“Enterrar os mortos e cuidar dos vivos”. Desastres naturais, respostas culturais: Sesimbra e o ciclone de 1941

June 24, 2017 | Autor: João Dias | Categoria: Environmental History, Natural Hazards, Storms, Cyclones
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Freitas, J.G.; Dias, J.A. (2015) - “Enterrar os mortos e cuidar dos vivos”. Desastres naturais, respostas culturais: Sesimbra e o ciclone de 1941. In: Davis Pereira de Paula & J. Alveirinho Dias (orgs.), Ressacas do Mar / Temporais e Gestão Costeira, pp.121-172, Editora Premius, Fortaleza, CE, Brasil. ISBN: 978-85-7924-440-7

Capítulo

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“ENTERRAR OS MORTOS E CUIDAR DOS VIVOS”. DESASTRES NATURAIS, RESPOSTAS CULTURAIS: SESIMBRA E O CICLONE DE 1941

Joana Gaspar de Freitas1, João Alveirinho Dias2

1. Introdução Os desastres naturais são geralmente entendidos como manifestações súbitas e imprevisíveis da natureza, que têm consequências negativas sobre os seres humanos. Mas estes desastres — entre os quais sismos, maremotos, temporais, etc. —, não podem ser analisados tendo apenas em conta as suas causas naturais, porque na verdade estes eventos só se tornam “desastres” ou “catástrofes” em função do seu impacte sobre as comunidades humanas (MAUELSHAGEN, 2009, p. 42; MAUCH, 2009, p. 4). Com efeito, a extensão dos danos materiais e não materiais é causada tanto pela energia das forças naturais como pela vulnerabilidade das comunidades atingidas. Essa vulnerabilidade IELT, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade Nova de Lisboa, Avenida de Berna, 26 – C, 1069-061 Lisboa; Centro de História, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, Alameda da Universidade, 1600-214 Lisboa, joana.gaspar. [email protected] 2 CIMA, Universidade do Algarve, Edifício 7, Campus de Gambelas, 8005-139 Faro, Portugal, [email protected] @ Autor de correspondência: 1

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é composta por um conjunto de fatores que determinam a amplificação ou a mitigação dos efeitos dos fenômenos naturais. Entre eles contam-se a exposição das populações ao risco e a sua capacidade de resposta, que dependem de elementos tão variados como o local de implantação, a condição social e econômica dos grupos, as atividades desenvolvidas e a dependência dos recursos, a qualidade/resistência das habitações, a capacidade técnica de intervenção e até a possibilidade de recorrer a instrumentos financeiros como os seguros (PFISTER, 2009, p. 20-21). Tudo isto faz com que a vulnerabilidade dos seres humanos face às ameaças naturais apresente grande variabilidade no tempo e no espaço e que dependa muito dos contextos culturais, sociais, políticos, econômicos e demográficos. A maioria dos planos de gestão de desastres está dividida em três fases: emergência, recuperação e reconstrução. Aplicadas ao passado, estas categorias são úteis como instrumentos de análise para perceber como diferentes grupos humanos atuaram perante a catástrofe e como se articularam diferentes forças — locais, regionais, nacionais — em resposta ao evento, no socorro às vítimas, no restabelecimento das atividades do quotidiano, na reconstrução de infraestruturas e até na adoção de medidas mitigadoras de futuros eventos catastróficos (PFISTER, 2009, p. 21). Utilizando esta grelha de interpretação, são analisadas neste artigo as consequências do ciclone de 15 de fevereiro de 1941, no território continental português, de forma geral, e na vila piscatória de Sesimbra, em particular (Figura 1). Examinam-se os acontecimentos ocorridos no dia do ciclone; faz-se um cômputo geral de vítimas e danos; e registra-se o papel de entidades locais e nacionais, públicas e privadas, na ajuda às populações

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e na recuperação dos modos de vida das comunidades. O objetivo final é refletir sobre o impacte deste evento extremo em Sesimbra, tendo em consideração fatores como as características meteorológicas do fenômeno, a exposição da população ao risco, o contexto social e econômico dos mais atingidos, a capacidade de mobilização (financeira e técnica) das instituições, as marcas culturais do desastre perpetuadas na memória coletiva e as lições aprendidas (se as houve).

Figura 1. Localização de Sesimbra, na costa W de Portugal, a sul da Serra da Arrábida, junto a Setúbal e ao estuário do rio Sado (Montagem a partir de imagens do GoogleMaps).

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2. Materiais e Métodos Os estudos existentes sobre o temporal (normalmente apelidado de ciclone) que, em 1941, atingiu a Península Ibérica centram-se majoritariamente na caracterização meteorológica do fenômeno (CERECEDA, 1941; PITA, 1941; RUBIO, 2001; LIBERATO; TRIGO, 2012) e na avaliação dos prejuízos registados, quer a nível nacional, quer local (MUIR-WOOD, 2011; NUNES et al., 2011/12). Freitas e Dias (2013) fizeram uma breve abordagem aos efeitos do ciclone em Sesimbra e na Ria Formosa, analisando as possíveis consequências da ocorrência, nos dias de hoje, de um evento do mesmo tipo naquelas localidades, destacando o papel da história e da memória para evitar comportamentos de risco, como a ocupação intensiva das zonas costeiras. O presente artigo pretende desenvolver algumas das temáticas acima referidas, mas, focando sobretudo as pessoas e as instituições, as ações e as memórias, ou seja, a componente humana (social e cultural) do “desastre”, como preconizado por Mauch e Pfister (2009). Este trabalho assume uma abordagem de caráter interdisciplinar, utilizando conceitos e métodos das Ciências Sociais e Humanas — sobretudo da História — e das Ciências Naturais e Exatas. A investigação baseou-se na identificação e recolha de informação de fontes primárias e secundárias. Entre estas, a imprensa da época é, sem dúvida, a mais importante para o conhecimento do impacte do ciclone no território nacional e para perceber as medidas tomadas com vista à recuperação. A pesquisa realizada nos Arquivos Nacionais — Torre do Tombo, Biblioteca Nacional, Biblioteca e Arquivo Histórico das Obras Públicas e Arquivo Histórico da Marinha — permitiu: a) constatar a escassez de informação relativa ao ciclone, a nível dos arquivos das

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instituições centrais (ter-se-á perdido? estará num arquivo que não foi consultado?), o que contrasta com a importância que lhe atribuíram os jornais e a opinião pública nacional; b) encontrar um conjunto de material avulso, de características diversas (notas, relatórios, correspondência, registros meteorológicos e náuticos), que possibilitou conhecer com relativo pormenor as diferentes fases da gestão do desastre. Já no Arquivo Histórico Municipal de Sesimbra foi possível recolher muita documentação sobre o ciclone e suas consequências na vila. Através dos técnicos da Câmara Municipal de Sesimbra conseguiu-se também algum material, produzido por ocasião da sessão evocativa do ciclone, promovida pela Municipalidade, em 15 de fevereiro de 2011. A informação histórica compilada — escrita e iconográfica — foi confrontada entre si e devidamente contextualizada através do recurso à historiografia produzida sobre a área em estudo. Toda a documentação reunida foi analisada de acordo com a perspectiva aqui abordada — os aspectos humanos do desastre natural —, tendo como suporte teórico a bibliografia científica produzida sobre o ciclone e sobre os impactes de fenômenos naturais noutras populações. Através do cruzamento destes múltiplos dados pretendeu-se obter uma interpretação mais coerente de uma realidade complexa e multifacetada.

3. Resultados e Discussão 3.1 Caracterização meteorológica O ciclone de fevereiro de 1941 foi a maior tempestade que, no século XX, atingiu a orla costeira portuguesa. As condições meteorológicas então registadas não se repetiram até hoje (FREITAS; DIAS, 2013, p.1).

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Os anos de 1940 e 1941 foram caracterizados por índice da NAO negativo, quer o anual (?1,24 e ?1,24), quer o de inverno (-3,2 e ?2,5) (índices com base nas estações de Lisboa, Portugal e Stykkisholmur/Reykjavik, Islândia disponíveis em HURRELL, s.d.). Nestas condições, a trajetória dos temporais atacou mais as costas da fachada atlântica da Península Ibérica, isto é, houve maior frequência de temporais. A partir de 11/12 de Fevereiro de 1941 instalou-se uma vasta depressão a W da Irlanda, que ocupava grande parte do Atlântico Norte, e estendia a sua influência à Península Ibérica. Segundo dados do Observatório Infante D. Luís, em Lisboa, a pressão atmosférica começou a baixar logo no dia 8. Às 15:00 desse dia a pressão era de 1012.6 hPa (hectoPascais), ou seja, um valor considerado “normal” (o normal teórico é de 1013 hPa), mas que foi diminuindo continuamente nos dias seguintes (às 15:00), mantendo-se baixa durante um período relativamente prolongado (Figura 2). No dia 11, às 15h, estava já abaixo da barreira dos 1000 hPa, só voltando a ultrapassá-la no dia 18 às 09:00 horas. De acordo com os dados aludidos, verificou-se uma descida de 43 hPa em 24 horas (média de ±1,8 hPa / hora). Acresce que, a média da descida da pressão atmosférica foi de ±2,0 hPa / hora entre as 21:00h de dia 14 e as 09:00h de dia 15 (passando de 995,9 para 971,2), e de ±3,2 hPa / hora entre as 09:00h e as 15:00 de dia 15h (passando de 971,2 para 952,1) (ANAIS DO OBSERVATÓRIO, 1942, II, p. 16). É de considerar que, normalmente, descidas da ordem de 1 hPa por hora conduzem a situações meteorológicas de grande violência, o que, realmente, se verificou.

