Efeitos da rodovia BR-262 na mortalidade de vertebrados silvestres: Síntese naturalística para a conservação da região do Pantanal, MS (UFMS 1997)

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EFEITOS DA RODOVIA BR-262 NA MORTALIDADE DE VERTEBRADOS SILVESTRES: SÍNTESE NATURALÍSTICA PARA A CONSERVAÇÃO DA REGIÃO DO PANTANAL, MS. Wagner Augusto Fischer

Dissertação apresentada à Universidade Federal de Mato Grosso do Sul como parte das exigências para a obtenção do título de Mestre em Ecologia e Conservação, Área de Concentração em ECOLOGIA. Orientador: Prof. Dr. Eliézer José Marques

Campo Grande/MS Dezembro/1997

À natureza e luz de meus pais, Evaldo e Marlene, que me legaram o privilégio e a responsabilidade de viver esta Era, numa mistura de aquários, criaturas e estrelas.

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“Se toda coincidência Tende a que se entenda E toda lenda Quer chegar aqui A ciência não se aprende A ciência apreende A ciência em si Se toda estrela cadente Cai pra fazer sentido E todo mito Quer ter carne aqui A ciência não se ensina A ciência insemina A ciência em si Se o que se pode ver, ouvir, pegar, medir, pesar Do avião a jato ao jaboti Desperta o que ainda não, não se pôde pensar Do sono eterno ao eterno devir Como a órbita da terra abraça o vácuo devagar Para alcançar o que já estava aqui Se a crença quer se materializar Tanto quanto a experiência quer se abstrair A ciência não avança A ciência alcança A ciência em si" G.Gil

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AGRADECIMENTOS Sou grato a todos que provocaram mudanças no produto que aí está. A todos que falaram, que apenas olharam e que sentiram. Àqueles que viram o algo errado, estufado, estupefato, o bicho atropelado. Aos que me contaram e aos que os contaram, que marcaram meu caderno, me ajudaram na conta. A todos dou crédito, sou crédulo e no meu balanço, têm um grande saldo. Hoje, sou grato. Impessoal, informal, mas sem nunca ser ingrato. A todos estes, o meu sincero obrigado.

Gostaria de agradecer também aos órgãos que tornaram possível este produto. Em primeiro lugar, à Coordenação do Mestrado em Ecologia e Conservação da UFMS, pelo curso, apoio e logística. À CAPES pelo patrocínio ao meu programa de mestrado. À Fundação Boticário de Proteção à Natureza-FBPN, Fundação MacArthur e ao Fundo Mundial para a Natureza-WWF pelo apoio financeiro. Finalmente, um agradecimento especial à "Fischer Foundation" que apoiou este projeto desde seu embrião.

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SUMÁRIO AGRADECIMENTOS _____________________________________________________________________________ iv SUMÁRIO_______________________________________________________________________________________1 RESUMO _______________________________________________________________________________________2 ABSTRACT _____________________________________________________________________________________3 INTRODUÇÃO ___________________________________________________________________________________4 O pantanal e o homem __________________________________________________________________________4 As estradas e seus efeitos _______________________________________________________________________5 A BR-262 e seus impactos: fonte de problemas para a conservação regional _______________________________6 CAPÍTULO 1. EFEITOS DA PAISAGEM NA INCIDÊNCIA DE ATROPELAMENTOS DE VERTEBRADOS NA BR-262: DILEMAS ENTRE PRESERVAÇÃO E CONSERVAÇÃO __________________________________________________9 Introdução ____________________________________________________________________________________9 Metas ________________________________________________________________________________________9 Métodos _____________________________________________________________________________________10 Resultados e Discussão ________________________________________________________________________12 Caracterização regional ______________________________________________________________________12 Descrição local _____________________________________________________________________________15 Os "corredores da estrada" e a fauna silvestre ____________________________________________________15 CAPÍTULO 2. ATROPELAMENTO DE VERTEBRADOS SILVESTRES NA BR-262: PADRÕES DE MORTALIDADE ATRAVÉS DO PANTANAL DO MS __________________________________________________________________18 Introdução ___________________________________________________________________________________18 Métodos _____________________________________________________________________________________19 A região de estudo através da Rodovia BR-262 ___________________________________________________19 Resultados e Discussão ________________________________________________________________________21 Fauna atropelada ___________________________________________________________________________21 Taxas de mortalidade ________________________________________________________________________24 Padrões de ocorrência de atropelamentos________________________________________________________26 Espécies comuns ___________________________________________________________________________30 Espécies raras e equivalentes ecológicos ________________________________________________________31 Conclusões e Recomendações___________________________________________________________________32 REFERÊNCIAS _________________________________________________________________________________35

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RESUMO A rodovia Campo Grande-Corumbá (BR-262) atravessa o gradiente paisagístico-ambiental formado entre o cerrado lato sensu e o pantanal sul-mato-grossense, apresentando diferentes níveis de urbanização e extensas áreas de pastagem e vegetação nativa. A diversidade da fauna local é alta, sendo freqüente a ocorrência de acidentes com vertebrados silvestres que utilizam a estrada como parte de seu habitat. Visando detectar os efeitos da BR-262 na mortalidade de vertebrados silvestres, foram feitos registros sistemáticos sobre a incidência de animais atropelados em vários tipos de ambientes e de paisagens da estrada entre maio de 1996 e novembro de 1997, revelando alta riqueza de espécies atropeladas e índices preocupantes. Neste período, a lista de 1.402 mamíferos, aves, répteis e anfíbios mortos por veículos registrou um mínimo de 84 espécies, das quais ao menos seis estão ameaçadas de extinção: o cervo-do-pantanal (Blastocerus dichotomus), o lobo-guará (Chrysocyon brachyurus), a jaguatirica (Felis pardalis), a onça-pintada (Panthera onca), a lontra (Lontra longicaudis) e o tamanduá-bandeira (Myrmecophaga tridactyla). Em 1990, a taxa de mortalidade era de 16,8 atropelamentos/mês, e de 30 atropelamentos/mês em 1992. Em 1997, a mortalidade atingiu 105 atropelamentos/mês (03 mortes/dia). Os atropelamentos foram mais freqüentes próximos ao Pantanal, a mais ampla planície inundável neotropical. Há muitos aspectos no desenho paisagístico da estrada que poderiam estar afetando as taxas de atropelamento. A borda e o aterro da estrada mantêm alguns tipos de corredores secundários de fauna (e.g. florestas e/ou baías marginais), capazes de atrair várias espécies de vertebrados para junto da estrada. A diversidade e a distribuição de espécies, bem como suas taxas de atropelamento, foram mapeadas ao longo da rodovia para detectar os padrões de mortalidade. A relação dos registros faunísticos com o ambiente permitiu estimar o status de conservação local, indicando as áreas de risco para vida selvagem e subsidiando uma discussão pertinente quanto às formas de manejo silvestre ao longo da rodovia BR-262. palavras-chave: cerrado, conservação, ecologia da paisagem, espécies ameaçadas, impactos de rodovia, manejo de vida silvestre, mortalidade de vertebrados, pantanal.

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ABSTRACT The Campo Grande-Corumbá Highway (BR-262) crosses a landscape/environment gradient between cerrado lato sensu and the southern pantanal (Mato Grosso do Sul State) that shows several levels of urbanization and large sections of pasture and native vegetation. The local diversity of fauna is high, and the occurrence of vertebrate/vehicle collisions is very often. To detect the effects of BR-262 Highway on wildlife mortality, data were collected about the incidence of road kills of animals within several types of environment and landscape between may 1996 and november 1997. The list of 1,402 mammals, birds, reptiles and amphibians killed by vehicles includes at least 84 species, six of which are endangered: the marsh-deer Blastocerus dichotomus, the maned-wolf Chrysocyon brachyurus, the ocelot Felis pardalis, the jaguar Panthera onca, the long-tail otter Lontra longicaudis, and the great anteater Myrmecophaga tridactyla. In 1990, the road-kill rate was from 16,8 road kills per month, and in 1992, this rate increased to 30 road-kills/month/yr. Actually, this rate reached up to 105 road-kills/month (03 deaths/day) at the end of this study (nov/97). Roadkills were more frequent in the Pantanal area, the largest neotropical flood plain. There are many features on the road landscape/environment distribution that could be affecting the road-kill rates. The border and the bank of the highway maintain some kind of secondary "corridors" to fauna (e.g. marginal forest and/or ponds), that could attract many species of vertebrates to the roadsides. Species diversity and distribution were mapped along the highway to detect the animal mortality patterns. The relationship between road-kill frequency and environment allowed me to recognize local conservation status, indicating the most important sites for wildlife protection, and supporting pertinent discussion about fauna management approaches along BR-262 highway.

key-words: cerrado, conservation, endangered species, highway impacts, landscape ecology, pantanal, vertebrate mortality, wildlife management.

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INTRODUÇÃO O pantanal e o homem Localizado na região central do continente sul-americano, o pantanal mato-grossense constitui uma das maiores planícies inundáveis do mundo, ocupando área aproximada de 140 000 km2. Irrigada pelo rio Paraguai e seus afluentes, a maior parte da planície apresenta uma dinâmica de inundações de caráter tipicamente estival, que condiciona diversos tipos de habitats como “ilhas” de vegetação não inundáveis (capões e/ou cordilheiras), campos, "baías" permanentes e temporárias (Prance & Schaller 1982, Paula et al. 1995). Na época da cheia, as áreas mais elevadas funcionam como refúgios da fauna terrestre, ao passo que no período da seca estes animais geralmente se concentram próximos às baías permanentes ou outros ambientes onde existe água disponível (rios e corixos). O pantanal tem alto valor ecológico pois, além de agregar em sua biodiversidade componentes de diferentes biomas como Cerrado, Amazônia, florestas meridionais e chaquenhas (Adamoli 1986), também representa um dos últimos grandes refúgios de várias espécies da fauna brasileira, de ampla distribuição e ameaçadas de extinção (Alho et al. 1988, Bernardes et al. 1990, BSP-CI-TNC-WCS-WRI-WWF 1995). A região, que teve um processo de ocupação modelado na pecuária extensiva, estruturada nos extensos campos de gramíneas nativas, experimentou outras atividades envolvendo o aproveitamento dos recursos naturais, com o comércio legal ou ilegal de produtos da fauna (Aguire 1945, Campos 1969, Brazaitis 1989, Marques & Monteiro 1995, Mourão et al. 1996). Mais recentemente, houve um crescimento do turismo e da prática de pesca desportiva, bem como uma intensificação da atividade pecuária, com o desmatamento de áreas florestadas para introdução de variedades exóticas de gramíneas. Um conjunto de fatores envolvendo o crescimento da ocupação humana, as transformações decorrentes do uso da terra (com as conseqüentes alterações no ambiente), a exploração da vida silvestre, o turismo predatório e diversas formas de poluição vêm comprometendo a manutenção da diversidade no pantanal (e.g. Alho et al. 1988, Bucher et al. 1993, Harris & Silva-Lopes 1993, Haigh et al. 1995). A execução de projetos como o polo de mineração em Corumbá, o gasoduto Bolívia-Brasil e a polêmica revitalização da Hidrovia do Rio Paraguai indicam a tendência do processo de desenvolvimento da região em criar e potencializar distúrbios sobre a fauna, a flora e ambiente (e.g. Bucher et al. 1993, Van Dyke & Klein 1996, Gomes 1997a, b). Em especial, o projeto da Hidrovia do complexo Paraguai-Paraná, integrando economicamente Argentina, Bolívia, Brasil, Paraguai e Uruguai, é a mais recente ameaça à conservação do pantanal, à medida que prevê obras com efeitos diretos sobre este ecossistema (Bucher et al. 1993, Gomes 1997a), além de acentuar outros problemas como o incremento do tráfego de cargas pelas rodovias federais BR-262 e BR267, vias de acesso às regiões portuárias de Corumbá-MS e de Porto Murtinho-MS.

