo uma flor, assim como o bico-de-papagaio, pode provocar irritação nos olhos.

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Plantas medicinais são aquelas que podem ser usadas no tratamento ou na prevenção de doenças, mas precisam ser identificadas por um profissional. O nome científico dessas plantas geralmente é escrito em latim e significa que a planta é ela mesma – é sua certidão de nascimento. As plantas também podem ser venenosas, por isso deve-se sempre alertar as crianças para não colocarem na boca qualquer plantinha. É preciso tomar cuidado, pois muitas delas podem provocar intoxicação. Chá é gostoso, mas não se pode abusar, quando se toma demais pode fazer mal à saúde.

Colaboração com a preservação do meio ambiente Estas são algumas das ações que ajudam a natureza: plantar um jardim; plantar uma árvore e cuidar dela; reaproveitar tudo o que pode ser reaproveitado; selecionar o lixo: garrafas, papéis, latas; apagar as luzes quando não houver ninguém no local; usar as folhas de papel dos dois lados ou não imprimir o desnecessário; usar cascas de legumes e frutas como adubo (é só bater no liquidificador e regar as plantas) ou ainda em receitas (em bolos, sopas, tortas – procure essas receitas saborosas e nutritivas).

Cuidar com cuidados e atitudes Erosão A erosão do solo é um grave problema ambiental, trazendo prejuízo: 1) aos rios – a erosão leva terra e areia para o leito (fundo) do rio, fazendo com que fique mais raso, com menor capacidade de guardar água, causando a falta de água nos meses de pouca chuva, além da morte dos peixes; 2) ao solo – a erosão leva embora as sementes que poderiam germinar e recompor a vegetação natural, ou seja, solo desprotegido tende a continuar desprotegido; 3) aos animais – a erosão pode levar embora ninhos de animais que ficam no chão e tampar diversos outros, matando os filhotes que estão dentro. Além do mais, sem vegetação e frutos para alimentá-los, eles vão embora ou morrem de fome; 4) aos lençóis freáticos – os solos sem vegetação, por não terem raízes nem minhocas para deixá-los fofos, não têm uma boa absorção de água. Como não há barreiras para a água, ela vai embora rapidamente, não havendo tempo para a chuva penetrar no solo. Com isso os lençóis freáticos secam, acabando assim com muitos rios e consequentemente com nossa água potável.

Por que plantar árvores Aqui estão alguns dos motivos para plantar não uma, mas várias árvores, e ajudar a natureza: estudos promovidos pelo INPA (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia) mostram que uma árvore com copa de 10 metros de diâmetro é capaz de bombear para a atmosfera mais de 300 litros de água, em forma de vapor, em um único dia, ou seja, mais que o dobro da água que um brasileiro usa diariamente! Uma árvore maior, com copa de 20 metros de diâmetro, por exemplo, pode evapotranspirar bem mais de 1.000 litros por dia. Estima-se que haja 600 bilhões de árvores na Amazônia: imagine então quanta água a floresta toda está bombeando a cada 24 horas! (Fonte: .). Imagine como as árvores poderiam ajudar para não ocorrer tantas enchentes, que matam e deixam muitas pessoas desabrigadas. Junto com toda a água absorvida pelas raízes e transportada através das árvores muitos nutrientes são absorvidos. Estes são utilizados na fotossíntese para a produção do alimento para toda a planta. Por sua vez, folhas, frutos, madeira e raízes, vivos ou mortos, servirão de alimento para diversos seres vivos (consumidores e decompositores). Estes animais processam e defecam o que comem, e este material volta ao solo e todo o ciclo recomeça. A camada de folhas que se forma abaixo das árvores serve de berço para as sementes e para proteger o solo, do ressecamento, da compactação e da chuva. Cada pingo de chuva que cai diretamente no solo causa algum tipo de erosão. A copa das árvores também protege o solo da chuva direta, sem contar que suas raízes seguram firmemente o solo. A quantidade de água transpirada por uma árvore em umdia produz o efeito refrescante que equivale a cinco

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condicionadores de ar, cada funcionando vinte horas por dia. Esse vapor se mistura às partículas de poluição do ar, acumulando-se em nuvens e caindo em forma de chuva. As árvores ajudam também na eliminação de poluentes do ar. Além do mais, esse vapor ajuda a equilibrar o clima da região. Isso é facilmente percebido em parques e florestas, que possuem um clima mais fresco. Outro ponto que podemos notar até mesmo em parques no meio de grandes cidades é o silêncio. As árvores formam uma parede que impede a propagação dos ruídos. Cercas vivas estão sendo muito utilizadas hoje em dia para criar ambientes mais silenciosos e aconchegantes (além de bonitos). Em um bosque frondoso, a copa das árvores acumula a maior parte da radiação solar, o que significa que o chão, permanecendo quase todo o dia na penumbra, é bem mais fresco. Assim se define um microclima. As metrópoles são outro tipo de microclima – nesse caso porque geralmente estão cobertas por massas de ar quente situadas a cerca de 120 metros de altura, criadas pela poluição. O resultado são as ilhas de calor. Desse modo, a temperatura no centro de uma cidade, por exemplo, pode estar 6 graus centígrados acima daquela de bairros distantes (ou mais arborizados) e da zona rural. A poluição gerada pelas grandes cidades está desequilibrando a quantidade de oxigênio no mundo. Plantar mais árvores pode ajudar a reverter essa situação. Quem não gosta de uma boa fruta? Mas elas não são produzidas em laboratório. Elas chegam à mesa porque as árvores as produzem. Com relação especificamente às árvores nativas do Cerrado, são elas que os pássaros nativos procuram para fazer seus ninhos. Este é um dos motivos pelos quais é necessária a recuperação do bioma Cerrado, por conta da interdependência.

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Educando pelas Trilhas do Cerrado: um roteiro de ações para a educação ambiental em escolas e comunidades

CAPÍTULO 9 Síntese das Oficinas Mery-Lucy V. Souza “Semeando ideias e valores para preservar o Bioma Cerrado” foi o tema básico das oficinas práticas de educação ambiental realizadas pela Associação dos Amigos das Florestas no Projeto Semeando o Bioma Cerrado. A metodologia aplicada foi a ecopedagogia, que trabalha o sentido das coisas, e a arte-pedagogia, para o aprender a fazer fazendo e brincando.

Importância da escolha dessas metodologias Toda criança é uma criadora em potencial. Criar para ela é tão natural quanto andar e correr, e o objetivo da arte é justamente liberar o impulso criador que existe dentro de cada uma. Quando a criança pinta, desenha, experimenta e manipula materiais diferentes que permitem um trabalho livre e criativo não se espera uma obra de arte, mas sim que essa atividade possa torná-la feliz e contribuir para sua integração socioambiental. O objetivo não é formar artistas, mas explorar com respeito a capacidade individual da criança. Os trabalhos artísticos dão às crianças a oportunidade de desenvolverem suas aptidões, o senso artístico e inventivo, o hábito da observação, a imaginação e a criatividade, favorecendo o aprendizado e a interdisciplinaridade da educação ambiental com as disciplinas curriculares. Apurando sensibilidades, transferimos conhecimentos sobre o Bioma Cerrado, despertando sentimento de pertencimento ao ecossistema.

Oficina de música e dança Saber aliar a prática educativa e a música é fazer da escola um lugar alegre e receptivo. A música na educação ambiental, além de ser facilitadora do processo ensino-aprendizagem, ajuda também a ampliar o conhecimento não só musical do aluno, afinal a música é um bem cultural e seu conhecimento e uso não deve ser privilégio de poucos. A música está sempre associada à cultura e às tradições de um povo e de sua época. Segundo Bréscia (2003, p. 25), a música é “uma linguagem universal, tendo participado da história da humanidade desde as primeiras civilizações”. Conforme dados antropológicos, as primeiras músicas foram usadas em rituais, com o passar do tempo começou a ser utilizada também em louvadores. Atualmente existem diversas definições para a música, porém, de modo geral, ela é considerada ciência e arte. Gaiza (1988, p. 22) ressalta que “A música e o som, enquanto energia, estimulam o movimento interno e externo no homem, impulsionando-o à ação, e promovem nele uma multiplicidade de condutas de diferentes qualidades e grau”.

Oficina de contos, cantos e encantos

Nas oficinas, por meio do movimento corporal, da melodia e do ritmo, crianças e jovens são motivados a experimentar as emoções certas, identificando os sons e os movimentos da natureza. O objetivo deste trabalho não é estudar a música e a dança em si, mas apresentá-las como arte abstrata, entretenimento ou lazer, e principalmente como energia capaz de influir positivamente no caráter do indivíduo. A música é agente transformador tanto da alma como da sociedade. Mas as oficinas dão “apenas algumas pinceladas” no seu aspecto sociocultural.

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Pintura de rosto, brincadeiras, contação de histórias Pedagogos e psicopedagogos enfatizam que a fantasia e a imaginação têm importância fundamental no desenvolvimento da criança. Compreender a infância é defender que cada criança é única e que possui formas de pensar e agir diferentes das dos adultos. Ouvir e contar histórias são atividades lúdicas que, dentre outras, podem desenvolver o emocional da criança, ajudá-la a se organizar e socializar, além de auxiliá-la no processo de alfabetização. Assim, os contos de fada, considerados um instrumento pedagógico prazeroso e de grande ajuda no processo de construção da aprendizagem da criança, são adaptados para histórias de formação e degradação do Bioma Cerrado, nas quais a fauna, a flora e seus povos são os personagens destacados. As histórias e as pinturas de rosto nas oficinas são fontes de diversão, direcionando a criança para momentos de atenção dirigida. Histórias antigas e novas são contadas com outro olhar, de forma que as crianças sintam prazer em passar alguns momentos adquirindo conhecimento sobre o Cerrado, que não deve se perder com o tempo. “Um contador de histórias educa, socializa, informa e desperta a imaginação das crianças na creche.” (COSTA, In: ROSSETTI-FERREIRA, 2001, p. 89). Constatamos que essas oficinas são recursos valiosos para a formação da cidadania, especialmente por proporcionarem aos envolvidos a possibilidade de ampliar seus conhecimentos na área, levando-os a refletir sobre a prática vivenciada e a expressar suas percepções de mundo. O gosto pela leitura deve ser estimulado na criança desde pequena. As crianças também adoram se pintar, principalmente se estiverem em um lugar onde a pintura no rosto é liberada e há quem a faça. Este livro oferece alguns contos para a contação de histórias sobre o Cerrado. Veja a seguir instrumentos sugeridos e o DVD ABCCerrado (anexo).

Oficina de trilhas interpretativas Nesta oficina, a educação ambiental e biológica emerge como instrumento significativo na tomada de consciência ambiental, promovendo reflexões sobre as relações entre o ser humano e o meio ambiente. É necessário buscar opções que viabilizem tais práticas de conscientização e sensibilização, sendo uma delas as trilhas temáticas. A busca e o gosto pela aventura incitam as pessoas a percorrerem caminhos, os quais possibilitam a interação com os lugares. Atividades de campo a partir da análise de seus recursos e da interpretação de suas belezas fazem das trilhas interpretativas ferramentas interessantes e úteis no processo de construção da cidadania ecológica. A interpretação ambiental busca ainda sensibilizar as pessoas para a compreensão da complexa temática ambiental e para o envolvimento em ações que promovam hábitos sustentáveis de uso dos recursos naturais. Considerando que a paisagem como recurso didático viabiliza a interação entre o homem e o meio ambiente, deduzimos que seu apelo estético nos conduz potencialmente à contemplação, estimulando a sensibilidade e a reflexão da problemática ambiental, peculiar a este início de século. Uma grande aliada das trilhas interpretativas é a metodologia desenvolvida pelo arte-educador Paulo Pereira, a “matomática” ou “matemática do mato”. Por meio dessa metodologia são repassadas em campo noções de matemática pela contagem dos elementos naturais das plantas do Cerrado, tornando o aprendizado da tão temida matemática uma divertida brincadeira (ver DVD ABCCerrado).

