Em defesa das parcerias público-privadas: análise do Projecto de Decreto-Lei angolano - 2004

July 17, 2017 | Autor: Sofia Vale | Categoria: Project Finance, PPP, Angola, PPP/PFI Contracts
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EM DEFESA DAS PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS: ANÁLISE DO PROJECTO DE DECRETO-LEI ANGOLANO1

SOFIA VALE2

I- INTRODUÇÃO À Administração Pública incumbe identificar as necessidades da população, hierarquizar os interesses de diferentes segmentos populacionais e socorrer-se dos mecanismos mais eficientes ao seu alcance para, de facto, promover a satisfação do interesse público. Tradicionalmente (e mais acentuadamente nos sistemas ditos continentais) a Administração desenvolvia directamente modelos destinados à realização do interesse público, desde a sua concepção, projecto, financiamento, construção, distribuição, manutenção, gestão e actualização. Os particulares apenas eram chamados a colaborar numa fase posterior, contratando com a Administração a prestação de serviços que ela não conseguia por si só realizar, aderindo a um caderno de encargos ‘fechado’ onde todas as suas tarefas se encontravam já previamente definidas. Pense-se nos contratos de concessão ou de fornecimento tradicionais . Actualmente, a tendência vai no sentido de possibilitar um maior envolvimento dos particulares nas tarefas tradicionalmente cometidas à Administração Pública. Por influência dos sistemas anglo-saxónicos, os particulares são agora chamados a colaborar com a Administração na busca do modelo que melhor satisfaça uma determinada necessidade colectiva, com base em critérios de eficiência, eficácia e economicidade. Para além da concepção e do projecto, é sobre os particulares que recai a obrigação de obtenção do financiamento necessário à sua implementação, sendo essencial que proponham um modelo de gestão adequado e o desenvolvam durante o período de longevidade do contrato.

Artigo publicado na Revista da Faculdade de Direito da Universidade Agostinho Neto, n.º 5, ed. FDUAN, Luanda, 2004. 2 Professora da Faculdade de Direito da Universidade Agostinho Neto. Luanda, Angola. 1

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Em suma, a uma Administração Prestadora sucede-se uma Administração Reguladora. Esta mudança de perspectiva sobre o input que os particulares deverão ter na definição do modo de satisfação das necessidades colectivas representa claramente uma opção de política económica. O fenómeno das Parcerias Público - Privadas (doravante designadas pela sigla PPP) tem sido amplamente discutido no seio da União Europeia, apontando-se as vantagens da aplicação das PPP aos contratos públicos e, em especial, aos contratos de concessão a celebrar pelas autoridades nacionais ou locais dos diferentes Estados - Membros. Na verdade, o recurso crescente às PPP prende-se com a rígida disciplina orçamental da União Europeia, levando os Estados-Membros a lançar mão de esquemas contratuais que lhes permitam canalizar financiamento privado para o sector público3. Também não será despicienda a necessidade de agilizar, flexibilizar e modernizar a capacidade de resposta das empresas públicas, que assim poderão beneficiar da experiência e do modus operandi adquiridos pelo sector privado. Tendo presente as mais recentes tendências do direito comunitário, têm surgido em Portugal alguns diplomas legislativos sobre PPP para as áreas da saúde (designadamente, a Resolução do Conselho de Ministros n.º 162/2001, de 16 de Novembro e o Decreto-Lei n.º 185/2002, de 20 de Agosto). Porém, só com o aparecimento do Decreto-Lei n.º 86/2003, de 26 de Abril, que disciplina o Regime das Parcerias Público-Privadas (adiante simplesmente designado por RPPP) se estabelece o enquadramento jurídico geral das PPP na ordem jurídica portuguesa 4. Mas as PPP têm vindo a ser utilizadas um pouco por todo o mundo. Não só na Europa, como também na Ásia5, na América6 e na África temos assistido a uma crescente utilização de recursos do sector privado na satisfação de necessidades públicas. Angola também não é alheia a esta tendência internacional, pelo que se encontra actualmente na calha um “Projecto de

A Iniciativa de Crescimento Europeu, aprovada pelo Conselho Europeu de Dezembro de 2003, disponível em www.europa.eu.int/scadplus/leg/pt aponta o especial interesse que as PPP podem revestir nas áreas da construção de infra-estruturas de longa duração (ILD), em virtude do elevado investimento inicial que implicam. 4 A legislação portuguesa a que fizemos referência pode ser obtida em www.dre.pt 5 Veja-se, a título de exemplo, a. tradução não oficial da lei japonesa sobre PPP, ‘Law relating to promotion of realization of public facilities by using private funds’ -Law Number 117, July 30 th, 11 th year of Heisei, disponível em www.yescombe.pwp.blueyonder.co.uk 6 Veja-se uma breve resenha da evolução das PPP nos Estados Unidos da América em “PPPs- American Style”, da autoria de RICHARD NORMENT, Director do Nacional Council for Private Public Partnerships, disponível em www.ncpp.org. Nos países da América Latina é possível constatar um amplo desenvolvimento das PPP, designadamente no Chile, Uruguai, Argentina e México. No caso do México, foi criado o programa ‘PIDIREGAS’, direccionado para as áreas estratégicas de monopólio governamental que se prendem com a construção de infraestruturas de longa duração. Mais detalhes sobre este programa podem ser encontrados em http://www.hacienda.gob.mx . 3

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Decreto-Lei relativo ao Regime Jurídico das Parcerias Público- Privadas” (seguidamente referido como ‘Projecto PPP’), da autoria do Mestre Carlos Feijó, que se pretende vá funcionar como diploma enquadrador das PPP naquele país. Este diploma que consagrará o regime geral das PPP deverá posteriormente ser complementado por regimes sectoriais específicos, quando tal se justifique, e por um diploma regulador das concessões. Começando por perscrutar a noção de PPP (II), procuraremos apontar quais as reais vantagens deste novo modelo de actuação dos entes públicos face aos moldes tradicionais da contratação pública (III), detendo-nos na análise comparativa dos regimes jurídicos constantes do ‘Projecto PPP’ (IV), e terminando com uma nota final, síntese das principais ideias aqui apresentadas (V). Permitimo-nos ainda realçar que o presente trabalho só é possível devido à inestimável colaboração do Mestre Carlos Feijó, a quem apresentamos os nossos sinceros agradecimentos por nos ter facultado o ‘Projecto PPP’ de sua autoria e nos ter concedido a honra de, nesta sede, o comentar.

II - NOÇÃO DE PPP Nos diversos estudos que vêm sendo realizados sobre o tema vão-se apontando os elementos constituintes da noção de PPP7, sem se ter chegado, até à data, a uma definição única comummente aceite. O ordenamento jurídico comunitário ainda não estabeleceu um conceito de PPP aplicável aos ordenamentos jurídicos dos Estados-Membros, mas identifica quatro elementos caracterizadores desta forma de cooperação entre as autoridades públicas e as empresas 8. Em primeiro lugar, a duração relativamente longa da relação estabelecida entre o parceiro público e o parceiro privado; em segundo lugar o facto de o financiamento do projecto ser assegurado em parte pelo parceiro privado, o que não quer dizer que muitas das vezes esse financiamento não seja completado por dinheiros públicos; o terceiro elemento prende-se com a importância da participação do parceiro privado em todas as fases do projecto a desenvolver, desde a sua Merece referência um recentíssimo estudo do FMI, de 12/03/2004,aprovado por TERESA TER-MINASSIAN, intitulado “ Public-Private Partnerships”, que poderá ser encontrado em www.imf.org . 8 Veja-se o documento COM (2004) 327 final, de 30/04/2004, “Livro Verde sobre Parcerias Público-Privadas e o direito comunitário em matéria de contratos públicos e concessões”, p. 3, in http://europa.eu.int/eur-lex 7

