Entre o público e o privado: a génese do arquivo do Conde da Barca (1754-1817). Dissertação de Mestrado em História Moderna e Contemporânea (2007)

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UNIVERSIDADE DO MINHO INSTITUTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS

ABEL LEANDRO FREITAS RODRIGUES

ENTRE O PÚBLICO E O PRIVADO: A GÉNESE DO ARQUIVO DO CONDE DA BARCA (1754-1817)

Dissertação de Mestrado em História das Instituições e Cultura Moderna e Contemporânea

Trabalho realizado sob a orientação do Professor Doutor Armando Malheiro da Silva

Outubro de 2007

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AGRADECIMENTOS Um trabalho desta natureza corresponde a uma etapa marcante no percurso científico e humano do seu autor. Como tal, seria injusto não referir as pessoas que, com a sua generosidade, contribuíram para a prossecução de um objectivo que significa, simultaneamente, o fim de uma fase e a abertura de um novo ciclo. Seja-me permitido, antes de mais, invocar a Senhora Dra. Maria da Assunção Jácome de Vasconcelos e Chaves, Directora do Arquivo Distrital de Braga, recentemente perecida, com quem discuti vários pontos deste trabalho, retirando daí inegáveis proveitos, bem como constantes testemunhos de uma amizade de que ficarei eternamente devedor. Ao corpo docente do Mestrado em História das Instituições e Cultura Moderna e Contemporânea da Universidade do Minho agradeço, na pessoa do Exmo. Senhor Professor Doutor José Viriato Capela, a disponibilidade e os estímulos recebidos. À Senhora Dra. Isabel Fevereiro, Directora do Arquivo Histórico dos Negócios Estrangeiros, pelos esclarecimentos sobre a carreira diplomática de António de Araújo, tal como ao Professor Doutor José Nuno Oliveira pelas valiosas informações sobre o Dr. Manuel José de Oliveira. Ao Dr. Henrique Barreto Nunes, Director do Arquivo Distrital e da Biblioteca Pública de Braga, pelo incentivo constante e amigo, bem como aos funcionários de ambas as instituições pela profícua convivência ao longo destes anos. Ao Senhor Dr. Duarte Chaves, às Senhoras Professora Elfrida Ralha e Dra. Eucária Martins Vieira, por uma amizade que dificilmente pode ser exprimível por palavras. Ao Professor Francisco Mendes por ter lido, em tempo recorde, a versão final deste texto, mas ainda a tempo de deixar uma marca indelével nesta etapa da minha vida. Às Senhoras Professoras Fátima Moura Ferreira, Marta Lobo de Araújo e Maria Augusta de Lima Cruz pelo encorajamento permanente e amigo.

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Ao Ricardo Santos pela disponibilidade e pela amizade dedicada. Aos meus pais por serem uma fonte inesgotável de apoio e à Sandra que trocou a minha ausência por incentivos constantes. Propositadamente para o fim, fica uma palavra de profundo apreço, admiração e reconhecimento ao Professor Doutor Armando Malheiro da Silva, orientador desta tese, pela disponibilidade e incentivo, pela paciente colaboração e generosidade, pela cumplicidade e amizade. Sem o seu exemplo contagiante, este trabalho não veria a luz do dia.

Abel Rodrigues Outubro de 2007

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ENTRE O PÚBLICO E O PRIVADO: A GÉNESE DO ARQUIVO DO CONDE DA BARCA (1754-1817)

RESUMO

O presente trabalho incide sobre o arquivo do conde da Barca, também conhecido por “Fundo Barca-Oliveira”. António de Araújo de Azevedo, conde da Barca (1754-1817), senhor de formação iluminista, foi morgado e administrador de propriedades da família e desempenhou, simultaneamente, diversos cargos públicos como Diplomata, Ministro e Secretário de Estado, Conselheiro de Estado e Presidente da “Real Junta do Comércio”. Ao longo da sua vida, produziu, recolheu e acumulou vasta informação que se encontra cristalizada no seu arquivo, desprovida do seu contexto originário de produção. No intuito de fixar os diversos e, por vezes, concomitantes contextos genésicos, bem como para compreender a emergência e o estabelecimento dos fluxos informacionais, recorremos a um estudo interdisciplinar que convocou a História e a Arquivística, entendida como disciplina aplicada da Ciência da Informação. Na I parte, debruçamo-nos sobre a história custodial do arquivo, revelando o percurso do mesmo desde a morte do conde da Barca, ocorrida no Brasil, em 1817, até à sua entrada no Arquivo Distrital de Braga/ Universidade do Minho, em 1926. Na II parte, elaboramos uma sinopse crítica da bibliografia passiva do conde da Barca, a qual serve de antecâmara à análise e à sistematização de dois grandes grupos de documentos: os de índole privada, procedentes da administração da propriedade familiar; e os documentos de cariz oficial, produzidos durante o desempenho de cargos públicos.

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ENTRE O PÚBLICO E O PRIVADO: A GÉNESE DO ARQUIVO DO CONDE DA BARCA (1754-1817)

ABSTRACT

This thesis focuses on the count of Barca archive, also known as the “Fundo Barca-Oliveira”. António de Araújo de Azevedo, count of Barca (1754-1817), an illuminist formed gentleman, was heir and administrator of family properties and simultaneously carried out diverse public responsibilities, such as Diplomat, Minister, Secretary of State, State Counsellor and President of the “Real Junta do Comércio”. Throughout his life he produced, gathered and accumulated immense information which is found in a crystallized state in his archive, lacking it’s original production context. With the purpose of establishing the diverse and somewhat occasional concomitant contexts, as well as in order to comprehend the emergence and establishment of information fluxes, we resort to an interdisciplinary study that calls upon History and Archivistic, which is perceived as an applied discipline of Information Science. In part I we go over the archive’s custodial history, where we reveal it’s course since the death of the count of Barca, occurred in Brazil, in 1817, up to it’s entrance in the District Archive of Braga/University of Minho in 1926. In part II we elaborate a critical synopsis of the count of Barca’s passive bibliography, which works as an antechamber to the analysis and systematization of two great groups of documents: those of private nature, from the family property administration; and those of official nature, produced while carrying out public incumbencies.

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ÍNDICE INTRODUÇÃO -------------------------------------------------------------------------------------------------1 I PARTE – A SALVAGUARDA DA “MEMÓRIA” ---------------------------------------------------------- 7 Cap. 1 – A morte do conde da Barca e o retorno do seu arquivo à Casa de Sá ---------------------8 1. A acção de João António de Araújo de Azevedo no Brasil ---------------------------------------- 8 2. O retorno do arquivo à Casa de Sá ------------------------------------------------------------------- 11 Cap. 2 – Erudição e coleccionismo na viragem para o século XX: a “Livraria Oliveira”-------- 14 1. Dr. Manuel José de Oliveira, um homem no seu tempo: esboço biográfico ------------------- 14 2. A “Livraria Oliveira” e a produção historiográfica de um erudito -------------------------------22 Cap. 3 – No Arquivo Distrital e Biblioteca Pública de Braga: o “Fundo Barca-Oliveira”------- 27 1. A aquisição da “Livraria Oliveira” ------------------------------------------------------------------- 27 2. O empirismo arquivístico ----------------------------------------------------------------------------- 28 2.1. O contributo da Ciência da Informação ------------------------------------------------------------37

II PARTE – A GÉNESE DO ARQUIVO ---------------------------------------------------------------------- 46 Cap. 1 – António de Araújo de Azevedo, entre o elogio e a detracção. Sinopse crítica das abordagens biográficas ----------------------------------------------------------------------- 47 1. A origem do debate -------------------------------------------------------------------------------------48 1.1. Os periódicos portugueses em Inglaterra --------------------------------------------------------- 48 1.2. O “Elogio Histórico” e o recrudescimento da acusação ---------------------------------------- 57 1.3. A visão do memorialismo --------------------------------------------------------------------------- 63 2. A historiografia erudito-metódica -------------------------------------------------------------------- 65 2.1. Os estudos histórico-biográficos ------------------------------------------------------------------- 66 2.3. As abordagens parcelares --------------------------------------------------------------------------- 75 2.3.1. O Letrado e a livraria ------------------------------------------------------------------------------ 75 2.3.2. A epistolografia ------------------------------------------------------------------------------------ 82 2.3. A historiografia científica --------------------------------------------------------------------------- 88 Cap. 2 – Morgado e Administrador de Propriedades (1783-1817) --------------------------------- 94

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1. O nascimento ------------------------------------------------------------------------------------------- 94 2. A educação: entre a tutoria e a Universidade ------------------------------------------------------- 94 3. As primeiras actividades sociais --------------------------------------------------------------------- 98 4. A administração do vínculo de Sá ------------------------------------------------------------------ 102 4.1. A administração da comenda de São Pedro do Sul, na Ordem de Cristo ------------------- 117 4.2. A doação de Tomás Vicente Cabeças de Sousa ------------------------------------------------ 123 4.3. A reforma do cartório da Casa de Sá ------------------------------------------------------------- 127 4.3.1. O labor arquivístico em Sá ---------------------------------------------------------------------- 128 4.3.2. O cartório como memória da família ---------------------------------------------------------- 138 5. A propriedade no Brasil ------------------------------------------------------------------------------ 164 5.1. Senhor do Engenho --------------------------------------------------------------------------------- 165 5.2. A fazenda do Porto da Estrela -------------------------------------------------------------------- 172 5.3. A chácara do Bom Retiro ------------------------------------------------------------------------- 172 5.4. Testamenteiro de Pombal ------------------------------------------------------------------------- 174 Cap. 3 – O Homem Público Ilustrado (1787-1817) ------------------------------------------------ 177 1. O diplomata ------------------------------------------------------------------------------------------ 177 1.1. Breve evolução da diplomacia portuguesa ----------------------------------------------------- 177 1.2. Enviado Extraordinário na Haia (1787-1802) -------------------------------------------------- 184 1.2.1. O exercício de funções e as competências ---------------------------------------------------- 184 1.2.2. A produção informacional ---------------------------------------------------------------------- 185 1.3. Ministro Plenipotenciário em Paris (1796-1798; 1801) --------------------------------------- 194 1.3.1. O exercício de funções e as competências ---------------------------------------------------- 194 1.3.2. A produção informacional ---------------------------------------------------------------------- 195 1.4. Ministro Plenipotenciário em São Petersburgo (1802-1803) --------------------------------- 212 1.4.1. O exercício de funções e as competências ---------------------------------------------------- 212 1.4.2. A produção informacional -----------------------------------------------------------------------212 2. O Ministro e Secretário de Estado ------------------------------------------------------------------ 214 2.1. A génese e a evolução das Secretarias de Estado ---------------------------------------------- 214 2.2. Ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra (1804-1808; 1815-1817) ----------------------------------------------------------------------------------- 220 2.2.1. A nomeação e as competências do SENEG -------------------------------------------------- 220 2.2.2. A produção informacional ---------------------------------------------------------------------- 223 2.3. Ministro e Secretário de Estado do Reino (1807-1808; 1817) ------------------------------- 239 2.3.1. O exercício de funções e as competências do Ministro ------------------------------------- 239 2.3.2. A produção informacional ---------------------------------------------------------------------- 241

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2. 4. Ministro e Secretário de Estado da Marinha e dos Domínios Ultramarinos (1814-1817) ------------------------------------------------------------------ 244 2.4.1. O exercício de funções e as competências do Ministro ------------------------------------- 244 2.4.2. A produção informacional ---------------------------------------------------------------------- 245 3. Presidente da Real Junta do Comércio (1807; 1817) -------------------------------------------- 250 3.1. A génese da Real Junta e as competências do Presidente ------------------------------------- 250 3.2. O exercício de funções ----------------------------------------------------------------------------- 251 3.3. A produção informacional ------------------------------------------------------------------------- 251 4. O Conselheiro de Estado (1807-1817) ------------------------------------------------------------- 253 4.1. Origens e evolução do Conselho de Estado ----------------------------------------------------- 253 4.2. O estatuto do Conselheiro de Estado ------------------------------------------------------------- 257 4.3. A composição do Conselho de Estado e o exercício de funções ----------------------------- 260 4.4. A produção informacional ------------------------------------------------------------------------- 261 CONCLUSÃO ---------------------------------------------------------------------------------------------- 271 FONTES E BIBLIOGRAFIA ------------------------------------------------------ -------------------------- 274 ANEXOS --------------------------------------------------------------------------------------------------- 291

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ÍNDICE DE QUADROS E TABELAS Tabela 1 - “Fundo Barca-Oliveira” – Distribuição física dos documentos ----------------------- 33 Tabela 2 - Análise da metodologia aplicada por Frei Francisco de São Luís -------------------- 136 Quadro 1 – Fluxograma do Sistema de Informação Família Araújo de Azevedo ---------------- 42 Quadro 2 – Administração da comenda de São Pedro do Sul, na Ordem de Cristo (1809-1817) --------------------------------------------------------------------- 122 Quadro 3 - Esquema genealógico dos Pereiras Pintos de Bertiandos ----------------------------- 150 Quadro 4 - Esquema genealógico dos Araújos de Azevedo --------------------------------------- 160 Quadro 5 - Administração da fazenda da Ponte do Gentio (1813-1817) ------------------------- 171 Quadro 6 - Administração da fazenda do Porto da Estrela (1815) -------------------------------- 173 Quadro 7 - Enviado Extraordinário na Haia (1789-1802). Comunicações a montante e na horizontal -------------------------------------------------------------------------------- 187 Quadro 8 - Enviado Extraordinário na Haia (1789-1802). Comunicações a jusante ----------- 191 Quadro 9 - Ministro Plenipotenciário em Paris (1796-1798). Comunicações a montante------197 Quadro 10 - Ministro Plenipotenciário em Paris (1796-1798). Comunicações horizontais --- 201 Quadro 11 - Ministro Plenipotenciário em Paris (1796-1798). Comunicações a jusante -------208 Quadro 12- Ministro Plenipotenciário em Paris (1801). Comunicações a montante ----------- 209 Quadro 13 - Ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra (1804-1807). Comunicações a montante -------------------------------------------- 224 Quadro 14 - Gabinete Ministerial (1804-1808). Comunicações a montante e na horizontal -- 227 Quadro 15 - Ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra (1804-1808). Os Negócios Estrangeiros--------------------------------------------- 232 Quadro 16 - Ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra (1804-1808). O expediente da Guerra ----------------------------------------------- 236 Quadro 17 - Ministro e Secretário de Estado do Reino (1807). Comunicações a montante e na horizontal -------------------------------------------------------------------------------- 242 Quadro 18 - Ministro e Secretário de Estado da Marinha e dos Domínios Ultramarinos (1814-1817) ---------------------------------------------------------------------------------- 246 Quadro 19 – Processo de consulta do conselheiro de Estado (1807-1817) ---------------------- 262

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ABREVIATURAS UTILIZADAS

ADB/UM – Arquivo Distrital de Braga/Universidade do Minho ANRJ – Arquivo Nacional do Rio de Janeiro BNRJ – Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro BPB/UM – Biblioteca Pública de Braga/ Universidade do Minho CR – Correspondência Recebida DOC – Documento DOCS – Documentos EEH – Enviado Extraordinário na Haia HL – Homem de Letras IANTT – Instituto dos Arquivos Nacionais/ Torre do Tombo ISAD(G) – General International Standard Archival Description MAP – Morgado e Administrador de Propriedades MPP – Ministro Plenipotenciário em Paris MPSP – Ministro Plenipotenciário em São Petersburgo MS – Manuscrito MSS - Manuscritos SC – Secção SEMDU – Secretário de Estado da Marinha e dos Domínios Ultramarinos SENEG – Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra SER – Secretário de Estado do Reino SIFAA – Sistema de informação Família Araújo de Azevedo SR – Série SSC – Subsecção SSR – Subsérie SUBSI – Subsistema

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INTRODUÇÃO 1. A ESCOLHA E A DELIMITAÇÃO DO TEMA António de Araújo de Azevedo, 1.º conde da Barca (1754-1817), foi um personagem polémico no dealbar do século XIX, em virtude do desempenho de cargos públicos como diplomata, Ministro e Conselheiro de Estado. Nascido em Ponte de Lima, a 21 de Maio de 1754, cedo ingressou na vida pública. Em 1779, foi nomeado para Presidente efectivo da Sociedade Económica dos Amigos do Bem Público da sua terra natal, e, oito anos depois, entrou no mundo da diplomacia, passando sucessivamente pela Haia, Paris e São Petersburgo. Com partida de Lisboa no ano da Revolução Francesa, António de Araújo percorreu toda a Europa, durante os quinze anos epigonais, absorvendo os ditames do Enlightment, das Lumiéres e do Aüfklarung, por esta ordem. Em 1804, regressa ao reino revestido de uma aura de prestígio, mas também de alguma polémica, sobretudo, pela negociação do tratado de paz de 10 de Agosto de 1797 com a França do Directório. A partir de 6 de Junho desse ano passa a desempenhar o cargo de Ministro dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, num exercício custoso e sufocante, tal como a situação de um reino comprometido com a sua própria ideia de neutralidade, tentando manter, pela via diplomática, uma relação equidistante com a França e com a Grã-Bretanha. O futuro conde da Barca foi, por isso, um dos protagonistas da luta pela manutenção da coroa na Casa de Bragança, deixando o seu nome registado na preparação do acontecimento mais simbólico da crise do Antigo Regime: a partida da Corte para o Brasil. Nos primeiros tempos no Rio de Janeiro, manteve-se arredado do Ministério, conservando apenas a condição de Conselheiro de Estado, à qual tinha sido elevado em Fevereiro de 1807. Dedicou-se, então, com maior afinco aos estudos científicos e culturais, demonstrando um espírito verdadeiramente empreendedor e multifacetado. Em 1814, foi chamado novamente para o Ministério, desta feita, para a Marinha e Domínios Ultramarinos e, nessa condição, veio a assinar o decreto de elevação do Brasil a Reino Unido ao de Portugal e dos Algarves e a sancionar a expansão para o Rio da Prata. Três anos depois, foi nomeado interinamente para as restantes secretarias de Estado, tendo vindo a sucumbir no desempenho dessas funções. -1-

O processo de construção do conhecimento histórico do personagem e, porque não dizê-lo, da sua mitificação, iniciou-se através da historiografia liberal, essencialmente legitimadora de um tempo presente, que colocou em confronto dois paradigmas políticos. Na verdade, alguns desses plumitivos tinham sido espectadores ou, até mesmo, participantes nos acontecimentos passados e estavam, por isso, conscientes dos intensos debates que se registaram entre as camarilhãs cortesãs, a que deram eco os periódicos portugueses, nomeadamente os da primeira vaga de emigração liberal em Londres. As brechas que então se abriram, foram reavivadas por uma historiografia erudito-metódica que, com a sua predilecção pela história da diplomacia e pela história militar, contribuiu para alimentar a polémica em torno do personagem, analisando-o à luz do eterno confronto entre anglófilos e francófilos, reduzindo todos os outros aspectos a meros adereços dos “factos” históricos. Na verdade, a análise crítica dos estudos sobre o conde da Barca revela um certa lógica auto-referencial, em que se assiste à problematização dos mesmos “factos”, e consequentemente, à repetição de fontes, tanto manuscritas como impressas, provocando assim um certo estatismo que se revela na ausência de variações significativas na narrativa. Só mais recentemente é que se assistiu a uma, ainda incipiente, abertura patrocinada pela historiografia científica que permitiu analisar de forma depurada as vivências de António de Araújo. Como se depreende, a nossa ideia inicial foi, efectivamente, uma tentativa de empreender uma abordagem biográfica. Todavia, um motivo bastou para nos afastarmos desse intento. A certeza de que o nosso objectivo não seria concretizável sem uma reapreciação rigorosa e indutiva dos documentos constantes no seu arquivo depositado no Arquivo Distrital de Braga/ Universidade do Minho, sob pena de se obter resultados redundantes. Se o protagonismo de António de Araújo é inegável nos acontecimentos políticos ocorridos no última caminhada do Antigo Regime, também não é menos verdade que, antes de se querer esboçar os quadros pontuais da sua vida, deve-se entender que o actor social reuniu duas características que estão intrínseca e permanentemente ligadas aos seus percursos: Morgado e iluminista. Querer estudar António de Araújo de Azevedo desprovido destas duas características é, efectivamente, não querer compreender a sua realidade. -2-