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Oficina de maquete do Bioma Cerrado O termo “bioma” (bios = vida; oma = massa ou grupo) corresponde a uma unidade biológica ou espaço geográfico cujas características específicas são definidas pelo macroclima, pela fitofisionomia, pelo solo e pela altitude, entre outros. Maquete é uma representação em escala de grandes estruturas, ou seja, é qualquer representação realista, podendo ser funcional ou não, dependendo do interesse do estudo. As maquetes são geralmente utilizadas em projetos de planejamento e mostram o visual do contexto da área representada. As maquetes podem ser feitas com uma grande diversidade de materiais, mas na oficina da educação ambiental são utilizados apenas papel, lápis de cor e cola para montar uma miniárea representativa do Bioma Cerrado. O trabalho é iniciado com um contato simbólico de sons da natureza. Posteriormente, desenhando, colorindo, recortando e colando, a fauna e a flora do Cerrado vão ganhando forma, e água, animais e outros componentes pouco a pouco vão sendo inseridos no trabalho, respeitando a configuração local e as leis da natureza. Nessa oficina as crianças criam com desenhos e pinturas os elementos básicos que formam o Cerrado e aprendem a organizá-los com base em conhecimentos repassados pelo monitor, considerando a cadeia alimentar dos animais, as necessidades da flora em relação ao solo e os recursos hídricos. O produto final, que é uma pequena maquete, é levado para a escola.

Oficina de pegadas de animais Muitos mamíferos vivem sozinhos e escondidos, o que dificulta sua visualização. Além das fezes e do odor encontrados em regiões próximas, não é costumeira a presença de animais em nossas áreas de atuação, pois eles fogem. Rugidos ou mesmo o som do andar dos animais podem indicar sua presença, mas principalmente os mamíferos raramente são vistos. As pegadas são os mais fortes indícios de sua presença. As aves costumam construir ninhos para se abrigar, geralmente em locais de difícil acesso a seus principais predadores, mas seu canto pode ser escutado a longas distâncias. A presença de fezes no chão também é característica de sua presença. Nesta oficina, por meio de moldes, as crianças confeccionam, em argila e gesso, as pegadas de animais do Cerrado ao mesmo tempo em que recebem informações sobre a importância de cada animal para a manutenção do ecossistema. Elas aprendem que o animal silvestre não é o doméstico, e que o doméstico já está acostumado a viver perto das pessoas, como os gatos, os cachorros, as galinhas e os porcos, entre outros. O animal silvestre foi tirado da natureza e reage à presença do ser humano. Por essa razão, tem dificuldade para crescer e se reproduzir em cativeiro. O papagaio, a arara, o mico e o jabuti, ao contrário do que muitos pensam, são animais silvestres e, como tais, protegidos por lei. Capturá-los ou matálos é crime, com penas previstas em lei (Lei dos Crimes Ambientais, Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998). Todos os seres vivos dependem da natureza para sobreviver, pois é nela que obtemos desde alimentos até remédios. Os animais são parte fundamental da cadeia, ao serem extintos ou se tornarem raros, comprometem todo o equilíbrio da natureza. Comunidades tradicionais utilizam-se de animais da caça para comer, faz parte de seus hábitos e costumes. Além dos aspectos ambientais, precisamos refletir sobre os aspectos sociais arraigados à cultura dos povos do Cerrado. Sobre os povos do Cerrado, veja o DVD anexo (capa).

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Oficina de culinária – redescobrindo aromas e sabores do Cerrado Alimentação saudável vem da natureza, e o Cerrado é rico dela. A culinária sempre foi vista como um dos distintivos culturais que particularizam o patrimônio coletivo de uma sociedade. Por isso os aromas e os sabores das antigas cozinhas dos povos do Cerrado precisam ser reintroduzidos como resgate cultural e instrumento para o reconhecimento do verdadeiro valor desse bioma, também como fonte de alimentos. A culinária do Cerrado retrata a harmonia entre a simplicidade e os ingredientes naturais desta região, resultando em receitas, segundo grandes chefes, de inigualável sabor. Dentre muitas que podem ser usadas em oficinas de educação ambiental estão: galinhada com pequi, molho de pequi, frango ao molho pardo, angu de milho verde. Também os doces são atrativos para as crianças, que se divertem com sua produção, como cajuzinhos e geleias variadas. Produtos nativos do Cerrado vêm ganhando cada vez mais espaço na culinária brasileira: pequi – este fruto sobreviveu na cozinha goiana na galinhada com pequi, mas vem ganhando novos usos, como em sorvetes, bolos, pães; baru – usado em docinhos variados, vem retomando seu lugar, que foi ocupado pelo amendoim torrado ou cru; araticum – presente em sucos, picolés; cagaita – usada na queijadinha; murici e jambu – utilizados em tortas e quiches; jatobá – presente em suflês, doces e salgados. Para alguns, cozinhar é diversão, para outros é dever, mas para os alunos das oficinas da AAF lidar com a comida pode significar as duas coisas. As aulas de culinária, que mais parecem um momento de brincadeira, são, na verdade, uma hora de muita concentração e aprendizagem, pois as crianças absorvem conhecimentos, desenvolvem habilidades e, principalmente, conhecem o potencial alimentício do Cerrado. Buscamos modificar hábitos alimentares para que em comunidades socialmente carentes, mas ambientalmente ricas, o Cerrado seja uma alternativa de combate à fome e de geração de renda por meio da exploração sustentável dos recursos disponíveis nos quintais.

Termos culinários

Conhecendo os aromas e sabores do Cerrado

Hortaliças, legumes e verduras são termos nutricionais, agrícolas e culinários que se referem a plantas consumidas pelos seres humanos como alimento. Geralmente não são consideradas hortaliças as frutas, os frutos secos, as especiarias, os grãos, as batatas e alguns tubérculos, como a mandioca. No entanto, do ponto de vista nutricional, todos esses produtos, com exceção das frutas doces, podem ser classificados como hortaliças. O termo legume é também utilizado em botânica para designar um tipo de fruto, também chamado vagem, e as sementes, como os feijões. Usualmente se incluem na categoria verduras as folhas (alface), os caules (aspargo) e as raízes de diversas plantas (cenoura). Mas nessa categoria podem ser incluídos também frutos não doces, como as vagens verdes (por exemplo, do feijão) ou suas sementes (como as das favas), o pepino, os diferentes tipos de abóboras, tomates, abacates e pimentas. Por extensão, consideram-se, por vezes, como hortaliças algumas sementes já maduras (secas), como ervilhas e feijões. A produção familiar das hortaliças é feita nas hortas. A produção comercial das hortaliças é uma especialização da horticultura chamada olericultura.

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Especialidades do Cerrado Mas fora da horta, bem ali no quintal, estamos redescobrindo sabores e odores que os antigos habitantes do Cerrado já usavam como especiarias da culinária tradicional, e por falta de repasse do conhecimento muito se perdeu no tempo. Entretanto, graças ao empenho e à união de estudiosos do bioma Cerrado e da gastronomia brasileira esses produtos, antes tidos como sem valor nutritivo nem econômico, vêm ganhando força e voltando à mesa do brasileiro como pratos simples, mas saborosos, ou em sofisticadas receitas que frequentam as cozinhas internacionais. Que tal uma aula de culinária na qual as crianças possam descobrir os sabores e os odores do Bioma Cerrado e aprender a valorizar seu potencial econômico para a comunidade, a região, o país e o planeta? Considerando que nosso organismo precisa dos mais variados nutrientes para que possamos fazer frente às diferentes necessidades ocorridas nos estágios do nosso desenvolvimento natural, sugerimos: solicitar pesquisas sobre os alimentos mais saudáveis, descrevendo quais seus principais benefícios para a saúde e os cuidados nutricionais exigidos durante as várias fases da vida: da gravidez à velhice; solicitar pesquisa sobre os alimentos nativos do Cerrado e seu valor nutritivo e ou medicinal.

Oficina de viveiro educador Viveiros são espaços naturalmente agradáveis e, por suas características, com enorme potencial para a aprendizagem transversal e interdisciplinar, além da sensibilização. Por isso, eles são amplamente utilizados nas ações de educação ambiental. Além do cultivo de mudas de árvores e hortas, a AAF procura tornar seus viveiros espaços amplamente integrados com a comunidade, propiciando oportunidades de aprendizagem, convivência e articulação. Nessa oficina, além de se produzirem mudas, desenvolvem-se também processos que buscam ampliar as possibilidades de construção de conhecimento que tragam em seu bojo a reflexão crítica sobre questões relevantes para a educação ambiental, tais como: responsabilidade socioambiental, segurança alimentar, inclusão social, geração de renda, ética, solidariedade, recuperação de áreas degradadas, entre outras possibilidades. Primeiramente por meio de maquete e depois em campo, as crianças e os jovens aprendem que um viveiro florestal não pode ser uma simples fábrica de mudas, produzindo milhares de mudas que podem ser metodicamente plantadas, sem estabelecer nenhum tipo de reflexão acerca da complexidade envolvida no plantio de árvores e sua importância no contexto local e global. Todos são levados a refletir sobre a forma como o ser humano tem se relacionado com a natureza, as causas e os efeitos dos problemas socioambientais, assim como as possibilidades de enfrentamento. A produção de mudas passa a ter significado mais profundo e complexo. Conduzido de forma pedagógica e questionadora, o viveiro estimula o surgimento de novas iniciativas que complementam e fortalecem os processos de educação ambiental desenvolvidos. Na oficina enfoca-se que, além de desempenhar seu potencial educador, esses espaços têm uma função produtiva. São espaços organizados para a germinação e a reprodução de espécies vegetais em condições adequadas, segundo as exigências e as necessidades essenciais e específicas de cada espécie. “Podemos caracterizar um viveiro florestal como um espaço estruturado, com características próprias, destinado à produção, à proteção e ao manejo de mudas até que tenham idade e tamanho suficientes para resistir às condições adversas do meio e terem um crescimento satisfatório quando plantadas em definitivo” (PAIVA, 2000). Mas também pode ser uma sala de aula onde as diversas disciplinas podem ser trabalhadas.

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Oficina de monotipia – pigmentos do Cerrado Esta é uma técnica que permite a reprodução de um desenho ou mancha de cor numa prova única, daí o nome “monotipia”. A monotipia oferece um desenho rápido, desprendido, de gesto livre e expressivo com a linha, o traço e o uso da cor. A pintura, de modo geral, é uma atividade artística que agrada muito às crianças e aos jovens Entretanto, todos sabem que as tintas encontradas nas papelarias são compostas por ingredientes pouco confiáveis. Muitas vezes são utilizados químicos que tanto afetam a saúde dos pequenos quanto os rios após serem descartados. Uma alternativa para evitar o uso de tais tinturas é fazer sua própria composição utilizando ingredientes caseiros, como ensina o site . Nesta oficina, o monitor explica o princípio das cores e como é possível produzir tintas com sementes, terra e espécies da flora do Cerrado. Também trabalha o senso artístico e inventivo, a imaginação e a criatividade, permitindo à criança desenhar livremente.

