ENSINO DE VIOLÃO: ESTRATÉGIAS DE CORREÇÃO E ORIENTAÇÃO NO PROCESSO DE FORMAÇÃO DE VIOLONISTAS SOLISTAS

July 3, 2017 | Autor: Luan Sodré | Categoria: Music Education, Guitar, Música, Guitar Pedagogy, Educação Musical
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ENSINO DE VIOLÃO: ESTRATÉGIAS DE CORREÇÃO E ORIENTAÇÃO NO PROCESSO DE FORMAÇÃO DE VIOLONISTAS SOLISTAS Luan de Souza Sodré [email protected] Ana Cristina Tourinho Gama dos Santos [email protected] RESUMO Este trabalho trata-se de um recorte da pesquisa "Ensino de violão: Estratégias para a formação de violonistas solistas em uma classe de Seminários em Instrumento". O texto traz um panorama do referencial teórico utilizado, descrição da metodologia aplicada e parte dos dados obtidos na pesquisa. O objetivo deste trabalho é mostrar a relação encontrada entre estratégias de condução da aprendizagem empreendidas por um professor de violão de um curso de bacharelado em instrumento e o desenvolvimento de estratégias de autorregulação da aprendizagem dos estudantes. Desta forma, pretendemos descrever e discutir como este professor conduziu os trabalhos de correção e orientação da performance dos alunos em sala de aula afim de desenvolver as habilidades autorregulatórias.

A PESQUISA E O SRSD A pesquisa trouxe a análise de um contexto visto por diversos olhares, com destaque para estratégias de condução da aprendizagem. Configurou-se como um estudo de caso de caráter qualitativo, YIN (2001); BOGDAN & BIKLEN (1994), conduzido em uma classe de seminário em instrumento, integrante da matriz curricular do curso de bacharelado em instrumento/violão da UFBA27, com aulas em grupo e carga horária semestral de 68 horas. Foi possível observar que as estratégias utilizadas pelo professor, embora este não assumisse seguir nenhum modelo instrucional, tinham relação com o modelo SRSD (Self-Regulated Strategies Development 28 ), que é, Segundo Harris, Graham e Santangelo (2013), um formato estruturado de instrução que visa uma aprendizagem autorregulada, um modelo de ensino que garante estratégias gerais e específicas da área do conhecimento, além de procedimentos de autorregulação. Este modelo, estruturado para o desenvolvimento de estratégias de escrita, aqui foi analogicamente voltado para a Educação Musical. Combina instruções explícitas com procedimentos de autorregulação: configuração 27 28

 Universidade  Federal  da  Bahia  Estratégias  de  desenvolvimento  autorregulado  [Tradução  nossa]

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de metas, autoinstrução, auto-monitoramento e auto-reforçamento. O SRSD envolve ativação, gerenciamento e manutenção da cognição, além de comportamento e afetos no suporte de metas. As principais características desse modelo são: 1) Seus estudantes são providos de sistemática e explícita instrução. 2) Busca atender o domínio cognitivo, afetivo e comportamental. 3) O atendimento é individualizado, levando em consideração as necessidades e esforços de cada individuo. 4) O progresso dos estudantes é baseados em seus níveis individuais. 5) Procedimentos que promovem um longo período de manutenção e a Generalização (HARRIS; GRAHAM; SANTANGELO, 2013). O modelo é composto pelos estágios descritos a seguir: No estágio Discussão alunos e professores discutem a estratégia utilizada, estabelecem objetivos e exploram como e quando a estratégia acontece, lançando bases para a generalização, não limitando a discussão à sala de aula ou à tarefa. Cabe também pontuar que os estudantes são ensinados a selecionar os objetivos de modo individual e específico para: 1) aprender a estratégia; 2) usá-la e 3) manter a mesma em uso. Na Modelação o professor fala o modelo, demonstrando como tocar, mostrando estratégias de autorregulação ao longo do processo de construção da performance. O professor dá o modelo para definir metas específicas com tarefas de tocar, monitorar o auto-desempenho e o auto-reforço. As autoinstruções para definição de problemas, foco na atenção e planejamento, implementação de estratégias, auto-avaliação, enfrentamento e auto-reforçamento são usadas enquanto o professor atua enquanto modelo. A Memorização começa no primeiro estágio, conforme os alunos participam de atividades divertidas e atraentes. Ajuda-os a memorizar os passos da estratégia, o significado de cada passo e seus autorrelatos personalizados. No Suporte o professor auxilia as performances e as estratégias de autorregulação usadas pelos alunos enquanto eles trabalham juntos. Gradualmente, os alunos assumem a responsabilidade pela sua performance e pelas estratégias de autorregulação. No Desempenho independente são oferecidas oportunidades aos estudantes para usar suas performances e estratégias de autorregulação sem o suporte do professor ou dicas. Devido à identificação de algumas características do modelo SRSD nas aulas do professor observado na pesquisa, da possível relação entre as estratégias adotadas por ele e os estágios do modelo, pudemos observar um ensino voltado para o desenvolvimento da autorregulação da aprendizagem dos estudantes. Assim, o objetivo principal para aquisição de habilidades de 117