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As estradas e seus efeitos Promotoras do avanço da ocupação humana e do processo de fragmentação de ambientes, as estradas de rodagem, implantadas sem planejamento adequado, podem comprometer a qualidade de ecossistemas naturais adjacentes. Além disso, agem como fontes de poluição e de mortalidade, interferindo na dispersão de elementos da flora e da fauna (Mader 1984, Wilcox 1989, Schonewald-Cox & Buechner 1993, Fischer & Gascon 1995, Milberg & Lamont 1995). A ocupação humana que se dá ao longo das estradas deve ser considerada ainda como uma da maiores fontes de problemas (Harris & Silva-Lopes 1993, Schonewald-Cox & Buechner 1993, Dale et al. 1994). Em rodovias com tráfego de veículos constante, os ruídos e os riscos de atropelamento podem alterar a dinâmica biológica das comunidades locais (Feldhamer et al. 1986, Woodward 1990, Henson & Grant 1991, Birkan et al. 1994, Foppen & Reijnen 1994, Reijnen & Foppen 1994, 1995), transformando-as em barreiras ecológicas para algumas espécies (Harris & Silva-Lopes 1993, Schonewald-Cox & Buechner 1993, Fehlberg 1994, Thurber et al. 1994, Krausman & Etchberger 1995). As conseqüências são piores quando a rodovia cruza corredores tradicionais da fauna (e.g. “carreiros”, áreas preservadas, matas ciliares), sem que se faça qualquer concessão a estes deslocamentos (Harris & Silva-Lopes 1993, Rodriguez et al. 1996). Grande parte dos trabalhos enfocando atropelamento de fauna tem sido realizada no exterior, principalmente em países temperados. Nesses locais, os registros incluem invertebrados, anfíbios, répteis, aves e mamíferos (e.g. Oxley et al. 1973, Garland & Bradley 1984, Knutson 1987, Woodward 1990, Seibert & Conover 1991, Barrientos 1993, Rosen & Lowe 1994, Buhlmann 1995, Romin & Bissonette 1996). Rodovias interligando pontos distantes e/ou atravessando grandes áreas preservadas tendem a apresentar altos índices de mortalidade da fauna silvestre, como ocorre em planícies da América do Norte, Europa, África e Austrália, uma vez que dificultam a travessia de animais (e.g. Drews 1995, Barrientos 1996). Conhecida como “fauna de estrada”, animais silvestres atropelados podem servir como indicadores suplementares da diversidade local, além de fornecerem dados ecológicos e da história natural de algumas espécies (Adams 1983, Knutson 1987, Korhonen & Nurminen 1987, Novelli et al. 1988, Seibert & Conover 1991, Hamer 1994). Portanto, monitorar a fauna de estrada pode revelar aspectos interessantes como o padrão de deslocamento e a dinâmica sazonal de algumas populações das espécies presentes na comunidade (Knutson 1987, Barrientos 1993, Buhlmann 1995, Romin & Bissonette 1996). Com estas informações pode-se avaliar o estágio de conservação local e estabelecer áreas prioritárias para proteção e manejo da fauna que utiliza rodovias como parte do seu habitat (Gleason & Jenks 1993, Barry & Shaffer 1994, Rosen & Lowe 1994, Drews 1995). No Brasil, apesar do conhecimento histórico sobre a questão rodovia vs. meio ambiente (Lopes & Queiroz 1994), somente alguns estudos recentes relacionam animais atropelados (Novelli et al. 1988, Eterovic & Marques 1996, Jácomo et al. 1996, Vieira 1996) e praticamente nada se sabe dessa problemática no Pantanal (Fischer 1996). 5

A BR-262 e seus impactos: fonte de problemas para a conservação regional A rodovia BR-262 se estende por todo o Estado de Mato Grosso do Sul, no sentido leste-oeste, desde a cidade de Três Lagoas, divisa com o Estado de São Paulo, atravessa Campo Grande, culminando em Corumbá, no extremo oeste, fronteira com a Bolívia. Ao longo dos 753km de sua extensão total no Estado (MS), o trecho compreendido entre Campo Grande e Corumbá (426km) desperta um interesse especial por estar integrado num gradiente paisagístico-ambiental de transição entre cerrado e pantanal (figura 1). A diversidade da fauna local é alta, pois a rodovia cruza ecótonos de cerrados e de florestas meridional e chaquenha com a vegetação típica da planície pantaneira (RADAMBRASIL 1982, Adamoli 1986, Brown Jr. 1986). A construção de estradas nessa região não somente transformou a paisagem, obstruiu e/ou degradou corredores naturais da fauna silvestre (e.g. matas ciliares), como também produziu efeitos atrativos para diversas espécies de animais. Um exemplo está nas chamadas “caixas de empréstimo”, resultantes da retirada de material para o aterramento das estradas. Estas caixas-de-empréstimo funcionam como "baías" durante os meses secos da região, armazenando água e concentrando organismos aquáticos, principalmente peixes. Fontes de água e alimento, estas caixas de empréstimo promovem forte atração em outras espécies da fauna pantaneira, que se utilizam desses recursos no período. Na cheia, a estrada ainda serve como refúgio e como rota de deslocamento, uma vez que junto com os capões e cordilheiras torna-se uma das poucas áreas emersas na planície (veja Fischer 1996). Um componente importante a ser considerado na avaliação dos riscos de mortalidade da fauna nas estradas é o volume de tráfego de veículos. Na BR-262, o tráfego ocorre/varia em função do turismo ecológico, incentivado pelas belezas paisagísticas do pantanal e de regiões vizinhas (e.g. Bonito), do “turismo de compras” na Bolívia, do afluxo de praticantes de pesca desportiva e também devido ao fato da estrada representar a única rota de transporte rodoviário para municípios como Aquidauana, Miranda, Corumbá, outros da região sudoeste do Estado e mesmo para a Bolívia. A implantação da BR-262 conduziu a uma realidade na qual a estrada funciona como a via de ligação formal com uma série de programas/perspectivas para o desenvolvimento regional. Isto deve representar uma preocupação, pertinente aos possíveis equívocos cometidos, quanto à sua eficácia sócio-econômica e a integração ao ambiente por ela ocupado, no que se refere às formas de uso da terra e/ou planos de manejo nas áreas sob sua influência (e.g. Lopes & Queiroz 1994, Roe 1996, Wallisdevries 1996). Considerando o aumento do fluxo de veículos pela integração com a hidrovia (Bucher et al. 1993) e pelo crescimento do (eco)turismo, é imperativo monitorar os efeitos da estrada, diagnosticando problemas e apontando soluções a serem testadas. Qualquer reestruturação da rodovia deverá contar com orientação técnica, baseada no conhecimento científico como forma de minimizar os impactos sobre a fauna, a flora e o ambiente (e.g. Kuiken 1988, Anderson 1993, Lopes & Queiroz 1994). Atenção especial deve ser dada ao turismo, atualmente a 6

segunda maior fonte de receita para a região, que pode subsistir como atividade sustentável se praticado de forma a não exaurir suas fontes potenciais. Em países da Europa e nos Estados Unidos, algumas técnicas, nem sempre eficazes, são aplicadas para a conservação da vida silvestre nas áreas atravessadas por estradas (e.g. Reed et al. 1982, Reeve & Anderson 1993, Foster & Humphrey 1995, Woelfel & Krueger 1995, Rodriguez et al. 1996). Alternativas conservacionistas devem acompanhar o desenvolvimento do turismo (ou ecoturismo) na região para que a exploração deste potencial traga soluções e resulte em menores danos à vida silvestre (e.g. Pedevillano & Wright 1987, Harris & Silva-Lopes 1993). As informações disponíveis sobre a mortalidade na BR-262, ainda que não organizadas, motivaram a realização deste estudo, com a finalidade de executar um diagnóstico atual sobre a “fauna de estrada” nesta rodovia, sistematizando o registro de atropelamentos ao longo de um ano, no trecho compreendido entre Campo Grande e Corumbá, MS. Ao mesmo tempo, avaliar como alguns fatores, tratados como variáveis bióticas e abióticas, estariam relacionados à freqüência de atropelamentos de vertebrados silvestres. O capítulo 1 trata da distribuição paisagístico-ambiental ao longo da estrada e seus efeitos na freqüência de atropelamentos. Inclui a caracterização da paisagem e zoneamento ambiental ao longo da rodovia, relacionando trechos preservados e alterados, domínios vegetacionais originais, locais de concentração da fauna, devido à sua atração como fontes de água, alimento e refúgio. Estas descrições foram realizadas a partir de imagens de satélite, fotos aéreas, literatura e comprovação visual in loco. O capítulo 2 traz o mapeamento espacial e temporal da ocorrência de atropelamentos de vertebrados nos diferentes tipos de ambientes e habitats envolvidos, além do inventário da fauna atropelada. Basicamente, o estudo envolve a questão sobre quais espécies encontram na BR-262 um potencial risco de mortalidade e que, portanto, poderiam estar sendo prejudicadas pela sua presença. Além disso, apresenta os trechos, ambientes e pontos de maior freqüência de atropelamentos, bem como os efeitos da cheia do pantanal neste processo, principalmente nas áreas onde a paisagem está condicionada pelos pulsos de inundação dos rios que drenam a região. Finalmente, proponho formas de manejo adequadas a cada fisionomia caracterizada, na tentativa de minimizar a mortalidade faunística, sem diminuir o atrativo exercido pela rodovia. Manter a fauna associada à estrada representa um aspecto de valor significativo no estabelecimento de pontos de observação ou avistamento, fontes de interesse para o (eco)turismo e um reconhecido apelo aos usuários da BR-262, quanto à importância do exercício coletivo na prática da conservação da biodiversidade na região do Pantanal.

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Figura 1. Localização da rodovia BR-262 através da região de estudo no trecho Campo GrandeCorumbá (Cerrado-Pantanal).

