Entre o público e o privado - a campanha de comunicação “Echar Pal’ante” do Banco Popular de Porto Rico e os interesses explícitos (ou não).

June 19, 2017 | Autor: Áquila Paz da Rosa | Categoria: Puerto Rico, Comunicação Social, Relações Públicas, Micropolítica
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE COMUNICAÇÃO SOCIAL

ÁQUILA PAZ DA ROSA

ENTRE O PÚBLICO E O PRIVADO – A CAMPANHA DE COMUNICAÇÃO “ECHAR PAL’ANTE” DO BANCO POPULAR DE PORTO RICO E OS INTERESSES EXPLÍCITOS (OU NÃO).

Orientadora: Prof. Dra. Denise Avancini Alves

Porto Alegre 2015

ÁQUILA PAZ DA ROSA

ENTRE O PÚBLICO E O PRIVADO – A CAMPANHA DE COMUNICAÇÃO “ECHAR PAL’ANTE” DO BANCO POPULAR DE PORTO RICO E OS INTERESSES EXPLÍCITOS (OU NÃO).

Trabalho de conclusão de curso para obtenção do grau de Bacharel em Relações Públicas pela Faculdade de Comunicação Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul

Orientadora: Profa. Dra. Denise Avancini Alves



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ÁQUILA PAZ DA ROSA

ENTRE O PÚBLICO E O PRIVADO – A CAMPANHA DE COMUNICAÇÃO “ECHAR PAL’ANTE” DO BANCO POPULAR DE PORTO RICO E OS INTERESSES EXPLÍCITOS (OU NÃO).

Trabalho de conclusão obtenção do grau de Relações Públicas pela Comunicação Social Universidade Católica do Sul

de curso para Bacharel em Faculdade de da Pontifícia Rio Grande do

Aprovado em: ____de__________________de________.

BANCA EXAMINADORA: ______________________________________________ Profa. Dra. Denise Avancini Alves ______________________________________________ Prof. Dr. Jacques Alkalai Wainberg ______________________________________________ Profa. Me. Glafira Maria Furtado

Porto Alegre 2015

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Dedico esse trabalho aos meus pais, que me criaram para o mundo.



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AGRADECIMENTOS Aos meus pais, pelo amor incondicional e pelo apoio em minhas escolhas. Pela edução centradas em valores humanos e, principalmente, pela liberdade que me ensinaram a valorizar e desfrutar. À minha namorada, Bruna Schaab, pelo incentivo, pelo companheirismo, pelo ouvido atento e paciente, por acreditar em mim e me fazer cada dia mais feliz. Aos irmãos de ideal que a vida me deu a oportunidade de conhecer: Caio Coelho, Davi Sanchez, William “Ogro”, Diogo Laux, Henrique Messias. Me reconheço hoje inspirado em cada um de vocês. Obrigado pela parceria. À minha orientadora, Denise Avancini, pelos conselhos instigadores, pela paciência e pelas palavras de incentivo. Obrigado por ser um exemplo de profissionalismo. A mis amigos de mi tiempo en la “Isla del Encanto”: David Hernández Rivera y su familia, Erika Santos, Abimael Medina y su familia, Fernando Berrios, Wilfredo Vega, Salvatore Bica, Greta Molinari, Martina Picinali, Sonia Muñiz y todos mis compañeros de clase. Todos los profesores y empleados de la Pontificia Universidad Catolica de Puerto Rico, en especial el profesor Otto Sievens y a Maria Reyes. Gracias a todos por el bueno tiempo que compartimos. Yo extraño a Puerto Rico. A todos que de alguma forma colaboraram para esse trabalho e para a conclusão do curso, minha sincera gratidão.



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“O melhor meio para alcançar a felicidade é contribuir para a felicidade dos outros.” Baden-Powell



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RESUMO O presente estudo tem como objetivo analisar o discurso da campanha de Relações Públicas “Echar Pal’ante”, idealizada pelo Banco Popular de Puerto Rico para dinamizar a economia de Porto Rico através do empreendedorismo e da educação. Dentre as ações que compõem a campanha, buscou-se os vídeos “Echar Pal’ante” e “The most popular song”, analisadas a partir de Charaudeau (2008, 2010). Entre os principais autores encontra-se Simões (1995, 2001) e Esteves (2007, 2011), buscando os conceitos de Relações Públicas alinhados com a Micropolítica e da Sociologia da Comunicação, respectivamente. A partir desse processo tratou-se de identificar os interesses, sejam eles de caráter público ou privado, da campanha “Echar Pal’ante” e estabelecer o diálogo entre as teorias sociológicas, da área da comunicação e da micropolítica. Para isso, foi realizada pesquisa bibliográfica e análise do discurso das mencionadas realizações audiovisuais. Com base nas técnicas utilizadas, foi possível verificar a existência de interesses privados mesclados com o interesse público da campanha, porém de maneira implícita no vídeo “Echar Pal’ante”, mas de modo mais explícito em “The most popular song”. Palavras-chave: Relações Públicas e Micropolítica. Interesse Público. Interesse Privado. Porto Rico



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RESUMEN El presente estudio tiene como objetivo analizar el discurso de la campaña de relaciones públicas "Echar Pal'ante", creada por el Banco Popular Puerto Rico para impulsar la economía de Puerto Rico a través del empresarismo y la educación. Entre las acciones que componen la campaña, se buscó los vídeos "Echar Pal'ante" y "The most popular song", analizados desde Charaudeau (2008, 2010). Entre los principales autores están Simões (1995, 2001) y Esteves (2007, 2011), en busca de los conceptos de las Relaciones Públicas en línea con la Micropolítica y Sociología de la Comunicación, respectivamente. A partir de este proceso se trató de identificar los intereses, sean públicos o privados, de la campaña "Echar Pal'ante" y establecer un diálogo entre las teorías sociológicas de la área de la comunicación y de la Micropolítica. Para esto, se realizó la búsqueda bibliográfica y el análisis del discurso de las películas. Sobre la base de las técnicas utilizadas se hizo posible verificar la existencia de intereses privados fusionados con el interés público en la campaña, pero implícitamente en el vídeo "Echar Pal'ante" pero más explícitamente en "The most popular song". Palabras clave: Relaciones Públicas e Micropolítica. Interés Público. Interés Privado. Puerto Rico.



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LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Localização geográfica de Porto Rico no Caribe ..................................... 17 Figura 2 – Evolução do PIB de Porto Rico ................................................................ 27 Figura 3 – Dívida pública de Porto Rico .................................................................... 27 Figura 4 – Porto-riquenhos nos Estados Unidos continental..................................... 28 Figura 5 – Identidade visual do Banco Popular de Porto Rico .................................. 31 Figura 6 – Prédio-sede do Banco Popular de Porto Rico .......................................... 32 Quadro 1 – Comparativo dos processos e programas de RRPP e Micropolítica ...... 41 Figura 7 – Esquema narrativo do discurso propagandista segundo Charaudeau .... 49 Figura 8 – Jíbaro e cantor.......................................................................................... 51 Figura 9 – Shapper e saxofonista .............................................................................. 52 Figura 10 – Padeiro e percussionista ........................................................................ 53 Figura 11 – Funcionária de escritório e tecladista ..................................................... 53 Figura 12 – Inserção de marca do Banco Popular de Porto Rico ............................. 54 Quadro 2 – Esquema narrativo do vídeo “Echar Pal’ante” ........................................ 55 Quadro 3 – Comparação da letra de “No hago mas na’” e “Echar Pal’ante” ............. 56 Figura 13 – Resultados de mídia da campanha “Echar Pal’ante” ............................. 57 Quadro 4 – Esquema narrativo do vídeo “The most popular song”........................... 59



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SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ................................................................................................... 11 2. PUERTO RICO – LA ISLA DEL ENCANTO ....................................................... 16 2.1. ASPECTOS SOCIOCULTURAIS .................................................................. 18 2.2. BANCO POPULAR DE PORTO RICO .......................................................... 30 3. SOCIOLOGIA DA COMUNICAÇÃO, RELAÇÕES PÚBLICAS E O APELO SOCIAL ................................................................................................................ 34 3.1. SOCIOLOGIA APLICADA À COMUNICAÇÃO .............................................. 35 3.1.1 Comunicação e o Interesse Público ......................................... 35 3.2. RELAÇÕES PÚBLICAS ................................................................................ 39 3.2.1 RRPP e a Micropolítica .............................................................. 41 3.2.2 O apelo social como estratégia de RRPP ................................ 43 4

“NO HAGO MAS NA’ ” VERSUS “ECHAR PAL’ANTE” ................................ 47 4.1 ANÁLISE DO DISCURSO DA CAMPANHA “ECHAR PAL’ANTE” DO BANCO POPULAR DE PORTO RICO ..................................................... 49 4.2 ANÁLISE DO DISCURSO DO VIDEO CASE DA CAMPANHA “THE MOST POPULAR SONG” ........................................................................ 55

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CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................. 63

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 66 ANEXOS.................................................................................................................... 72 ANEXO A – Letra original de “Y no hago mas na’” ......................................... 72 ANEXO B – Letra de “Echar Pal’ante” ............................................................ 83



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1 INTRODUÇÃO A comunicação social, como parte das ciências sociais aplicadas, é bem clara ao definir seu escopo de estudo: a sociedade em que vivemos. De igual maneira, é uma área muito fértil para que ideias e ideais de mudança social ganhem espaço e se disseminem, afinal, estudar um fenômeno é de alguma forma um ato político. Porém, como a comunicação não acontece de forma unilateral, pois o receptor da mensagem sempre tem algum poder em suas mãos para aceitá-la ou refutá-la, legitimá-la ou descartá-la. Numa sociedade cada vez mais complexa, onde fenômenos políticos, sociais, econômicos, demográficos, culturais (apenas para citar alguns) se entrelaçam e compõem novas maneiras de viver e de ver o mundo, o estudo das formas de comunicar e de influenciar o comportamento das pessoas é algo necessário. As políticas econômicas de cada país, seja ele livre ou não para implementálas, configuram um fator especial na maneira como as pessoas se relacionam umas com as outras, na sua interação com as organizações e com as coisas. Cada modelo econômico pode ou não ter sucesso, dependendo de outros fatores, como a história da região e seus costumes. Nesse sentido, o Estado Livre Associado de Porto Rico (mais conhecido apenas como Porto Rico) tem uma história e cultura próprias, um passado-presente de dominação e de programas econômicos assistencialistas. Isso não encoraja nem incentiva a autonomia e o empreendedorismo, o que, de certa forma, torna a economia dependente, estagnada, sem o potencial dinamismo que a localização geográfica confere à ilha. No meio deste cenário econômico pouco favorável, somado ao contexto histórico pós-crise do subprime1, também conhecida como a crise do sistema financeiro de 2008, o Banco Popular de Porto Rico, maior instituição financeira privada do país, lançou uma campanha de comunicação para mudar a realidade econômica da ilha. Para tanto, se utilizou de um fator cultural muito forte e tradicional: a salsa. 1

“Pessoas que não tinham renda suficiente para obter financiamento imobiliário se viram conseguindo seus empréstimos sem fazer força – nem ter de apresentar bateladas de documentos comprovando que eram boas pagadoras. Os devedores da classe média alta para cima eram chamados de “prime”. Então essa outra fatia do mercado era a “subprime”. VERSIGNASSI (2011, p.268).



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A campanha “The most popular song”, que pode ser traduzida como “A música mais popular”, foi criada pela agência JWT Porto Rico para o Banco Popular de Porto Rico e lançada no dia 16 de agosto de 2011 com o slogan “Echar Pa’lante” (numa tradução literal: “tocar para frente”). O mote da campanha foi regravar a música “Y No hago mas na’” do grupo “El Gran Combo de Puerto Rico”, lançada originalmente em 1983 no disco “La Universidad de la Salsa”. A música conta a história de um homem que recebe benefícios do governo e por isso não trabalha, além de contar vantagem de sua vida em cima dos que trabalham. A transformação de "Y No hago mas na'" em "Echar Pa'lante" mostra que o Banco Popular acreditou ser possível modificar o comportamento das pessoas através de um ícone da cultura local, uma salsa que foi bastante famosa na década de 80. A campanha não se baseou somente na larga exposição midiática das peças publicitárias e da regravação da canção, mas sim no poder que um fenômeno cultural pode ter para mudar a vida das pessoas. Dessa forma, contrapondo o interesse público em desenvolver o país através de uma economia dinâmica, temos o interesse privado de uma instituição financeira em ter mais clientes acreditando no desenvolvimento da nação, tomando empréstimos, investindo, comprando e vendendo, gerando lucros ao banco. Essa preocupação do setor privado com assuntos que seriam mais tocantes ao poder público nos traz um ponto de análise que nos leva aos limites do discurso, não somente ao que foi dito e explicitado pela campanha, mas também o que deixou de ser dito. A campanha de comunicação do Banco Popular de Porto Rico rendeu à JWT o Grande Prêmio de Relações Públicas do Festival Internacional de Criatividade de Cannes em 2012, além de reconhecimento no cenário externo. Tal distinção trouxe visibilidade à ação e, por isso, interesse em pesquisá-la como uma estratégia de Relações Públicas usando o apelo social. Dessa forma, a análise de conteúdo do clipe de vídeo de “Echar Pal’ante´”, juntamente com o vídeo do case chamado “The most popular song”, enviado ao Festival de Cannes, formam um importante binômio de estudo do “discurso” com o “que foi dito sobre o discurso”. No vídeo apresentado pela JWT é ressaltado o poder que a música pode ter na mudança social almejada pela campanha do Banco Popular de Porto Rico, talvez como forma de tornar a comunicação mais empática, ou apenas como um meio de vender mais facilmente a mensagem. Porém, temos outro ponto de estudo

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interessante, que seria a discussão da forma como as Relações Públicas podem ajudar na construção de um mundo melhor. Como objetivos desse trabalho estão, identificar, através de análise de discurso, as características dos vídeos “Echar Pal’ante” e “The most popular song”, ambos do Banco Popular de Porto Rico. De igual maneira, existe a intenção de verificar como os interesses do Banco Popular de Porto Rico se expressam nas realizações audiovisuais, de maneiras distintas conforme o público a ser atingido. Surgem, na trilha dessa monografia, a interpretação dos objetivos da campanha criada pela agência de publicidade JWT e a verificação se os interesses privados do Banco Popular de Porto Rico se mesclam com o uso de um tema de interesse público. A inspiração para escrever a monografia, baseada numa ação de comunicação de uma instituição financeira estrangeira, foi uma aproximação pessoal ao tema. Entre agosto e dezembro de 2014, estive como aluno de intercâmbio na “Pontificia Universidad Católica de Puerto Rico”, morando na cidade de Ponce e convivendo com muitos aspectos da realidade aqui descrita, participando de debates políticos e trazendo muitas boas lembranças de volta ao Brasil. Assim, para o desenvolvimento deste trabalho acadêmico, utiliza-se um conjunto de metodologias que auxiliam o processo de análise de conteúdo. As metodologias que servem como base para o trabalho são as pesquisas, tanto bibliográfica quanto documental e também a análise de conteúdo. Stump (2005, p. 51) define o conceito de pesquisa bibliográfica como um planejamento inicial que busca sistematizar materiais de diversos autores que abordam um determinado tema e que serão utilizados como base a defesa de ideias e opiniões do aluno. Para a autora, o conceito se define como: Conjunto de procedimentos que visa identificar informações bibliográficas, selecionar os documentos pertinentes ao tema estudado e proceder à respectiva anotação ou fichamento das referências e dos dados dos documentos para que sejam posteriormente utilizados na redação de um trabalho acadêmico. Stump (2005, p. 51)

A análise documental é diferente, pois sua pesquisa está mais focada em documentos de mídia impressa – como jornais e revistas – e de mídia eletrônica através de gravações de áudio, vídeo e imagens. Esta pesquisa trabalhará com grande enfoque na análise dos vídeos produzidos para campanha.



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As principais metodologias a serem utilizadas são a de análise de conteúdo e a de discurso, pois focam no estudo do conteúdo produzido em forma de vídeo e como a narrativa é conduzida pela campanha. A intenção é comparar os interesses públicos e os interesses privados, a mensagem comunicada através de um olhar sobre o que foi dito, e o que foi falado sobre o discurso. Manhães (2005, p. 305) define análise de discurso como uma forma de compreender como a mensagem é formada no interior de uma conversa ou durante a realização de um ato. Para a autora, discurso se define como: A noção de discurso é uma consequência da premissa hermenêutica de que a interpretação do sentido deve levar em conta que a significação é construída no interior da fala de um determinado sujeito; quando um emissor tenta mostrar o mundo para um interlocutor, numa determinada situação, a partir de seu ponto de vista, movido por uma intenção.