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Figura 2. Pressão atmosférica registada em Lisboa, no Observatório Infante D. Luís (observações às 9h, 15h e 21 horas), entre os dias 7 e 20 de fevereiro de 1941 (Gráfico de J.A. Dias).

Devido à situação sinóptica, com as baixas pressões localizadas a NW e a W de Península, a circulação era do tipo depressionário, com ventos dos quadrantes W, SW e S., o que é confirmado pelos registros do Observatório Infante D. Luís, que indicam que as direções predominantes foram de WSW no dia 14 e de S no dia 15. Nestas circunstâncias, geraram-se ventos muito fortes, tendo-se registrado no dia 15 a rajada máxima de 129 km/h (ANAIS DO OBSERVATÓRIO, 1942, II). Nestas condições, com baixas pressões excepcionais e ventos fortes de Sul, não é de estranhar que Sesimbra, cujo litoral se desenvolve, grosso modo, Este – Oeste, estando virado a sul, estivesse completamente desabrigado das ondas provenientes dos quadrantes de Sul, e fosse duramente atingida. Como a superfície marinha é uma superfície livre equipotencial, reage ao aumento de pressão atmosférica de 1 hPa através de uma sobre-elevação de 10 mm. Como, de dia 14 para 15, a pressão baixou 43 hPa, tal significa, só por si, uma sobre-elevação

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de quase meio metro. Considerando a pressão mínima registrada (952,1 hPa), pode dizer-se que, apenas devido ao efeito do abaixamento da pressão atmosférica, se verificou uma sobre-elevação superior a 60 cm relativamente ao nível característico de pressões normais. Para além disso, a Lua Nova foi, em fevereiro de 1941, no dia 12, o que significa que era ainda período de marés vivas. O valor mais baixo registrado da pressão atmosférica ocorreu mais ou menos em meia maré (15 horas), pois que, segundo a tabela de marés (JUNTA AUTÔNOMA DAS OBRAS DO PORTO, 1941), a baixamar e a preamar ocorreram, respetivamente, às 10:50 e às 17:35 horas. Considerando que o nível teórico calculado para a preamar foi de 3,65 m (relativamente ao Zero Hidrográfico), apenas por efeito da pressão atmosférica o nível marinho deve ter ultrapassado os 4,2 m, ou seja, 2,2 m acima do nível médio do mar teórico. Ao efeito da sobre-elevação do nível do mar devido ao abaixamento da pressão atmosférica há que adicionar a influência do vento. Sendo o vento de WSW e de S, verifica-se o empilhamento da água contra a costa, que se desenvolve Este – Oeste. Com ventos de mais de 100 km/h, o volume de água mobilizado e empurrado contra a costa foi, seguramente, muito grande. Considerando a configuração deste litoral, com a serra da Arrábida, em cuja costa se localiza Sesimbra, disposta mais ou menos E-W, com a restinga de Tróia, a oriente da localidade considerada, disposta grosso modo N-S, e com o estuário do Sado muito possivelmente em situação de cheia, a água empilhada pelo vento não tinha por onde sair (Figura 1), pelo que se pode pressupor que ocorreram valores de sobre-elevação muito elevados. Refira-se que, no temporal de 1981/82, não tão intenso como o de Fevereiro de 1941, a sobre-elevação determinada no marégrafo de Tróia foi de 1,05 m

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(TABORDA; DIAS, 1992). Aliás, tal parece ser convergente com o que se passou em Leixões, dentro do porto, em 1941, onde a tabela de marés indicava a altura de 3,40 m, registando-se o valor de 4,32 m, tendo o estilete de marcação do marégrafo ultrapassado o limite do curso (NOGUEIRA, 1942, p. 55), o que permite deduzir uma sobre-elevação superior a 92 cm. Nestas condições, é de admitir que, em Sesimbra, completamente desabrigada, a sobre-elevação do nível do mar (devido à pressão atmosférica e à ação do vento) tenha ultrapassado largamente um metro. Era neste nível sobreelevado que se propagavam as ondas. Embora não haja registos, certamente que tinham altura significativa (Hs) bastante grande, sendo muito provável que fosse expressivamente superior a 10 metros. Com efeito, temporais com Hs > 10 m têm, na costa oeste portuguesa, período de retorno relativamente curto, da ordem de 5 a 10 anos (e.g., PIRES; PESSANHA, 1986a, b; CARVALHO, 1992; FERREIRA, 1993). É de presumir que, nas condições excecionais do temporal (ciclone) de 1941, a Hs fosse significativamente maior. Não é, portanto, de estranhar que, na altura, “ondas alterosas [fossem] rebentar nos largos e ruas circunvizinhas à praia e [se estendessem] pela parte baixa da vila. Os estabelecimentos e armazéns à beira-mar foram inundados e todos os haveres arrebatados pelo mar” (O CEZIMBRENSE, 23-2-1941).

3.2 Fase 1: Emergência No ano de 1941, em plena Segunda Guerra Mundial, Portugal “fundamentalmente rural, de indústria pouco desenvolvida, periférico e dependente” sentia — apesar do estatuto de neutralidade — “os efeitos das desordens econômicas

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da guerra” agravados pela debilidade estrutural da sua economia, nomeadamente a dependência externa em combustíveis, matériasprimas industriais, bens alimentares e outros produtos essenciais. A impossibilidade ou dificuldade na importação de certos bens originaram no primeiro semestre daquele ano o esgotamento de vários artigos, o que conduziu à inflação, ao açambarcamento, ao mercado negro e ao contrabando. A escassez de gêneros, a fome, os salários reduzidos, o agravamento das condições de vida e o acentuar das desigualdades contribuíram para um clima de agitação social, que deu então os seus primeiros sinais, pondo em causa o equilíbrio do regime (ROSAS, 1994, p. 323, 325, 353). Foi neste contexto econômico, social e político que, no dia 15 de fevereiro, o território português foi atingido pelo fenômeno meteorológico acima caracterizado, com consequências devastadoras. As notícias dos jornais da época não deixam dúvidas quanto a isso. Os ventos ciclônicos provocaram “desmoronamentos, roturas de telhados, quebra de vidraças e claraboias, derrube de postes telegráficos e telefônicos, cortes de cabos de alta-tensão, afundamento de barcos, inundações – e, o que é pior, mortos e feridos” (O SÉCULO, 16-021941, p. 1).

As descrições mais extensas dizem respeito aos danos provocados em toda a área ribeirinha de Lisboa até Cascais, onde as vagas causaram inúmeras inundações e destruíram equipamentos portuários, infraestruturas de apoio a atividades náuticas e balneares e até parte dos aterros da linha férrea, interrompendo a circulação de comboios (O SÉCULO, 16-02-1941; DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 16-02-1941) (Figuras 3 e 4). Mas os estragos estenderam-se a todo o país, com maior incidência nas zonas costeiras, atingidas pelos ventos e pela agitação marítima provocada pela tempestade.

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Figura 3. Destruição provocada pelo vento e pelas vagas na zona ribeirinha de Lisboa, junto à Torre de Belém (Fotografia cedida pela Administração do Porto de Lisboa).

Figura 4. Naufrágio de embarcação no rio Tejo (Fotografia cedida pela Administração do Porto de Lisboa).

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Relatórios de diversas entidades dão conta dos esforços para salvar as tripulações de embarcações em perigo, no Tejo, no Douro, em Leixões. Segundo os testemunhos de quem socorreu o pessoal da draga Guadiana, que se afundou no Tejo, todo o salvamento “foi feito com água pelo peito, batidos constantemente pelas vagas que atingiam o jardim do Cais do Sodré e sem [este] auxílio a tripulação da draga teria perecido” (BATALHÃO DE SAPADORES BOMBEIROS, 03-04-1941). Os elementos do Instituto de Socorros a Náufragos, no Porto, foram chamados para ajudar os tripulantes de várias traineiras e lugres bacalhoeiros surtos em Massarelos, no rio Douro, que estando à deriva, embatiam uns contra os outros (INSTITUTO DE SOCORROS A NÁUFRAGOS, 11-03-1941). Em Leixões, dentro do porto, o “muito mar e vento rijo” dificultaram a prestação de auxílio às embarcações em perigo, o Carvalho Araújo — o barco do ISN — viu-se durante algum tempo impossibilitado de sair do porto de serviço para ir socorrer as tripulações de algumas traineiras e fragatas que tinham garrado. Também não houve maneira de impedir que dois vapores estrangeiros encalhassem, um na entrada sul da doca n.º 1, outro na praia do pescado (INSTITUTO DE SOCORROS A NÁUFRAGOS, 28-02-1941; CAPITANIA DO PORTO DE LEIXÕES, 20-02-1941). Deram-se episódios dramáticos nos mouchões do Tejo, onde a subida das águas provocou o arrombamento dos valados dos mouchões da Póvoa, Alhandra e Lombo do Tejo, inundando-os. Homens, mulheres e crianças ficaram ali presos, refugiando-se nos restos dos valados, nos telhados das casas e nas árvores. Os socorros foram dificultados pela falta de embarcações — já que muitas tinham desaparecido ou naufragado — e pela periculosidade de navegar por canais baixos e tortuosos, sem qualquer balizagem. Os barcos só conseguiram