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concepção; por último, a distribuição dos riscos inerentes ao projecto é feita casuísticamente, em função da capacidade das partes para os controlar e gerir, procurando-se transferir para o parceiro privado os riscos que tradicionalmente eram suportados pelo parceiro público. Como veremos em seguida, estas notas idiossincráticas encontram-se presentes tanto no RPPP como no ‘Projecto PPP’ angolano. O art. 2º, n.º 1 do ‘Projecto PPP’, em clara sintonia com o RPPP português, define PPP como “(..) o contrato ou união de contratos, por via dos quais entidades privadas, se obrigam, de forma duradoura, perante um parceiro público, a assegurar o desenvolvimento de uma actividade tendente à satisfação de uma necessidade colectiva, em que o financiamento e a responsabilidade pelo investimento e pela exploração incumbem, no todo ou em parte, ao parceiro privado”. Esta definição incorpora quatro elementos essenciais, a saber: (i)

Um elemento subjectivo, relativo à existência de uma relação jurídica entre uma entidade pública e um parceiro privado. Nos termos do n.º 2 do art. 2º do ‘Projecto PPP’ são parceiros públicos o Estado e as entidades públicas estaduais, os fundos e serviços autónomos, as empresas públicas9 e as entidades por elas constituídas com vista à satisfação do interesse público. O ´Projecto PPP’ aplica-se também a parcerias em que o Estado se apresente como parceiro público, sendo o parceiro não público uma empresa pública (pense-se nas concessões de serviços públicos que estão a cargo de empresas públicas), uma cooperativa ou uma instituição privada sem fins lucrativos (n.º 3 do art. 2º ‘Projecto PPP’).

(ii)

Um elemento objectivo, atinente ao contrato ou contratos destinados ao desenvolvimento de uma actividade tendente à satisfação de uma necessidade colectiva. O n.º 4 do art. 2º ‘Projecto PPP’ elenca exemplificativamente os contratos que poderão disciplinar uma PPP, a saber, o contrato de concessão de obras públicas, o contrato de concessão de serviço público, o contrato de fornecimento contínuo, o contrato de prestação de serviços, o contrato de gestão e o contrato de colaboração.

Em Angola as Empresas Públicas são disciplinadas pela Lei n.º 9/95, de 15 de Setembro de 1995 e pelo Decreto n.º 8/02, de 12 de Abril, de 12 de Abril de 2002. 9

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São expressamente excluídos do âmbito de aplicação do diploma as empreitadas de obras públicas, os arrendamentos e os contratos públicos de aprovisionamento (art. 2º, n.º 5, al. a) a c) ‘Projecto PPP’) (iii)

Um elemento temporal, exigindo uma associação duradoura entre parceiro público e parceiro privado. Esta é a razão de ser da exclusão do âmbito de aplicação do diploma de todos os contratos de fornecimentos de bens ou de prestação de serviços com prazo de duração igual ou inferior a três anos, que não envolvam para o parceiro público a assunção automática de obrigações no termo do contrato (al. d) do n.º 5 do art. 2º ´Projecto PPP’).

(iv)

E, por último, um elemento financeiro, impondo que pelo menos uma parte do financiamento esteja a cargo do parceiro privado. O facto de o financiamento e a responsabilidade pelo investimento ficarem a cargo do parceiro privado é uma nota essencial do esquema legal delineado no ‘Projecto PPP’. Porém, o investimento privado pode surgir concomitantemente com investimentos públicos, muitas vezes justificados pelo facto de através da PPP se estar a promover a realização de serviços de interesse económico geral10, serviços que devem ser proporcionados ao público a um preço inferior ao que seria ditado pelas regras de mercado, incumbindo ao Estado cobrir essa diferença através das chamadas indemnizações compensatórias11.

Da leitura do ‘Projecto PPP’ facilmente se identificam os principais objectivos que presidiram à sua publicação, designadamente repartir entre as partes os encargos e riscos inerentes a projectos de grande envergadura, iniciar progressivamente a orçamentação plurianual do sector público administrativo e instituir critérios de eficiência e eficácia nos contratos que o Estado

Serviços de Interesse Económico Geral (SIEG) é a expressão utilizada no art.º 86º TCE; refere-se aos serviços de mercado que os Estados sujeitam a obrigações de serviço público em função de critérios de interesse geral. Abrange em princípio as redes de transportes, energia e telecomunicações. Estes distinguem-se dos Serviços de Interesse Geral (SIG) que são actividades de serviços, com fins lucrativos ou não, consideradas de interesse geral pelas autoridades públicas, estando sujeitas a obrigações específicas de serviço público. Cf. Relatório ao Conselho Europeu de Laeken, apresentado pala Comissão, em 17/10/2001. Veja-se ainda sobre os serviços de interesse geral na Europa a .Comunicação da Comissão de 1996, publicada no JO C 281 de 26/09/1996 e Comunicação da Comissão de 2001, publicada no JO C 17 de 19/01/2001. Todos os documentos mencionados se encontram disponíveis em http://europa.eu.int/eur-lex 11 O Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (TJCE) tem entendido que a compensação paga pelos Estados-Membros pode cobrir todos os custos adicionais expostos para cumprir a missão de serviço público, de modo a que a empresa que o preste possa actuar em condições de equilíbrio económico e beneficiar de uma margem normal de lucro Veja-se o documento da Comissão, Non-paper relativo aos Serviços de Interesse Económico Geral e Auxílios Estaduais´, de 12/12/2002, que poderá ser obtido em http://europa.eu.int/eur-lex. 10

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celebra com particulares, promovendo a boa utilização dos dinheiros públicos através da sua aplicação em projectos bem geridos e financeiramente sustentados. As PPP, entendidas em sentido amplo, representam qualquer forma de colaboração duradoura entre a Administração e os particulares, com vista à satisfação de necessidades colectivas12. Esta forma de promoção do interesse público socorre-se de instrumentos jurídicos que desde há muito vêm sendo utilizados pelos poderes públicos, designadamente: (i)

os ‘Contract Services’ ou contratos de concessão de exploração de um serviço público

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São muito utilizados pelo regime de contratação pública tradicional.

Nestes contratos o parceiro público, para além de fornecer os activos fixos, fica também responsável pelos riscos de financiamento, de concepção e de construção; sobre o parceiro privado recaem os riscos de exploração e os de aquisição e manutenção dos activos circulantes. Estes contratos são muito utilizados em situações em que as infra-estruturas pertencem às autoridades públicas como é o caso das concessões portuárias, estações de tratamento de esgotos e águas residuais. (ii)

os ‘Developer Finance’ ou contratos de contrapartidas para licenciamento14: Neste tipo contratual o parceiro privado financia a construção ou expansão das infraestruturas já existentes a troco da obtenção do licenciamento para a sua exploração. São de grande utilização na construção de parques industriais, de habitação social ou armazéns, porquanto implicam um reforço das infra-estruturas existentes ou um aumento de capacidade dos equipamentos sociais.