Esta monografia se compõe em cinco capítulos. Após as páginas de introdução, o segundo capítulo apresenta Porto Rico, seus aspectos históricos, geográficos, culturais, econômicos. O objetivo é situar o leitor sobre um país que talvez nunca teve contato, assim como frisar alguns pontos que de forma transversal atingem o tema, como política, well fare state, cultura e música do país. Há ainda nesse capítulo uma importante contextualização sobre a organização proponente da campanha "Echar Pal'ante", o Banco Popular de Porto Rico, portanto também se desdobram outros fatos relevantes para uma melhor compreensão sobre o universo a ser estudado. O terceiro capítulo está voltado para a área da Sociologia, mais especificamente no campo da Sociologia da Comunicação. De igual forma, nesse capítulo a área de Relações Públicas e da Micropolítica, são abordadas de maneira teórica, levantando o estado da arte dessas disciplinas. A elaboração das hipóteses sobre os interesses privados e públicos tem como base os autores que tratam da área de Sociologia da Comunicação, e a visão estratégica das Relações Públicas através do apelo social nos agrega o conceito de “mudança de comportamento dos públicos-alvo”. No quarto capítulo o trabalho se debruça sobre a análise dos vídeos do Banco Popular de Porto Rico, analisando os discursos explícitos e sobre a comunicação verbal / não-verbal. Nessa altura do trabalho, já com as referências sobre os públicos, análise de conteúdo, entendimento sobre o contexto histórico e social do país, os textos sobre interesses públicos e privados, com tudo isso já visitado, o

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objetivo é comparar o discurso de cada realização audiovisual e assim descobrir pontos interessantes presentes / ausentes e os interesses implícitos / explícitos. Para dar respaldo à presente análise serão trazidos da área da Sociologia as questões de interesse público e privado, focadas na comunicação, através de textos de Esteves (2007, 2011) e Duarte (2012). O subcapítulo sobre Comunicação Social, Relações Públicas e Micropolítica tem como autores centrais Wolton (2010), Simões (1995 e 2001) e demais teóricos que podem auxiliar na explanação dos conceitos necessários para um embasamento na área, como França (2004), Rosa (2006) e Silveirinha (2004). O texto inicial, que visa apresentar Porto Rico como território, país e sua realidade complexa vai se utilizar de referências variadas. Aspectos econômicos e demográficos serão amparados por dados do próprio Governo de Porto Rico, bem como contribuições de Oliveras (1998). As descrições de população e cultura tem apoio de Gonzáles Cruz (2014) e Alonso (2007). Também buscou-se autores que dialogam mais criticamente sobre a história e sobre o território porto-riquenhos, como Ianni, Baggio, Torres, sendo alguns nativos do referido país e outros não. Ainda sobre os autores, é interessante ressaltar que optou-se em usar o texto original das obras para as citações. Dessa forma, além dos diferentes idiomas existentes, pois encontram-se referências em inglês, espanhol e português, também existem variedades linguísticas presentes dentro de cada língua. Apresenta-se os autores lusófonos portugueses (Silveirinha e Esteves) e em espanhol antigo, Alonso, que escreveu a obra usada em 1849. Todas as citações em inglês e espanhol têm sua tradução nas notas de rodapé. Tendo tudo isso em mente, essa monografia se soma aos esforços de expandir os domínios de estudo de comunicação normalmente abordados em monografias de RRPP da FAMECOS. Abordando não de maneira internacional, pois esse conceito é entendido como “relação entre duas ou mais nações”, mas sim estudando um fenômeno externo à nossa realidade, entendendo de que maneira outro país compreende Relações Públicas e se empoderando de conhecimentos e práticas inspiradoras a nós.



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2 PUERTO RICO - LA ISLA DEL ENCANTO Para que se iniciem o estudo e as discussões que são propostas por esta monografia, antes é necessário um aprofundamento nas questões políticas, geográficas, sociais, culturais e econômicas de Porto Rico. O presente capítulo se propõe a fazer a apresentação dos aspectos relevantes sobre esse país para o desenvolvimento dos demais tópicos desse trabalho, bem como deseja já realçar alguns dados que nos serão úteis. Porto Rico, ou para ser mais formal, o Estado Livre Associado de Porto Rico (nome oficial) é, conforme definição do próprio Departamento de Estado: Un territorio no incorporado de los Estados Unidos de América. Como consecuencia de esta relación política, el control de la entrada y salida a los 2 límites territoriales de Puerto Rico lo tiene el Gobierno Federal.

A discussão sobre a situação política e territorial de Porto Rico é bastante delicada e que será explicada no decorrer deste capítulo, mas de qualquer forma será convencionado a referência a Porto Rico como país. Geograficamente localizase no Caribe sendo um arquipélago e a ilha principal é a menor e mais oriental das Grandes Antilhas (a saber: Jamaica, Cuba, Hispaniola3 e Porto Rico). A ilha principal de Porto Rico possui 65km de largura e 178km de comprimento e nela localizam-se 76 municípios, entre eles a capital San Juan. Além disso, ainda existem duas ilhas-município localizam-se à leste (Vieques e Culebra) e mais dezenas de pequenas ilhas no recortado litoral do país. A população do país é de 3,725 milhões de habitantes4, distribuídos em 8.870 quilômetros quadrados5. Por sua localização privilegiada no Caribe (ver figura 1), Porto Rico sempre teve um papel estratégico na logística da região e a posse da ilha foi disputada desde a chegada dos espanhóis na América. Conforme González Cruz (2014, p.16): A ilha tem uma interessante localização central geográfica que ainda hoje em dia a posiciona no meio de uma espécie de canal da “Mancha” caribenho, um de grande trânsito cultural e humano constante, onde se falam múltiplas línguas. González Cruz (2014, p.16)

A chegada de Cristóvão Colombo à ilha de Porto Rico em 19 de novembro 1493 dá início à colonização espanhola e a um período de dominação que se extende até 1898. Originalmente a ilha chamava-se “Isla de San Juan Bautista” e a 2

“um território não incorporado dos Estados Unidos da América. Como consequência desta relação política, o controle de entrada e saída dos limites territoriais de Porto Rico são de responsabildade do Governo Federal.” (tradução do autor) 3 Isla Hispaniola é o nome dado à ilha onde se localizam o Haiti e a República Dominicana. 4 Retirado de http://factfinder.census.gov/faces/nav/jsf/pages/community_facts.xhtml. Acessado em 11 nov 2015. 5 Retirado de https://www.cia.gov/library/publications/the-world-factbook/geos/rq.html. Acessado em 11 nov 2015.



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capital, fundada em 1509 (sendo a segunda cidade mais antiga da América) era conhecida como “Puerto Rico”, até que em meados de 1520 trocou-se o nome da cidade pelo da ilha e San Juan passou a designar-se a capital. Figura 1 – Localização geográfica de Porto Rico no Caribe.

Fonte: Sistema de Información Geográfica (2015)

De 1493 até 1898, Porto Rico foi colônia do Império Espanhol e em suas terras foi aplicado o sistema de encomiendas, baseado no latifúndio exportador monocultor escravagista, de maneira muito semelhante ao que ocorreu no Brasil Colonial, sendo inclusive a mesma matéria-prima exportada, o açúcar. Em suma, a ilha viveu um período de mais de 400 anos sob o regime do Pacto Colonial, que nos é resumido por González Cruz (2014, p.21) como: A ilha [...] se manteve na base de uma economia básica de subsistência sob o domínio total das instituições espanholas como a Coroa e a Igreja Católica. O comércio com as nações industrializadas estava proibido pelo governo insular, principalmente por causa do uso da ilha como fortaleza militar da armada espanhola. O potencial produtivo da ilha era limitado em grande parte pelo status colonial, a posição geográfica e as políticas de restrição de comércio.

Porém, se a economia da ilha tinha poucos atrativos além do plantio e refino da cana-de-açúcar, em termos sociais o domínio espanhol e seu sistema de

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encomiendas trouxe certo dinamismo para a cultura, favorecido pela posição de destaque no Caribe e pelas transgressões às regras da Coroa Espanhola.

2.1. ASPECTOS SOCIOCULTURAIS A proximidade entre as Antilhas sob domínio britânico, francês e holandês, a decadência do controle espanhol devido a questões administrativas e às precárias condições da economia da ilha aos poucos conduziram a mudanças na ordem social, principalmente do comércio, com o fortalecimento do contrabando. Conforme nos afirma González Cruz (2014, p. 21): Já para finais do século XVII existe isso que o historiador porto-riquenho Fernando Picó chamou de uma “economia de contrabando” a mesma foi muito comum durante grande parte destes séculos. A investigação de uma década do historiador Ángel López Cantos nos mostra como a atividade do contrabando era uma cotidianidade. O seu estudo, que recolhe, data de uma década, desde o ano de 1650 até o 1700, eleva o contrabando à categoria de sistema. Nas tabelas mencionadas por (Picó, 1986) onde aparecem detalhados os 16 navios procedentes dos domínios da Espanha, aparecem ademais registrados 65 barcos estrangeiros. Há barcos holandeses, britânicos (Jamaica), franceses (Guadalupe, Martinica), portugueses e dinamarqueses (Curaçao) registrados por López no seu estudo. O que resulta interessante para nós neste ponto, são os produtos que eram o objeto do contrabando. De Porto Rico e dos outros domínios espanhóis é roupa, vinhos e aguardente, do estrangeiro chegam espécies, conservas, sal e mercadorias em geral. O nível de contrabandeio era tal, que todos os governadores espanhóis da ilha entre o ano 1650 e o ano 1700 foram acusados de estar implicados no comércio ilegal, oficiais reais e membros do clero foram acusados também. Os compradores eram soldados e vizinhos provenientes de todos os níveis sociais.

Apesar da proibição do comércio regional por conta do Pacto Colonial e da violência marítima na época, também conhecida como a “Era de Ouro da Pirataria”6, a presença de não-espanhóis na ilha de Porto Rico não era vista como ameaçadora por parte da população, como nos cita Carrión (1995, p.1) nesse trecho: Hubo numerosos contactos entre las islas que no se limitaron necesariamente a incursiones agresivas o a ataques directos. Este fue el caso, en especial, del área central antillana donde la proximidad de diversos poblados en competencia entre sí intensificó las tensiones, pero al mismo tiempo aumentó las oportunidades de intercambio directo de productos e 7 ideas .

E entre os processos de intercâmbio cultural ocorridos nesse período de domínio espanhol, a mescla de ritmos afro-caribenhos foi tão importante quanto a 6

Ramos & Ertzogue (2015, p. 3) Houveram numerosos contatos entre as ilhas que não limitaram-se necessariamente a incursões agressivas ou ataques diretos. Este foi o caso, em especial, da área central das Antilhas, onde a proximidade de diversos povoados concorrentes entre si intensificou as tensões, mas ao mesmo tempo aumentou as oportunidades de intercâmbio direto de productos e ideias. (tradução do autor)

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miscigenação entre indígenas, espanhóis e negros trazidos para o trabalho escravo nos latifúndios. Como por dito San Miguel (2001), houve uma “crioulização” das Antilhas pela mescla de culturas, etnias e religiões, criando uma “identidade granítica”, solidificada na alta diversidade de povos, porém ainda com uma visão subalterna às metrópoles. Como exemplo desse ambiente de alta miscigenação cultural, exemplos no campo da música ajudam a entender o grau de interferência de cada parte formadora da identidade afro-caribenha. Um dos primeiros escritores borícuas8 que retratou os costumes de sua terra foi Manuel Antonio Alonso, que ao escrever “El Gíbaro9 – Cuadro de Costumbres de la Isla de Puerto Rico”, datado de 1849, traz no capítulo “Bailes de Puerto Rico” algumas informações sobre os ritmos da ilha naquela época: Todos los pueblos tienes bailes acomodados a su gusto, clima, civilización y costumbres. [...] En Puerto Rico hay dos clases de bailes: unos de sociedad, que no son otra cosa que el eco repetido allí de los de Europa; y otros, llamados de gabarato*, que son propios del país, aunque dimanan a mi entender de los nacionales españoles mezclados con de los primitivos habitantes; conócense además algunos de los de África, introducidos por los negros de aquellas regiones, pero que nunca se han generalizado, llamándoseles bailes de bomba* por el instrumento que sirve en ellos de 10 música. Alonso (2007, p.93)

Em sua descrição que segue, Alonso fala da contradanza americana (de origem colombiana), da vals11 (dançada da mesma maneira que na Europa), da polka e de outros balies de sociedad. A seguir começa a relatar sobre los bailes de gabarato, como las cadenas, el fandanguillo, el sonduro e el seis. Ao terminar o autor denota orgulho da variedade das danças presentes em seu país escrevendo: Inútil sería entretenerme en probar que esta variedad depende de la posición geográfica que acumula allí individuos de tantas naciones, cada una de las cuales introduce usos que se arraigan más o menos [...] y así concluyo manifestando que [...] en cuanto a bailes nada tenemos que 12 envidiar a ningún pueblo del mundo. Alonso (2007, p.93)

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Gentílico alternativo a porto-riquenho, que deriva do nome dado à ilha pelos indígenas pré-colombianos. Gíbaro pode ser traduzido como “colono” ou “campesino”, e traz um significado bastante semelhante à visão estereotipada que os brasileiros fazem com os “caipiras”. 10 “Todos os povoados tem bailes conforme suas preferências, clima, civilidade e costumes. [...] Em Porto Rico há dois tipos de dança: uns de clube, que não são outra coisa que o eco repetido aí dos bailes europeus; e outros, chamados de gabarato, que são próprios do país, ainda que decorrentes, ao meu entender das danças nacionais espanholas mesclados com as dos primeiros habitantes; conhecem-se também algumas danças africanas, introduzidos pelos negros daquelas regiões, mas que nunca foram generalizados, nomeados bailes de bomba, por conta dos instrumentos com que são tocados. (tradução do autor) 11 Valsa 12 “Inútil seria me pôr a provar que esta variedade deriva da posição geográfica que soma aqui tantos indivíduos de tantas nações, cada uma introduzindo usos e costumes que se enraízam mais ou menos [...] e assim concluo manifestando que [...] no que se fala de danças nada temos que invejar a nenhum outro povo do mundo. (tradução do autor). 9



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Essa mescla cultural que aos poucos foi solidificando a identidade borícua se fez aos mesmos moldes de outros países latino-americanos, assim como diz Ianni (1987, p.6): “A sociedade nacional se forma aos poucos, [...] nas terras americanas, os conquistadores vão se tornando nativos, colocam-se em divergência e oposição em face da metrópole, passam a lutar pela pátria.”. Nessa formação social, Correa (1966 citado por IANNI 1987, p. 6) nos dá um importante resumo: “É um fenômeno geralmente aceito que, entre os séculos XVII e XVIII, o nativo deixou de sentir-se espanhol e passou a considerar-se americano”. Em 1868 ocorre o Grito de Lares, uma tentativa organizada, porém frustrada, de independência de Porto Rico. Liderada por Ramón Betances, a insurgência contra o governo espanhol teve origem no descontentamento com a administração de Isabel II e com a falta de diálogo da corte junto aos representantes das colônias espanholas no Caribe. Após ser duramente reprimida pela milícia espanhola na ilha, outros pequenos embates pela independência aconteceriam até 1897, ano em que a Espanha promulga a “Carta Autonômica de Porto Rico”, documento que dava à ilha uma série de liberdades, entre elas o direito de eleger um governo autônomo (tal qual as exigências de Betances). Porém, esse direito nem pôde ser levado a cabo, pois em 1898 se inicia a Guerra Hispano-Americana. No conflito, a Espanha perdeu e teve que dar como espólio seus territórios ultramarinos (Porto Rico, Cuba e Filipinas) aos Estados Unidos da América. Dessa forma, se encerra o período colonial espanhol no Caribe. Iniciada pela invasão à ilha, o domínio americano começa em 1898 e segue até hoje. Nos primeiros anos de ocupação, Porto Rico fica sob a tutela de governadores

militares,

nomeados

por

Washington.

Sobre

os

interesses

estadunidenses, González Cruz (2014, p. 31) nos coloca que: O objetivo principal do governo militar e do capital corporativo norteamericano era desenvolver Porto Rico como bastião militar fronteiriço do império em expansão de acordo com o que ditou na sua doutrina 13 expansionista do Destino Manifesto , doutrina já aplicada a múltiplas nações indígenas que ocupavam o território ao oeste das 13 colônias. Era a subsequente e sistemática aculturação da população e logo a eventual industrialização das terras agrícolas. [...] Esse processo, chamado por alguns de americanização, que além da mudança ocasionada pela

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Conceito aplicável a toda a política externa americana, o Destino Manifesto é “Conjunto de crenças nacionalistas e expansionistas embevecidas pela religião e pela ética protestante, serviu de princípio legitimador para a ocupação e anexação de territórios do Oeste dos Estados Unidos durante o século XIX.” (DA COSTA, 2009, p. 2267)



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aculturação, foi a mudança causada pelas novas realidades, foi a nova relação entre o indivíduo e o estado. González Cruz (2014, p. 31)

Ao final após o período militar em Porto Rico, inicia-se a Primeira Guerra Mundial e com ela ocorre uma mudança significativa no contexto social da ilha. Em 1917, por meio da “Lei Jones”, o governo americano começa a considerar como “cidadãos americanos” os nascidos na ilha, da mesma forma que os estadunidenses nascidos no continente14. Essa estratégia de torná-los cidadãos pode ser entendida como um ato de guerra, pois nesse período os EUA estavam entrando na Primeira Guerra Mundial (1914-1918) e ao torná-los americanos de fato, puderam conscrever os homens em idade de alistamento, pondo milhares15 de soldados16 nas fileiras americanas que marcharam para a Europa. Os porto-riquenhos agora cidadãos americanos, fugindo de sucessivas crises econômicas da ilha sob o domínio recente estadunidense, migraram em massa para os Estados Unidos continental durante todo o século XX, assim como relata Degró (2004, p.269): El movimiento emigratorio de los puertorriqueños comenzó en los inicios del siglo XX, como consecuencia del cambio de soberanía ocurrido en el 1898, con la invasión de los norteamericanos. Miles de puertorriqueños se movieron individualmente o con sus familias a Nueva York y a otras ciudades de los Estados Unidos, estimándose que entre 1900 y 1944, un 17 total de aproximadamente 90,000 habitantes emigraron a ese país.

