Efeito de diferentes soluções de enema sobre os parâmetros clínicos de eqüinos

June 16, 2017 | Autor: Rogéria Serakides | Categoria: Group, Veterinary Sciences
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Arq. Bras. Med. Vet. Zootec., v.60, n.3, p.525-535, 2008

Efeito de diferentes soluções de enema sobre os parâmetros clínicos de eqüinos [Effect of different enema solutions on clinical parameters of equines]

U.P. Melo1,4, M.S. Palhares2*, C. Ferreira1, I.G.B. Evaristo3, F.O.P. Leme2, R. Serakides2, J.M. Silva Filho2 1

Aluno de pós-graduação - EV-UFMG – Belo Horizonte, MG 2 Escola de Veterinária - UFMG Caixa Postal 567 30123-970 – Belo Horizonte, MG 3 Aluno de graduação - EV-UFMG – Belo Horizonte, MG 4 Bolsista do CNPq

RESUMO Avaliou-se o efeito de diferentes soluções de enema sobre os parâmetros clínicos de eqüinos hígidos. Foram utilizados 15 eqüinos adultos, distribuídos em três grupos de cinco animais cada: grupo 1 – tratados com água de torneira mais sabão neutro; grupo 2 – tratados com solução isotônica e grupo 3 – tratados com água de torneira mais vaselina. O efeito das soluções de enema sobre os parâmetros clínicos variou em função do tipo de solução infundida. A solução com menor efeito sobre os parâmetros clínicos foi a isotônica. A solução de água de torneira e sabão neutro desencadeou um aumento da temperatura retal e edema da mucosa retal. Embora as três soluções tenham se mostrado efetivas em hidratar e amolecer as fezes, a solução de água com sabão foi a que apresentou o melhor efeito. Palavras-chave: eqüino, enema, parâmetros clínicos ABSTRACT The effect of three different enema solutions on clinical parameters of equines was studied using 15 healthy adult animals. They were alloted into three groups of five animals each: group 1 – treated with tap water associated with neuter soap; group 2 –treated with isotonic solution; and group 3 – treated with tap water associated with vaseline. Effects of enema solutions on clinical parameters were observed. Isotonic solution caused less alteration on clinical parameters. Tap water and soap enema induced inflammatory reaction on colon mucosa. Even though all three solutions showed effectiveness in hydrating and softening the feces, the treatment with water plus soap showed the best results. Keywords: enema, equine, clinical parameters INTRODUÇÃO Nos eqüinos, os distúrbios de motilidade do trato gastrintestinal manifestam-se comumente como cólica e, independentemente dos recentes avanços no manejo geral, a cólica continua a ocorrer e se constitui na principal causa de morbidade e mortalidade na espécie eqüina (Singer e Smith, 2002). Recebido em 8 de novembro de 2007 Aceito em 29 de abril de 2008 *Autor para correspondência (corresponding author) E-mail: [email protected] Apoio: FAPEMIG

O trato gastrintestinal é uma estrutura volumosa e complexa que realiza uma variedade de funções simultâneas e, às vezes, opostas tais como: secreção e absorção, mistura e propulsão, esvaziamento e enchimento, que podem variar de segmento a segmento. A falha ou negligência em reconhecer a natureza heterogênea desse sistema pode levar a erros na escolha do tratamento mais adequado para uma doença específica (Freeman, 1999).

Melo et al.