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CAPÍTULO 1. EFEITOS DA PAISAGEM NA INCIDÊNCIA DE ATROPELAMENTOS DE VERTEBRADOS NA BR-262: DILEMAS ENTRE PRESERVAÇÃO E CONSERVAÇÃO Introdução A introdução de estradas cruzando áreas naturais é um dos primeiros passos para o início do processo de alteração de ambientes. Independentemente de incentivar a ocupação humana ou não, a presença da rodovia pode trazer "novidades" ambientais para a região. Desde que o Homo sapiens é sapiens, as estradas são nossos "carreiros" naturais. Primariamente, somos animais de deslocamento terrestre. Portanto, ou encaramos nosso status natural e tentamos interagir positivamente com o ecossistema pelo qual passam nossos caminhos (princípios básicos da conservação); ou continuamos com a idéia de que devemos ser diferentes, "artificiais", para então isolar "homem" e "natureza", protegendo-a de nossos artifícios maléficos (princípios básicos da preservação). A revisão destes conceitos demanda de uma visão bastante ampla de nosso papel no globo. Se nos considerarmos predadores de topo da teia alimentar, afinal aparentemente não temos predadores naturais, por coerência à lógica de transferência de energia de um nível trófico a outro, deveríamos ser uma espécie de baixa densidade na face da Terra. Seguramente, existem mais seres humanos do que o ambiente global poderia suportar, com o agravante de que várias ações antrópicas vem diminuindo esta capacidade de suporte global. Enquanto não diminuímos nossa densidade no planeta ou algum fenômeno natural não o faz para nós, temos que tomar alguns posicionamentos imediatos. No caso das rodovias, elas facilmente se tornariam exemplos de coexistência se alguns aspectos fossem observados. A BR-262 (Campo Grande-Corumbá) é um caso privilegiado pois atravessa uma região escassamente povoada e que apresenta muitas áreas em condições naturais de preservação. Além disso, a fauna associada a ela é bastante diversa, principalmente por atravessar o gradiente cerrado-pantanal. Portanto, ela pode se tornar um laboratório exemplar para a experimentação de técnicas de manejo de fauna e da paisagem. Metas Entre 1996 e 1997, realizei uma classificação paisagística da BR-262 em várias escalas de análise, buscando uma delimitação ambiental adequada ao estudo da mortalidade da fauna por atropelamento de veículos. O conceito de paisagem definido aqui teve caráter relativo, i.e. ao tratar da paisagem, procurei observar e/ou detectar ambientes característicos a partir da visão panorâmica da estrada. As descrições visaram detectar aspectos da paisagem relativos à atração da fauna silvestre e eventuais problemas para seu deslocamento. Finalmente, aponto soluções locais que poderiam diminuir os riscos de atropelamento de animais na BR-262, a partir da síntese de informações adequadas à elaboração de planos locais de desenvolvimento turístico e econômico que sejam sustentáveis ao ambiente e à fauna nativa (detalhes no cap.2). 9

Métodos O objeto de estudo foi a estrada em si, i.e. a autopista e o acostamento que se estendem desde Campo Grande até Corumbá (figura 1). A partir da BR-262, analisamos cada unidade ambiental em algumas escalas de refinamento, enfocando aspectos ecológicos da paisagem. Utilizei nesta análise, dados de literatura, imagens de satélite (CPAP/EMBRAPA e UFMS), fotos aéreas, mapas topográficos e comprovação visual in loco. Além disso, utilizei publicações referenciais sobre dados geomorfológicos, florísticos e vegetacionais da região (e.g. Prance & Schaller 1982, RADAMBRASIL 1982, Adamoli 1986, Ratter et al. 1988, Pott & Pott 1994, Paula et al. 1995, PCBAP 1997). Os critérios definidos para a separação da BR-262 em categorias ambientais foram (i) tipos vegetação como fontes de recursos naturais para a fauna de vertebrados silvestres; (ii) grau de conservação e alteração ambiental; (iii) gradiente altitudinal e influência dos períodos de inundação da planície pantaneira. No campo, percorri mensalmente (entre 1996/1997) os 426 km da BR-262 (trecho Campo Grande e Corumbá) para comprovação e registros locais de aspectos relevantes do ambiente para a vida selvagem (e.g. áreas abertas, florestas e matas ciliares, drenagens, corpos d'água e outras fontes de recursos vitais). Trechos com padrões paisagístico-ambientais similares formaram categorias próprias (e.g. cerrado, áreas inundáveis, cordilheiras, etc.). Cada local foi demarcado e delimitado pelas suas coordenadas, utilizando-me de GPS, hodômetro do veículo e eventuais aferições locais pela quilometragem oficial da rodovia. Reuni informações bibliográficas e de campo para compor a tabela 1 que avalia a contribuição da vegetação na paisagem da BR-262, considerando também a proporção de áreas preservadas e alteradas. A planificação esquemática da paisagem da BR-262 foi mostrada na figura 2, que considera também o mapeamento dos locais com maior incidência de atropelamentos da fauna silvestre demonstrados e discutidos no capítulo 2. Espécies de vertebrados naturalmente raras e/ou ameaçadas foram consideradas indicadoras de locais de alto risco para a vida selvagem, sendo listadas pela sua contribuição regional nos registros de atropelamentos.

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BR-262

Regiões ABERTA

M 20o25,3' S A 54 o57,1'W R A C MARACA A J Ú 20o32,0' S 55 o34,6'W CHAPÉU

Drenagem Loc CG TR Aquidauana Cachoeirão 2 Irmãos

104 105

Taquaruçu

130 133 138 155 175 179 180

Acogo Laranjal Agachi Bananal

20o19,7' S 56 o12,1'W

B O D O Q U E N MIRANDA A

Répteis

Aves

01 E. murinus

02 falconídeos 01 G. brasilianum 01 R. toco

01 G. cuja 01 Tayassu sp. 06 C. brachyurus 06 procionídeos 01 Mazama sp. 02 F. yagouaroundi

01 Phrynops sp. 01 L. mattogrossensis

02 H. meridionalis

02 P. cancrivorous

02 L. mattogrossensis

01 P. perspicillata

01 M. americana

01 strigídeo

01 L. longicaudis 04 procionídeos

01 D. corais corais

MI

01 Felis sp. 01 C. unicinctus 01 C. brachyurus 02 F. yagouaroundi 01 L. longicaudis 04 procionídeos

203 01 H. gigas

Miranda

Mamíferos 02 procionídeos

70

AQ

BODOQ

km 0 23 35

01 R. clamator

01 L. longicaudis

221 01 S. venaticus 01 E. barbara 01 Felis sp. 01 M. americana 01 F. pardalis 14 procionídeos GU

249 02 H. gigas 01 B. constrictor

19o50,2' S 56 o53,7'W

01 F. pardalis 01 C. unicinctus 07 procionídeos

280

BP

01 R. toco

03 F. pardalis 01 L. longicaudis 02 procionídeos

01 B. neuwiedi 01 H. gigas

01 J. mycteria 01 B. virginianus 01 C. aura

02 procionídeos 01 P. onca 02 B. dichotomus

01 R. americana

12 procionídeos. 01 Tayassu sp. 01 M. americana

306

P ANTANAL MO

02 H. gigas

353

Paraguai Verde

01 H. gigas

19o26,0' S 57 o26,2'W

363 01 B. moojeni

U RUCUM CO

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Figura 2. Linearização esquemática da BR-262 com o mapeamento da paisagem e da ocorrência de atropelamentos de espécies raras e/ou ameaçadas de vertebrados por região.

Regiões: MARACA=Maracajú; BODOQ=Bodoquena; Locais (Loc): CG=Campo Grande; TR=Terenos; AQ=Aquidauana; MI=Miranda; GU=Guaicurus; BP=Buraco das Piranhas; MO=Morrinho; CO=Corumbá; Áreas: Azul=drenagem; Vermelha=campos não-inundáveis; Amarela=campos inundáveis; Verde=florestas nativas; Limão=CFMs; Anil=CBMs.

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Resultados e Discussão Caracterização regional RADAMBRASIL (1982) - De acordo com as Folhas Campo Grande e Corumbá, a fisionomia de Cerrado (lato sensu) corresponde a 41,4% de toda a paisagem da estrada (173,9km), e de onde se estima que 58% desta encontra-se preservada (tabela 1). A transição Cerrado/Floresta Estacional ocupa 90,3km (21,5%), e somente 39% desta permanece. A interface vegetacional Cerrado/Chaco ocupa somente 2,5% da paisagem, estando praticamente toda preservada (100%). O mesmo ocorre com a vegetação chaquenha propriamente dita (2,1%), e da sua transição para a floresta estacional (56,7km), que representa 13,5% do total. Ambas fisionomias foram consideradas 100% preservadas e correspondem a toda a porção paisagística da BR-262 situada entre a margem direita do Rio Paraguai (Porto Morrinho) e Corumbá. Por outro lado, o domínio da floresta estacional (19%), onde se enquadram as matas ciliares da rede hidrográfica AquidauanaMiranda-Paraguai está quase totalmente devastada. No geral, metade (50,5%) de toda a paisagem da BR-262 permanece preservada, sendo que o restante é utilizado quase que exclusivamente para atividades agropecuárias extensivas. A influência urbana na paisagem é invariavelmente muito pequena uma vez que a BR-262 atravessa poucos quilômetros através de zonas urbanas entre Campo Grande e Corumbá. PCBAP (1997) - Analisando o zoneamento ambiental feito no Plano de Conservação da Bacia do Alto Paraguai - PCBAP, pode-se enquadrar a estrada em algumas das classificações propostas. Numa escala macro, a rodovia Campo Grande-Corumbá se insere em quatro grandes regiões, que assim denominei (figura 2): Maracajú- A primeira região se situa sobre o planalto Maracajú-Campo Grande, estendendo-se desde a capital do estado ( 20027,3' S, 54040,3' W, alt380m) até próximo a divisa com a serra da Bodoquena, na borda oeste da bacia sedimentar do rio Paraná ( 20032,0'S, 55034,6'W, alt180m). São 104km de estrada por uma paisagem que naturalmente teria fisionomia de mata (cerrado, cerradão e floresta estacional), hoje bastante comprometida pela policultura e pecuária em expansão. Esta região alta e não sujeita a inundação corresponde a 24,8% do percurso estudado. Bodoquena- A segunda região se inicia no afloramento rochoso da serra da Bodoquena, onde o solo é mais antigo e as altitudes vão decrescendo (180 a 50m). Este embasamento geológico serve de substrato para o aterro da BR-262 por mais 175km (41,7%), até um ponto bastante próximo ao morro do Azeite (19050,2' S, 56053,7'W).

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Tabela 1. Contribuição das fisionomias vegetacionais para a paisagem da rodovia BR-262 (Campo GrandeCorumbá), descrita no RadamBrasil (1982) e revisada neste estudo (1997). km= extensão da estrada que atravessa a fisionomia vegetacional; CFM= corredores de floresta marginal; CBM= corredores de baía marginal. 1982 paisagem fisionomia