Foi, portanto, sob proposta do Professor Doutor Armando Malheiro da Silva que este trabalho derivou de uma abordagem ao “produtor da fonte” para uma análise empírica da “fonte” tentando, com isto, reinterpretar e sistematizar os percursos e a interacção com o contexto envolvente do Morgado, do Político e do Ilustrado. Lançadas estas bases, poder-se-á, então, partir para um estudo histórico-biográfico aprofundado, que possa revelar as múltiplas vivências públicas e privadas de António de Araújo, que demonstre a sua mundividência, a sua essência, e que contextualize as suas práticas e o seu correcto posicionamento numa conjuntura específica. Mas, dois outros grupos de motivações estiveram na base da opção seguida. O primeiro resultou do trabalho de catalogação do arquivo do conde da Barca, durante o qual fomos observando, para além da riqueza informativa dos documentos, as dinâmicas subjacentes à produção, recolha, recuperação e transmissão da informação social registada no suporte documental. Este aspecto está, também, relacionado com o nosso interesse em ensaiar uma abordagem metodológica inovadora, eminentemente empírica, que contrasta com um paradigma arquivístico essencialmente descritivo. O objectivo final daquela catalogação passa por erguer a estrutura interna do acervo, baseada num critério orgânico-funcional, normalizar a descrição documental e dotar, um e outro, de uma coerência capaz de os tornar acessíveis ao utilizador sob a forma de um catálogo definitivo. Como veremos, esta tese é também um produto dessa gestão informacional que definiu, desde o início, o arquivo como fonte e como objecto de estudo. O segundo grupo de motivações prende-se com o nosso interesse no período histórico referente aos reinados de D. Maria I e de D. João, ou do Absolutismo Reformista, se se pretender atribuir-lhe um conceito eminentemente político. E dentro dessa conjuntura devemos salientar alguns acontecimentos como a partida da corte para o Brasil e o seu impacto dos dois lados do Atlântico e, ainda, as Invasões Francesas, os quais foram estudados de forma modelar por Jorge Borges de Macedo, António Pedro Vicente e Valentim Alexandre. Por outro lado, também os estudos publicados em França por Michel Vovelle e Roger Chartier, na área da História da Cultura, e em Portugal por José Sebastião da Silva Dias e Ana Cristina Bartolomeu de Araújo, no âmbito de História das Ideias e das Mentalidades, contribuíram, decisivamente, para o nosso interesse na temática do Iluminismo, numa perspectiva de tentar compreender a filosofia racionalista através do estudo das realidades vividas. -3-

2. O PONTO DE PARTIDA: A ESTRUTURAÇÃO SISTÉMICA DO ARQUIVO O campo de observação empírica foi o arquivo do conde da Barca, também conhecido por “Fundo Barca-Oliveira”, fonte privilegiada para os estudos sobre o personagem, mas também para a compreensão do crepúsculo do Antigo Regime, nas suas vertentes política, social, económica, militar e cultural. Trata-se, sem dúvida, de um excelente campo de observação das dinâmicas pessoais e institucionais adoptadas no tempo em questão. O acervo apresentava algumas deficiências técnicas na estruturação e descrição da documentação, decorrentes da aplicação de vários paradigmas arquivísticos, desde 1926 data da incorporação do mesmo no Arquivo Distrital de Braga/ Universidade do Minho sem que, contudo, existisse um instrumento de acesso à informação. Neste sentido, a manutenção do modelo de descrição arquivística existente provocaria, não só neste trabalho, como em outros que viessem a surgir, características muito similares às que constam em abordagens já publicadas, ao veicular noções e factos tão redundantes como descontextualizados, como já foi referido. O nosso intuito passou por abordar a fonte e não o “produtor da fonte”, delimitando o campo de observação empírica, como objecto de uma lógica própria. Num primeiro momento, tornou-se necessário reconstituir a sua história custodial para se compreender a emergência e os conceitos subjacentes à designação de “Fundo Barca-Oliveira”, tentando compreender, ao mesmo tempo, o uso e a interpretação dos documentos pelos investigadores. Depois, foi necessário lançar as bases da sistematização do conjunto documental, numa tentativa de preparar o arquivo para a História. Evidentemente, que num campo de observação empírica como o nosso, em que as séries documentais se encontravam constituídas de forma artificial e inorgânicas, foi necessário analisar e descrever documento a documento e, mantendo a sua ordenação física, restituir cada um deles ao seu contexto originário de produção, proporcionando assim o surgimento de documentos compostos, processos, séries, subsecções e secções. Neste sentido, deslocamos a análise do valor secundário dos documentos – meramente informativo – para o valor primário dos mesmos, procurando compreender as motivações que estiveram na base da produção daquela informação e os mecanismos que permitiram a emergência dos fluxos informacionais. No fundo trata-se de analisar a génese, a transmissão e a recuperação da informação, deixando de lado a -4-

problematização do facto histórico, ou seja, os efeitos dessa informação no próprio tempo em que foi produzida. No entanto, é certo que, num universo de mais de 7400 documentos, o desenvolvimento do projecto encontrou resistências face à ordenação da documentação e às múltiplas vivências do seu principal produtor, marcadas pelo desempenho de diversos cargos públicos num tempo de crise, de reformas e revoluções. Da vasta informação existente, seleccionamos e colocamos em confrontos dois grandes grupos de documentos produzidos em simultâneo: os provenientes da administração do morgadio e de outras propriedades; e os decorrentes do desempenho de cargos públicos, através dos pretendemos identificar o posicionamento de António de Araújo e as suas competências. Como tal, o nosso estudo é o resultado de uma interdisciplinaridade que convoca a História, nas suas dimensões de História das Elites, como sugere Nuno Gonçalo Monteiro1, e de História das Instituições, na linha de António Manuel Hespanha2 e de José Subtil3, e, ainda, a Arquivística entendida como um ramo teórico-prático da Ciência da Informação, tal como defende Armando Malheiro da Silva4. Aliás, a Ciência da Informação foi o cerne deste estudo, conforme se poderá comprovar pela utilização de terminologia específica e pela aplicação de princípios e conceitos arquivísticos, nomeadamente na normalização da descrição e da organização de documentos. Neste sentido, optamos por dividir a narrativa em duas partes. A I parte diz respeito à história custodial do arquivo e relata o processo de salvaguarda da memória empreendida no Rio de Janeiro, logo em 1817, ano da morte de António de Araújo, até ao momento da sua incorporação no Arquivo Distrital de Braga/ Universidade do Minho, a qual marcou o início de sucessivas intervenções arquivísticas tendo em vista a obtenção de um instrumento de acesso. A II parte inicia-se com uma sinopse crítica da bibliografia passiva de António de Araújo, a qual serve de antecâmara à análise da produção informacional do Morgado e Administrador de Propriedades e do Homem Público Ilustrado.

1 Ver: MONTEIRO, Nuno Gonçalo – O crepúsculo dos Grandes. A Casa e o património da aristocracia em Portugal (1750-1832), 2.ª edição revista, Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 2003. 2 Ver: HESPANHA, António Manuel – As vésperas do Leviathan. Instituições e poder político. Portugal – séc. XVII, Coimbra: Livraria Almedina, 1994. 3 Ver: SUBTIL, José Manuel Louzada Lopes – O Desembargo do Paço (1750-1833), Lisboa: Universidade Autónoma de Lisboa, 1996. 4 Ver: SILVA, Armando Malheiro da, [et alli] – Arquivística 1; Teoria e prática de uma Ciência da Informação, Porto: Afrontamento, 1999.

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3. OBJECTIVO O objectivo principal foi o de procurar contribuir para uma representação alternativa do arquivo do conde da Barca, através da colocação de interrogações aos artefactos deixados por António de Araújo, fixando, assim, os diversos e, por vezes, concomitantes contextos, ou se se preferir a “superfície” social, que favoreceu a génese da produção da informação.

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I PARTE A SALVAGUARDA DA “MEMÓRIA”

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CAP. 1 – A MORTE DO CONDE DA BARCA E O RETORNO DO SEU ARQUIVO À CASA DE SÁ 1. A ACÇÃO DE JOÃO ANTÓNIO DE ARAÚJO DE AZEVEDO NO BRASIL A 21 de Junho de 18175, faleceu na chácara do Bom Retiro, no Rio de Janeiro, António de Araújo de Azevedo, conde da Barca, senhor da Casa de Sá, em Ponte de Lima, Conselheiro de Estado, Ministro da Marinha e dos Domínios Ultramarinos e Ministro interino das restantes Secretarias de Estado. Três dias antes, tinha declarado as suas últimas vontades num testamento (ver Anexo I), muito sucinto, realizado em três meias folhas, no qual nomeou para seus testamenteiros com livre e geral administração de todos os bens o conselheiro José Egídio Álvares de Almeida, secretário particular de D. João VI, e o desembargador José Duarte da Silva Negrão Coelho, pois ambos tinham dado prova de verdadeiros amigos no decurso de muitos annos 6. Por se ter conservado sempre no estado de solteiro, António de Araújo não tinha herdeiros forçados e, como tal, instituiu herdeiro universal o seu irmão João António de Araújo de Azevedo, conselheiro da Fazenda, que, no momento, se encontrava no Brasil. No testamento consignou-lhe o direito de imediatamente requerer a El Rey Nosso Senhor qualquer remuneraçam que seja servido em razão dos cerca de trinta anos de serviços prestados à Coroa. João António7 tinha viajado para o Rio de Janeiro, em 1815, provavelmente a pedido de seu irmão, que nesse ano tinha visto o seu estado de saúde agravar-se8, depois do ataque de Maio de 1814, ou, então, com o propósito de fazer acelerar o deferimento

5 Ver: AFONSO, Domingos de Araújo, VALDEZ, Ruy Dique Travassos - Livro de Oiro da Nobreza, Braga: «Pax», 1932, vol. 1, p. 230. No dia 22 de Junho foi sepultado na Ordem Terceira. Veio conduzido no coche Real, vestido a cavalheiro e foi encomendado e recomendado pela Capela Real e recomendado pelo Padre Comissário e por vinte sacerdotes. Em 1850, foi trasladado para o cemitério de S. Francisco de Paula, em Catumbi. V. Certidão da inumação do conde da Barca, “Livro n.º 1 – Termo de sepultura de fiéis”, p. 78 apud MACHADO, Alberto de Sousa – “Para a história das invasões francesas”, in: Arquivo do Alto Minho, 6.º volume, Tomo I, Viana, 1956, p. 109. 6 Ver: Cópia do traslado existente às folhas 30-verso a 36 dos autos de incorporação dos Próprios e Nacionais da casa sita na rua do Passeio e que fora do Excelentíssimo Conde da Barca, de 17.08.1825. BNRJ-Secção Manuscritos-cód. II-35,05,005. 7 João António de Araújo de Azevedo (1764-1823), fidalgo da Casa Real e cavaleiro da Ordem de Cristo. Formou-se em Cânones na Universidade de Coimbra, tendo sido, sucessivamente, juiz de fora da vila de Viana do Castelo, provedor da comarca de Coimbra, desembargador efectivo da Relação do Porto e, finalmente, conselheiro da Fazenda. Ver: RODRIGUES, Abel - “Sistema de Informação Família Araújo de Azevedo. Estudo orgânico-funcional aplicado ao Cartório da Casa de Sá”, Actas do I Congresso Internacional da Casa Nobre: Um Património para o futuro, Município de Arcos de Valdevez, 2007, pp. 107-109. 8 Luís Joaquim dos Santos Marrocos, numa carta datada de 1815, referia-se ao conde da Barca como estando sacramentado e informava que “A sua moléstia é antiga, e está muito agravada; dizem ser moléstia das entranhas; eu não vejo nele senão inchação e tremulência; e S. A. R. disse a minha vista que ele já não podia assinar …”, apud LIMA, Oliveira – D. João VI no Brasil, 3.ª edição, Rio de Janeiro: Topbooks, p. 536, nota 724.

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de alguma súplica pendente na Corte9. Independentemente das razões que motivaram esta viagem, o papel do conselheiro viria a ser crucial na salvaguarda da “memória” do conde da Barca, ou seja, do seu arquivo e da sua livraria particular. Como a maioria dos homens de Estado portugueses do seu tempo, o conde da Barca morreu quasi pobre, deixando como bens principaes no Rio de Janeiro uma casa à Rua do Passeio, alguns bons quadros e sua livraria, duas vezes preciosa, por seu inestimavel valor litterário, e esses mesmos subjeitos a dívidas10. Logo em 1817, perante a pressão exercida por alguns credores, João António viu-se na necessidade de proceder ao inventário dos bens e dívidas herdadas no sentido de assegurar o futuro e o engrandecimento da Casa de Sá, que agora era sua. Vendida a Casa da Rua do Passeio, as suas atenções viraram-se para o arquivo, verdadeiro repositório das múltiplas e sucessivas actividades de Barca e, naturalmente, para a livraria. Assegurada a transferência da documentação de carácter oficial para os sucessores de Barca nas Secretarias de Estado, debruçou-se sobre os documentos “pessoais” que o irmão fora acumulando desde o ingresso na carreira diplomática em 1787. Conhecedor do valor probatório da informação que o arquivo encerrava e da sua influência para o futuro da Casa, optou pela sua conservação no seio da família. A sua primeira medida, ainda no Brasil, foi a de compulsar toda a documentação, e muito particularmente a correspondência recebida, com o intuito de proceder a um recenseamento dos bens adquiridos e/ou vendidos, de obter um conhecimento factual dos serviços prestados que fossem passíveis de remuneração régia e ainda das possíveis dívidas deixadas por Barca, como de facto veio a acontecer. É frequente encontrarem-se nos documentos de carácter pessoal, como cartas e outros pequenos apontamentos, várias anotações suas, nas margens, sobre os autores e o teor do próprio documento. Deste procedimento terá resultado o conhecimento de que Barca deixara uma pesada dívida no valor de 105.472$917 réis e, como tal, a certeza de que era imperioso recorrer à munificência régia para obter alguns rendimentos. Provavelmente em 1819, João António dirigiu um requerimento a D. João VI (ver Anexo II), no qual narra os serviços prestados pelo irmão ao longo de quase trinta 9 Durante a permanência da Corte no Brasil, o deferimento das súplicas submetidas à regência do reino em Lisboa só ocorria após um longo processo que incluía o envio do requerimento à competente Secretaria de Estado no Rio de Janeiro, onde eram objecto de consulta e só depois subia à presença do Soberano para que este assinasse. Neste processo, que podia demorar meses, não havia garantias de que o resultado fosse positivo. Esta situação era transversal a todos os quadrantes da sociedade portuguesa e tinha até resultados nefastos na própria administração do Estado. Veja-se, a título de exemplo, os obstáculos colocados pela Regência do reino ao Marechal Beresford, quando tentou empreender uma reorganização do exército e que o levou a embarcar, em 1815, para o Rio de Janeiro com o intuito de expor pessoalmente os seus propósitos ao Príncipe Regente. Ver: MARQUES, Fernando Pereira – Exército e Sociedade em Portugal no declínio do Antigo Regime e advento do Liberalismo, Lisboa: Alfa, 1989, p. 130. 10 Ver: BRUM, J. Z. Menezes – “Do Conde da Barca, de seus escriptos e livraria”, in: Annaes da Bibliotheca Nacional do Rio de Janeiro, vol. II, Fascículo n. 2, Rio de Janeiro: Typ. G. Leuzinger & Filhos, 1877, p. 359.

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anos, desde que fora nomeado Enviado Extraordinário na Haia até ao momento em que recaindo sobre ele [Barca] o expediente dos Negócios de todas as secretarias de Estado, sucumbio ao pezo da gravidade dos negócios e do trabalho. Apelando ao Soberano, que recentemente tinha dado provas da sua benevolência no despacho para a Casa Anadia, João António salientava que o conde deixou ao supplicante os seus serviços, para que pudesse requerer imediatamente qualquer remuneração, que V. Magestade fosse servido conferir ao supplicante, impondo-lhe o ónus de dar annualmente do útil dessa remuneração duzentos mil réis a cada huma das suas sinco Irmãas, durante a sua vida11.

Como tal, em 1820, João António recebia a mercê de uma vida na comenda de São Pedro do Sul12, o que, agora como vinte anos antes13, vinha enriquecer o património familiar. Verificou-se, assim, uma primeira recuperação e utilização objectiva daquela informação que foi sendo produzida pelo conde da Barca ao longo da sua vida, a qual proporcionou a celebração de um compromisso entre o passado (os serviços prestados por um membro da família) e o futuro (a subsistência da Casa). Por outro lado, perante as dificuldades óbvias do herdeiro, a livraria particular de Barca, valiosa pelo seu valor informativo, não podia trazer nenhuma mais valia à causa a não ser pelo valor a ser arrecadado através da sua alienação. Desse vasto conjunto de livros, composto por mais de 7000 volumes, o conselheiro João António optou por conservar cerca de 400 (ver Anexo III), tendo providenciado, logo de seguida, a catalogação dos restantes que seriam levados a leilão, em 1819, pelo valor de 16.818$30014. Perante o seu inquestionável valor, D. João VI ordenou ao Padre Joaquim Dâmaso, bibliotecário da Biblioteca Régia da Corte do Rio de Janeiro15, que se apresentasse no local e que arrematasse a livraria num único lote. Assim, a admirável livraria que António de Araújo de Azevedo foi compondo pacientemente, desde o seu ingresso na carreira diplomática, era agora incorporada na

11 Ver: [Requerimento do] Conselheiro João António de Araújo Azevedo - pedido dos serviços de seu falecido irmão, o Conde da Barca, historiando todos os serviços prestados desde que o mesmo entrou para a carreira diplomática em 1787. BNRJ – Secção de Manuscritos,”Coleção Biográfica”, C-521,18. 12 Ver: Alvará de mercê de uma vida na Comenda de S. Pedro do Sul da Ordem de Cristo dado a João António de Araújo de Azevedo, em 16 de Março de 1820. IANTT-Registo Geral de Mercês/07/167715. 13 António de Araújo de Azevedo tinha recebido o alvará da Comenda de São Pedro do Sul na Ordem de Cristo, a 26 de Maio de 1800, em remuneração dos serviços prestados na negociação do Tratado de Paz de 10 de Agosto de 1797. Ver: IANTT-Registo Geral de Mercês/06/91959. Mais tarde, em 1810, foi elevado a Grã-cruz da Ordem de Cristo. 14 Ver: BRUM, J. Z. Menezes– ob. cit., p. 361. 15 Ver: ID., p. 361.

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Real Biblioteca Pública do Rio de Janeiro que via, assim, o seu núcleo inicial substancialmente enriquecido. 2. O RETORNO DO ARQUIVO À CASA DE SÁ Tratados que estavam os bens do conde no Brasil, João António empreendeu, por volta de 1822, o regresso a Portugal e à Casa de Sá, em Ponte de Lima. Consigo trouxe o arquivo de Barca, composto por cerca de seis mil documentos, que seria assim incorporado na Casa e reunido aos “papéis” dos seus Maiores ou, se se preferir, ao cartório que António de Araújo tinha, muito pragmaticamente, mandado ordenar na primeira década do século, conforme veremos. Por outro lado, a selecção de obras impressas e manuscritas que vieram do Brasil, e que versavam temáticas variadas como a Jurisprudência, a Literatura, a Geografia, as Ciências, entre outras, passaria, doravante, a constituir a livraria particular de João António e, assim, a livraria da Casa de Sá. Pouco tempo depois da sua chegada a Portugal, mais precisamente a 16 de Junho de 1823, João António faleceu e a sucessão na Casa recaíu em seu sobrinho António de Araújo de Azevedo Pereira Pinto, filho do brigadeiro Francisco António, governador dos Açores, e de sua mulher Francisca Antónia Pereira Caldas de Sá Sotomaior. Como contava apenas 14 anos era necessário assegurar o processo de transição nas propriedades familiares. A escolha deveria recair, como era normal, entre os irmãos de João António. Contudo, Francisco António tinha sido assassinado, em 1821, na contrarevolução absolutista em Angra do Heroísmo16 e António Fernando, abade de Lóbrigos, que, desde sempre, tinha colaborado na administração da Casa do conde da Barca, tinha perecido em 14 de Abril de 1823. Restavam, apenas, as irmãs Clara Vitória e Antónia Luísa. A primeira, Clara Vitória, chamou a si a condição de “cabeça de casal e língua de inventário” de João António, e procedeu não só ao inventário dos bens, como também protagonizou diversos actos de gestão como o arrendamento de propriedades, a cobrança de dívidas de caseiros, e requereu, ainda, no Juízo e Cartório das Habilitações do Reino, a habilitação do sobrinho à herança do brigadeiro. Todavia, tendo Clara Vitória falecido em 1827, D. Antónia Luísa, abadessa no convento de São Bento de 16 Ver: MAYA, Francisco d’Athayde Machado Faria e – Subsídios para a história de S. Miguel e Terceira: Capitães-generais. 1766-1831., 2.ª ed., Açores: Instituto Cultural de Ponta Delgada, 1988, pp. 216-217.

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Viana, chamou a si a gestão provisória da Casa e procedeu ao pagamento de parte da dívida do conselheiro João António, tratando também da habilitação do sobrinho ao hábito de Cristo e do encarte da comenda. Durante a década de 30, entrava, finalmente, na posse da Casa de Sá, António de Araújo de Azevedo Pereira Pinto, tenente-coronel de Cavalaria, moço fidalgo da Casa Real17, que manteve unida a totalidade dos bens de família, impedindo, assim, a sua fragmentação mesmo depois da extinção definitiva dos institutos vinculares por decreto de 19 de Maio de 1863, numa prática que foi seguida, depois do seu perecimento, pela esposa D. Ana Maria dos Prazeres Calheiros Magalhães Barreto Amorim18. Ao manter a propriedade una e indivisa e destinada a ser transmitida de geração em geração, também os documentos deviam ser inalienáveis dada a sua condição de verdadeiro repositório das actividades estruturais da família, possuindo, como tal, um valor probatório para a posse dos bens materiais. Assim se compreende as razões pelas quais o arquivo da Casa de Sá se mantinha activo e acumulava os “papéis” de vários membros da família desde o século XV até ao século XIX, com destaque, naturalmente, em função da extensa documentação acumulada, para os arquivos do conde da Barca e de João António. Em 29 de Julho de 1879, quatro anos após o falecimento de D. Ana Maria dos Prazeres, reuniram-se os seus herdeiros para efectuar a partilha amigável dos bens de família e, de acordo com a escritura, estando hoje melhor informados estão convencidos que com effeito não tem a natureza de vinculo os bens que composeram a meação da mãe e que, por esse motivo, eram de natureza livre e alludial19. Coube à filha segunda Marquesa Margarida de Araújo de Azevedo e a seu marido José Mimoso de Barros e Alpoim20 ficarem na posse da Casa de Sá, onde se encontravam outros bens como uns livros que foram avaliados em 250 mil réis21, e naturalmente o arquivo da Casa.