(iii)

os ‘Merchand Facilities´ contratos de licenciamento comercial para a exploração de um serviço público15 : Nestes contratos exclui-se o projecto e a construção de activos. O parceiro privado assume todos os riscos de mercado relativos à exploração do serviço público (e, nessa medida, fica também sujeito às obrigações de serviço público que lhe sejam impostas), tendo também a seu cargo o financiamento, a aquisição, posse, propriedade e manutenção dos activos

Veja-se uma muito boa sistematização dos tipos contratuais utilizados pelas autoridades públicas angolanas in CARLOS TEIXEIRA, Os Contratos Administrativos no Direito Angolano, Luanda Editora, Luanda, 1999. 13 Classificação apresentada por. ANTÓNIO POMBEIRO, As PPP/PFI – Parcerias público-privadas e a sua auditoria, Áreas Editora, Lisboa, 2003, p. 54. 14 Idem, p. 56. 15 Idem, p. 56 e 57. 12

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necessários; os riscos assumidos pelo parceiro público são praticamente despiciendos. Têm sido utilizado na exploração de fábricas de reciclagem. (iv)

os

‘Turkney

Projects’

ou

contratos

de

concepção,

projecto,

construção/produção e exploração de um serviço público16: Nestes contratos o parceiro privado tem uma grande margem de manobra na concepção, planeamento, gestão e exploração do projecto, assumindo ainda todos os riscos relativos ao sucesso ou insucesso económico do empreendimento. A propriedade dos activos é do parceiro privado (ele assume o financiamento de todos os activos circulantes e, em geral, de grande parte ou da totalidade dos activos fixos), pelo que é necessário prever uma solução legal para que no final da concessão tais activos revertam para o domínio público, podendo inserir-se nos contratos uma cláusula de reserva de propriedade a favor do parceiro público ou uma cláusula de reversão automática mediante dada remuneração. O parceiro público assumirá os riscos que, na sequência da negociação do contrato, sobre ele impendam, designadamente o risco de financiamento (se decidir consignar parte das receitas provenientes das taxas pagas pelos utentes) e o risco da propriedade dos activos (se for incluída no contrato uma cláusula de reserva de propriedade). Quando o parceiro privado, para além dos riscos supra-mencionados, assume também a responsabilidade pela obtenção e risco do financiamento. estamos perante um tipo contratual denominado Project Finance Iniciative (doravante PFI). Do que acabamos de expor resulta que o PFI constitui uma forma de PPP. A ideia subjacente aos contratos de PFI consiste na máxima transferência possível para o sector privado do risco subjacente a contratos de serviço público, transferência que pode ser total ou parcial, em função do contratualmente acordado. Assim, se na situação concreta se entender que o parceiro privado lida melhor com determinado risco (por exemplo, o risco de construção), esse risco ser-lhe-á imputado; se estivermos perante riscos que o parceiro privado não consegue gerir, a responsabilidade mantém-se no sector público (por exemplo, o risco de mercado no âmbito da prestação de serviços de interesse económico geral, que inevitavelmente originam situações financeiras deficitárias).

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Idem, p. 54 e 55.

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O documento intitulado “The Private Finance Iniciative”, elaborado pela Câmara dos Comuns’17 apresenta três categorias de projectos PFI, que se distinguem no que toca ao modo de retorno do investimento privado, a saber: (i)

Contratos auto-sustentados – neste caso, o investimento efectuado pelo parceiro privado é recuperado inteiramente através de taxas cobradas ao utilizador final, consagrando-se o princípio do utilizador – pagador. Este tipo de PFI tem sido utilizado para a construção de auto-estradas com portagens, pontes e parques de estacionamento automóvel.

(ii)

Joint Ventures ou Consórcios – neste tipo de acordo, o financiamento é suportado tanto pelo parceiro privado como pelo público, consistindo a contribuição do parceiro público em empréstimos, afectação de bens de domínio público, autorização para exploração acessória de determinados mercados, disponibilização de outros tipos de trabalhos, indemnizações compensatórias, entre outras. A sua utilização é frequente em serviços deficitários por natureza, como por exemplo na exploração de serviços de transporte público e na construção de infra-estruturas de longa duração (as chamadas ILD).

(iii)

Serviços vendidos ao sector público – nesta modalidade de PFI, o parceiro privado cobra ao parceiro público taxas pelos serviços que lhe presta. O montante recebido não é fixo, dependendo antes do grau de realização de determinados objectivos contratualmente previstos e da disponibilidade dos serviços a prestar. Este sistema tem servido de base, por exemplo, para a prestação de serviços de hemodiálise a um hospital, de serviços às prisões ou de gestão de infra-estruturas ferroviárias e de metropolitano ligeiro.

III - VANTAGENS DAS PPP/PFI FACE AO MODELO DE CONTRATAÇÃO PÚBLICA TRADICIONAL No modelo de contratação pública tradicional, e retomando o que já dissemos, a Administração ou procura por si só prover à satisfação dos interesses da colectividade ou contrata com privados a prestação de determinados serviços públicos, em moldes tais que o adjudicatário HOUSE OF COMMONS LIBRARY, Research Paper 01/117, ‘The Private Finance Iniciative’, de 18 de Dezembro de 2001, disponível em www.parliamente.uk , p. 12. 17

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acaba por ser totalmente desresponsabilizado face ao sucesso final do projecto. O esquema contratual tradicional é um sistema rígido que dificulta o diálogo entre os diversos entes públicos nele intervenientes, originando em muitos casos situações de desarticulação nas decisões a tomar. Por outro lado, também não facilita a disseminação de informação acerca das necessidades e dos pontos de vista dos utentes dos serviços públicos junto dos projectistas/ conceptores, pelo que se torna frequente depararmo-nos com projectos tecnicamente bem elaborados mas não direccionados para as reais necessidades dos utilizadores. A maior crítica que se faz ao processo tradicional de contratação pública prende-se com o elevado dispêndio de dinheiros públicos a q conduz. Não obstante o preço global inicialmente tido em consideração (a contrapartida paga pelas autoridades públicas), à medida que o projecto vai sendo implementado vão-se sucedendo propostas de soluções variantes que aumentam as margens do adjudicatário, trabalhos a mais, urgências impostas pela Administração, prémios automáticos pelo cumprimento puro e simples das obrigações contratuais, revisões de preços mal fiscalizadas, etc. Este tipo de situação leva as autoridades adjudicantes a ponderarem entre manter o adjudicatário originário ou lançarem novo concurso para a adjudicação do projecto, com todos os encargos inerentes e o aumento do tempo de espera até que os projectos fiquem concluídos, acabando por optar, via de regra, pela primeira solução. Em Portugal estas situações são, infelizmente, comuns. Um projecto inicialmente orçamentado num montante x, revela-se a final com um custo de 2x, o dobro do inicialmente previsto, com sérias repercussões a nível do equilíbrio do orçamento de Estado18. Como a realização de projectos de grande envergadura implica ab initio um vultuoso investimento público, é muito difícil ou praticamente impossível concretizá-los quando existam limites ao endividamento público ou restrições orçamentais. Acresce que, no modelo tradicional de contratação pública, as actividades de gestão pública não são avaliadas, ou seja, não existe qualquer controlo da forma como essa actividade se vai desenvolvendo ou sequer parâmetros e objectivos que sirvam para assacar responsabilidades aos decisores públicos. Sendo as legislaturas de duração bem mais curta do que estes contratos públicos, vão-se sucedendo os decisores e os técnicos deles encarregues, contribuindo assim para a falta de coerência e continuidade nas opções das autoridades públicas. Por último, nos modelos contratuais tradicionais utilizados para a construção de grandes infraestruturas prevê-se normalmente que o financiamento dos activos fixos fica a cargo das Como se pode constatar pela análise de diversos relatórios relativos às auditorias efectuadas pelo Tribunal de Contas português às concessões de obras e serviços públicos, in www.tcontas.pt 18