preservada

km

%

%

cerrado

173,9

41,4

58,2

floresta estacional

79,8

19,0

0

chaco

8,8

02,1

100,0

cerrado/floresta estacional-ciliar

90,3

21,5

39,0

cerrado/chaco

10,5

02,5

100,0

floresta estacional/chaco

56,7

13,5

100,0

total

420

100

50,5

ambiente

alterado

1997 tipo

%

urbano

04,8

aberto

08,8

CFM

19,2

CBM

33,0

total

65,8 cerrado/floresta ripária

22,2

floresta estacional/chaco

12,0

preservado total

34,2

13

A estrada percorre aproximadamente a borda norte da serra, formada pela depressão do rio Miranda antes de atingir a planície pantaneira. A região também não sofre os efeitos diretos da inundação, exceto por um pequeno trecho do pantanal do Miranda. São apenas 20km compreendidos entre o município de Miranda e a comunidade de Salobra, região das várzeas do rio Miranda onde se pode detectar fisionomias de cerrado, campo sujo e pastagens nativas, além da presença de formações vegetacionais monotípicas do pantanal como o regionalmente chamado paratudal (paratudo= Tabebuia aurea). Este trecho está sujeito a um regime de 4 a 6 meses de inundação, condicionado pelo volume de água do rio Miranda. Este segmento da BR-262 chega a atravessar a depressão e a calha do rio Miranda, separando as duas escarpas da serra da Bodoquena que se contrapõe ao município de Miranda. No trecho anterior ao rio (lado direito), iniciado na região de Aquidauana (morraria do Chapéu), a vegetação é composta de alguns remanescentes de floresta savânica e matas ciliares da drenagem afluente ao sistema Aquidauana-Miranda. Todavia, a predominância da atividade de pecuária promoveu a formação de agroecossistemas de pastagens não-nativas, introduzidas e mantidas de forma bastante rudimentar (e.g. queimadas periódicas). Estas alterações ficam mais evidentes no trecho final da BR-262 sobre a serra da Bodoquena, lado esquerdo do rio Miranda. Apresentando um relevo mais suave e percorrendo as bordas da planície inundável, a região foi totalmente devastada para cultivo de gramíneas exóticas. Os remanescentes de mata ficam restritos às partes altas de alguns morrotes, apresentando fisionomia e dinâmica bastante semelhantes a dos capões e cordilheiras, mas também condicionados pela ocorrência crônica de queimadas, a despeito dos efeitos da cheia. Em zonas mais alagáveis, é possível encontrar formações remanescentes de carandazal (carandá=Copernicia alba). A BR-262 percorre neste trecho o que anteriormente se caracterizava como uma cordilheira de mata (R. Fraga, com. pess.), hoje alterada pela presença da estrada, da rede elétrica e de outras ações do homem. Pantanal - Ao atingirmos a planície do pantanal (alt.50m), adentramos na terceira macro-região da área de estudo. Nesta parte da BR-262, o aterro da estrada é um dos raros locais permanentemente emersos na área, e o único tão extenso, ca. de 83km praticamente em linha reta até o rio Paraguai. O aterro da estrada separa o pantanal do Miranda e do Nabileque, respectivamente caracterizados por paratudais e carandazais, ambos associados com pastagens nativas. Estão sujeitos a regimes de inundação de até 6 meses por ano, e as fisionomias savânicas se restringem às cordilheiras e capões elevados. Cruzando para a margem direita do rio Paraguai, a BR-262 continua sobre um aterro contínuo por mais 10km até atingir a base do Residual do Urucum (19026,0'S, 570 26,2'W), quando a estrada novamente entra em regiões mais elevadas. Esta região inundável da várzea do Paraguai tem maior influência do chaco boliviano, com forte presença de carandazais. Esta macro-região corresponde a 19,8% de toda a paisagem da BR-262. Urucum- Finalmente, a última região a ser considerada situa-se na morraria do Urucum, embasamento geológico que inclue maciços com mais de 300m de altitude, ricos em ferro e manganês. A estrada passa nas partes mais baixas do relevo (alt 100-200m), que originalmente é de domínio das florestas 14

estacionais deciduais de terras baixas, mas que também apresenta pastagens não-nativas. O alto da serra é coberto por florestas semideciduais submontanas, bastante preservadas devido à dificuldade de manejo agrícola nestas áreas íngremes. No geral, muito pouco da paisagem nestes 57km de extensão até Corumbá (13,6%) está descaracterizada pelo uso da terra, e a região serrana proporciona um grau de preservação ambiental consideravelmente alto até as proximidades de Corumbá (19001,6'S, 57037,1'W). Descrição local A tabela 1 traz o percentual de preservação da vegetação natural e de formações secundárias produzidas a partir da construção da estrada. As áreas com ambientes naturais preservados totalizam aproximadamente 143,6km (34,2% da paisagem), sendo que 58% (84km) destes estão na região MaracajúBodoquena anterior à calha do rio Miranda. Os outros 42% (60km) encontram-se na região do Urucum e correspondem às areas de floresta estacional com forte influência do chaco, principalmente na sua parte sudoeste com áreas alagadas e campos nativos. Nota-se portanto uma diferença de 16,3 pontos percentuais entre às áreas consideradas preservadas pelo RADAMBRASIL (50,5% do total) e àquelas reconhecidas no campo (34,2%). Além da possibilidade de evolução do processo de ocupação humana (entre 1982 e 1997), a influência da estrada como degradadora ambiental pode ter sido subestimada e/ou negligenciada na análise do RADAMBRASIL (1982). Dentre as alterações ambientais, podemos notar que 13,6% da paisagem nativa foram completamente degradadas em ambas as margens da BR-262, seja para pastagens (36,9km), seja pela urbanização (20,2km). Entre Campo Grande e Terenos, os campos de gramíneas exóticas predominam até junto às margens da estrada, sem que haja qualquer formação florestal detectável. Isto ocorre em todo o trecho onde os trilhos da antiga Rede Ferroviária Federal (RFFSA) acompanham o lado sul da estrada (35km). Além disso, foi detectado que a maioria das matas de galeria foi alterada ou devastada. Corredores naturais de fauna e importantes na manutenção da sua diversidade, a preservação destas florestas permitiria aos animais cruzarem por baixo das pontes da rodovia, se manejadas adequadamente (e.g. Naiman et al. 1993, Foster & Humphrey 1995, Sullivan 1996). Além desta degradação, drenos e riachos menores foram canalizados e a travessia da fauna obrigatoriamente se dá pela rodovia. Via de regra, a ocupação humana nestas áreas é freqüente e sempre degradante à floresta ripária. Os "corredores da estrada" e a fauna silvestre A partir de Terenos, apesar de predominarem os campos de pastagem, a estrada invariavelmente apresenta uma faixa de mata secundária nativa junto às suas bordas (esquematizada na figura 2). Estes corredores de mata se dispõem paralelamente entre a estrada e as áreas de pastagem, apresentando de 20 a 100m de largura em cada lado da BR-262. São áreas pertencentes ao Departamento Nacional de Estradas 15

de Rodagem (DNER), compreendidas entre a autopista e as propriedades rurais. Esta vegetação não sofre qualquer tipo de manejo agrícola, ficando condicionada por queimadas ocasionais e processos de regeneração natural. Convencionei chamar estes remanescentes de “corredores de floresta marginal” (CFM), uma vez que formam um cinturão de mata conectando as áreas de vegetação preservada ao longo da rodovia. Os CFMs ocupam 19,2% da paisagem (80,6km de extensão) e se intercalam entre áreas preservadas e corredores de mata transversais à BR-262 (e.g. floresta ripária). Este desenho paisagístico contribui para que a fauna utilize a estrada ao se deslocar de um fragmento a outro, principalmente aquelas espécies com alguma inibição em se deslocar por áreas abertas. Os CFMs estendem-se desde a região de Terenos até Miranda. Entre Terenos e Aquidauana, onde o uso da terra é muito mais intenso, ocorrem estreitos CFMs (20-50m), além dos poucos fragmentos de mata preservados, principalmente a partir do rio Cachoeirão (20o 32.470’ S, 55o 33.420’ W), ainda na região de Maracajú. Entre Aquidauana (20o 29.970’ S, 55o 48.766’ W) e Miranda, os CFMs são mais largos (ca. 100m). A partir de Miranda, estes CFMs assumem uma fisionomia arbustiva e acabam por desaparecer por completo na região da planície, voltando a ocorrer bem mais adiante na região do Urucum, à direita do Rio Paraguai. Nesta região, estas formações marginais da estrada ocorrem em apenas em alguns quilômetros da BR-262, pois a vegetação torna-se mais arbórea e conservada, não caracterizando um CFM típico (corredor de mata). Todavia, a vegetação lateral da estrada demonstra uma fisionomia semelhante, inclusive com espécies vegetais muito comuns nos CFMs (e.g. palmeira-bocaiúva Acrocomia sclerocarpa), e também se apresenta de forma contínua até o município de Corumbá. De uma maneira geral, todos os trechos da estrada que não sofrem efeitos diretos da inundação da planície, apresentam CFMs ou cruzam remanescentes de floresta preservada que chegam até o acostamento da estrada. Estas margens florestadas geralmente representam rotas atrativas para fauna em deslocamento. Vários animais costumam utilizar a estrada em algum momento do dia ou do seu ciclo de vida. Tamanduás (Tamandua tetradactyla e Myrmecophaga tridactyla), tatus (Dasypus novemcinctus e Euphractus sexcinctus), aves não-voadoras (tinamídeos, Cariama cristata, Rhea americana), além de cobras e lagartos costumam forragear nos ambientes que a estrada atravessa e/ou proporciona (e.g. bordas de mata), onde são comumente atropelados. Muitas vezes a estrada fornece itens alimentares a omnívoros como o mão-pelada (Procyon cancrivorous), lobo-guará (Chrysocyon brachyurus), coati (Nasua nasua), furão (Galictis cuja), tatu-preto (D. novemcinctus), tatu-peba (E. sexcinctus) e aves em geral. Estes animais costumam forragear frutos (e.g. bocaiúva=Acrocomia sclerocarpa, ervas e arbustos), artrópodes e pequenos vertebrados que ocorrem nos CFMs e bordas de mata em geral. E finalmente, o caso em que a própria rodovia torna-se local de alimentação para animais oportunistas/generalistas como os carnívoros/necrófagos cachorro-do-mato, carancho e urubu (Cerdocyon thous, Polyborus plancus e Coragyps atratus, respectivamente), presentes 16

desde Campo Grande até Corumbá. Os falconiformes competem entre si pelas carcaças, entretanto seu horário de forrageio difere do cachorro-do-mato e de outros carnívoros noturnos. Eles são os "limpadores" da estrada e apresentam maiores concentrações em áreas de grande incidência de atropelamentos (capítulo 2). Nas áreas inundáveis, principalmente no trecho entre Miranda-Salobra (20km) e no pantanal propriamente dito (Guaicurus-Morrinhos), a estrada passa a exibir as chamadas “caixas de empréstimo", paralelos à rodovia. Este outro tipo de corredor representam longas "baías", às quais chamei de “corredores de baías marginais” (CBM), correspondendo a 139km, i.e. 33% da extensão da BR-262. Durante a vazante e a seca, os CBMs retêm água e cardumes de peixes, atraindo uma rica concentração de animais, principalmente quando as baías permanentes vão escasseando pela planície pantaneira. Nestes trechos, é comum encontrar jacarés (Caiman crocodilus yacare), sucuris (Eunectes spp.), capivaras (Hydrochaeris hydrochaeris) e mesmo lontras (Lontra longicaudis) atropelados ou cruzando a estrada. Conforme a planície vai inundando, a BR-262 passa a oferecer outros perigos, principalmente por se tornar um abrigo seco e rota de deslocamento para várias espécies da fauna (Fischer 1996), até mesmo como "poseiro" às grandes aves aquáticas (e.g. Jabiru mycteria). Portanto, a consideração de fatores ambientais e paisagísticos deveriam ser incluídos no planejamento cênico das estradas (e.g. Kuiken 1988), associado a planos de manejo da vida selvagem, principalmente em casos como o da BR-262, que está longe de ser compatível com importância da região à manutenção da biodiversidade neotropical. Uma discussão sobre a problemática e formas mitigadoras para a BR-262 são apresentadas e melhor discutidas no capítulo 2.