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Ver: RODRIGUES, Abel - ob. cit., p. 112-113. Ana Maria dos Prazeres Calheiros Magalhães Barreto Amorim (1818-1875) filha de José Calheiros de Magalhães Barreto, senhor da Casa do Souto em São Miguel de Brandara e da do Matobom em Esturãos, e de sua mulher Maria Isabel de Araújo de Abreu Bacelar. Ver: RODRIGUES, Abel - ob. cit., p. 112-113. 19 Escritura de partilha que fazem as Exmas. D. Francisca Antónia de Araújo de Azevedo, Dona Amália de Araújo de Azevedo, solteiras e D. Margarida de Araújo de Azevedo e marido, da freguesia de Sá, com respeito à herança de sua mãe e sogra a Exma. D. Ana dos Prazeres Calheiro, em 21 de Julho de 1897 e também a Exma. D. Maria Filomena de Araújo de Azevedo, viúva da cidade do Porto. v. ADB/UM-SIFAA/SSC 10.01/ DOC. 4,126. 20 José Mimoso de Barros e Alpoim tinha sido magistrado no Ultramar. Depois do regresso a Ponte de Lima, granjeou grande prestígio, em virtude dos desempenhos dos cargos de juiz substituto e, ainda, de Presidente da Câmara e de Administrador do concelho. Era filho de Francisco da Costa Mimoso, da Casa da Avelenda em Arcos de Valdevez, e de Sebastiana Maria de Meneses de Barros Barbosa de Abreu Lima, Senhora da Casa da Carcaveira. v. RODRIGUES, Abel – ob. cit., p. 114. 21 Escritura de partilha que fazem as (…) em 21 de Julho de 1897 (…), fl. 14. v. ADB/UM-SIFAA/SSC 10.01/ DOC. 4,126 18

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José Mimoso, que entrara na posse da Casa de Sá pelo casamento, será o responsável pela doação do arquivo da Família Araújo de Azevedo, em 1908 ou 1909, ao médico e político Dr. Manuel de Oliveira, mas não sem antes seleccionar um conjunto de documentos, que hoje não podemos quantificar, e transferi-los para o arquivo da Casa da Carcaveira. O momento marcante do percurso deste conjunto documental ocorre por volta de 1908 ou 1909, altura em que o mesmo deixa de pertencer à sua entidade produtora, a família Araújo de Azevedo, para passar para as mãos de uma entidade estranha à produção da informação que ali estava encerrada. A circunstância marca, obviamente, uma transmutação na finalidade com que se passou a aceder àqueles documentos. Ora, a partilha de 1879 foi o acto final de um longo processo, com mais de quatrocentos anos, em que a família foi constituindo e estruturando um arquivo no sentido de legitimar os seus actos e de providenciar o engrandecimento da Casa. Doravante, o arquivo passava a deter um único interesse: o histórico. Neste sentido, importa lançar um olhar sobre o “contexto” de Manuel de Oliveira e tentar compreender quais os motivos que o levaram a receber o arquivo do conde da Barca, qual a utilização que lhe deu e como é que procedeu à integração deste conjunto documental na sua livraria particular.

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CAPÍTULO 2. ERUDIÇÃO E COLECCIONISMO NA VIRAGEM PARA O SÉCULO XX: A “LIVRARIA OLIVEIRA”. 1. DR. MANUEL JOSÉ DE OLIVEIRA, UM HOMEM NO SEU TEMPO (1877-1918): ESBOÇO BIOGRÁFICO

Manuel José de Oliveira nasceu a 23 de Março de 1877, no lugar da Ordem, em Marrancos, concelho de Vila Verde22 e era filho primogénito de Tomás José de Oliveira, emigrante enriquecido no Brasil, e de Maria Maximina de Oliveira. O pai, conhecido como o “brasileiro Thomaz”, era filho de lavradores artífices pertencentes a um ramo pobre de uma família de proprietários abastados, cuja fortuna começara em clérigo no século XVII23. As dificuldades da vida levaram-no a planear uma viagem para o Brasil e, para tal, solicitou auxílio monetário aos fidalgos da terra que, prontamente, o mandaram cavar as glebas. Apesar de ter sido repelido pela nobreza local, Tomás de Oliveira empreendeu a viagem, não sem antes prometer à família que regressaria em condições de vingar a ofensa. Estabeleceu-se, então, em Pernambuco onde fez fortuna e aplicou os proventos num carregamento de algodão que trouxe para Portugal onde veio a vender o produto com fartos lucros24. O “brasileiro Thomaz” instalou-se, então, na terra natal e aí conheceu Maria Maximina, exposta na roda de Ponte de Lima, que viria a ser sua criada, governanta e esposa e que, também, passaria a ser conhecida por “brasileira”. Conquistada a ambicionada riqueza, a breve trecho seria também grande proprietário rural pois viria a adquirir as casas, as bouças e as terras dos Freires, dos Correias de Sá e de outras famílias nobres locais. Mais tarde, desempenharia o cargo de vereador municipal em Vila Verde e alcançaria o epíteto de benemérito ao mandar compor a casa de seus pais para fundar a escola primária25. Tomás José de Oliveira morreu em 1889, deixando aos quatro filhos avultado pecúlio, que sua mãe iletrada bem governou, aconselhada pelos esclarecidos tutores, indicados pelo marido26. O primogénito, Manuel José de Oliveira, estava destinado a seguir os estudos eclesiásticos conforme pretendia a mãe. Passou então a Braga, onde frequentou o Liceu 22

Agradecemos as informações gentilmente cedidas pelo Sr. Professor Doutor José Nuno de Oliveira. Ver: RAMOS, Luís de Oliveira – “Os descendentes do brasileiro Thomaz: uma família da burguesia minhota”, in: O Tripeiro, 7.ª série, 10 (4), Abril de 1993, p. 107. 24 Ver: IDEM. 25 Ver: IDEM. 26 Ver: IDEM, p. 108. 23

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Central num tempo em que a cidade fervilhava devido à crise social, política e económica sustentada por um regime monárquico abalado pelo “terramoto” originado com o Ultimatum inglês de 189027. Os vinte anos que medeiam o Ultimatum e a proclamação da República no 5 de Outubro correspondem, na verdade, aos anos de formação política e cívica de Manuel de Oliveira. Foi em Braga que Manuel de Oliveira aderiu aos ideais republicanos. Mais tarde, já no final da vida, diria que sem espírito de rebeldia […] seria impossível o progresso28, mantendo, assim, viva a ligação à matriz do ideário iluminista que fora apropriado pelo movimento republicano desde cedo. O convívio com alguns professores do liceu que professavam os ideais da república, como era o caso de José Joaquim Pereira Caldas, e o protagonismo que os estudantes detinham nas manifestações, podem explicar a sua adesão ao movimento. A sua condição de estudante vinha potenciar as emoções e favorecer a disponibilidade para empreender a luta em prol de uma sociedade democrática, igualitária e justa para todos os portugueses. Mas, Manuel de Oliveira atinge mesmo uma aura superior e de referência para os seus condiscípulos, quando dirige ao Arcebispo Primaz umas cartas críticas contra a Companhia de Jesus, que era então dominante no norte de Portugal. Cedo percebeu que o exercício do jornalismo constituía uma arma a favor da defesa dos seus ideais, nomeadamente contra o anticlericalismo e o ensino religioso nas escolas, mas também na luta a favor de uma educação para todos, entendida como factor primordial para promover um exercício colectivo da cidadania. Na cidade dos Arcebispos, foi redactor principal de jornais como A Alma Nova e A Pátria, órgão da Comissão Municipal republicana de Braga, em que se insurgiu contra uma peregrinação ao Sameiro e combateu a exploração dos operários reunidos, pela primeira vez, em comício na capital do Minho protestando contra a exploração clerical. Os seus desempenhos jornalísticos e propagandísticos valeram-lhe ataques cerrados dos jornais clericais de todo o país, em especial da Palavra que durante meses sucessivos o atacou29.

27 Ver: SOUSA, Amadeu José Campos de – Braga do entardecer da monarquia ao tempo da 1.ª República (1890-1926). Abordagem de História política, Braga: Edições Casa do Professor, 2004, pp. 61 e segs. 28 Ver: OLIVEIRA, Manuel de – “Pro veritate”, in: Almanaque Illustrado de O Commercio do Lima, coord. por António de Magalhães, Ponte de Lima: Tipografia Confiança, 1909, p. 258. 29 Ver: As Constituintes de 1911 e os seus deputados, Lisboa: Livraria Ferreira, 1911, p. 182

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Findos os estudos em Braga, ingressou na Escola Médico-Cirúrgica do Porto, provavelmente no ano de 1899 e aí prosseguiu imbuído de um espírito acirradamente republicano, pois não havia outro credo político na boca dos rapazes30. Ali, participou em debates informais sobre os problemas transcendentes da biologia31, base de uma construção intelectual e cultural, de uma mundividência própria do movimento que professavam e que se opunha ao providencialismo teológico e conservador vigente. O importante papel desempenhado pelo historicismo e pelo cientismo na construção do determinismo natural fundamentava um republicanismo interventivo que tinha como critério último a verdade, não de um saber de origem teológica ou metafísica, mas demonstrações tidas por científicas32. O conhecimento indutivo de origem científico-natural permitia obter uma credibilidade epistemológica necessária para legitimar um facto que era inevitável aos olhos dos estudantes: a implantação da República como uma necessidade científica33. Oliveira, que fazia parte de todas as organizações revolucionárias destinadas a derrubar a monarquia34, detinha um papel de liderança entre os jovens republicanos que lhe reconheciam um espírito reflectido e calmo, filósofo e letrado, um Taine de vinte anos ministrando conselhos e ideais com a prudência de um velho35. Para tal, contribuía igualmente a sua aparência física pois a sua cabeleira farta, os seus olhos grandes e exoftalmicos, a sua testa vincada e ampla, davam-lhe ares de apóstolo36. Os seus hábitos, a sua dedicação ao conhecimento quando estava livre das “lutas” estudantis, ajudavam a potenciar a aura mística junto dos condiscípulos mais íntimos pois retomava o seu sorumbático aspecto habitual e absorvido num mar íntimo de preocupações mentaes, lá ia a caminho da república, estudar e ler até de madrugada […] uma cela para ele era um oásis na sua vida ininterrupta de trabalho37. A luta dos estudantes da Escola Médico-Cirúrgica do Porto vai ser anticlerical, contra o ensino religioso nas escolas e também na promoção de um ensino verdadeiramente científico ao alcance de todos.

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Ver: ARAÚJO, Artur – “Lembrando o passado”, in O Primeiro de Janeiro, 6 de Janeiro de 1921. Ver: ARAÚJO, Artur– ob. cit. 32 Ver: CATROGA, Fernando – O Republicanismo em Portugal – Da formação ao 5 de Outubro de 1910, Coimbra: Faculdade de Letras, 2.º vol., 1991, p. 211. 33 Ver: IDEM - p. 211; 220. 34 Ver: As Constituintes de 1911 e os seus deputados, Lisboa: Livraria Ferreira, 1911, p. 182. 35 Ver: ARAÚJO, Artur – ob. cit. 36 Ver: IDEM 37 Ver: IDEM 31

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A 22 de Fevereiro de 1899, a Assembleia-geral da Associação Académica do Porto reúne sob a presidência do quintanista de Medicina Manuel de Carvalho para debater a questão do ensino religioso nas escolas e a entrada para o corpo docente dos estabelecimentos liceais de sacerdotes que apenas tivessem o curso teológico dos seminários. A Assembleia delibera realizar um conjunto de acções que englobavam a redacção de um manifesto ao país contra a criação do curso de ensino religioso, a realização de um comício anti-jesuítico no dia 8 de Maio, dia do aniversário da morte do marquês de Pombal, algoz da Companhia de Jesus nos idos anos de 1759, e a deposição de uma coroa de flores no túmulo de um dos símbolos da luta anticlerical, o poeta Guilherme Braga38. Para dar execução ao planeado, a assembleia nomeava uma comissão que era composta pelos académicos Manuel de Oliveira, Santos Silva, Barros Lopes, Manuel de Carvalho, Moreira Nunes, Campos Monteiro, Oliveira Monteiro, Matos Ferreira, Júlio Abeillard, Sollari Allegro, Pádua Correia e outros39. No início do ano seguinte, um acontecimento no Porto vinha inflamar novamente a opinião pública portuguesa e originar acesa polémica na imprensa da época e o recrudescimento da luta: o “Caso Calmon”. Rosa Calmon, provavelmente “seduzida” pelos jesuítas, tinha decidido ingressar numa instituição religiosa contra a vontade do pai, cônsul brasileiro, que ao mesmo tempo que tentava interditar judicialmente a escolha, denunciava, excessivamente, em frente à igreja da Trindade o pretenso rapto da filha. O caso ganhou rapidamente foros de luta ideológica e os ânimos inflamaram-se, nos primeiros dias de Março, havendo registo do envolvimento da Maçonaria, de movimentações populares e do apedrejamento de alguns edifícios religiosos. Apesar de o governo ter restringido o número de instituições religiosas, por decreto de 18 de Abril, e ter ordenado a execução do decreto de extinção das ordens religiosas, publicado no longínquo ano de 1834, os protestos prosseguiam. A luta contra a ordem social e política vigente necessitava apenas de um pretexto para acicatar os meandros estudantis. De tal forma que no mês de Março de 1901, a academia portuense lançava nova investida, chamando a si a iniciativa de promover uma série de conferências científicas, especialmente sobre as ciências biológicas, dedicadas à classe operária. Da reunião na Escola Médico-Cirúrgica do Porto, realizada por proposta de Pires de Lima, saiu uma comissão encarregue de apresentar as bases de 38 Guilherme Braga (1834-1874), poeta portuense, irmão de Alexandre Braga. Temperamental, era um poeta inflamado pelas ideias político-sociais da época, destacando-se como panfletário e violentamente anticlerical. Aderiu ao grupo de A grinalda de Júlio Dinis e Ramalho Ortigão, sendo conhecido como percursor de Guerra Junqueiro e António Nobre. 39 Ver: O Tripeiro, V Série, Ano IV, n.º 10, Fevereiro de 1949, p. 237.

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um centro educativo com os propósitos de se transformar no futuro próximo em Universidade Livre. Assim, no dia 23 desse mês, a academia do Porto promove uma reunião, no salão do grémio comercial portuense, em que tomam parte 62 delegados de 39 associações operárias e cerca de 40 académicos liderados por Manuel de Oliveira que era coadjuvado por Vilela Areias e Oliveira Malheiro, este da Escola Politécnica. Após vigorosos discursos, é aclamado por unanimidade o relatório da Academia que propõe uma estreita colaboração entre estudantes e operários e a nomeação de duas comissões para dar corpo às deliberações tomadas. Pelo grupo estudantil passaram a fazer parte Manuel de Oliveira, que redigia as céleres Folhas volantes, Pádua Correia, Carlos Rocha, Júlio Abeillard e Bartolomeu Severino, enquanto que no grupo operário sobressaiam Tomás Gasparinho, Cardoso Lucena, Manuel José da Silva e Macedo de Andrade. Como corolário das lutas empreendidas pelo comité académico-operário do Porto, projecto a que Oliveira se entregou especialmente, a Universidade Livre viria a ser inaugurada em 9 de Dezembro de 1903, sendo sediada na Travessa da Rua Formosa. Na sessão inaugural discursaram o Professor Azevedo de Albuquerque, da Escola Politécnica, e o próprio Manuel de Oliveira, e nas reuniões subsequentes Duarte Leite, Magalhães Lemos entre outros40. Como se vê, a carreira estudantil de Oliveira é recheada de inúmeras participações em actividades políticas seja através da propaganda política, seja através da participação em greves e manifestações, ou ainda, em comissões académicas. No Porto, publica ainda diversos textos de feição propagandística em jornais como Canto do Académico, Traga Mouros, Gigante, A Arte, O Campeão, O Jornal dos Estudantes, A Voz Pública entre outros. Por outro lado, os manifestos que redigiu em nome da Academia portuense ficaram célebres, sendo de salientar o Sobre o ensino religioso nas escolas que provocou a ira e a reacção do clericalismo nacional através da imprensa, de pequenos opúsculos e de livros. A resposta não se fez tardar, e a Academia, novamente por intermédio de Oliveira, respondia com o Mentiras Clericais. Em 1901, proferia a conferência intitulada o Perigo Negro, que mais tarde seria publicada pela Associação do Registo Civil do Porto e, depois, publicada no México e amplamente distribuída pela América Latina41.

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Ver: O Tripeiro, VI Série, Ano VI, n.º 12, Dezembro de 1966, p. 374. Ver: As Constituintes de 1911 e os seus deputados, Lisboa: Livraria Ferreira, 1911, p. 182

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O ano de 1904 proporcionaria a Manuel de Oliveira o ensejo de concluir o curso. Nos dias 16 e 17 de Outubro42, defende a tese subordinada ao tema O Problema de Lombroso43, na qual analisa e instrumentaliza, um assunto caro aos republicanos: o da exclusão social. Invocando, em primeiro lugar, a “ memória do pai”, e, depois, a restante família, Manuel de Oliveira dedicava o exercício final aos meus amigos, aos meus companheiros do «Comité Académico-Operário», a todos os meus condiscípulos e contemporâneos: a todos os que comigo lutaram pelos opprimidos, pelos fracos, pelos pobres, pelos humildes; a todos os que em Portugal combatem pelo libertação da consciência humana44.

A escolha do tema não era inocente e o estudante propunha-se analisar a tese do atavismo da autoria do criminologista italiano César Lombroso sob um aspecto completamente novo, creio eu, no nosso acanhado meio scientifico45. A tese lombrosiana, baseada no evolucionismo de Darwin e no positivismo, tinha surgido pela primeira vez na obra Homem Criminoso e desde então vinha sendo constantemente revista e debatida por toda a Europa. Lombroso sustentava que o criminoso nato era um ser atávico pois apresentava anomalias funcionais e morfológicas que permaneceram latentes durante várias gerações, mas que eram reminiscências de familiares ancestrais ou de raças primitivas. Contestando este princípio, Manuel de Oliveira elabora um exercício verdadeiramente notável, não só pela sua capacidade analítica mas, também, pela demonstração de uma actualização extraordinária citando vasta bibliografia editada por toda a Europa. Os objectivos do tema, contudo, eram outros. Considerou, então, que a tese de Lombroso e de seus seguidores era infundada e ilusória46. Carecia de fundamento científico pois estava fundamentada numa pseudo-ciencia biológica, em que confundia d’uma maneira lamentável os phenomenso regressivos de degenerescência com os

42

Ver: O Tripeiro, V Série, Ano X, n.º 6, Outubro de 1954, pp. 189. Ver: OLIVEIRA, Manuel de – O Problema de Lombroso. Estudo crítico de bio-sociologia sobre a theoria atávica do crime, Porto: Typographia de A. F. de Vasconcellos, suc., 1904. 44 Ver: IDEM, p. não numerada. 45 Ver: IDEM, p. não numerada. 46 Ver: IDEM, p. 21 43

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chamados phenomenos d’atavismo sendo certo que entre as duas categorias de phenomenos não há […] relações biológicas possíveis47.

Por outras palavras, por atavismo não se devia entender hereditariedade. Como tal, as características intrínsecas de um criminoso nato teriam de ser, necessariamente, explicadas de outra forma. Oliveira defendia, então, que Se em longas séries de gerações apparecem sempre criminosos degenerados, é que a estabilidade da organisação social mantem atravez dos séculos o seu condicionalismo etiológico: o delinquente não representa, por isso, como quer Lombroso, uma utilidade social, como a não representam as doenças infecciosas, que sempre acompanharam a Humanidade em todas as suas phases evolutivas. A imbecilidade, a loucura, a criminalidade, a tuberculose, n’uma palavra, todas as degenerescências reconhecem como principal, e muitas vezes como único factor o elemento social, e não é com leis, como não é com leis que se combate a tuberculose, que o hygienista conseguirá modificar esse meio pathologico que se tem engrandecido em muitos séculos de fome, de peste e de guerra. Compete-lhe um papel mais útil, mais sympathico e mais nobre: o de se transformar n’um apostolo da Humanidade, collocando-se ao lado d’aquelles que andam empenhados n’essa santa e luminosa cruzada da CONQUISTA DO PÃO. Encarado, assim, sob este ponto de vista, o Problema de Lombroso apresenta, como única solução, a solução do Problema social.

A sua tese não enveredava por uma explicação cientificamente comprovável pela disciplina biológica, como pretendia Lombroso, mas sim através do recurso a uma explicação de cariz sociológico – o tal aspecto inovador – invocando o determinismo social para defender que o crime sofrido provoca o crime perpetrado. Em suma, a marginalização e a opressão do indivíduo, ao sujeitá-lo a um conjunto de caracteres abstractos que sustentam uma organização social artificialmente estratificada e desigual como vinha sendo defendida pelo regime monárquico, eram os responsáveis pelo surgimento da delinquência. Assim, o acto final do processo de graduação académica de Oliveira correspondia, igualmente, ao epílogo da luta estudantil em busca da igualdade social. Finda uma brilhante carreira académica, com a obtenção de uma das maiores classificações conferidas até ao seu tempo48, Manuel de Oliveira tinha cabedal 47 48

Ver: IDEM, p. 19 Ver: As Constituintes de 1911 e os seus deputados, Lisboa: Livraria Ferreira, 1911, p. 181.