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lá chegar na manhã de dia 16: os primeiros a regressar dos mouchões traziam sobreviventes e cadáveres (POLÍCIA MARÍTIMA DO PORTO DE LISBOA, 01-03-1941; DIVISÃO DE DRAGAGENS DOS SERVIÇOS HIDRÁULICOS E ELÉTRICOS, 15-03-1941). No dia 17, a imprensa, no rescaldo do ciclone, apresentava os primeiros números da catástrofe: 78 mortos, centenas de feridos e milhares de contos em prejuízos. Com algumas exceções, as notícias pormenorizadas dos danos estavam circunscritas à capital e arredores. As comunicações com as províncias eram deficientes, dado que o temporal provocara graves avarias nas linhas telefónicas e telegráficas e cortara muitas estradas. A Emissora Radiofónica Nacional foi utilizada para transmitir comunicados oficiais e informações entre diversas entidades. Através dela e das estações regionais de Coimbra e Porto foi possível dar a conhecer ao país a situação criada pelo ciclone (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 17-02-1941). Um dia depois, surgiram nos jornais lisboetas as primeiras notícias sobre Sesimbra. O Século (18-02-1941) dava conta de três mortos (foram 4), setenta pescadores feridos e seiscentas embarcações perdidas. A parte baixa da vila tinha ficado repleta de destroços: pedras trazidas pelo mar, restos de barcos, casas por terra. Os relatos dos que viveram o acontecimento permitem reconstituir o que se passou. Normalmente, o mar quando a maré vazava recuava cerca de 40 metros em relação à muralha, mas nesse dia ocupava toda a praia. A baixamar foi às 10.50 horas da manhã (JUNTA AUTÔNOMA DAS OBRAS DO PORTO, 1941), os mais velhos sabiam que o problema viria com a subida da maré e recearam o pior. Por volta das 12/13h as ondas já galgavam para a terra (LOPES, 1941, p. 2; LOPES, 1985). Pela

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mesma hora, o vento rugia arrancando telhas, chaminés e arvoredo. O mar encapelado invadia a Avenida Marginal e a Esplanada do Atlântico, “partindo embarcações, penetrando em estabelecimentos comerciais, casas de habitação e armazéns (…) arrastando tudo quanto encontra[va] à sua frente” (LOPES, 1941, p. 2). A experiência dos homens do mar ajudou-os a prever, na véspera, a chegada do temporal, muitos tinham varado as suas embarcações em terra, colocando-as em zonas resguardadas como o Largo do Município. Mas a força das ondas era tal que penetrou na vila, arrastando pessoas e os barcos que os pescadores julgavam seguros (Figura 5). Muitos arriscaram a vida para salvar os que eram levados, bem como para resgatar as suas embarcações (O CEZIMBRENSE, 23-02-1941, p. 2; SESIMBRA ACONTECE, 2011, p. 6, 8). Segundo o relatório do 2.º Comandante dos Bombeiros de Sesimbra, começaram a chegar então os primeiros pedidos de socorro. Os feridos foram conduzidos ao hospital da vila e ao posto médico da Casa dos Pescadores. Os mais graves metidos num carro automaca, para serem levados aos hospitais de Lisboa. Tiveram, contudo, de regressar a Sesimbra, pois a estrada estava obstruída pelas árvores caídas. Pela tarde, quando a fúria do mar abrandou, os Bombeiros passaram em revista os destroços da Esplanada do Atlântico em busca dos pescadores desaparecidos (LOPES, 1941, p. 2-4). No balanço final apuraram-se 4 mortos — que deixaram viúvas e dez órfãos — e muitos feridos (O CEZIMBRENSE, 23-02-1941, p. 1).

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Figura 5. Planta de Sesimbra onde está assinalada a penetração das águas do mar. O círculo assinala o Largo do Município e o triângulo o Largo Bombaldes. Planta Aerofotogramétrica. Comissão dos Levantamentos Topográficos Urbanos, levantamento aéreo da SPLA – Sociedade Portuguesa de Levantamentos Aéreos, 1:1000, 1942 (Planta cedida pela Biblioteca e Arquivo das Obras Públicas).

3.3 Fase 2: Recuperação Nos dias seguintes ao ciclone, a prioridade foi o restabelecimento das comunicações. Através da Emissora Nacional, o Ministro das Obras Públicas, Duarte Pacheco, deu ordens aos chefes das circunscrições técnicas dos Correios Telégrafos e Telefones, aos diretores de serviços hidráulicos e de estradas e aos chefes de cantoneiros para trabalharem em conjunto, com vista à rápida recuperação das linhas telefônica e telegráfica em todo o país, à desobstrução das vias e ao funcionamento dos serviços ferroviários (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 17-02-1941, p. 6-7; 18-02-1941, p. 5). O Ministério do Interior expediu instruções para as autoridades policiais e administrativas locais

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para que fosse prestado auxílio às famílias atingidas pela catástrofe. Para atender às despesas provenientes da reparação dos estragos foi anunciada a abertura de um crédito de 20 mil contos a favor do Ministério das Obras Públicas (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 18-02-1941, p. 1, 5; MINISTÉRIO DAS OBRAS PÚBLICAS E COMUNICAÇÕES, 1944, p. 66-67). A fim de facilitar a reparação dos danos provocados pelo ciclone — reconstrução de chaminés, telhados, muros e vedações — concedeu-se dispensa das licenças municipais para obras (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 19-02-1941, p. 1). Da mesma forma foram tomadas providências para que não se verificasse uma subida generalizada dos preços dos materiais de construção, obrigando os comerciantes a praticar os valores anteriores ao dia 15 (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 20-021941, p. 1). Segundo documento encontrado no Arquivo Oliveira Salazar (DOCUMENTAÇÃO AVULSA, [1941]a), o governo enfrentava sérios problemas: afluíam constantes pedidos de socorros destinados a reparar estragos em habitações, a sustentar os famintos e a solicitar o internamento dos órfãos. Não tendo a Direção Geral de Assistência verbas suficientes para prestar auxílio a todos era preciso decidir o que fazer. As soluções possíveis que se apresentavam eram ir buscar dinheiro a donativos locais e a subscrições públicas e/ou a subsídios da assistência pública, podendo estes últimos provir dos cofres dos governos civis, ou das juntas de província, ou da Direção Geral de Assistência. O dito documento, escrito à máquina, não tem data, mas o seu conteúdo associa-o a outros papéis guardados na mesma pasta, que revelam a decisão política tomada então pela Presidência do Conselho: entregar a gestão humanitária da catástrofe a uma Comissão Nacional de Auxílio às Vítimas (DOCUMENTAÇÃO

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AVULSA, [1941]b). Com efeito, perante a dimensão dos prejuízos — que Muir-Wood (2011, p. 12) estimou em um milhão de contos (cerca de 5 biliões de euros em 2009) —, acrescidos do aumento inevitável de despesas, da queda de certas receitas e do enfraquecimento do mercado de capitais, o Estado determinou regras precisas para o pagamento das despesas de reparação dos estragos causados pelo ciclone. Estabeleceu que as verbas existentes seriam canalizadas para os serviços, obras e edifícios públicos, através do Orçamento Geral do Estado ou das dotações próprias das instituições, sendo que só em caso de verificada insuficiência de meios poderiam aquelas recorrer à verba extraordinária — os 20 mil contos — colocados à disposição do Ministério das Obras Públicas. O Estado decidiu também não se responsabilizar pelos prejuízos dos particulares. Diretriz que era “necessário manter firmemente”, segundo o Ministro das Finanças (MINISTRO DAS FINANÇAS, 12-03-1941). O auxílio aos sinistrados caberia em exclusivo à Comissão Nacional de Auxílio, entretanto criada pelo governo, através dos fundos que aquela conseguisse angariar. Para ajudar seria criada uma taxa a cobrar durante três meses sobre as entradas dos espetáculos públicos. A ação do Estado — escrevia o ministro — devia ser realizada através da “intensificação dos serviços que normalmente realiza[va]m assistência econômica ou técnicas às atividades particulares, e não em nome de uma obrigação de reparação que o Estado não pod[ia] assumir” (MINISTRO DAS FINANÇAS, 12-03-1941). Salazar concordou com a doutrina geral apresentada na exposição do ministro e deu ordens para a sua transmissão aos outros ministérios (GABINETE DA PRESIDÊNCIA DO CONSELHO, 14-03-1941). A informação foi depois divulgada nos jornais (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 29-03-1941, p. 2).

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A Comissão Nacional de Auxílio às Vítimas, instituída por portaria de 4 de março, tinha por missão “coordenar todos os bons esforços, concentrar todas as informações oficiais ou particulares indispensáveis à ação a desenvolver, e presidir superiormente à distribuição dos donativos”. As verbas recolhidas eram destinadas a acudir “às necessidades mais urgentes das pequenas economias familiares arruinadas ou calamitosamente depauperadas pela catástrofe, devendo considerar-se como mais urgentes as necessidades de alimentação, de recuperação das pequenas moradias e dos indispensáveis instrumentos de trabalho” (COMISSÃO NACIONAL DE AUXÍLIO, 1944, p. 101).