17

CAPÍTULO 2. ATROPELAMENTO DE VERTEBRADOS SILVESTRES NA BR-262: PADRÕES DE MORTALIDADE ATRAVÉS DO PANTANAL DO MS Introdução A condição característica de uma planície inundável, de sazonalidade bem definida, com grande diversidade de ambientes típicos de áreas úmidas e baixa densidade da população humana, faz do Pantanal Mato-grossense uma região de extrema importância para a fauna silvestre. Essa extensa área geográfica abriga mais de 200 espécies de anfíbios e répteis, cerca de 650 espécies de aves e outras 100 espécies de mamíferos. Embora seja identificada como uma região de baixo endemismo (Brown Jr. 1986), o fato de ser uma área contínua e praticamente concentrar espécies representantes de todos os grandes biomas brasileiros e sul-americanos, o pantanal se reserva como uma das últimas grandes províncias neotropicais para a conservação da diversidade animal. Apesar de várias estradas públicas brasileiras cruzarem áreas naturais preservadas, poucos trabalhos se preocuparam com os efeitos do tráfego de veículos na mortalidade de animais silvestres. Novelli et al. (1988) relacionaram 15 espécies de aves mortas, durante 4 meses, em 66km da rodovia BR-471, no Rio Grande do Sul. Eterovic & Marques (1996) utilizaram registros de serpentes atropeladas, como uma tentativa de caracterizar a comunidade de ofídios na Mata Atlântica. Vieira (1996), através de algumas viagens entre São Paulo-Distrito Federal (900km) e São Paulo-Belo Horizonte (700km), apresenta uma preocupante previsão do índice anual do atropelamento de fauna, sugerindo que algo em torno de 2.700 mamíferos sejam mortos anualmente nas estradas do País. Dentre as 15 espécies identificadas nos percursos avaliados, as mais freqüentemente atropeladas foram cachorro-do-mato (Cerdocyon thous), mão-pelada (Procyon cancrivorous), tatu-peba (Euphractus sexcinctus) e tamanduá-mirim (Tamandua tetradactyla). Este autor e Jácomo et al. (1996) compõem os raros e recentes esforços de registrar a mortalidade de mamíferos silvestres em rodovias federais brasileiras, nos estados de Goiás, Minas Gerais, São Paulo e o Distrito Federal. Além de serem os únicos registros publicados, nenhum deles tem caráter sistemático e/ou longa duração. Na região do Pantanal mato-grossense, muito pouco se conhece da fauna ameaçada pelo tráfego de veículos (Fischer 1996). Registros inéditos feitos na BR-262 (trecho Campo Grande-Corumbá) entre 1989-92, revelam uma riqueza de espécies coerente com a alta diversidade regional (R. Herrera, com. pess.), atingindo números alarmantes e superando qualquer outra estimativa. Conforme descrito no capítulo 1, a BR-262 atravessa extensas áreas naturais, ao longo de um gradiente bastante diversificado, desde planalto de Maracajú-Campo Grande até a planície pantaneira. Sua importância econômica é bastante grande pois, além de permitir o escoamento da produção agropecuária dessa região brasileira e mesmo a boliviana, também é a mais importante via de acesso ao turista que viaja ao pantanal. Durante grande parte do trajeto, os usuários da rodovia podem contemplar sem dificuldade e/ou custo, as belezas cênicas e a vida selvagem da região, 18

privilégio pouco comum, proporcionado por um número considerável de grandes vertebrados que habitam as áreas rurais de Mato Grosso do Sul. Desde sua pavimentação a rodovia vem obtendo um incremento médio superior a 100 veículos/dia de um ano a outro. Segundo projeções do Departamento do Estradas de Rodagem de Mato Grosso do Sul (DERSUL), do volume diário médio (VDM) de 1.133 veículos no ano de 1990, o tráfego atinge hoje um VDM=2.217 veículos, sendo que em muitos trechos da rodovia o VDM permanece praticamente inalterado durante grande parte do ano. Visando avaliar os efeitos diretos do tráfego de veículos numa região tão importante como refúgio faunístico, realizei monitoramentos mensais na estrada para

registrar a ocorrência de vertebrados

atropelados ao longo dos 420km que separam Campo Grande do município de Corumbá, MS. As principais metas nestes monitoramentos foram (i) detectar quais taxa são afetados pelo tráfego da rodovia; (ii) determinar a freqüência e as taxas de mortalidade mensais e sua evolução anual a partir de 1989, com considerações sobre o tráfego de veículos e os períodos de inundação do pantanal; (iii) mapear os trechos da estrada com maior freqüência de atropelamentos, principalmente aqueles com maior mortalidade de espécies naturalmente raras e/ou ameaçadas. Métodos A região de estudo através da Rodovia BR-262 No trecho entre Campo Grande e Corumbá, a BR-262 atravessa áreas de domínio do cerrado lato sensu, de pantanal e áreas alagáveis, além de trechos com influência de floresta meridional e do chaco. Nos 420km pavimentados, de pista única e mão dupla, existem poucos trechos sinuosos, sendo a maior parte do percurso em linha reta, no sentido leste-oeste (figura 1). A partir da caracterização paisagística-ambiental realizada no capítulo 1 (Maracajú, Bodoquena, Pantanal e Urucum), delimitei os sub-trechos da BR-262 a fim de detectar possíveis padrões na ocorrência de atropelamentos. A figura 2 esquematiza a abrangência destas 4 macro-regiões, e das subdivisões adotadas para ajustá-las às descrições naturalísticas e aos trechos usados pelo DERSUL nas estimativas de tráfego. Estabeleci áreas de descarte, eliminando trechos de transição entre uma sub-região e outra. Desta forma, a região de Maracajú foi reduzida para 70km de extensão; a região do Chapéu (30km pela morraria de Aquidauana), da Bodoquena (45km da serra); e do Miranda (100km da parte mais baixa da serra, incluindo o rio de mesmo nome) representam sub-regiões da Bodoquena, descrita no capítulo anterior. Finalmente, as regiões Pantanal (83km) e Urucum (57km) foram consideradas com as mesmas dimensões anteriormente descritas. Coletas mensais sistemáticas e registros de animais atropelados foram realizados entre maio/96 e novembro/96 no trecho de 306km entre Campo Grande e Buraco das Piranhas, município de Corumbá. A 19

partir de novembro de 1996 até novembro de 1997, as coletas foram feitas também nos 114 km restantes até o município de Corumbá. Foram realizadas 40 viagens em intervalos regulares de dois e cinco dias entre idavolta pela rodovia, totalizando cerca de 15.000km percorridos. As viagens tiveram início pela manhã (07:00), durando em média 10h cada a uma velocidade média de 60km/h. O hodômetro parcial do veículo era zerado em pontos pré-determinados. No sentido Campo GrandeCorumbá, os marcos-zero parciais foram (i) Aeroporto Internacional de Campo Grande, (ii) Terenos, (iii) Aquidauana, (iv) Miranda, (v) Guaicurús, (vi) Morro do Azeite, (vii) Porto Morrinhos (rio Paraguai), (vii) Corumbá. No sentido contrário, os marcos foram os mesmos, porém na ordem inversa. Sendo assim, cinco destes segmentos da BR-262 foram monitorados durante 20 meses (Campo Grande - Morro do Azeite), sendo que os trechos entre Morro do Azeite e Corumbá tiveram esforço amostral de 12 meses. Portanto, a partir de nov/96 todos os segmentos considerados tiveram o mesmo esforço amostral, exceto no mês de dez/96, quando não houve amostragem em nenhum trecho. Estimei as taxas de mortalidade por atropelamento em cada trecho, utilizando o registro mensal de animais mortos, dividido pela extensão de cada segmento amostrado. Em cada registro faunístico, anotei a quilometragem e as coordenadas geográficas do ponto (usando GPS), além de uma breve descrição do ambiente, buscando a relação definida no capítulo 1. Dentro das possibilidades, para cada animal encontrado morto atropelado foram feitas a identificação, sexagem, biometria-padrão à sua classe taxonômica, além de algumas coletas de conteúdo estomacal, pele e crânio. As coletas foram acondicionadas em sacos plásticos e conservadas em freezer e/ou formol, aguardando sua triagem e/ou preparação para serem depositadas na Coleção Zoológica de Referência da UCFMS. Quando conveniente, os animais foram apenas fotografados e analisados in loco, sendo depois retirados da estrada para evitar sua recontagem. Na estimativa das taxas de atropelamento foram considerados apenas os animais silvestres encontrados mortos no acostamento ou na pista, sendo desprezado qualquer indivíduo que casualmente fosse encontrado em áreas adjacentes. Carcaças de animais que tiveram tempo de morte estimado acima de 15 dias foram desconsideradas. Animais domésticos também não foram registrados. Animais atropelados geralmente desaparecem da estrada entre um a quinze dias, dependendo do seu tamanho e do local onde aconteceu o atropelamento. Os pequenos vertebrados permanecem apenas algumas horas no asfalto, antes de serem levados por necrófagos e/ou predadores passivos (obs. pess.).Por esta razão, as taxas de mortalidade podem ter sido subestimadas em quase 50% do seu valor real (e.g. Drews 1995). As carcaças de animais de médio e grande porte podem ficar disponíveis mais tempo no asfalto, e portanto têm um volume de registros mais acurado. Alguns dados de motoristas e pesquisadores da região foram somados na amostragem do mês referente, desde que comprovada sua veracidade e acurácia. Estes registros extras foram considerados apenas para o inventário de espécies ameaçadas pelo tráfego, não fazendo parte da estimativa mensal de atropelamentos. Os registros se limitaram às classes de animais mais 20

conspícuas: répteis, aves e mamíferos. Entretanto, anfíbios também foram comumente encontrados atropelados e foram listados apenas como forma de registrar as espécies mais freqüentes na região. Dados do histórico da mortalidade de animais na BR-262 entre 1989 a 1992 foram obtidos de registros inéditos da pesquisadora R. Herrera, servindo de base para as discussões sobre a evolução da mortalidade na referida estrada. Estimativas do volume diário médio de veículos nas estradas do MS foram obtidas junto ao Departamento de Estudos e Projetos - DEP-DERSUL. As variações do nível das águas do rio Miranda foram obtidas junto à Base de Estudos do Pantanal - BEP/UFMS. Resultados e Discussão Fauna atropelada As espécies representadas nos registros de atropelamentos estão listadas na tabela 2. Das 84 espécies identificadas, 27 são de mamíferos (32,1%), 31 espécies são de aves (36,9%), e 26 representam a herpetofauna (31%), sendo quatro espécies de anfíbios e 22 de répteis. Porém, este número deve ser maior se considerarmos a curva de acúmulo de espécie ao longo dos 20 meses de amostragem (figura 3). Nota-se que somente em dois meses, isolados entre si, não houve registro de alguma espécie nova na amostragem total de vertebrados. O gráfico também não demonstra tendência em formar platô que caracterizasse uma suficiência amostral para a fauna da BR-262. Desta forma, o número de espécies ameaçadas pelo tráfego deve ser ainda maior. Os mamíferos representaram 67,2% dos registros, aves 19,4%, répteis 12,6% e anfíbios 0,8%. A espécie de mamífero mais comum foi o cachorro-do-mato (C. thous), seguida da capivara (Hydrochaeris hydrochaeris), tamanduás (Myrmecophaga trydactila e Tamandua tetradactila) e tatus (Dasypus novemcinctus e Euphractus sexcinctus). Destaque para outros mamiferos registrados como tatu-de-rabo-liso (Cabassous unicinctus), mão-pelada (Procyon cancrivorous), coati (Nasua nasua), lobo-guará (Chrysocyon brachyurus), lontra (Lontra longicaudis), jaguatirica (Felis pardalis), gato-do-mato (Felis spp.), onça pintada (P. onca), irara (Eira barbara), cachorro-vinagre (Speothos venaticus), veados (Mazama spp.) e cervo-do-pantanal (Blastocerus dichotomus). Várias destas são naturalmente raras e/ou ameaçadas de extinção (e.g. Bernardes et al. 1990). O gavião carcará ou carancho (Polyborus plancus) e o urubú-preto (C. atractus) foram as espécies mais comuns entre as aves atropeladas. A lista de aves inclui ainda algumas espécies raras de strigiformes e falconiformes (e.g. Rhinoptynx clamator, Bubo virginianus, Pulsatrix perspicillata), aves terrestres como a ema (R. americana) e a siriema (C. cristata), e aquáticas (Jabiru mycteria, Jacana jacana).