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scientifico que lhe dava jus a uma cátedra, mas não tinha os ligamentos vertebrais treinados na subserviência49. Decidiu, então, rumar a Ponte de Lima, tendo obtido um despacho que o nomeava médico municipal50, onde viria a adquirir grande notoriedade, não só no exercício das funções como médico, mas também como político e erudito. Foi director do Instituto Bacteriológico, com sede na rua António Feijó, ao qual acorria numerosa clientela proveniente de todo o distrito devido aos tratamentos inovadores que ali prescrevia51, sendo que o seu nome envolvia excelente conceito. Por outro lado, Manuel de Oliveira continua a sua acção política. Em 1905, funda, em Braga, com Manuel Monteiro, Domingos Pereira, Simões de Almeida, Justino Cruz, Alberto Feio e outros, o Centro Republicano local52. Pouco tempo depois, assumiu a direcção do Partido Democrático de Ponte de Lima e foi nessa condição que se entregou novamente à propaganda republicana, redigindo, em 1908, o manifesto Pela República, que seria editado pela Comissão Republicana local e por algumas do sul, sendo que a do Porto faria uma larguíssima distribuição53. Proclamada a República no dia 5 de Outubro de 1910, e enquanto Rodrigues da Silva dava a boa nova nos Paços do concelho de Viana, Manuel de Oliveira e um grupo de cidadãos tomavam conta da Câmara de Ponte de Lima. Chegou a administrador do concelho de Ponte de Lima e, pouco depois, apresentou-se como candidato do Partido Republicano às Constituintes de 1911 tendo sido eleito, sem oposição, para deputado pelo círculo de Ponte de Lima juntamente com Narciso Alves da Cunha, Rodrigo Fontinha e Tito de Morais54. O acto eleitoral de 28 de Maio de 1911 seria a consagração do novo regime político55. Como tarefa fundamental, cabia às Constituintes formar um Governo provisório e elaborar a Constituição que, nesse mesmo, ano ficou concluída e foi promulgada56. No dia seguinte à eleição de Manuel de Arriaga para Presidente da República, portanto a 25 de Agosto de 1911, a Constituinte escolhia por voto os senadores sendo

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Ver: ARAÚJO, Artur – “Lembrando o passado”, in O Primeiro de Janeiro, 6 de Janeiro de 1921. Ver: Almanaque de Ponte de Lima, dirigido por António de Magalhães, Ponte de Lima: Tipografia Guimarães, 5.º ano, 1923, p. 76. 51 Ver: IDEM, p. 77. 52 Ver: SOUSA, Amadeu José Campos de – ob. cit.,p. 93. 53 Ver: As Constituintes de 1911 e os seus deputados, Lisboa: Livraria Ferreira, 1911, p. 182. 54 Ver: RAMOS, Luís de Oliveira – “Memória sobre os deputados do Minho às Constituintes de 1911”, in: Bracara Augusta, vol. XXX, II tomo, Ano de 1976 (Julho-Dezembro), N. 70 (82), Braga: Câmara Municipal, pp. 384. 55 Ver: IDEM, pp. 379-380. 56 Ver: IDEM, pp. 397. 50

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que pelo distrito de Viana do Castelo figuravam os nomes de Manuel Rodrigues da Silva e Manuel de Oliveira, então consagrado como grande mentor democrático57. Mais tarde, a 29 de Maio de 1913, depois de recusas aos diversos convites para integrar o Ministério, sendo muito instado pelo Ministro do Interior, Manuel de Oliveira aceita o cargo de governador civil do Porto e a sua nomeação era assim noticiada: Trata-se d’uma individualidade a todos os respeitos distintíssima que já n’esta cidade affirmou o seu alto valor intellectual, quando, a convite da Academia de que fazia parte, se pronunciou sobre o ensino religioso nos lyceus, n’um manifesto notável, revelador da mais vasta cultura e erudição, mostrando-se, desde logo, um espírito liberal desanuviado e de firmes princípios. […] O novo chefe do districto não é só um homem de talento e illustração comprovada é também um espírito disciplinado e um carácter da maior rectidão58.

Como governador civil do Porto, participa na comemoração do 23.º aniversário da revolta de 1891 - que contou com um “grandioso cortejo cívico” com milhares de pessoas e sessões solenes -, em que discursa juntamente com Henrique Pereira de Oliveira, presidente da Câmara, e Jaime Cortesão, vereador suplente da comissão executiva da Câmara do Porto59. Todavia, Manuel de Oliveira abandonou em seguida a vida política por razões que se desconhecem. Veio a falecer vítima de nefrite crónica pelas sete horas do dia 5 de Janeiro de 1918, no largo da Senhora-a-Branca60, em casa de seu cunhado António Faria Figueiredo Matos Júnior. Como diria, um amigo próximo, faleceu com quarenta anos na pujança da vida, quando sinais havia a esperar do seu talento de polígrafo e de scientista61. 2. A “LIVRARIA OLIVEIRA” E A PRODUÇÃO HISTORIGRÁFICA DE UM ERUDITO Não sabemos com exactidão como era composta a sua biblioteca particular, mas sabemos que era rica, na qualidade, a inestimável biblioteca, formada por milhares de volumes e que a mantinha organizada com zelo, carinho e método especial62.

57

Ver: IDEM, pp. 397-398. Ver: O Primeiro de Janeiro, n.º 127, 45.º ano, 30 de Maio de 1913. 59 Ver: O Tripeiro, V Série, Ano IV, n.º 1, Janeiro de 1964, p. 32. 60 Ver: Cópia do registo de óbito de Manuel José de Oliveira. REGISTO CIVIL DE BRAGA –Maço n.º 4, registo n.º 32 61 Ver: ARAÚJO, Artur – “Lembrando o passado”, in O Primeiro de Janeiro, 6 de Janeiro de 1921. 62 Ver: MAGALHÃES, Francisco de - “Médicos de Ponte de Lima”, Separata do Elucidário Regionalista de Ponte de Lima, Ponte de Lima: Tipografia de Augusto de Sousa, 1950, p. 16. 58

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A característica que sobressai do perfil de Manuel de Oliveira, e que está subjacente à vasta livraria, é inegavelmente a sua condição de bibliófilo, de coleccionador. Recebeu o arquivo da Casa de Sá, bem como alguns livros ali existentes, por oferta de José Mimoso de Barros e Alpoim63 a quem assistia como médico64. Os “papéis” do conde da Barca, o membro mais ilustre daquela família, possuíam um inegável interesse para o estudo do crepúsculo do Antigo Regime e, principalmente, para o estudo da Guerra Peninsular. Por um lado, é de crer que o ciclo de comemorações, de sabor positivista, ou das “Ritualizações da História”, iniciado com o terceiro centenário de Camões, que continuou com o primeiro do marquês de Pombal, este de verdadeira mobilização republicana65, até ao primeiro centenário da “Guerra Peninsular”, em 190866, tivera alguma influência na decisão de Manuel Oliveira de receber o conjunto documental, como adepto que era de uma renovação historiográfica fundamentada nos pressupostos positivistas e, como tal, propenso à análise documental como validação do conhecimento histórico e da busca de uma causalidade directa do facto histórico. Idênticas circunstâncias terão proporcionado o ensejo de adquirir o arquivo dos viscondes de Vila Nova de Cerveira, antigos senhores donatários de Ponte de Lima, graças a uma extrema gentileza das Senhoras do Paço. Sabemos que Oliveira era, também, um frequentador assíduo de leilões e de alfarrabistas conforme comprova o vasto conjunto de livros que hoje repousam na Biblioteca Pública de Braga sob o título de Biblioteca Barca-Oliveira (Impressos)67 e, ainda, o conjunto de cartas que haviam pertencido a Francisco José Maria de Brito, oficial da Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros, secretário e amigo do conde da Barca, comprado no leilão da biblioteca de Aníbal Fernandes Tomás, ocorrido em 191268. A sua biblioteca, dividida em três grandes áreas temáticas (Medicina, Literatura Moderna e História) era, bem à maneira dos eruditos do seu tempo, um espaço de 63

Ver: MACHADO, Alberto de Sousa – in: Arquivo do Alto Minho, 6.º vol., Tomo I, Viana do Castelo, 1956, p.9. Ver: SANCHES, RIBEIRO - Dificuldades que tem um reino velho para emendar-se e outros textos, apresentação de Vítor de Sá, Porto: Inova, p. 64. 65 Ver: TORGAL, Luís Reis – “Sob o signo da «reconstrução Nacional», in: História da História em Portugal., 2.ª ed., [s.l.] Temas e Debates, vol 1, p. 249 e segs. 66 Ver: CATROGA, Fernando – “Ritualizações da História”, in: ob. cit., 2.ª ed., [s.l.] Temas e Debates, vol. 2, p. 332-334. 67 Ver: BIBLIOTECA PÚBLICA DE BRAGA – “Catálogo do Fundo Barca-Oliveira (Impressos)”, in: Portugal da Revolução Francesa ao Liberalismo, Braga: Universidade do Minho, 1988, pp. 85-289. 68 Foram adquiridas em 1912 no leilão da biblioteca de Aníbal Fernandes Tomás. Ver: ALCOCHETE, Nuno Daupiás de – Humanismo e Diplomacia. Correspondência Literária (1789-1804) de Francisco José Maria de Brito com Dom Frei Manuel do Cenáculo, Paris: Fundação Calouste Gulbenkian/ Centro Cultural Português, 1976, p. 5. 64

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trabalho, um “laboratório” destinado a possibilitar o surgimento de um conhecimento do passado com um cunho marcadamente nacionalista. Por essa razão é que Oliveira partilhava a sua livraria com um círculo restrito de amigos como Artur Araújo e Maximiliano Lemos, respectivamente seu colega e professor na Escola Médico-Cirúrgica do Porto. O primeiro demonstrava uma apetência pela História e era, ainda, finalista na Escola Médica quando consultou e publicou os manuscritos de Sanches que possuía o seu antigo colega Oliveira. Mais tarde, publicou ainda umas cartas autógrafas que o abade Correia da Serra dirigiu ao seu amigo de sempre: o conde da Barca69. O segundo, Maximiliano de Lemos, professor da cadeira de Medicina Legal na Escola Médico-cirúrgica, graças ao seu declarado interesse pela história da Ciência em Portugal, nomeadamente da Medicina, foi conduzido aos manuscritos originais de Ribeiro Sanches que existiam na biblioteca do seu antigo discípulo. Nesse trabalho, Maximiliano de Lemos salientou que a colecção que mais lhe interessava pertence ao meu distinto colega Dr. Manuel de Oliveira, de Ponte de Lima. Não só me permitiu examiná-la, mas confiou-me durante o tempo que reputei de necessário os manuscritos de Sanches que possue70

Por outro lado, importa fazer referência ao “uso” que Oliveira deu aos livros, pois sabemos que era sólida a sua erudição e acatada, por conseguinte, no campo da inteligência, a sua opinião71. A este testemunho não era alheia a colaboração em vários periódicos de Ponte de Lima com enquadramento nos estudos locais, que nessa altura conheciam um novo fôlego72. Se a sua participação significava um serviço cultural e educativo, regionalista e agregador, pois persistia na procura e na divulgação de elementos identitários que visavam o progresso económico e científico local73, por outro lado não pode ser menosprezado o facto dessa mesma colaboração reforçar o prestígio do seu autor. No dizer de um coevo, Manuel de Oliveira mantinha-se

69 Ver: ARAÚJO, Artur – “Cartas do abbade Corrêa da Serra ao Conde da Barca”, in: Arquivos de História da Medicina Portuguesa, Nova Série – 3.º ano, Porto: Lemos & C.ª, Suc., 1912. 70 Ver: LEMOS, Maximiliano – Ribeiro Sanches, a sua vida e a sua obra, Porto 1911, p. VII, apud RIBEIRO SANCHES – ob. cit., p. 63 e segs. 71 Ver: Elucidário Regionalista de Ponte de Lima, p. 190. 72 Ver: SILVA, Armando Malheiro da – “O Minho nas monografias (Sécs. XIX-XX). Notas para uma revisão sistemática dos estudos locais”, in: Bracara Augusta, Braga: Câmara Municipal, vol. XLIII, n.º 94/95 (107/108), 1991/92, p. 32 73 Ver: IDEM, p. 49.

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Debruçado sobre os códices, as poucas horas que lhe restassem dos seus afazeres profissionais, aplicava-as, na mais amena das distracções, aos estudos históricos e de investigação, sobretudo aos que se ligavam e interessavam a Ponte de Lima74.

Em 1909, surge como colaborador no Almanaque Illustrado de O Commercio do Lima e publica um trabalho sugestivamente intitulado Pro veritate, no qual assume ser o detentor de uma pequena parte, a que ainda existia do arquivo dos Senhores do Paço de Giela, o histórico e primitivo solar dos Limas, primeiro viscondes de Vila Nova de Cerveira e depois marqueses de Ponte de Lima, cujo mais ilustre representante tinha sido o bisconde D. Leonel de Lima. O tema do trabalho anda à volta das lutas municipalistas empreendidas na Idade Média contra as regalias das castas dominantes, defendendo o seu autor que Os municipios na Edade Media, revoltando-se contra as exigências “legaes” dos senhores “de juro e herdade”, evidenciam essa força mysteriosa de vida e revolução mais por instinto do que por consciência nítida de seus direitos, mais em defeza natural de seus interesses do que em ódio a seus senhores75.

Em seu entender, a crítica parcelar da História apresenta, erradamente, o bisconde e os seus descendentes mais próximos como tyranos pois, mas ao contrário do que se supunha Foram elles, todos o sabem, quem com os vícios inherentes à sua educação e à sua epocha, e com as virtudes próprias do seu carácter, fizeram de Portugal a nação mais colonizadora desde a queda 76 do império romano até às vascas da longa agonia da Edade-Media .

No ano seguinte, colabora no Almanaque de Ponte de Lima juntamente com outras gradas figuras como o capitão Álvaro Pimenta, António Baião, António Feijó, António de Magalhães, conde de Bertiandos, F. de Abreu Maia, João Gomes de Abreu, José de Magalhães, Júlio de Lemos, Teófilo Carneiro, entre outros. Num ano de cheias frequentes e vingadoras, Oliveira defendia a canalização do rio Lima como sendo um melhoramento importantíssimo para a vila, de que se ocupara, em finais do século XVIII, António de Araújo de Azevedo, um filho ilustre de Ponte de Lima77. 74

Ver: Elucidário Regionalista de Ponte de Lima, p. 190. Ver: OLIVEIRA, Manuel de – “Pro Veritate”, in: Almanaque Illustrado de O Commercio do Lima, coord. por António de Magalhães, Ponte de Lima: Tip. Confiança, 1909, p. 258. 76 Ver: IDEM, p. 259. 77 Ver: IDEM – “Noticias históricas”, in: Almanaque de Ponte de Lima, Ponte de Lima: O Commercio do Lima, 1910, pp. 193-199. 75

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Mais tarde, em 1915, fez inserir no Comércio do Lima, uma notícia sobre Ponte de Lima no tempo dos franceses, lamentando que estando a terminar a comemoração centenária sobre a Guerra Peninsular nada se tenha escrito sobre aquela localidade e mais concretamente sobre a defesa heróica da ponte. Num curioso exercício, Oliveira opõe a narração dos factos empreendida pelo governador militar de Ponte de Lima, Francisco Pereira Peixoto Ferraz Sarmento, cujo manuscrito inédito possuía, à narração de Vítor Maria Duplan, capitão francês que tomara a ponte, cujas memórias tinham sido publicadas em 190178, e que também existiam na sua livraria. Todavia, apesar destes breves exemplos, Manuel de Oliveira usufruiu pouco tempo da sua livraria particular pois veio a falecer logo em 1918, como vimos. No seu testamento, Manuel de Oliveira dispôs da sua literatura moderna e de medicina em favor de seus sobrinhos António e do primeiro que se formasse em Medicina; a colecção de livros e manuscritos sobre a Etiópia, cartas e autógrafos dos jesuítas daquela missão (século XVII) o manuscrito do P. Pêro Pais e a primeira edição do Preste João, assim como a colecção dos livros e opúsculos e manuscritos sobre a guerra peninsular deseja que, pelo seu justo valor sejam adquiridas por uma das Câmaras do Norte de Portugal, sobretudo Braga ou Porto, ou pelo Estado79.

A “Livraria Oliveira” foi, então, adquirida nos anos 20 pela Câmara Municipal de Braga pelo preço de 250.000$0080.

78

Ver: O Comércio do Lima, Ano 9.º, n.º 430, de 11 de Abril de 1915. Ver: Ofício do Dr. Alberto Feio dirigido ao Dr. Júlio Dantas, apud NUNES, Henrique Barreto – “Fundo Barca-Oliveira”, in: Da biblioteca ao leitor. Estudos sobre a leitura pública em Portugal, Braga: Autores de Braga, 1996, p. 322. 80 Ver: NUNES, Henrique Barreto – ob. cit., p. 321. 79

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CAPÍTULO 3 - NO ARQUIVO DISTRITAL BRAGA: O “FUNDO BARCA-OLIVEIRA”

E

BIBLIOTECA PÚBLICA

DE

1. A AQUISIÇÃO DA “LIVRARIA OLIVEIRA” A recepção da “Colecção Oliveira” na Câmara Municipal de Braga parece não ter sido pacífica. Na verdade, comentava-se em surdina, já há algum tempo, a má aquisição feita pelo Presidente Manuel João Caetano Fonseca Lima, até que, na sessão de 30 de Janeiro de 1925, o vereador António Ferreira de Almeida usou da palavra para criticar a compra que esta câmara fez da livraria que foi do falecido Doutor Manuel d’Oliveira, atendendo a que a mesma se compõe apenas de livros de medicina sem valor algum, devendo a quantia por que ela foi adquirida ser aplicada em obras da cidade81. O Presidente da Instituição esclareceu, então, que a referida livraria não possuía quaisquer espécies de medicina e que o seu valor era inquestionável, conforme o comprovava o interesse constante de livreiros de Lisboa. Além disso, se a Câmara Municipal de Braga não tivesse avançado para a compra dúvida alguma há que ela seria comprada pela Câmara do Porto perdendo-se, assim, a oportunidade de adquiri-la nas melhores condições como, na realidade, acontecera82. Todavia, a “Livraria Oliveira” continuou, de tal forma, a não ser consensual que a 25 de Setembro desse mesmo ano, a Câmara decidiu que […] se oficie ao Senhor Bibliotecário da Biblioteca Pública desta cidade para fazer a seguinte proposta às instâncias superiores. Que a Câmara de Braga cede àquela biblioteca a título de depósito a livraria que adquiriu do Doutor Manuel d’Oliveira, que não poderá ser alienada ou transferida; como desta cedência resultam duplicações de espécies, serão estes duplicados entregues a esta Câmara, que deles fará o uso que entender83.

Perante a proposta recebida, Alberto Feio, director do Arquivo Distrital e da Biblioteca Pública e Arquivo Distrital de Braga, conhecedor da importância do conjunto documental e ainda imbuído dos efeitos provocados pelas iniciativas editoriais contextualizadas pelo centenário da Guerra Peninsular, dirigiu-se, então, ao Dr. Júlio

81

Ver: Acta de vereação da Câmara Municipal de Braga de 30 de Janeiro de 1925, fls. 73v.-74v. Ver: ID. de 30 de Janeiro de 1925, fls. 73v.-74v. 83 Ver: ID. de 25 de Setembro de 1925, fl. 119 v.-120. 82

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Dantas, Inspector das Bibliotecas Eruditas e Arquivos, solicitando a autorização para proceder à permuta salientando a dupla importância do conjunto documental, visto que a livraria em questão contém muitas espécies de extrema raridade não possuídas por esta Biblioteca, constando, além disso, de uma colecção muitíssimo importante, com mais de um milhar de peças, sobre a Guerra Peninsular. Mas o que sobretudo a torna notável é o valiosíssimo conjunto de manuscritos que encerra, pertencentes outrora, na maior parte, ao Conde da Barca84.

Como contrapartida, o bibliotecário-arquivista oferecia à Câmara Municipal um número inferior a 2000 exemplares provenientes, na maior parte, das recentes incorporações das casas congreganistas, de pequeno valor bibliográfico, livros vulgares de direito canónico, crónicas religiosas, sermões e história 85 eclesiástica .

Se por um lado, a permuta era vantajosa para a A. D. e B. P. B. pelo riquíssimo valor informativo que a “Livraria Oliveira” encerrava, por outro, convém lembrar que a natureza desta documentação destoava em muito das características das restantes colecções do Arquivo. Obtida a autorização necessária do Ministério da Instrução Pública, de quem dependia o Arquivo Distrital e a Biblioteca Pública de Braga, foi, provavelmente, em 1926 que se promoveu a permuta86.