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autoridades públicas, pertencendo-lhes estes desde o início em propriedade. Sucede que, no final destes contratos de longa duração19, reverte para a Administração um activo fixo completamente desactualizado. O custo que para os utentes representa a progressiva desactualização dos activos fixos e o custo que a sua substituição impõe à Administração não são sequer tidos em consideração aquando da adjudicação. Procurando responder e superar as apontadas ineficiências, as PPP/PFI apresentam um conjunto de características nas quais residem as suas vantagens face ao modelo de contratação tradicional. São essas características que merecerão agora a nossa atenção. Em primeiro lugar, passa a existir uma definição detalhada das necessidades públicas a prover, através do estudo pormenorizado dos níveis de serviço a proporcionar (do ponto de vista quantitativo e qualitativo), racionalizando-se assim a decisão política. Passamos a ter opções políticas mais consentâneas com as necessidades sentidas pela população. Depois de identificadas as necessidades, a escolha do melhor modo para as satisfazer é deixada aos concorrentes, possuindo estes uma grande flexibilidade na concepção dos modelos de financiamento e de gestão do projecto, o que não se verifica nos esquemas tradicionais de contratação. A ideia é deixar a maior margem de manobra possível aos concorrentes para que eles possam apresentar soluções criativas e inovadoras e as melhores propostas de rentabilização do projecto. Todas as formas possíveis de gerar poupanças adicionais ou rendimentos acessórios, que minimizem os custos da Administração são atendíveis. Para que uma PPP/PFI tenha luz verde das autoridades públicas, é necessário que se demonstre o ‘value for money’ do projecto face ao comparador público. Dito de outro modo, é preciso demonstrar a viabilidade do projecto através da comparação entre os custos globais do projecto ao longo de toda a sua vida e os seus benefícios financeiros, económicos e sociais que possibilitará. Para tal utiliza-se um mecanismo comparativo: o ‘public sector comparator’ ou comparador público. Pensa-se no melhor projecto que poderia ser realizado e financiado directamente pela Administração para prestar os mesmos serviços, e tem de se provar que os ganhos obtidos com uma PPP/PFI (desde a diminuição dos custos, aos ganhos de eficiência, aos rendimentos complementares, à transferência de um conjunto de riscos para o parceiro privado) são superiores aos possibilitados pelo modelo de contratação tradicional. Através deste 19

Estamos a falar, via de regra, em contratos de concessão com uma duração entre 15 e 30 anos.

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sistema comparativo procura desenhar-se o projecto que melhor dê resposta às necessidades de serviço público em questão20. Mas a que é apontada como a grande vantagem das PPP/PFI reside na sustentabilidade orçamental do projecto. Em períodos de restrição das despesas públicas, em que se torna impossível à Administração financiar integralmente projectos de grande envergadura, os projectos PFI/PPP são uma excelente solução, na medida em que transferem para o sector privado a obrigação de avançar com o financiamento, apenas exigindo à Administração que inscreva no orçamento de Estado a verba correspondente ao ano económico em questão (que é relativamente baixa, uma vez que corresponde a uma taxa de natureza variável a ser paga ao parceiro privado). Promovendo-se a orçamentação plurianual do sector público, consegue-se que os decisores públicos projectarem temporalmente os custos e os benefícios anuais dos projectos, fazendo uma avaliação objectiva das opções tomadas. E desta inscrição orçamental plurianual dos encargos públicos com um projecto PPP/PFI resulta um reequilíbrio na distribuição intergeracional dos custos atinentes a grandes empreendimentos, uma vez que a relação custo/benefício do projecto vai repercutir-se ao longo do tempo, sendo os custos suportados pelos contribuintes que, no período de duração do contrato, vão beneficiar do serviço público em questão. E, claro, sendo os custos anuais menores, é possível iniciar em simultâneo mais projectos de grande dimensão. Mas este ponto tem sido criticado, na medida em que a Administração se vincula a efectuar pagamentos ao sector privado durante um longo período de tempo, comprometendo as opções políticas das gerações futuras21. Diz-se ainda que, mesmo que os custos unitários do financiamento dos projectos PPP/PFI sejam mais elevados do que os dos projectos desenvolvidos de acordo com o modelo tradicional (até porque têm de compensar os custos financeiros em que o parceiro privado incorre), o capital necessário para um projecto PPP/PFI é menor. Isto porque, na contratação tradicional, ao preço global pago ao adjudicatário acresciam sempre injecções de capital extraordinárias e justificadas pelos mais variados motivos, acabando por se verificar grandes derrapagens nos custos Tem sido muito discutido se os projectos PFI implicam na prática um ‘Value for Money’. Veja-se um documento da autoria da ACCA (ASSOCIATION OF CHARTERED CERTIFIED ACCOUNTS) do Reino Unido, intitulado ‘ACCA members’ survey: Do PFI schemes provide value for money?’, datado de Setembro de 2002 e disponível em www.accaglobal.com , onde se refere que a maioria dos seus membros acredita que os projectos PFI resultam na prática mais dispendiosos do que os levados a cabo através dos modelos tradicionais de contratação pública. 21 Para uma boa sistematização das críticas que têm sido apontadas ao PFI, veja-se PAUL GOSLING, “PFI- Againt the public interest: Why a ‘licence to print money’ can also be a reseat to disaster”, disponível em www.unison.org.uk/pfi 20

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inicialmente previstos. A ser assim, as PPP/PFI permitem à Administração fazer poupanças, de montante variável, que poderão ser canalizadas para a satisfação de outras necessidades públicas. Por outro lado, as PPP permitem à Administração libertar-se das tarefas de gestão dos projectos sem perder, porém, a sua responsabilidade reguladora e fiscalizadora, mantendo sempre e em última instância a decisão sobre a melhor forma de satisfazer o interesse público. Isto permite à Administração maximizar a sua própria organização, uma vez que deixa de acumular funções dispensáveis, entorpecedoras mesmo, reduzindo o peso da sua estrutura (reduz o número de funcionários públicos, sem aumentar o desemprego). Na verdade, num projecto PPP as autoridades administrativas reduzem amplamente as suas competências, transferindo-as para o sector privado. Porém, as competências de controlo e fiscalização do cumprimento dos parâmetros contratuais acordados são inalienáveis, só assim se garantindo que o parceiro privado actua com respeito pelas obrigações de serviço público a que está adstrito. Outra das vantagens das PPP tem a ver com a responsabilização do sector privado pelo sucesso ou insucesso do projecto, pela sua eficiência, eficácia e economicidade. Quer o parceiro privado receba indemnizações compensatórias do Estado quer o retorno do seu investimento lhe seja dado directamente pelo pagamento dos serviços que presta (ie, através das tarifas que cobra aos utentes do serviço público), a sua actuação está sempre sujeita a um conjunto de critérios de bom desempenho que, se não forem atingidos não lhe possibilitarão rentabilidade. Ou seja, a remuneração do parceiro privado é directamente proporcional a uma positiva avaliação de desempenho. Este aspecto afigura-se essencial para assegurar a qualidade dos serviços prestados pelo parceiro privado, um dos elementos- chave das PPP. Diz-se ainda que as PPP/PFI têm a vantagem de funcionar como um estímulo ao investimento privado, porquanto incentivam a criação de novas empresas em segmentos de mercado tradicionalmente entregues em exclusivo à Administração, dando ao parceiro privado completa autonomia na gestão do empreendimento desde que respeite as obrigações de serviço público que lhe são impostas e atinja os patamares de qualidade pretendidos. Numa época em que os mercados estão já muito saturados, forçando os empresários a buscar novas áreas de negócio, as PPP permitem-lhes aceder a sectores de mercado onde se verifica sempre um elevado nível de procura.