21

Tabela 2. Número de atropelamentos das espécies de vertebrados silvestres registrados na BR-262, região sul do pantanal mato-grossense. n1=abr/96-nov/97; n2=comunicações pessoais. CLASSE / Ordem ANFÍBIOS Anuros

RÉPTEIS Crocodilianos Ofídios

Lacertílios Testudines indeterminada AVES Caprimulgiformes Ciconiformes Columbiformes Coraciformes Cuculiformes Falconiformes

Gruiformes Passeriformes

Piciformes Psittaciformes Rheiformes Strigiformes

Tinamiformes indeterminada

n1 11 b 06 b 02 b 01 b 01 b 01 b

% 0,8

n2 -

177 76 01 32 01 01 01 02 06 01 06 02 01 03 01 02 01 01 07 03 01 22 01 04

12,6

Jacaré-do-pantanal Jibóia Sucuri Sucuri Cobra-cipó Papa-pinto Falsa-sucuri Surucucu-do-pantanal Cobra-cipó Papa-ovo Cobra-cipó Cobra-cipó Caninana Falsa-sucuri Boipeva Caiçaca Boca-de-sapo Cobra Calango Iguana, Camaleão Teiú Cágado réptil

33b 23 02b 02b 02b 04

272 01 01 01 01 10 04 02 01 01 65 01 87 01 13 01 01 02 04 01 04 01 24 02 02 04 01 01 01 01 01 01 01 01 29

19,4

Curiango Tuiuiu, Jaburu Rolinha Pomba-asa-branca Martim-pescador-grande Martim-pescador-pequeno Anú-preto Anú-branco Gavião-carijó Gavião-caboclo Gavião-velho Urubú-de-cabeça-vermelha Urubú-preto Quiri-quiri Carcará, Carancho gavião Siriema Jacutinga Cafézinho Gralha-picaça Gralha-cinza Andorinha-azul-e-branca Cardeal Cardeal-do-pantanal João-de-barro Pássaro-preto Suiriri-tropical Bem-te-vi passarinho Pica-pau-do-campo Tucanuçu Aratinga-estrela Prícipe-negro Ema Jucurutu Coruja-caburé Coruja-orelhuda Coruja-buraqueira Coruja-de-garganta-preta Codorna-amarela ave

61b 01b 01b 01b 04b 02b 02b 01b 01b 02b 01b 20b 01b 02b 01b 01b 01b 01b 01b 01 15

Espécie (Família)

Nome vulgar

Bufo paracnemis (Bufonidae) Hyla sp. (Hylidae) Leptodactylus sp. (Leptodactylidae) Pseudis paradoxa (Pseudidae) indeterminada

Sapo-cururu Perereca Falsa-rã Falsa-rã

Caiman crocodilus yacare (Alligatoridae) Boa constrictor (Boidae) Eunectes notaeus (Boidae) E. murinus (Boidae) Chironius quadricharinatus (Colubridae) Drimarchon corais (Colubridae) Helicops leopardinus (Colubridae) Hydrodynastes gigas (Colubridae) Liophis poecilogyrus (Colubridae) Mastigodrias bifossatus (Colubridae) Phillodryas olfersii (Colubridae) P. mattogrossensis (Colubridae) Spilotes pullatus (Colubridae) Thamnodynastes strigilis (Colubridae) Waglaerophis merremi (Colubridae) Bothrops moojeni (Viperidae) B. neuwiedi (Viperidae) indeterminada Ameiva ameiva (Teiidae) Iguanae iguanae`(Iguanidae) Tupinambis teguixim (Teiidae) Phrynops sp

Nyctidromus albicolis (Caprimulgidae) Jabiru mycteria (Ciconiidae) Columbina sp. (Columbidae) Columba picazuro (Columbidae) Ceryle torquata (Alcedinidae) Chloroceryle americana (Alcedinidae) Crotophaga ani (Cuculidae) Guira guira (Cuculidae) Buteo magnirostris (Accipitridae) Heterospizias meridionalis (Accipitridae) Busarellus nigricolis (Accipitridae) Cathartes aura (Cathartidae) Coragyps atratus (Cathartidae) Falco sparverius (Falconidae) Polyborus plancus (Falconidae) indeterminada Cariama cristata (Cariamidae) Penelope obscura (Cracidae) Jacana jacana (Jacanidae) Cyanocorax chrysops (Corvidae) C. cyanomelas (Corvidae) Notiochelidon cyanoleuca Paroaria sp. (Fringillidae) P. capitata (Fringillidae) Furnarius rufus (Furnariidae) Gnorimopsar chopi (Icteridae) Tyrannus melancholicus (Tyrannidae) Pitangus sulfuratus (Tyrannidae) indeterminada Colaptes campestris (Picidae) Ramphastos toco (Ramphastidae) Aratinga aurea (Psittacidae) Nandayus nenday (Psittacidae) Rhea americana (Rheidae) Bubo virginianus (Strigidae) Glaucidium brasilianum (Strigidae) Rhinoptynx clamator (Strigidae) Speotyto cunicularia (Strigidae) Pulsatrix perspicillata (Strigidae) Nothura sp. (Tinamidae)

22

Tabela 2. Continuação. CLASSE / Ordem MAMÍFEROS Artiodactyla

Carnívora

Edentata

Lagomorfa Marsupialia Perissodactyla Rodentia

Espécie (Família)

Nome vulgar

Blastocerus dichotomus (Cervidae) a Mazama americana (Cervidae) Mazama sp. (Cervidae) Tayassu sp. (Tayassuidae) Cerdocyon thous (Canidae) Chrysocyon brachyurus (Canidae) a Speothos venaticus (Canidae) Felis sp. (Felidae) F. concolor (Felidae) a F. pardalis (Felidae) a F. yagouaroundi (Felidae) Panthera onca (Felidae) a Eira barbara (Mustelidae) Galictis cuja (Mustelidae) Lontra longicaudis (Mustelidae) a Nasua nasua (Procyonidae) Procyon cancrivorous (Procyonidae) Cabassous unicinctus (Dasypodidae) Dasypus novencinctus (Dasypodidae) Euphractus sexcinctus (Dasypodidae) Myrmecophaga tridactyla (Myrmecophagidae)a Tamandua tetradactyla (Myrmecophagidae) Sylvilagus brasiliensis (Leporidae) Didelphis albiventris (Didelphidae) Tapirus terrestris (Tapiridae) a Dasyprocta azarae (Dasyproctidae) Hydrochaeris hydrochaeris (Hydrochaeridae) Cavia sperea (Caviidae)

Cervo-do-pantanal Veado-mateiro Veado Queixada, Caitetu Cachorro-do-mato, Lobinho, Guaracho Lobo-guará Cachorro-vinagre Gato-do-mato Onça-parda Jaguatirica Gato-morisco Onça-pintada Irara Furão Lontra Coati Mão-pelada, Guaxinim Tatu-de-rabo-liso Tatu-liso, Tatu-galinha Tatu-peba, Tatu-peludo Tamanduá-bandeira Tamanduá-de-colete, Tamanduá-mirim Coelho-tapiti Gambá, Mucura Anta Cotia Capivara, Carpincho Preá mamífero

indeterminada TOTAL a b

n1 942 02 03 01 02 270 07 01 03 06 03 01 01 01 04 14 41 02 52 112 91 83 05 09 02 153 03 70

% 67,2

n2 227b 01b 58 01b 01 01 02b 01 01b 02b 03b 16b 25b 27 25 01b 01b 20 42

1 402

100

466b

ameaçada de extinção (Bernardes et al. 1990) subestimativa

Figura 3. Número cumulativo de espécies atropeladas na BR-262 pelo tempo (abril/96 a novembro/97).

23

A maioria dos répteis atropelados foi representada pelo jacaré-do-pantanal (C. crocodilus yacare), pela sucuri (E. notaeus) e pelo lagarto teiú (Tupinambis spp.). Além disso, houve alguns registros de serpentes de grande porte (SVL>2m) como Hydrodynastes gigas, Eunectes murinus, Boa constrictor, além de outras pouco freqüentes como Bothrops spp., Lysthrophis mattogrossensis, Drimarchon corais (ver tabela 2 para listagem completa das espécies). O número de espécies ameaçadas pelo tráfego da BR-262 não apenas supera os poucos levantamentos anteriores relativos a este problema no Brasil (e.g. Novelli et al. 1988, Jácomo et al. 1996, Vieira 1996) como registra até hoje mais de 2/3 da fauna de mamíferos de médio e grande porte, incluindo ainda registros de espécies não recenseadas na região (e.g. Cabassous unicinctus; Alho et al. 1987b). Taxas de mortalidade Os dados dos últimos 12 meses de estudo (n=1260) forneceram a taxa mensal de 105 animais mortos por atropelamento, i.e. mais de três ocorrências por dia em 420km de rodovia, que eqüivalem a cerca de 03 animais mortos/km/ano. As taxas acima calculadas provavelmente foram subestimadas, dado que uma proporção desconhecida de animais sofrem colisões com veículos e morrem fora da estrada, não sendo registrados (e.g. Drews 1995, Vieira 1996). Em particular, estes resíduos negativos afetam a contagem de aves, serpentes e possivelmente, grandes vertebrados que não chegam a ser mortos instantaneamente e acabam morrendo mais tarde devido às injúrias obtidas na estrada (e.g. capivaras, antas, jacarés, sucuris; obs. pess.). A evolução anual da taxa de mortalidade entre 1989 e 1997 foi representada na figura 4. Obviamente, a taxa de atropelamentos tem relação direta com o volume de tráfego. O gráfico sugere diferenças significantes na incidência de atropelamentos da fauna, bem como no tráfego de veículos entre 1989 e 1997. Em 1989/1990, foram registrados 202 indivíduos atropelados, numa média de 16,8 mortes/mês. Entre 1991 e 1992, este número aumentou para 365 atropelamentos/ano, pouco mais de 30 mortes/mês. Não houve monitoramentos na BR-262 entre 1993 e 1995. Entre maio de 1996 e maio de 1997, os números praticamente triplicaram, sendo registrado um total de 1.260 animais mortos pelo tráfego. Como já foi dito, média mensal foi de 105 mortes/mês, equivalente a 03 atropelamentos/km. O VDM da BR-262 também vem sofrendo incremento nos últimos anos, principalmente após 1992, sendo coerente com as taxas de mortalidade observadas. As taxas de mortalidade também variaram ao longo do ano. Como a região encontra nos pulsos de inundação da planície pantaneira um importante fator condicionante da biologia de animais e plantas (e.g. Alho et al. 1987a, Mourão et al. 1994), usei as medidas do nível fluviométrico do rio Miranda para estimar os períodos de inundação-cheia-vazante-seca durante os meses estudados (figura 5). Considerei três intervalos para definir os períodos de inundação da região, (i) > 2,5m - cheia - jan-mai/96 e fev-jun/97; (ii) 2,5-1,5m vazante/enchente - jun-jul/96 e jan-fev/96; jul-ago/97; (iii) < 1,5m - seca - jul/96-jan/97 e set-dez/97. 24

2500

Mt (Nmortos/ano)

2000

VDM (v/d/ano) 1500

1000

500

0 89-90

91-92

93-94

94-95

96-97

Figura 4. Evolução anual das taxas de mortalidade de vertebrados silvestres (Mt) e do volume diário médio (VDM) na BR-262 entre 1989 e 1997.