autogerenciamento dos estudos, permitiu uma condução do processo de aprendizagem diferente dos que geralmente são praticados em turmas onde o foco está centrado no ensino de determinada peça ou conteúdo técnico-musical. Ainda, as características desta classe incluíam objetivos que iam além da execução de determinada peça e que os estudantes se tornassem independentes o mais rápido possível e adquirissem técnicas para resolver questões da performance musical.

AS ESTRATÉGIAS Os dados foram coletados por meio de 8 observações/filmagens, sendo 4 transcritas na íntegra, gerando 4 cadernos de transcrição (CT), além de uma entrevista semiestruturada feita com o professor. Durante a análise, os dados foram caracterizados com números e títulos dos eventos identificados no CT1 e em seguida agrupando as ações afins. Esta síntese levou a 5 grupos de ações do professor: Gerenciamento da aula; Detecção e exposição de problemas; Correção e orientação; Avaliação; e Interação com a classe. Nos cadernos seguintes, a busca foi focada nos grupos identificados no primeiro caderno. Após este processo, as ações recorrentes foram reagrupadas, dando origem a 37 estratégias. Neste texto focaremos no grupo de estratégias de correção e orientação, referente às ações que foram empreendidas pelo professor para corrigir e orientar os alunos, a classe e/ou ambos. Neste grupo emergiram 12 estratégias, descritas a seguir: 1) Preparava o estudante para momentos de estudo extraclasse. O professor testava em sala, junto com o estudante, a mesma atividade proposta para seus estudos individuais, evitando que o estudante estudasse de forma equivocada. Buscava desenvolver a capacidade de planejar, estruturar e acompanhar os próprios estudos e ainda mecanismos para criar metas de curto e longo prazo. Esses momentos clarificaram a iniciativa de desenvolver estratégias autorregulatórias nos estudantes. É possível relacionar esta estratégia com o estágio denominado Modelação do SRSD. Nele o professor dá o modelo, demonstrando como tocar e orientando estratégias de autorregulação ao longo do processo de construção da performance. O professor oferece o modelo para definir metas específicas durante a tarefa de tocar, monitorar o auto-desempenho e o auto-reforço. 2) Estimulava o estudante à ter uma visão crítica da sua execução, a perceber e corrigir os problemas que estava habilitado a resolver. O professor questionava

acerca dos problemas da

performance e possíveis soluções. Aspectos como notas erradas, limpeza do som, ritmo, intenção, interpretação e ideia musical faziam parte das indagações. Segundo Robert Duke:

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[...] quanto mais os professores corrigem os erros dos estudantes, é menos provável que estas correções se tornem partes duradouras do pensamento e comportamento dos estudantes. Os estudantes devem ter mais oportunidades para identificar e corrigir seus próprios erros, mesmo que isso requeira mais tempo do que seria necessário se seus professores fizessem toda a correção por eles (DUKE, 2012, p.37, tradução nossa). O professor aproveitava os momentos de indagações para orientar os estudantes sobre como deveriam proceder. Esta estratégia poderia se relacionar com o SRSD no estágio de Desenvolvimento e ativação de conhecimento prévio, visto que os alunos só conseguem identificar e resolver um problema se ele ativar o seus conhecimentos prévios. A estratégia ainda poderia ser relacionada com o estágio Suporte, visto que os questionamentos e a ativação de uma visão crítica da performance é também suporte no processo de construção da aprendizagem do aluno. 3) Expunha os problemas para os estudantes, orientando-os. O professor emitia opiniões próprias, avaliando e apresentando o caminho que escolhera para resolver aquele problema. Costumava também explicar porque considerava tal situação um problema. É possível relacionar esta estratégia com o estágio Modelação do SRSD, pois o professor tentava modelar o estudante através de suas orientações e demonstrações. 4) Orientava o estudante durante a execução. Para este processo de Modelação, o professor utilizava diversos recursos, destacando-se as orientações verbais, solfejo da melodia, gestos corporais, expressões corporais, estalo de dedos, percussão corporal, encenações e onomatopeias. Criava letras para as frases instrumentais e utilizava-se da regência, propondo que o estudante executasse a peça de outras maneiras, isolando as vozes, os acordes e as frases, dentre outras possibilidades. 5) Fazia explanações dirigindo-se para toda a classe. Em muitos casos, o professor explanava a partir da dificuldade ou do trabalho desenvolvido com o aluno executante. Essa era também uma iniciativa de envolver toda a classe nas ações que estavam sendo desenvolvidas. 6) Estimulava o estudante a buscar as soluções e resolver problemas técnicos-musicais. Nem sempre o professor resolvia a situação para o aluno. Apontava o problema, dava algumas diretrizes e estimulava que o aluno buscasse uma maneira de resolvê-lo. Esta estratégia poderia ser relacionada com o estágio do SRSD chamado de Desempenho Independente, pois é dada a oportunidade ao estudante de conectar os seus conhecimentos prévios a novas orientações para que, de forma independente, encontrasse uma solução.

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7) Corrigia o estudante dando suporte para o seu desenvolvimento. O professor não apenas indicava o que considerava correto para a situação. Mas aproveitava para orientar os estudantes amplamente em relação ao aspecto trabalhado. Utilizava problemas para uma análise mais ampla, fundamentando suas correções de forma que as orientações passavam a significar para os estudantes. Explicava trechos e concepções que estavam por trás do fragmento, ampliando a imagem que os alunos faziam da peça, filosoficamente, conceitualmente e tecnicamente. Esta estratégia poderia ser relacionada com os estágios Suporte e Modelação do SRSD. 8) Propunha atividades visando facilitar a compreensão do conteúdo pelos estudantes. Dentre diversas ações, propunha que o aluno isolasse elementos da peça para melhor compreensão de elementos isolados e depois reunia-os de forma mais abrangente. Criava letras para as melodias instrumentais, facilitando o processo de transmissão das ideias musicais; propunha abstrações para que os estudantes imaginassem que o seu instrumento era uma orquestra, com intenção de imaginar uma orquestra no violão, simulando instrumentos, usando recursos técnicos e timbrísticos; Propunha que o estudante trabalhasse a condução de vozes, tocasse uma voz e cantasse a outra; pedia que fosse executado um trecho e que a classe levantasse a mão a cada frase. Após identificar as frases, discutia uma orquestração imaginária, com cada aluno representando o instrumento escolhido e o aluno executante tocando e dando uma pseudo entrada aos instrumentos, acenando com a cabeça. Talvez uma regência mas usando o recurso timbrístico planejado, dando a entender qual o instrumento escolhido. A estratégia descrita poderia ser relacionada com o estágio Modelação do SRSD pois, a partir destas atividades, o professor buscava modelar os alunos de diversas formas. 9) Grafava algumas intervenções. Em alguns casos, o professor grafava na partitura ou criava uma representação gráfica para sinalizar o que estava sendo trabalhado. Quando grafava, socializava para todos os presentes na sala. Essa estratégia poderia ser relacionada ao processo de Modelação defendido pelo SRSD. Além disso, pode estar relacionada ao estágio de Suporte e o de Memorização. 10) Tocava junto com o aluno. Durante as aulas o professor tocava junto com os estudantes, visando diferentes objetivos. 11) Explica demostrando no instrumento. O professor fazia explanações enquanto executava os trechos, fazendo comentários diversos. Em casos de sugestões de digitação, também era comum que o professor as experimentasse e fizesse comentários. 12) Pedia a opinião dos presentes na sala. O professor pedia a opinião da classe em relação a aspectos da execução de um colega ou de um tema que estivesse sendo comentado. Esta iniciativa 120