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No tocante à qualidade técnica dos projectos, as PPP permitem ao parceiro público beneficiar em larga escala do ‘know-how’ adquirido pelo parceiro privado22. A nível tecnológico e operativo o sector privado é caracterizado por um forte dinamismo, sendo inovador na pesquisa de soluções vanguardistas aplicáveis aos problemas concretos. É também reconhecida ao sector privado uma capacidade de gestão rigorosa, de flexibilização das estruturas da organização e de maleabilidade dos meios de contratação de que se socorre, competências imprescindíveis para o sucesso de qualquer PPP. Da utilização destas competências resulta uma visão global e integrada dos serviços a prover, sendo o projecto sujeito a constante actualização e desenvolvimento em função das vicissitudes práticas com que se vai defrontando. Este estímulo à inovação e actualização tecnológica do projecto reveste-se de grande importância na medida em que no final do prazo contratual não reverterão para a Administração activos profundamente desactualizados. Os esquemas PPP têm também o mérito de contribuir para a transparência e divulgação constante dos custos do projecto, uma vez que nos contratos se prevê a elaboração pelo parceiro privado de relatórios mensais e semestrais relativos ao grau de concretização do projecto e aos custos suportados, a remeter às entidades públicas fiscalizadoras. Por outro lado, como nos projectos PPP/PFI a Administração procede a pagamentos periódicos ao parceiro privado, pagamentos esses que servirão para cobrir todos os custos inerentes (de financiamento, manutenção, conservação, actualização, amortização dos activos e atribuição de uma margem de lucro razoável), é-lhe possível fazer um acompanhamento sistemático da situação económica do parceiro privado. Este aspecto é extremamente importante, na medida em que é comum no modelo de contratação tradicional o adjudicatário ficar numa situação económica tal (em virtude da má gestão das quantias recebidas ou da falta de controle dos custos) que já não lhe é possível continuar o projecto sem uma injecção adicional de dinheiros públicos. Este tipo de situações, completamente imprevistas para as autoridades administrativas, conduzem a um agravamento abrupto dos custos dos projectos. Na sequência do exposto, espera-se que as PPP contribuam para a redução da corrupção que se verifica no modelo de contratação tradicional, uma vez que se co-responsabiliza o parceiro privado pelos resultados globais durante toda a vida do projecto.

Veja-se, da autoria do MINISTÉRIO DAS FINANÇAS FRANCÊS, o documento com o título ‘Quel sont les enjeux des Partenariats Public-Privés?’ in www.ppp.minifi.gouv.fr. 22

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Algumas vozes23 têm chamado a atenção para a necessidade de não encarar o PFI, o modelo de PPP de longe mais utilizado, como o único paradigma possível da contratação pública. Não obstante as vantagens que terminamos de apontar às PPP/PFI, é importante que as autoridades públicas tenham sempre presente que para cada caso concreto deve ser encontrado o modelo de contratação pública que melhor responda às necessidades em presença. Partindo deste pressuposto, em certas situações pode ser mais benéfico para a administração pública, tanto do ponto de vista económico como no tocante à qualidade dos serviços a prestar, enveredar pelo esquema de contratação pública tradicional. O espírito subjacente à criação das PPP consiste em encontrar a melhor solução para a prestação de determinado serviço público, nem que para tal o modelo PPP deva, no caso em apreço, ser deixado de lado.

IV - O REGIME GERAL DAS PPP: ANÁLISE DO PROJECTO DE DECRETO – LEI ANGOLANO À semelhança do RPPP24, que permitiu o enquadramento jurídico de modelos alternativos de contratação pública que têm vindo a ser experimentados em Portugal nos últimos dez anos, também o ‘Projecto PPP’ procura abarcar as PPP que em Angola se vêm desenvolvendo sob a égide das lacunas dos diplomas que regulam a contratação pública tradicional. Nesta medida, prevê o art. 16º ‘Projecto PPP’ que se proceda à sua aplicação imediata a todas as PPP a constituir e bem assim a “todas as renegociações, contratualmente previstas ou acordadas pelas partes, das parcerias já existentes, nos limites da disponibilidade negocial legalmente permitida”. Quer-se com isto dizer que as orientações vertidas no ‘Projecto PPP’ constituirão o regime jurídico geral enquadrador de qualquer PPP a implementar em Angola. Procederemos em seguida a uma breve análise dos elementos fundamentais deste diploma, procurando identificar o modo como a Administração salvaguarda a sua auctoritas de ente público e apontar, à luz da experiência portuguesa, algumas das dificuldades que se poderão levantar na sua aplicação prática.



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Regimes sectoriais especiais – art. 3º, n.º 2 e 3 ‘Projecto PPP’

Cf. PAUL MALTBY, ‘PPPs: The only show in town’, 2004 , disponível em www.iipr.org.uk . Art. 16º RPPP.

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O ‘Projecto PPP’ estabelece programaticamente que poderão ser criados normativos aplicáveis a sectores específicos (transportes, saúde, habitação, ensino, etc.), que tenham em conta as particularidades económicas, financeiras e técnicas de cada sector, e onde se consagrem normas procedimentais de aplicação específica (art. 3º, n.º 3, al. a) e b) ). Estes regimes especiais poderão também atribuir a uma entidade sob tutela sectorial as competências de identificação, avaliação prévia, acompanhamento e constituição de projectos de parcerias (art. 3º, n.º 3, al. c) ). Até à data, apenas foi criado em Portugal um regime sectorial particular para o sector da saúde, através da proclamação de um regime jurídico enquadrador25, de um procedimento concursal – tipo para os contratos de gestão26, de um caderno de encargos - tipo27 e da criação de uma Entidade Reguladora da Saúde. Os demais sectores em que é premente a criação de um diploma regulamentar específico, designadamente o dos transportes, continuam a aguardar a sua concretização. Uma vez que o ‘Projecto PPP´’ pretende ser um diploma de aplicação generalizada a todos os sectores da actividade do Estado passíveis, maxime, de serem concessionados, seria desejável que se avançasse também com a previsão de outros regimes sectoriais específicos, por forma a garantir a coerência dos modelos PPP a criar para o sector em causa, definindo os parâmetros técnicos que se pretende sejam cumpridos pelo parceiro privado e assegurando que a Administração manterá um papel preponderante na definição e fiscalização das formas de satisfação do interesse público. O ‘Projecto PPP’ prevê ainda no seu art. 3º, n.º 4 que ‘o regime sectorial especial das obras públicas e de serviço público prevalece sobre o previsto nos capítulos II [Avaliação das parcerias] e III [ Fiscalização e acompanhamento das parcerias] do presente diploma’. Tal previsão parece-nos, salvo melhor opinião, desnecessária na medida em que qualquer regime sectorial especial das PPP prevalecerá sempre sobre o regime geral do ‘Projecto PPP’, de acordo com o princípio geral de direito segundo o qual a lei especial derroga a lei geral.



Fase de negociação no procedimento concursal – 6º, n.º 1, al. f) ‘Projecto PPP’

Vertido no mencionado DL 185/2002. Aprovado pelo Decreto Regulamentar n.º 10/2003, de 28 de Abril. 27 Aprovado pelo Decreto Regulamentar 14/2003, de 30 de Junho. 25 26

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A existência de uma fase de negociação no concurso tendente à selecção do parceiro privado, para a qual sejam seleccionadas as duas melhores propostas apresentadas, atentos os critérios de avaliação do concurso, afigura-se-nos essencial. Na verdade, ao procurar que a BAFO (Best and Final Offer) constitua a proposta em que o maior número de riscos foi transferido para o sector privado, é desejável que a Administração aumente a sua capacidade negocial em face dos concorrentes. E isso seria conseguido através da discussão paralela, mas independentemente, com cada um dos dois concorrentes mais bem classificados de melhoramentos possíveis às propostas por eles apresentadas. Essa discussão teria lugar em face da minuta do contrato avançada pela Comissão de avaliação das propostas (prevista no art. 9º ‘Projecto PPP’). Em Portugal, esta fase de negociação está apenas legislativamente consagrada para as PPP no sector da saúde (art. 3º, n.º 2 Decreto - Lei n.º 185/2002), não obstante ser já correntemente utilizada em outros procedimentos concursais. Parece-nos imprescindível a previsão legal expressa de uma fase de negociação para todos os concursos tendentes à constituição de PPP, podendo entretanto o art. 6º, n.º 1, al. f) ‘Projecto PPP’ servir de base legal à sua inclusão.