Dessa forma, o ambiente de mestiçagem sociocultural presente na ilha de Porto Rico, onde já estavam descendentes de taínos (indígenas autóctones), de negros trazidos da África, espanhóis, franceses, holandeses, colombianos e de outros antilhanos mais uma vez se modifica e passa a ter Nova York e outras cidades americanas como domínio cultural, como polo da cultura porto-riquenha. Como nos afirma Torres (2000, p.33): Os EUA e o Caribe, desde o século 19, encontram-se emaranhados em uma relação bastante particular; se ela não tem sido simétrica político e economicamente, ela tem, sem dúvida, gerado uma troca cultural mais complexa entre centro e periferia. Os porto-riquenhos de Nova York os nuyoricans (o termo vem da fusão de New Yorker com Puerto Rican), têm sua forma muito especial de serem tanto “locais” quanto “globais”. Assim,

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Até os dias de hoje ainda existe esse conflito de conceitos entre “a ilha X o continente”, esse último, referido na literatura também como “Estados Unidos contíguos”. 15 Segundo Avilés-Santiago (2014, p. 5), 17.855 soldados foram convocados para a Primeira Guerra Mundial 16 Numa declaração de 2010, o ex-governador da ilha, Aníbal Acevedo Vilá, disse que Porto Rico ainda servia aos EUA enquanto lhes dava açúcar e soldados. (CASTRO, 2015). 17 “O movimento migratório dos porto-riquenhos começou no início do século XX, como consequência da mudança de soberania ocorrida em 1898, com a invasão norte-americana. Milhares de porto-riquenhos moveram-se individualmente ou com suas famílias a Nova Iorque e a outras cidades dos Estados Unidos, estimando-se que entre 1900 e 1944, aproximadamente 90 mil habitantes migraram a esse país. (tradução do autor)



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embora um nuyorican possua origem latino-americana, e mais especificamente caribenha, é importante que se levem em conta, também, as diferentes perspectivas desse grupo, que os diferencia de seus compatriotas insulares. Torres (2000, p.33)

De certa forma, esse êxodo de porto-riquenhos em tempos bonança econômica se explica pelas relações assimétricas entre a colônia e a metrópole. Antes de 1917, exportação de açúcar, café e tabaco18 (nessa ordem) para vários países dinamizava a economia da ilha. Porém, a promulgação da Lei Jones, o comércio foi monopolizado pelos EUA, que inseriram restrições para o comércio marítimo através da lei de cabotagem19. Além disso, a presença americana industrializou fortemente a economia do açucareira, tornando-a muito eficiente e rentável, porém, pouco influenciando positivamente na condição de vida dos colonos, como nos diz Oliveras (1998, p.9): Tal “eficiencia” no se tradujo en mejores contratos para los colonos ni en jornales más generosos para los trabajadores. Tampoco propició aumento en la responsabilidad contributiva para el financiamiento de la gestión 20 pública [...], se tradujo en rentabilidad.

A situação se manteve nesse patamar, tanto nas relações entre Porto Rico e Estados Unidos quanto na migração, da ilha para o continente, até o fim da década de 1920, quando a crise de 1929 corrói a economia global e, ainda segundo Oliveras (1998, p.12) “La prolongada crisis de la década de 1930 puede considerarse como el punto clave de la ruptura de la economía basada en la exportación de bienes primarios, particularmente azúcar”.21 No contexto de recuperação econômica pós-crise de 1929, surge o New Deal americano para a Europa. Para Porto Rico, os planos financeiros de ajuda foram o PRERA (Puerto Rico Emergency Administration)22 e o PRRA (Puerto Rico Recontruction Administration)23 (OLIVERAS, 1998), ambos com uma forte tendência de intervencionismo estatal na economia, visto que o excessivo liberalismo econômico foi uma das causas da crise de 1929. Se analisarmos com um pouco mais de cuidado, desde a invasão norte-americana em 1898, o domínio dos aspectos econômico e social já era desejo americano, como já dito por González 18

(Oliveras, 1998, p.8) (Ibid., p.9) 20 Tal “eficiência” não se traduziu em melhores contratos para os colonos nem em salários mais generosos para os trabalhadores. Também não propiciou aumento na responsabilidade contributiva para o financiamento da gestão pública [...], se traduziu apenas em rentabilidade. (tradução do autor) 21 A prolongada crise da década de 1930 pode ser considerada como o ponto chave da ruptura da economia basada na exportacão de bens primários, particularmente o açúcar. (tradução do autor) 22 Administração Emergencial de Porto Rico. (tradução do autor) 23 Administração de Reconstrução de Porto Rico. (tradução do autor) 19



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Cruz (2014, p. 31), e os dois planos de recuperação convergem para este domínio socioeconômico. Assim como Oliveras (1998, p. 13): El problema con tal enfoque radicaba en que estaba diseñado para economías que contaran con un acervo productivo significativo. Por lo tanto, se presumía que el aumento de la demanda movilizaría a la base productiva. Pero en Puerto Rico dicha base necesitaba hacerse, no rehabilitarse. Desafortunadamente, las distintas iniciativas inscritas en el 24 Nuevo Trato no lograron desatar el proceso innovador que se necesitaba.

A crise dos anos 30 foi logo substituída por outra preocupação: a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Nesse período, além de servir para o alistamento de soldados porto-riquenhos, o arquipélago também foi útil aos Estados Unidos como base militar, principalmente no leste da ilha e no município de Vieques, onde foram instaladas grandes bases americanas. Após o fim do conflito, a quantidade de investimentos americanos no território porto-riquenho não cessou, muito pelo viés keynesiano25 implementado nos anos 30 e pela política de bem-estar social26 pregada pela doutrina keynesiana. Como nos diz Oliveras (1998, p. 15) La depresión económica que muchos anticiparon que ocurriría después de la Segunda Guerra nunca se materializó. En su lugar se desarrolló en todos los países industriales un aparato estatal orientado a la estabilización (gestión “keynesiana”) y a la provisión de prestaciones sociales (gestión de bienestar). Esto, naturalmente, aumentó el peso de la esfera pública en la 27 economía.

Nos idos dos anos 40, o movimento nacionalista que lutou pela independência se intensifica, agora contra o domínio americano. Esse movimento foi protagonizado por Pedro Albizu Campos, líder do Partido Nacionalista de Porto Rico e que o levou a ficar 26 anos na prisão, se tornando um mártir do movimento independentista da 24

O problema com tal enfoque é que ele foi projetado para economias que contavam com um sugnificativo leque produtivo. Para isso, presumia-se que o aumento da demanda mobilizaria a base produtiva. Mas em Porto Rico tal base necessitava fazer-se, não reabilitar-se. Infelizmente, as variadas iniciativas inscritas no New Deal não conseguiram iniciar o processo de inovação que era necessário. (tradução do autor) 25 “Conjunto de idéias que propunham a intervenção estatal na vida econômica com o objetivo de conduzir a um regime de pleno emprego. [...] Acreditava que a economia seguiria o caminho do pleno emprego, sendo o desemprego uma situação temporária que desapareceria graças às forças do mercado. O objetivo do keynesianismo era manter o crescimento da demanda em paridade com o aumento da capacidade produtiva da economia, de forma suficiente para garantir o pleno emprego.” Retirado de: . Acessado em 12 nov. 2015 26 “Fenômeno do século XX, a provisão de serviços sociais, cobrindo as mais variadas formas de risco da vida individual e coletiva, tornou-se um direito assegurado pelo Estado a camadas bastante expressivas da população. [...] Ainda que alguns países [...] tenham dado origem a programas de seguro social já no final do século passado e que políticas de proteção a idosos, mulheres, incapacitados, etc tenham se desenvolvido em vários países já no início deste século. [...] É a partir de então que se generaliza e ganha dimensões quase universais nesses países um conjunto articulado de programas de proteção social, assegurando o direito à aposentadoria, habitação, educação, saúde, etc.” ARRETCHE (1995) 27 A depressão econômica que muitos anteciparam que ocorreria depoiss da Segunda Guerra nunca se materializoou. Em seu lugar se desenvolveu em todos os países industrializados um aparato estatal orientado à estabilização (gestão “keynesiana”) e à oferta de benefícios sociais (gestão de be-estar. Isto, naturalmente, aumentou o peso da esfera pública na economia. (tradução do autor)



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ilha. Entre seus escritos, pode-se destacar o trecho do livro “La conciencia nacional puertorriqueña”28 (Campos citado por IANNI 1987, p.27): Porto Rico e as outras Antilhas constituem o campo de batalha entre o imperialismo ianque e o ibero-americanismo. A solidariedade iberoamericana exige que cesse toda ingerência ianque neste arquipélago, para restaurar o equilíbrio continental e assegurar a independência de todas as nações colombianas. Dentro dessa suprema necessidade, é imprescindível nossa independência. Nossa situação dolorosa sob o império dos Estados Unidos é a situação que Norte-América pretende impor a todos os povos do continente. Nossa causa é a causa continental. Os pensadores iberoamericanos vêem claro o problema conjunto da América Ibérica diante do imperialismo ianque. Se triunfa a absorção norte-americana em nossa terra, o espírito de conquista ianque não terá freios.

Os reclames do Partido Nacionalista geraram repercussão entre os portoriquenhos, apesar do partido não obter nenhum sucesso nos pleitos eleitorais e acabar se retirando do cenário partidário, atuando apenas no âmbito ideológico. Nesse momento, a população começa a pedir por mais autonomia, tal qual o período anterior à Carta Autonômica de Porto Rico, onde a Espanha começou um movimento para dar mais liberdades à ilha. Na política então surge o nome de Luis Muñoz Marín, que após a expulsão do Partido Liberal, forma o Partido Popular Democrático (PPD), existente até hoje. Muñoz foi um líder muito popular, foi o primeiro governador eleito da ilha (em 1948) e permaneceu no cargo por 16 anos. “Papá Muñoz” foi o principal nome da política porto-riquenha no que se refere à instalação do atual status político, o Estado Livre Associado. A popularidade do líder pode ser sentida até hoje, conforme Cosme (2007, p.189): Cuando se habla de la historia de Puerto Rico de la primera y gran parte de la segunda mitad del siglo XX se suele escuchar el nombre de Don Luis Muñoz Marín y la conocidísima frase de que fue éste quien le puso zapatos al jíbaro puertorriqueño. La figura de Muñoz Marin es considerada por 29 muchos como un icono de progreso y modernidad.

Ao iniciarmos o diálogo sobre o status político-administrativo de Porto Rico, é importante situarmos o contexto histórico onde se encontram as bases do surgimento do Estado Livre Associado (ELA). Segundo Román (2013, p. 44): En los años 1947 y 1950, el Congreso de Estados Unidos, como respuesta al reclamo de la sociedad puertorriqueña y de presiones internacionales en contra del colonialismo, autoriza por vez primera la elección del gobernante

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O livro “Consciência Nacional Porto-riquenha” não possui versão em português. Quando se fala da história de Porto Rico da primeira e grande parte da segunda metade do século XX se costuma ouvir o nome de Don Luis Muñoz Marín e da frase muito conhecida de que foi ele quem deu sapatos aos jíbaros porto riquenhos. A figura de Muñoz Marón é considerada por muitos como um ícone de progresso e modernidade. (tradução do autor)

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de Puerto Rico por los puertorriqueños y la redacción de una Constitución 30 local. Román (2013, p. 44)

Para definirmos o que é o ELA, muitas referências são necessárias, comecemos por Baggio (1998, p.41): A Constituição que criou o “Estado Livre Associado de Porto Rico” ocupouse basicamente dos assuntos relacionados ao governo local, deixando para a Lei de Relações Federais a regulamentação das relações entre Porto Rico e os Estados Unidos. O ELA não rompeu, portanto, com a situação colonial, apesar das declarações finais da Assembleia Constituinte de Porto Rico, aprovadas em fevereiro de 1952.

As declarações de Baggio encontram coro em Ianni (1987, p.23): Sob todos os aspectos, Porto Rico é uma Nação sem Estado, no sentido de que não se expressa em um Estado que reflete a cara do povo. Os administradores pensam e falam em inglês. Para comunicar-se com o povo, traduzem para o espanhol. [...] Não expressam o idioma, a cultura, a história, a irreverência do povo. Correspondem a um poder alheio, estranho, estrangeiro. Por isso Porto Rico é uma Nação em busca de um Estado. [...] A Nação não se delimita na fronteira, mas por suas relações internas e externas, de cunho social, econômico, político e cultural. Não é na geografia que se localiza a fronteira. Ela está na sociedade, Estado, história. [...] A história de Porto Rico mostra como é um Estado Livre Associado, isto é, administrado segundo os interesses do governo dos Estados Unidos. Um caso extremo, na gama das situações latino-americanas. Revela uma tendência muito forte do que são as relações dos Estados Unidos com os países da América Latina. Tanto assim que se pode afirmar que há outros Estados associados no continente e nas ilhas. Definem-se como soberanos, interdependentes, aliados, parceiros dos Estados Unidos. Mas também podem ser Estados-Livres-Associados.

De todo modo, conseguimos resumir o status político de Porto Rico no trecho de Colón Morera (2012, p. 100): En el caso de Puerto Rico, el problema de su llamado déficit democrático formal es central: ni participa de forma efectiva en la elaboración de buena parte de la ley que lo gobierna, ni tiene control efectivo de sus procesos internos. Bajo el arreglo del Estado Libre Asociado (ELA) el Congreso, y el sistema judicial de Estados Unidos, son los que determinan cuál legislación 31 de ese país le aplica.

Assim podemos explicar o status político de Porto Rico e sua profunda relação com os demais aspectos do país. Desde a formação da identidade nacional, a relação com os poderes, o déficit democrático, a cidadania “inferior” reflexo da colonização ainda presente, enfim, variados fatores socioculturais que se tornam nebulosos frente à situação de “Nação sem Estado”, como dito por Ianni. Mas no 30

Entre os anos de 1947 e 1950, o Congresso dos Estados Unidos, como resposta aos reclames da sociedade porto-riquenha e de pressões internacionais contra o colonialismo, autoriza pela primeira vez a eleição do gobernador de Porto Rico pelos porto-riquenhos e a redação de uma Constituição local. (tradução do autor) 31 No caso de Porto Rico, o problema de seu chamado déficit democrático formal é central: nem participa de forma efetiva na elaboração de boa parte das leis que o governa, nem tem controle efetivo de seus processos internos. Sob o arranjo do Estado Livre Associado (ELA) o Congresso e o sistema judicial dos Estados Unidos são quem determinam qual legislação americana se aplica. (tradução do autor)



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contexto econômico, de uma economia dependente dos Estados Unidos, é que encontramos dados que nos denotam o desgaste do modelo do Estado Livre Associado. De todo modo, a gestão keynesiana implantada ainda nos anos 30 seguiu como o caminho econômico até hoje, tendo o Estado (seja o americano ou o portoriquenho) como grande ator da economia local. Tal ideologia de governo nos ajuda a explicar a dependência da ilha e também o nível de fragilidade perante os Estados Unidos. Conforme Oliveras (1998, p.21): Por su parte, el gobierno de Puerto Rico aumenta considerablemente su papel como proveedor de empleos. El empleo clasificado bajo la categoría de administración pública, que para el año 1970 sumaba 106,000 y representaba el 15.5 por ciento del total de empleados, llega a 184,000 para el año 1980, que como fracción del total de empleos es 24.4 porciento. [...] Para el año 1997 dicha cifra sumó 261,000 empleados: 23.8 por ciento del total de empleados en la economía. Al sumar a los empleados de las corporaciones públicas la cifra es de alrededor de 320,000 empleados [...]. Este esfuerzo compensatorio del sector gubernamental, junto a la gestión infraestructural para servirle al patio industrial y a la ciudadanía, se ha 32 traducido en enormes aumentos en la deuda pública.

A dívida pública, consequência de uma política governamental citada por Oliveras, por fim gerou um cenário insustentável, agravado com sucessivos resultados econômicos negativos, como mostra a figura 2. A figura 3 retrata o aumento da dívida pública, representada pelo aumento da dívida das corporações públicas (companhia de água, de energia, de estradas, da Universidade de Porto Rico, etc).

