Em busca de uma Teoria da Consciência

May 22, 2017 | Autor: Renzo Comolatti | Categoria: Neuroscience, Philosophy of Mind, Phenomenology, Neuroscience of Consciousness
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Em busca de uma Teoria da Consciência Neurociência e Fenomenologia

Renzo Comolatti aluno do curso de Ciências Moleculares (USP)

RESUMO I. II. III. IV.

Um experimento mental e uma definição provisória Correlatos Neurais da Consciência (NCC) Abordagem fenomenológica: uma definição de consciência Teoria da Informação Integrada (IIT) Empírico

Experiência

Teórico

I. Um experimento mental e uma definição provisória

A lacuna explanatória Moinho de Leibniz (similar a Sala Chinesa de Searle, 1980) “Imaginando-se que há uma máquina cuja estrutura a faça pensar, sentir e perceber, poder-se-á, guardadas as mesmas proporções, concebê-la ampliada de sorte que se possa nela entrar como em um moinho. Admitido isso, lá não encontraremos, se a visitarmos por dentro, senão peças impulsionando-se umas às outras, e nada que explique uma percepção.” (Leibniz 1714)

Uma teoria rudimentar da consciência “Dor é a ativação das fibras nervos de tipo C” (Levine 1983) ou mais recentemente: “Consciência correlaciona com corresponde a sincronização de oscilações gamma no cérebro” (Melloni 2007)

Os vários problemas da consciência ●

O que é consciência? (Definição)



Quais padrões neurais produzem a consciência? (Correlatos Neurais da Consciência)



Por quê alguns padrões neurais produzem a consciência? (Problema Difícil)



Como os padrões neurais produzem a consciência? (Teoria da Consciência)



Para que serve a consciência? (Função cognitiva e causa evolutiva)

O que é consciência? Definição negativa ● Aquilo que vai embora quando caímos em sono profundo, e retorna quando acordamos. Condições em que estamos inconsciente ● Sono profundo ● Anestesia ● Ataque epiléptico ● Coma Condições em que estamos consciente ● Acordado ● Sonho ● Alucinação (Ketamina, LSD) ●

Experimentalmente, não seria possível contrastar ambas as condições?

O que é consciência? Definição negativa positiva ●

Aquilo que vai embora quando caímos em sono profundo, e retorna quando acordamos.



Mas o que vai embora?

Do meu ponto de vista, tudo. ●

Consciência = Experiência



Qual experiência? Experiência do que?



Consciência é sempre consciência de algo (Intencionalidade/ Aboutness) ○



ex: ver um triângulo vermelho à esquerda, lembrar que nadei ontem, sentir-se alegre

Esse algo pode ser contrastado e mapeado a uma atividade/região neural?

Abordagens de investigação Correlatos Neurais da Consciência (Koch)

Empírico Workspace Theory (Dehaene)

Neurofenomenologia (Varela)

Teoria da Informação Integrada (Tononi)

Experiência

Teórico

Fenomenologia (Husserl)

II. Correlatos Neurais da Consciência (NCC)

Neurociência 101

(Kandel 2000)

Neurociência 101 Princípios da organização funcional do córtex ●

“Luria propôs que os córtices sensoriais e motores são compostos de múltiplas subáreas especializadas que são conectadas de maneira hierárquica. A área sensorial primária fica ao lado da área sensorial secundária que por sua vez faz fronteira com a área terciária. Essas áreas têm funções progressivamente mais complexas, culminando na integração de múltiplas modalidades sensoriais nas zonas terciárias. Áreas do lobo frontal relativas ao comportamento motor são organizadas de maneira semelhante.” (Kandel 2012 p.392)

Correlatos Neurais da Consciência (NCC) ●

Proposto em 1990 por Christof Koch e Francis Crick no artigo “Towards a neurobiological theory of consciousness”



Programa de pesquisa para investigar a consciência



Estratégia: Relacionar correlatos comportamentais da consciência com os mecanismos neurais subjacentes



Consciência



Correlatos comportamentais da consciência ○ ○

↔ Comportamento



Substrato neural

Nível de consciência: Vigília, ações voluntárias, COMA Recovery Scale, atenção não-transiente Percepto consciente: Relato verbal ou aperto de botão



NCC: mecanismos neurais minimamente suficientes para a consciência



NCC-conteúdo-específico: estímulo



NCC-completo: estado

NCC conteúdo-específico ●

NCC-específico: Mecanismos neurais responsáveis por um conteúdo específico da experiência. ○