Como fazer tintas naturais O pó de café resulta na cor marrom; do urucum vem a cor laranja; do açafrão, o amarelo. O processo de produção de tinta artesanal é simples e divertido: basta misturar água e cola branca a um ingrediente natural. As proporções dependem da quantidade de tinta a ser feita para ser usada de imediato. Ao preparar a tinta, os alunos aprendem que não existem apenas produtos industrializados. Antes da produção e da utilização, eles podem pesquisar substâncias corantes – sementes, carvão e terra, entre outras opções Os estudantes maiores conseguem ir além e aproveitar a atividade para estudar outras disciplinas, como Artes e História. Podem aprender, por exemplo, que o pintor Alfredo Volpi (1896-1988) preparava as próprias tintas utilizando a técnica de têmpera (pigmentos dissolvidos na clara de ovo). Ou que os índios produzem tintas para pintar o próprio corpo em diferentes ocasiões, como em uma comemoração ou na preparação para a guerra. Tinta de terra Material: terra, peneira fina, coador de pano, pano velho. Como fazer: para fazer tinta de terra, é importante ver se ela é barrenta, se tem “liga” ou “pega”. Terra com muita areia não serve. Serve a tabatinga ou a terra comum, que pode ser encontrada de várias cores. Pegar uma porção de terra e socar bem. Peneirar em peneira fina várias vezes, misturar água, mexer bem e coar essa mistura num coador de pano. Jogar fora a areia, colocar dentro de um vidro a água coada. Deixar a água barrenta descansar por dois dias para que o barro vá para o fundo, separando-se da água, isso se chama decantar. No segundo dia, jogar a água fora com cuidado para não voltar a misturar. Retirar o barro do vidro, colocando em um pedaço de pano e levar ao sol para escorrer um pouco. Depois colocar o “barro” em um recipiente plástico, acrescentar um pouco de água e de cola. Se quiser acentuar a cor, colocar um pouco de óleo de cozinha. Tinta de carvão (cor preta ou cinza) Material: carvão, água, peneira ou pedaço de pano. Como fazer: socar bastante o carvão. Depois misturar bastante água no pó, peneirar ou coar num pano. Deixar descansar por duas horas. Jogar fora, com cuidado, a água de cima e colocar um pouco de cola.

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Educando pelas Trilhas do Cerrado: um roteiro de ações para a educação ambiental em escolas e comunidades

Tinta de beterraba (cor grená ou rosa) Material: beterraba e água. Como fazer: aproveitar a água em que a beterraba cozinhou. Para a cor da tinta ficar mais forte cozinhar com menos água. Pode acrescentar qualquer cola para engrossar. No caso de ter beterraba nas sobras da horta que não prestem para comer, pode fazer a tinta com a própria beterraba batida ou amassada na água e depois peneirada.

Oficina “O luxo do lixo” – reaproveitamento de resíduos sólidos Lixo é todo e qualquer resíduo proveniente das atividades humanas ou gerado pela natureza em aglomerações urbanas. Comumente é definido como aquilo que ninguém quer. Porém, precisamos reciclar esse conceito de lixo, deixando de enxergá-lo como uma coisa suja e inútil em sua totalidade. Grande parte dos materiais que vão para o lixo pode e deve ser reciclada. A produção de lixo vem aumentando assustadoramente em todo o planeta. Visando a uma melhoria da qualidade de vida atual e para que haja condições ambientais favoráveis à vida das futuras gerações, faz-se necessário o desenvolvimento de uma consciência ambientalista. Além do baixo custo, o artesanato com reciclagem ajuda nosso sofrido planeta e ameniza os efeitos que o homem moderno tem provocado no próprio chão onde pisa. Criar objetos com material reciclado é como ter duas aventuras ao mesmo tempo: uma leva a cuidar do planeta, diminuindo a poluição gerada por plásticos, vidros e outros materiais que podem ser reciclados (virar outra coisa); a segunda aventura será a capacidade de usar a criatividade e a imaginação para dar uma nova função e forma a esses materiais. A reciclagem é o termo geralmente utilizado para designar o reaproveitamento de materiais beneficiados como matéria-prima para um novo produto. Muitos materiais podem ser reciclados, e os exemplos mais comuns são o papel, o vidro, o metal e o plástico. As maiores vantagens da reciclagem são a redução da utilização de fontes naturais, muitas vezes não renováveis, e a diminuição da quantidade de resíduos que necessitam de tratamento final, como aterramento ou incineração. O conceito de reciclagem serve apenas para os materiais que podem voltar ao estado original e ser transformados novamente em um produto igual em todas as suas características; é diferente do de reutilização. O reaproveitamento ou reutilização consiste em transformar um determinado material já beneficiado em outro. O despertar dessa consciência é o aspecto trabalhado nas oficinas de reciclagem, onde as crianças aprendem não só a reutilizar e a reciclar materiais descartados, mas, principalmente, a repensar sua verdadeira necessidade de consumo.

Pintura de painéis do Cerrado A pintura refere-se genericamente à técnica de aplicar pigmento em forma líquida a uma superfície a fim de colori-la, atribuindo-lhe matizes, tons e texturas. Em um sentido mais específico, é a arte de pintar uma superfície, tais como papel, tela ou parede. A pintura é considerada por muitos um dos suportes artísticos tradicionais mais importantes. Mas nas oficinas do projeto esse conceito de pintura vem sendo ampliado para a representação visual do Bioma Cerrado por meio das cores de sentimentos e emoções. É este o enfoque dado nas oficinas de produção de painéis do Cerrado – as crianças materializam em tecidos imagens da natureza local, inserindo animais nunca vistos de perto e aprendendo a importância de cada ser existente no ecossistema. Quais os argumentos da educadora para explicar como as crianças pequenas produzem pinturas? As crianças são levadas a pesquisar sobre a fauna, investigam sobre como é esse lugar. Inicialmente começam o trabalho usando todas as cores, mas depois passam a se interrogar sobre que cores são necessárias. Comprometem-se com seu próprio processo na pintura a partir da experimentação. A pintura acontece em função de um projeto pessoal, de uma pesquisa e de um processo de construção que precisa ser compreendido também pelo professor com um olhar diferenciado para as imagens que surgem na pintura das crianças e jovens que retratam seu olhar para o mundo.

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Passarinhos do Cerrado – argila e origames Muitos animais são dispersores de sementes, mas os pássaros foram os escolhidos para representar a relação ecológica entre seres vivos de espécies diferentes nas oficinas de educação ambiental do Projeto Semeando o Bioma Cerrado. Com criatividade, as crianças utilizam a argila e ou dobraduras de papel para moldar as aves representativas desse ecossistema. Tucanos, corujas, joõesde-barro e muitas outras aves ganham vida nas mãos das crianças, enquanto são repassadas importantes informações sobre os maiores semeadores do planeta, que viajam e trabalham muito para sobreviver na natureza, ameaçados pela degradação e pelo tráfico de animais.

Conhecendo as aves como semeadores

A arte milenar japonesa de fazer dobraduras em papel encanta pessoas no mundo todo. Utilizando um pequeno número de dobraduras de formas variadas é possível fazer desde imagens simples a desenhos complexos. Os monitores dessa oficina transformaram um pedaço de papel em aves do Cerrado, com incríveis detalhes. Para as crianças, trabalhar com origami é muito produtivo e divertido, pois a arte pode ajudar aos pequenos a ter concentração e coordenação motora. Como o origami possui diferentes níveis de dificuldades, é possível investir em desenhos e formas perfeitas para o público infantil. Esse tipo de atividade é ideal para ser realizado em qualquer lugar, seja na escola, como um método educativo, seja em casa, com pais e amigos. As crianças envolvem-se muito com as dobraduras de papel, principalmente se tiverem exemplos prontos para que possam visualizar como ficará o resultado final. Antecipadamente se deve estabelecer um passo a passo do animal que se deseja fazer com as dobraduras, ou com a argila Dar forma à argila propicia também uma experiência riquíssima para as crianças. Por ser um material maleável, a argila permite a exploração tátil para a estruturação de formas, sendo um excelente meio de estimular a criatividade. A modelagem favorece o jogo simbólico, pois as crianças dão significados às formas que elaboram e as modificam à medida que trabalham com a argila. Dessa maneira, permite-se que os pequenos tenham um maior contato com os sentidos, principalmente o tato e a visão, liberem seus movimentos e desenvolvam a percepção e a psicomotricidade, fatores importantes na sua formação. Ao trabalhar com a argila, vale bater, enrolar, furar, torcer, beliscar, amassar, puxar ou alisar com os dedos molhados. Após a modelagem, cabe ainda o trabalho com diferentes tipos de tintas, desde as naturais, como guache, até tinta acrílica ou tinta PVA para artesanato, por exemplo, e a exploração das cores e suas misturas.

Fontes de energia: use corretamente o que a natureza oferece A primeira fonte de energia a ser usada pelo ser humano foi o sol e seu próprio corpo. Com o tempo, passouse a usar a energia do vento, da água e dos músculos dos animais domesticados. Na Revolução Industrial, o uso do carvão mineral como fonte de energia deu um grande impulso à indústria e aos transportes. Isso propiciou o funcionamento dos motores a vapor instalados nas máquinas fabris, nas locomotivas e nos navios. A busca de novas fontes de energia, mais eficientes e economicamente rentáveis, continuou. No século XIX, o petróleo, que já era conhecido desde a pré-história, começou a ser usado na indústria para a produção de gasolina e de outros derivados. No século XX foi a vez do aproveitamento da energia nuclear, contida nos átomos do núcleo. É impossível imaginar o mundo moderno sem o aproveitamento das fontes de energia. No entanto, elas não geram apenas riqueza. A queima do petróleo e do carvão, por exemplo, provoca sérios danos ao meio ambiente, como o aumento do efeito estufa, responsável pela elevação da temperatura média da Terra. As centrais hidrelétricas geram, como todo empreendimento energético, alguns tipos de impactos ambientais, como alagamento das áreas vizinhas e aumento do nível dos rios. Algumas vezes o curso do rio represado pode ser modificado, podendo, ou não, prejudicar a fauna e a flora da região. Até há bem pouco tempo se pensava que

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só as grandes hidrelétricas impactavam o ambiente e as populações ribeirinhas do entorno dos reservatórios construídos. Hoje se sabe que o efeito sinérgico da construção de várias pequenas centrais elétricas em uma bacia hidrográfica é também devastador. Todavia, este ainda é um tipo de energia mais barata do que outras, como a energia nuclear, e menos agressiva ambientalmente do que o petróleo ou o carvão, por exemplo. E a energia hidráulica é a maior fonte de energia que temos hoje. Por isso, promover o uso correto da energia disponível passou a ser um desafio da educação ambiental. Nesta oficina isso é feito demonstrando-se em maquete o consumo diário de uma residência e as formas de racionalizar esse consumo.

Oficina de jogos e brincadeiras – aprenda com a natureza A introdução do lúdico nas atividades educativas é uma maneira muito eficaz de entrar no universo infantil para imprimir-lhe o universo adulto, apresentando-lhe nossos conhecimentos, ideias, valores e, principalmente, a forma de interagirmos. A atividade lúdica é muito importante para o desenvolvimento sensório motor e cognitivo e é uma maneira inconsciente de se aprender, de forma prazerosa e eficaz, a transversalidade disciplinar e a complicada rede da vida. Jogos cooperativos utilizados nas oficinas são empregados como dinâmicas de grupo com o objetivo de despertar a consciência de cooperação e promover efetivamente a ajuda entre as pessoas, tomando sempre por base o exemplo da natureza. No jogo cooperativo, aprende-se a considerar o outro que joga como um parceiro, e não como adversário, ensinando a pessoa a se colocar no lugar do outro, e não priorizar apenas o seu lado. Incentiva a união das pessoas e reforça a confiança em si mesmo e nos outros. O ganhar ou perder não é o que realmente importa, e sim o processo como um todo. Essas oficinas resultam na vontade da criança em continuar jogando e aceitando todos como são verdadeiramente. Ajudam as pessoas a se libertar da competição, seu objetivo maior é a participação de todos por uma meta em comum, sem agressão física, e cada um no seu próprio ritmo. Os jogos cooperativos ajudam as pessoas a aprender a trabalhar em grupos, desde crianças até adultos. O que mais importa é a colaboração de cada indivíduo do grupo e o que cada um tem para oferecer no momento da atividade. Nesta oficina é reforçada a noção de grupo, porque uma determinada tarefa é cumprida de forma mais eficaz com a ajuda dos vários elementos da equipe.