Comissões especializadas para o acompanhamento, fiscalização e alteração das PPP – arts. 8º, n.º 3 , 13º e 14º, n.º 2 ‘Projecto PPP’ Um dos aspectos mais relevantes do regime vertido no ‘Projecto PPP’ consiste no facto de a Administração assegurar o acompanhamento e controlo dos contratos por ele abrangidos através de mecanismos especialmente criados para o efeito. Para tanto, prevê-se a criação de três tipos de comissões especializadas, a saber, uma Comissão de acompanhamento do projecto de parceria em preparação (prevista no art. 8º, n.º 3 ‘Projecto PPP’), uma Comissão/Entidade para o acompanhamento global da parceria (art. 13º ‘Projecto PPP’) e uma Comissão de acompanhamento de alteração da parceria (art. 14º, n.º 2 ‘Projecto PPP’). No que concerne à ‘Comissão de acompanhamento do projecto de parceria em preparação’, ela será instituída por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da tutela sectorial em questão, tendo poderes para obter toda a informação de que necessite junto das entidades competentes (art. 8º, n.º 4 ‘Projecto PPP’), por forma a emitir as recomendações que entender convenientes (art. 8º, n.º 5 ‘Projecto PPP’). Quando o projecto estiver pronto para seguir para a fase de lançamento, os membros nomeados para a Comissão por cada um dos ministérios emitirão dois pareceres não 16

vinculativos, onde se pronunciarão sobre o cumprimento dos pressupostos legais das PPP, a repartição dos riscos entre parceiro público e parceiro privado e os custos e riscos implícitos no projecto para o sector público (art. 8º, n.º 8 ‘Projecto PPP’). Estes pareceres serão tidos em conta na aprovação das condições de lançamento da PPP, a definir por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da tutela respectiva (art. 8º, n.º 9 ‘Projecto PPP’). A ‘Comissão/Entidade para o acompanhamento global da parceria’, referida no art. 13º ‘Projecto PPP’, será designada pelos Ministros das Finanças e da tutela sectorial e terá por objectivo a avaliação permanente durante a execução do contrato dos custos e dos riscos inerentes à PPP, procurando recolher e veicular informações a outras comissões/entidades com tarefas semelhantes de modo a

contribuir para o

aperfeiçoamento do processo de constituição de futuras parcerias. No caso de ser necessário na vigência do contrato proceder a modificações aos compromissos acordados pelas partes, será criada uma ‘Comissão de acompanhamento de alteração da parceria’ que, nos termos do art. 14º, n.º 2 ‘Projecto PPP’, deverá ser designada pelos Ministros que procederam ao lançamento da PPP. Esta Comissão emitirá recomendações e pareceres (art. 8º, n.ºs 7 e 8, por remissão do 14º, n.º 4 ‘Projecto PPP’), ficando qualquer alteração sujeita a parecer vinculativo do Ministro das Finanças, o que se compreende, na medida em que tal possa implicar a inscrição de verba superior no orçamento de Estado. Chamamos a atenção para o facto de o ‘Projecto PPP’ prever, à semelhança do RPPP, que a não emissão de parecer pelo Ministro das Finanças no prazo de trinta dias após ter sido notificado dos pareceres da Comissão, determina que esse parecer seja tido por favorável. Esta disposição pretende forçar o Ministro das Finanças a pronunciar-se dentro de um curto período de tempo sobre as alterações contratuais propostas, que muitas das vezes serão essenciais para a continuação da PPP. Debruçar-nos-emos agora sobre as disposições relativas ao regime das Comissões especializadas que, no nosso entender, são merecedoras de crítica. Em primeiro lugar, da leitura do ‘Projecto PPP’ retira-se que a Comissão de lançamento, a Comissão de acompanhamento permanente e a Comissão de alteração da PPP constituem entidades distintas. Do nosso ponto de vista, conseguir-se-ía uma maior coerência do processo de decisão e uma mais eficaz fiscalização se se designasse uma mesma comissão para proceder a estes três tipos de tarefas, uma vez que tendo

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acompanhado todas as fases de evolução do projecto, teria um conhecimento mais alicerçado dos problemas em questão. Em segundo lugar, prevê o ‘Projecto PPP’ que para cada futura PPP sejam designadas novas Comissões especializadas. Ora, dependendo da dimensão da parceria e de já existir ou não uma comissão com o mesmo objectivo para parcerias similares realizadas com a mesma entidade pública, não deveria equacionar-se que a comissão já existente pudesse acompanhar o lançamento de mais do que uma parceria? Acresce que o ‘Projecto PPP’ prevê a criação de comissões especializadas de acordo com a fase do projecto em questão (lançamento, acompanhamento, modificação). Ora, atribuindo-se a uma entidade única, internamente estruturada por áreas/sectores de intervenção, competência para o estudo, recolha e tratamento da informação relativa às PPP, permitir-se-ía uma melhor articulação dos dados e da experiência obtida, contribuindo para uma melhor optimização e adequação das futuras decisões em matéria de PPP. Esse é, aliás, o princípio programático que resulta do art. 13º, n.º 2 ‘Projecto PPP’. Estamos em crer que a diminuição do número de comissões e, consequentemente, do número de elementos altamente qualificados para elas designados, contribuiria certamente para uma redução de custos da Administração com a realização de PPP. Alguns países têm optado pela criação de uma entidade que em permanência vá acompanhando todas as PPP que vão sendo lançadas, reunindo, sistematizando e divulgando os conhecimentos e experiências adquiridas, de modo a aperfeiçoar este esquema de contratação pública. Atentemos na experiência inglesa. No Reino Unido28 foi criada em 1997 a ‘Treasury Taskforce’ com a incumbência de ajudar os diferentes departamentos governamentais no desenho das PPP a lançar, estabelecendo prioridades por forma a facilitar as negociações e a identificação do ‘value for money’ dos projectos. Como a Taskforce foi perspectivada para durar apenas dois anos, sucedeu-lhe uma entidade permanente - a ‘Partnerships UK’- ela própria constituída por entidades privadas e públicas29, que procura contribuir para o melhoramento, planificação e implementação de projectos PPP específicos através de actividades de pesquisa e consultoria. Em 2000 foi criado o ‘Office of Government Commerce’ (OGC), com o propósito de modernizar os processos

HOUSE OF COMMONS LIBRARY, Research Paper 01/117, ‘The Private Finance Iniciative’, op. cit. A ‘Partnerships UK’ constitui-se em 2001 como PPP, sendo 51% das suas acções detidas por entidades privadas e 49% por entidades públicas. 28 29

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de contratação pública e representar internacionalmente o Reino Unido nestas matérias (designadamente a nível da União Europeia e da Organização Mundial do Comércio). Este organismo tem trabalhado no sentido de promover e desenvolver a utilização do PFI pelas entidades públicas, socorrendo-se dos conhecimentos e serviços prestados pela ‘Partnerships UK’.30 Em Portugal, ficou a PARPÚBLICA - Participações Públicas (SGPS), S. A.31 incumbida da prestação de apoio técnico ao Ministro das Finanças no contexto dos procedimentos de

definição,

concepção,

preparação,

concurso,

adjudicação,

alteração

e

acompanhamento global das PPP. É também a esta entidade que deverão ser dirigidas as notificações destinadas a dar início ao estudo e preparação de uma nova parceria ou da alteração dos termos e das condições de parcerias já celebradas. Mas a PARPÚBLICA pode apenas actuar no âmbito da delegação de competências que lhe foi feita pelo Ministro das Finanças32, não podendo substituir-se às diferentes Comissões nas tarefas que em cada PPP lhes cabem desempenhar.