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De sua parte, o governo de Porto Rico aumenta consideravelmente seu papel como provedor de empregos. Os empregos classificados na categoriia de administração pública, que em 1970 somavam 106 mil e representavam 15,5% do total de empregados, alcança 184 mil em 1980, que como fração do total de empregos era 24,4%. [...] Em 1997 o número chega a 261 mil empregados: 23,8% do total de empregados na economia. Somando-se os empregados de todas asc orporações públicas o número é ao redor de 320 mil empregos [...]. Este esforço compensatório do setor governamental, junto a gestão da infraestrutura para servir ao parque industrial e a cidadania, se traduziu em um grande aumento na dívida pública. (tradução do autor)



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Figura 2 – Evolução do PIB de Porto Rico

Fonte: Banco Mundial (2015)

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A figura 3 mostra que após um ano de forte crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) na série histórica, inicia-se um período de recessão, com o país oficialmente em recessão econômica entre 2006 e 2012. Figura 3 – Dívida pública de Porto Rico

Fonte: Rivera (2014)

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Variação percentual do PIB de Porto Rico no período 2000 - 2013. Variação da dívida pública de Porto Rico no período de 2006 até 2012 (em US$).

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Por outro lado, se o governo porto-riquenho se faz presente na economia como empregador, o Estado norte-americano, referenciado como o ente federal na literatura, é também ator que intensifica o processo de dependência, conforme o histórico mencionado por Oliveras (1998, p.20): En los años 1960 y 1970 las transferencias netas del gobierno federal a Puerto Rico sumaron $100 y $329 millones respectivamente. Como proporción del Producto Nacional Bruto representaban un seis (6) y un siete (7) por ciento. Pero para el año 1980 sumaron $2,873 millones, que como fracción porcentual del P.N.B. representaron un 26 por ciento. No pasemos por alto que en estos años cobran particular importancia una serie de programas federales, como las becas para estudiantes (1973) y el Programa de Alimentos (1975-76). El mayor crecimiento en las transferencias federales se da en dicha década. Aunque la cifra preliminar de transferencias federales que se da para el año fiscal 1997 es de $6,859 36 millones.

Baggio (1998, p.3) também levanta a discussão das transferências federais com fins assistencialistas: É possível levantar alguns elementos para explicar a relação de subordinação de Porto Rico aos Estados Unidos até o presente: por um lado, a manutenção, por parte do governo norte-americano, de um sistema assistencialista que se concretiza pela distribuição de cheques de alimentos para um milhão e meio de habitantes (cerca de 45% população), o que dificulta - quando não impede - o apoio popular à independência . Devemos também levar em consideração que mais de dois milhões de portoriquenhos vivem nos Estados Unidos.

Esse outro ponto levantado, da quantidade de porto-riquenhos que habitam os Estados Unidos é uma questão importante na construção da identidade local (isleño) em contraponto com a nova etnia (nuyrican). E tal como já dito por Degró (2004, p. 269), o fluxo migratório para os Estados Unidos se manteve durante o início do século XX e criou locais com grande concentração de porto-riquenhos, principalmente Nova Iorque, fenômeno que gerou o vocábulo nuyoricans e pode ser explicado por Torres (2000, p.34): A principal condição responsável pelo processo diaspórico que resultou na expatriação de aproximadamente 40% da população dessa pequena ilha do Caribe para o continente norte- americano, mais marcadamente Nova York, desde os tempos em que seus líderes políticos lutavam pela independência de seu país do primei-o colonizador, é, sem sombra de dúvida, sua situação de dependência política e econômica — primeiro da Coroa Espanhola, e, em seguida dos EUA.

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Total da dívida, Autoridade de Aquetudos e Esgoto, Autoridade de Estradas, Autoridade de Edifícios Públicos, Autoridade de Energia Elétrica, Autoridade de Portos, Companhia de Fomento Industrial, Universidade de Porto Rico, Outras Corporações Públicas. (tradução do autor). 36 Nos anos 1960 e 1970 as transferências brutas do governo federal a Porto Rico somaram 100 e 329 milhões de dólares respectivamente. Como proporção do Produto Nacional Bruto representavam 6% e 7%. Mas para o ano de 1980 somaram-se $2,873 bilhões, que como fração do P.N.B. representaram 26%. Não se pode esquecer que nestes anos uma série de programas federais como as bolsas esudantis (1973) e o Programa de Alimentos (1975-76). O grande crescimento das transferências federaisa foi na década de 70. Porém, a cifra preliminar de transferências federais no ano fiscal de 1997 é de 6,859 bilhões de dólares. (tradução do autor)



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De igual forma, a atual localização da grande comunidade borícua no território estadunidense pode ser vista na figura 4. Figura 4 – Porto-riquenhos nos Estados Unidos continental

Fonte: Censo Federal (2012)

Como mostrado pela figura 4, o sudeste e, mais expressivamente, o nordeste estadunidense compreende a área com maior concentração de porto-riquenhos. Como também explícito na legenda da figura, os bairros nova-iorquinhos do Bronx, Kings e do Queens concentravam, em 2012, 608 mil borícuas. E foi justamente pela grande densidade de isleños37 que um outro fenômeno que nos ajuda a explicar a identidade afro-caribenha: a salsa. A salsa, como ritmo afro-caribenho que conhecemos hoje em dia é uma construção colaborativa entre as variados nacionalidades que viviam em Nova Iorque entre os anos de 1960 e 1970. Segundo Solano Castro (2009, p.3): La salsa fue, es y será uno de los productos culturales más exquisitos que pudo haber construido Latinoamérica durante la segunda mitad del siglo XX. Claro está que sus raíces antillanas no son tan recientes, sino que se aferran a siglos anteriores, regresando al pasado tanto como hacia el auge de la época colonial, entre los siglos XVI y XIX. De todos modos, puede afirmarse categóricamente su contextualización geográfica dentro del marco 38 de Cuba, Puerto Rico y los barrios latinos de Nueva York.

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Outra possível denominação para os nascidos em Porto Rico, muito utilizado pelos mesmos. A salsa foi, é e será um dos produtos culturais mais marcantes que a América Latina pode construir durante a segunda metade do século XX. Claro está que suas raízes antilhanas não são tão recentes, não só se referem

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Para nos auxiliar a entender a importância, Solano Castro ainda nos fala sobre o uso da salsa como fator identitário da população latina, tanto que nos Estados Unidos quanto em seus países de origem (2009, p.19): La salsa se convierte, por ende, en una abanderada de la identidad latinoamericana y el producto de la búsqueda de identidad de la juventud migrante. El movimiento de la salsa, esa ‘manera de hacer música’ que los latinos desarrollaron a finales de la década de 1960, fue mayormente una respuesta de la juventud migrante de la cultura latinocaribeña hacia el rock and roll [...] y a la homogenización que su ‘globalización’ parecía implicar. [...] Esta era, después de todo, la gente joven de una cultura hostigada con incertidumbre, una cultura que constantemente tuvo que pelear para asumir su forma de cara a la continua presencia de los más avasalladores poderes económicos y políticos coloniales. [...] Para esta juventud, la identidad 39 constantemente tuvo que reconstruirse.

Encontramos, ainda em Solano Castro (2009, p. 10) a “receita” da salsa: La salsa es básicamente una interacción de ritmos cubanos (son, rumba, danzón, mambo, trova, guajira, bolero, cha-cha-chá, guaracha, mozambique, pachanga, songo) y puertorriqueños (danza, bomba, plena, seis con décima, aguinaldo jíbaro), y estos, a su vez, han sido producto del 40 mestizaje de lo español, lo africano y lo indígena.

Dessa forma, observa-se o surgimento de um ritmo em um local fora do Caribe, mas que é representante da cultura afro-caribenha. De igual forma, nota-se que a salsa, além de ter uma construção que mescla diferentes influências, traz consigo referências históricas, pois é composta de danças e toques que surgem ainda durante o domínio espanhol nas Antilhas, fruto de um ambiente da pirataria e da localização geográfica de passagem. 2.2 BANCO POPULAR DE PORTO RICO Ainda dentro do contexto socioeconômico da ilha, ressalta-se a importância do Banco Popular de Porto Rico. O Banco Popular de Porto Rico (BPPR) é uma instituição financeira sediada em San Juan, fundada em 1923. Sua denominação anterior era “Banco Popular de Economía y Prestamos”, que surgiu ainda durante o ao século anterior, regressando ao passado, referindo-se ao auge da época colonial, entre os séculos XVI e XIX. De qualquer modo, pode-se afirmar categoricamente sua contextualização geográfica dentro del território de Cuba, Porto Rico e dos bairros latinos de Nova Iorque. (tradução do autor) 39 A salsa se converte, portanto, em uma portadora da identidade latino americana e no produto da busca identitária da juventude migrante. O movimento da salsa, essa “maneira de fazer música “que os latinos desenvolveram aos fins da década de 1960, foi majoritariamente, uma resposta da juventude migrante da cultura latino-caribenha contra o rock and roll, [...] e a homogeneização que sua “globalização” parecia implicar. [...] Esta era, depois de todo, a juventude de uma cultura assediada com incertezas, uma cultura que constantemente teve que brigar para assumir sua forma, a contínua presença dos mais avasaladores poderes econômicos e políticos coloniais. [...] Para esta juventude, a identidade constantemente teve que reconstruirse. (tradução do autor) 40 A salsa é basicamente uma mescla de de ritmos cubanos (son, rumba, danzón, mambo, trova, guajira, bolero, cha-cha-chá, guaracha, mozambique, pachanga, songo) e porto-riquenhos (danza, bomba, plena, seis con décima, aguinaldo jíbaro), e estes, por sua vez, são produto da miscigenação entre espanhóis, africanos e indígenas. (tradução do autor)



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período colonial espanhol (Méndez-Méndez, 2015, p.39). Segundo o Banco Popular (2015): Founded in 1893, Popular, Inc. (NASDAQ: BPOP) is the largest banking institution by both assets and deposits in Puerto Rico and in the United States ranks among the 50 largest banks and thrifts by total assets. In the United States, Popular has established a community banking franchise providing a broad range of financial services and products with branches in 41 Florida, New Jersey and New York.

O banco, apesar de hoje estar entre os 50 maiores bancos dos Estados Unidos, ainda se mantém como uma organização familiar, pertencente à família Carrión desde 1923. Entre os CEO’s42 da instituição já estiveram Rafael Carrión Pachecho (1891-1964), seu filho Rafael “Papi” Carrión Jr. (1914-1991) e Richard Carrión (1952-) (MÉNDEZ-MÉNDEZ, 2015, pp 40-41). Como símbolo do banco, além de seu logotipo (Figura 5), está o prédio onde se localiza sua sede (Figura 6), no bairro de Hato Rey. Figura 5 – Identidade visual do Banco Popular de Porto Rico

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Fonte: Banco Popular de Puerto Rico(d)

Sobre o prédio também ser considerado um símbolo para o banco, conforme Méndez-Méndez (2015, p. 41): Standing high in the middle of Hato Rey, Puerto Rico, there is a white and imposing high-rise building known as Popular Center. It bears the name of Banco Popular. Since its construction in 1965, it has served as the anchor of the financial, banking, and commercial industry on the island. It has headquartered one of the most important banking institutions in Puerto Rico, as well as one of the most significant Hispanic/Latino banks in the United 44 States.

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Fundado em 1893, Popular Inc. (NASDAQ: BPOP) é a maior instituição bancária que realiza operações em Puerto Rico e nos Estados Unidos e está entre os 50 maiores bancos e instituições de poupança pelo total de ativos. Nos Estados Unidos, o Banco Popular estabeleceu uma franquia de bancos de comunidade fornecendo uma ampla gama de serviços e produtos financeiros com filiais na Flórida, Nova Jersey e Nova Iorque. (tradução do autor) 42 Chief Executive Officer, em português algo como Diretor Executivo. (tradução do autor) 43 Logotipo do Banco Popular de Porto Rico 44 Erguido no meio de Hato Rey, Porto Rico, está o prédio branco imponente conhecido como Popular Center. Ele leva o nome do Banco Popular. Desde sua construção em 1965, serve como âncora financeira, bancária, industrial e comercial da ilha. É a sede de uma das instrituição bancárias mais importante de Porto Rico, assim como um dos mais significativos bancos hispânicos/latinos nos Estados Unidos. (tradução do autor)



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Figura 6 – Prédio-sede do Banco Popular de Porto Rico

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Fonte: Morales (2011)

Dentre os valores organizacionais da organização, conforme Banco Popular de Puerto Rico(c) encontram-se El Banco Popular es una instituición genuinamente nativa dedicada exclusivamente a trabajar por el bienestar social y económico de Puerto Rico e inspirada por los princípios más sanos y fundamentales de una buena práctica bancária. El Popular tiene empeñados sus esfuerzos y voluntad al desarrollo de un servicio bancario para Puerto Rico dentro de normas estrictamente comerciales y tan eficientes como pueda requerir la 46 comunidad más progresista del mundo.

Durante a crise financeira de 2008, o Banco Popular de Porto Rico foi uma das instituições financeiras que recebeu ajuda do governo estadunidense para se recuperar. O conglomerado Popular Inc., do qual o BPPR faz parte, recebeu 935 milhões de dólares47 através do programa chamado Troubled Asset Relief Program48 (TARP). Tais incentivos governamentais podem ser explicados pela importância do 45

Sede do Banco Popular de Porto Rico, localizada no bairro de Hato Rey O Banco Popular é uma instituição genuinamente nativa dedicada exclusivamente a trabalhar pelo bem estar social e econômico de Porto Rico e inspirada pelos princípios mais saudáveis e fundamentais das boas práticas bancárias. O Popular vem empenhando seus esforços e vontades no desenvolvimento de um serviço bancário para Porto Rico dentro de normas estritamente comerciais e tão eficientes como possa demandar a comunidade mais progressista do mundo. (tradução do autor) Retirado de http://www.popular.com/gente-credo. Acessado em 14 de out de 2015 47 U.S. Department of the Treasury (2014). 48 Programa de Alívio de Ativos Problemáticos. (tradução do autor) 46



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banco, o maior da ilha, mas também pela manutenção da política americana no país. Segundo Versignassi (2011, p. 282): Estava claro que a crise dos títulos poderia destruir mais Bancos – e arrasar toda a economia, que depende deles para respirar. O governo, então, decidiu tomar uma providência para que isso não virasse realidade: deu 30 bilhões para arrefecer as perdas.

Como um dos principais agentes econômicos da ilha, o Banco Popular de Porto Rico merece nossa atenção, pois além de dinamizar a economia local, também situa-se como importante elo entre a economia estadunidense e a portoriquenha, principalmente pelas facilidade na transferência de fundos. De tal forma, o BPPR facilita o trânsito monetário entre a ilha e os EUA e de certa maneira auxiliando na integração econômica de borícuas e nuyricans.



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3. SOCIOLOGIA DA COMUNICAÇÃO, RELAÇÕES PÚBLICAS E O APELO SOCIAL Entremeando-se entre a área das Ciências Sociais Aplicadas, a comunicação relaciona-se com outras áreas dentro desse grupamento de ciências, de maneiras distintas, porém com o mesmo objetivo, de explicar fenômenos sociais. Nesse sentido, colabora com essa definição de áreas mescladas Esteves (2011, p. 17): Considerando a presença permanente da comunicação na vida dos indivíduos em geral, nos processos de constituição e sedimentação da sua experiência simbólica, através dos mecanismos cada vez mais complexos de interlocução e interacção sociais, podemos assim referir-nos a essa presença em termos, propriamente, de uma centralidade da comunicação 49 para a vida humana.

Dessa forma, ainda segundo Esteves (2011, p. 29) podemos resumir sociologia como “estudo da sociedade”, sem, no entanto, dividir a sociedade dos indivíduos, parte constituinte e interativa desse sistema social. Nesse horizonte, Elias (1970 citado por ESTEVES 2011, p. 24), nos traz que: As configurações sociais definem, pois, tecidos de interdependências variáveis que os seres humanos (os indivíduos) formam entre si, aos mais diversos níveis da vida social – desde grupos relativamente pequenos até sociedades constituídas por milhares ou milhões de pessoas interdependentes.

Interdependência, palavra-chave do presente capítulo, é um tema recorrente entre os vários autores que nos auxiliam nessa caminhada, que percorre conteúdos entre a Sociologia aplicada à Comunicação, bem como às Relações Públicas, ajustando a lente para o seu apoio no apelo social. De certa maneira, a própria noção de que não somos totalmente independentes entre si é um fator de coesão social. E por social, podemos entender como coletivo de indivíduos (sociedade), cada qual com seus interesses e meios de vida, objeto de estudo sociológico, conforme observado no que segue.

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Esteves é um autor lusófono de origem portuguesa e optou-se por manter a grafia original de seus escritos.

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3.1. SOCIOLOGIA APLICADA À COMUNICAÇÃO A Sociologia da Comunicação e as demais subdivisões do estudo social apenas denotam que existem incontáveis fenômenos sociais ocorrendo dentro da sociedade em que vivemos, que podem ser escrutinados separadamente, porém sem esquecer suas consequências no restante do sistema social. Nos apoia nessa definição Esteves (2011, p. 147): Embora a designação sociologia da comunicação possa evocar, à partida, uma certa ideia de especialização disciplinar, um domínio de conhecimento específico, e de alguma forma parcelar, da realidade social, atendendo à especificidade do seu objecto de estudo (a comunicação pública) torna-se indispensável uma perspectiva epistemológica mais global [...] como uma perspectiva compreensiva e tanto quanto possível original sobre a realidade social no seu conjunto. A esta perspectiva podemos também dar simplesmente a designação de uma sociologia ou teoria social (enquanto teoria geral da sociedade) que tem por base o paradigma comunicacional fazendo assim justiça ao papel absolutamente comunicação na sociedade de um modo geral (e, por maioria de razão, mais ainda nas sociedades modernas).