3.5 VDM (x 1.000 veículos/dia/trim) MIR (x 1.000 m/dia/mes)

3

Me (Nmortos/km/mês)

2.5

2

1.5

1

0.5

0 abr

mai

jun

jul

ago

set

out

nov

dez

jan

fev

mar

abr

mai

jun

jul

ago

set

out

nov

1996-97

Figura 5. Variação temporal do volume diário médio de veículos (VDM trimestral) e das taxas mensais de mortalidade de vertebrados (Me) na BR-262, e do nível do rio Miranda (MIR) no Pantanal entre abril/96 e novembro/97. 25

Além do nível fluviométrico, também foram plotadas a curva das taxas de atropelamentos mensais e da média do volume diário médio (VDM) trimestral, fornecido pelo DERSUL. (figura 5), para permitir a comparação com a variação da cheia no pantanal do Miranda. As estimativas de tráfego do DEP/DERSUL foram feitas em intervalos trimestrais, mas lamentavelmente o órgão não realizou estimativas completas nos últimos dois anos (1996/1997), comprometendo a análise com valores atuais acurados. Apesar disso, trabalhei com projeções confiáveis do VDM de alguns trechos e informações sobre crescimento do (eco)turismo na região nos últimos anos que confirmasse/aferisse os valores obtidos (R. Lourival, com. pess.). Padrões de ocorrência de atropelamentos Apesar da importância da estrada como refúgio seco e rota de deslocamento para algumas espécies (e.g. capivara, cachorro-do-mato, tatu; Fischer 1996), os maiores picos nas taxas de mortalidade corresponderam aos meses de seca, principalmente jul/96, set-out/96 e out/97. Não por acaso, estes meses sempre tiveram altos volumes de tráfego, uma vez que estão relacionados aos períodos de férias (julho) e de final de temporada de pesca, quando o pantanal recebe milhares de turistas praticantes desta atividade, que se encerra com o início da piracema em novembro. Além disso, este período representa também a alta temporada de praticantes do (eco)turismo provenientes de várias partes do Brasil e do exterior. Isto ocorre não apenas porque a época coincide com as férias de verão dos países de primeiro-mundo, mas também pelo fato do pantanal ser reconhecido internacionalmente pela exuberância da sua fauna e flora nestes meses mais secos (jul-dez). Além de atrair o homem e seus veículos de transporte, os corredores de caixas de empréstimo (ou corredores de baías marginais - CBMs) funcionam como fontes de recursos alimentares. Aliás, toda a estrada torna-se uma fonte de alimento neste período. Desde a região de Terenos até Miranda e na região do maciço do Urucum (Corumbá), a vegetação remanescente na margem da estrada (corredores de floresta marginal CFMs e fragmentos de mata) abriga invariavelmente a espécie de palmeira conhecida como bocaiúva (Acrocomia aculeata), típica de formações secundárias (Lorenzi 1992, Pott & Pott 1994), podendo ser considerado como um bocaiuval praticamente contínuo. A bocaiúva ocorre principalmente nas regiões mais emersas do ambiente, inclusive nos barrancos do aterro da estrada. A floração/frutificação é bastante variável podendo ocorrer durante quase o ano todo, dependendo do tipo de ambiente, sendo o fruto consumido por canídeos e procionídeos (inclusive C. thous), animais constantemente abatidos pelo volume de tráfego na BR-262. Praticamente, todas as amostras de fezes e de conteúdo estomacal de indivíduos destas duas famílias, obtidas na BR-262 exibiram frutos de bocaiúva na sua composição (obs. pess.), que poderiam inclusive contribuir na dispersão da palmeira pelos CFMs. A dispersão de frutos da espécie é descrita como sendo feita por mamíferos ungulados e roedores (artiodactilocoria, Paula et al. 1995), porém esta gama de dispersores pode ser ainda maior (obs. pess.). Por ser um período de alta produtividade na região, o pantanal propicia um "boom” demográfico de 26

várias espécies de vertebrados. Nesta época, a maioria das espécies encontra-se em fase reprodutiva, provocando incrementos na movimentação da fauna, relativos à busca de parceiros sexuais, à obtenção de alimento para a prole, ao forrageamento de espécies gregárias e à dispersão dos jovens (e.g Campos & Magnusson 1995, Alho et al. 1987a, b, 1989). Portanto, esta dinâmica da comunidade de vertebrados, incluindo o homem como realizador de um turismo predatório, promove a intensificação nos "encontros" entre animais silvestres e veículos e de seus efeitos desastrosos. Por ser um tipo de "predador" que mata e injuria as mais variadas espécies de "presas" (e.g. Panthera onca), mas não as consome, a cadeia trófica na estrada fica abreviada. A oferta de proteína animal na pista atrai não somente os necrófagos, mas também favorece a evolução de comportamentos predatórios passivos, um tipo de "senta-e-espera" (seat-and-wait) bastante oportunista e eficiente, podendo ter um valor adaptativo local alto (e.g. Drews 1995). Independente dos aspectos evolutivos deste comportamento, a ocorrência crônica de atropelamentos promove a atração de mais este componente da fauna, que por sua vez aumentam os riscos de mais acidentes, formando ciclos progressivos e viciosos, já descritos em alguns trabalhos e corroborados por este (e.g. Wotzkow & Wiley 1988, Drews 1995). No geral, a incidência de atropelamentos em 20 meses foi superior a 02 ocorrências por km em todas as regiões consideradas (figura 6). Os trechos com maior freqüência de mortes devido ao tráfego foram Maracajú e Pantanal com mais de 04 mortes/km. Por sua vez, o trecho com menor freqüência de mortalidade faunística por veículos foi em Chapéu, com 02 a 03 animais mortos/km. A figura 6 também exibe a estimativa do tráfego por região, e parece não haver correspondência lógica entre as duas curvas. Todavia, o gráfico parece evidenciar que as diferenças nas taxas de atropelamentos podem estar condicionadas a fatores ambientais como àqueles relacionados à densidade, composição e deslocamento da fauna silvestre, discutidos acima. Além disso, os resultados sugerem que a sensibilidade da fauna às flutuações de tráfego são distintas. Regiões como Maracajú e Chapéu apresentam VDM similares, porém os índices de atropelamento são bastante díspares. A região de Maracajú inclui alguns afluentes da bacia do Aquidauana (Cachoeirão e Dois Irmãos), corredores de mata ripária, poucos fragmentos de mata e CFMs contínuos e estreitos, restritos por campos de pastagem cultivados. O Chapéu é uma região de serra, com vegetação preservada e menos fragmentada, não exibindo nenhuma drenagem natural volumosa até a proximidade do rio Taquaruçu, próximo à cidade de Aquidauana. A despeito da queda do VDM a partir de Chapéu, a taxa de mortalidade aumenta, sugerindo que a transição Bodoquena-Miranda seja um local de intensa travessia de fauna, uma vez que une as escarpas da serra com a planície inundável. Em Pantanal, as evidências dispensam maiores comentários, já que a BR-262 simplesmente corta o pantanal em duas partes (Nabileque e Miranda), e apresenta os efeitos atrativos já comentados anteriormente (e.g. CBMs).

27

VDM (x1.000 v/d) 4.5 vertebrados (Nmortos/km/ano)

4

3.5

3

2.5

2

1.5

1

planalto

chapéu

miranda

urucum

regiões da estrada

Figura 6. Variação regional do volume diário médio de veículos (VDM) e da taxa anual de mortalidade de vertebrados na BR-262 (Campo Grande-Corumbá, MS).

1.80

C.thous dasipodídeos (spp.)

1.60

mirmecofagídeos (spp.) 1.40

H.hydrochaeris

1.20

1.00

0.80

0.60

0.40

0.20

0.00 planalto

chapéu

miranda

urucum

regiões da estrada

Figura 7. Variação regional da taxa anual de mortalidade (Nmortos/km/ano) das espécies de mamíferos mais freqüentes na BR-262 (Campo Grande-Corumbá, MS): Cachorro-do-mato (C. thous); Dasipodídeos (E. sexcinctus, D. novemcinctus e C. unicinctus); Mirmecofagídeos (M. tridactyla e T. tetradactyla); e Capivara (H. hydrochaeris).

28

Figura 8. Variação regional da taxa anual de mortalidade (Nmortos/km/ano) das espécies de répteis mais freqüentes na BR-262 (Campo Grande-Corumbá, MS): Jacaré (C. crocodilus yacare); Sucuri (E. notaeus); e Teiú (Tupinambis spp.).

Figura 9. Variação regional da taxa anual de mortalidade (Nmortos/km/ano) das espécies de aves mais freqüentes na BR-262 (Campo Grande-Corumbá, MS): Urubu (C. atractus) e Carancho (P. plancus).

29

Espécies comuns Basicamente, todas as regiões tiveram taxas de mortalidade elevadas quando comparadas a outros estudos (e.g. Vieira 1996) e ao próprio histórico da BR-262. Desta forma, selecionei as espécies mais comuns nas ocorrências de morte a fim de verificar o padrão de ocorrência destas em relação à paisagem. As figuras 7, 8 e 9 trazem as taxas de ocorrência de morte dos mamíferos, répteis e aves mais comuns em cada região. Na figura 7, podemos observar que os cachorros-do-mato, tatus e tamanduás têm um padrão de ocorrência semelhante, i.e. tendem a apresentar baixas ocorrências em áreas sujeitas aos efeitos mais diretos da inundação da planície (Pantanal). Nestes locais, a vegetação arbórea próxima a estrada é praticamente inexistente, fator que pode ser inibidor de deslocamento de algumas espécies (e.g. tamanduás), além de não apresentar árvores de bocaiúva, item comum na dieta de outras como C.thous (obs. pess.). Em compensação, em Pantanal as altas taxas de mortalidade passam a ser representadas pelas capivaras, espécie gregária, com mais de um ciclo reprodutivo anual, acostumada à presença humana e mesmo ao tráfego de veículos, principalmente por utilizar freqüentemente a estrada como abrigo seco, nos períodos de cheia (ver Fischer 1996, Alho et al. 1989). Apesar de a espécie ocorrer em toda região entre Campo Grande e Corumbá, as áreas de risco para esta espécie estão na planície pantaneira. Na figura 8 apresento as ocorrências dos répteis mais comuns, i.e. jacarés, sucuris e teiús. Jacarés e sucuris dependem dos corpos d'água, o que praticamente explica as freqüentes ocorrências nas regiões sujeitas à inundação, principalmente nos CBMs e áreas em proximidade. Nos períodos reprodutivos destas duas espécies, a estrada torna-se uma armadilha fatal para os animais em acasalamento, nidificação e dispersão (ver Campos & Magnusson 1995). Quanto aos teiús, sua ocorrência nos registros de atropelamento está relacionada aos ambientes mais secos, áreas mais alteradas e bordas de mata. Portanto, as áreas elevadas da BR-262 parece ser um ambiente atrativo para a(s) espécie(s). Finalmente, a figura 9 exibe a taxa de mortalidade de urubus e caranchos, basicamente necrófagos e/ou predadores passivos em estradas (e.g. Wotzkow & Wiley 1988, Drews 1995). O tráfego de veículos praticamente fornece itens alimentares para estas espécies, que passam a disputar os espaços da estrada enquanto aguardam a morte da próxima presa. Como se pode notar, as duas espécies têm ocorrências de mortalidade nas regiões onde há maior número de registros de atropelamento, i.e. naquelas que apresentam mais áreas de risco (Bodoquena-Urucum). Evidências seguras (obs. pess.) e casos semelhantes ocorridos em outras regiões tropicais (e.g. Drews 1995) sugerem que C. thous também se comporta como predador passivo, sendo comum sua ocorrência (seja atropelado, seja em atividade; obs. pess.) junto a carcaças recentes de animais atropelados. Como esperado, isto foi observado também com freqüência para urubus e caranchos, o que faz destas espécies boas indicadoras de áreas de risco, i.e. locais com altas taxas de mortalidade faunística em rodovias (e.g. Wotzkow & Wiley 1988, Drews 1995). Considerando cachorros-do-mato e caranchos como potenciais competidores, este talvez seja outro fator relacionado a pouca sobreposição de suas áreas de vida, 30