2. O EMPIRISMO ARQUIVÍSTICO É de crer que, logo no momento da entrada no Arquivo e na Biblioteca, a “Livraria” tenha passado a ser designada por “Fundo Barca-Oliveira”, como referência explícita às proveniências distintas de manuscritos e impressos. Importa, também, referir que a inclusão de “Oliveira” na designação do acervo, demonstra o propósito de Alberto Feio de homenagear o seu correligionário e amigo. Contudo, a colecção parecia ser aparentemente homogénea, mas convém realçar, uma vez mais, que era composta pelo arquivo da Casa de Sá (ou arquivo do conde da 84

Ver: Ofício do Dr. Alberto Feio ao Dr. Júlio Dantas apud Henrique Barreto NUNES – ob. cit., p. 321. Ver: IDEM - p. 322-323. 86 Ver: IDEM - p. 324. 85

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Barca), pelas obras impressas sobre a Guerra Peninsular, por um conjunto de cartas de Francisco José Maria de Brito, por uma colecção de gravuras e pelo arquivo dos Senhores do Paço de Giela, sendo que o tempo e os procedimentos arquivísticos desenvolvidos no seio do A. D. e B. P. B. se encarregariam de caldear estes documentos que, na verdade, tinham pertencido a diferentes entidades produtoras. Por outro lado, a sua classificação como “fundo” provém da influência historicista que se impôs na afirmação de um modelo arquivístico nascido em França em 1841 e que tinha estado na génese dos arquivos distritais portugueses87. O respeito pelo princípio da proveniência e a observância da regra da manutenção da ordem original configuravam-se como pressupostos inalienáveis de uma arquivística concebida como uma ciência auxiliar da História, nomeadamente de uma historiografia erudito-metódica. É neste pressuposto que se vão desenvolver os trabalhos arquivísticos sobre o conjunto documental durante os cerca de sessenta anos subsequentes. O Arquivo Distrital de Braga tinha sido fundado e anexado à Biblioteca Pública local pelo decreto n.º 3286 de 11 de Agosto de 1917, passando a partilhar as instalações do antigo convento dos Congregados do Oratório. A abertura do Arquivo simbolizou uma vitória da cidade, depois da luta empreendida por um conjunto de notáveis locais, de que Alberto Feio era a face visível, em defesa do riquíssimo património documental bracarense88, pois em 1913, Braga tinha visto surgir a ameaça da deslocação para a Torre do Tombo do arquivo do Cabido bracarense. Segundo Alberto Feio, a criação do Arquivo Distrital de Braga vinha solucionar o problema de enquadramento não só do arquivo do cabido, como também, dos outros cartórios eclesiásticos, como o da Mitra e o da Sé (este também designado por Igrejário ou Registo Geral, como hoje é conhecido) que graças à Lei da Separação de 1911 de Afonso Costa, tinham sido gradualmente incorporados na Biblioteca Pública de Braga89. Resolvida a questão, iniciaram-se os trabalhos de descrição arquivística dos variados fundos tendo em vista a sua disponibilização ao público, nomeadamente, através da publicação no Boletim da Biblioteca Pública e Arquivo Distrital de Braga de inventários, índices e sumários, os quais deviam surgir a par de outros trabalhos

87

Ver: SILVA, Armando Malheiro da [et alli] - Arquivística 1. Teoria e prática de uma ciência da informação, Porto: Edições Afrontamento, 1999, pp. 114-116. 88 Ver: NUNES, Henrique Barreto - “O centenário de Alberto Feio e os 140 anos da Biblioteca Pública de Braga”, ob. cit., p. 266; SOUSA, Amadeu – ob. cit., pp. 125-127. 89 Sobre a fundação do A.D.B. e as suas primitivas colecções ver: FEIO, Alberto – “O Arquivo Distrital de Braga: Notas Históricodescritivas”, in: Boletim da Bibloteca Pública e do arquivo Distrital de Braga, volume I, Braga: Tipografia do Arquivo Distrital, 1920, pp. 77-116.

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bibliográficos sobre espécies da Biblioteca Pública e de estudos regionais de investigação histórica90. Como vimos, a Alberto Feio - erudito bibliotecário-arquivista, a quem ficaram a dever-se as traves mestras da estrutura em que ainda hoje assenta a […] organização e funcionamento da Biblioteca91 - deve-se a incorporação da “Livraria Oliveira”, agora transformada em “fundo Barca-Oliveira”, mas não só. Deve ser realçado, também, o seu trabalho na catalogação e na divulgação do “fundo Barca-Oliveira”, do qual encontramos cerca de cem fichas com a descrição e apreciação qualitativa de vários documentos e processos. A estratégia de divulgação do conjunto documental assentou na publicação de alguns manuscritos inéditos, como por exemplo os que se referiam à contratação do célebre gravador Francesco Bartolozzi pelo conde da Barca92 e à edição da História da Etiópia do Padre Pêro Pais93. Por outro lado, Alberto Feio tomou a iniciativa de dar a conhecer ou de sugerir a alguns ilustres académicos do seu tempo a existência de documentação inédita no “fundo”. Assim, Hernâni Cidade publicou uma selecção de cartas da marquesa de Alorna, a célebre Alcipe dos fastos literários94, e Abílio Fernandes, professor de Botânica da Universidade de Coimbra, estudou as cartas de Félix de Avelar Brotero95. Um outro tópico de extrema importância nesta história custodial do “Fundo Barca-Oliveira” aconteceu com a deslocação física de vários manuscritos, como memórias científicas e literárias avulsas e outros códices, para a Secção de Manuscritos, bem como de edições impressas de extrema raridade para a Secção de Reservados, os quais foram perdendo a inegável ligação ao seu contexto original de produção com o passar dos anos. Convém referir que a Secção de Manuscritos, hoje existente no A.D.B., foi originalmente composta no seio da B.P.B., logo por altura das incorporações das bibliotecas dos conventos, após 1841, pela mão do bibliotecário Silva Abreu96, à

90 Ver: AZEVEDO, Alberto Feio Soares de – “Duas Palavras”, in: Boletim da Bibloteca Pública e do arquivo Distrital de Braga, volume I, Braga: Tipografia do Arquivo Distrital, 1920, p. 4. 91 Ver: NUNES, Henrique Barreto – “O centenário de Alberto Feio e os 140 anos da Biblioteca Pública de Braga”, ob. cit., pp. 266267. 92 Ver: FEIO, Alberto - “A Livraria e os ex-libris do Conde da Barca gravados por Bartolozzi. Novos subsídios biográficos do Artista”, in: Anais das bibliotecas e Arquivos, Vol. IX (1-2), Janeiro-Junho (33-34), 1931, pp. 26-34. 93 Ver: PAIS, Pêro - História da Etiópia, introdução por Elaine Sanceau, nota bio-bibliográfica por Alberto Feio, Leitura Paleográfica de Lopes Teixeira, [s.l.] Livraria Civilização – Editora, 1945, 3 volumes. 94 Ver: Marquesa de Alorna: inéditos, cartas e outros escritos, selecção, prefácio e notas de Hernâni Cidade, Lisboa: Sá da Costa Ed., 1941. 95 Ver: FERNANDES, Abílio - “Quatro cartas inéditas de Brotero para o Conde da Barca”, separata da Revista da Faculdade de Ciências da Universidade de Coimbra, vol. XVI, Coimbra: Tipografia da Atlântida, 1947. 96 No Boletim de 1920, o Director do A.D. e B.P.B. faz referência à sala da Secção de Manuscritos e de Secção de Reservados como existindo já há muito tempo. Ver: FEIO, Alberto - Boletim da Bibloteca Pública e do arquivo Distrital de Braga, volume I, Braga: Tipografia do Arquivo Distrital, 1920, p. 64.

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semelhança do que sucedia noutras instituições97. E só quando se procedeu à transferência de instalações da A. D. e B. P. B. para o recém construído Paço dos Arcebispos, em 1934, é que a Secção de Manuscritos passou a figurar na estrutura orgânica do Arquivo. Esta Secção era composta, inicialmente, por espécies de natureza literária, histórica e filosófica procedentes das Livrarias Monástico-Conventuais98, mas aos poucos Alberto Feio foi juntando documentos provenientes de outros acervos99. Os cerca de mil registos que hoje a corporizam foram agrupados e arrumados nas estantes por dimensões, o que veio potenciar a sua heterogeneidade e, acima de tudo, o carácter de construção artificial que ostenta, o qual se baseou numa seriação inorgânica que permitiu juntar documentos avulsos e diminutos núcleos documentais com o intuito de proporcionar uma maior expressão a todos eles e de potenciar o seu valor informativo. Ali passaram a figurar, sem registo da sua entidade produtora, vários títulos do “Fundo Barca-Oliveira”100, como as poesias de Bocage101, as de Filinto Elísio102 e as de António Dinis da Cruz e Silva (ou Elpino Nonacriense como era conhecido entre os árcades)103, os manuscritos de Ribeiro Sanches104, a História da Etiópia do Padre Pero Pais105, as Cartas Ânuas da Missão da Etiópia106, a Sentença do Padre António Vieyra107, o Ensaio Sobre as minas de José Anastácio da Cunha108 e os seus restantes opúsculos que até há bem pouco tempo permaneciam inéditos109, a Colecção recôndita de algumas obras 97 Ver, a título de exemplo, a constituição da colecção de manuscritos da Biblioteca Nacional em: FERREIRA, Teresa Duarte, SANTANA, Ana Cristina – “O tratamento documental ao serviço da investigação: a experiência da Biblioteca Nacional”, comunicação apresentada nas 10.ª jornadas PORBASE, disponível em . (consultado a 16.01.2007). 98 Ver: ARAÚJO, António de Sousa, SILVA, Armando B. Malheiro da - Inventário do Fundo Monástico Conventual, Braga: Arquivo Distrital de Braga/ Universidade do Minho, 1985, p. 41-nota 81. 99 Sobre os procedimentos arquivísticos operados por Alberto Feio, bem à maneira do seu tempo, veja-se igualmente o “arranjo” que juntou os pergaminhos e outros documentos do Cartório aos documentos da Capela da Glória que se passaram a designar por Colecção Cronológica. Ver: FEIO, Alberto - Boletim da Bibloteca Pública e do arquivo Distrital de Braga, volume I, Braga: Tipografia do Arquivo Distrital, 1920, p. 109 100 Em 1974, Vítor de Sá publicou um artigo no qual chamava a atenção para o facto da riqueza da Secção de Manuscritos se dever, também, a um conjunto de documentos inéditos que tinham pertencido ao conde da Barca. Ver: SÁ, Vítor de– “Notícia de manuscritos Setecentistas existentes no Arquivo da Biblioteca Pública de Braga”, in: Bracara Augusta, n.º 28 (65-66), Braga: Câmara Municipal, 1974, pp. 337-366. 101 Ver: Epistola de Manuel Maria Barbosa du Bocage, (ADB/UM – SIFAA/SSC 08.01/DOC.-Ms. 80.3); Noute de Inverno por Manuel Maria Barbosa du Bocage, (ADB/UM – SIFAA/SSC 08.01/DOC.-Ms. 96.1); A Noite bem passada, (ADB/UM – SIFAA/SSC 08.01/DOC.-Ms. 570.3). 102 Ver: Os Lusíadas de Luiz de Camões copiados de um raríssimo manuscrito. Paris anno de 1788, com comentários de Filinto Elísio. ADB/UM – SIFAA/SSC 08.01/DOC.-Ms. 638. 103 Ver: Sonetos e Epigramas do Desembargador António Diniz da Cruz Silva conhecido entre os Àrcades de Lisboa pelo nome de Elpino Nonacriense [...], (ADB/UM – SIFAA/SSC 08.01/DOC.-Ms. 390); Obras do Desembargador António Diniz da Cruz e Silva Conhecido entre os Àrcades de Lisboa pelo nome de Elpino Nonacriense [...], 1794, (ADB/UM – SIFAA/SSC 08.01/DOC.-Mss. 389; 391-393). 104 Colecção de autographos inéditos do celebre médico portugues António Ribeiro Sanches, ADB/UM – SIFAA/SSC 08.01/DOC.Ms. 640. 105 Ver: História Geral da Etiópia pelo Padre Pero Pais, ADB/UM – SIFAA/SSC 08.01/DOC.-Ms. 778. 106 Ver: Cartas anuas da Etiópia., ADB/UM – SIFAA/SSC 08.01/DOC.-Ms.779 107 Ver: Sentensa do Padre Antonio Vieyra, ADB/UM – SIFAA/SSC 08.01/DOC.-Ms. 528. 108 Ver: Ensaio sobre as Minas, por Joze Anastácio da Cunha. ADB/UM – SIFAA/SSC 08.01/DOC.-Ms. 526. 109 Ver: Princípios de Geometria tirados dos de Euclides, (ADB/UM- SIFAA/ SSC 08.01/ DOC.-Ms. 912.18); Nouvelle Résolution Numérique des Equations de tous les Degrés, (ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/ DOC. - Ms. 515.13); Princípios do Cálculo

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políticas do Illustríssimo e excelentíssimo Marquez de Pombal Sebastião Joze de Carvalho e Mello110, as Obras de D. Luís da Cunha111 e as Memórias de Salvador Taborda112, entre muitos outros opúsculos que – hoje se sabe – figuram nos catálogos manuscritos da livraria particular do conde da Barca. O mesmo sucedeu com os impressos do “fundo”, quando Alberto Feio, durante os anos 30, 40 e 50, tentou completar o “incompletável” anexando-lhe várias dezenas de obras de temática semelhante que foram sendo adquiridas pela Biblioteca Pública. Assim, nos anos 50 o “Fundo Barca-Oliveira” estava disperso pelas várias “colecções” do A.D. e da B.P.B. numa situação que será potenciada e irreversível em 1974 com o desmembramento destas duas instituições e a sua incorporação no seio da novel Universidade do Minho. Entretanto, em 1968, e ao abrigo do despacho de 28 de Dezembro que permitiu interditar à consulta pública a documentação necessária para teses de doutoramento, Nuno Daupiás de Alcochete – primeiro como bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian e, depois, do Instituto Português do Património Cultural – iniciou um processo de inventariação que visava a edição de um catálogo “monumental” dos manuscritos “Barca-Oliveira”, o qual não seria terminado por razões várias113. Desta intervenção brotou um primeiro inventário dactilografado que, não obstante as suas deficiências técnicas, serviu de instrumento de acesso aos utilizadores que ansiavam pelo acesso àquela extraordinária documentação sobre o ocaso do Antigo Regime. A descrição e o agrupamento dos documentos do “Fundo Barca-Oliveira” deixava antever uma amálgama de conceitos e técnicas arquivísticas fortemente influenciadas pela óptica do arquivista-historiador, tendo obedecido a uma lógica puramente dedutiva, assente na distinção entre o pessoal, o oficial, o literário e o

Fluxionário, (ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/ DOC. - Ms. 885.2, fls. 1-3v.); Logarithms & Powers, (ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/ DOC. - Ms. 522.3); Necessidades, March 3. 1780, (ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/ DOC. - Ms. 885.2, fls. 6-6v.); Meu Rico Amigo, (ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/ DOC. - Ms. 885.2, fls. 4-5 v.); Balistique de Galilée, (ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/ DOC. - Ms. 515.14). Ver: José Anastácio da Cunha. O Tempo, as Ideias, a Obra e… Os Inéditos, Braga: ADB/UM, CMAT/UM, CMUP, 2006, 2 vols. 110 Ver: Collecção recondida de algumas Obras Politicas do Illustrissimo e Exmo. Marquez de Pombal Sebastião de Jozé de Carvalho e Mello, ADB/UM – SIFAA/SSC 08.01/DOC.-Ms. 477.1. 111 Obras de D. Luís da Cunha; 3 tomos, (ADB/UM – SIFAA/SSC 08.01/DOCS.-Mss. 707-709); Officios de D. Luís da Cunha e do Conde de Tarouca [...], 2 tomos, (ADB/UM – SIFAA/SSC 08.01/DOCS.-Mss. 710-711). 112 Ver: Memórias de Salvador Taborda Portugal, 2 Livros, ADB/UM – SIFAA/SSC 08.01/DOCS.-Mss. 716-717. 113 Apesar de não ter concluído a inventariação do conjunto documental, Nuno Daupiás de Alcochete trouxe a lume algumas cartas e outros documentos inéditos pertencentes ao “fundo Barca-Oliveira”. Ver: ALCOCHETE, Nuno Daupiás de – “Lettres de Jacques Ratton a António de Araújo de Azevedo, Comte da Barca: 1812-1817”, Separata do Bulletin d'Etudes Portugaises, 25, Lisbonne: Institut Français au Portugal, 1964, pp. 137-256; ID. – “Ideias económicas de Jácome Ratton em relação ao Brasil”, in: Actas do V Colóquio Internacional de Estudos Luso-Brasileiros, Coimbra: [s.n.], 1965; ID. – “Lettres de Diogo Ratton a Antonio de Araujo de Azevedo, comte da Barca: 1812-1817”; [avant-propos] José V. de Pina Martins, Paris: Centro Cultural Português, 1973. ID. – “Les pamphlets portugais anti-napoléoniens”, Separata dos Arquivos do Centro Cultural Português, Paris: Fundação Calouste Gulbenkian, 1978.

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científico. A disposição física dos documentos reflectiu esse mesmo critério, criando secções artificiais e até uma duplicação de cotas, conforme se deduz da seguinte tabela:

Tabela 1 - “Fundo Barca-Oliveira” – Distribuição física dos documentos Caixas • 1 – 15 •1–5 • 6 – 12 • 13 • 14 – 15 • 16 • 17 • 18 – 19 • 20 – 34 • 35 – 40 • 41 • 42 • 43 • 44 – 45 • 46-47 • 48 • 49 • 50-51 • 52 • 53-54 • 55-61 • 62 • 63

Conteúdo • Conde da Barca: Correspondência particular • Conde da Barca: Diplomata • Conde da Barca: Ministro • Conde da Barca: Conselheiro de Estado • Conde da Barca: Ministério • Conde da Barca: Memórias • Conde da Barca: Diplomata e Ministro • Conde da Barca: Oficial – Brasil • [Caixas inexistentes] • Conde da Barca: Oficial – Memórias • Conde da Barca: Produção literária • Conde da Barca: Biblioteca • Conde da Barca: Biblioteca e Mercês • Conde da Barca: Administração de bens • Colecção de cartas de Francisco José Maria de Brito • [Caixa inexistente] • Arquivos de Francisco António de Araújo , de António de Araújo e de António Fernando (Abade de Lóbrigos) • Conde da Barca: Oficial • Cartas de Francisco José Maria de Brito • Conde da Barca: Biblioteca • Arquivo de João António de Araújo de Azevedo • Conde da Barca: Legislação brasileira • “Papéis” de Tomás Vicente Cabeças de Sousa

Centremo-nos exclusivamente nos documentos do conde da Barca. A disposição física dos documentos nas caixas acima referidas revela que os conceitos aplicados na descrição aniquilaram qualquer noção de organicidade ao advogar a criação de “conjuntos” documentais artificiais (a omissão de termos como secção, subsecção e série é intencional) baseadas em critérios tipológicos e temáticos, destacando-se dentro destes os acontecimentos históricos de grande notoriedade como “Preparativos militares do país”, “Partida da Corte para o Brasil”, “Invasão de Portugal”, “Tratados de comércio com a Inglaterra de 1809 e 1810”, entre outros. Para além disto, os documentos foram desprovidos dos vários contextos e micro-contextos do seu natural produtor e receptor, assistindo-se muitas vezes à separação física de documentos compostos e de processos.

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Antes de mais, convém referir que nenhum paradigma arquivístico contemplou tais práticas e que esta organização fere, até, os princípios fundamentais da Arquivística “clássica” como o da proveniência e o da ordenação original. A filosofia que esteve subjacente a este “arranjo” cai por terra se tivermos em atenção que os contextos em que se movimenta António de Araújo enquanto morgado, diplomata, ministro ou conselheiro de Estado, não são necessariamente os mesmos. E, neste pressuposto, não podem ser olvidadas as motivações e os efeitos de uma produção documental que está intimamente ligada à preponderância do contexto envolvente. Os exemplos do que se acaba de referir são variados: • desmembramento do documento composto, formado por uma carta de Charles Fraser, e uma memória intitulada Cursory observations on Brazil (…): a carta integrou a correspondência particular114 enquanto a memória permaneceu na secção “Oficial-memórias” 115; • a carta de José Egídio Álvares de Almeida, secretário particular do Príncipe Regente, datada de 19 de Março de 1814 foi colocada na “Correspondência Particular” 116 e afastada da extensa série de cartas que o mesmo autor enviou a Araújo entre os anos de 1806 e 1807117; • a correspondência dita “oficial” do conde de Vila Verde, Ministro do Reino, para António de Araújo de Azevedo, composta por cerca de 136 cartas e avisos permaneceram na caixa 7 – “Ministro”118, enquanto que o aviso de 6 de Junho de 1804, que nomeia Araújo para Ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, e que necessariamente sanciona aquela correspondência, foi “desviado” para a Secção “Mercês” localizada na caixa 43119; • as cartas patentes referentes à carreira diplomática de Araújo passaram a integrar a caixa 43120, enquanto que os despachos de Luís Pinto de Sousa,

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Carta de Charles Fraser para António de Araújo de Azevedo, datada do Rio de Janeiro, 1811. 06. 22. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/ CR/ DOC. 4,52,1 Cursory observations on Brazil tending to shew some of its transcedent natural, local & political advantages, which render it an asylum peculiarly illigible for the distressed peolple who have suffered, or would wish to fly from the miseries, & ruinous consequences of the Revolutions, tirany & bloodshed of Europe, & war in North America. By [Charles Fraser] a British Subject settled in Brasil. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/ DOC. 39, 35 116 Carta de José Egídio Álvares de Almeida para António de Araújo de Azevedo, datada do Rio de Janeiro, 1814. 03. 19. ADB/UMSIFAA/ SSC 08.01/ CR/ DOC. 1,8,1 117 Ver: Cartas de José Egídio Álvares de Almeida para António de Araújo de Azevedo, entre Janeiro de 1806 e Novembro de 1807. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/ DOC. 7, 167 – 7, 242 118 Ver: Cartas e Avisos do conde de Vila Verde para António de Araújo de Azevedo, entre Novembro de 1805 e Novembro de 1806. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/ DOC. 7,1 – 7, 136 119 Ver: Aviso do conde de Vila Verde para António de Araújo de Azevedo, datado de Lisboa, 1804. 06. 06. ADB/UM – SIFAA/SSC. 08.01/DOC. 43,15 120 Ver: Cartas patentes de António de Araújo de Azevedo. ADB/UM – SIFAA/SSC. 08.01/DOC. 43,8 – DOC. 43,13 115

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ministro dos Negócios Estrangeiros, que são o veículo das primeiras, permaneceram distribuídos pelas caixas 2 e 3121; • a distinção entre o particular e o oficial nas cartas de D. Rodrigo de Sousa Coutinho que foram divididas em duas partes, ficando uma na correspondência particular122 e outra na caixa 18 – “Brasil-Oficial”123. Todavia, o caso mais paradigmático foi, sem dúvida, o de Sebastião José de Arriaga Brum da Silveira, oficial de artilharia durante a Guerra Peninsular, que pela carta de 24 de Setembro de 1811 remeteu a António de Araújo um processo composto por atestações e outros documentos referentes aos seus serviços no intuito de ganhar alguma estima de pessoas de mérito como V. Ex.ª124. Esse processo, formado por trinta documentos numerados, dispostos por ordem sequencial e fisicamente unidos por uma linha, foi decomposto e os seus documentos distribuídos por várias caixas seguindo um critério tipológico.