Ou seja, a parcela da ciência chamada Sociologia dedicada a estudar os fenômenos de comunicação entre os indivíduos de uma sociedade não realiza um corte e estuda a comunicação de maneira isolada, mas sim com um olhar centrado pela comunicação, não excluindo outras disciplinas. Tendo em vista esse horizonte, o da comunicação como eixo central de análise social, podemos começar a definir os elementos formadores do contexto social e suas denominações. Segundo Jaramillo (2003 citado por BRANDÃO 2012, p. 8): Quando se entende a natureza coletiva, pública da comunicação e se deixa de obedecer a um propósito particular, muda a intenção, se comunica com outra intenção, com uma intenção coletiva e isto obriga a recolocar todos os papéis, a olhar de outra maneira o papel que cumprem os sujeitos que interatuam na comunicação coletiva. E este comunicar coletivo em função de um interesse coletivo deve levar em direção à mobilização.

E para esta mobilização, ou seja, para a real comunicação em função do coletivo, do bem comum, do interesse público, é necessária uma atividade comunicacional ética, consonante com tais conceitos. 3.1.1. Comunicação e o Interesse Público Para compreender a comunicação e o interesse público, conceitos enraizados nos conflitos sociais, é necessário o entendimento dos processos comunicacionais entre os indivíduos e as organizações. Muitos são os autores que conceituam o



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termo comunicação e seus processos, tendo assim diversas implicações. Para Hohlfedlt, Martino e França (2007, p. 61) A comunicação é um fenômeno social, porque se dá através da linguagem e implica um número maior de elementos que uma só pessoa. Assim, embora seja estudada enquanto disciplina específica, na verdade é campo de estudos e análises de múltiplas disciplinas.

Assim como dito pelos autores, o campo da comunicação é amplo e é possível abordá-lo por vários prismas. Nesse caso, a análise apoiada na Sociologia, compreendida através de Esteves (2011, p. 147) tem como objetivo jogar luz sobre os conceitos, como o de comunicação pública (CP), citado anteriormente, é um bom indicativo de início nessa trilha. Para Mainieri e Ribeiro (2011, p. 53): O conceito de comunicação pública “remete ao processo de comunicação instaurado em uma esfera pública que engloba Estado, governo e sociedade: um espaço de debate, negociação e tomada de decisões relativas à vida pública do país”. O intuito precípuo da comunicação pública é transmitir informação de interesse público aos cidadãos, o que se constitui em passo inicial para estabelecer um diálogo e uma relação entre Estado e sociedade.

A comunicação pública, nesse entendimento, é a que é realizada no espaço público e trata da vida pública. Outras correntes teóricas entendem a comunicação pública como sendo a forma usada pelos governos para dar publicidade aos seus atos. Há ainda o erro de interpretação sobre a CP, confundindo-a com a comunicação política e também à divulgação científica, situadas também no horizonte do interesse público, mas com outras implicações. Outro conceito de possível nesse tópico nos é dado por Duarte (2012, p.61): Comunicação pública coloca a centralidade do processo de comunicação no cidadão. [...] Portanto, é um bem e um direito de natureza coletiva, envolvendo tudo o que diga respeito a aparato estatal, ações governamentais, partidos políticos, movimentos sociais, empresas públicas, terceiro setor e, até mesmo, em certas circunstâncias, às empresas privadas. O uso da expressão está associado ao esforço de melhorar a vida das pessoas pela comunicação. [...] Praticar comunicação pública implica assumir espírito público e privilegiar o interesse coletivo em detrimento de perspectivas pessoais e corporativas.

De certa forma, pode-se sugerir, pelo olhar de Duarte (2012, p.61) a diferenciação da comunicação pública como aquela que é feita no espaço público, trata do interesse público e implica em privilegiá-lo, num tom bastante republicano. Porém, para delinear com mais clareza qual é o conceito de espaço público utilizado por Mainieri e Ribeiro, busca-se a referência em Esteves (2007, p. 189): Aquilo que hoje identificamos como “espaço público” tinha como equivalente no mundo helénico a praça pública/ágora – o local onde os cidadãos se reuniam para debater os assuntos concernentes à cidade (à sua



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governação). O público é definido nesse contexto histórico e cultural de uma forma muito estrita, tendo por base oposições dicotómicas rígidas: público/privado, político/económico, [...] o reino da liberdade onde são tomadas as decisões importantes que dizem respeito à vida colectiva dos cidadãos e do qual se consideram excluídas as actividades concernentes ao domínio do trabalho [...] e à actividade económica em geral (esfera privada). À lei da liberdade e do espaço público contrapõem-se aos domínios de actividades referidos, as leis da dominação e da violência. Esteves (2007, p. 189)

Temos então a localização do interesse público, como em oposição do interesse privado. O primeiro é ligado ao socialmente comum, à governança da sociedade e a conceitos amplos, o segundo ao particular, ao que é esfera privada, ao íntimo ou pessoal. Porém, em conjunto com os interesses, outras expressões começam a povoar a literatura tais como opinião pública e públicos, conceitos interessantes que auxiliam a entender ainda mais a comunicação, com viés sociológico. Para Esteves (2011, p. 158): Os públicos são redes de comunicação e espaços sociais fortemente personalizados, abertos à (e dependentes da) afirmação das carateríscas individuais dos seus membros, que contribuem para a formacão das identidades destes, na base da personalidade e da subjectividade próprias.

Na mesma obra, com objetivo de jogar mais luz sobre o conceito, Tarde (1901 citado por ESTEVES 2011, p. 159): As profundas transformações sociais que devemos à imprensa realizaramse no sentido da união e da pacificação finais. Ao substituírem-se ou ao se sobreporem aos agrupamentos mais antigos, os novos agrupamentos, cada vez mais extensos e mais massivos, a que chamamos públicos, não apenas fazem suceder o reino da moda ao reino do costume, ou seja, a inovação à tradição, mas também substituem as divisões claras e persistentes entre as múltiplas variedades da associação humana, com os seus conflitos infindáveis por uma segmentação incompleta e variável, de limites indistintos, em via de renovação permanente e mútua penetração.

O que fala o autor, por meio de Tarde, é que a imprensa teve papel fundamental na mudança do que se entende por públicos, massa50 e multidão51. Os públicos são um constructo da modernidade, e se diferem ao relacionar-se e possuírem um “espírito de união” sem contato (nas palavras de Esteves, contágio sem contato), usando a mídia impressa e outros meios de comunicação.

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“Agrupamento de pessoas sem contrigüidade espacial; é composta de indivíduos anônimos, que participam de um mesmo comportamento coletivo, porém sem apresentar organização e unidade, e que convergem para um acontecimento importante, à base principalmente de considerações emocionais.” Andrade (1996 citado por FRANÇA 2004, p. 46). 51 “Grupo espontâneo de indivíduos, unido por laços de contigüidade física; age baseada em impulsos, sendo inconstante, sugestionável e irresponsável. A formação de uma multidão pressupõe, inicialmente, a ocorrência de algum acontecimento emocionante que atraiu a atenção de várias pessoas Andrade (1996 citado por FRANÇA 2004, p.46).



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Para tratar também da conceituação de públicos, porém pelo viés da área de Relações Públicas, a leitura de Andrade (1980 citado por FRANÇA 2004, p. 45) traz que públicos são: O agrupamento espontâneo de pessoas adultas e/ou grupos sociais organizados, com ou sem contigüidade física, com abundância de informações, analisando uma controvérsia, com atitudes e opiniões múltiplas quanto à solução ou medidas a ser tomadas perante ela; com ampla oportunidade de discussão, e acompanhando ou participando do debate geral por meio da integração pessoal ou dos veículos de comunicação, à procura de uma atitude comum, expressa em uma decisão ou opinião coletivas, que permitirá a ação conjugada.

Vemos no conceito de Andrade que os públicos têm “abundância de informações”, e participam do debate geral “por meio da integração pessoal ou dos veículos de comunicação”. De certa forma, o autor concorda com Tarde no que diz respeito aos públicos, esse constructo social que só foi possível após o advento da imprensa. Outro conceito importante para discutir o interesse público é a opinião pública. Para Silveirinha (2004): Do ponto de vista social, o termo remete para uma forma de nos relacionarmos com os outros, através de uma espécie de “horizonte da sociabilidade”, normalmente traduzido pela expressão “o que os outros pensam” – uma dimensão que, mesmo sem significar necessariamente a interiorização de expectativas dos outros, significa pelo menos uma forma de nos posicionarmos face a uma comunidade mais vasta com a qual partilhamos interesses que vão para além do nosso, puramente pessoal.

Interessante o texto de Silveirinha ao falar de um “o que os outros pensam”, numa oposição ao que é “puramente pessoal”, visto que torna-se possível a analogia entre os (muitos) outros como público e o pessoal como privado, explicitando novamente o contraditório já visto. Ainda dentro das teorias de opinião pública, segundo Furtado (2010, p. 113): A opinião pública implica também a existência de outra opiniões distintas dela. Uma opinião só se firma ante opinião contrária e, portanto, pode-se afirmar que a opinião está sempre dividida. [...] Nesse sentido, a opinião pública não é a soma das opiniões privadas. Isso se dá porque seu suporte é o grupo e não o indivíduo. A opinião pública é um fenômeno social. Furtado (2010, p. 113)

Numa redução, temos que a opinião pública não é unânime e que também não representa o somatório das opiniões individuais. Essa mesma característica, de difícil redução a um denominador comum e da multifacetada interpretação é também aplicada ao conceito de interesse público, que segundo De Faria (2002, p. 175): Em resumo, interesse público não existe em si, ou por si mesmo, mas tratase de um emaranhado de interesses, de confrontos discursivos, ancorados



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nos processos sociais em curso. Múltiplos atores e manifestações sociais, às vezes provisórios, às vezes com movimentos pendulares. A imagem mais apropriada pode ser associada a um caldeirão, cujo conteúdo final, ainda desconhecido, reúne vários ingredientes na fervura. A figura hipotética de um chefe de cozinha leva, imediatamente, ao papel das organizações jornalísticas. De Faria (2002, p. 175)

Lemos no trecho que novamente surge a imprensa como agente fundamental no processo de conceituação dos constructos sociais, antes dito por Tarde como fator de modernização dos públicos, agora por De Faria como o “cozinheiro do caldeirão”, reunindo temas que geram interesse público. Tal interesse, que antes era debatido no espaço público, conforme dito por Esteves (2007, p. 189) vem sofrendo transformações, cerceamentos, perdendo seu espaço no âmbito do público, cada vez mais ocupado pelo privado, como escreve Dupas (2008, p. 72): Na teoria política clássica, incorporada ao inconsciente coletivo das sociedades, o espaço público era equivalente ao espaço da liberdade dos cidadãos, no qual estes exerciam sua capacidade de participação crítica na gestão dos assuntos comuns, sob o princípio da deliberação; um espaço que se opunha, portanto, ao espaço privado regido pela dominação do poder. Hoje, as corporações apropriaram-se do espaço público e o transformaram em espaço publicitário; os cidadãos que o freqüentam não o fazem mais como cidadãos, mas como consumidores de produtos ou de informação. A paisagem pública urbana é agora um material midiático privado, criando desejos e tratando o cidadão como um mero consumidor. Os espaços públicos (meios de comunicação, parques, museus etc.) só conseguem se manter abertos atolados na propaganda e no patrocínio do setor privado. O universo corporativo não precisa mais se opor ao seu entorno físico e à sociedade, como acontecia com a arquitetura modernista; agora ele se apropriou do controle direto do espaço social circundante.

Ainda que pessimista quanto ao presente do espaço público, Dupas não se encontra sozinho na crítica ao atual modelo de ocupação deste espaço, pois é possível encontrar coro em Esteves (2011). Mas é justamente no contraditório, na ideia antagônica à privatização do espaço público que se encontra ainda o ético, o discurso que constroi e milita em prol do interesse público e de seu espaço de diálogo. Dessa forma, encontramos em Andrade (2005, p. 16) que “é incompatível com o exercício das tarefas de Relações Públicas e com a ética da profissão toda atividade contrária ao interesse público”. Importante é notar que o autor não utiliza o conceito “interesse do público”, mas sim trata do bem comum. Sendo assim, após o entendimento sobre os conceitos referentes à área de comunicação, porém vistos pela Sociologia, é hora de debruçar-se sobre as Relações Públicas.



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3.2 RELAÇÕES PÚBLICAS A área de Relações Públicas (RRPP), entendida como parte da Comunicação Social e, portanto, parte das Ciências Sociais Aplicadas, possui várias definições e conceitos, sendo o principal teórico para o presente estudo a teoria de Simões. Para Simões (1995, p. 83): A atividade de Relações Públicas é a gestão da função política da organização. [...] A função política da organização [...] objetiva que, através da filosofia, políticas e normas, a atuação da organização [...] ocorra e seja percebida como realizada em benefício dos interesses comuns que possui com seus públicos.

Para o teórico, a atividade de RRPP tem como objeto de estudo e interferência a relação das organizações com seus públicos e deve, segundo ele, ser realizada de forma que seja percebida como convergente com os interesses dos públicos. No esforço de conceituar a área de Relações Públicas, França (2004, p.97) nos traz que: Relações públicas são uma atividade de relacionamentos estratégicos das organizações, públicas ou privadas, com seus públicos e seu objetivo é gerenciar de maneira adequada esses relacionamentos, que podem ser múltiplos, interatuantes, coletivos, efêmeros, duráveis, permanentes, internos ou externos.

Na leitura conjunta dos conceitos de França e Simões, percebe-se a formação de expressões como “gestão de relacionamento estratégicos” e “função política de organizações públicas e privadas”. Apesar de distantes temporalmente, os conceitos vindos da leitura simultânea se atravessam de forma complementar e pertencem ao vocabulário dos profissionais da área de Relações Públicas. Para auxiliar na construção teórica sobre a RRPP Kunsch (2003, p. 97), nos diz que: O gerenciamento de relações públicas nas organizações tem como fundamentos, de acordo com Ehling, White e Grunig quatro teorias essenciais: teoria interorganizacional; teoria de gerenciamento; teoria da comunicação; e teoria de conflitos-resoluções (p. 384). Para eles, são essas teorias que embasam as atividades de relações públicas nas organizações, diferenciando-as da área de marketing. [...] A teoria interorganizacional, ajudando a compreender os conceitos gerais e as interdependências entre indivíduos, grupos e organizações, trata das relações e interações no mundo da sociedade organizacional e no interior de cada organização.

Trazida por Kunsch (2003), a palavra-chave interdependência nos leva novamente ao cerne do capítulo. As sociedades complexas são assim denominadas pela gama de relações de poder e legitimidade que se estabelecem entre as organizações, sejam elas públicas ou privadas e os indivíduos, de forma que em



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cada relação há múltiplos fatores de interferência, porém com todos os entes ligados entre si, como uma teia, uma rede. 3.2.1 Relações Públicas e Micropolítica Baseado em sua própria teoria, Simões (2001) segue em sua trilha com o intuito de esclarecer as implicações políticas da área de Relações Públicas, porém de forma mais aprofundada que em sua obra de 1995. Segundo Simões (2001, p. 65): A ruptura do paradigma comunicacional foi tentada com a apresentação das primeiras idéias sobre a gestão da função organizacional política (Simões, 1995). Esta teoria posiciona a comunicação como meio, a informação como matéria-prima e relaciona diversos instrumentos para o exercício do poder. Nela, a relação de poder é a essência e a comunicação é a aparência.

Na sua obra mais antiga, Simões trata da gestão da função política, ou seja, que a atividade de Relações Públicas é a gestora do processo político, das mediações de poder da organização com seus públicos. Isso se dá por meio da comunicação, ou seja, o intrínseco da área de RRPP não é a comunicação, mas sim as relações de poder, que explicitam-se na forma comunicacional. Tais acepções convergem se levada em consideração Schater (1951 citado por SIMÕES 2001, p. 79) que diz que “Comunicação é o mecanismo pelo qual o poder é exercido”. Nesse mesmo sentido, encontramos voz consoante em Durkhein (1995 citado por RAUDMATTEDI 2005, p. 129): Se o interesse aproxima os homens, nunca o faz mais que por alguns instantes e só pode criar entre eles um vínculo exterior [...]. As consciências são postas apenas superficialmente em contato: nem se penetram, nem aderem fortemente umas às outras. Se olharmos as coisas a fundo, veremos que toda harmonia de interesses encerra um conflito latente ou simplesmente adiado. Porque, onde o interesse reina sozinho, como nada vem refrear os egoísmos em presença, cada eu se encontra face ao outro em pé de guerra e uma trégua nesse eterno antagonismo não poderia ser de longa duração. De fato, o interesse é o que há de menos constante no mundo.

Por ser uma área essencialmente política, como dito por Simões (1995, p.83), o substrato da atividade de Relações Públicas é o interesse. Levando-se em conta a importante contribuição dada por Durkheim, tem-se que a sociedade é um ambiente de interesse e de conflito latente, que necessita da intervenção do profissional de RRPP e seu arcabouço teórico.