gerava um ambiente colaborativo onde os estudantes trocavam opiniões. Essa estratégia poderia ser relacionada com o SRSD no estágio de Discussão e Modelação, pois na iniciativa de modelar a execução dos estudantes, o professor buscava promover diálogos entre os presentes com relação a este processo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS Desta forma, a SRSD foi utilizado neste trabalho, como referencial teórico, tendo em vista as analogias que foram possíveis ser feitas, estudando a teoria e observando o trabalho em classe do professor. Embora o mesmo tenha declarado em entrevista, ser “um instrumentista que dá aulas” e que não recebeu nenhuma preparação específica para ser professor de instrumento, é notório o seu êxito na preparação dos alunos do curso de bacharelado em instrumento / violão. Além disso, vale ressaltar a importância e os desdobramentos do caminho de condução da aprendizagem escolhido por esse professor na vida profissional e pós-acadêmica dos seus estudantes. Visto que durante a profissão, a maioria não terá seus professores ao lado para preparar os seus programas de recitais, nem para resolver os problemas técnico-musicais que poderão ocorrer. Entendo que a leitura do SRSD e as relações feitas com a prática profissional abordada na pesquisa seja um ponto de partida para reflexões maiores que dizem respeito à concepção dos interesses nas classes de ensino de violão, trazendo uma visão de que os objetivos nas classes de formação de instrumentistas podem ir além da mera aquisição de conteúdos técnicos-musicais e da preparação de peças instrumentais. O que pode contribuir para uma reforma na preparação de violonistas / solistas, principalmente na graduação em música.

REFERÊNCIAS BOGDAN, R. C.; BIKLEN, S. K. Investigação Qualitativa em Educação. Porto: Porto Editora, 1994. DUKE,   R.   A.   Their   Own   Best   Teachers:   How   We   Help   and   Hinder   the   Development   of   Learners’   Independence. Music Educators Journal. December. 2012. p. 36-41. HARRIS, K. R.; GRAHAM, S.; SANTANGELO, T. Self-Regulated Strategies Development in Writing: Development, Implementation, and Scaling Up. In: BEMBENUTTY, H.; CLEARY, T. J.; KITSANTAS, A. (Ed) Applications of Self-Regulated Learning across Diverse Disciplines: A Tribute to Barry J. Zimmerman. Charlotte: NC, IAP Inc 2013. p. 59–87.

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YIN, R. K. 
 Estudo de caso: Planejamento e Métodos. Tradução Daniel Grassi. 2.ed. Porto Alegre : Bookman, 2001.

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FESTIVAIS DE COROS DO RIO GRANDE DO SUL (1963-1978): PALCO DE PRÁTICAS MÚSICO-EDUCATIVAS Lúcia Helena Pereira Teixeira UFRGS/UNIPAMPA [email protected] RESUMO Esta comunicação apresenta alguns resultados de uma pesquisa de doutorado que tomou por foco os Festivais de Coros do Rio Grande do Sul, na cidade de Porto Alegre, Brasil, durante o período 19631978. A investigação, de caráter qualitativo (PIRES, 2010; GONZÁLEZ REY, 2005; MELUCCI, 2005), teve por objetivos: 1) examinar como eram mobilizadas as práticas músico-educativas nos Festivais de Coros e 2) descrever e analisar quais práticas músico-educativas eram geradas e impulsionadas pela dinâmica dos Festivais. O material empírico é proveniente de fontes orais (entrevistas em história oral) e escritas (artigos de jornais, cartas de um dos organizadores e programas musicais dos Festivais). Práticas músico-educativas foram se constituindo e sendo propaladas a partir da ação dos agentes participantes dos Festivais. A partir de uma comissão organizadora foi institucionalizada a Associação dos Festivais de Coros do Rio Grande do Sul, que passou a mobilizar atores internos (coros, regentes, imprensa e público) e externos (autoridades, governos, patrocinadores e apoiadores). Examinar o que era exigido e que dinâmica movia regentes, coros e público a participar dos Festivais de Coros, ajuda a compreender as aprendizagens geradas e impulsionadas pelo contexto. A transmissão e apropriação musicais ocorridas naqueles eventos precisam ser observadas a partir da rede de relações que os agentes estabeleciam entre si. Assim, qualquer referência ao processo de ensino-aprendizagem dos participantes dos Festivais está atrelada às figurações formadas por eles (ELIAS, 1994). Palavras-chave: Festivais de coros, práticas músico-educativas, Sociologia da Educação Musical ABSTRACT This communication presents some results from a doctorate research that focused the Choirs Festivals of Rio Grande do Sul, in the city of Porto Alegre, Brasil, during the period 1963-1978. The investigation, that has a qualitative character (PIRES, 2010; GONZÁLEZ REY, 2005; MELUCCI, 2005), had the following aims: 1) to examine how music educational practices were mobilized in the Choirs Festivals; 2) to describe and analyze which music educational practices were generated and

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