A dirigir os trabalhos estava o Subsecretário de Estado da Assistência Social, que contava com a colaboração de representantes da Igreja, dos organismos corporativos, da imprensa, do Comissariado do Desemprego e da Cruz Vermelha. Logo que instalada, a Comissão nacionalizou a subscrição pública aberta pelo Diário de Notícias, no dia 18 de fevereiro, e que apurara até então mais de 700 contos (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 07-031941, p. 1; 12-03-1941, p. 1; COMISSÃO NACIONAL DE AUXÍLIO, 1944, p. 102-103). Daqui em diante, todas as verbas recebidas por este jornal e outras instituições, oferecidas por privados nacionais e estrangeiros, foram canalizadas para a conta da Comissão na Caixa Geral de Depósitos. Esta centralização foi entendida como justificada e oportuna, útil para reunir os esforços e as ações particulares, evitando “o perigo duma lamentável dispersão” (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 26-03-1941, p. 1). Na sua primeira sessão, a Comissão emitiu um comunicado pedindo às autoridades administrativas e eclesiásticas e a pessoas particulares a organização de relações circunstanciadas: (a) das famílias cujos

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chefes tivessem perecido na catástrofe de 15 de Fevereiro; (b) das que viram a sua moradia derrubada; (c) e das que perderam barcos, redes e outros instrumentos de trabalho. Solicitava urgência na recolha das informações indispensáveis para a distribuição dos socorros aos mais necessitados, indicando o dia 20 como prazo limite para a entrega das relações. Foi também criada uma rede de apoios locais, com base em comissões regionais, dirigidas pelos governadores civis (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 07-03-1941, p. 1; 12-03-1941, p. 1, 2; COMISSÃO NACIONAL DE AUXÍLIO, 1944, p. 101-102). As informações recolhidas cedo revelaram que “a classe mais atingida pela fúria do ciclone fora a dos pescadores, os homens do mar flagelados pelas inclemências do vento e das ondas” (COMISSÃO NACIONAL DE AUXÍLIO, 1944, p. 105). As primeiras medidas de apoio às vítimas materializam-se na reparação dos barcos avariados, na abertura de concurso para a construção dos que se perderam e na atribuição de subsídios de alimentação. Foi ainda decidido conceder, às famílias que tinham perdido o seu chefe e ganha-pão, um subsídio correspondente à média do salário mensal que aquele ganhava (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 15-03-1941, p. 1). Durante algum tempo, o Diário de Notícias deu destaque à recuperação depois do ciclone, anunciando diariamente nas suas páginas os montantes recolhidos e publicitando os trabalhos da Comissão Nacional de Auxílio. A partir de maio observa-se um claro desinteresse por esta questão, as informações são remetidas para segunda página e tornam-se raras. Em julho, o jornal encerrou a recolha de donativos fazendo o balanço da obra feita na assistência às vítimas do ciclone. As verbas reunidas por várias instituições e entregues à Comissão tinham atingido um montante superior

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a 4000 contos, que foram utilizados para conceder subsídios de alimentação destinados às regiões mais atingidas e subsídios de apoio a famílias. Muitos casos estavam ainda pendentes, sujeitos a averiguações, mas esperava-se estender estas ajudas a mais núcleos familiares. Tinham sido também concedidas verbas para a reparação ou reconstrução de casas, visando sobretudo a compra de materiais. O trabalho de recuperação e substituição de barcos e redes de pesca fora confiado às Casas dos Pescadores. Encerrava-se, desta forma, a subscrição do Diário de Notícias, mas a Comissão mantinha-se em funções, continuando a “utilizar, o mais justiceiramente possível, os subsídios recolhidos” (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 09-07-1941, p. 1-2). No dia seguinte ao ciclone, a população de Sesimbra deparou com uma vila devastada: casas destelhadas, árvores partidas, a Avenida Marginal e a Esplanada do Atlântico cheias de destroços e pedras trazidas pelo mar, as casas, armazéns e lojas na frente marítima destruídos e repletos de entulho, a praia sem areia, o pequeno molhe do porto de abrigo arruinado (O CEZIMBRENSE, 23-02-1941, p. 1; COELHO, 1997, p. 11; SESIMBRA ACONTECE, 2011, p. 8-9) (Figuras 6, 7, 8, 9 e 10). Em carta ao Governador Civil de Setúbal, o Presidente da Câmara de Sesimbra indicava os prejuízos havidos: destruição de parte da cortina, muralha e varadouros da estrada do porto de abrigo; destruição da Esplanada do Atlântico; destruição de 200 barcos de pesca (PRESIDENTE DA CÂMARA, 16-02-1941). Dias mais tarde, numa outra missiva enviada ao Governador, o Presidente enumerava as embarcações destruídas: 74 aiolas, 46 botes, 32 barcas sem coberta, 20 barcas do alto, 1 traineira; e avariadas: 15 aiolas, 19 botes, 12 barcas sem coberta, 9 barcas do alto, 3 traineiras. Segundo ele, o valor dos danos atingia os 450

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contos. Isto sem contar com os prejuízos sofridos pelas empresas de armações de sardinha — cerca de 1300 contos — em barcas destruídas (37) e avariadas (40), estaleiros e armações (PRESIDENTE DA CÂMARA, 26-02-1941). A destruição dos barcos pelo ciclone foi talvez o fator de maior impacte para a comunidade sesimbrense. Pois, sendo este um “importante centro de pesca e vivendo única e exclusivamente desta indústria”, a perda de um “grande número da sua frota, redes e mais aparelhos de pesca” impossibilitava que “a classe piscatória p[udesse] angariar os meios de subsistência para si e para os seus” (O CEZIMBRENSE, 02-03-1941, p. 1).

Figura 6. Destruição provocada pelo vento e pelas vagas na frente marítima de Sesimbra (Fotografia cedida pelo Arquivo Municipal de Sesimbra).

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Figura 7. Embarcações destruídas ou avariadas na angra de Sesimbra (Fotografia cedida pelo Arquivo Municipal de Sesimbra).

Figura 8. Embarcações recolhidas nas ruas da vila e destroços das que foram apanhadas pelo mar (Fotografia cedida pelo Arquivo Municipal de Sesimbra).

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Figura 9. Aspeto da praia e dos varadouros da parte W da vila depois do ciclone (Fotografia cedida pelo Arquivo Municipal de Sesimbra).

Figura 10. Aspeto da frente urbana, varadouros e praia da parte E da vila depois do ciclone (Fotografia cedida pelo Arquivo Municipal de Sesimbra).

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A situação era grave, sem barcos e sem redes, uma parte significativa dos pescadores não podia sair para o mar para ganhar o seu sustento. Sem dinheiro não lhes era possível adquirir novas embarcações e instrumentos de trabalho. Mesmo os que trabalhavam para as empresas de armações — com maior capacidade econômica — enfrentavam dificuldades, pois era preciso construir novos barcos e recuperar os aparelhos perdidos, o que não se fazia dum momento para o outro. Alguns autores (SEN, 1982; SOENS, 2013, p. 218) têm defendido que existe uma seletividade (social) no que diz respeito ao impacto dos desastres numa mesma comunidade e região. Neste caso, isso é facilmente observável, a pobreza dos homens do mar — especialmente no inverno — e a sua dependência dos recursos marítimos tornou-os particularmente vulneráveis às consequências do ciclone. Mais do que outros grupos sociais que —vivendo na mesma área e sofrendo os mesmos efeitos do fenómeno natural — tinham uma situação financeira que lhes permitiu recuperar mais rapidamente. Dizia o Cezimbrense (16-03-1941, p. 2), “a cada dia que passa mais se vai agravando a vida da classe piscatória (…). É confrangedor o quadro que se observa. Nele se vê claramente a imagem da tragédia a indicar-nos luto, dor e miséria!”. “A terra era pobre e ficou pior” (COELHO, 1997, p. 13). Tão grandes prejuízos agravaram a situação econômica de Sesimbra, que já era bastante má (PRESIDENTE DA CÂMARA, 19-04-1941). Perante a situação precária e angustiosa dos pescadores, a Junta Central das Casas dos Pescadores, em conjunto com a Câmara, anunciou o estabelecimento de uma “Sopa dos Pobres” para alimentar as famílias (O CEZIMBRENSE, 16-03-1941; p. 2;

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JUNTA CENTRAL DAS CASAS DOS PESCADORES, 1942, p. 64). A “sopa” já existia antes, vinha do tempo da guerra, mas tornou-se particularmente procurada nos meses que se seguiram ao ciclone. Para aqueles que nunca haviam precisado de tais favores, ir à “sopa” era motivo de vergonha e as mulheres tapavam as caras com os xailes ou mandavam os filhos pequenos (LOPES, 1985; COELHO, 1997, p. 13). A “sopa”, mantida antes por um subsídio da Junta de Província da Estremadura, passou a ser assegurada quase exclusivamente pela Casa dos Pescadores (PRESIDENTE DA CÂMARA, 19-04-1941). A partir de 10 de março, e por tempo que não foi possível precisar, foram servidas cerca de 2300 refeições diárias, compostas por pão, feijão, grão, massa, arroz e hortaliças (JUNTA CENTRAL DAS CASAS DOS PESCADORES, 1942, p. 66). A miséria era agravada também pela escassez de pescado (JORNAL DO PESCADOR, 31-05-1941, p. 2): os poucos que podiam sair a pescar voltavam sem peixe. Os pescadores atribuíam “a falta de pescado miúdo ao ciclone, porque o mar na sua fúria destruiu as comedorias e devia ter concorrido para que o peixe tenha procurado outros fundos onde encontre pasto. Porque diz[ia]m: se nalguns pontos nós sondávamos o mar e encontrávamos 14 braças de profundidade e hoje não medem mais que 8 braças, verifica-se o seu assoreamento e portanto as areias cobriram as comedorias” (O CEZIMBRENSE, 20-04-1941, p. 2).