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Para explicitar de maneira mais clara as semelhanças entre a área de RRPP e da Micropolítica, o quadro 1 traz o quadro de Simões (2001, p. 77) que esclarece tais intersecções. Quadro 1 – Comparativo dos processos e programas de RRPP e Micropolítica

Fonte: Simões (2001)

Como visto no quadro 1, Simões engendrou a conexão entre as Relações Públicas e a Micropolítica, através de um paralelismo entre o processo e o programa das referidas disciplinas. Dessa maneira, explicitou que o profissional de RRPP é o mediador dos conflitos generalizados, explícitos ou não, que permeiam a sociedade e, principalmente, a relação entre organizações e públicos. A gestão da função política, no entanto, é realizada através de ações de comunicação, pois como dito anteriormente, o processo comunicacional é o mecanismo pelo qual o poder é exercido. Importante, então, é diferenciar as formas de comunicação, para de igual maneira diferenciar as possibilidades de influência desse poder, realizado no processo comunicativo. Wolton (2010, p. 23) nos mostra concordar, de certa forma, com dita função da comunicação afirmando que “os



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horizontes da comunicação são o compartilhamento, a convicção, a sedução, a influência, a convivência e a incomunicação”. Na mesma obra, Wolton trata da incomunicação por conta do excesso de informação, que somente se resolve com o reconhecimento do receptor, através do diálogo e da negociação. Para Wolton (2010, p. 62): Comunicar é cada vez menos transmitir, raramente compartilhar, sendo cada vez mais negociar e, finalmente, conviver. [...] Não se pode negar a abertura ao outro, não se deve esquecer do receptor, é preciso reconhecer a importância da negociação.

Nesse horizonte, torna-se cada vez mais claro o papel do Relações Públicas na negociação, através da comunicação, para atingir os objetivos de mediação da relação política das organizações com cada público. 3.2.2 O apelo social como estratégia de RRPP No intuito de influenciar e criar uma reputação positiva da organização junto aos seus públicos, o profissional de Relações Públicas deve atentar-se, além do discurso direcionado para cada segmento de público de interesse, também para a imagem organizacional e sua identidade. Esse tripé identidade-imagem-reputação é estratégico para a construção dos relacionamentos da organização com seus públicos e o entendimento de cada um instrumentaliza a atividade enquanto gestora da função política das organizações. Segundo Kunsch (2003, p. 172): A identidade corporativa refere-se aos valores básicos e às características atribuídas às organizações pelos seus públicos internos e externos. Além do que ela é e faz, a identidade corporativa se origina de três níveis de comunicação: o que ela diz, o que ela realmente faz e o que dizem e acham dela seus públicos.

Na questão da imagem, a comunicação busca disseminar e transmitir essas informações pertinentes para auxiliar na construção dessa imagem, que pode ser compreendida como “o reflexo da identidade de uma organização. Em outras palavras, é a organização sob o ponto de vista de seus diferentes públicos.” (ARGENTI, 2006). De maneira mais aprofundada, segundo Almeida (2009, p. 217): A identidade de uma organização não pode ser entendida ou analisada como algo homogêneo e condensado por seus membros. Ela é uma única identidade, por se tratar de uma só organização, mas é vista, vivida e praticada por indivíduos com percepções, visões e perspectivas distintas, que vão construindo seus significados e (res)significando-os em um ambiente cultural exposto às influências socioeconômicas e políticas.



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Finalizando o esclarecimento da tríade identidade-imagem-reputação, Rosa (2006, p. 124): Falar em reputação não é falar apenas em conduta: não é falar sobre seguir uma linha de comportamento que esteja afinada com valores fundamentais, valores que percebidos pelos outros ajudem a despertar a confiança deles em relação a você ou à instituição por trás de você. Confiança tem muito a ver com as suas atitudes concretas e objetivas sim, mas tem muito a ver também com a percepção dos outros em relação a elas, especialmente quando há a necessidade de interagir com públicos variados. Se confiança depende da forma como somos vistos, estamos reconhecendo na verdade que reputação é uma forma de percepção.

Essas construções do profissional de Relações Públicas, a imagem e a reputação de uma organização, são realizadas de maneira estratégica, planejadas, testadas, com o objetivo de serem mensuradas e comparadas com o plano de metas da organização. Dessa forma, transforma-se em números o esforço da gestão da função

política

organizacional,

representado

pela

sua

face

comunicativa.

Convergente com essa construção está Weber (2004, p. 262): As informações e sinais são estrategicamente construídos como as “ações de instituições e sujeitos públicos” (informação, propaganda, eventos, atitudes) que, sendo públicas, são “informações de interesse público”, as quais dependem da “participação da mídia” (relações econômicas, políticas, privadas etc.) para repercutir. A “repercussão pública” é desencadeada pelas mídias, adversários, grupos sociais, indivíduos, através da veiculação de suas opiniões e imagens sobre a ação do sujeito político. No processo de recepção à repercussão da imagem, residem as dúvidas e certezas sobre a cena política, seus protagonistas e seus difusores.

Nesse contexto Bittencourt e Carrieri ([2005]) trazem uma perspectiva pessimista quando as ações de relacionamento necessárias para gerar confiança e empatia nos públicos das organizações. Não existem fórmulas mágicas nem mecanismos automáticos que garantam os resultados que o público deseja. [...] É verdade que não podemos escapar totalmente de nossa herança cultural, mas, lentamente, estamos acumulando conhecimentos sobre nós mesmos e sobre os homens de negócios que podem possibilitar a resolução de alguns dos problemas relacionados à responsabilidade do negócio.

A responsabilidade citada pelos autores é a Responsabilidade Social Corporativa (RSC), que é uma estratégia que vem sendo bastante utilizada pelas organizações, de certa forma porque vem sendo demandada pela sociedade, como nos diz Baldissera e Araújo (2007, p.36): A sociedade, por razões diversas, tem exigido responsabilidade (ou mais responsabilidade) organizacional. Tende a não mais aceitar a geração de lucros/capitais a qualquer preço, isto é, aos poucos começa a cobrar das organizações uma postura de preservação/qualificação ecossistêmica.



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Quem nos introduz algumas noções de RSC é Vasconcelos, Alves, e Pesqueux ([2012]): As empresas, por meio de ações de RSC, vão muito além de apenas cumprirem as expectativas da sociedade, envolvendo-se diretamente em ações de regulação e na produção de bens públicos. Isso significaria adotar um novo conceito politizado de RSC, capaz de agregar esses novos papéis assumidos pelas empresas, transcendendo uma visão econômica, para a qual as ações de RSC são puramente voltadas à criação de valor para as empresas no longo prazo. Esse novo conceito politizado de RSC é capaz de adequar-se a um novo contexto global, pós-nacional, marcado por novas relações entre o Estado e a sociedade.

Frente a esse conceito e principalmente ao que os autores chamam de “novas relações entre o Estado e a sociedade”, Dupas (2008, p. 76) faz a crítica que nos faz retornar ao ponto de partida: Em síntese, o exercício de uma ética empresarial baseada na responsabilidade social e ambiental das empresas liga-se, ainda que de maneira subliminar, à substituição da idéia de deliberação participativa sobre os bens públicos – que deve ser praticada pela democracia, pela política e por suas instituições – pela noção de gestão eficaz de recursos sociais e prevenção de riscos decidida aleatoriamente pelo setor privado. Nesse sentido, essas práticas privadas diluem as referências públicas e políticas na tentativa de redução das injustiças sociais e agravos ambientais.

Como já visto em Esteves (2007), o movimento do mercado em direção à questão pública tem como fundo a intenção de deslegitimá-lo, de pulverizar e, principalmente, de privatizar o espaço e os bens públicos. Dessa forma, o interesse privado sobrepõe-se ao interesse público e como profissionais da área de Relações Públicas, baseados na ideia de Andrade (2005, p. 16), não é nosso interesse participar desse movimento de ocupação do público pelo privado. Nesse contexto também surge o Marketing para Causas Social (MCS), que é definido por Pringle e Thompson (2000 citado por DE OLIVEIRA, 2007, p. 24), “como uma ferramenta estratégica de marketing e de posicionamento que associa uma empresa ou marca a uma questão ou causa social relevante, em benefício mútuo”. De certa forma, o “benefício mútuo” dito pelos autores é a dupla troca que os autores anteriores também reforçaram: organizações realizam ações socialmente benéficas, seja em termos comunitários ou ambientais, para que isso auxilie na construção de uma melhor reputação e imagem institucional. Não há filantropia, no sentido de que é feito algo em prol do “bem comum” sem esperar-se um retorno (de reputação ou realmente monetário) num momento posterior. Isso de maneira alguma invalida as ações de Responsabilidade Social e/ou Ambiental e nem do Marketing para Causas Sociais. Ambas práticas usam de temas

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que trazem questões ligadas aos problemas sociais, dando visibilidade a causas, essas sim, de interesse público. E é essa comunicação, planejada para atingir o público de maneira persuasiva, modificando suas atitudes, integrando vários meios e tratando de assuntos de interesse público que trata-se do apelo social como estratégia de Relações Públicas.



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4 “NO HAGO MAS NA’ ” VERSUS “ECHAR PAL’ANTE” Como objetos de estudo dessa monografia, dois vídeos produzidos pela agência de propaganda JWT Porto Rico se colocam como centrais, na busca do entendimento sobre os interesses, públicos ou privados, do Banco Popular de Porto Rico. Nesse sentido, se torna importante diferenciar as características de cada um e os fins dos mesmo, localizando-os no tempo e delimitando o objetivo de cada um. O vídeo “Echar Pal’ante”52 é peça integrante da campanha de mesmo nome do BPPR, lançada no dia 16 de agosto de 2011 de maneira massiva na ilha. A divulgação prévia do lançamento da ação de comunicação foi realizada de maneira a ocupar os meios e focar a atenção do público no “recado” que seria dado. Na peça, apresentam-se os músicos da banda “El Gran Combo de Puerto Rico”, um famoso conjunto de salsa que obteve grande sucesso entre 1970 e 1980. Após um breve discurso, a banda toca a música “Echar Pal’ante”, uma adaptação da música “Y no hago mas na’”53 do álbum “Universidad de la Salsa”54, de 1983. Já o vídeo “The most popular song”55 é uma peça publicitária produzida com o intuito de explicar a campanha, suas motivações, seu plano de ação e suas ações subsequentes. Não há foco na música regravada, mas sim no resultado esperado e no alcance de mídia conquistado. A realização audiovisual também apresenta vários dados relativos ao Gran Combo, ao país, ao Banco Popular de Porto Rico e ao motivo da mudança de “Y no hago mas na’” para “Echar Pal’ante”. Ambos vídeos, como peças publicitárias, são instrumentos da linguagem (mensagem), expressões de ideias do Banco Popular de Porto Rico (emissor) para os públicos de cada um (receptor). A mensagem, nesse caso os dois vídeos, será mencionada como o discurso da organização. E segundo Manhães (2005, p. 305): A noção de discurso é uma consequência da premissa hermenêutica de que a interpretação do sentido deve levar em conta que a significação é construída no interior da fala de um determinado sujeito; quando um emissor tenta mostrar o mundo para um interlocutor, numa determinada situação, a partir de seu ponto de vista, movido por uma intenção.

Essa intenção, dita por Manhães, são os interesses da organização com discurso. E sejam esses interesses de viés público ou privado, é objetivo explicitá 52

Tocar adiante (tradução do autor) Retirado de , acessado em 04 nov 2015. 53 Não faço mais nada (tradução do autor) 54 Universidade da Salsa (tradução do autor) 55 A canção mais popular (tradução do autor) Retirado de , acessado em 04 nov 2015.



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los. No que tange a análise de discurso e as intencionalidades no processo comunicativo, Charaudeau (2008, p. 17) argumenta que: Uma outra posição teórica consiste em conceber o ato de linguagem como produzido por um emissor determinado, em um dado contexto sóciohistórico. Disso resulta a idéia de que a linguagem é um objeto não transparente. Na realidade, neste caso, o processo de comunicação não é o resultado de uma única intencionalidade, já que é preciso levar em consideração não somente o que poderiam ser as intenções declaradas do emissor, mas também o que diz o ato de linguagem a respeito da relação particular que une o emissor ao receptor.

Ou seja, conforme Charaudeau, não há um discurso “puro”, uma mensagem livre de intenções, imparcial. Por esse ponto de vista, sempre é necessário, para total entendimento da mensagem, o entendimento do contexto histórico e social de cada emissor. Segundo o autor, o discurso publicitário é um contrato do que ele define como “semiengodos” que não pode ser interpretado unicamente como um discurso de manipulação, com conotação negativa, pois “não há relações sociais que não estejam marcadas por relações de influências” (Charaudeau, 2010, p. 58). E complementa indicando que não há uma instância de produção (‘EU’) sem a instância de recepção (‘TU’), havendo sempre interação social, pois “para tocar o outro, o sujeito falante recorre a estratégias discursivas que focam a emoção e os sentimentos do interlocutor ou do público de maneira a seduzi-lo” (Ibidem, p. 60). No caso do Banco Popular e sua campanha "Echar Pal’ante” ou o video case “The most popular song”, o aprofundamento teórico é necessário para entender se a intencionalidade do discurso é de caráter público ou privado. Segundo Viegas e Carvalho (2015, p. 4), existe na publicidade um duplo esquema narrativo/argumentativo que juntos têm como objetivo persuadir e incitar o público para o consumo daquele produto/serviço. No presente trabalho, cada um dos vídeos analisados tem um esquema narrativo diferente, porém em ambos é necessário trocar o conceito de produto/serviço por uma ideia, uma representação mental. O esquema original é representado na figura 7.



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Figura 7 – Esquema narrativo do discurso propagandista segundo Charaudeau

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Fonte: Viegas e Carvalho (2015)

Segundo o esquema, o EU deve incitar o TU a buscar a supressão de sua carência, tendo como meta o objeto ideal, através do meio que é anunciado. O meio, segundo Charaudeau, é o produto/serviço oferecido e que nesses dois casos é o conceito/ideia que estão sendo veiculados. Ainda conforme Charaudeau (1983 citado por VIEGAS E CARVALHO 2015, p. 4) “o publicitário deve conquistar seu interlocutor fabricando uma imagem de sujeito destinatário suficientemente sedutora e/ou persuasiva para que o interlocutor possa se identificar com ela”. Dessa forma, entendemos os dois vídeos como peças publicitárias de cunho persuasivo que tem o apelo social como estratégia de comunicação, cada uma configurando um diferente esquema narrativo e que tem sua análise nos subcapítulos que seguem. 4.1 ANÁLISE DO DISCURSO DA CAMPANHA “ECHAR PAL’ANTE” DO BANCO POPULAR DE PORTO RICO O vídeo “Echar Pal’ante”, da campanha homônima do Banco Popular de Porto Rico (EU, conforme Charaudeau) possui quatro minutos de duração, sendo destes o primeiro minuto dedicado às falas dos integrantes da banda “El Gran Combo de Puerto Rico” e no tempo restante é reproduzida a versão modificada e regravada do sucesso “Y No hago mas na’”. No primeiro minuto, as falas dos integrantes são curtas, porém todas têm um tom motivacional, incorporando o objetivo da campanha que pode ser entendido na adaptação do título da canção. Segundo o Banco Popular de Puerto Rico(a), em seu case de campanha: The relationship with the United States has brought billions of dollars in aid and benefits to help people who were unemployed or needed financial

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Esquema apresentado no curso “Comunicação, linguagem e discurso em processos comunicacionais”, ministrado por Patrick Charaudeau em junho de 2015, na Universidade Feevale. (VIEGAS E CARVALHO, 2015, p. 4)



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assistance. However, it has also created a subculture of welfaredependency that now affects 60% of the country’s population. We believe that this financial assistance helped to eliminate the extreme poverty but, at the same time, it created a new kind of poverty; bigger, stronger and more 57 dangerous to progress than its predecessor: The reluctance to work Banco Popular de Puerto Rico(b)

“Echar pal’ante” é algo como “tocar adiante”, “fazer acontecer”, “seguir adiante”. Esse novo título, trocado com o anterior “não faço mais nada” é um claro recado de reposicionamento de ideias. Um recado de que se deve mudar a mentalidade passiva do povo porto-riquenho (‘TU’, segundo Charaudeau) para uma ativa, do fato de ser economicamente sustentado por incentivos governamentais para a oportunidade de empreender, de trabalhar por si mesmo. Segundo o Banco Popular de Puerto Rico(a) em seu case da campanha, o objetivo era: Igniting the productive-self of Puerto Ricans. Willingness to work wouldn’t come easy; so we set an ambitious yet inspiring task. The task: To stimulate a behavioral change that, in turn, would trigger a break away from welfare dependency. To make productivity contagious we discussed with the creative team that by looking to art we would discover and idea that would 58 increase our chances of success.