Bincando para observar a força da união na natureza

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Oficina ecoesporte – jogando com a natureza A promoção de um trabalho educativo com compromissos firmados para a formação do cidadão ecológico e com as grandes questões envolvendo a paz, o meio ambiente e a inclusão social não poderia deixar de inserir a atividade física como forma de fortalecer a relação harmoniosa do homem com a natureza. Integrando os movimentos da fauna e da flora em ações de educação física realizadas em ambientes naturais, as crianças aprendem o verdadeiro sentido da vida. O movimentar-se com a observação da natureza traz a compreensão do porquê das regras impostas, a necessária disciplina e o papel de cada elemento, inclusive o humano, na complexa rede planetária. O esporte, aliado à educação, é uma poderosa ferramenta da proteção social e resgate de crianças e jovens em situação de risco, pois, mesmo fora da escola, eles podem se manter ocupados com atividades prazerosas, diminuindo o ócio e evitando o risco de estar nas ruas, convivendo e aprendendo “o que não devem”. Entretanto, é preciso entender o esporte, acima de tudo, como um instrumento pedagógico capaz de agregar valor à educação, ao desenvolvimento das individualidades, à formação pessoal para a cidadania, à orientação para a prática social e naturalmente ao respeito à natureza. Como todo processo educativo, se utilizado corretamente de forma transversal e com a interdisciplinaridade, as oficinas de ecoesporte contribuem para a formação do cidadão ecológico, para participar da vida política, econômica e social das cidades, estados e do país. Precisamos entender que o papel decisivo do esporte perante a educação é a busca por princípios e valores sociais, morais e éticos.

No Ecoesporte se aprende movimentos e equilíbrios com a natureza

Brincando e aprendendo – contos, cantos e encantos do Cerrado *Ana Patrícia Oliveira Ramos Siqueira

Como é nosso bioma? Há quem veja a educação como um processo que ocorre apenas na escola. Mas também se pode entender por aprendizagem a maneira como cada um vive no dia a dia, um jeito de olhar para o mundo com atenção ao novo, ao diferente, ou mesmo de se espantar com o que sempre esteve aí, como o brilho dos dias, o canto dos pássaros, a brincadeira das crianças, a contação de histórias, as adaptações de antigas cantigas de roda. Aprender pode ser coisa de uma alegria sem comparação – “A educação nos leva para mundos novos e nos faz experimentar sentimentos que desconhecíamos. A educação torna as pessoas mais ricas internamente”. Repercutindo (no amplo sentido) o pensamento de Rubem Alves, elas enchem o ambiente de beleza e embalam a alma da gente. Na educação ambiental não é diferente, desde cedo as crianças precisam começar a receber corretamente informações acerca do Bioma Cerrado, pois a primeira ideia que têm é de que esse ecossistema

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é um espaço seco e sem vida. O grande desafio a vencer na educação ambiental é o desconhecimento dos elementos que compõem esse rico bioma. Se perguntarmos a um aluno se ele é capaz de criar uma história com ilustrações sobre elefantes, leões e girafas certamente ouviremos uma resposta afirmativa. A quantidade de informações, imagens e canções sobre tais bichos é incontável. Entretanto, o mesmo não acontecerá se no lugar do elefante apresentarmos a anta, ou o lobo-guará, ou o tamanduá, pois literatura e instrumentos pedagógicos com essa informação ainda são escassos. Educação ambiental – educação. Essa palavra, acompanhada de pequenas novidades, poderá fazer uma grande diferença na compreensão do mundo. Os poderosos frutos do Cerrado começam a ser mais bem difundidos, inclusive destacados na mídia especializada como iguarias utilizadas em requintada gastronomia. Ganham importância e começam a ser mais bem protegidos. Entretanto, os animais do Cerrado, apesar da triste realidade do tráfico, continuam desconhecidos para as crianças. Chegou a hora de apresentarmos às nossas crianças os bichos do Cerrado, com sua singularidade e beleza. Para sensibilizar crianças com esse conhecimento, Ana Patrícia Siqueira buscou inspiração na sua própria infância, resgatando cantos, contos e encantos que, adaptados e utilizados com a metodologia da ecopedagogia, encantaram as crianças participantes do projeto. Encante-se também com novas descobertas.

Conto 1 A ema emo Êta cerradão de meu Deus! Era só o que eu conseguia piar. Também, com tanta beleza ao meu redor! Construí o meu ninho no murundu da canela-de-ema. O murundu mais parece uma ilha tendo em sua volta um suave capim amarelo, fino e rasteiro. Gosto de observar quando humildemente se curvam quando a suave brisa do entardecer do Cerrado passa sobre seus fiapos e ele, numa atitude reverente e agradecida, deixa cair sementes que serão levadas para outros campos e assim darão continuidade ao ciclo de reprodução que perpetuará a espécie. A boa semente que nos é ofertada diariamente pela natureza. O Cerrado anda muito perigoso. As estradas complicaram a nossa vida. Quando meu avô Emualdo chegou por aqui, falar em campo sujo representava apenas a ideia de poucas árvores quebrando a imensidão dos campos. Hoje? Campo sujo representa literalmente sujeira quase eterna. Garrafa pet, sacolinhas plásticas e latas de cerveja. Esse lixo é jogado nas estradas diariamente. O pior e mais perigoso são as sobras do cigarro. São sutilmente lançadas pelas janelas dos Ana Patrícia Oliveira Ramos Siqueira carros. De forma também sutil, a pequena brasa passa para um fiapo de capim. Não é sutil a forma como o fogo se espalha e devora tudo o que há pelo caminho. Ainda bem que as árvores daqui, já acostumadas com o clima quente e grandes períodos de estiagem, formam uma casca muito grossa que protege o tronco. Após uma queimada, avistamos uma terra cinza, caules pretos e fumaça, mas, como uma fênix que ressurge das cinzas, basta uma chuva para que tudo se vista de verde novamente, pois o meu Cerrado é bravo, teimoso, lutador. Na estiagem passada tudo aconteceu. Eu passeava pelo campo, não era bem um campo. Toda a vegetação natural havia sido arrancada para dar lugar a uma grande plantação de soja. Estava por ali, comendo sementes maduras quando uma pena de minha plumagem perto da asa ficou presa ao arame farpado. Foi bem na hora que eu atravessava aquela cerca quebrada, perto do jatobazeiro, era a minha entrada secreta. Quando me vi enganchado danei a gritar, e logo duas emas de mim se aproximaram e com leves bicadas puxaram a minha asa. – Acalme-se rapaz. Abaixe a cabeça para facilitar! Quem deu a ordem foi Jurema, a gata! Apaixonei-me. Sua irmã, Flor, ficou apenas assistindo e logo mostrou o quanto era brava: – Você não sabe que nossas asas são grandes demais! Tenha mais cuidado da próxima vez!

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– Terei mais cuidado senhora. Muitíssimo obrigado pela atenção – respondi envergonhado. As meninas partiram, mas eu percebi quando Jurema olhou para trás. Tive vontade de sorrir. Tentei acenar, mas a minha asa doeu demais. Fiz uma cara muito feia, quase entortei o meu bico, e quem sorriu foi ela. No dia seguinte parti para o campo de soja novamente. Dessa vez tive bastante cuidado e estava com uma pena pendurada. Logo avistei as damas. Ao me aproximar, a pequena Cris, filha da Flor, me perguntou: – Por que você não arranca essa pena e a joga no lixo? – Menina, isso dói pra caramba! Ainda está presa à pele. – Bom-dia! Foi a linda Jurema quem quebrou o gelo. – Bom-dia senhorita! – respondi como um perfeito cavalheiro. Floema queria ensinar sua cria a delícia que é correr com as asas abertas contra o vento. Quando eu passava, sempre mangavam de minha pena torta. A malvada caía sobre a minha coxa. As emas falavam pra eu arrancála, mas cadê a coragem? Sabe quando a parte colante do bandaid gruda na ferida? É assim a dor. Meu amigo, já tentei. Qual o problema? No verão passado, resolvi dar umas voltas. Eu estava ainda tentando conquistar o coração da Jurema. Era amarradão na gata. Convidei as amigas para um passeio na chapada e ali estavam acampados alguns garotos. Quando perceberam a nossa presença, um deles perguntou: “Qual é o masculino de ema?” Imediatamente obteve a resposta: emo. Não deu outra, me dei mal. Jurema e a irmã começaram a me chamar de ema emo. Riram até não poder mais. Os garotos resolveram fazer uma fogueirinha. Foi aí que tudo começou. Foi aí que tudo acabou. Eles desarmaram a barraca e partiram com as fotos do entardecer vermelho produzido pelo ferro incandescente da poeira do Cerrado e nós ficamos com o fogo que queima muito mais que aquele sol distante e que, atiçado pelo vento, passou pelo capim seco e tomou conta do meu espaço, do meu cerrado. Corremos sem rumo e sem ar. As chamas eram altas. Certa hora, o desespero não permitiu que Flor avistasse o arame farpado. Ela ficou enganchada no arame e o fogo a alcançou. Não podíamos parar. Empurrei a cria pra o outro lado da cerca e continuamos a correr. O campo nos salvou. O fogo já havia passado por ali e sugado todo o capim. Abracei Jurema, que tremia de medo e tristeza. Uma leve neblina tentou nos acalmar. Fiquei com Jurema. Fico aqui vigiando cada passeio e corrida. O meu lema é: aonde há acampamento, há fogo. É bom ficar bem longe. Uma linda flor lilás apareceu nos campos negros de carvão. O caule se parecia com a canela da Flor. Nosso ninho é adornado pelas flores da canela-de-ema. E, pra variar, na minha espécie, e eu sou uma ema macho, nós chocamos os ovos e cuidamos dos filhotes. É assim que o Cerrado se renova. Opa! Jurema! O ovo está quebrando, corra, corra pelos campos verdes. Uma nova vida está chegando. Corra pra perto de mim, seu emo. O esquisitão que te faz sorrir. O Cerrado está se renovando mais uma vez. Correremos pelos campos com as asas abertas contra o vento no entardecer vermelho do Cerrado.

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Educando pelas Trilhas do Cerrado: um roteiro de ações para a educação ambiental em escolas e comunidades

Terra O planeta Terra já está com sua estrutura comprometida. Hoje é o dia perfeito para iniciar essa nova forma de pensar o nosso bioma. Prepare um clima especial para sensibilizar a razão e estimular o interesse pela vida. Separe uma trilha sonora que lembre a natureza e faça a leitura do texto “O planeta sonho”. Pergunte às crianças: como vocês imaginam o planeta dos seus sonhos? O que existe nele? Como é a natureza? Como as pessoas cuidam desse planeta? Podemos fazer o mesmo pelo nosso planeta?

Conto 2 O planeta sonho Tudo era escuridão. A grande Luz pairava pelo universo infinito, porém não o iluminava por inteiro. Foi aí que uma lágrima apareceu na face da grande Luz. Nada podia ver. Na sua consciência, infinitas formas surgiam e logo desapareciam como se fossem as formas produzidas pelas nuvens que são empurradas pelo vento: eram formas de luz. Aquelas formas desconhecidas eram como se fossem crianças querendo nascer, mas ainda estavam presas naquele útero de luz, eternamente guardadas e protegidas em uma redoma de energia que duraria a eternidade se não fosse o desejo de perceber de fato aquelas imagens, aqueles sonhos de vida.

Ana Patrícia Oliveira Ramos Siqueira

A grande e eterna Luz, dando forças ao seu desejo, começou a resplandecer de uma maneira diferente. Encheu-se de força e amor e brilhou, mas brilhou tanto que explodiu em centenas de milhares de raios, que voaram pelo espaço infinito por muitos anos. Após perderem a velocidade, pairaram no infinito. Os raios que se desprenderam da consciência permaneceram iluminados e formaram as grandes estrelas. Os pequenos raios que se desprenderam do desejo de ver a vida acontecer se transformaram em esferas, que escolheram viver próximo às estrelas. A grande Luz não estava mais só. Agora podia ver espetáculos de explosões de luzes e cores de todos os tons.