Um mês depois do ciclone, foi organizada uma procissão de penitência ao Senhor das Chagas, suplicando os pescadores “nas suas preces a Misericórdia do Senhor, para que lhes desse peixe; para que lhes concedesse uma côdea de pão para si e para

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os seus” (O CEZIMBRENSE, 23-03-1941, p. 6). Segundo o Presidente da Câmara se não fosse a distribuição diária de sopa teria havido muitos casos de morte pela fome (PRESIDENTE DA CÂMARA, 19-04-1941). Tal como a nível nacional, com a subscrição do Diário de Notícias, também em Sesimbra surgiu um movimento de solidariedade por parte de grupos mais favorecidos — a família Palmela, intelectuais, banhistas, funcionários públicos e de empresas —, que reuniu dinheiro e gêneros para distribuir entre a comunidade piscatória (O CEZIMBRENSE, 02-03-1941, p. 3, 5; 09-03-1941, p. 1; 16-03-1941, p. 2; 30-031941, p. 6; 21-02-1943, p. 1). Para além da ajuda humanitária houve grande preocupação por parte das diferentes instituições — Câmara Municipal, Casa dos Pescadores e Comissão Nacional de Auxílio às Vítimas — com a recuperação dos instrumentos de trabalho e o retomar da atividade piscatória. A construção de novos barcos e a reparação dos que tinham ficado avariados tornou-se, desde cedo, uma das prioridades da Junta Central das Casas dos Pescadores, não apenas em Sesimbra, mas em todo o país. Logo que tomou conhecimento dos prejuízos causados pelo ciclone, aquela Junta enviou circulares a todas as Casas de Pescadores, Capitanias e Delegações Marítimas, pedindo informações sobre os danos sofridos, nomeadamente: o número e o tipo de embarcações totalmente destruídas, tonelagem e valor; o número e o tipo de embarcações parcialmente destruídas, possibilidades de reconstrução e custo das reparações; cabos, redes e aparelhos de pesca destruídos ou avariados. Obtidas as informações necessárias e constatado o grande número de embarcações novas a construir, e

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dada a dificuldade em atender a todos os pedidos, a Junta decidiu — com o apoio financeiro da Comissão Nacional — contratar com uma única entidade a construção de todas as embarcações. Foi assim feito contrato (assinado a 1 de julho) com o Sindicato Nacional dos Carpinteiros Navais, Calafates e Ofícios correlativos do Distrito e Porto de Lisboa, para o fabrico de 169 novos barcos, a construir nos estaleiros da Mutela e de Sesimbra (JORNAL DO PESCADOR, 28-02-1942, p. 6-10). As reparações das embarcações avariadas iniciaram-se logo após o ciclone. Em março, noticiava-se que a Junta Central das Casas dos Pescadores tinha ordenado que todos os barcos danificados fossem reparados, tomando a responsabilidade pelo seu pagamento. Acrescentava-se ainda que aos sinistrados seria feito um bônus de 20% sobre o valor das reparações, ficando o pescador com 80% do encargo, que seria pago com o produto da pesca (O CEZIMBRENSE, 23-03-1941, p. 2). Isto significa que os pescadores pagaram parte da reparação dos seus barcos. No caso das novas embarcações, contudo, os encargos foram assumidos na totalidade pela Junta Central das Casas dos Pescadores, que comparticipou também a reposição dos apetrechos de pesca (COMISSÃO NACIONAL DE AUXÍLIO, 1944, p. 117). As verbas vieram da Comissão Nacional de Auxílio às Vítimas, através dos donativos recolhidos (JORNAL DO PESCADOR, 31-05-1941, p. 2).

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Figura 11. Mapa das embarcações destruídas e construídas, por localidade (Junta Central das Casas dos Pescadores, 1942).

Figura 12. Mapa das embarcações avariadas e reparadas, por localidade (Junta Central das Casas dos Pescadores, 1942).

Os primeiros barcos novos foram distribuídos pelos pescadores em setembro, outubro e dezembro de 1941. Segundo dados da Junta Central da Casa dos Pescadores, das 169 embarcações encomendadas, 53 foram entregues ainda em 1941, 97 em 1942 e 15 em 1943, num total de 165 novos barcos (JUNTA CENTRAL DA CASA DOS PESCADORES, 1945a, p. 98). A sua distribuição era feita pelo Delegado Marítimo de Sesimbra e pelo Presidente da Casa dos Pescadores, sendo dada preferência

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aos pescadores mais necessitados (JUNTA CENTRAL DAS CASAS DOS PESCADORES, 1942, p. 94). Mas muito antes disto, já a imprensa local e nacional anunciava a revitalização da economia de Sesimbra, com o regresso da frota à faina. De acordo com o Diário de Notícias (11-04-1941, p. 1), em abril, graças às medidas da Comissão Nacional de Auxílio, 68 dos barcos que o temporal avariara estavam no mar laborando, restituindo assim “o trabalho e o pão a cerca de quatrocentos pescadores e seus famílias”. Segundo O Cezimbrense (13-07-1941, p. 1), graças às providências da Junta Central da Casa dos Pescadores, “já não se regista[vam] lares sem pão; já não se v[ia] faces cadavéricas estendendo a mão à caridade pública. Os pescadores de Sesimbra e suas famílias apresenta[va]m-se com outro aspeto”.

Como se depreende pelos jornais, depois de alguns meses de desânimo, Sesimbra animou-se com a época balnear. As notícias da escassez de peixe e da miséria da população foram substituídas pelas preocupações relativas aos arranjos dos espaços públicos, trabalhando-se “com grande azáfama” na reconstrução da muralha e pavimento da Avenida, bem como na colocação de candeeiros de iluminação, para que tudo ficasse recomposto (O CEZIMBRENSE, 15-06-1941, p. 3). As informações sobre a reconstrução das embarcações surgem lado a lado com as queixas dos banhistas, que reclamavam por a praia ter muita pedra, tornando-se quase impossível tomar banho na maré baixa (O CEZIMBRENSE, 27-07-1941, p. 2). Um ano depois do ciclone, a Câmara Municipal escrevia uma carta de agradecimento à Junta Central das Casas dos Pescadores:

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“ao lembrar a hecatombe que pairou sobre Sesimbra, onde nessa ocasião só luto, miséria e dores havia e hoje felizmente há alegria, mediania e desafogo era justo que a Câmara representante da população sentisse a obrigação em seu nome de reconhecida agradecer a quem tão devotamente concorreu para esse bem-estar” (PRESIDENTE DA CÂMARA, 01-03-1942).

Mas não esquecia a Câmara de lembrar à Junta das Casas dos Pescadores que se esperava que essa ação benemérita se mantivesse até à integral reparação dos prejuízos sofridos, o que significa que nem tudo estava ainda resolvido. 3.4 Fase 3: Reconstrução A Comissão Nacional de Auxílio às Vítimas mantevese em atividade até final de 1943. Segundo dados do relatório então apresentado, a Comissão conseguiu reunir perto de 7500 contos, em resultado das contribuições de portugueses residentes na metrópole e em Angola, Moçambique, Cabo Verde, Macau, Brasil e outros países; de donativos vindos da Alemanha, Congo Belga, Estados Unidos da América, França, Inglaterra e Itália; de verbas angariadas pela Cruz Vermelha e pelo Diário de Notícias; e ainda do imposto sobre espetáculos. As receitas obtidas foram distribuídas sob a forma de socorros de alimentação (subsidiaramse sopas em Sesimbra, Alhandra, Peniche, Caparica, Sobral de Monte Agraço, Alcochete, Cadaval, Vila Franca de Xira, Arruda dos Vinhos e Figueira da Foz); subsídios provisórios, pensões temporárias e vitalícias concedidas às famílias dos sinistrados; e reparações em moradias e edifícios. No Natal de 1941, a Comissão destinou parte do seu saldo a fornecer alimentos e agasalhos às crianças das famílias carenciadas. Continuou também a satisfazer os pedidos que lhe eram apresentados com fundamento