i.e. áreas de morte na estrada, podendo indicar que tais espécies partilham os recursos oferecidos pelos atropelamentos, se equivalendo nas funções ecológicas que desempenham na cadeia trófica estabelecida . Espécies raras e equivalentes ecológicos Foram consideradas as espécies reconhecidamente raras por natureza e/ou ameaçadas de extinção (predadoras de topo de cadeia trófica, animais sensíveis a perda/alteração de habitats, animais de grande porte, especialistas, etc.) como indicadoras de locais de alta importância para a conservação e prioritárias para a elaboração de planos de manejo. A figura 2 mostra um mapeamento esquemático da estrada por região, a quilometragem correspondente ao seu predomínio na paisagem da BR-262, locais importantes da drenagem e municípios/localidades principais no trajeto entre Campo Grande (Km 0) e Corumbá (Km 420). Neste esquema, demarquei os segmentos onde espécies indicadoras (répteis, aves e/ou mamíferos) apresentaram registro de mortalidade. Os intervalos considerados em cada região formam o que chamei de áreas de risco, e que deverão ser priorizadas na adoção de medidas mitigadoras aos impactos da BR-262. O monitoramento da rodovia BR-262 mostrou que a região como um todo (Campo Grande-Corumbá) detêm um considerável status de conservação, a despeito da presença da estrada e de seus impactos mais crônicos. Os registros de mortalidade mostraram uma variedade de espécies com padrões de ocorrência bastante definidos ao longo do gradiente ambiental pelo qual passa o transecto representado pela rodovia. Considerando algumas famílias e/ou espécies representativas dos vários níveis tróficos na comunidade de vertebrados, podemos observar dados interessantes. Pelo percurso da estrada desde regiões altas (Maracajú) até a planície inundável (Pantanal), podemos detectar registros da ocorrência de espécies que são ecologicamente equivalentes porém, com um relativo incremento da biomassa individual. No caso de mamíferos, escolhi os cervídeos e roedores como representantes de consumidores primários, e os felídeos como predadores de topo das cadeias tróficas, uma vez que são os mais carnívoros dos Carnivora (e.g Quigley & Crawshaw 1992, Crawshaw, 1995). Nas regiões do planalto (Maracajú-Chapéu), as espécies encontradas foram Mazama sp. e Cavia sp., dentre os consumidores; e felídeos de pequeno porte (Felis spp.) como predadores. Registros notáveis ficaram com a frequência relativamente alta do lobo-guará (C. brachyurus). Em um único ano, num trecho de pouco mais de 10 km, foram mortos nada menos que seis indivíduos da espécie, considerada em extinção. Ao descermos para as regiões de Bodoquena-Miranda, constatamos que a biomassa da fauna ameaçada pelo tráfego começa a aumentar. Aparecem alguns registros de capivaras (H. hydrochaeris), e também felídeos de maior porte como jaguatiricas (F. pardalis) e onças pardas (F. concolor) (E. Amil, com. pess.). Esta região também registrou ocorrências interessantes sobre animais pouco conhecidos e estudados, raros por natureza. Os casos mais notáveis foram do tatu-de-rabo-liso (Cabassous unicinctus), espécie de maior biomassa dentre as três espécies de tatus registradas, do cachorro-vinagre (S. venaticus) e da irara (E. barbara) que apesar de pouco freqüentes, sofrem os efeitos do tráfego. 31

Finalmente, em Pantanal, o porte dos animais atingidos pelo tráfego de veículos foram os maiores registrados, e.g. cervo-do-pantanal (B. dichotomus), capivaras (com taxas surpreendentes de mortalidade), além de uma onça pintada (P. onca), um registro bastante preocupante, uma vez que os animais desta espécie são muito espertos e arredios à presença humana, o que não impede que ocorram com certa regularidade nos registros de atropelamento, juntamente com outros felídeos (V. Pott, com. pess.). Conclusões e Recomendações Após estes primeiros 20 meses de monitoramento da estrada, os resultados se mostraram bons indicadores tanto da riqueza da comunidade de vertebrados que orbitam na BR-262, bem como do efeito letal que uma rodovia não manejada pode exercer sobre a fauna local. O mapeamento das “áreas de risco” indica os trechos onde as atividades visando o manejo da fauna e da paisagem deveriam ser mais eficientemente trabalhados. Medidas de fiscalização e monitoramento podem ser facilmente concretizadas buscando formas seguras de uso da rodovia tanto para a vida selvagem quanto humana. Existem trechos da BR-262 que devido à sua qualidade paisagística poderiam ter um status mais elevado que o de simples rodovia, tornando-se uma estrada cênica de alta qualidade. A rodovia poderia compor junto com a Estrada Parque (MS-184 e MS-228) uma rota de visitas "autoguiadas" pelo Pantanal Sul, contendo acomodações, serviços de apoio ao trânsito e atendimento ao visitante. Todos estes melhoramentos todavia, dependem da melhoria da “imagem” da mesma junto à sociedade, assim como de um planejamento adequado para sua operação. Apesar do volume de atropelamentos ser qualitativamente expressivo, seu efeito negativo mais grave está ligado a indústria do turismo, pois a BR-262, juntamente com a “Estrada Parque”, formam um produto de elevado potencial turístico, se for bem manejado. Vários exemplos de rotas cênicas estão disponíveis ao redor do mundo (e.g. “Gran Canyon’s Big Circle”, Everglades, Delta do Okavango, Victoria Falls, Estrada da Graciosa, etc.), e apesar das controvérsias, estas rotas são um excelente meio de chamar a atenção da sociedade para a conservação destes ecossistemas. No exterior, alguns autores têm se dedicado a avaliar os impactos rodoviários sobre a vida selvagem (e.g. Barrientos 1993, Drews 1995, Reijnen et al. 1995). Nestes estudos, várias formas de manejo vêm sendo propostas, e posteriormente implantadas e monitoradas, revelando aquelas mais eficientes para minimizar a mortalidade de animais nas estradas, inclusive com a redução do risco de acidentes para o próprio usuário (Anderson 1993, Reeve & Anderson 1993, Foster & Humphrey 1995, Woëlfel 1995, Rodriguez et al. 1996). O Brasil praticamente não apresenta medida efetiva alguma neste sentido, a despeito de sua extensa malha viária (e.g. Vieira 1996). Análises do custo/benefício e avaliações locais de longo prazo das ações mitigadoras são fundamentais para determinar aquelas realmente efetivas e adequadas às áreas de risco (Reed et al. 1982). 32

Nos EUA e Europa, as técnicas mais eficientes neste sentido incluem a criação de cercas e telas de proteção nas laterais da estrada, associada à construção e/ou manutenção de corredores naturais e passagens transversais (túneis e/ou pontes), adaptadas à travessia da fauna silvestre (Anderson 1993, Romin & Bissonette 1996). Obviamente, algumas recomendações têm caráter regional ou local, havendo a necessidade de estudos prévios do ambiente para a adequação das medidas a serem adotadas (e.g. Woëlfel 1995). É importante também a observação das respostas da fauna a estas alterações em suas rotas originais de deslocamento, seja pela degradação antrópica, seja na execução de algum plano de manejo silvestre (Feldhamer et al. 1986, Thurber et al. 1994, Foster & Humphrey 1995, Wöelfel & Krueger 1995). Dentre as alternativas conhecidas, as mais econômicas e ecologicamente corretas deveriam considerar a preservação e proteção de corredores naturais tais como matas ciliares transversais às estradas (e.g. Redford & Fonseca 1986, Naiman et al. 1993). Porém, uma vez que a rodovia e os efeitos de sua instalação e da ocupação humana resultante já existem sem prévio planejamento, as alternativas de manejo se restringem. Nestes casos, uma readaptação nos pontos de travessia “consagrados” pela fauna local poderiam manter o fluxo de deslocamento e diminuir os riscos de acidentes (e.g. viadutos de estradas secundárias, pontes, dutos de drenagem, etc.). Rodriguez et al. (1996) sugerem que pequenas modificações podem transformar algumas destas estruturas em passagens eficientes para determinadas espécies. A revegetação destes locais de travessia da fauna e a colocação de cercas guiando os animais para estas passagens poderiam diminuir a freqüência de atropelamentos. A utilização de cercas de contenção para a fauna implica na criação de várias passagens e túneis transversais, para evitar que predadores fiquem condicionados aos sítios de passagem “marcados”. A construção de passagens “one-way” nos locais cercados criaria a possibilidade de retorno, para indivíduos que eventualmente tenham ultrapassado as cercas, adentrando à rodovia. Conforme foi detectado, raros são os locais da BR-262 que permitem o deslocamento transversal da fauna (e.g. pontes sobre a drenagem com matas ciliares preservadas), sendo que na maioria das vezes, a fauna é obrigada a utilizar as margens e a pista para o seu deslocamento. A própria distribuição dos ambientes que compõem a paisagem da estrada muitas vezes contribui para “atrair” os animais. Estes fatores elevam os riscos de acidentes e de mortalidade, tanto para a fauna quanto para os viajantes, além de contribuir para acelerar processos de extinção locais de espécies raras e/ou ameaçadas. Existem previsões nada otimistas do incremento de até 35% no VDM da BR-262, durante a construção/instalação do Gasoduto Brasil-Bolívia, iniciada há alguns meses. Além disso, outras obras previstas como a ponte sobre o Rio Paraguai (Morrinho) e a possível revitalização da Hidrovia, certamente potencializarão ainda mais os efeitos do tráfego de veículos. Estes fatos, aliados à intensificação da fragmentação de habitats, passam a contribuir para que a fauna silvestre apresente deslocamentos mais freqüentes e atípicos (e.g. Fischer & Gascon 1995). 33

Considerando as tendências mundiais do crescimento da atividade turística e ecoturística em particular (10 e 30% respectivamente), a rodovia BR-262, privilegiada por natureza e vocação, poderia se tornar um exemplo de compatibilização entre desenvolvimento e conservação, um marco de coexistência entre homens e a vida silvestre, engajando vários segmentos da sociedade no ideal de desenvolvimento sustentável para a região.

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