Ensino de Sociologia: conteúdos didáticos e metodológicos

July 8, 2017 | Autor: Marcelo Cigales | Categoria: Sociologia da Educação, Ensino De Sociologia, Ensino De Ciências Sociais
Share Embed


Descrição do Produto

(*) Marcelo Pinheiro Cigales é Licenciado em Ciências Sociais e mestrando em Educação pela Universidade Federal de Pelotas-UFPel . @ [email protected]

177

Resenha

Ensino de sociologia: conteúdos didáticos e metodológicos The teaching of Sociology: didactic and methodological contains

Marcelo Pinheiro Cigales* MEIRELLES, Mauro; MOCELIN, Daniel Gustavo; RAIZER, Leandro; PEDDE, Valdir; SCHWEIG, Graziele Ramos. (orgs.). Sociologia: trabalho - ciência - cultura - diversidade. Coleção Olhares Contemporâneos. Porto Alegre: CirKula, 2013. 440 p. A publicação de livros que envolvem a pesquisa e o ensino de sociologia no Brasil vem crescendo verticalmente nos últimos anos. A criação de grupos de trabalhos, congressos, associações e o desenvolvimento de dissertações e teses sobre o assunto estão cada vez mais alcançando espaço na área das Ciências Humanas. Um dos principais acontecimentos que caracterizam o período é certamente a aprovação da Lei 11.684 de 2008 (BRASIL, 2008), que encerrou um ciclo de lutas pela obrigatoriedade da disciplina na educação básica. Se anterior a isso, existiam raras pesquisas sobre a historicidade da sociologia na educação, produção de livros didáticos e metodologias de ensino, agora, acrescidas a essas temáticas, também existem outras questões que se destacam, como a formação dos professores de sociologia, políticas públicas de incentivo à docência – PIBID, papel da sociologia na educação etc . Nesse sentido, é possível afirmar que Sociologia: trabalho - ciência - cultura - diversidade, primeiro livro que compõe a coleção Olhares Contemporâneos da editora Cirkula de Porto Alegre, é reflexo dessas questões que envolvem o ensino da disciplina no país. Esta edição possui 17 artigos distribuídos em quatro seções que o título do livro apresenta (trabalho, ciência, cultura e diversidade). No final de cada capítulo, é possível encontrar sugestões sobre a utilização do texto em sala de aula. Além disso, o livro apresenta, nas últimas páginas, um índice remissivo com os principais conceitos abordados no decorrer dos capítulos. O público e o privado - Nº 24 - Julho/Dezembro - 2014

Artigo Recebido: 23/04/2014 Aprovado: 02/09/2014

178

Marcelo Pinheiro Cigales

Conforme os organizadores, o objetivo é socializar uma série de trabalhos produzidos por pesquisadores ligados ao Laboratório Virtual e Interativo de Ensino em Ciências Sociais – LAVIECS1, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. Alguns dos artigos foram publicados com financiamento do Ministério da Educação e Cultura – MEC, e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE, nos últimos anos2. Dessa forma, tendo em vista a demanda pelo material, os organizadores decidiram republicá-los nessa edição. ­ Destinado aos professores (as) e estudantes de Ciências Sociais (Sociologia, Antropologia e Ciência Política), o livro busca preencher um espaço ainda insuficiente de materiais didáticos para a disciplina na educação básica, ainda mais no que se refere as características regionais, bem como às questões étnico-raciais que a maior parte dos livros didáticos não consegue abranger, como apontado por Handfas e Santos (2013, p. 80) ao fazerem um balanço sobre as publicações junto aos Grupos de Trabalho – GT, (Livro Didático de Sociologia), do Encontro Nacional sobre Ensino de Sociologia na Educação Básica – ENESEB, em 2013. 1 Para maiores informações sobre o LAVIECS, acesso o site: . 2 Assim como a UFRGS, outras instituições também criaram seus Laboratórios de ensino, como a Universidade Estadual de Londrina – UEL, com o Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão em Sociologia – LENPES. Sobre a experiência do LENPES na UEL ver o artigo de Silva (2010). A Universidade Federal do Rio de Janeiro também criou o Laboratório de Ensino de Sociologia Florestan Fernandes, que, a cada dois anos, realiza o Encontro Estadual de Ensino de Sociologia – ENSOC. Para maiores informações acesse o site: .