A grande Luz preparou-se então para ver aquelas formas que voavam em sua mente antes de se espalharem pelo Multiverso, aquele espaço eterno e infinito, mas nada podia ver. As esferas dependiam das estrelas. Luz e movimento. Foi nesse dia que, pela primeira vez na eternidade, a Luz chorou. A lágrima que correu em sua face iluminada caiu em uma esfera que girava em torno da estrela que conhecemos como Sol. Ela envolveu aquele planeta com formas tão irregulares e ali se instalou para sempre. Mesmo diante do Sol, a lágrima da Luz não se evaporou. Impregnou-se no planeta Terra como se fosse um ímã. A terra molhada pela lágrima da Luz, água salgada de tom azul que conhecemos como oceano, liberou um vapor formando assim a atmosfera. A Luz parou para assistir àquela cena e gostou muito. Sorriu e pensou que ali seria possível surgir a vida com que estava sonhando desde a eternidade. Compadecido, um raio se desprendeu de suas mãos eternas e, como se fosse semente lançada, instalou-se na Terra. Logo suas raízes se estenderam pelo oceano salgado e começou a crescer uma grande árvore – a árvore da vida. Cresceu e ficou do tamanho do planeta em altura. A Luz sorriu. A árvore era verde de vários tons. A visão da árvore da vida era tão fantástica que milhares de raios da Luz que ainda não tinham se transformado em planetas ou estrelas, por serem muito pequenos, começaram a pousar ali como se fossem pássaros que passaram quase uma eternidade voando e finalmente encontram repouso em um ninho aconchegante. Com o passar dos séculos, a árvore da vida guardava em seus galhos, ramos, folhas e raízes milhares de pequenas luzes como se fossem pisca-piscas de árvore de natal. Algo ruim estava acontecendo. Com tantas luzes lhe aquecendo, a árvore começou a secar. Logo tombou sobre o planeta e seus galhos se esparramaram por todos os lados. A grande Luz, que não se cansava de sonhar, soprou sobre a árvore, e a umidade do seu hálito começou a umedecer os galhos de tal forma que se transformaram em uma água doce, como doce deve ser a vida. Por todo o planeta Terra, águas doces e cristalinas começaram a correr. Das sementes da árvore da vida surgiram milhares de outras espécies que bebiam a doce água da árvore.

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Quando as pequenas luzes experimentaram aquele sabor diferente, viram imagens refletidas nas águas, e enquanto saciavam a sede provocada pelo calor da luz ganhavam formas fantásticas. Foi assim que apareceram todos os animais da Terra. Os grupos se espalharam pelo planeta. Em cada lugar onde nasciam se adaptavam às condições que lhe eram oferecidas. Por muitos séculos a grande Luz observou e sorriu, pois finalmente podia ver aqueles seres tão perfeitos. Enquanto alguns se assemelhavam às pedras em movimento, parecidos com os elefantes, outros, o camaleão e a cobra, misturavam-se ao verde da vegetação. Os oceanos também ficaram cheios de vida. Milhares de peixes povoaram as águas. Tudo estava perfeito, mas a grande e eterna Luz gostava de sonhar. Queria um ser especial que fosse capaz de interagir com o planeta, com todos aqueles seres que se formaram. Por ser infinita e eterna, só podia observálos a distância. Pensou em formar um ser que pudesse sonhar e viver entre toda aquela criação. Do pó da terra criou o homem. Tinha a mesma matéria da terra, mas recebera em sua mente o sopro da vida que era capaz de sonhar. As criações e as construções se iniciam em um sonho. O primeiro sonho do homem foi o domínio absoluto. Tudo deveria estar debaixo dos seus pés. Seus sonhos sempre eram erguidos na destruição do espaço que era ocupado por todos. O que demorou eras para ser edificado em pouquíssimo tempo estava se acabando. Os animais, subjugados, extinguem-se a cada dia. A vegetação sonha com o tempo em que era a vida do planeta. Ele, o único ser capaz de sonhar, ficou deslumbrado com sua capacidade superior e não percebe que está destruindo o planeta que nasceu de um sonho de vida. Tudo era escuridão... Uma luz infinita vaga pelo espaço sonhando com uma nova criação, porque o primeiro céu e a primeira terra foram destruídos pelo sonho egoísta da humanidade.

Ana Patrícia Oliveira Ramos Siqueira

Assim como podemos inventar muitas histórias sobre os bichos do Cerrado, fazer canções é mais divertido ainda. Podemos fazer uso das melodias que pertencem ao folclore brasileiro e criar novas letras! Para começar, cante com os alunos as musiquinhas da ema, do tatu e da capivara. Esses animais são encontrados facilmente no Cerrado e não correm risco de extinção. Observar imagens e reproduzi-las livremente é uma poderosa ferramenta para fixar novos conhecimentos. Abuse desse recurso pedagógico com as crianças, incentivando-as a desenhar nossos bichos.

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Cantos Letras adaptadas por Ana Patrícia às antigas músicas do folclore brasileiro a) Ema (música de “Escravos de Jó”) Vive pelos campos sempre a passear Ema, eminha Quero lhe ajudar O Cerrado, sua casa Prometo, vou preservar! Ema é bem faceira, e muito arredia Corre, foge Não quer minha companhia O Cerrado, sua casa Prometo, vou preservar! O macho choca os ovos Sem nunca reclamar Choca, cria Da ninhada cuidará O Cerrado, sua casa Prometo, vou preservar! b)Tatu-galinha (música de “Pai Francisco entrou na roda”) Seu tatu entrou na toca Queria se esconder, se esconder! Vem de lá uma onça parda Caçar o tatu para comer Como ele entrou todo apressado Parecia um ratinho bem assustado! Seu tatu tem casco duro Nove cintas usará, usará Chamam de tatu-galinha Sua pegada denunciará Como ele entrou todo apressado Parecia um ratinho bem assustado! Tem unhas bem afiadas Sua toca cavará, sim cavará Mas outro animal folgado A sua toca quer ocupar Como ele entrou todo apressado Parecia um ratinho bem assustado! Ana Patrícia Siqueira

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Capítulo 10 Textos de Apoio Ao Professor No mundo ocidental, um dos grandes desafios é adaptar a educação às novas tecnologias, mas na educação ambiental, centradas no Bioma Cerrado, temos constatado que a maior dificuldade é o pouco conhecimento sobre o assunto, pois o Cerrado é ainda um bioma em estudo. Durante muito tempo foi visto e ensinado como um bioma feio, pobre e ainda não reconhecido pela Constituição Federal como patrimônio natural. Mas hoje já se sabe que o Cerrado é um berço de vida que se estende do norte ao sul do país. De acordo com o Ministério do Meio Ambiente, “o Cerrado é o segundo maior bioma da América do Sul”, e a Rede do Cerrado tem afirmado [...] que não há apenas vida animal em jogo quando o assunto é sua preservação, mas também a preservação de uma rede aquífera que alimenta todo o país, mantida limpa na medida do possível pelas raízes da vegetação que ainda resta. Isso porque o Cerrado e a Caatinga, diferentemente de florestas fechadas por copas de árvores, são mais profundos sob o solo do que acima dele .Por isso se diz que o Cerrado é uma floresta invertida. É, inclusive, pela longevidade das raízes que o tipo de bioma é tão resistente e suporta temperaturas extremas, ao mesmo tempo mantendo o solo firme e reciclando a água através da filtragem vegetal. O conjunto de fatores, portanto, engloba uma gama de bens naturais que devem ser – no mínimo – preservados ().

Conservação dos recursos naturais Marina de Fátima Vilela (Agência de Informação Embrapa)

A cada ano, milhares de plantas e animais desaparecem da Terra, e com eles desaparecem as oportunidades de fornecimento de benefícios à humanidade, o auxílio à manutenção do planeta e a possibilidade de serem reconhecidos pela ciência. A conservação e a manutenção das áreas nativas possibilitam que os serviços ambientais prestados pela natureza, como a ciclagem de nutrientes, a proteção das bacias hidrográficas, o sequestro de carbono, a disponibilidade e a qualidade da água, dentre outros, continuem ocorrendo. Diante dos benefícios e dos serviços prestados pela natureza, a preservação da diversidade biológica de um país, de uma região, é um investimento necessário para a manutenção de opções futuras, além de contribuir para a evolução do conhecimento científico, econômico e social. No Cerrado, por exemplo, existem mais de 10 mil espécies de plantas, 199 espécies de mamíferos, 837 espécies de aves, 180 espécies de répteis, 150 espécies de anfíbios, 1.200 espécies de peixes e 67 mil espécies de invertebrados. Muitas espécies que ocorrem no Bioma Cerrado são endêmicas, ou seja, só estão presentes nesta região. Devido ao rápido e desordenado processo de ocupação e também devido aos sistemas de produção implantados, o Bioma Cerrado é, atualmente, um grande conjunto de interações, interesses, conflitos, desafios e possibilidades, onde variedades selvagens de cultivares são perdidas e pelo menos 137 espécies animais estão ameaçadas de extinção. As transformações ocorridas no Bioma Cerrado e as ameaças constantes à biodiversidade têm deflagrado o surgimento de iniciativas de conservação pelo governo e por organizações não governamentais (ONGs). Algumas ações, como, por exemplo, a proibição do funcionamento de carvoarias que utilizam matéria-prima originada de desmatamento irregular, a criação de reservas particulares do patrimônio natural, a proposta de criação do ICMS Ecológico, o mapeamento dos remanescentes do bioma, permitindo maior eficácia no planejamento de ações para a conservação, dentre outros, são implementadas na tentativa de conservar a biodiversidade do Cerrado. No entanto, as poucas unidades de conservação existentes, as quais correspondem a aproximadamente 2,5% dos quase 204.000.000 de hectares do Bioma Cerrado, apresentam problemas ora relacionados à manutenção, à falta de equipamentos e de pessoal, ora relacionados às questões de desapropriação e/ou legalização das terras. A fragmentação da vegetação e o isolamento das UCs impedem a movimentação das espécies e o fluxo genético. Assim, há a necessidade de implantação e de manutenção de corredores ecológicos interligando as UCs e demais áreas naturais remanescentes, possibilitando, além do fluxo genético e a movimentação das espécies, a dispersão de espécies e a recolonização das áreas degradadas. Por fim, recomenda-se que a elaboração de políticas públicas, sobretudo aquelas voltadas para a conservação e para a agricultura, considere o conhecimento existente em relação às espécies, aos serviços ambientais e ao funcionamento dos ecossistemas.

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Ecologia e o Bioma Cerrado O dicionário Michaelis define ecologia como “a parte da biologia que estuda as relações dos organismos com o ambiente, isto é, com o solo, o clima e os outros organismos que povoam determinada zona da Terra”.

Definir ecologia como o estudo das relações dos seres vivos entre si e com o ambiente seria pouco para caracterizar a importância e a abrangência do que é a ecologia hoje, definida por alguns como a força motriz de uma mudança radical na atitude do ser humano civilizado perante a natureza. O ambiente onde ocorrem as complexas relações mútuas e a transferência de energia entre os seres vivos e o meio é definido como ecossistema. Mas onde começa e termina um ecossistema? Qual ou quais seus limites? Para uma melhor compreensão e para a possibilidade para investigações científicas os ecossistemas podem ser separados em ecossistema aquático (lagos, rios, mares e oceanos) e ecossistema terrestre (florestas, desertos, mangues, pastagens, dentre outros). As dimensões de um ecossistema, determinadas para efeito de estudo, geralmente não ocorrem naturalmente. Dessa forma, um vaso ou uma cidade podem ser exemplos de ecossistemas, mesmo criados pela ação humana. Assim, fica claro que um ecossistema pode ter desde alguns cm2 até milhares de km2.

Nesse contexto, interessa-nos as relações e a transferência de energia entre os seres vivos e o Bioma Cerrado. Entretanto, é importante observar que os biomas não são ambientes fechados, uma vez que há fluxo de energia e matéria entre eles, adjacentes ou não. Como exemplo do fluxo de energia e matéria tem-se a entrada de fertilizantes, defensivos e combustíveis no sistema e a exportação de grãos, carne e combustível, dentre tantos outros.