Por outro lado, pressupõe-se que a constituição da “Correspondência Particular”, com mais de 2000 documentos retirados de várias caixas, teve por base uma avaliação da estrutura formal dos documentos que permitiu reconhecer nos mesmos um cariz estritamente pessoal. Outra das motivações residiu na intenção de agregar um vasto conjunto de nomes, glorificados pelas suas vivências e pela historiografia posterior, dos quais de destaca alguns exemplos das Belas Letras, como a marquesa de Alorna e Filinto Elísio; das Belas Artes como Francisco Bartolozzi, Francisco Tomás de Almeida, Gregório Francisco de Queirós e Henry l’Evêque; das Ciências, como o abade Correia da Serra, Félix de Avelar Brotero e o barão de Eschwege; das armas como o 3.º marquês de Alorna, Gomes Freire de Andrade, William Carr Beresford e o conde de Goltz; da política e diplomacia, como Martinho de Melo e Castro, o conde das Galveiras, o marquês de Marialva, o conde de Palmela, António de Saldanha da Gama, Rodrigo Navarro de Andrade, Cipriano Ribeiro Freire, Lord Robert Fitzgerald, Lord Holland, Charles Maurice de Talleyrand e o duque de Luxemburgo; da Igreja, como D. Gaspar de Bragança, D. Frei Manuel do Cenáculo e D. Mateus de Abreu Pereira, do comércio e indústria, como Jácome e Diogo Ratton e o barão de Quintela; e até de instituições como Junta da Administração da Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro. 121 Ver: Despachos de Luís Pinto de Sousa Coutinho para António de Araújo de Azevedo. ADB/UM – SIFAA/SSC 08.01/DOC. 2,143 – DOC. 224; DOC. 3,225 – 3, 272. 122 Ver: Cartas de D. Rodrigo de Sousa Coutinho para António de Araújo de Azevedo, entre Fevereiro de 1788 e Novembro de 1810. ADB/UM – SIFAA/SSC 08.01/CR-DOC. 7,16,1 – DOC. 7,16,14. 123 Ver: Cartas e avisos de D. Rodrigo de Sousa Coutinho para António de Araújo de Azevedo, entre Março de 1808 e Janeiro de 1811. ADB/UM – SIFAA/SSC 08.01/DOC. 18,2 - DOC. 18,30. 124 Ver: Carta de Sebastião José de Arriaga Brum da Silveira para António de Araújo de Azevedo, datada de Fronteira, 1811. 09.24. ADB/UM – SIFAA/SSC 08.01/CR/DOC. 14,14,1.

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Foi com esta estrutura que o “Fundo Barca-Oliveira” chegou até aos nossos dias. Em 1970, o acervo mantinha-se acondicionado em sala própria125 e continuava a captar as atenções dos investigadores portugueses e estrangeiros que aguardavam pela edição do respectivo inventário completo. O “fundo Barca-Oliveira” era então descrito de forma imprecisa, estando dividido em quatro núcleos: 1) a biblioteca – composta por 1300 títulos portugueses, franceses e em outras línguas, sobretudo referentes à Revolução Francesa, Guerras Napoleónicas e lutas em Portugal; 2) volumes de Manuscritos – que ainda estavam em catalogação; 3) caixas de documentação – que estavam somente colocados em maços dentro de caixas; 4) colecção de estampas – 58 “quadros” ou estampas, que ocupam metade das paredes da sala126.

Com a criação da Universidade do Minho, em 1974, o Arquivo Distrital de Braga e a Biblioteca Pública foram dissociados um do outro e incorporados na novel Academia como suas unidades culturais. A mudança reflectiu-se no “Fundo Barca-Oliveira” que sofreu uma separação: os manuscritos ficaram à guarda do A.D.B./U.M., enquanto os impressos permaneceram sob a custódia da B.P.B./U.M., conforme sugeria a natureza de cada um destes serviços. Na sequência dos fecundos trabalhos arquivísticos que marcariam o quotidiano do Arquivo Distrital nos anos epigonais, os manuscritos do “Fundo Barca-Oliveira” integraram o quadro de classificação da instituição, primeiro, como “arquivo de função”127 e, depois, como arquivo “diplomático” dentro da rubrica “Arquivos Privados e Semi-Públicos”128. Sessenta anos depois da incorporação e perante as inúmeras solicitações de vários investigadores, a Reitoria da Universidade do Minho, pelo despacho de 9 de

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A “Sala Barca-Oliveira” localizava-se no gabinete em frente à sala do Director do A.D.B., onde hoje está instalado o gabinete de informática. Agradeço a informação gentilmente cedida pelo Dr. Henrique Barreto Nunes, Director do Arquivo Distrital e da Biblioteca Pública de Braga. 126 Levantamento publicado por ROSÁRIO, Frei António do – “Notícias de alguns manuscritos e impressos na Biblioteca Pública e Arquivo Distrital de Braga”, in: Arquivos do Centro Cultural Português, Paris: Fundação Calouste Gulbenkian, vol. IV, pp. 700702. 127 Ver: VASCONCELOS, Maria da Assunção Jácome de – “O Arquivo Distrital de Braga”, in: FORUM, n.º 1, Braga: Universidade do Minho, 1987, p. 9. 128 ARQUIVO DISTRITAL DE BRAGA – Guia do utilizador, 1998-1999. Coordenação e textos de Maria da Assunção Jácome Vasconcelos, Braga: A.D.B., 1988, p. 4.

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Maio de 1986, sugeriu a elaboração de um inventário simples do arquivo do conde da Barca, tendo em vista a sua disponibilização imediata à consulta pública129. Este inventário, realizado de forma muito sucinta, debateu-se com as dificuldades geradas pelas intervenções dos anos 60 e 70. Assim sendo, a extensão e riqueza informativa dos documentos do conde da Barca consignaram-lhe uma posição dominante face aos “papéis” dos seus antepassados, irmãos e sucessores na Casa. Foi, então, identificado um grande núcleo documental o “Fundo do conde da Barca” composto

pelas

secções

“actividade

diplomática”,

“actividade

política”,

“correspondência particular”, “livraria” e “papéis pessoais”. Dentro destes “papéis pessoais” encontravam-se vários subfundos pertencentes aos irmãos e ao sobrinho do conde da Barca e, ainda, o Cartório da Casa de Sá e uma “Vária” composta por documentos de Tomás Vicente Cabeças de Sousa, por cartas de Francisco José Maria de Brito e por uma colecção de gravuras. (ver Anexo V). A realização do inventário de 1986 simbolizava, simultaneamente, o (re)início da cedência do acervo à consulta pública, mas também o fim de um ciclo do “Fundo Barca-Oliveira”. Novamente na ordem do dia, o conjunto documental seria, desde então, alvo de uma inovadora abordagem protagonizada por Armando Malheiro da Silva que, reconhecendo a existência de documentação produzida a montante e a jusante do conde da Barca, não hesitou em classificá-lo como um arquivo de família130. 2.1. O CONTRIBUTO DA CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO O trabalho de descrição documental foi retomado em 2001. A imperiosa necessidade de se disponibilizar à consulta pública a totalidade do “Fundo BarcaOliveira” impôs a obrigatoriedade de se completar a descrição da documentação remanescente tendo por base a estrutura delineada no referido inventário simples. A “Correspondência particular” do conde da Barca foi o campo da acção. Tratava-se de uma série artificial composta por documentos de diversas tipologias como cartas, requerimentos e representações, balizados cronologicamente pelos anos de 1788 e 1817.

129

Arquivo Administrativo do A. D. B./ U. M. – Despacho da Reitoria da Universidade do Minho de 09. 05. 1989. Ver: SILVA, Armando Malheiro da – “Arquivos de Família e Pessoais. Bases teórico-metodológicas para uma abordagem científica”, in: Arquivos de Família e Pessoais. Seminário, Vila Real: APBAD, 1997, pp. 96-98.

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Desfeita a sua localização topográfica natural, bem como os vínculos orgânicos, a solução imediata passou por um esforço de restituição dos anexos ao documento matriz, procedendo-se à reconstituição dos documentos compostos e dos processos. Foram reunidos os documentos do mesmo autor, dando origem a processos epistolográficos encabeçados pelo último apelido dos autores das cartas, os quais foram, depois, ordenados alfabeticamente segundo as convenções em vigor. Dentro de cada um destes processos, os documentos foram colocados por ordem cronológica. Todavia, durante a descrição catalográfica da “Correspondência Particular”, foram sendo identificados diversos contextos da vida do receptor desses documentos e, ao mesmo tempo, foi emergindo a noção de que a manutenção desta estrutura promovia a colisão de estatutos, de dinâmicas e de vivências do conde da Barca. Tal efeito revelava-se verdadeiramente nefasto e um verdadeiro obstáculo à compreensão do fenómeno de produção informacional decorrente durante a vida de António de Araújo, ao desprover os documentos de um contexto envolvente e, numa análise prospectiva, de poder obstar à problematização histórica do acontecimento e ao estabelecimento de quadros conjunturais e estruturais. A solução passou pela ruptura com as noções impostas pela Arquivística “clássica”, essencialmente incorporacionista e descritiva, concebida como uma disciplina auxiliar da História, que possuía as suas raízes no historicismo e positivismo emergentes a partir de meados do século XIX131. Tal medida, implicava, antes de mais, um afastamento do conceito de “fundo” criado por Natalis de Wailly para o tratamento descritivo a posteriori e que, portanto, coloca a tónica na descrição dos documentos tendo por base o seu valor secundário. A nossa abordagem passou a incidir na compreensão dos mecanismos que estiveram na base da produção informacional, sendo que para tal foi necessário interpretar o valor primário dos documentos em detrimento do secundário132. Antes de se iniciar a descrição da totalidade do acervo, composto por mais de 7400 documentos, foi necessário fazer uma análise das necessidades, diagnosticar os problemas e definir um programa de tratamento da informação assente no método

131 Ver: SILVA, Armando Malheiro da [et alli], Arquivística 1. Teoria e prática de uma ciência da informação […], 1999, p. 107115 132 O valor primário dos arquivos define-se como sendo a qualidade de um documento baseado nas utilizações imediatas e administrativas que lhe deram os seus criadores, por outras palavras, nas razões para as quais o documento foi criado […]; O valor secundário define-se como sendo a qualidade do documento baseada nas utilizações não imediatas ou científicas. […]. Ver:. ROSSEAU, Jean-Yves [et alli] – Os fundamentos da disciplina arquivística, Lisboa: Dom Quixote, 1998, pp. 117-118. Ver também PEIXOTO, Pedro de Abreu – “O valor dos arquivos de família”, in: Cadernos BAD, 1, Lisboa: APBAD, 1995, pp. 41-51.

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quadripolar de Paul de Bruyne, J. Herman e M. De Schoutheete, conforme é defendido pela Ciência da Informação133. A descrição catalográfica134 assentou na interdisciplinaridade que convoca a História e a Arquivística135, esta enquanto ramo teórico-prático de uma Ciência da Informação que […] investiga as propriedades e o comportamento da informação, as forças que regem o fluxo informacional e os meios de processamento de informação para a optimização do acesso e uso. Está relacionada com um corpo de conhecimento que abrange origem, colecta, organização, armazenamento, recuperação, interpretação, transformação e utilização da 136 informação Portanto, é a acção humana e social que gera e contextualiza a informação registada ou codificada num suporte, a qual está intrinsecamente ligada ao binómio informação-comunicação137, sendo por isso dinâmica, quantificável, reprodutível e transmissível138. Logo, a informação encontra-se intimamente ligada à preponderância do contexto envolvente e aos objectivos da acção. Neste sentido, contexto é um conceito operatório que se define como como uma unidade agregadora de elementos materiais (um edifício, um ou mais aposentos quaisquer que constitui cenário para a acção info-comunicacional), tecnológicos (mobiliário, material de escritório, computadores com ou sem ligação à Internet, etc.) e simbólicos (o estatuto e os papéis desempenhados pelas pessoas ou actores sociais) que envolvem o(s) sujeito(s) de acção infocomunicacional através de momentos circunstanciais delimitados cronologicamente (situação). Engloba dois tipos essenciais: o orgânico 133

Ver: SILVA, Armando Malheiro da [et alli]- Arquivística 1[…], 1999, pp. 217-226. Sobre a definição das tipologias de instrumentos de acesso à informação ver: RIBEIRO, Fernanda – O acesso à informação nos Arquivos, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian/ Fundação para a Ciência e Tecnologia/ Ministério da Ciência e do Ensino Superior, 2003, pp. 633-688. 135 Arquivística é uma ciência de informação social, que estuda os arquivos (sistemas de informação (semi-) fechados), quer na sua estruturação interna e na sua dinâmica própria, quer na interacção com os outros sistemas correlativos que coexistem no contexto envolvente. Ver: SILVA, Armando Malheiro da [et alli] – Arquivística 1 […], 1999, p. 214. 136 Ver: BORKO, Harold – Information Science: what is it?, apud SILVA, Armando Malheiro da – “Abordagem aos arquivos familiares e pessoais como sistemas de informação”, in: Arquivo & Administração, vol. 3, n.º 1/2, Jan.-Dez. 2004, Rio de Janeiro: Associação de Arquivistas Brasileiros, 2004, p. 23. 137 Ver: SILVA, ARMANDO Malheiro da - “Informação e comunicação”, in: A Informação. Da compreensão do fenómeno e construção do objecto científico, Porto: Edições Afrontamento, 2006, pp. 81-109. 138 Segundo Armando Malheiro da Silva e Fernanda Ribeiro, são seis as propriedades da informação: estruturação pela acção (humana e social) – o acto individual e/ ou colectivo funda e modela estruturalmente a informação; integração dinâmica – o acto informacional está implicado ou resulta sempre tantos das condições e circunstâncias internas, como das externas dos sujeito da acção; pregnância – enunciação (máxima ou mínima) do sentido activo, ou seja, da acção fundadora e modeladora da informação; a codificação línguistica, numérica ou gráfica é valorável ou mensurável quantitivamente; reprodutividade – a informação é reprodutível sem limites, possibilitando a subsequente retenção/memorização; transmissibilidade – a (re)produção informacional é potencialmente transmissível ou comunicável. Ver: SILVA, Armando Malheiro da; RIBEIRO, Fernanda – Das «ciências» documentais à ciência da informação. Ensaio epistemológico para um novo modelo curricular, Porto: Edições Afrontamento, 2002, p. 42 134

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e o efémero. O contexto orgânico pode ainda ser institucional (em que a unidade agregadora é determinada estruturalmente por uma instituição pública ou privada, mas com aparelho político administrativo) e informal (em que a unidade agregadora é determinada estruturalmente por entidades individuais e colectivas, sem ou com reduzido aparato burocrático e de génese e extinção rápidas139.

Retomámos a descrição documental incidindo sobre o cartório da Casa de Sá, onde foram encontrados documentos produzidos pelos antepassados e pelos sucessores do conde da Barca. Assim sendo, não se podia verificar a primazia de um fundo documental sobre os demais subfundos, baseada unicamente no valor quantitativo e qualitativo da informação que cada um deles encerra. Esta noção implicava a validação de uma estrutura interna do arquivo que consagra, efectivamente, uma hierarquia e uma subsidiariedade artificiais, porque inorgânicas, de um arquivo que foi sendo produzido ao longo dos séculos por uma entidade familiar na prossecução de objectivos concretos. Portanto, as nossas atenções derivaram imediatamente para a entidade produtora dessa documentação: os Araújos de Azevedo, da Casa de Sá, em Ponte de Lima, família nobre com instituto vincular, com raízes medievais na Galiza, que a partir de Quatrocentos se estabeleceram no Entre Douro e Minho, mais concretamente em Ponte da Barca, Arcos de Valdevez e Ponte de Lima. Na verdade, a existência e a persistência de documentação produzida entre os anos de 1479 e de 1875 por membros da família Araújo de Azevedo comprova, objectivamente, a utilidade da documentação que foi sendo produzida, acumulada, salvaguardada e recuperada na prossecução de objectivos tanto individuais como colectivos. O pólo estruturante da documentação cristalizada no suporte é a família, na qual se verifica que a heterogeneidade das partes não anula, antes reforça, a identidade fenoménica da mesma140. Neste sentido, consentindo na existência de uma permanente correlação entre as partes (os membros) e o todo (a família)141, emergiu a orgânica familiar que sustenta a estrutura interna de um Sistema de Informação que se entende

139 Ver: SILVA, Armando Malheiro da – A Informação. Da compreensão do fenómeno e construção do objecto científico, Porto: Edições Afrontamento, 2006, pp. 144-145 140 Ver: SILVA, Armando Malheiro da - “Abordagem aos arquivos familiares e pessoais como sistemas de informação”, […], Rio de Janeiro: Associação de Arquivistas Brasileiros, 2004, p. 43 141 Ver: IDEM, p. 26

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como uma totalidade formada pela interacção dinâmica das partes, ou seja [que] possui uma estrutura duradoura com um fluxo de estados no tempo142. O passo seguinte seria o de proceder à restituição virtual ao contexto originário de produção de toda a documentação existente no acervo, providenciando, assim, a metamorfose do “Fundo Barca-Oliveira” em Sistema de Informação Família Araújo de Azevedo. No entanto, à medida que foi sendo realizado o recenseamento da totalidade dos documentos, efectuou-se, também, o levantamento genealógico dos Araújos de Azevedo, tendo por base os nobiliários editados143. A genealogia permitiu reconhecer as vivências de cada um dos seus membros e a evolução estrutural da família, num permanente desenvolvimento e aperfeiçoamento de estratégias relacionadas com a conservação, reprodução e protecção socio-económica da mesma. Por outro lado, serviu de base ao primeiro instrumento/ produto da nossa abordagem: o quadro orgânicofuncional do Sistema de Informação Família Araújo de Azevedo (ver Anexo V), no qual estão identificadas as dez secções referentes a outras tantas gerações produtoras de informação. Dentro destas secções, identificadas pelos apelidos em uso, assinalamos as subsecções das quais a primeira corresponde ao casal administrador das propriedades familiares; a segunda ao marido e destina-se a englobar toda a documentação produzida até ao momento do casamento; a terceira, com as mesmas características, à esposa; e as subsequentes aos irmãos/ cunhados. Cada uma destas subsecções são identificadas pelos nomes completos dos produtores de informação e pelas suas datas de nascimento e de óbito (Ver Anexo V – SSC. 07). Por outro lado, durante a descrição documental observamos, também, a existência de documentação produzida por outras entidades familiares e institucionais com dinâmicas e orgânicas próprias, as quais devem ser entendidas como subsistemas de informação (ver Quadro 1).

142 143

Ver: IDEM – A Informação. […], 2006, p. 162 Ver os nobiliários citados na bibliografia geral.