Conteúdo é conscientemente percebido ⇔ NCC ativo



NCC é estimulado artificialmente ⇒ conteúdo deve ser percebido



Experimento: Estímulo percebido é contrastado com não percebido



Resultados: ampla rede fronto-parietal é ativada

C. Koch et al. Neural correlates of consciousness: progress and problems (2016) Nature Reviews

Desafios para o NCC-específico ● ●

Outras funções cognitivas covariam sistematicamente com a ativação do NCC Super-estimação do NCC ● pré-NCC ○ atenção ○ expectativas ○ arousal ● pós-NCC ○ memorial operacional ○ monitoramento ○ planejamento da tarefa ○ relato

J. Aru, T. Bachmann, W. Singer and L. Melloni. Distilling the neural correlates of consciouness (2011) Tsuchiya et al. No-Report Paradigms: Extracting the True Neural Correlates of Consciousness (2015)

Paradigma No-report

Percepção bi-estável: Cubo de Necker

Dieter (2011)



Resultados: áreas posteriores, mas não pré-frontais Frässle (2014) Journal of Neuroscience

NCC completo ●

NCC-completo: Substrato neural minimamente suficiente para gerar a consciência em sua totalidade



União de todos os conjuntos de NCC conteúdo-específico para qualquer experiência possível.



Contraste entre estados (e não tarefas) ○

sujeitos acordados x anestesia, sono profundo, desordens da consciência

C. Koch et al. Neural correlates of consciousness: progress and problems (2016) Nature Reviews

NCC completo ●

Covariantes: vigília, ativação do tronco encefálico (neuromodulação)



Soluções: ○

Paradigmas intra-estados: flutuações da consciência durante o sono (sonho x sono profundo)



Resultados: região temporo-parietal-occipital (experiências perceptivas) e região frontal (experiências de pensamentos) (Siclari 2014)



NCC ≠ Condições de fundo para a consciência ●

Condições que possibilitam a atividade consciente, porém sem contribuir diretamente com aspectos da experiência



Excitabilidade cortical



Tronco encefálico ○

sistema reticular ativador (RAS) e sistemas neuromodulatórios

Resultados do NCC ●

Primeiro NCC: Glândula pineal (Descartes 1664)



Rede fronto-parietal → hot zone posterior: região parieto-temporal-occipital



Outras regiões e marcadores ○

Cerebelo ■

quatro vezes mais neurônios que o córtex, densamente conectado com o resto do cérebro, recebe inputs sensoriais, e modula controle



Córtex frontal ■

controle executivo; execução, planejamento e monitoramento de tarefas; alocação de atenção





lobotomia

Assinaturas neurais: EEG ativado, oscilações gamma e potencial P3b

Limites do NCC ●

Não é uma abordagem teórica, mas uma estratégia empírica de pesquisa ○



Não explica, nem é capaz de fazer previsões e extrapolações

Por que essas regiões e não outras? Não explica por que ou como a consciência surge com a ativação do NCC



Não se preocupar em determinar o que exatamente é a consciência



NCC opera dentro de pressuposições vagas do que a consciência deve ser



Correlato neural ○

Múltipla realizabilidade: independente do meio material (neurônios, silício, etc.)



Substrato biológico/neural → Substrato físico

Limites do NCC Condições em que a presença da consciência não é clara ●

Distúrbios da consciência (estado vegetativo, síndrome do encarceramento)



Animais: ○

Cambridge Declaration of Consciousness (2012)

“We declare the following: ‘The absence of a neocortex does not appear to preclude an organism from experiencing affective states. Convergent evidence indicates that non-human animals have the neuroanatomical, neurochemical, and neurophysiological substrates of conscious states along with the capacity to exhibit intentional behaviors. Consequently, the weight of evidence indicates that humans are not unique in possessing the neurological substrates that generate consciousness. Nonhuman animals, including all mammals and birds, and many other creatures, including octopuses, also possess these neurological substrates.’”

○ ●

Bebês ○



Em que ponto da evolução surge a consciência?

Em que ponto do desenvolvimento surge a consciência?

Computadores, robôs, alienígenas, etc

III. Abordagem fenomenológica: uma definição de consciência

Fenomenologia ●

Husserl (1859 – 1938)



Certeza indubitável no ego: “penso logo existo” → “qualio logo existo”





Conhecimento do meu eu é direto, e anterior a existência do mundo



Ciência é uma produção feita por sujeitos conscientes, covalidada intersubjetivamente

Primado da experiência: retorno às coisas como elas aparecem para mim, independentemente de sua existência dela e de teorias pré-estabelecidas ○

Evita-se começar a discussão por uma tomada de posição entre dualismo (corpo e mente) e monismo (só existe a matéria)



Investigação das estruturas invariantes da consciência realizada em primeira pessoa