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nos estragos causados pelo ciclone. Foram beneficiadas por esta iniciativa 12.991 famílias. Terminados os trabalhos em dezembro de 1943, a Comissão Nacional de Auxílio às Vítimas foi dissolvida por portaria de 11 de setembro de 1944, com um voto de louvor pela forma como desempenhara a sua missão (COMISSÃO NACIONAL DE AUXÍLIO, 1944). O relatório final da Comissão Nacional dá a entender que o inverno de 1941 foi particularmente duro. O temporal de fevereiro terá sido mais um fator a juntar à crise generalizada, mas os danos provocados e o seu impacte na economia e no quotidiano das populações tiveram — dada à fragilidade daquelas — repercussões a longo prazo. Isto não é evidente na imprensa, uma vez que, de maio de 1941 em diante, as informações sobre as consequências do ciclone se tornaram diminutas e secundárias. Em relação a Sesimbra a situação é diferente, as fontes e a bibliografia existentes permitem-nos traçar uma panorâmica mais lata do impacte do temporal na estruturação da própria vila. Em 1936, Sesimbra tinha serviços de correio, telefônico e telegráfico, escola de ambos os sexos, repartição de registo civil, agência bancária e de seguros, associações de recreio e desportivas, casas de espetáculos, filarmônica, misericórdia, hospital, farmácia e bombeiros voluntários. Entre as suas indústrias havia fábricas de licores, refrigerantes, gelo, conservas de peixe, moagem, cerâmica, cal, telha e tijolos. A freguesia de Santiago — restrita à vila — tinha, em 1930, cerca de 1627 fogos e 7086 habitantes (COSTA, 1936, p. 361-362, 367). A atividade da pesca constituía a principal ocupação da maioria dos habitantes e tinha considerável importância, tanto pelo valor do pescado e número de pessoas que nela se empregavam, como pelo número e valor dos barcos e aparelhos (MINISTÉRIO DAS OBRAS PÚBLICAS, 1937). No

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quinquênio de 1935-1939, Sesimbra era o décimo porto do país (em 24 assinalados), tendo em conta o valor da pesca desembarcada (MINISTÉRIO DAS OBRAS PÚBLICAS, 1945, p. 35). Contudo, os marítimos viviam em péssimas condições econômicas, sobretudo quando o ano era mau, sobrevivendo com o mínimo para as suas necessidades, alguns em extrema miséria. As suas casas, como em tantas outras localidades do litoral, não tinham condições higiênicas nem conforto, levando os pescadores uma vida confrangedora em pardieiros miseráveis, em vielas arruinadas (BERNARDO, 1941). Apesar do aparente progresso, Sesimbra vinha perdendo, desde o princípio do século XX, a sua importância como porto de pesca, sendo que outros com melhores infraestruturas se destacavam no panorama nacional. O que impedia o desenvolvimento da indústria do pescado em Sesimbra era a ausência de um porto de abrigo. Na zona oriental da praia, junto à Ponta do Cavalo — onde se situava o forte com o mesmo nome — ficava a parte mais abrigada da enseada de Sesimbra, a que era dado o nome de portinho de abrigo ou angra. Este portinho, contudo, só era utilizado quando as embarcações não podiam permanecer em frente da vila — por ocasião de ventos de noroeste e oes-noroeste, por exemplo — ou não tinham tempo para varar em terra. O fato de não oferecer proteção contra os ventos de sueste e sudoeste, a distância e a falta de ligação à vila — a estrada só foi construída nos anos 1930 — desincentivava a sua utilização. A pesca estava então limitada aos meses de primavera e verão — de março a outubro —, pois mesmo que o mar oferecesse condições de permitir a atividade dos pescadores, a rebentação na praia impedia os homens de sair. Isto forçava-os a dias e dias de inação, com os barcos encalhados, à espera das condições propícias. A existência

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de um porto — para que os barcos estivessem sempre na água — possibilitaria um maior número de dias no mar e o aumento da rentabilidade desta atividade. A falta de um porto de abrigo era também obstáculo ao desenvolvimento tecnológico, uma vez que a utilização de sistemas de pesca modernos, que exigiam aparelhos dispendiosos, embarcações de grande tonelagem, a motor, e tripulações numerosas, implicava investimentos avultados, que ninguém queria arriscar porque poderiam perder-se ao primeiro vendaval, na ausência de estruturas portuárias adequadas e capazes de garantir a segurança das embarcações. Assim, desde cedo, a grande aspiração dos homens do mar em Sesimbra foi a construção de uma estrutura, que artificialmente viesse reforçar as condições naturais de abrigo da angra (MINISTÉRIO DAS OBRAS PÚBLICAS, 1937; FREITAS, 2013, p. 135). Entre 1896 — ano do primeiro projeto — e a década de 1940, sucederam-se os planos e algumas intervenções, quase sempre gorados pela falta de recursos e pelos estragos causados pelos temporais. Assim, por exemplo, o molhe e a rampa varadouro construídos em 1921 ficaram danificados pelo mau tempo que se registou nesse mesmo ano e em 1922. Em 1923, consolidavam-se as obras já feitas e prolongava-se o molhe até aos 51m. Em dezembro de 1925 estavam executados 70m de molhe. Mas, em novembro de 1927, novos temporais vieram provocar danos significativos na estrutura, ficando a muralha fragmentada em 5 partes. Em 1928 não foram feitas reparações e em 1933 o molhe estava praticamente arruinado. Em 1935, foi encomendado novo estudo para resolver o problema: o projeto apresentado pela Direção Hidráulica do Tejo, em 1937, previa a construção de um outro molhe, a cerca de 180m do existente, enraizado no esporão saliente de Pontal da Varanda, com um comprimento de 400m.

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Mais uma vez, porém, as obras não foram realizadas. O deflagrar da II Guerra Mundial explica em parte a interrupção do programa de intervenções que vinha a ser posto em prática, a nível nacional, desde 1929, na sequência do Plano Portuário (MINISTÉRIO DAS OBRAS PÚBLICAS, 1937; FREITAS, 2013, p. 136-137). Em caso de mau tempo, os barcos continuavam a ser maioritariamente recolhidos na vila, tal como aconteceu na véspera do ciclone. Um dos fatores aliás que mais contribuiu para a destruição da frota de Sesimbra foi a falta de segurança do ancoradouro da angra. Na ausência de um molhe de proteção — destruído por temporais anteriores — o mar invadiu o varadouro originando a perda dos barcos ali recolhidos (PRESIDENTE DA CÂMARA, 23-02-1941; 15-03-1941) (Figura 7). Assim não admira que um dos primeiros pedidos das autoridades locais à administração central tenha sido a reparação dos varadouros, não só pelos entraves que o seu estado de degradação causava à pesca — obrigando a mais trabalho na varação das embarcações —, como também pelo perigo que elas corriam se “qualquer maresia se levant[asse]” (PRESIDENTE DA CÂMARA, 23-02-1941). Da mesma forma, solicitou-se a urgente construção do porto de abrigo na angra, entendendo-se que esta era uma necessidade já demonstrada, do ponto de vista econômico e social (PRESIDENTE DA CÂMARA, 15-03-1941). Esta questão era consensual na vila: a recuperação de Sesimbra e a melhoria da qualidade de vida dos seus habitantes só poderiam conseguir-se com a construção do porto de abrigo, pois só assim os pescadores e as suas famílias poderiam deixar de viver “com dificuldades, socorridos do crédito dos comerciantes ou do auxílio da Casa dos Pescadores”. Outra das grandes aspirações locais era a resolução do problema das casas dos pescadores, “pois em casas

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infectas, sem os mais rudimentares preceitos higiênicos, albergavam-se famílias inteiras”. (O CEZIMBRENSE, 05-10-1941, p. 1, 3; 15-02-1942, p. 1; BERNARDO, 1941). O desastre ocorrido em consequência do ciclone veio dar mais força a estas reivindicações. Quando, em 1945, o Estado português conseguiu voltar a reunir condições para definir e implementar a sua política em matéria portuária, Sesimbra, classificada como porto exclusivamente de pesca, destinada ao consumo local e regional, foi abrangida pelas medidas de proteção às populações piscatórias. Tendo sido então decidido a construção de um pequeno porto de abrigo e pesca, dada a importância desta atividade na localidade e a necessidade de criar um refúgio para aqueles que não conseguissem demandar a barra do Sado, por ocasião de temporais (MINISTÉRIO DAS OBRAS PÚBLICAS, 1945, p. 16-18, 23). O molhe então previsto (hoje designado por “molhe velho”) foi construído entre 1947 e 1949. O Bairro Piscatório — obra da Casa dos Pescadores com o apoio da Câmara que cedeu o terreno — foi construído no planalto a nordeste da povoação em 1944 e 1948. Representava, como em tantas outras localidades litorais, o expoente da obra do Estado Novo em prol da integração (ou controlo) das comunidades marítimas: aglomerados homogêneos “de moradias saudáveis e higiênicas onde o pescador se sente elevado ao nível social a que, como qualquer outro trabalhador, tem direito” (JUNTA CENTRAL DAS CASAS DOS PESCADORES, 1945b, p. 21). M.ª Alfreda Cruz defende que, nos anos de 1960, o nível de vida da maioria dos pescadores de Sesimbra se havia elevado, em relação ao passado. Atribuía-o ao trabalho desenvolvido pela Casa dos Pescadores de Sesimbra, criada em 1940, mas sobretudo à utilização do ancoradouro artificial do porto de abrigo, que