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QUADRO 1 - FLUXOGRAMA DO SISTEMA DE INFORMAÇÃO FAMÍLIA ARAÚJO DE AZEVEDO Sistema de Informação

Subsistemas de Informação

S.01 Ssc.01.01 S.02

Cunha

Filgueira

Ssc.02.01 S.03

Pereira Filgueira

Ssc.03.01 S.04 Ssc.04.01

Pereira Pinto

Ssc.04.02

Gonçalves Barbosa

S.05 Ssc.05.01 Ssc.05.02

Barros Barbosa

Ssc.05.03 Ssc.05.04 S.06

Pereira Pinto, da Quinta de Nelas Brito Barreiros

Ssc.06.01 Ssc.06.02 Ssc.06.03 S.07

Araújo de Azevedo, da Quinta da Prova

Ssc.07.01 Ssc.07.02 Ssc.07.03 Ssc.07.04

Velho Fagundes

Ssc.07.05 Ssc.07.06 S.08 Ssc.08.01 Ssc.08.02 Ssc.08.03 Ssc.08.04 Ssc.08.05 Ssc.08.06 Ssc.08.07 Ssc.08.08 Ssc.08.09 S.09 Ssc.09.01 Ssc.09.02 Ssc.09.03 S.10 Ssc.10.01

Fernandes Bandeira

Bandeira

Cabeças de Sousa

A existência destes documentos na Casa de Sá pode ser comprovada de duas formas: pela realização de alianças matrimoniais que, não raras vezes, são o pretexto para a incorporação de dotes no património da família receptora e cuja posse é validada pela documentação que acompanha esse capital simultaneamente económico e simbólico; e pela doação de propriedades por elementos exteriores ao ramo principal da família que são legitimadas por instrumentos jurídicos como escrituras de doação, testamentos, etc.144. O passo seguinte consistiu na concepção de uma base de dados, baseada no instrumento de descrição multinível ISAD-G145, com as alterações propostas por Armando Malheiro da Silva146, que permitiu normalizar a descrição documental e fazêla convergir para uma única estrutura estabelecida pela dinâmica familiar imposta pelos documentos constantes no Cartório da Casa de Sá. Assim, da nova estrutura orgânica do Sistema de Informação Família Araújo de Azevedo, surgiu o conde da Barca como Subsecção 08.01. Antes de (re)debruçarmo-nos sobre os documentos deste diplomata e ministro, foi necessário proceder à recolha e análise crítica de toda a bibliografia passiva de António de Araújo de Azevedo, conforme apresentamos no capítulo 1 da II parte, de forma a identificar as suas múltiplas vivências e balizar cronologicamente o desempenho dos diversos e, por vezes, concomitantes cargos públicos. Assim, identificamos diversos contextos, sendo de salientar, o Morgado e Administrador de Propriedades, o Homem de Letras, o Enviado Extraordinário na Haia (1787-1802), o Ministro Plenipotenciário em Paris (1796-1798), o Ministro Plenipotenciário em São Petersburgo (1802-1803), o Ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra (1804-1808; 1815-1817), o Ministro do Reino (1807-1808; 1817), o Ministro e Secretário de Estado da Marinha e dos Domínios Ultramarinos (1814-1817), o Conselheiro de Estado (1807-1817), e o Presidente da Real Junta do Comércio (1807; 1817). Para descortinar não só o encaixe da documentação pessoal na familiar como, também, para respeitar os vários contextos em que foi produzindo e recolhendo a

144

A propósito das estratégias ou normas de sucessão na propriedade ver: DURÃES, Margarida – “No fim, não somos iguais: estratégias familiares na transmissão da propriedade e estatuto social”, in: Boletin de la Associación de Demografia Histórica, X, 3, 1992. (consultado a 22 de Outubro de 2006 no Repositorium dos Serviços de Documentação da Universidade do Minho: http://hdl.handle.net/1822/2839). 145 Ver: PEIXOTO, Pedro de Abreu – “A aplicação das ISAD(G) aos arquivos de família”, in: Páginas A&B (4), Lisboa: Edições Colibri, 2000, pp. 55-70. 146 Ver: SILVA, Armando Malheiro da – “Abordagem aos arquivos familiares e pessoais como sistemas de informação”, 2004, p. 35.

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documentação existente, foi necessário recorrer à organicidade pessoal que assenta na infância, adolescência/juventude e na adultez/ velhice147. Daqui emergiu uma complexa estrutura orgânica que requereu permanentemente a avaliação dos contornos formais dos documentos, de forma a providenciar a distinção entre os documentos de natureza privada e os documentos de natureza pública, estes produzidos no âmbito das suas funções. A grande questão que se colocava era, na verdade, a de se distinguir, dentro de cada uma das subsubsecções atrás descritas, quais os documentos que deviam ser integrados no Sistema de Informação e quais os que deviam ser restituídos aos subsistemas “de função”. A questão é assaz complexa, porquanto no Antigo Regime as práticas inerentes a cada uma das funções era fortemente condicionada pela tradição que permitia ao detentor dos cargos públicos assistir o expediente tanto em sua casa, como no gabinete do organismo a que pertencia148. Numa sociedade hierarquizada como a do Antigo Regime, em que se assiste a uma permanente defesa de privilégios e ao desenvolvimento de prática conducentes à manutenção do estatuto, o detentor de cargos oficiais, na sua vida privada, tem tendência para acumular documentação relacionada com o desempenho de funções, como cartas, requerimentos, etc., que nunca chega a tramitar no expediente da secretaria. Ora, esta situação implicou que muitos documentos de natureza privada integrassem fundos públicos e muitos documentos de natureza oficial permanecessem nos arquivos dos detentores dos cargos149, desconhecendo-se se a estas práticas estavam subjacentes ordens oficiais ou a mera casualidade. No caso da diplomacia, a situação parece ter sido flagrante, pois o diplomata era o responsável pela guarda e pela passagem do arquivo da legação e demais bens ao seu sucessor e no caso da inxesitência deste deveria conservá-los em seu poder. Podemos considerar que existiu uma certa “promiscuidade” entre o pessoal e o público que agrediu uma linha demasiado ténue mas que, todavia, era existente. 147

Ver: IDEM - p. 34. Um rápido olhar pelo Almanach do anno de 1807 demonstra inequivocamente o que acabamos de referir. Veja-se, por exemplo, a Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra onde se denota grande dispersão geográfica do seu pessoal com o ministro a assistir em Belém, o oficial maior ao Bom Successo, o oficial de línguas na Rua da Cruz, e os oficiais na rua da Cruz em Alcântara, na Junqueira, ao Livramento, na Calçada da Ajuda, etc. Ver: Almanach do anno de 1807, Lisboa: Impressão Régia, pp. 100-101. 149 Ver, por exemplo, a sinopse crítica dos arquivos pessoais e familiares em SILVA, Armando Malheiro da – “Arquivos de Família e Pessoais. Bases teórico-metodológicas para uma abordagem científica”, in: Arquivos de Família e Pessoais. Seminário, Vila Real: APBAD, 1997. 148

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No caso do desempenho de cargos ministeriais a questão adensa-se, pois, em Novembro de 1807, quando se procede à transferência da corte para o Brasil, foi o próprio ministro e secretário de Estado o responsável pela arrumação e pelo encaixotamento dos documentos e outros bens pertencentes à Secretaria de Estado, bem como, pelo seu transporte para o Brasil150. Já depois da chegada aos trópicos, seria o novo Ministro e Secretário dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, D. Rodrigo de Sousa Coutinho, a solicitar a António de Araújo a remessa da cifra grande que servia na Secretaria de Estado151, a ordenar a entrega no Arquivo Militar de todos os mapas pertencentes ao Arquivo de Lisboa152, ou até sugerir, com alguma ironia, que Não se achando registada nos livros respectivos, que se remetterão para esta Secretaria de Estado, a correspondência de Paris e Madrid de 1807 até ao momento da retirada de S. A.R. para este continente, que necessariamente há-de ser interessante; e convindo muito que ella aqui exista, tenho de rogar a V. Ex.ª queira remetter-me estes papeis no cazo que ainda os conserve em seu poder153.

Como já aqui referimos, a distinção entre documentos privados e públicos é ténue mas existe. A coexistência de ambos no arquivo do conde da Barca impõe a necessidade de se proceder à análise das formas protocolares do texto, documento a documento, recorrendo ao contributo da Diplomática, para se poder distinguir entre os que são de foro privado e os que conheceram tramitação no expediente dos organismos onde desempenhou tarefas. Dessa distinção, resultará a redistribuição virtual dos documentos particulares pelas várias subsecções e subsubsecções do Sistema de Informação e a restituição dos documentos que tramitaram no organismo em que prestou funções pelos subsistemas de informação “de função”, que serão descritos organicamente atendendo ao enquadramento administrativo que estava devidamente instituído e regulamentado pelas instruções, normativas e pela legislação em vigor ao tempo do exercício dessas funções.

150

Ver: SCHWARCZ, Lília Moritz – A longa viagem da biblioteca dos Reis: do terremoto de Lisboa à Independência do Brasil, São Paulo: Companhia das Letras, 2002, p. 210. 151 Ver: Aviso de D. Rodrigo de Sousa Coutinho para António de Araújo de Azevedo, datado do Rio de Janeiro, 1808. 03. 24. ADB/UM – SIFAA/ SSC 08.01/ DOC. 18,3. 152 Ver: ID., datado do Paço [do Rio de Janeiro], 1808. 06. 02. ADB/UM – SIFAA/ SSC 08.01/DOC. 18,7. 153 Ver: ID., datado do Palácio de Santa Cruz, 1809. 09. 20. ADB/UM – SIFAA/ SSC 08.01/DOC. 18,26.

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II PARTE A GÉNESE DO ARQUIVO

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CAP. 1 - ANTÓNIO

DE

ARAÚJO

DE

AZEVEDO,

ENTRE O ELOGIO E A

DETRACÇÃO. SINOPSE CRÍTICA DAS ABORDAGENS BIOGRÁFICAS

Cada geração refaz a sua história, não sobre as ruínas, mas sobre as aquisições da geração precedente. R. Marichal154

É sabido que nos últimos anos do século XVIII e nas primeiras duas décadas do seguinte, Portugal assistiu a um confronto entre a monarquia absoluta e patrimonialista e os novos paradigmas políticos que emergiram da Revolução Francesa de 1789. António de Araújo de Azevedo, nobilitado como conde da Barca já no final da sua vida, foi um dos principais actores sociais deste tempo de charneira, tendo desempenhado os mais relevantes cargos na estrutura político-administrativa do Estado português. O conhecimento que hoje detemos sobre o personagem começou a ser construído ainda em sua vida, através do intenso debate promovido pela imprensa periódica portuguesa em Londres, passou pelas abordagens biográficas imbuídas de um espírito erudito-metódico, por estudos parcelares publicados em revistas científicas, ganhou forma, ainda, através da edição de fontes arquivísticas, de verbetes em dicionários temáticos e enciclopédias e, ainda, de memórias particulares de vários autores coevos. Assim, importa abordar de forma crítica os vários escritos publicados em diferentes

contextos,

seguindo

diversas

escolas

historiográficas,

para

tentar

compreender se, hoje, se pode falar em Memória histórica do conde da Barca, entendendo por isto o conhecimento comum, ou se se pode atribuir um conhecimento

154 Ver: MARICHAL, R. – “Critique des textes”, in: SAMARAN, C. (dir. de) – L’Histoire et ses méthodes, p. 1350, cit. por MENDES, José Amado Mendes – A História como ciência. Fontes, Metodologia e Teorização, Coimbra: Coimbra Editora, 1987, p. 135.

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histórico eminentemente crítico e científico sobre o homem e a sua interacção no contexto envolvente. Apesar de não sermos capazes de perscrutar o consciente ou o inconsciente de cada um dos vários autores que se dedicaram ao tema, podemos, de uma forma objectiva, contribuir para a compreensão do contexto em que escreveram, dos assuntos que abordaram e da forma como o abordaram, salientando se houve diversidade metodológica ou ausência de método, se houve ou não variedade ideológica que tivesse condicionado a escrita e, finalmente, elucidar se este vasto rol de estudos produziu mutações ou variações significativas no processo de conhecimento sobre o objecto de estudo. A revisão crítica do processo de construção da imagem histórica em que o historiador/ investigador cria e condiciona, tenta compreender se António de Araújo de Azevedo possui, aos nossos olhos, uma imagem polissémica ou, pelo contrário, uma configuração bem definida e em que medida é que essa imagem pode condicionar o interesse pelo seu arquivo e livraria. No fundo, trata-se de uma sinopse que incide sobre a extensa lista de bibliografia passiva, que servirá de antecâmara para a segunda parte desta tese: a aplicação de uma alternativa metodológica capaz de providenciar a compreensão das estruturas que estão subjacentes ao fenómeno de produção informacional que está contido no seu arquivo. 1. A ORIGEM DO DEBATE 1.1. OS PERIÓDICOS PORTUGUESES EM INGLATERRA O primeiro dos palcos onde se assistiu ao debate em torno de António de Araújo de Azevedo foi o da imprensa periódica portuguesa publicada em Londres, que, durante os anos de 1808 e 1819, concedeu aos próprios protagonistas dos acontecimentos políticos a oportunidade de esgrimirem argumentos. A questão era recorrente: a opção pelo estabelecimento de uma aliança com a Inglaterra ou com a França e, consequentemente, a atribuição de responsabilidades, entre os partidários de uma e de outra facção, na partida do Príncipe Regente para o Brasil em 1807. São textos marcados pelo contexto envolvente, ou seja, por um reino “destituído” da sua Coroa. O confronto entre os tradicionalistas e os adeptos dos novos paradigmas políticos, para além de lançar na opinião pública as acusações e as tensões existentes entre as - 48 -

camarilhas cortesãs, vai contribuir significativamente para o descrédito da ordem política e social vigente. A partir de 1808 assiste-se à partida para Inglaterra de um conjunto de individualidades portuguesas que, a coberto da liberdade de imprensa vigente naquele país, vão procurar obter uma opinião pública mais visível através do lançamento de vários periódicos, que assumiram feições liberais ou proto-liberais, tendentes a alargar os horizontes políticos da sociedade portuguesa. Os periódicos portugueses da primeira vaga de emigração liberal tornavam-se, pois, em espaços de intervenção onde a história se discute e reinterpreta. A discussão pública que promoveram em torno do “Portugal Velho” e das suas decadentes estruturas políticas e sociais é também um debate em torno dos protagonistas políticos e de um vasto leque de actores sociais. É neste contexto que surgem, entre outros, o Correio Brazilense ou Armazém Literário (18081822), o Investigador Português em Inglaterra (1812-1818), O Portuguez ou o Mercúrio Político, Comercial e Literário (1814-1821) e O Campeão Português ou o Amigo do Rei e do Povo (1819-1821). O primeiro destes periódicos a debruçar-se sobre a crise diplomática e política de 1806 e 1807 foi o Correio Braziliense, redigido por Hipólito José da Costa, homem com ligações à maçonaria, que recebia o apoio “oficial” de D. Domingos de Sousa Coutinho, embaixador português em Londres, em nome do governo do Rio de Janeiro. Apesar da sua extraordinária operosidade e combatividade, o redactor estava longe de ser um personagem probo e consensual, mesmo entre os publicistas coetâneos. Se para o liberal José Liberato Freire de Carvalho não tinha probidade alguma política e indiferentemente vendia a sua pena a quem melhor lhe pagava155, já para o tradicionalista José Agostinho de Macedo era notório o seu impacto, pois o Correio causava tantas perturbações na sociedade portuguesa como os exércitos franceses156. Logo em 1808, o primeiro ano da sua publicação, Hipólito José da Costa lançava na opinião pública a acusação de que António de Araújo de Azevedo, principal figura do ministério português, ocultara ao Príncipe Regente a marcha do exército de Junot157. A denúncia de uma certa conivência do Ministro dos Negócios Estrangeiros português com o invasor francês podia parecer inócua mas, na verdade, não o era, pois sabia-se que o Correio era, não só, o jornal mais lido, como o mais notável, tanto pela sua 155

Ver: Memórias da vida de José Liberato Freire de Carvalho, Lisboa: Typographia de José Baptista Morando, 1855, p. 194. Ver: O Espectador, vol. II, p. 85 cit. por TENGARRINHA, José – História da imprensa periódica portuguesa, 2.ª ed. revista e aumentada, Lisboa: Caminho, 1989, pp. p. 86. 157 Ver: Correio Braziliense ou Armazém Literário, Londres, vol. I, n.º 6, Novembro de 1808, pp. 519-520. 156

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redacção, como pela guerra crua que fazia aos governantes158 e, para além disso, Hipólito regozijava-se publicamente pelo facto de se ler o Braziliense ate no Paço, sem rebuço algum159. Portanto, o impacto da acusação de traição à Pátria não demoraria a fazer-se sentir. Logo nesse mesmo ano, José Anselmo Correia Henriques, futuro conde de Seisal, embaixador português na Suécia, em dois artigos no Courier exigia ao redactor do Correio a pronta refutação de semelhantes acusações e, simultaneamente, lançava a defesa da conduta de António de Araújo160. Entretanto, o debate extravasou a imprensa e, em Lisboa, a defesa de António de Araújo publicou um opúsculo intitulado Provas da falsidade e injustiça com que o editor do Correio Braziliense intentou desacreditar António de Araújo de Azevedo, o qual analisava as minudências da questão, combatendo as injustas e infames invectivas proferidas contra o carácter e honra daquele distinto homem público161. Aquela primeira denúncia, que provavelmente teve a sua génese nos círculos próximos da Inglaterra, abrira o caminho para um debate essencialmente político que se adivinhava activo e, sobretudo, longo, dadas as características dos intervenientes. Se, por um lado, se assistia às acusações mútuas entre os próprios “actores” dos acontecimentos políticos de 1806 e 1807, por outro lado, existia uma imprensa com objectivos bem distintos, interessada, sobretudo, em servir de veículo de transmissão para a opinião pública e, assim, proporcionar uma participação alargada da sociedade neste debate sobre a sucessão de acontecimentos confidenciais que se registaram nos altos círculos de um sistema político em manifesta crise de autoridade. Em 1810, Hipólito dava um novo alento à questão. Primeiro, no mês de Junho, retracta-se publicamente, conforme lhe tinha sido exigido, atribuindo as suas declarações à pressão que sobre ele exercera D. Domingos de Sousa Coutinho162, um dos principais defensores da aliança política com a Inglaterra, e depois, em Setembro, publica uma carta anónima em defesa de António de Araújo de Azevedo163. Esta nova posição de Hipólito vinha comprovar inequivocamente que, já em 1810, existiam 158

Ver: SORIANO, Simão da Luz – História da Guerra Civil e do Estabelecimento do Governo Parlamentar em Portugal, 2.ª época, tomo II, pp. 450-452, cit. por TENGARRINHA, José - ob. cit., p. 86 159 Ver: TENGARRINHA, José - ob. cit. 160 Não pudemos consultar estes dois artigos. Ver a sua referência em PINTASSILGO, Joaquim, Diplomacia, política e economia na transição do século XVIII para o século XIX : o pensamento e acção de António de Araújo de Azevedo (Conde da Barca), Tese de mestrado em História, apresentada à Faculdade Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova Lisboa, 1987, vol. 1, pp. 59-60. 161 Ver: Provas da falsidade e injustiça com que o editor do Correio Braziliense intentou desacreditar António de Araújo de Azevedo, e algumas reflexões acerca desse jornal offerecidas aos seus leitores, Lisboa: Na Nova Officina de João Rodrigues Neves, MDCCCX. 162 Ver: Correio Braziliense (…), vol. IV, n.º 25, Junho de 1810. 163 Ver: [Carta anónima em defesa do futuro conde da Barca], in: Correio Braziliense (…), Londres, vol. IX, n.º 52, Setembro de 1812, pp. 562-568.

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dissenções entre o Correio e o embaixador português, as quais viriam a culminar, dois anos depois, com a retirada do apoio oficial ao periódico por parte da embaixada e, consequentemente, com um reorientação editorial do jornal que passou a ter como objectivo a independência do Brasil164. Em 1812, o debate em torno do ministério de 1804-1808 mudava de proscénio com a utilização do Investigador Português em Inglaterra que, nesse ano, havia sido fundado por iniciativa do embaixador com o intuito de combater a influência nefasta que o Correio Braziliense vinha adquirindo. A redacção do Investigador Português em Inglaterra esteve inicialmente nas mãos dos médicos Bernardo José de Abrantes e Castro e Vicente Pedro Nolasco da Cunha, a que depois se juntou um terceiro, Miguel Caetano de Castro, sendo que, em 1814, chegava José Liberato Freire de Carvalho que emprestou ao jornal uma tendência mais independente ao lançar a defesa das ideias liberais em toda a sua plenitude. Ostentando claras influências enciclopedistas, o Investigador Português publicava, não só, estudos e críticas científicos e literários165, como também, noticiava amiudadamente as principais ocorrências políticas, sociais e militares tanto portuguesas como europeias, proporcionando a discussão alargada de uns e de outros, através de uma dinâmica secção de correspondência. É nesta secção que, em 1812, são publicadas as 12 observações justificativas do Exmo. Senhor António de Araújo de Azevedo, subscritas por Manuel Pereira de Faria166 que vieram finalizar o primeiro momento do debate em torno dos acontecimentos políticos registados em Lisboa nos momentos que precederam a partida da corte para o hemisfério sul. Durante os cinco anos epigonais a contenda aquietou e esse facto deve-se, talvez, a duas razões: a primeira, prende-se com a morte de D. Rodrigo de Sousa Coutinho, Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, que era o principal rosto da oposição à política que Araújo desenvolvera e que com o seu irmão embaixador em Londres defendera a aliança com a Inglaterra; a segunda, deve-se ao progressivo afastamento da influência inglesa na Corte do Rio de Janeiro que permitiu um progressivo ressurgimento de António de Araújo até ao ano de 1814 em que regressou ao ministério através da pasta da Marinha e dos Domínios Ultramarinos. A inegável importância que António de Araújo detinha neste seu segundo fôlego político

164

Ver: TENGARRINHA, José - ob. cit., p. 50. Ver: IDEM, p. 87. 166 Ver: Investigador Português em Inglaterra, vol. III, n.º 12, Junho de 1812, pp. 54-64. 165

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era por demais evidente e é nesta perspectiva que se compreende que só após a sua morte, em Junho de 1817, é que vai ser retomada a questão da partida da Corte. Assim, o ano de 1817, proporcionava a João Bernardo da Rocha Loureiro o ensejo de promover a discussão pública quando decidiu noticiar n’O Portuguez a morte do conde da Barca e, paralelamente, esboçar um juízo crítico da sua actuação política e social, onde se denota alguma condescendência com o desempenho social mas uma forte clivagem nos actos governativos no Brasil. Para Rocha Loureiro, Araújo não devia ser confundido com os péssimos Ministros, que viéram depois de Pombal, pois era inclinado a favorecer as lettras, e os homens que as cultivam; talvez porque elle d’ahi quizesse ser tido como homem de lettras. Araújo teria sido como todos sabem, mui abocanhado de traidor, mas mui injustamente porque o facto de ter preferido uma aliança com a França, opção que talvez derivasse da sua longa estada nesse país, não devia ser interpretado como um crime, mas sim, como um erro de systema político, que não lhe deixava ver que Portugal podia tornar-se independente d’allianças. Para este publicista, se, por um lado, era notório que Araújo em tempos difficeis fez à pátria serviços relevantes, por outro, não estava isento de responsabilidades no estado actual da monarquia portuguesa porque os dois maiores erros do seu ministério foram, a louca e funesta expedição de Montevideo (aonde agora os nossos se acham encurralados, como o haviamos previsto) e o systema prodigo de destruir Portugal para augmentar o Brazil: Deos lho perdoe!167.