O que faz parte da experiência? ●

Percepção, emoções, dor, consciência corporal



Temporalidade



Rememoração, imaginação

Casos difíceis ●

Atenção, função executiva (planejamento, manipulação, memória operacional)



Ações motoras



Pensamento? Consciência de si? ○ ○ ○

Sonhos puramente conceituais Visão “liberal”: conceitos fazem parte da experiência consciente e não podem ser reduzidos a sua forma verbal ou imagética; constituem um "qualia cognitivo" Visão “conservadora”: não nos tornamos conscientes do conceito per se, somente de suas manifestações sensoriais, motoras ou afetivas, e só somos afetados conscientemente por seus efeitos e não por suas causas de alto nível

O que é consciência?

A totalidade do que, a cada momento, aparece para mim.

Todo unitário e estruturado

Temporalidade

Independente da existência das coisas

Perspectiva em primeira pessoa

IV. Teoria da Informação Integrada (IIT)

“Axiomas” da Experiência ●

Existência intrínseca: Consciência existe, e ela é dada a partir de um ponto de vista



Composição: Experiência é estruturada, e é constituído por uma multiplicidade de aspectos



Informação: Experiência é de uma maneira específica, e distingui-se de uma maneira particular das outros experiência possíveis; nesse sentido, ela é informativa



Integração: Cada experiência é unitária e não pode ser reduzida a componentes independentes



Exclusão: Experiência é definida e exclusiva; não é constituída por nem mais, nem menos do que o que as distinções fenomenais presentes. Ela possui uma fronteira (o que faz parte e o que não faz parte), uma resolução temporal, e uma resolução espacial.

Experimento mental Fotodiodo ●

Fotodiodo: Discriminação entre dois estados



Humano: discriminação entre uma infinidade de estados



Discriminação entre estados gera informação, pois distinguir um estado implica em excluir as outras alternativas possíveis.

Câmera ●

Uma camêra fotográfica distingue entre 2n estados. Qual a diferença?



Integração da informação: cada sensor realiza discriminações locais sem interagir com os demais fotodiodos. O sistema pode ser reduzido a uma coleção de sensores independentes. O todo é maior do que as partes.



Fenomenologia: toda experiência é uma unidade vivida de um ponto de vista particular intrínseco

Teoria da Informação Integrada ●

Formulado por Giulio Tononi (e “apoiada” por Christof Koch) ○

Correlato neural da consciência (NCC) → substrato físico da consciência (PSC)



Consciência é um modo particular do cérebro de processar informação: integrando-a.



Como a consciência independe do observador, a informação deve ser intrínseca ao sistema ○

diferente da noção de informação de Shannon



“Difference that makes a difference” (G. Bates)



Um sistema físico é consciente toda vez que gera informação integrada



Φ é a quantidade de informação integrada e mede o quanto de consciência, a partir das relações de informação que definem a qualidade da experiência

Teoria da Informação Integrada

Integração sem informação

Informação integrada

Informação sem integração

G. Tononi. An information integration theory of consciousness (2004) Arch. Biologie

Teoria da Informação Integrada ●

Identidade central: A experiência é idêntica a estrutura conceitual definida pelas relações de interação causal entre os elementos do substrato físico, que é maximamente integrado

http://integratedinformationtheory.org/calculate.html

Poder Explicativo ●

Cerebelo: topologia paralelizada feedforward ○

Φ é maximizado em arquiteturas com especialização funcional e integração



Sono: biestabilidade elimina diferenciabilidade dos estados e quebra integração cortical



Epilepsia: Atividade sincronizada apesar de integrada não gera informação



Vantagem evolutiva da consciência é a vantagem de integrar informação (Simulações)

Oizumi M. From the Phenomenology to the Mechanisms of Consciousness: Integrated Information Theory 3.0 (2014) PLOS Comp. Bio.

Ingredientes de uma Teoria da Consciência ●

Restrições mútuas entre fenomenologia e neurociência (Varela 1996)



Parte dos axiomas da experiência e uma tradução em postulados físicos



Deve fornecer as condições necessárias e suficientes para a consciência...



...e especificar o quanto (nível de consciência) e o que (conteúdo da experiência)

● Postula uma fronteira no mundo físico entre o que está dentro e o que está fora do substrato físico da consciência, a cada instante

O que é uma Teoria da Consciência? ●

A teoria é uma ponte que vai da experiência para uma estrutura conceitual através de uma substrato físico.



É um mapa que leva cada distinção fenomenal em um conceito da estrutura conceitual, além de definir uma distância entre os conceitos

Tononi, G. Integrated information theory: from consciousness to its physical substrate (2016) Nature Reviews

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