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Principais biomas do Brasil Atualmente há vários sistemas de classificação para grandes áreas de vegetação existentes no país. No entanto, geralmente são reconhecidos seis grandes biomas: Cerrado, Campos Sulinos, Floresta Atlântica e de Araucária, Caatinga, Floresta Amazônica e Pantanal. Em cada bioma há um tipo de vegetação (fitofisionomia) predominante que ocupa a maior parte da área e que é determinada em primeiro lugar pelo clima. Outros tipos de vegetação também são encontrados, e sua ocorrência está associada a eventos temporais (tempos geológico e ecológico) e a variações locais, como aspectos físicos e químicos do solo, paisagem, relevo e topografia.

Mapa demonstrativo dos biomas brasileiros

Mapa demonstrativo dos tipos de vegetação do Bioma Cerrado Restrito Cerrado Sentido Amplo Cerrado Sentido Restrito Formações Florestais

Formações Savânicas

Formações Campestres

5. Cerrado

1. Mata Ciliar

2. Mata de Galeria

3. Mata Seca

4. Cerradão

a. Denso

b. Típico

Ilustração: José Felipe Ribeiro

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c. Ralo

d. Rupestre

Formações Savânicas

6. Campo Sujo 7. Campo Limpo

9. Vereda

8. Campo Rupestre

11. Palmeiral

10. Parque de Cerrado

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Tipos de vegetação do Bioma Cerrado Podemos definir um bioma como um conjunto de vida, vegetal e animal, especificado pelo agrupamento de tipos de vegetação e identificável em escala regional, com condições geográficas e de clima similares e uma história compartilhada de mudanças cujo resultado é uma diversidade biológica própria. A localização geográfica de cada bioma é condicionada predominantemente pelos seguintes fatores: clima, temperatura, precipitação de chuvas e umidade relativa, e em menor escala pelo tipo de componentes do solo. Por tipo de vegetação entende-se a fisionomia, a flora e o ambiente, e por forma de vegetação apenas a fisionomia. Esta última inclui a estrutura, as formas de crescimento (árvores, arbustos, etc.) e as mudanças estacionais (sempreverde, semidecídua, etc.) predominantes na vegetação. A estrutura, por sua vez, refere-se à disposição, à organização e ao arranjo dos indivíduos na comunidade, tanto em altura (estrutura vertical) quanto em densidade (estrutura horizontal). Alguns sistemas de classificação também podem definir a fisionomia pelos critérios consistência e tamanho das folhas. São descritos 11 tipos principais de vegetação para o Bioma Cerrado, enquadrados em formações florestais (mata ciliar, mata de galeria, mata seca e cerradão), savânicas (Cerrado sentido restrito, parque de Cerrado, palmeiral e vereda) e campestres (campo sujo, campo limpo e campo rupestre). Considerando também os subtipos neste sistema, são reconhecidos 25 tipos de vegetação.

Recursos hídricos Três das maiores bacias hidrográficas da América do Sul (São Francisco, Tocantins-Araguaia e Prata) têm origem no Cerrado, e todos os demais biomas brasileiros (os Pampas Gaúchos, o Pantanal Mato-Grossense, a Floresta Amazônica, a Caatinga e a Mata Atlântica) recebem alguma fração da água que nasce no Cerrado. Alguns estudos informam que a existência desses cursos d’água pode ter contribuído para a grande biodiversidade da região, pois, através dos rios, vários organismos dos mais variados biomas podem ter encontrado caminho para migrar e colonizar as regiões mais centrais do nosso território. Dois fatores propiciaram a presença de grande quantidade de nascentes e corpos hídricos de tamanho pequeno e intermediário no planalto central brasileiro: o fato de ser uma região divisora de bacias e por se tratar de uma região de altitude elevada quando comparado ao restante do país.

Fogo O Bioma Cerrado apresenta um grande mosaico de formas de vegetação, desde as formações florestais, onde adensam as árvores e os arbustos, passando pelas formações savânicas, contendo árvores e arbustos de pequeno porte entremeados por herbáceas, até as formações campestres, onde dominam as plantas herbáceas. Milhares de anos de ocorrência de fogo no cerrado e de seleção natural fizeram com que muitas espécies vegetais desenvolvessem estruturas capazes de amenizar os efeitos danosos das queimadas. Algumas dessas espécies possuem uma casca grossa composta de um material isolante térmico que protege as estruturas essenciais do tronco das altas temperaturas. Outras possuem órgãos de reserva nas raízes, que são capazes de guardar elementos químicos necessários à produção de novas folhas e até mesmo novos troncos. Embora pesquisas apontem o fogo como elemento de renovação da vegetação por rebrota e germinação de sementes devido à quebra de dormência, além de constituir papel fundamental na estruturação de algumas paisagens do Cerrado, sua ocorrência provoca mudanças na cobertura vegetal, alterando a hidrologia e afetando a dinâmica e os estoques de carbono no ecossistema. Ademais, a periodicidade ideal para a ocorrência de fogo no bioma ainda não é conhecida. A peculiaridade da região em relação aos solos, à altitude, à má distribuição das chuvas, à grande quantidade de nascentes e rios, ao fogo e aos milhares de anos de seleção natural resultou num grande número de espécies animais e vegetais de ocorrência restrita ao Bioma Cerrado – as chamadas espécies endêmicas.

Populações tradicionais

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Nas últimas décadas, o Bioma Cerrado tem sofrido uma intensa invasão por atividades e populações animais e vegetais ausentes ou pouco disseminadas, transformando rapidamente as paisagens e o modo de vida dos povos tradicionais e promovendo impactos ambientais e sociais imensuráveis. As populações mais antigas do Cerrado são os povos indígenas Xavantes, Tapuias, Karajás, Avá-Canoeiros, Krahôs, Xerentes, Xacriabás, dentre alguns dos muitos outros que viviam na região e foram dizimados antes mesmo de serem conhecidos. As chamadas populações tradicionais do Cerrado incluem, além dos povos indígenas, os povos negros ou miscigenados, conhecidos como quilombolas, geraizeiros, vazanteiros, sertanejos e ribeirinhos, que permaneceram em relativo isolamento nas áreas do bioma e, ao longo dos séculos, adaptaram seus modos de vida aos recursos naturais disponíveis para alimentação, utensílios e artesanato. A maior parte dessas populações foi expulsa ou confinada a áreas marginas e hoje se vê diante de um mundo e de um sistema de produção que não considera ou valoriza o conhecimento sobre a convivência com a natureza. A situação do Cerrado, atualmente a principal região agrícola brasileira, é um grande conjunto de interações, interesses, desafios e possibilidades. A adoção de meios de produção sustentável aliando o conhecimento técnico, o conhecimento tradicional e a pesquisa é essencial à conservação, sobretudo dos recursos hídricos e da biodiversidade do Bioma Cerrado (conheça mais no DVD ABCerrado).

Unidades de conservação “Unidade de conservação é um espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção.” A criação das unidades de conservação (UCs) está prevista na Constituição Federal de 1988 (Capítulo VI, artigo 225, parágrafo 1o, inciso III), que determina ao poder público a incumbência de definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção”. As pessoas de uma dada região podem sensibilizar governantes locais e legisladores da importância de certas áreas que pretendem preservar. Os legisladores criam então, através de decreto, uma UC. Nestas áreas, a fauna, a flora e os processos que regem o ecossistema devem ser conservados. Para organizar, proteger e gerenciar as UCs instituiu-se, em julho de 2000, o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (Snuc). De acordo com o disposto na lei, os objetivos do Snuc são os seguintes: 1) contribuir para a manutenção da diversidade biológica e dos recursos genéticos no território nacional e nas águas jurisdicionais; 2) proteger as espécies ameaçadas de extinção nos âmbitos regional e nacional; 3) colaborar para a preservação e a restauração da diversidade de ecossistemas naturais; 4) promover o desenvolvimento sustentável com base nos recursos naturais; 5) impulsionar a utilização dos princípios e das práticas de conservação da natureza no processo de desenvolvimento; 6) resguardar paisagens naturais e pouco alteradas de notável beleza cênica; 7) proteger as características de natureza geológica, geomorfológica, espeleológica, paleontológica e cultural; 8) preservar e recuperar recursos hídricos e edáficos; 9) revigorar ou restaurar ecossistemas degradados; 10) proporcionar meios e incentivos para atividades de pesquisa científica, estudos e monitoramento ambiental; 11) valorizar econômica e socialmente a diversidade biológica; 12) favorecer a educação e a interpretação ambiental, a recreação em contato com a natureza e o turismo ecológico; 13) resguardar os recursos naturais necessários à subsistência de populações tradicionais, respeitando e valorizando seu conhecimento e sua cultura e promovendo-as social e economicamente.

Categorias das unidades de conservação As diversas categorias de unidades de conservação (UCs) estabelecidas pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (Snuc) estão agrupadas em proteção integral e uso sustentável, conforme os objetivos de manejo e uso. As unidades de proteção integral têm como objetivo básico a preservação da natureza, sendo admitido o uso indireto dos seus recursos naturais, com exceção dos casos previstos na lei do Snuc. As unidades de uso sustentável têm como objetivo básico compatibilizar a conservação da natureza com o uso direto de parcela dos seus recursos naturais.

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Educando pelas Trilhas do Cerrado: um roteiro de ações para a educação ambiental em escolas e comunidades

Categoria de UCs Distrito Federal As diferentes categorias de UCs e seus objetivos de manejo e uso, segundo o estabelecido pelo Snuc, estão descritos a seguir. CATEGORIA

MANEJO E USO

Estação ecológica

Proteção integral

DESCRIÇÃO Tem como objetivo a preservação da natureza e a realização de pesquisas científicas. É proibida a visitação pública, exceto com objetivo educacional, e a pesquisa científica depende de autorização prévia do órgão responsável.

EXEMPLO NO DF Águas Emendadas (Esec) Jardim Botânico

Proteção integral

Tem como objetivo a preservação integral da biota e demais atributos naturais existentes em seus limites, sem interferência humana direta ou modificações ambientais, excetuando-se as medidas de recuperação de seus ecossistemas alterados e as ações de manejo necessárias para recuperar e preservar o equilíbrio natural, a diversidade biológica e os processos ecológicos.

Proteção integral

Tem como objetivo básico a preservação de ecossistemas naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica, possibilitando a realização de pesquisas científicas e o desenvolvimento de atividades de educação e interpretação ambiental, de recreação em contato com a natureza e de turismo ecológico.

Monumento natural

Proteção integral

Tem como objetivo básico preservar sítios naturais raros, singulares ou de grande beleza cênica.

Refúgio de vida silvestre

Proteção integral

Tem como objetivo proteger ambientes naturais onde se asseguram condições para a existência ou a reprodução de espécies ou comunidades da flora local e da

Área de proteção ambiental

Uso sustentável

Área em geral extensa, com certo grau de ocupação humana dotada de atributos.

APA do Planalto Central; APA de Cafuringa APA do Lago Paranoá APA do São Bartolomeu APA Gama e Cabeça de Veado

Uso sustentável

Área em geral de pequena extensão, com pouca ou nenhuma ocupação humana, regional ou local e regular o uso admissível dessas áreas, em compatibilidade com os objetivos de conservação da natureza.

Arie Cruls Arie da Granja do Ipê Arie da Vila Estrutural Arie do Bosque Arie do Córrego Cabeceira do Valo Arie do Córrego Mato Grande Arie do Paranoá Sul Arie do Riacho Fundo Arie do Torto Arie Dom Bosco Arie Jk

Floresta nacional

Uso sustentável

Área com cobertura florestal de espécies predominantemente nativas, tem como objetivo básico o uso múltiplo sustentável dos recursos florestais e a pesquisa científica, com ênfase em métodos para a exploração sustentável de florestas nativas.

Floresta Nacional de Brasília-DF

Reserva extrativista

Uso sustentável

Área utilizada por populações locais, cuja subsistência se baseia no extrativismo.

No Cerrado existem duas: a Recanto das Araras da Terra Ronca, nos municípios de Guarani de Goiás e São Domingos, e a Lago do Cedro, em Aruanã, localizadas no Estado de Goiás.

Reserva de fauna

Uso sustentável

Área natural com populações animais de espécies nativas, terrestres ou aquáticas.