Observamos a presença desses argumentos tanto nas falas dos músicos quanto na letra da canção. Como exemplos da primeira parte do vídeo, podemos ressaltar alguns discursos, observando a origem da banda em 1962 e do contexto econômico e social da época: “Eran tiempos dificiles, de muchos retos y problemas, pero nuestro pueblo los venció.”59 Em um trecho seguinte, já iniciando o assunto sobre a atual realidade e os desafios de se “echar pal’ante”, encontramos as seguintes frases: “Hoy, todavia seguimos luchando contra las adversidades que dia a dia nos trae na vida.”60 “Nuestro Puerto Rico no esta pobre de esperanza”61 “No esperes que nadie lo haga por ti”62. A tentativa de reverter a situação econômica foi a estratégia escolhida, porém seu verdadeiro alvo foram as pessoas que não querem trabalhar, que sobrevivem 57

A relação com os Estados Unidos trouxe bilhões de dólares em ajuda e benefícios para ajudar as pessoas que estavam desempregados ou precisando de assistência financeira. No entanto, ele também criou uma subcultura de dependência do estado de bem-estar que agora afeta 60% da população do país. Acreditamos que esta assistência financeira ajudou a eliminar a pobreza extrema mas, ao mesmo tempo, criou um novo tipo de pobreza; maior, mais forte e mais perigosa para o progresso do que sua antecessor: A relutância para trabalhar. (tradução do autor) 58 Impulsionando a produtividade de cada porto-riquenho. Vontade de trabalhar não viria fácil; por isso, nós definimos uma tarefa inspiradora e ambiciosa. A tarefa: Estimular uma mudança de comportamento que, por sua vez, provocaria uma ruptura com a dependência do wellfare state. Para fazer com que a produtividade fosse contagiosa discutimos com a equipe criativa que, ao abordar o problema pela arte descobriríamos a idéia que iria aumentar nossas chances de sucesso. (tradução do autor) 59 Eram tempos difíceis, de muitos desafios e problemas, mas nosso povo os venceu” (tradução do autor) 60 “Hoje, ainda seguimos na luta contra as adversidades que todos os dias a vida nos traz” (tradução do autor) 61 Nosso Porto Rico não está pobre de esperança. (traducão do autor) 62 Não espere que alguém faça algo por você. (tradução do autor)



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com os auxílios federais de alimentação, de moradia e outros. Tais inferências podem ser retiradas dos discursos explícitos dos músicos, porém isso representa apenas um quarto do tempo de duração do vídeo. Tendo em vista a análise das imagens e símbolos presentes no decorrer do objeto, nos é necessário um escopo teórico, sobre o explícito e o implícito. Conforme Esteves (2007, p. 433) No domínio do chamado não verbal, os elementos constituintes não são todos equivalentes; é importante distinguir, em particular, as simbolizações do tempo e do espaço, que dão lugar no discurso aos díticos, os quais possuem um efeito estruturante das demais formas simbólicas: as palavras, os gestos, os símbolos, etc.

No decorrer do vídeo, já durante a reprodução de “Echar pal’ante”, as representações são coerentes com a proposta da canção, no sentido de mostrar pessoas trabalhando felizes para inspirar mais pessoas a fazerem o mesmo. Mas a forma usada para ilustrar tais situações merece destaque. No transcorrer da peça audiovisual são mostradas diferentes profissões, de diferentes setores da sociedade, porém, de forma intercalada, aparecem os músicos realizando movimentos parecidos com os dos trabalhadores. Essa estética, de certa forma, aproxima os músicos e os trabalhadores, gera empatia entre o público e a marca, ainda que ela não esteja diretamente presente no vídeo. Na figura 8 podemos observar dois frames do vídeo que, implicitamente, trazem a mesma mensagem. Na imagem da esquerda, um trabalhador do campo, um jíbaro que participa da colheita e na imagem da direita, Luis “Papo” Rosario, um dos vocalistas da “Universidad de la Salsa”63 também secando o suor. Apesar de originárias de lugares distantes entre si, o fato dos dois personagens estarem secando o suor da testa os liga pela ideia de trabalho duro, frequentemente ligada ao clichê de “suor do trabalho”.

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Universidade da Salsa (tradução do autor). O conjunto “El Gran Combo de Puerto Rico” tem, entre outros apelidos, também é conhecido como “Universidad de la Salsa” e “Los Mulatos del Sabor”



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Figura 8 – Jíbaro e cantor

Fonte: Echar Pal’ante(b)

Da mesma maneira, repete-se esse artifício de associação das atividades dos trabalhadores/ com os gestos dos músicos. As figuras 9 e 10 reforçam a intencionalidade de criar a relação entre os instrumentistas e as pessoas em suas atividades laborais. Na figura 9, do lado esquerdo coloca-se um jovem shaper64 e ao lado direito o saxofonista Freddie Miranda. No vídeo, ambos tomam fôlego e usam o sopro como parte de seu trabalho, separados por poucos instantes, quase dando a entender que é o sopro do shaper quem toca o saxofone. Figura 9 – Shapper e saxofonista

Fonte: Echar Pal’ante(b)

Já na figura 10, o instrumento tocado é o bongô e a relação laboral/musical feita é com um padeiro, que sova a massa de maneira semelhante a qual Richie Bastar toca a percussão. Apesar de bastante manual o trabalho de ambos, entendese a distância entre cada atividade, assim como a importância de ambas para a sociedade porto-riquenha.

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Profissional que fabrica, conserta e personaliza pranchas, principalmente de surf.

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Figura 10 – Padeiro e percussionista



Fonte: Echar Pal’ante(b)

Na figura 11, nos últimos frames de análise, temos a relação laboral / musical com mais elevada tecnologia, com uma funcionária de escritório, trabalhando até tarde (visto o ambiente escuro ao seu entorno) e o tecladista Willie Sotelo tocando seu instrumento. Em primeira análise, não há nenhum fator novo na relação entre músico e trabalhador além dos exemplos que já foram citados, exceto pelo local onde a profissional está. Logo antes do aparecimento dela digitando, há uma breve exposição de marca (figura 12), bastante discreta, do Banco Popular de Porto Rico, através da fachada de sua sede em Hato Rey. O prédio, que é bastante característico, aparece de relance, totalmente escuro. No frame seguinte, uma luz é acesa e logo após aparece a figura da colaboradora trabalhando até mais tarde, dedicando-se à sua ocupação. Figura 11 – Funcionária de escritório e tecladista

Fonte: Echar Pal’ante(b)



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Figura 12 – Inserção de marca do Banco Popular de Porto Rico

Fonte: Echar Pal’ante(b)

Em todo o vídeo esta é a única exposição que trata sobre o Banco Popular de Porto Rico, bastante singela para uma produção audiovisual de 4 minutos e que se propõe a dinamizar a economia de um país inteiro, através da regravação de uma música bastante conhecida naquele país. Esse fato, de certa forma, nos ajuda a diferenciar essa peça de propaganda do modo como geralmente entendemos a publicidade, visto que houve, deliberadamente, a exposição do BPPR muito breve, quase imperceptível. E quando usada, apenas para ilustrar o fato de que trabalhar além do expediente, dedicar-se à sua ocupação independente do horário, é mais um valor dentre os já mencionados para a motivação das pessoas para trabalharem e serem independentes. Nem mesmo ao final do vídeo o banco assina como emissor da mensagem, tendo como última mensagem, logo após o término da canção, o que aparece é o site do movimento de empresários impulsionado pelo Banco Popular de Porto Rico, chamado “Movimento Social Echar Pal’ante” (EPL). Segundo o seu site oficial, Echar Palánte(a) afirma que suas aspirações são: Este movimiento aspira a servir de mesa de trabajo para un junte multisectorial del país conducente a un mejor Puerto Rico. Promueve las dimensiones de calidad de vida, educación y empresarismo, entre otras iniciativas, como bandera de superación para nuestro reto socio-económico. EPL tiene como compromiso promover proyectos noveles que alienten y abran posibilidades al futuro y al quehacer de nuestro país. Nuestra filosofía es que sólo con el esfuerzo de todos los sectores en una voluntad colectiva seremos capaces de transformar una realidad que presenta grandes retos de progreso en estos momentos. Uno de los aspectos medulares para que ese movimiento pueda darse es el fortalecimiento de la educación en Puerto Rico y el impulso de la empresa propia. Nuestro propósito es fortalecer 65 estas alianzas para desarrollar una agenda común.

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Este movimento aspira servir como plataforma de trabalho para um elo multissetorial do país para conduzir a um melhor Porto Rico. Promove as dimensões de qualidade de vida, educação e empreendedorismo, entre outras iniciativas, como estandarte de superação para nossos desafios socioeconômicos. EPL tem como compromisso promover projetos novos que apoiem e abram posibilidades ao futuro de nosso país. Nossa filosofia é que somente com o esforço de todos os setores em uma vontade coletiva seremos capazes de transformar uma realidade que apresenta grandes desafios de progresso. Um dos aspectos medulares para que



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Portanto, apesar de ser uma peça de publicidade promovida pelo Banco Popular, foi de certa forma adotada pelo Movimento Echar Pal’ante, sem grandes interferências do próprio BPPR, classificando-a de cunho institucional (apesar da marca do banco ser pouco explorada e exposta). Com isso, numa primeira leitura, pode-se dizer que o vídeo é uma mensagem de comunicação pública que visa o interesse público, pois foi patrocinada pela organização financeira, mas leva como mensagem a ideia de empreendedorismo e melhora na educação, na forma de um pacto nacional pelo desenvolvimento econômico. Essa interpretação pode ser mais claramente visualizada no quadro 2, no quadro narrativo da campanha “Echar Pal’ante”, analisado com base na leitura do discurso proposta por Charaudeau e traduzida no esquema publicitário em Viegas e Carvalho (2015, p.4): Quadro 2 – Esquema narrativo do vídeo “Echar Pal’ante”

EU TU CARÊNCIA BUSCA OBJETO IDEAL

Movimento Echar Pal’ante População porto-riquenha Economia dinâmica Empreendedorismo e não-dependência do wellfare state Progresso, desenvolvimento, economia forte, não-dependência do estado.

Fonte: Elaborado pelo autor

Dessa forma, é possível compreender os objetivos da vídeo, começando pelo compartilhamento do papel do EU entre o Banco Popular de Porto Rico e o Movimento Echar Pal’ante. O primeiro, o patrocinador e o segundo, quem assina o vídeo e que tem em si mesmo os objetivos colocados como ‘busca’ no Quadro 2. A análise do vídeo da campanha “Echar Pal’ante” pode ser complementada pela leitura da realização audiovisual “The most popular song”, visto que o segundo trata da campanha realizada e de suas motivações e resultados. Seguimos então para a análise do segundo vídeo.

4.2 ANÁLISE DO DISCURSO DO VIDEO CASE DA CAMPANHA “THE MOST POPULAR SONG” Na segunda peça publicitária objeto de análise, o video case apresenta-se de maneira a explorar mais o próprio assunto que trata, configurando uma esse movimento possa acontecer é o fortalecimento da educação em Porto Rico e o impulso para as empresas próprias. Nosso propósito é fortalecer estas alianças para desenvolver uma agenda comum. (tradução do autor).



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autorreferencialidade. Esse case que nos é apresentado não é somente a campanha de publicidade do Movimento Echar Pal’ante, mas sim o compilado das ações de comunicação promovidas pelo Banco. O vídeo de 3 minutos traz desde as motivações da campanha (as dificuldades econômicas que Porto Rico passava pela falta de trabalhadores), a importância do “El Gran Combo de Puerto Rico”, as estratégias de comunicação utilizadas antes e depois do lançamento do peça “Echar Pal’ante” e os desdobramentos (espontâneos e planejados) das ações. De maneira concisa, o objetivo do vídeo é contextualizar o espectador sobre a situação do país, sobre a oportunidade em agir perante a realidade posta e de que maneira isso foi realizado. A realização audiovisual “The most popular song” já tem um apelo mercadológico para o BPPR em seu título, já que a palavra “popular” é comum ao nome do vídeo e ao Banco Popular de Porto Rico. Pode se estabelecer uma relação entre “a canção mais popular” e “o banco mais popular”, que aliás, é a maior organização financeira da ilha. Um ponto importante que introduz o vídeo, além das informações que tratam da economia, retiradas do “Estudio Nueva Pobreza”66 produzido pela JWT Puerto Rico, é a frase que diz “As the largest bank in Puerto Rico, Banco Popular’s success depends on the island’s economy”67. De certa forma, é somente nesse trecho que o interesse privado da organização é explicitado. Outra ideia que pode ser analisada é que “The most popular song” não é um vídeo que tem como público principal a população de Porto Rico, começando pela língua utilizada. Apesar que o inglês é também língua oficial da ilha, por conta da sua relação com os Estados Unidos da América, somente 29% dos habitantes da ilha se consideram bilíngues68. O fato é que o referido vídeo é um case produzido para inscrever a campanha de comunicação “Echar Pal’ante” no Festival Internacional de Cannes, especificamente na categoria de Relações Públicas. Segundo Cannes, a categoria de RRPP é entendida como: The definition of PR for the purpose of Cannes Lions is the creative use of reputation management by the building and preservation of trust and understanding between individuals, businesses or organizations and their publics/audiences. PR Lions will be awarded to the freshest creative PR

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Estudo sobre a Nova Pobreza. (tradução do autor) Como o maior banco de Porto Rico, o sucesso do Banco Popular depende da economia da ilha. (tradução do autor) 68 Comisión de Educación, Ciencia y Cultura del Senado de Puerto Rico. Informe Final sobre el Idioma en Puerto Rico (2001, p. 41). Retirado de: . Acessado em 10 nov 2015. 67



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campaigns, programs and tactics that actively engage consumers/audiences to products/brands/organizations and demonstrate the highest levels of 69 strategic planning, creativity and business results. Cannes (2015)

Tendo em mente essa definição, alinhada com França (2004, p.97), nos traz que apesar de contar com muitos elementos de comunicação mercadológica, assessoria de imprensa e outras formas de comunicação mostradas no decorrer de “The most popular song”, há o entendimento do BPPR e da própria agência responsável pela campanha, a JWT Puerto Rico, de que o trabalho realizado foi de Relações Públicas. Tal conceito também foi reafirmado quando premiado, visto que houve legitimação internacional da ação. Outra parte do texto narrado de “The most popular song”, mais precisamente no início, relata a música “Y no hago mas na’” como uma “celebração” do estilo de vida porto-riquenho de aproveitar-se do wellfare state do país. Tal afirmação, ao mesmo tempo que é prejudicial a imagem do isleño, está em consonância com os dados levantados pela pesquisa “Estudio Nueva Pobreza” e com os dados governamentais sobre a economia do país. Porém, ao incluir o trecho “living on wellfare has become a common way of life, so common that it celebrated in one of the greatest’s salsa hit in all time”70, entre as possíveis interpretações está que os borícuas orgulham-se de terem esse estilo de vida, a ponto de que o “El Gran Combo de Puerto Rico” gravou essa música em 1983 e ela se tornou um grande sucesso. No transcorrer do vídeo, tanto a letra original da canção “Y no hago mas na’” quanto a versão “Echar Pal’ante” são traduzidas ao inglês, porém o importante é a colocação delas lado a lado, mostrando a mudança da música e de seu significado, convergente com os objetivos da campanha (quadro 3). Na letra original da canção, em seu início e seu refrão, encontram-se as grandes trocas de significação.

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A definição do Relações Públicas com o propósito do prêmio Cannes Lions é o uso criativo de gestão de reputação pela construção e preservação de confiança e compreensão entre indivíduos, empresas ou organizações e seus públicos. O prêmio de Relações Públicas Lions será concedido as mais criativas campanhas de relações públicas, programas e táticas que envolvem ativamente o público e consumidores com os produtos / marcas / organizações e demonstrar os mais altos níveis de planejamento, criatividade e resultados. (tradução do autor) 70 “Viver num estado de bem-estar social tornou-se um estilo de vida comum, tão comum que foi celebrado em um dos maiores hit salsa em todos os tempos”. (tradução do autor)



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Quadro 3 – Comparação da letra de “No hago mas na’” e “Echar Pal’ante”

Fonte: Elaborado pelo autor (2015)

Outro dado apresentado pelo video case são as estratégias de comunicação utilizadas para impulsionar a campanha “Echar Pal’ante”. Entre elas está o uso de

anúncios teasers sobre o lançamento, com o intuito de gerar expectativas sobre o que seria apresentado ao país pela banda “El Gran Combo de Puerto Rico”, de maneira massiva por meio dos canais de televisão e emissoras de rádio. Os resultados finais em termos de exposição da marca do Banco Popular podem ser vistos na figura 13.