Partilha de riscos – art. 7º ‘Projecto PPP’ Os riscos que correm por conta de cada um dos parceiros terão de ser claramente identificados no contrato e deverão ser repartidos em função da capacidade de cada um deles para gerir determinado risco. Ou seja, o parceiro que for mais capaz de lidar com dado risco, será mais hábil a minimizar os custos que esse risco implique ou possa vir a implicar, reduzindo assim os custos gerais da PPP face aos modelos de contratação tradicionais. O ideal, claro está, é conseguir a máxima transferência possível dos riscos para o sector privado (como se diz na al. b) do art. 7º ‘Projecto PPP’), mas sempre no pressuposto de que essa é a opção que melhor optimiza a distribuição dos riscos. Na recente Decisão 18/2004, de 11 de Fevereiro, o EUROSTAT33 identifica três grandes categorias de riscos existentes em contratos públicos (especialmente em contratos de

Também no Quebec foi recentemente criada a ‘Agence pour les Partenariats public-privé’, que impõe às autoridades públicas que queiram lançar uma PPP a obrigatoriedade de se socorrerem dos serviços desta agência no respeitante ao estudo de viabilidade das PPP, à escolha dos parceiros privados, às negociações contratuais, bem como à adjudicação definitiva dos contratos PPP. Assim estatui a section 8, Bill 61, citada no ‘IPPP Memorandum - General Consultation on Bill 61’, da autoria do Institut pour le partenariat public-privé, de 10/09/2004, disponível em www.pppcouncil.ca/pdf 30

Através do Despacho Normativo n.º 35/2003, de 20 de Agosto Art. 15º RPPP. 33 Cf. EUROSTAT, Comunicado n.º 18, de 11/02/2004, ‘Tratamento das Parcerias público-privadas’, disponível em http://europa.eu.int/comm/eurostat 31 32

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concessão); se se verificar uma efectiva transferência destes riscos para o parceiro privado, então estamos perante uma verdadeira PPP. Esses riscos são: -

o risco de construção, que engloba o risco por atrasos na entrega dos activos, pelo desrespeito dos padrões de qualidade definidos contratualmente, pelos custos adicionais/supervenientes com a construção, pelos defeitos técnicos da obra e pelas externalidades negativas. Este risco considera-se transferido para o parceiro privado se a Administração só proceder a pagamentos depois de tomar em consideração o efectivo estado dos activos.

-

o risco de disponibilização, que inclui a impossibilidade de prestar o volume de serviços contratualmente acordado, de cumprir os parâmetros de segurança ou de qualidade dos serviços a prestar aos utentes ou de atingir os padrões mínimos de qualidade, eficiência e eficácia previstos no contrato. Este risco considera-se transferido para o sector privado, quando a Administração pode reduzir ou aumentar os pagamentos periódicos ao parceiro privado em função da sua performance face ao cumprimento de determinados parâmetros contratualmente acordados.

-

o risco da procura, que abrange as variações da procura (aumento e diminuição) verificadas face ao momento da adjudicação, e que dependem mais do mercado do que da gestão do parceiro privado. Este risco considera-se transferido para o parceiro privado quando os pagamentos a efectuar pelo parceiro público dependam da procura efectivamente verificada (caso das autoestradas com portagem). Porém, quando estão em causa serviços por natureza deficitários (como é o caso dos transportes públicos), a Administração terá de proceder a pagamentos de montante regular independentemente dos níveis da procura verificados, por forma a garantir que o serviço seja sempre prestado, correndo então este risco por sua conta.

O art. 7º, al. d) ‘Projecto PPP’ estatui que o risco de insustentabilidade financeira da PPP, por causa não imputável a incumprimento ou modificação unilateral do contrato pelo parceiro público ou a situação de força maior, deve ser tanto quanto possível, transferido para o parceiro privado. Esta é, como já se disse, uma nota essencial do conceito de PPP/PFI, uma vez que cabe ao parceiro privado garantir o financiamento do projecto e promover a gestão racional da actividade contratada (art. 5º, 2ª parte ‘Projecto PPP’), condições determinantes do sucesso ou insucesso financeiro da PPP/PFI.

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Cumprimento das regras de programação financeira e concepção de modelos que evitem a assunção perante o parceiro privado de regimes indemnizatórios de longo prazo – Art. 6º, n.º 1, al. a) e e) ‘Projecto PPP’ O ‘Projecto PPP’ prevê que o financiamento e a responsabilidade pelo investimento recaiam sobre o parceiro privado (art. 5º ‘Projecto PPP’). Como a generalidade dos projectos PPP requer um investimento inicial avultado, na medida em que é necessário proceder à construção de activos patrimoniais (ILD), esse desembolso caberá ao parceiro privado. Só no decurso do contrato irá o parceiro privado recuperar o investimento inicialmente realizado acrescido de uma taxa de lucro razoável (conforme previsto no art. 6º, n.º 1, al. c), 2ª parte ‘Projecto PPP’), ressarcindo-se através da cobrança de tarifas ao utilizador final (se o serviço público em questão for rentável) ou através de pagamentos a efectuar pela Administração (as chamadas indemnizações compensatórias, caso o serviço público seja por natureza deficitário). Sucede normalmente que o parceiro privado explora áreas que não têm rentabilidade ou nas quais não é possível praticar preços de mercado, por força das obrigações de serviço público a que está adstrito. Por esse motivo, é dada ao parceiro privado a faculdade de cobrar uma taxa à Administração por cada serviço que lhe preste, inscrevendo-se anualmente no orçamento de Estado apenas os pagamentos a efectuar no ano corrente (programação financeira plurianual). Tomemos alguns exemplos: -

O parceiro privado encarregue de prestar um ‘serviço telefónico de apoio ao doente’ cobra ao Estado, por cada utente que atende via telefone, aconselha e/ou reencaminha para o posto de saúde mais próximo, uma taxa fixa, equivalente a x. Será o número total de doentes que anualmente atender multiplicado por essa taxa o montante a inscrever no orçamento de Estado;

-

Um gestor de infra-estrutura ferroviária cobrará ao Estado uma taxa pelos serviços de gestão, manutenção e disponibilização que presta ao operador que explore a linha ferroviária em questão. Essa taxa, variável em função do cumprimento de parâmetros de qualidade dos serviços prestados, será inscrita anualmente no orçamento de Estado.

-

Um hospital consoante os cuidados médicos que presta a um doente, cobra ao Estado um montante fixo definido numa tabela de referência, um montante que tem apenas em conta o valor médio do tratamento e não toma em consideração

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a sua duração efectiva. É o valor anualmente cobrado que será inscrito no orçamento. -

Um operador de serviços de metropolitano cobra ao Estado uma taxa fixa de x por cada utilizador do serviço; para utilizadores que possuam um regime de desconto especial (passe), a taxa fixa a cobrar será de valor superior. O montante global pago anualmente será inserido no orçamento de Estado.