A primeira seção, destinada à discussão sobre trabalho, possui cinco artigos e foi coordenada por Daniel Gustavo Mocelin, professor do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da UFRGS. De sua autoria, o capítulo que abre esta parte é denominado Olhares fundadores: a sociologia de Marx, Durkheim e Weber e propõe um estudo a partir de três eixos: perspectiva, abordagem e narrativa. Dessa forma, o autor faz uma sistematização das concepções apresentadas pelos clássicos da sociologia. O primeiro eixo analisa a biografia e o contexto histórico específico de observação e teorização de cada um dos clássicos, destacando os principais eventos que vivenciaram e privilegiaram em suas observações. O segundo eixo busca esclarecer as diferentes concepções científicas adotadas por cada autor, enfatizando as especificidades analíticas e os procedimentos metodológicos propostos. Por fim, o último eixo destaca aspectos fundamentais das elaborações teóricas apresentadas por Marx, Durkheim e Weber. Além disso, o autor faz referência aos pressupostos adotados em cada obra, com destaque para alguns conceitos centrais presentes em cada uma das teorias. O segundo artigo intitulado Alienação, solidariedade e racionalização: o trabalho no pensamento dos clássicos da Sociologia, de Valdir Pedde, visa focar esses conceitos a partir de Karl Marx, Émile Durkheim e Max Weber. A partir de Marx, a questão é vista através das relações de conflito entre capital e trabalho humano. “Das relações sociais de produção capitalista emerge a mais-valia e a alienação do trabalhador” (2013, p. 99). Em Durkheim, o autor

Ensino de sociologia: conteúdos didáticos e metodológicos

evidencia os conceitos de solidariedade mecânica e orgânica, apresentando a concepção funcionalista deste autor. Por sua vez, Weber é analisado a partir do conceito de racionalização, “pois o conceito de trabalho foi alterado apartir do protestantismo. Se no catolicismo medieval, o trabalho foi encarado como decorrência de castigo divino, no protestantismo, ele foi valorizado” na forma de glorificar a Deus (2013, p. 100). Estratificação e Desigualdade Social: olhares clássicos e contemporâneos, de Leandro Raizer e Mauro Meirelles, busca apresentar como Marx, Durkheim e Weber analisaram o fenômeno das desigualdades sociais. Em seguida, fazem uma síntese de algumas das muitas visões contemporâneas que hoje compõem o manancial teórico da sociologia no que se refere aos temas sobre estratificação e desigualdade. Utilizando recursos metodológicos como o coeficiente de Gini e o Índice de Desenvolvimento Humano, os autores fazem uma breve análise de 31 municípios que fazem parte do Conselho Regional de Desenvolvimento - COREDE da Serra Gaúcha. A análise busca aproximar as concepções sociológicas sobre o tema com a realidade dos estudantes, visto que é possível realizar este tipo de estudo em qualquer região brasileira, pois os dados, muitas vezes, estão diponíveis em bases online. Luís Fernando Santos Corrêa da Silva, em Globalização, novas tecnologias e mudanças no mundo do trabalho, evidencia como as novas tecnologias e a globalização alteraram o mundo do trabalho. A partir da discussão de alguns teóricos clássicos e contemporâneos, aponta características sobre a situação atual do trabalho, salientando sobre a importância da sociologia se reinventar, pois “os velhos conceitos parecem pouco operacionais neste cenário tão desafiador” (2013, p. 140). O texto que encerra esta primeira parte é de autoria da professora Naiara Dal Molin. Intitulado Trabalho e sindicalismo no Brasil: de 1930 até o fim do governo Lula apresenta importantes reflexões históricas sobre a trajetória do sindicalismo no Brasil. A autora busca demostrar como o Estado conseguiu modelar as bases do sindicalismo no país, diminuindo, assim, o poder dos trabalhadores sindicalizados. A segunda seção do livro é coordenada por Leandro Raizer, professor do Instituto Federal do Rio Grande do Sul, que já possui três artigos que visam discutir questões envolvendo a temática: Ciência. Dessa forma, o primeiro artigo intitulado Ciência, tecnologia e inovação: ferramentas para o desenvolvimento da sociedade, escrito por Cleber Cristiano Pradanow, traz algumas questões pertinentes para se pensar a ciência, inovação e tecnologia na universidade, no mercado de trabalho e na sociedade. Conforme o autor, é O público e o privado - Nº 24 - Julho/Dezembro - 2014