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tornara possível a pesca durante um maior número de dias do ano e contribuíra para o aumento do número de embarcações motorizadas. Com efeito, as embarcações a motor passaram de 58 em 1945 para 176 em 1957 e 253 em 1962. (CRUZ, 1966, p. 102, 75). Esta ideia é reforçada pelos testemunhos dos sobreviventes do ciclone, que referem que depois do desastre se começou a ganhar mais e que a vida se tornou um pouco melhor: o molhe e o avanço tecnológico tornaram Sesimbra mais rica nos anos de 1950 (LOPES, 1985; COELHO, 1997, p. 13). Para a reconstrução e recuperação econômica concorreu também a afirmação progressiva de Sesimbra enquanto praia de veraneio. A partir dos anos de 1930, a vila passou a ser frequentada por algumas famílias de Lisboa (RAMOS, 2009, p. 21). Segundo Bernardo (1941), em meados de 1940, a vila não figurava sequer nos roteiros de propaganda, mas, mercê da tenacidade de algumas vereações da Câmara e de alguma publicidade feita na Emissora Nacional e em periódicos da capital, havia já então um pequeno afluxo de banhistas que era preciso intensificar. Aos poucos, Sesimbra foi sendo integrada nos circuitos do turismo nacional: em 1942, um cartaz, da responsabilidade do Secretariado de Propaganda Nacional, destinado a fazer a divulgação das praias portuguesas, descrevia-a como uma “praia magnífica, de mar brando. Interessante a vida piscatória” (PANORAMA, 1942). Seis anos depois, um roteiro turístico, produzido pelo Secretariado Nacional de Informação, para os visitantes de língua francesa, sugeria uma visita à “outra banda” para conhecer a Península de Setúbal. Entre as terras a descobrir encontrava-se Sesimbra, “praia pitoresca e vila de pescadores”, cenário de atividades marítimas, animadas e coloridas pelas ocupações características dos pescadores locais (SECRETARIADO NACIONAL

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DE INFORMAÇÃO, 1948). Na década de 1960 — dotada entretanto da Pensão Espadarte (1956), do Hotel Náutico (1959) e do Hotel do Mar (1963) — a vila convertera-se numa praia elegante, frequentada pelos citadinos. Por essa altura, e depois cada vez mais, já se sentia que o desenvolvimento futuro de Sesimbra teria como esteios a pesca e o turismo, o primeiro como “fundo substancial e condição imutável” da vida dos homens, o segundo “como fator de elevação econômica” da urbe e do nível de vida dos seus habitantes (CRUZ, 1966, p. 91, 93). 3.5. Memória e Identidade O ciclone — pela extensão e valor dos prejuízos causados — teve impacte significativo na depauperada economia nacional, sobretudo no contexto de guerra que então se vivia. A pouca documentação encontrada, na Torre do Tombo, a nível das altas instâncias governativas, centra-se na questão da ajuda aos sinistrados, mas sobretudo na escassez de recursos para fazer fase às necessidades, impondo restrições na distribuição das verbas destinadas às reparações (DOCUMENTAÇÃO AVULSA [1941]a; MINISTRO DAS FINANÇAS, 12-03-1941; GABINETE DA PRESIDÊNCIA DO CONSELHO, 14-03-1941). A questão do ciclone foi então instrumentalizada em proveito da unidade nacional e do reforço do prestígio do Estado. Num momento difícil como o que se vivia — falta de gêneros, inflação, agravamento das condições de vida —, a ajuda à recuperação foi transformada numa causa patriótica (PFISTER, 2009, p. 30). Pfister (2009, p. 28-29) afirma que os desastres naturais constituem uma poderosa força de unificação nas regiões afetadas. Dando como exemplo a Suíça, explica que a comunicação/ publicidade criada em torno de certos desastres foi usada como

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elemento de propagação da ideia de nação e para gerar um movimento de solidariedade nacional de auxílio às vítimas. A imprensa tinha um papel preponderante na estratégia de angariação de fundos, publicando os nomes dos generosos doadores e as respectivas somas doadas. Organizavam-se concertos, bazares, rifas, e todos — incluindo os mais necessitados — contribuíam para a campanha. O governo não concedia quaisquer fundos, mas recolhia os donativos e encarregava-se da sua redistribuição. O autor defende que, no caso suíço, a mobilização de movimentos de solidariedade nacional constituiu uma estratégia para distribuir o esforço de recuperação depois dos desastres e evitar o esgotamento dos recursos financeiros do estado. Ora, viu-se surgir algo de muito semelhante, em Portugal, no período pós-ciclone de 1941. Três dias depois do temporal, o Diário de Notícias (18-02-1941, p. 1) abria uma subscrição pública para receber todos os “subsídios e concursos a favor das famílias necessitadas”, destacando o “irresistível movimento de solidariedade” gerado em torno da catástrofe, ao qual se associava com o intuito de “dar uma expressão nacional a esse impulso da opinião do país”. Nos meses seguintes, eram publicados, com destaque de primeira página, os nomes dos contribuidores e as respectivas quantias oferecidas. O jornal deu ainda publicidade a festas, concertos e eventos tauromáquicos promovidos para arranjar fundos para esta causa (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 2502-1941, p. 1; 01-03-1941, p. 4; 04-04-1941, p. 1; 10-04-1941, p. 1; 30-06-1941, p. 1). Ao mesmo tempo, através dos microfones da Emissora Nacional, algumas figuras afetas ao regime — como o Comandante Henrique Tenreiro e o Subsecretário de Estado da Assistência Social — faziam apelos à comunidade pedindo a participação de todos, sob dois fortes argumentos. Primeiro,

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explicando que perante tal calamidade todos eram vítimas, direta ou indiretamente, dando ao desastre uma dimensão nacional e global. Depois, justificando que num “país de pobres” — havendo poucos ricos a quem se pudesse pedir em nome da justiça social — era preciso que até os pobres concorressem com o “seu pouco”, pois só assim “a soma reunida sai[ria] avultada e digna; digna da pobreza que oferec[ia] e digna da miséria que [ia] aliviar” (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 14-03-1941, p. 1). “Que ninguém falte” — dizia Henrique Tenreiro —, porque todos os donativos, grande ou pequenos, eram indispensáveis (JORNAL DO PESCADOR, 30-04-1941, p. 12). Em todo este processo, a imprensa serviu como instrumento do Estado divulgando, justificando e louvando as medidas tomadas pelas autoridades (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 18-02-1941, p. 1; 19-02-1941, p. 1), transformando o governo no grande catalisador da recuperação. Coube aos jornais levantar a moral das vítimas, para que confiassem no Estado que as governava, garantindo-lhes que este não as abandonaria em “transe tão custoso”, explicando também que, “em contraposição”, não lhes poderia ser dado tudo quanto precisassem e que nem sequer tinham o direito de o pedir perante a devastação que sofrera o país (LOUREIRO, 02-03-1941, p. 1). Um editorial, intitulado “Depois da tempestade”, lembrava que no meio do caos, das transmissões cortadas, de estradas e vias férreas obstruídas, de povoações inteiras que precisavam de socorro, tinha sido preciso reorganizar toda a atividade nacional suspensa. Fora essa a obra do Estado. E nessa ação “mais uma vez surgia o benéfico exemplo da política de previdência de Salazar. A forte armadura financeira do Estado, criação sua, era a primeira resistência e o primeiro baluarte a opor ao alastramento das consequências materiais das devastações. A Nação sabia-o. E sabia que o Estado estava pronto” (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 21-02-1941, p.1).

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O fato de a imprensa publicar apenas as notícias que eram favoráveis à situação, condiciona o conhecimento e a avaliação da extensão real dos prejuízos, bem como a da efetiva capacidade de recuperação do país e das populações. Há, porém, alguns indícios de contestação às medidas do governo e à falta de apoios estatais. A preocupação dos jornais em justificar a ação do Estado (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 19-03-1941, p. 1) pode traduzir a existência de uma certa celeuma em torno do seu papel em toda esta questão. Na Torre do Tombo, entre a documentação da Presidência do Conselho de Ministros, encontramos também uma carta de um produtor de sal de Setúbal queixando-se da falta dos apoios prometidos — a concessão de um empréstimo em condições vantajosas — para a reparação dos estragos nas marinhas confinantes com o rio Sado, explicando que isso comprometera gravemente a situação dos proprietários das salinas e contribuíra para que os trabalhadores deixassem de ganhar o seu sustento quando mais necessitavam dele. Concluía ele que este “facto lamentável […] constitui, infelizmente, desprestígio para a situação atual” (NUNES, 28-10-1941). Houve provavelmente outras queixas como esta, mas os instrumentos de controlo do regime — a censura e a polícia política — impediram decerto a difusão e/ou a generalização de quaisquer descontentamentos ou protestos relativamente à forma como a recuperação foi conduzida. Depois de o Diário de Notícias ter encerrado a sua subscrição, em julho de 1941, as notícias sobre as consequências do ciclone praticamente desaparecem. Eventualmente, vemo-las surgir no final do ano ou de forma esporádica em 1942, 1943 e 1944, no balanço de atividades de certas instituições envolvidas no processo de reconstrução (ADMINISTRAÇÃO GERAL DO PORTO DE LISBOA, s.d., p. 6-7; DIREÇÃO GERAL DOS

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SERVIÇOS HIDRÁULICOS E ELÉCTRICOS, 1943; JUNTA CENTRAL DAS CASAS DOS PESCADORES, 1942, 1945a, 1945b; COMISSÃO NACIONAL DE AUXÍLIO, 1944). A lembrança do temporal permaneceu, contudo, na memória das populações. Ainda hoje há quem o tenha vivido e se recorde do “dia do ciclone”. Os versos de João “Valintum” Farto, pescador de Peniche, são um dos muitos exemplos disso: “Queiram ouvir portugueses/ e foi para todos em geral/ um ciclone tão violento/ nunca houve em Portugal./ Já parecia o fim do mundo/ causou muita admiração./Árvores e telefones no chão/por um poder furibundo/ e que repetia segundo,/ pois os sábios muitas vezes/querem pôr-se a adivinhar,/ mas não puderam anunciar./ Queiram ouvir, portugueses,/ ali não vale a aviação,/ nem as peças d´artilharia,/ nem as granadas de mão,/ nem as armas de infantaria./ Pescadores e marinheiros também foram naufragados,/ os seus barcos afundados, / perdendo esses dinheiros, morrendo alguns companheiros,/ nesse desastre tão fatal./ Na nossa terra natal/ ficou gravado na História/ como esse não houve memória/ nunca houve em Portugal” (MEMORIAMEDIA).