A administração de enemas é um procedimento de enfermagem comumente utilizado para tratar quadros de compactação e esvaziar o cólon menor e reto antes de procedimentos cirúrgicos e diagnósticos (Schmelzer et al., 2004). Os enemas foram utilizados pela primeira vez há centenas de anos. Sua utilização é baseada na tradição, sem nenhuma investigação científica profunda dos seus efeitos, tanto na medicina humana quanto na veterinária. Grande quantidade de solução de água de torneira com sabão, administrada por meio de enemas, é utilizada no tratamento de eqüinos com compactações do cólon descendente (cólon menor e reto) (White II e Dabareiner, 1997; Schumacher e Mair, 2002). Entretanto, ainda não são conhecidos os efeitos sistêmicos dessa terapia, principalmente sobre os parâmetros clínicos. Este estudo teve como objetivo avaliar o efeito de diferentes soluções de enema sobre os parâmetros clínicos de eqüinos hígidos. MATERIAL E MÉTODOS O experimento foi realizado entre os meses de setembro e outubro de 2006, tendo sido aprovado pelo Comitê de Ética em Experimentação Animal (CETEA/UFMG) sob o número 19/2006. Foram utilizados 15 eqüinos adultos hígidos, com média de peso de 262±48,28kg. Antes do período experimental, os animais passaram por período de adaptação de 30 dias durante o qual receberam ração comercial1 (0,5kg/100kg de peso vivo), feno de tifton (Cynodon ssp.), além de capim-elefante (Pennisetum purpureum) triturado, e água e sal mineral2 ad libitum. Todos os animais receberam tratamento endo3 e ectoparasiticida4. Os animais foram agrupados de acordo com o peso e sexo (quatro fêmeas e um macho/grupo) e distribuídos em três grupos de cinco animais cada. Os do grupo 1 foram tratados com água de torneira mais sabão neutro5 (seis gramas de sabão neutro/litro de água; osmolalidade: 24mOsm/l); os do grupo 2 com solução 1

Ração Equitage 15P, Guabi Nutrição Animal – São Paulo, Brasil. 2 Guabiphos centauro, Guabi Nutrição Animal – São Paulo, Brasil. 3 Panacur pasta, Intervet – Cruzeiro, Brasil. 4 Butox, Intervet – Cruzeiro, Brasil. 5 Lavarte, Bertin Ltda – São Paulo, Brasil.

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eletrolítica (solução: Na+: 135mEq/l; HCO-3: 25mEq/l; Cl-: 110mEq/l; K+: 4mEq/l; Ca++: 5mEq/l; osmolaridade: 285mosm/l; pH: 7,45); os do grupo 3, com água de torneira mais vaselina líquida (três litros de água/litro de vaselina; osmolalidade: 6mOsm/l). Durante a avaliação clínica os animais permaneceram em jejum hídrico e alimentar desde o primeiro até o último exame, totalizando 10 horas. Foram realizados três enemas em cada animal, um a cada três horas. O enema foi administrado por fluxo de gravidade, com o recipiente posicionado a dois metros de altura com sonda de 8mm de diâmetro, em volume equivalente a quatro litros de solução à temperatura de 35°C. Após cada enema, os animais foram estimulados a caminhar ao passo durante 15 minutos e, então, a cada hora. Todas as mensurações foram realizadas com os animais em posição quadrupedal. Antes de cada enema foi realizada palpação transretal para identificar a presença de fezes na ampola retal e terço distal do cólon menor, bem como avaliar as características das fezes consistência, hidratação, coloração, odor, tamanho da fibra e presença de grãos e de muco conforme sugerido por Gonçalves et al. (2005). Os parâmetros clínicos freqüência cardíaca, pulso arterial, freqüência respiratória, tempo de preenchimento capilar, temperatura retal, pressão sangüínea sistólica, motilidade gastrintestinal, tolerância ao enema e manifestação de dor foram avaliados antes do primeiro enema (T0 – tempo zero) e a cada 30 minutos, totalizando 15 tempos (T) de avaliação. O esquema foi: T0 (tempo zero) seguido pelo enerma 1; T1 a T6 seguidos pelo enema 2; T7 a T12 seguidos pelo enema 3; e T13 e T14. A avaliação terminou uma hora após o último enema. A motilidade gastrintestinal foi classificada como ausente, diminuída, normal ou aumentada, adotando-se a classificação proposta por Ehrhardt e Lowe (1990), em ambos os antímeros. A pressão sangüínea arterial foi mensurada indiretamente em um esfignomanômetro de coluna de mercúrio6 na artéria coccígea, utilizando um Doppler7 para detectar o fluxo e o retorno do fluxo conforme técnica descrita por 6

Esfignomanômetro – Missouri, Brasil Doppler Vascular Veterinário DVT 500 – Martec – Ribeirão Preto, Brasil.