Reserva de desenvolvimento sustentável

Uso sustentável

Área natural que abriga populações tradicionais, cuja existência se baseia em sistemas.

Reserva particular de patrimônio natural

Uso sustentável

Reserva biológica

Parque nacional

Área de relevante interesse ecológico -

Área privada, gravada com perpetuidade, com o objetivo de conservar a diversidade.

Rebio da Contagem Rebio do Cerradão Rebio do Descoberto Rebio do Gama Rebio do Guará Rebio do Lago Paranoá

Parque Nacional de Brasília Obs. No DF há 73 parques que podem ser conhecidos no http:www.ibram.df.gov.br Monumento Natural do Morro da Pedreira Além deste há no DF vinte conjuntos de cavernas e 15 conjuntos de saltos e cachoeiras

Chákra Grisu Reserva Maria Velha Vale das Copaibeiras Santuário Ecológico Sonhem Reserva Córrego da Aurora

Fonte: Guia de Unidades de Conservação do Distrito Federal. Ibram/ICMBIO. Disponível em:

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Fotos Marcelo Kuhlmann

Conhecendo as Belezas do Cerrado

Xylopia sericea A.St.-Hil.

Xyris sp

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Alstroemeria sp

Asteraceae

Brosimum gaudichaudii

Byrsonima umbellata

Calliandra sp

Cambessedesia sp

Cardiopetalum calophyllum

Cerdocyon thous

Couepia grandiflora

Crax fasciolata

Diplusodon sp

Erythroxylum daphnites

Eugenia dysenterica

Eugenia punicifolia

Gomphrena sp

Hymenaea stigonocarpa

Hymenaea stigonocarpa

Kielmeyera sp

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Fotos Marcelo Kuhlmann

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Ouratea sp

Palicourea rigida

Protium heptaphyllum

Pseudobombax sp

Qualea grandiflora

Ramphastos toco

Sapajus libidinosus

Sauvagesia sp

Tachyphonus rufus

Tangara cayana

Tibouchina sp

Trichilia pallida

Trimezia sp

Vellozia sp

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Fotos Marcelo Kuhlmann

Miconia elegans

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Poema – “A horta” (Rubem Alves, O quarto do mistério) Uma horta é uma festa para os cinco sentidos. Boa de cheirar, ver, ouvir, tocar e comer. É coisa mágica, erótica, o cio da terra provocando o cio dos homens. Cheguei de viagem e antes de entrar em casa fui ver a minha horta. O mato crescera muito. Mas minhas plantas também. O verde anunciava uma exuberância de vida, nascida do calor e das chuvas que se alternavam sem parar. O meu coração se alegrou. Pode parecer estranho, mas é pelo coração que me ligo à minha horta. Daí a alegria... Estranho porque para muitos a relação acontece através da boca e do estômago. Horta como o lugar onde crescem as coisas que, no momento próprio, viram saladas, refogados, sopas e suflês. Também isso. Mas não só. Gosto dela, mesmo que não tenha nada para colher. Ou melhor: há sempre o que colher, só que não para comer.

Semente, sêmen Horta se parece com filho. Vai acontecendo aos poucos, a gente vai se alegrando a cada momento, cada momento é hora de colheita. Tanto o filho quanto a horta nascem de semeaduras. Semente, sêmen: a coisinha é colocada dentro, seja da mãe/mulher, seja da mãe/terra, e a gente fica esperando pra ver se o milagre ocorreu, se a vida aconteceu. E quando germina – seja criança, seja planta – é uma sensação de euforia, de fertilidade, de vitalidade. Tenho vida dentro de mim! E a gente se sente um semideus, pelo poder de gerar, pela capacidade de despertar o cio da terra. Não é à toa que povos de tradições milenares ligavam a fertilidade da terra à fertilidade dos homens e das mulheres. Faziam suas celebrações religiosas em meio aos campos recém-semeados, para que o cio humano provocasse a inveja da terra e ela também se excitasse para o recebimento das sementes. O cio dos homens provocando o cio da terra. Mas o inverso também é verdadeiro: o cio da terra pode provocar o cio dos homens. Cio é desejo intenso, não dá descanso, invade tudo e provoca sonhos, semente que não se esquece do seu destino, vida querendo fertilizar e ser fertilizada para crescer. Pois a horta é assim também. Não é coisa só para a boca. Apossa-se do corpo inteiro, entra pelo nariz, pelos olhos, pelos ouvidos, pela pele, toma conta da imaginação, invoca memórias.

Horta é coisa boa de se cheirar Estranho o desprezo com que tratamos o nariz. Os teólogos de outros tempos falavam da “visão beatífica de Deus”. Mas nunca li, em nenhum deles, coisa alguma sobre a “cheiração beatífica de Deus”. Como se fosse indigno que Deus tivesse cheiros, que ele entrasse pelos nossos narizes adentro, por escuros canais até as origens mais primitivas do nosso corpo. Pois, se eu pudesse, faria uma teologia inspirada na horta, e o meu Deus teria o cheiro das folhas do tomateiro depois de regadas, e também da hortelã, do manjericão, do orégano, do coentro. Essa coisa indefinível, invisível, que entra fundo na nossa alma e daí se irradia para o corpo inteiro como uma onda embriagante, o cheiro é a aura erótica do objeto, sua presença dentro de nós, emanação mágica por meio da qual nós o possuímos. Quem cheira fundo – e para isso até fecha os olhos, porque o cheiro vai mais dentro que os olhos – está dizendo o quanto ama... E fico pensando nessa coisa curiosa: que a horta só seja percebida como produtora de coisas boas para comer. Isso só pode ser devido a uma degeneração do nosso corpo, de sua imensa riqueza erótica, a monotonia canibalesca que só reconhece o comer como forma de apropriação do objeto. Os cheiros moram na horta, e quem não se dá o trabalho de cultivá-la não poder ter a alegria de reconhecê-los. Há pessoas que se reúnem para ouvir música; outras pelo puro prazer do paladar. Mas ainda não se convidam pessoas para concertos e banquetes de perfumes. O mais próximo seria, talvez, convidá-las para passear pela nossa horta, e ali nos deliciar com a sua perplexidade na medida em que lhes oferecemos folhinhas para cheirar e lhes perguntamos: “Sabe o que é isto? Veja como é gostoso...”

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Olhares para a vida – horta é coisa boa de se ver Dizem os poemas sagrados que Deus Todo-Poderoso, depois de criar todas as coisas, parou, deixou cair os braços e foi invadido pelo puro deleite de ver a beleza de tudo o que existia. Ver é experiência estética, não serve para coisa alguma. Diferente do comer. Comer é útil. A mãe insiste com a criança: “Coma o espinafre, meu bem, ele faz você ficar forte”. O “ficar forte” justifica suportar o gosto ruim: é a utilidade da coisa. Mas nada disso se pode dizer do ato de ver. Ver os espinafres, as couves, as alfaces, os tomates não é útil para coisa alguma, não serve para nada. Mas faz bem à alma. “Não só de pão viverá o homem”, diz o texto sagrado. Vivemos também das coisas belas. Há o belo das cores: o vermelho dos pimentões, das pimentinhas ardidas, dos tomatinhos. Ah! Os tomatinhos. Falo daqueles pequenos, minúsculos, que não se encontram em lugar civilizado, não se vendem em feiras (quanto poderiam valer?). Mas eu os descobri numa velha fazenda, e não resisti à tentação de trazer umas mudas. Sua maior utilidade, além de serem redondinhos e vermelhos, é serem planta da minha infância. De modo que, na minha horta, eu tenho um arbusto mágico que me leva através do tempo e, quando eu os apanho e os como, sinto renascer dentro do meu corpo o corpo de um menino que mora nele. Há o verde também dos pimentões, que se comprazem em brincar com as cores das cebolinhas, das alfaces, das couves, dos espinafres, da salsa. O amarelo das cenouras, e de novo dos pimentões (vocês já viram pimentões amarelos?) São raros, brilhantes, maravilhosos. Eu até tive uma árvore de Natal enfeitada só com pimentões verdes, vermelhos e amarelos. O roxo das beterrabas, dos rabanetes, das berinjelas. O branco dos nabos. E ao ver essa abundância de cores imagino que a natureza é brincalhona, ela se compraz na exuberância e no excesso. E enquanto meus olhos vão andando pela variedade das cores, coisas vão acontecendo dentro de mim. Porque isso significa que elas existem dentro de mim. Se eu fosse cego para as cores, não me aperceberia de nenhuma diferença. O objeto que vejo revela um objeto que existe dentro de mim. Os olhos só veem fora aquilo que já existe dentro como desejo. Tenho também um pé de ora-pro-nobis, coisa de gente pobre, em Minas Gerais. Só vi referências a ele em dois lugares. Primeiro, no livro Fogão de lenha, de Maria Stella Libânio Christo, como uma receita culinária no meio de uma celebração de trezentos anos de cozinha mineira, que vale pelo puro deleite de ler. E depois num poema de Adélia Prado – ela sabe muito bem do encanto das hortas. Orapro-nobis, nome que parece responso litúrgico, é um arbusto que se planta uma vez na vida. Ele é tão amigo que fica lá, soltando folhas sem parar. Pois é: uma festa. Cores, formas, tudo diferente, natureza brincalhona, artista, imaginação sem fim. Morangas gomosas; aboborões e abobrinhas; quiabos escorregadios; berinjelas roxo-pretas, engraçadas em tudo, até no nome; mandiocas; carás de debaixo da terra; carás do ar, pendentes; inhames; chuchus; nabos redondos; nabos fálicos; alcachofras, folhas de todos os desenhos; alfaces, almeirão; acelgas; brócolis; couve; bertalha; repolhos brancos; repolhos roxos; agrião, espinafre. Diante desse esbanjamento de inventividade o jeito é o espanto, o riso e a gratidão de que este seja um mundo onde o enfado é impossível.

Sons e toques – horta também é coisa boa de se ouvir Ora, direis, ouvir a horta. Plantas não dizem nada, não cantam! Se fosse passarinho, ou o mar, ou as casuarinas, se compreenderia. Mas a horta? Horta é coisa calma e silenciosa. E isso é bom. Ouvir o silêncio. As pessoas exigem sempre uma palavra. Têm medo de ficar quietas. Entram em pânico quando o assunto acaba, começam a falar bobagens só por falar, porque é melhor dizer besteira que ficar ali na presença do outro, sem nada dizer e sem nada ouvir. Com as plantas é diferente. Elas nos tranquilizam. Se quisermos falar com elas, tudo bem. Acho que gostam. Mas o melhor de tudo é que, ao falar com elas, não é preciso fingir, porque as plantas são extremamente discretas. Guardam os segredos com uma fidelidade vegetal. E as hortas são também coisas boas de tocar. Sentir o capim molhado, enfiar a mão na terra. Se você tiver a felicidade rara de ter uma aguinha que escorre e cai, você terá uma das experiências mais calmas que se pode ter. Ouvir o barulhinho da água. Ele trará memórias ou fantasias de regatos escondidos no meio do mato, correndo entre pedras, fazendo crescer o limo verde. E aí você enfiará seus pés dentro dela. Difícil um prazer igual pela tranquilidade, pela pureza, pela profundidade. Porque a água nos reconduz às nossas origens. E a terra. Não, não é sujeira. Terra preta com esterco: ali a vida está acontecendo, invisivelmente. Meu destino. Um dia serei terra, de mim a vida poderá nascer de novo. As crianças, sem que ninguém as ensine, sabem dessas coisas. Somos nós que dizemos que terra é sujeira, porque preferimos os carpetes assépticos e mortos e os pisos vitrificados onde mão nenhuma pode penetrar.