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Figura 13 – Resultados de mídia da campanha “Echar Pal’ante”

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Fonte: Banco Popular de Puerto Rico(a)

Conforme a figura 15, vemos que a campanha teve um grande impacto midiático no país, tornando a marca presente de maneira além dos comerciais, através da ligação da música, que permaneceu nas paradas de sucesso e alcançou o topo em 13 rádios. O show promovido pelo banco com mais de 60 mil pessoas também foi uma ação que oportunizou a fixação, de maneira massiva, da marca junto aos espectadores. Ainda referente ao discurso do vídeo, a escolha da banda é apoiada no sucesso de “El Gran Combo de Puerto Rico” através de sua música, mas também é apoiada no artigo “Jubilees and Living Histories”, publicado no New York Times. Segundo Ratliff (2012): 71

Resultados de exposição: Mais de 300 mil dólares em mídia espontânea; Mais de 57 mil pedidos de música; A canção alcançou o topo das paradas de 13 rádios. Cada uma das milhares de vezes que ela foi tocada significaram 3 minutos de publicidade grátis para o banco; Mais de 125 mil visualizações online; 75 mil novas curtidas na página do Facebook; Mais de 80 mil visitas no blog echarpalante.com; O sucesso repentino da música encorajou o Banco Popular a organizar um concerto grátis com a participação do El Gran Combo para mais de 60 mil pessoas. (tradução do autor)



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The following month El Gran Combo formed out of the remains of Rafael Cortijo y Su Combo, a brilliant band that had come to symbolize the new Puerto Rican popular music: black, working-class, Cuban-influenced, tight and urban but rustic at the middle [...] Like El Gran Combo — and the Stones and Chieftains too — the Beach Boys weren’t necessarily pioneers of anything. [...] There had been black Puerto Rican pop stars before but no important black band, and none who had so effectively adapted the old Puerto Rican bomba rhythms [...] El Gran Combo “is not a traditional group 72 but musical tradition itself.” Ratliff (2012)

No referido artigo, “El Gran Combo” é colocado no mesmo patamar de bandas como Rolling Stones, Chieftrains e Beach Boys, como dito no trecho abaixo: They’ve all been seen as standard-bearers, if not for an entire culture, in the case of El Gran Combo and the Chieftains, at least for a sound or a disposition. They’re all, effectively, scholars and popularizers. They’ve had to negotiate nearly compulsory changes of style without abandoning the 73 audiences that value them most. RATLIFF (2012)

Trazendo para o vídeo “The most popular song” o esquema narrativo proposto por Viegas e Carvalho (2015, p.4), podemos analisar o discurso sob outros prismas. Quadro 4 – Esquema narrativo do vídeo “The most popular song”

EU TU CARÊNCIA BUSCA OBJETO IDEAL

Banco Popular de Porto Rico Mostra competitiva do Festival de Cannes Reforçar a marca do banco perante o público Campanha Echar Pal’ante Boa imagem do banco, fixação da marca, criação de empatia

Fonte: Elaborado pelo autor (2015)

Pode-se perceber que as metas presentes no quadro 4, tanto em ‘carência’ quanto em ‘objeto ideal’ são objetivos mercadológicos, que tratam especificamente da marca do BPPR junto ao seu público, representado no quadro pelo ‘TU’. Contudo, esse viés de mercado comunicado pelo banco através da campanha “Echar Pal’ante” não foi explicitado na campanha “institucional”, mas o vídeo “The most popular song” trata dessa campanha, nos mostrando que nem todos os interesses foram trazidos à tona no vídeo “Echar Pal’ante”. Outra informação importante para jogar luz sobre o que se torna explícito em “The most popular song” mas não é tratado em “Echar Pal’ante” é o interesse no 72

No mês seguinte El Gran Combo, formado a partir dos restos de Rafael Cortijo y Su Combo, uma banda brilhante que tinha vindo para simbolizar a nova música popular porto-riquenha: negra, da classe trabalhadora, influenciada por ritmos cubanos, urbana, mas sem deixar de ser rústica [...] Como El Gran Combo - e os Stones e também os Chieftains - os Beach Boys não eram necessariamente pioneiros em nada. [...] Não havia estrelas pop porto-riquenhas negras, mas nenhuma banda negra importante, e nenhuma que obteve tanta eficácia adaptando os velhos ritmos, como a bomba porto-riquenha [...] El Gran Combo "não é um grupo tradicional mas a própria tradição musical." (tradução do autor) 73 Eles foram todos vistos como porta-estandartes, se não para toda uma cultura, no caso de El Gran Combo e os Chieftains, pelo menos para um ritmo. Eles foram todos, de forma eficaz, estudiosos e divulgadores. Eles tiveram que negociar mudanças quase obrigatórias de estilo sem abandonar as audiências que eles mais valorizavam. (tradução do autor)



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crescimento econômico do país. Como dito anteriormente, o primeiro vídeo não se coloca como uma peça de campanha do Banco Popular de Porto Rico, mas sim como de autoria do Movimento Echar Pal’ante, fato que é desmistificado pelo video case e, principalmente, pela frase “Como o maior banco de Porto Rico, o sucesso do Banco Popular depende da economia da ilha”. Além disso, a real justificativa do banco investir no empreendedorismo e no intento de dinamizar a economia da ilha pode ser encontrado no case da campanha, que traz: Helping the country to help us. With such overwhelming dominance in the market (46%), there was only a limited amount to gain from trying to further improve Banco Popular’s market share. The return on any efforts would most likely be minimal. […] We believed that the solution would lie in Banco Popular helping grow the entire banking market themselves. The bank would 74 then disproportionally gain to the tune of almost half of all the growth”

Ou seja, a tentativa de fazer crescer a economia local tinha, como real objetivo, o crescimento do mercado consumidor de serviços bancários, e por conseguinte, dos lucros do maior banco do país, o Banco Popular de Porto Rico. Tal visão acaba com a teoria de que a organização promoveu uma ação de responsabilidade social ou de filantropia. Como dito por Baldissera e Araújo (2007, p.37): Se, por um lado, pode estar, sim, comprometido com o ecossistema, em algum nível, por outro lado, não se pode desconsiderar o fato de que se apresentar socialmente responsável tende a resultar em retorno positivo de imagem-conceito, aumento das vendas, poder simbólico, isto é, geração de mais lucros/capital.

Ou seja, o interesse público que se explicita em uma primeira análise do vídeo “Echar Pal’ante”, através de uma comunicação pública e mobilizando a opinião pública nacional (com impacto visível através dos resultados da campanha), não se confirma frente a análise de “The most popular song”. Nesse sentido, não passa de um argumento sem prática, de um discurso persuasivo feito com o objetivo de somar ativos de confiança e reputação para a marca do Banco Popular de Porto Rico, e não somente de dinamizar a economia e promover o empreendedorismo junto aos porto-riquenhos. Dessa forma, confirmam-se as críticas de Esteves (2007, p. 189) e Dupas (2008, p. 76) no que trata da privatização do espaço público e na mescla dos interesses públicos e privados, mas em detrimento do primeiro. 74

Ajudando o país para nos ajudar. Com o domínio esmagador no mercado (46%), haveria apenas uma quantidade limitada a ganhar com a tentativa de melhorar ainda mais o percentual quota de mercado do Banco Popular. O retorno sobre quaisquer esforços desse tipo provavelmente seria mínimo. [...] Nós acreditamos que a solução estaria no Banco Popular ajudar a crescer todo o mercado bancário si. O banco, então, ganharia de forma desproporcional quase metade de todo o crescimento "



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Porém, na visão de Charaudeau (2010, p. 58), não há prejuízo de valor na ação “Echar Pal’ante”, pois segundo o autor, nos discursos publicitários há um contrato de “semiengodos”, onde a interpretação não pode ser de um discurso de manipulação, com conotação negativa, pois “não há relações sociais que não estejam marcadas por relações de influências”. E é nesse conflito de interesses que reside a função do Relações Públicas, tal como colocado por Simões (1995, p. 83): A atividade de Relações Públicas é a gestão da função política da organização. [...] A função política da organização [...] objetiva que, através da filosofia, políticas e normas, a atuação da organização [...] ocorra e seja percebida como realizada em benefício dos interesses comuns que possui com seus públicos.

Enfim, é entremeada nesses “interesses em comum” que se posiciona a campanha “Echar Pal’ante”, numa ação que objetivou melhorar a situação econômica de um país, gerando também melhores resultados para a maior instituição financeira de Porto Rico.



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CONSIDERAÇÕES FINAIS A proposta dessa monografia baseou-se na análise de discurso de dois vídeos do Banco Popular de Porto Rico, maior instituição financeira do referido país, presente dentre as mais importantes dos Estados Unidos da América. Apesar de tratarem sobre a mesma campanha, que contou com a regravação do sucesso “Y no hago mas na’” da banda de salsa “El Gran Combo de Puerto Rico”, as duas realizações audiovisuais não tinham o mesmo público-alvo e não compartilhavam objetivos, sendo essa diferença o ponto chave possível de ser abordado nas análises. Conforme os objetivos previstos, as características de cada vídeo foram apresentadas e colocadas em contraponto entre si, sendo o video case “The most popular song” muito útil para enxergar além do discurso da campanha “Echar Pal’ante”, pois transparecia no “discurso sobre o discurso” as motivações e os interesses privados do banco, antes envoltos numa aura de interesse público. Da mesma forma, os objetivos de “The most popular song” ficam evidentes ao analisarmos o quadro narrativo da realização audiovisual, com um discurso voltado para a competição internacional de Cannes, com linguagem, idioma e estética planejadas para isso. A partir da problemática que conduziu este estudo, foi possível pensar criticamente conceitos que estão já impregnados no nosso cotidiano e, principalmente, no meio acadêmico de Relações Públicas. As práticas de responsabilidade social / ambiental e as campanhas de Marketing para Causas Sociais não podem ter como objetivo único o retorno benéfico para a organização proponente, quase sempre o lucro direto ou a construção de uma boa imagem organizacional. Com base na reflexão da área de Relações Públicas deve-se buscar a mediação dos relacionamentos entre as organizações e seus públicos de influência, mas sem deixar de ter no horizonte o interesse público. Pois se há algum tipo de ranço ou preconceito sobre a área de Relações Públicas, é porque as técnicas, ideias e ferramentas de RRPP foram utilizadas por profissionais sem ter o interesse público em vista. Com base na pesquisa bibliográfica realizada e nas interpretações dadas aos vídeos “Echar Pal’ante” e “The most popular song”, é possível entender melhor as

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aspirações do Banco Popular de Porto Rico com a campanha de Relações Públicas “Echar Pal’ante”. Em primeiro momento, na análise do primeiro vídeo, a instituição financeira quase não aparece como autora da ação e nos parece ter em vista o interesse público, o real interesse na dinamização de uma economia em recessão. Quem assina a realização audiovisual é um movimento de empresários apoiado pelo banco, o que só nos faz entendê-lo ainda mais como isento, como uma instituição ética, focada no interesse público. Porém, após a análise do vídeo “The most popular song”, um video case que tem como objetivo apresentar as ações de RRPP realizadas pela campanha “Echar Pal’ante”, o entendimento sobre os interesses do banco se modificaram. A dita “aura” de interesse público conferida pela ausência de elementos de exposição de marca só ressaltou os reais objetivos da campanha: motivar o empreendedorismo dos porto-riquenhos, visando aumento das transações bancárias como um todo e dessa forma gerando dividendos aos acionistas da referida instituição financeira. Entende-se a posição mercadológica do banco e dessa forma não é possível invalidar a comunicação com apelo social realizada, visto que houve um “benefício social” na tentativa de mobilizar a economia. Porém, observa-se que a estratégia usada é convergente com os apontamentos sociológicos apresentados, no que se refere à ocupação do espaço público com interesses privados. O vídeo “Echar Pal’ante, se analisado sozinho, pode ser considerado como uma mensagem de Comunicação Pública, mas com o auxílio do case de campanha e do vídeo “The most popular song”, é possível entender que a estratégia teve muito mais a ver com o percentual de domínio de mercado do Banco Popular de Porto Rico (42% de market share) do que com um interesse genuíno no reestabelecimento econômico da ilha. Esse jogo de interesses explícitos e ímplicitos na comunicação do Banco Popular de Porto Rico nos mostra que, conforme os teóricos visitados, não há imparcialidade no discurso, ainda mais no que tange o discurso de organizações grandes, com inúmeros públicos de influência e grande alcance territorial e cultural. Há sempre uma intencionalidade no que é dito e, principalmente, no que não é dito. De igual forma, a estética e a linguagem sempre são estrategicamente realizadas, engrendradas de modo a persuadir o público, de somar-se na constante construção da imagem e reputação das organizações.

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Ao fim, acredito que a busca de interesses em comum, comunicada de maneira transparente, é o grande trunfo de uma comunicação planejada através do olhar de Relações Públicas, com o objetivo de fortalecer a credibilidade das organizações, porém sem perder de vista o interesse público e a ética profissional. De forma pessoal, que tive a felicidade de viver alguns meses no arquipélago porto-riquenho, a oportunidade de agregar vivências do meu intercâmbio estudantil à conclusão da minha graduação me fez crer ainda mais na importância da internacionalização para o profissional de RRPP, bem como me fez ter uma maior sensibilidade aos conceitos do campo da Sociologia em relação à comunicação. Ao poder aprofundar o estudo em certos fenômenos, ainda que distantes da realidade brasileira, é possível fazer alguns paralelos entre marcas e campanhas nacionais, que de igual forma se utilizam de temas com apelo social, de versões de músicas consagradas para gerar empatia, que tratam de assuntos relevantes à sociedade brasileira e ao bem comum do país, mas que por trás somente objetivam o lucro. Apesar de estar realizado com o resultado final do percurso de pesquisa da presente monografia, é importante salientar as dificuldades que se colocaram no caminho, como a complexidade do tema em si; a preocupação em citar autores de uma mesma linha de trabalho, nesse caso voltados mais para a Teoria Crítica; e densidade dos textos dos autores do campo da Sociologia. Porém, foram das dificuldades enfrentadas que surgiram interesses reais em estudar mais a fundo a Sociologia da Comunicação e também a área de Relações Internacionais, com possibilidade de seguir os estudos após a graduação nos referidos campos de estudo.



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ANEXOS ANEXO A – Letra original da música “Y no hago mas na’” Yo me levanto por la mañana, me doy un baño y me perfumo, me como un buen desayuno y no hago mas na', mas na'. Después yo leo la prensa, yo leo hasta las esquelas, o me pongo a ver novelas y no hago mas na', mas na'. A la hora de las doce yo me como un buen almuerzo de arroz con habichuelas y carne guisada, y no hago mas na'. Después me voy a la banca a dormir una siestita; y a veces duermo dos horas y a veces mas, y no hago mas na'. Y me levanto como a las tres, y me tomo un buen café, me fumo un cigarillito con mi guitarra y me pongo a cantar.

y duermo hasta por la mañana y no hago mas na', mas na'. (Qué bueno es vivir asi, comiendo y sin trabajar) ¡Oigan!, yo nunca he doblado el lomo y no pierdan su tiempo, no voy a cambiar. ¡Qué va! (Qué bueno es vivir asi, comiendo y sin trabajar) Señores, si yo estoy declarado en huelga, ¡si!, ¡mi mujer que me mantenga! ¿Oiste? (Qué bueno es vivir asi, comiendo y sin trabajar) Qué bueno, qué bueno, qué bueno, qué bueno es vivir la vida, ¡comiendo, durmiendo y no haciendo na'! Oiga compay, ¿usted sabe lo que es estar en un sillón mece que te mece? Esperando que lleguen los cupones del Seguro Social... ¡Asi cualquiera!

A la la, a la la, a la la lara la lara Y a la hora de la comida me prepara mi mujer un bifstec con papas fritas con ensalada y mil cosas mas. Me lo mango y no hago mas na'. Luego me voy al balcón, cual si fuera un gran señor, a mecerme en el sillón, Con mi mujer a platicar. A larara la la. ¡Ay!, cuando se me pega el sueño enseguidita me voy a acostar,



(Qué bueno es vivir asi, comiendo y sin trabajar) Recibiendo la pensión por loco, de loco yo no tengo na', ¡listo que soy! (Qué bueno es vivir asi, comiendo y sin trabajar) Qué bueno... Traen un plato de mondongo, arroz, habichuela y carne guisa, para empezar. (Qué bueno es vivir asi, comiendo y sin trabajar) ¿Quién trabajara? ¿Quién, yo? Buscate a otro, yo ya hice lo que iba a hacer.

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ANEXO B – Letra de “Echar Pal’ante” Yo me levanto por la mañana. Salgo de casa bien elegante, listo pa’ echar pa’ alante, nunca pa’ atrás, pa’ atrás. Hoy le meto mano al día. Esa es mi filosofía: derechito por mi vía, y nunca pa’ atrás, pa’ atrás. De las seis hasta las doce, el día me lo aprovecho. Me gano mis habichuelas aquí o allá, y nunca pa’ atrás.

¡Qué bueno es vivir así, que bueno, con ganas de trabajar! Oiga yo siempre voy contento y positivo no voy a cambiar ¡Qué bueno es vivir así, vira si, con ganas de trabajar Haciendo de todo poco voy progresando, no voy para atrás ¡Qué bueno es vivir así, que bueno, con ganas de trabajar! Que bueno, que bueno es vivir la vida Echando pa’lante y nunca pa’tras ¡Compay, hay que echar pa’lante!

A las doce aprieta el hambre. Busco almuerzo en la guagüita. Pa’l frente voy en la fila con los demás, y nunca pa’ atrás. Si me da sueño como a las tres, yo lo espanto con café. Y si se pone dura la cosa respiro hondo y rompo a cantar: A la la, a la la, a la la lara la lara. Y a la hora de la salida, lo recuerdo como ayer, el sermón de mi viejita diciendo “mi’jo hay que laborar. De cabeza y nunca pa’ atrás.” Si me estanco en el tapón, lo convierto en vacilón. Aprovecho la ocasión: un momentito pa’relajar. A la larara la la la. Me acuesto a dormir con sueños, y mi motor pongo a descansar, listo pa’ arrancar mañana nunca pa’ atrás, pa’ atrás.

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