Do exposto resulta que o custo total de uma PPP será repercutido nas contas públicas durante todo o período de duração do contrato, ou seja, numa base plurianual, apenas sendo devidas indemnizações compensatórias no âmbito de serviços de interesse económico geral, nos termos do art. 6º, n.º 1,al. e) ‘Projecto PPP’. Realçamos que o art. 6º, n.º 1, al. a) do RPPP português refere expressamente que as PPP devem cumprir, quando for caso disso, as “normas relativas à programação financeira plurianual constantes da lei de enquadramento orçamental”, enquanto que o mesmo artigo do ‘Projecto PPP’ não faz qualquer referência à programação financeira plurianual do sector público. Porém, no art. 8º, n.º 10, al. g) do ‘Projecto PPP’ refere-se que o despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da tutela sectorial deve conter, entre outros elementos, “a demonstração da compatibilidade dos custos e riscos decorrentes da parceria em função da programação financeira plurianual do sector público administrativo”. Não obstante, cremos que a ideia subjacente é a mesma: as PPP permitem inscrever em cada ano no orçamento de Estado apenas as quantias efectivamente despendidos, perspectivando-se aquando do lançamento de uma PPP os montantes a inscrever nos orçamentos subsequentes.



Vinculação do parceiro privado a obrigações de serviço público – 2º, n.º 1 ‘Projecto PPP’ Porque chamado a colaborar na prossecução de tarefas de interesse público, impõe-se contratualmente ao parceiro privado o respeito pelas obrigações de serviço público, nos mesmos moldes em que a Administração teria de as respeitar se directamente prestasse os serviços. Dito de outro modo, mesmo sendo o serviço público prestado por intermédio do parceiro privado sempre será garantida a igualdade de acesso, a universalidade e, se for o caso, a gratuiticidade ou a tendencial gratuiticidade do mesmo 34. Estas obrigações

As instituições comunitárias têm vindo a utilizar a expressão Serviço Universal, um conceito evolutivo que define um conjunto de exigências de interesse geral para as empresas que prestam serviços de interesse económico geral, assegurando o acesso de todas os cidadãos a determinadas prestações essenciais de qualidade e preço acessível. 34

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que caracterizam os serviços de interesse económico geral são mais fortes quando em causa estejam direitos fundamentais constitucionalmente garantidos, como é o caso do direito à saúde, do direito ao ensino e do direito à habitação, respectivamente garantidos nos arts. 95º, n.º 2, 52º, n.º 2 e 96º, n.º 2 do Anteprojecto de Constituição da República de Angola.



Avaliação das propostas – art. 6º e 9º ‘Projecto PPP’ A Comissão de avaliação das propostas prevista no art. 9º ‘Projecto PPP’, a designar por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da tutela sectorial respectiva, deverá erigir um conjunto de critérios destinados a avaliar as propostas dos concorrentes Essa avaliação, que se pretende quantitativa, por forma a permitir uma eficaz hierarquia das propostas a concurso, deverá tomar em consideração os riscos e os encargos em que incorre o parceiro privado. O grau de risco e de compromisso associado à proposta poderá ser aferido através das relações contratuais que o adjudicatário se propõe assumir, da forma como cada uma das partes envolvidas mitigará esses riscos, designadamente através dos seguros que se propõe contratar. Outro aspecto a ter em conta na avaliação das propostas consistirá no mérito relativo das mesmas em face do comparador público, ou seja, do melhor projecto que poderia ser obtido por recurso à contratação tradicional. As propostas a concurso terão de comprovadamente trazer um benefício acrescido para o parceiro público face ao método de contratação tradicional (cf. art. 6º, n.º 1, al. c) ‘Projecto PPP’). Outros factores tais como o cumprimento dos níveis de qualidade dos serviços exigidos, a qualidade técnica da proposta (nas suas vertentes de concepção, construção e exploração), valor actual líquido esperado dos pagamentos a realizar pelo Estado e prazos de execução do projecto deverão ser também tidos em consideração35. Em virtude da falta de concretização dos critérios de avaliação das propostas no ‘Projecto PPP’, seria desejável que sectorialmente se perfilhassem linhas de orientação que presidissem à actuação da Comissão de avaliação. Entretanto, é possível lançar mão das finalidades avançadas no art. 4º ‘Projecto PPP’, designadamente “eficiência”,

Cf. COMISSÃO, ‘Non-paper relativo aos Serviços de Interesse Económico Geral e Auxílios Estaduais’, de 12/12/2002, disponível em http://europa.eu.int/eur-lex . Estes critérios estão previstos no art. 36º, n.º 2 do Decreto Regulamentar n.º 10/2003, para o sector da saúde em Portugal, mas parecem-nos poderem ser de aplicação generalizada. 35

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“melhoria qualitativa e quantitativa do serviço”, e dos princípios gerais subjacentes ao diploma como farol dos critérios a adoptar na avaliação das propostas.

V - NOTAS FINAIS No decorrer do presente trabalho procurámos debruçar-nos sobre o fenómeno das PPP, entendidas como qualquer forma de colaboração duradoura entre as autoridades públicas (o parceiro público) e os particulares (o parceiro privado), com vista à colaboração destes na realização de tarefas de interesse público. Da leitura do art. 2º, n.º 1 do ‘Projecto PPP’ podemos concluir que estamos perante uma PPP quando o esquema contratual delineado pelas partes incorpore os quatro elementos essenciais aí previstos, a saber os elementos subjectivo, objectivo, temporal e financeiro que caracterizámos. Dentre os diversos instrumentos jurídicos que podem ser utilizados para a criação de PPP, o mais corrente é o PFI, um tipo contratual em que a concepção, projecto, construção/produção, gestão, manutenção, exploração e financiamento de um serviço público ficam a cargo do parceiro privado, mantendo o parceiro público a responsabilidade pela supervisão e fiscalização do projecto, por forma a garantir que o parceiro privado actua com respeito pelas obrigações de serviço público a que se encontra adstrito. O PFI, que entendemos apresenta bastantes vantagens em relação ao modelo tradicional de contratação pública, não deverá porém ser encarado como dogma. A coexistência de ambos os modelos é desejável, sendo a aplicação de um deles determinada no caso concreto, em face da melhor contribuição para a promoção do interesse público (que dependerá, obviamente, da articulação do binómio menores despesas para a Administração e qualidade mais elevada dos serviços a prestar). Analisados os aspectos mais pertinentes do ‘Projecto PPP’, concluímos ser desejável a criação de regimes jurídicos sectoriais específicos onde se pretenda aplicar as PPP (designadamente o sector dos transportes, da saúde, da habitação e das obras públicas) e apontámos a mais-valia que representaria para a Administração a inclusão de uma fase de 24

negociação nos concursos públicos. Referindo-nos às diversas Comissões especializadas previstas no diploma, esboçámos a sugestão de atribuição a uma entidade única, estruturada por áreas/sectores de intervenção a tarefa de acompanhar todas as PPP, por forma a garantir-se a adequação, coerência e optimização das decisões a tomar e bem assim a fluída troca de dados e de experiências obtidas nestas matérias. Por fim, chamámos ainda a atenção para a necessidade de se delinearem com mais precisão os critérios de avaliação das propostas dos concorrentes, que deverão nortear a actuação da Comissão de avaliação das propostas. Estando prestes a ser aprovado em Angola o regime jurídico geral das PPP, o que é então necessário para o sucesso das futuras PPP? O Banco Europeu para a Reconstrução e Desenvolvimento (BERD)36, refere que não existe uma chave para o sucesso das PPP mas avança uma receita possível: uma boa base legal e regulamentar das PPP sustentada por um comprometimento político forte, implementada por quadros profissionais possuidores do ‘know-how’ e vontade para permitir que o sector privado detenha elevado grau de controle em áreas tradicionalmente cometidas à Administração. Receitas à parte, acreditamos que Angola saberá atender às suas próprias especificidades e condicionantes, criando a chave que conduzirá ao sucesso as suas PPP.

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EBRD, ‘Public Private Partnerships’, in www.ebrd.com

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