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Gay et al. (1977). Os valores obtidos representaram a pressão sistólica da artéria coccígea, em mmHg, não corrigida. O delineamento experimental foi inteiramente ao acaso, tendo-se o cuidado de manter um macho em cada grupo. O modelo experimental constituiu-se de parcelas subdivididas, sendo três grupos nas parcelas e 15 tempos na subparcela para estudar freqüência cardíaca, pulso, freqüência respiratória, tempo de perfusão capilar e temperatura retal, com cinco repetições. Os parâmetros clínicos foram avaliados antes do primeiro enema e após esse, a cada 30 minutos. A análise de variância foi utilizada considerandose a ocorrência dos erros (a) e (b), referentes à parcela e subparcela, respectivamente. Para comparação de médias usou-se o teste Student Newman Keuls, com nível de significância de 95% (P0,05) do grupo 2 dentro de cada tempo, exceto em T5, e somente em T10, o grupo 1 foi diferente do grupo 3. Médias mais altas observadas no grupo 2 podem ser atribuídas à presença de um animal com freqüência cardíaca elevada durante todo o estudo. Embora a freqüência cardíaca tenha diferido entre os tempos, dentro do grupo ela manteve-se dentro dos limites fisiológicos. Além disso, não se observou diferença (P>0,05) entre os tempos que antecederam ou sucederam os enemas. A elevação da freqüência cardíaca é causada primariamente por estímulo simpático em resposta à dor, hipovolemia, endotoxemia ou septicemia (Wilson e Gordon, 1987; Furr et al., 1995) ou por alteração comportamental (Bordin et al., 2007). Como a freqüência cardíaca se manteve dentro dos limites fisiológicos, independente da solução administrada, é provável que a administração de enemas não estimule o sistema simpático. Seria lógico esperar que o estresse induzido pela infusão do enema e a dor desencadeada pela distensão do cólon menor e reto provocassem elevação da freqüência cardíaca, entretanto, tal efeito não foi observado.

Tabela 1. Freqüência cardíaca (bpm) em eqüinos hígidos após a administração de enema, de acordo com os grupos experimentais (tratamentos) e os tempos (T) de avaliação Tempo T0 (antes) enema T1(30min) T2(60min) T3(90min) T4(120min) T5(150min) T6(180min) enema T7(210min) T8(24min) T9(270min) T10(300min) T11(330min) T12(360min) enema T13(390min) T14(410min)

Grupo 1 31,80+9,33Bb

Grupo 2 41,40+11,32Aa

Grupo 3 30,80+8,87Bb

34,60+11,56ABb 33,20+13,75ABb 33,60+12,83ABb 34,20+13,31ABb 35,20+15,38Aa 34,60+15,15ABb

39,60+8,87ABa 39,00+9,94ABCa 38,60+10,16ABCa 37,80+9,14BCa 37,40+9,04BCa 38,60+13,46ABa

32,60+9,15ABb 34,00+10,19Ab 32,20+8,13ABb 32,60+7,26ABb 32,40+6,98ABb 34,80+7,01Ab

35,60+14,70Ab 34,60+12,66ABb 34,40+12,77ABb 35,20+13,75Ab 33,60+13,06ABb 32,80+13,17ABb

38,60+13,99ABCa 38,40+12,46BCa 38,60+11,94ABCa 38,80+12,29ABCa 38,60+11,26ABCa 37,20+12,02BCa

34,80+7,56Ab 32,80+8,87ABb 32,00+6,20ABb 32,20+6,90ABc 32,80+5,21ABb 31,20+4,60Bb

33,40+12,64ABb 33,40+12,64ABb

38,60+11,26ABCa 36,60+13,10Ca

32,80+6,09ABb 31,40+5,63Bb

Tratamentos: 1= água de torneira mais sabão neutro; 2= solução eletrolítica e 3=água de torneira mais vaselina líquida. Médias seguidas por letras maiúsculas diferentes na coluna, diferem entre si (P
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