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Brincar com a terra, conquistar sua dureza, misturar o esterco esfarelado, senti-la leve e solta, esguichar a água. Ali, diante dos nossos olhos, uma metamorfose vai acontecendo, e a terra, de coisa estéril, dura, virgem, é agora mulher em cio, pedindo as sementes. Vamos abrindo os sulcos, canteiros, e neles colocamos a vida que o nosso desejo escolheu. Coisa gostosa. Estamos muito próximos de nossas origens. Nossos pensamentos ficam diferentes. Deixam de perambular pelos desertos de ansiedade e ficam cada vez mais próximos, colados à mão, colados à terra. Os pensamentos fantasmas voltam ao aqui e ao agora do corpo, passam a ser coisas amigas e alegres. Segundo filósofos de outros tempos, tudo o que existe se reduz a quatro elementos: a terra, a água, o vento e o fogo. E ali estamos nós, mãos na terra, terra molhada, e a brisa sopra. Horta, pedaço de nós mesmos, mãe. Se compreendermos que ela é não só a nossa origem como também nosso destino, e se a amarmos, então estaremos amando a nós mesmos, como seremos. Não, não tenho uma horta para economizar na feira. Tenho uma horta porque preciso dela, como preciso de alguém a quem amo.

Sabores amigos – há, por fim, o ato supremo de comer Comer: dizer que o que estava fora pode entrar, será bem recebido, eu o desejo, tenho fome. Para isso examino o que ainda não conheço, pois todo cuidado é pouco. Nem tudo é bom de comer: há coisas de nojo e de vômito, venenosas e de morte. Provo a coisa: primeiro a aparência, a cor, o cheiro e, cuidadosamente, na ponta da língua, o gosto, para o veredito final – amigo ou inimigo. É assim que a criança aprende sua primeira lição sobre o mundo, mundo reduzido a coisas boas que devem ser engolidas e coisas más que devem ser vomitadas. Assim nasceu a ética, na boca, pois é ela a primeira a dizer “é bom”, “é mau”. E a sua sabedoria é imensa, pois o corpo é o grande juiz. A horta é lugar de coisas boas para comer, ali onde se planta a amizade pelo corpo, onde se plantam os objetos do nosso desejo, que nos fazem alegres quando estão de fora e mais alegres ainda quando os colocamos na boca e dizemos: “Que gostoso...” Sem saber, estamos afirmando nossa solidariedade com a terra. A horta é parte do meu corpo, do lado de fora, e é por isso que pode ser comida, entrar para dentro, transformar-se em vida, minha vida. Eu dou vida à horta, preparo a terra, planto as sementes, rego, elas vivem, e depois se oferecem a mim, através do meu desejo. E como elas são brincalhonas. Jiló amargo, careta pra quem não está acostumado; o picante da pimenta; o duro amarelo adocicado da cenoura recém-arrancada da terra; o estranho gosto dos nabos obscenos; as ervilhas, brincalhonas e redondas; e a peça que os alhos e as cebolas nos pregam, fica o cheiro, evidência do crime. E nós tomamos os frutos da horta e os transformamos pelo poder alquímico do fogo. Já disse dos quatro elementos dos sábios de outro tempo, terra, água, ar e fogo. Sem o fogo só podemos juntar as coisas, do jeito que a terra nos deu. Mas o fogo nos dá outro poder, tudo fica diferente. Misturamos, alteramos, inventamos. No peixe branco e pálido, o vermelho do urucum, extraído da frutinha pelo poder do calor. Vermelho para excitar: na cor mora o quente. Junta-se mais: a cebola, os pimentões, verdes e vermelhos, o tomate, o coentro. E a pimenta, magia estranha, ainda não entendi por que gosto dela. Talvez por ser metáfora de certos amores que de tão ardentes viram ardume, e machucam. E aí, tudo junto, pelo poder do fogo, a moqueca, a horta transformada em culinária, em gosto inventado. Comer é ato complicado, há nele uma mistura de amor e de destruição. As mandíbulas mastigando, infatigáveis, o movimento brusco da cabeça para frente e para baixo, boca aberta, pra abocanhar o naco que o garfo espetou, as bochechas estufadas de comida. O ato de comer é como os sonhos – pode ser psicanalisado, porque revela nossos segredos de ódio e de amor, nosso nojo ou nossa voracidade, nossa mansidão ou nossa violência. Ao comer nós nos revelamos. E nisto está a diferença entre a comida crescida na horta e a comprada na feira: na primeira está um pouco de nós mesmos – e ao sentir seu gosto bom é como se eu estivesse sentindo meu próprio gosto. “Eu plantei, eu colhi...” O que está em jogo não é o tomate, a alface – é o eu que está sendo servido, disfarçado de hortaliça. A refeição fica meio sacramental. Come-se um pedaço da própria pessoa, que se oferece, de forma vegetal, num banquete canibal. “Tomai, comei, isto é o meu corpo. Tomai, bebei, isto é o meu sangue.”

Alegria do encontro Pois é, horta é algo mágico, erótico, onde a vida cresce e também nós, no que plantamos. Daí a alegria. E isso é saúde, porque dá vontade de viver. Saúde não mora no corpo, mas existe entre o corpo e o mundo – é o desejo, o apetite, a nostalgia, o sentimento de uma fome imensa que nos leva a desejar o mundo inteiro. Alguém já disse que somos infelizes só porque não podemos comer tudo aquilo que vemos. Concordo em parte, pois há aqueles que veem tudo, mas não desejam nada. Estão doentes, prisioneiros deles mesmos. Saúde: quando o desejo pulsa forte, cio por coisas amadas, e o corpo vai em busca do objeto desejado – a horta podendo ser um

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pequeno (e delicioso) fragmento dos nossos maiores e infinitos desejos. O mundo bem poderia ser uma grande horta: canteiros sem fim, terra fértil, nossas sementes se espalhando, nosso corpo ressuscitado de sua grande e mortal letargia. E penso esta coisa insólita: há lições de kama-sutra a serem aprendidas na horta, no despertar dos sentidos que ela provoca. O caminho da saúde, o caminho da libertação do corpo pra copular com os objetos do desejo (e uso a palavra copular no seu preciso sentido gramatical de “fazer conexão” e também no sentido erótico de união entre duas pessoas que se querem e, por isso, se interpenetram, transgredindo os limites do próprio corpo) passa pelo caminho do despertamento erótico dos nossos sentidos adormecidos. A capacidade sutil de distinguir os perfumes, o olhar extasiado que diz, para a planta ou para a pessoa, não importa: “Como é bom que você existe!”; o ouvido que tem a tranquilidade para morar no silêncio, sem se perturbar; a pele que se deleita com o vento, com a água, com a terra; e a boca que sente o gosto da coisa como quem prova um vinho. Uma horta é um bom lugar para começar. E pra continuar, até acabar. Seria bom saber que alguém colherá coisas que nós semeamos, depois da nossa partida, e as plantas continuarão, como um gesto nosso de amor. *Rubem Alves é psicanalista, educador, teólogo e escritor brasileiro, é autor de livros e artigos que abordam temas religiosos, educacionais e existenciais, além de uma série de livros infantis.

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Cerrado que não mais se vê *Tonicato Miranda Escuta aqui, almofadinha... não se engane, a cidade já foi campo. Ele o agreste quase não mais se vê, mas... já houve tempo, já houve vento terra causticante, sol a pino, sede de ceder rodamoinho com nome de lacerdinha Brasília cercada de cerrado tinha. O Cerrado tinha jacupemba, andorinha tinha pequi pra toda parte, fruta no pé e no chão árvores retorcidas, mais de um milhão... cobra, couro de arte, buriti nos brejos, tinha.. Muitos corguinhos de água limpinha, moça se banhando na cacimba... a gente olhando lá de cima, como tinha! Lobo-guará, ema, seriema, tatu-bola tinha. Gavião, coruja, sucuri, lebres saltadoras, veado-campeiro, formigas de fogo e as voadoras. Araticum, ameixa brava, belas plantinhas, tinha. Casa de barro plantada no morro alto, cavalo sem cilha e um pouco de asfalto, tudo isto quase não tem, já teve, tinha! Bando de papagaios no rumo dos guabiruvus, peixes coloridos no remanso de rio pequeno, bem-te-vi te vi tão grande, te vi tão pequeno bem-te-vi, mal te vi, já todo te senti, você tinha! Tantas informações, cadê os sanhaços? será gato-do-mato comeu-os manhãzinha... cortaram os paus e tocos, mataram a matinha. Cerrado, muita velha curandeira tinha! Ervas-remédio, ervas de cheiro, ervas sozinhas. Alguns índios caçavam aqui, céus sobreviventes, malocas perdidas nos cantos das vertentes. Muito cristal de rocha e esmeralda tinha! E um pôr-do-sol, colorindo nos fins de tarde prostrado, velho caboclo, saudades da Ritinha. O Cerrado tinha... Seriemas, emas, cobras, assovio na mata tinha! Fruta azeda, fruta doce, camaleão na pedra, jacaré no brejo tinha! Susto do pacu, tinha pio de nhambu, lagartas nas folhas, lagartas no chão, asfaltos distantes tinha, cachorros no mato, carros no céu, carros sobre a cobra, brilho do sol na latinha, morros sorrisos, montanhas de veludo e uma montanha que só eu tinha. *Tonicato Miranda é escritor, cronista e poeta com diversas publicações em jornais do Estado do Paraná.

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Sites interessantes Esses sites podem ser acessados e utilizados, são encontrados no Projeto Planeta Sustentável da Editora Abril e há autorização para reprodução.  Uma análise sobre os 15 anos do Protocolo de Kyoto:  http://planetasustentavel.abril.com.br/blog/cop-mudancas-climaticas/2012/12/12/kyoto-um-protocolo-debutante/  link http://planetasustentavel.abril.com.br/blog/blog-do-clima/  http://planetasustentavel.abril.com.br/especiais/revista-do-clima-vozes-da-mudanca.shtml  Uma revista digital do Planeta sobre clima. Tem alguns infográficos excelentes: http://planetasustentavel. abril.com.br/especiais/revista-do-clima.shtml  Essa é a versão digital também do gibi Heróis do Clima, que vou te mandar os exemplares impressos, mas dá pra baixar de graça:  http://planetasustentavel.abril.com.br/herois-do-clima/  Planos de aula: link: http://planetasustentavel.abril.com.br/planosdeaula/  Sobre as mudanças do clima: http://www.gentequeeduca.org.br/planos-de-aula/mesa-redonda-sobremudancas-climaticas  Sobre os resultados rio20?page=all

da

Rio+20:

http://www.gentequeeduca.org.br/planos-de-aula/resultados-da-

 Sobre o CO2: http://www.gentequeeduca.org.br/planos-de-aula/co2-principal-vilao-do-efeito-estufa Outros sites http://www.mudancasclimaticas.andi.org.br/content/ipcc-painel-intergovernamental-sobre-mudanca-doclima-intergovernmental-panel-climate-change http://www.educacaoinstitucional.gov.br

Cerrado, um bioma em extinção – YouTube – www.youtube.com/watch?v=JrlihpaVR5Y Cerrado – Bioma Brasil – TV Escola – tvescola.mec.gov.br/tve/video/bioma-brasil-cerrado Cerrado – O pai das águas – Opará Vídeos – Documentários  www.oparavideos.com.br/produto/4 – Cerrado, o pai das águas

Planeta água – YouTube – www.youtube.com/watch Uso sustentável da água – usosustentaveldaagua.tripod.com/id4.htm Fauna e flora – Documentário – YouTube – www.youtube.com/watch?v=jn70zg7ZSJ Circuito Tela Verde – Ministério do Meio Ambiente – www.mma.gov.br/educacao-ambiental/.../circuito-tela-verde Semeando o Bioma Cerrado – Educação – youtube.com/watch?v=tguShshpQiY planetasustentavel.abril.com.br/video A vida retribui e transfere – YouTube – www.youtube.com/watch?v=VnSyx6cmMI Vídeos|Nova Escola – revistaescola.abril.com.br/vídeos planetasustentavel.abril.com.br/noticia/casa/horta planetasustentavel.abril.com.br/noticia/casa/horta Associação dos Amigos das Florestas – AAF – https://www.facebook.com/amigosdasflorestas

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as diretrizes e as bases da educação nacional.

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Anotações

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