179

180

Marcelo Pinheiro Cigales

importante que o ensino superior esteja ligado à inovação e o Brasil precisa estar atento a isso. Pois de nada adianta, por exemplo, ser o maior exportador de grãos no mundo se o Brasil não for capaz de criar tecnologia e inovação para fazer com que essa matéria-prima seja industrializada e inovada a partir do próprio país de origem. Nesse sentido, conhecimento é poder. E, portanto, a capacidade de inovar junto à ciência e tecnologia é de extrema importância. Vitor Simonis Richter e Rodrigo Ciconet Dornelles apresentam no texto Ciência e processo de produção do conhecimento algumas visões clássicas e contemporâneas das abordagens teóricas e metodológicas acerca da compreensão do processo de produção do conhecimento científico. Para os autores, o processo de produção da ciência “só pode ser visto enquanto um fenômeno marcado por valores referentes ao momento histórico e cultural vivido pelos cientistas” (2013, p. 192). Tópicos sobre Ciência, Sociedade e Autoria no mercado de ideias: o lugar da ciência no mundo, de Norberto Kuhn Júnior, é o artigo que fecha esta segunda seção do livro. O autor busca discutir o valor do discurso científico nas sociedades contemporâneas que resulta tanto da sua capacidade produtiva quanto da sua capacidade política. Partindo do conceito de moldura, o autor faz algumas reflexões sobre os espaços de circulação de sentidos entre a fonte autoral dos discursos científicos e as instituições de pesquisa.

3 Uma outra abordagem sobre a utilização da antropologia em sala de aula através da etnografia dos Naciremas, ver em: FLEISCHER, Soraya. Ensaio à la Nacirema: relato de uma experiência docente em Antropologia. Café com Sociologia. v. 3, n. 1. 2014.

A terceira seção do livro é composta por quatro artigos que abordam temas ligados ao conceito de cultura, e foi coordenado por Valdir Pedde, professor do Programa de Pós-Graduação em Diversidade Cultural e Inclusão Social da Universidade Feevale. No artigo intitulado Conceitos fundantes na Antropologia: sobre cultura, etnocentrismo e relativismo cultural, Mauro Meirelles e Valéria Aydos apresentam o conceito de cultura e trazem um pouco da história de como ela foi construída e trabalhada na Antropologia. Também destacam outros conceitos como de relativismo cultural e etnocentrismo. Em seguida, fazem uma relação entre os conceitos abordados sua possível aplicabilidade em sala de aula. Para isso, fazem uso da etnografia sobre os Naciremas3. O artigo Mitos e lendas gaúchas: do folclore à antropologia, de Ceres Karam, Brum busca evidenciar conceitos como de narrativa, folclore e mito, fazendo relações com mitos e lendas gaúchas, demostrando como estes sofrem alterações no decorrer do tempo. O principal mito destacado é de Sepé Tiaraju, comandante das tropas missioneiras, que já; morto pelos exércitos coloniais luso-hispânicos em 1756. Herói nacional e regional Sepé Tiaraju é analisado no texto, visto que sua história é contata até hoje nas Missões, região onde ele habitou.

Ensino de sociologia: conteúdos didáticos e metodológicos

Por sua vez, Cultura erudita e cultura popular: entre dissonâncias e correspondências, de José Rogério Lopes e André Luiz da Silva, discute como esses conceitos se construíram e se polarizaram no decorrer da história. Por outro lado, os autores buscam discutir até que ponto essa divisão ainda é visível, dado que “cada vez menos os indivíduos estão condicionados por uma única lógica de formação, vivenciando experiências diversas em suas trajetórias” (2013, p. 296). E para encerrar esta parte, Cultura de massa e consumo: onde meios, mensagens e pessoas se cruzam, de César Steffen, apresenta as principais correntes teóricas que abordam o fenômeno da cultura de massa, diferenciando suas premissas e principais ideias. O autor também busca fazer uma síntese dessas correntes de pensamento contrapondo com o cenário atual. A última seção foi organizada por Graziele Ramos Schweig, doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da UFRGS, e busca discutir as questões referentes à diversidade. O primeiro dos cinco artigos é de autoria de Wrana Panizzi e Mauro Meirelles. Intitulado Educando para a diversidade: a Iniciação Científica como uma atividade extra classe, o artigo parte da vivência dos autores com o trabalho e gestão da Iniciação Científica para discutir as vantagens que esse programa propícia aos estudantes envolvidos. Em um mundo do trabalho cada vez mais exigente e em constante transformação, a possibilidade de participar dessa formação, é sem dúvida, um passo a frente para o sucesso na carreira pessoal e profissional. Cledes Antonio Casagrande, em Educação para a diversidade: um olhar a partir da Universidade, discute o conceito de diversidade na sociedade contemporânea, bem como suas múltiplas interpretações. Através desse conceito o autor discorre sobre o papel que a universidade desempenha enquanto elemento promotor da diversidade, visto que o respeito à diferença e a outras formas de perceber e compreender o mundo, assim como a prática do diálogo, são essenciais e devem compor essa entidade formativa. Em Os índios no Brasil: políticas de Estado e direitos indígenas Marcio Martins dos Santos faz um levantamento histórico-antropológico sobre a legislação que define o direito dos povos indígenas no país. A partir disso, discute impasses e avanços em relação ao direito dessas populações junto ao Estado. Também enfatiza o papel da Antropologia e das Ciências Sociais na formação dos cientistas sociais. Uma formação que esteja vinculada a uma concepção crítica e, ao mesmo tempo, contribua para o desenvolvimento de uma visão ampla sobre os problemas sociais. O público e o privado - Nº 24 - Julho/Dezembro - 2014