Em Sesimbra, a memória do ciclone permanece viva na comunidade. Os sucessos daquele dia são recordados nos jornais (O CEZIMBRENSE, 08-10-1944, 17-02-1952, 21-02-1954; SESIMBRA MAGAZINE, 1991; COELHO, 1997), em exposições (no Festival do Mar de 1991), em postais evocativos (COELHO, 1997, p. 13-14), no cancioneiro local (RAPAZ, 2002, p. 92-93, 234-235) e até em fotografias expostas em locais públicos, como a que está no café da Sociedade Musical Sesimbrense. Em fevereiro de 2011, a Câmara Municipal promoveu a realização de uma sessão com algumas testemunhas do temporal (SESIMBRA ACONTECE, 2011). O objetivo, como se disse nessa ocasião,

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não era celebrar uma tragédia, mas recordar um “facto-charneira” que alterou profundamente a vida em Sesimbra. As recordações do temporal e do período que se lhe seguiu, bem como do movimento de solidariedade gerado em torno do desastre, são entendidos como fazendo parte do patrimônio imaterial da comunidade. O ciclone tornou-se um marco importante na identidade coletiva desta população (SESIMBRA: MEMÓRIA E IDENTIDADE, 2011). O processo de memorialização a que foi submetido parece ser garante da sua continuidade, através da transmissão de geração em geração, ganhando força enquanto “tradição local”.

4. Conclusão Os ventos ciclônicos que atingiram Portugal no dia 15 de fevereiro de 1941 provocaram importantes danos materiais, mortos e feridos, e podem por isso ser rotulados como um “desastre natural”. Mas os efeitos negativos de tal evento não se deveram apenas à força dos ventos e a outros fenômenos naturais associados. Na avaliação do seu impacte deve ser também tida em conta a maior ou menor vulnerabilidade das populações. Por todo o país houve prejuízos significativos, mas certas zonas foram mais atingidas do que outras e algumas comunidades foram mais afetadas que as restantes. Com efeito, logo que o apuramento dos danos foi realizado verificou-se que as áreas costeiras e as populações piscatórias tinham sido as mais prejudicadas. Isto deveu-se a uma conjugação de fatores naturais e humanos, que em seguida se enunciam: 1. Nas zonas costeiras, os ventos fortes e a baixa pressão atmosférica provocaram a sobre-elevação do nível do mar, o que, aliado às ondas de temporal, causou intensos galgamentos oceânicos e consequentes inundações e destruições;

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2. Nestas condições, as populações ribeirinhas, particularmente expostas aos elementos marítimos, foram as mais afetadas; 3. Nesta época do ano, não sendo período de veraneio, as povoações costeiras tinham menor número de habitantes, mas os que ali se encontravam — maioritariamente pescadores e suas famílias — eram exatamente os mais vulneráveis por causa da sua situação econômica e social; 4. Os pescadores, quase sempre muito pobres, dependiam totalmente da pesca para sua sobrevivência. Muitos perderam casas, roupas, haveres, barcos e redes durante o ciclone. Isto significa que não só perderam bens materiais (e alguns até a própria vida), como ficaram também sem a sua única forma de sustento. Dada a sua fragilidade econômica e social — que condicionou a sua capacidade de recuperação — o impacto do ciclone foi maior neste grupo do que em outros. No caso de Sesimbra, a reunião destes e de outros elementos ajudam a explicar a dimensão do desastre. A força e a direção dos ventos, a orientação e a forma deste litoral, bem como o caudal do Sado parecem ter-se conjugado para criar condições para o empilhamento das águas, empurradas então contra aquela costa. Ao mesmo tempo, verificou-se que a enseada de Sesimbra, que em geral constituía um bom abrigo para as embarcações, era particularmente vulnerável aos vendavais de sueste, exatamente a direção do vento e das ondas no dia do ciclone. Acresce ainda,

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que as estruturas de proteção da angra ou portinho natural tinham sido destruídas por anteriores temporais e não ofereciam quaisquer condições de segurança às embarcações ali recolhidas. O mar destruiu assim grande parte da sua frota, quer os barcos que estavam na angra, quer os que os pescadores cautelosamente haviam colocado nas ruas da vila. Depois da tragédia foi preciso retomar as atividades. Em plena Segunda Guerra Mundial, o governo português viu-se sem meios para fazer face a todos os pedidos de socorro. Decidiu então concentrar os seus recursos no restabelecimento dos serviços e patrimônio público, de interesse comum. A ajuda aos sinistrados ficou entregue à própria sociedade civil, sob a coordenação de uma Comissão Nacional de Auxílio às Vítimas do Ciclone. Os esforços de angariação de fundos para a reconstrução foram transformados em causa patriótica, pela mobilização da imprensa e de várias entidades nacionais e locais, públicas e privadas. Desta forma, o Estado não só conseguiu repartir os custos com as despesas das reparações, como também canalizou em proveito próprio o movimento de solidariedade gerado em torno do desastre. Em Sesimbra, o ciclone deixou marcas profundas na comunidade. Os testemunhos da época destacam sobretudo o drama dos pescadores que viram as suas embarcações serem destruídas pelo mar sem nada poderem fazer, o rastro de destruição que se encontrou, a miséria e a fome que se lhe seguiu. A “sopa” é uma das recordações mais fortes desse tempo. Isso e as ajudas recebidas de várias instituições e de grupos sociais mais favorecidos. A renovação da frota, a construção do porto de abrigo e a edificação do bairro piscatório são entendidos como elementos fundamentais para a reconstrução da vila e para o período de bonança que se lhe seguiu nos anos de 1950. Na memória coletiva desta população, o ciclone ficou gravado como “o dia mais negro”, mas é também

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símbolo, por tudo o que implicou, da sua capacidade de sobrevivência, constituindo por isso um importante elemento de coesão desta comunidade.

Agradecimentos

O trabalho de Joana Gaspar de Freitas foi financiado por Fundos Nacionais através da FCT – Fundação para a Ciência e Tecnologia — no âmbito do projeto PEst-OE/ELT/UI0657/2011 e de uma Bolsa de Investigação (SFRH/BPD/70384/2010). Para a elaboração deste artigo foi também determinante o apoio que recebemos de algumas pessoas e instituições. Assim, agradecemos a colaboração de Maria Antónia Valente, do Laboratório Associado Instituto D. Luiz (U. Lisboa); de Henrique Rodrigues, Anabela Gato e Cristina Conceição, da Câmara Municipal de Sesimbra; e a de António Manuel Costa Lopes, morador de Sesimbra. O nosso reconhecimento também aos funcionários do Arquivo Histórico da Marinha, Biblioteca e Arquivo Histórico das Obras Públicas, do Arquivo Municipal de Sesimbra, do Centro de Documentação do Porto de Lisboa e do Instituto Português do Mar e da Atmosfera, que nos ajudaram na pesquisa e forneceram dados e imagens para este trabalho.

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Ressacas do Mar/Temporais e Gestão Costeira

PRESIDENTE DA CÂMARA DE SESIMBRA, carta ao Ministro das Obras Públicas e Comunicações, em 23-02-1941 [AMS, CMS/ C/A/02/Lv. 026, n. 692 – 1941]. PRESIDENTE DA CÂMARA DE SESIMBRA, carta ao Governador Civil de Setúbal, em 26-02-1941, [AMS, CMS/C/A/02/Lv. 026, n. 692 – 1941]. PRESIDENTE DA CÂMARA DE SESIMBRA, carta ao Administrador Geral dos Serviços Hidráulicos, em 15-03-1941, [AMS, CMS/ C/A/02/Lv. 026, n. 692 – 1941]. PRESIDENTE DA CÂMARA DE SESIMBRA, carta ao Presidente da Junta de Província da Estremadura, em 19-04-1941, [AMS, FCMS/ B/B/04, cx. 05]. PRESIDENTE DA CÂMARA DE SESIMBRA, carta ao Presidente da Junta Central das Casas dos Pescadores, em 01-03-1942 [AMS, FCMS/B/B/04, cx.07]. SESIMBRA, MEMÓRIA E IDENTIDADE. Memória do ciclone de 1941. Guião da sessão promovida pela Câmara Municipal de Sesimbra, Fevereiro de 2011 [cedido Henrique Rodrigues, da Câmara Municipal de Sesimbra].

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