181

182

Marcelo Pinheiro Cigales

O artigo de Rosa Maria Castilhos Fernandes, intitulado Educação e desigualdade social: quando as minorias étnicas adentram a Universidade, aborda a educação como direito social e traz aspectos da sua dimensão social, histórica e política, relacionando a teoria com a prática sobre as ações afirmativas, as minorias étnicas e o sistema de cotas para o ensino superior no Brasil, para, então, apontar as diversas polêmicas e embates com relação a essa política de cotas, onde observa posições contrárias e a favor dessa política pública (2013, p. 383). As políticas Públicas no Brasil e a inclusão escolar para pessoas com deficiência: problematizando os doxas instituintes é o artigo que encerra o livro. De autoria de Valdir Pedde, Mauro Meirelles, Leandro Raizer e Fátima Liliane Oliveski Roth, busca analisar o processo de implementação do Programa Educação Inclusiva: direito à diversidade, no âmbito das políticas educacionais, desde sua criação até os dias atuais. Os trabalhos que compõem este primeiro volume da coleção Olhares Contemporâneos são ricos em conteúdo e reflexão, tanto para os professores de sociologia da educação básica e superior quanto para os graduandos na área de Ciências Sociais. A pluralidade dos temas abordados no livro e a qualificação dos autores enriquecem ainda mais este material, que não permanece somente nas reflexões teóricas, pois propõe formas de trabalhar o texto em sala de aula. Dessa maneira é possível afirmar que Sociologia: trabalho–ciência-cultura-diversidade é uma ferramenta didática e metodológica que vem agregar conhecimento e dar suporte material aos professores e estudantes de Ciências Sociais, visto que os temas e discussões são atuais e estão presentes no ensino de sociologia.

Referências BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Decreto-Lei nº 11684/2004, de 2 de Junho de 2008. Inclusão da Filosofia e Sociologia como disciplinas obrigatórias nos currículos do Ensino Médio. Disponível em: . Acesso em: nov. de 2013. BRASIL, Ministério da Educação. Orientações Curriculares Nacionais. Brasília, 2006. FLEISCHER, Soraya. Ensaio à la Nacirema: relato de uma experiência docente em Antropologia. Café com Sociologia. v. 3, n. 1, 2014.

Ensino de sociologia: conteúdos didáticos e metodológicos

HANDFAS, Anita; SANTOS, Mario Bispo dos. O livro didático de sociologia em debate. In: GONÇALVES, Daniela Nillin (org.). Sociologia e Juventude no Ensino Médio: formação, PIBID e outras experiências. Campinas: Pontes, 2013. LABORATÓRIO VIRTUAL E INTERATIVO DE ENSINO EM CIÊNCIAS SOCIAIS. LAVIECS. Disponível em . Acesso em: mar. de 2014. SILVA, Ileizi Luciana Fiorelli. O ensino de Sociologia como laboratório: educação e formação de professores nos projetos do Departamento de Ciências Sociais da UEL – LES/GAES/LENPES (1994-2009). In: CARVALHO, Cesar Augusto de (org.). A sociologia no ensino médio: uma experiência. Londrina: Eduel, 2010.

O público e o privado - Nº 24 - Julho/Dezembro - 2014

183

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.