Esta tomada de posição do redactor d’O Portuguez estava intrinsecamente ligada às características de um jornal que emergira do seio da burguesia168 destinado a corporizar a luta contra os abusos do governo, e a advogar descobertamente a necessidade de reformas, e do estabelecimento do systema monarchico-representativo em Portugal169, ou seja, bater-se pela hegemonia do reino europeu sobre o americano170, ao contrário da linha que, nesta altura, era seguida por Hipólito José da Costa e o seu Correio Braziliense. A partir desta altura, o debate deixava de estar centrado, unicamente, na análise das causas da partida da corte para o Brasil e resvalava para a discussão das motivações da longa permanência do Rei no hemisfério sul, opção 167

Ver: [Juízo critico do ministério de António de Araújo de Azevedo], in: O Portuguez ou Mercúrio Político, Comercial e Literário, Londres: Impresso por W. Lewis, Julho de 1817, pp. 957-958, cit. por BRUM, J. Z. Meneses – ob. cit., pp. 18-19. 168 Ver: TENGARRINHA, José – ob. cit., pp. 83; 92-93. 169 Ver: SILVA, Inocêncio Francisco da – Diccionário Bibliographico Portuguez, Tomo III, Lisboa: Na Imprensa Nacional, MDCCCLIX, p. 326. 170 Ver: TENGARRINHA, José - ob. cit., p. 88.

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que votava Portugal a um abandono sistemático e extremamente prejudicial num tempo de paz generalizada. A mesma questão será aflorada no Campeão Português ou o Amigo do Rei e do Povo, periódico fundado por José Liberato Freire de Carvalho em 1819 e aquele que teve mais directa influência na opinião pública pela erudição do seu fundador e o prestígio do seu nome171. Situando-se na linha reformista do constitucionalismo monárquico172, o Campeão Português opôs-se com veemência à política “brasileira” da Corte e, por aí, se compreende as intenções de Liberato ao dar eco a um libelo anónimo de teor político intitulado As quatro coincidências de datas que viera a público nesse mesmo ano em Paris173. O libelo visava, no seu âmago, ilibar os partidários da aliança com a Inglaterra das culpas pelo desfecho da crise que culminou com a transmigração da corte e com a invasão de Junot, razão primeira do desamparo a que Portugal fora votado. Num discurso directo, o seu autor, que se supõe ser D. Domingos de Sousa Coutinho174, propunha-se divulgar unicamente os factos que conserva na memória, porque não tenho à mão os meus papéis, e menos ainda os documentos officiaes que de necessidade deveria consultar para a análise de um assunto desta importância, mas sempre ressalvava que o mesmo mereceria, sem dúvida, a redacção de um Ensaio Histórico175. A acusação, desta feita, andava em torno da insensatez do ministério português nas negociações com a França e com a Inglaterra, em 1806 e 1807, que, por um lado, fizera com que o Príncipe Regente desconhecesse a marcha do exército de Junot quando já estava em território nacional e, por outro, quase que se via bloqueado pela esquadra inglesa que aportara ao largo de Lisboa para fazer face à continuada condescendência portuguesa perante as exigências francesas. Para sustentar a sua tese, apresentava uma cronologia exacta das acções que o seu autor desenvolvera em Londres e que ofereceram à corte portuguesa, sempre em antecipação às exigências francesas, os meios necessários para a defesa e a salvação da coroa portuguesa. Argumentava, ainda, que todos sabiam que, depois da batalha de Friedland e das negociações de paz iniciadas em Tilsit, em 1807, Bonaparte não tardaria a direccionar as suas atenções para o 171

Ver: ARRIAGA, José de – História da Revolução Portuguesa de 1820, tomo I, p. 487 cit. por TENGARRINHA, José - ob. cit., p. 88. 172 Ver: TENGARRINHA, José - ob. cit., p. 88. 173 Ver: “As quatro coincidências de datas”, in: O Campeão Portuguez ou o Amigo do Rei e do Povo, vol. 1, N.º V, Setembro de 1819, Londres: Impresso por L. Thompson, pp. 151-159; N.º VI, pp. 187-195. 174 O facto do narrador não se identificar, mas de referir que se encontrava na legação portuguesa em Londres a partir de 1803, bem como, a forma como se movimentava nos círculos de poder, parece indicar inequivocamente que o redactor deste opúsculo foi de facto D. Domingos António de Sousa Coutinho. Ver: “As quatro coincidências de datas”, p. 157. 175 “As quatro coincidências de datas…”, p. 152.

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projecto da Península Ibérica e que só o governo português descansava tranquilamente sobre a fé de um Tratado de neutralidade que havia comprado quatro anos antes176, deixando, assim, o reino à mercê de uma invasão que parecia inevitável mais cedo ou mais tarde177. No mês de Outubro do mesmo ano, o redactor do Campeão Português, invocando uma rigoroza imparcialidade mas, ao mesmo tempo, exigindo um debate com a decência, e moderação que a importância do objecto exige, publicava uma carta assinada por Vindex acompanhada de uma Representação que a S. M. fez António de Araújo de Azevedo no anno de 1810178. Segundo o subscritor da carta, a publicação da Representação, que tinha obtido de pessoa muito respeitável do Rio de Janeiro, configurava-se como um esclarecimento necessário pois se o principal dos accusados he morto, um dos principaes accusadores ainda he vivo, e sem pretender avaliar os merecimentos de um e de outros, era justo que o público conhecesse os factos de forma imparcial para que elle e a posteridade fação o juízo que bem lhes parecer179. Vinha, então, a público uma Representação, concebida confidencialmente e assim apresentada ao Príncipe Regente em 1810, na qual Araújo pretendendo justificar-se perante o soberano, manifestava o seu desagrado pela forma como se sentia injuriado por um modo atroz pelos caluniadores conde de Linhares e seu irmão D. Domingos180 que tinham procurado denegrir no publico a minha reputação181 através dos jornais e dos círculos de poder no Brasil e em Inglaterra. Ao mesmo tempo, Araújo desferia um implacável ataque aos seus opositores acusando D. Rodrigo de Sousa Coutinho de romper o seu sigilo ao relatar a seu irmão em Londres as matérias debatidas em Conselho de Estado182 e incriminando o mesmo D. Domingos por ter obrado em linha contrária à da sua Corte ao anuir à pretensão de Lord Sidmouth de forçar Portugal a romper a neutralidade183. E para finalizar Araújo sustentava que Ninguém me pode julgar senão V. A.R. porque conhece o meu carácter, o amor e fidelidade com que sempre o servi, e todos os factos particulares do meu ministério. Se eu fui parcial em política, V.A.R. o pode também decidir: por muitas vezes teve a bondade de me dizer que estimaria que os meus inimigos me ouvissem para ficarem confundidas 176

Ver: “As quatro coincidências […]”, p. 153. Ver: IDEM, pp. 153-154. 178 Ver: “Representação que a S. M. fez António de Araújo de Azevedo no anno de 1810”, in: O Campeão Portuguez ou o Amigo do Rei e do Povo, vol. 1, N.º VI, Outubro de 1819, Londres: Impresso por L. Thompson, pp. 266-274. 179 Ver: IDEM, p. 267. 180 Ver: IDEM, p. 268. 181 Ver: IDEM, p. 270. 182 Ver: IDEM, p. 269. 183 Ver: IDEM, p. 272. 177

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as suas calumnias. O certo he que nunca o governo Inglez publicou coiza alguma contra o meu ministério; nem Bonaparte teve que allegar a este respeito no seu Manifesto. Intentão agora os meus detractores, entre outras falsidades imputar-me o execrável crime de querer entregar a V. A.R., não lhe participando a marcha do exercito Francez […] bem como de ter fornecido víveres ao mesmo exército184.

Sustentando que jamais podia abandonar a minha honra, porque em tal caso seria indigno de servir o meu Príncipe185, António de Araújo suplicava que, por justiça, o Príncipe Regente fizesse patente por um Decreto, que desça aos tribunaes, a lealdade, e honra com que sempre o servi186. A resposta do Príncipe fez-se através da outorga da Grã-Cruz da Ordem de Cristo a António de Araújo nesse mesmo ano, ressalvando os merecimentos, e os distinctos serviços que com zelo honra, e acerto me tendes feito […] correspondendo à justa confiança que sempre me merecestes187. O facto de virem a público as acusações que Araújo expressara ao Príncipe Regente em privado e a condescendência deste perante a argumentação apresentada acicatou ódios antigos e, a partir deste momento, os detractores da política do ministério de 1804-1808 passaram para o mero ataque pessoal, por vezes com contornos coléricos, tecendo considerações sobre a personalidade e a forma como António de Araújo tinha ascendido aos mais altos cargos públicos. Essa foi a tendência evidenciada pelo Português Velho, em Abril de 1820, quando escreveu uma carta ao redactor do Campeão Português defendendo que a Representação de 1810 tinha sido forjada com a única intenção de calumniar os irmãos Souzas e, ao mesmo tempo, estranhou que com a sua publicação o amigo do ministro António de Araújo não tivesse receado acordar as memórias do público por factos notáveis que provam, pelo menos, a incapacidade deste individuo conhecido da nossa nação e de toda a Europa188. O Português Velho propunha-se recordar apenas factos notórios e indisputáveis, mas sempre ia lembrando que as culpas mais graves estão sepultadas nos arquivos e papéis diplomáticos cabendo aos diplomatas e aos historiadores o indagarem, e produzirem mil outros,189. O seu único propósito era o de defender a Nação contra semelhantes indivíduos, sustentando que todo o bom Portuguez deve lamentar que semelhante homem fosse chamado a reger importantes 184

Ver: IDEM, pp. 270-271. Ver: IDEM, p. 271. 186 Ver: IDEM, p. 273. 187 Ver: IDEM, p. 274. 188 Ver: “Carta do Português Velho ao Redactor de O Campeão Português”, in: O Campeão Português …, vol. II, n.º XX, 16 de Abril de 1820, pp. 284-286. 189 Ver: IDEM, p. 284. 185

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cargos, e indevidamente premiado com títulos e honras190 e apelava, ainda, a Deus para que defendesse a Pátria de ser regida por Araújos e seus sequazes!191. Araújo, que tinha entrado na carreira diplomática bafejado pela protecção de mulheres, e protegido pelo Mariano confessor192, demonstrara desde os tempos da Haia e de Paris ser um mau vassalo, e quando ingressou no ministério, graças à intervenção do general Lannes e de Talleyrand, revelou ser mao ministro pois conduziu as negociações de 1806 e 1807 de forma tão insensata que só por um feliz acaso S.A.R. conseguiu embarcar para o Brasil e escapar ao exército de Junot193. E não obstante ter sido votado ao ostracismo ministerial durante os primeiros tempos no Brasil, Araújo seria novamente chamado ao Conselho de Estado por paga da sua approvação dada ao Tratado de commercio de 1810, de cujo beneplácito lhe resultaram as mercês obtidas, continuando assim a demonstrar a sua inépcia como homem público194. O ano de 1820 trazia o mais forte ataque contra António de Araújo através da edição do tal “Ensaio Histórico”. A Resposta Pública à denúncia secreta da autoria de R. da C. Gouveia195 vinha rebater, de forma mais substancial, a Representação […] de 1810. Trata-se de um libelo extenso, baseado em correspondência diplomática, destinado a reescrever a História recente e a impor uma verdade axiomática - a verdade do “partido inglês” - ilibando os condes de Linhares e do Funchal das motivações da partida da corte para o Brasil. Segundo R. da C. Gouveia, pseudónimo de D. Domingos de Sousa Coutinho196, a extraordinária oposição que se verificou entre os dois irmãos e António de Araújo emergiu por alturas do tratado de 1797197 e agravou-se com a entrada de Araújo no Ministério em 1804, devido ao differente modo de pensar sobre o systema que a Portugal convinha seguir a respeito da França Revolucionária198. Aos olhos de Gouveia, António de Araújo era um bajulador, um homem isento de mérito, que desempenhara a função ministerial mantendo uma relação aleivosa com o Príncipe Regente, pois como homem dado à intriga, os seus princípios foram contrários a todos os recebidos em Política estando empenhado em 190

Ver: IDEM, p. 284. Ver: IDEM, p. 286. 192 Sublinhado do autor. 193 Carta do Português Velho ao Redactor de O Campeão Português, in: O Campeão Português …, vol. II, n.º XX, 16 de Abril de 1820, p. 285. 194 Sublinhado do autor. IDEM - p. 286. 195 Ver: Resposta Pública à denúncia secreta que tem por título “Representação que a Sua Magestade fez António de Araújo de Azevedo em 1810”, offerecida ao juízo do público e da posteridade (para que appellou o Correspondente do Campeão Portuguez,) por seu autor R. da C. Gouveia, Londres: R.E.A. Taylor, 1820. 196 Segundo Inocêncio, se a autoria deste opúsculo não pertence a D. Domingos de Sousa Coutinho, dúvida alguma há que ele ao menos tenha colaborado para a sua redacção brindando o seu autor com os necessários documentos diplomáticos para a realização de uma obra desta natureza. Ver: SILVA, Inocêncio Francisco da – Dicionário Bibliográfico […], tomo I, MDCCCLVI, p. 89. 197 Ver: Resposta Pública à denúncia secreta que tem por título (…), p. 136-138. 198 Ver: IDEM, pp. 49; 102. 191

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sacrificar a Independência, e a Dignidade do Monarcha a todos os caprichos do Governo Revolucionário, e ao de todos os seus Generaes, Comissários, e Agentes – pagar-lhe tributo para não ter guerra – admittir suas tropas, e mantê-las – dar-lhe suas Praças em refems, &c. &c. &c.199

O ponto alto da crítica ocorre quando, pela primeira vez, Araújo é acusado de partidista francês e de ter ocultado a marcha de Junot ao Príncipe Regente nestes termos Por huma de duas razoens aquelle Ministro da Guerra não informou a S. M.; ou porque não sabia da marcha dos Francezes, ou porque a queria ocultar. No 1.º caso a sua ignorância o declara incapacíssimo do lugar que occupava; no 2.º caso nada menos que huma forca devia ser o premio dos seus merecimentos200.

Depois desta breve resenha podemos retirar duas ideias. Em primeiro lugar, importa referir que, doze anos depois do seu início, a imprensa periódica portuguesa em Londres difundiu junto da opinião pública a certeza da existência de dois grupos distintos na Corte que personificavam diferentes soluções na política do Reino. O desfecho da intriga palaciana era já conhecido, e sentido, por todos. Perante um reino acéfalo, o regime político vigente estava irremediavelmente desacreditado. Em segundo lugar, o debate em torno do ministério liderado por António de Araújo resvala para a acusação pessoal, iniciando assim uma longa tendência que analisa as duas primeiras décadas de Oitocentos, quase exclusivamente, à luz da contenda entre “anglófilos” e “francófilos”. 1. 2. O “ELOGIO HISTÓRICO” E O RECRUDESCIMENTO DA ACUSAÇÃO Em 1819, Sebastião Francisco de Mendo Trigoso, secretário da Academia Real das Ciências, tornava-se no primeiro biógrafo do conde da Barca ao recitar o seu “Elogio Histórico” na Assembleia Pública do dia 24 de Julho201. Numa narrativa de

199

Ver: IDEM, p. 37. Segundo Hipólito referiu no Correio Braziliense, a maior parte das gazetas inglesas asseverou que António de Araújo ocultara ao Príncipe Regente a marcha das tropas francesas. Esta posição pública do Redactor daquele periódico teve a sua génese no discurso que George Canning, Ministro dos Negócios Estrangeiros, proferiu na Câmara dos Comuns. Ver: artigo do “Correio Braziliense”, N.º VI, vol. 1, p. 519 cit. em Resposta Pública à denúncia secreta que tem por título (…), p. 41, nota; p. 25, nota. 201 Ver: “Elogio Histórico do conde da Barca, recitado na Assembléa Pública de 24 de Junho de 1819 pelo Sócio Sebastião Francisco de Mendo Trigoso”, in: História e Memórias da Academia Real das Sciencias de Lisboa, Tomo VIII, Parte II, Lisboa, na Typographia da Mesma Academia, 1823, pp. XV-XLI. 200

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forte pendor apologético, o Elogio destinava-se, essencialmente, a evocar o contributo do confrade perecido no adiantamento das Ciências e das Belas Letras, propósitos daquela Instituição, e a traçar a defesa de um percurso político e social ímpar e imaculado. Todavia, não está imune à discussão pública em torno das suas actividades políticas, como vimos. Socorrendo-se de testemunhos orais de alguns amigos de António de Araújo, bem como, de alguns documentos existentes no cartório da Academia Real das Ciências, o Elogio Histórico apresentava-se como uma “exposição” reflexiva dos percursos do biografado, tentando subjectivamente efectuar o expurgo dos “males” atribuídos a António de Araújo. Por isso, a linha narrativa adoptada será constantemente sustentada pela alusão aos valores que permitiram uma ascensão social meritória, nomeadamente os grandes merecimentos e a força de trabalhos continuados, consubstanciada nas múltiplas performances de um actor social amante das Belas Letras, súbdito fiel, hábil diplomata e ministro vigilante. Aqui se inicia uma estratégia hagiográfica, que será prosseguida e aprofundada pela historiografia erudito-metódica, que pretende invocar constantemente o altruísmo de António de Araújo. Por este motivo, justifica-se uma análise mais circunstanciada do conteúdo do “Elogio”. A abordagem biográfica linear debuxada por Mendo Trigoso veio identificar e encadear cinco contextos cronológicos: o nascimento, a educação e as primeiras actividades sociais (1754-1786?); a carreira diplomática (1787-1803); o ministério em Portugal (1804-1807); o ostracismo Ministerial no Brasil (1808-1814); o regresso ao Ministério e morte (1814-1817). O primeiro quadro cronológico inicia-se com o nascimento no seio de uma família nobre da província, percorre todo o período da educação no Porto e da fugaz passagem pela Universidade de Coimbra e desenvolve-se até ao momento das primeiras actividades sociais, nomeadamente na Sociedade dos Amigos do Bem Público, de que foi Presidente, e na Academia Real das Ciências, de que foi Sócio Correspondente202. O Elogio Histórico, que continua a ser a única fonte disponível sobre este período da vida de Araújo, deixa antever, já nesta altura, a predisposição do biografado para a aquisição da plenitude do immenso e inexgotável tesouro dos conhecimentos humanos203, nomeadamente através da leitura. Araújo tinha adquirido

202 203

Ver: IDEM, pp. XVII-XX. Ver: IDEM, p. XVII.

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grandes cabedaes nas linguas e na litteratura estrangeira, sendo dotado de um temperamento robusto e como philosopho sabio e profundo […] as suas reflexões são como um facho, que illumina todos os objectos que estão na esfera da sua actividade.

Foi com essa vasta erudição, com uma summa facilidade e graça em se explicar, hum caracter amavel e ingenuo, e huma fisionomia expressiva204 que cativou alguns familiares que tinha na Corte e o decidido apoio do duque de Lafões, Presidente da Academia das Ciências, para entrar na carreira diplomática em 1787. Aliás, esta nomeação reflectia bem o conceito que D. Maria I tinha do seu conhecimento e do seu carácter para fazer entrar na carreira diplomática hum cavalheiro pouco conhecido na Corte, que ainda não tinha dado testemunhos públicos do seu saber205. O segundo quadro cronológico corresponde à vida diplomática que se estendeu entre os anos de 1787 e 1803, em que Araújo passou pelas legações da Haia, de Paris e de São Petersburgo e encetou, ainda, uma viagem de instrução pela Alemanha, tendo sempre se distinguido no convívio com sábios e políticos pelo interesse constante no estudo das Artes, do comércio, da política, da literatura, da física e da botânica206, bem como, pelas suas maneiras polidas e agradáveis. Nas Províncias Unidas, e não obstante a tensão política e social que ali se vivia, os primeiros anos foram calmos, principalmente, devido à companhia de alguns amigos escolhidos e seguros, á sociedade de alguns litteratos, e ao commercio das Musas, que nunca desamparára totalmente207. Foi o tempo em que acolheu Filinto Elísio em sua casa, iniciou a tradução das Odes de Horácio e se lançou na formação de uma livraria, objecto do seu maior cuidado208, que seria constantemente aumentada através de contactos em França e, mais tarde, durante as viagens pela Alemanha. Segundo o panegirista a livraria era composta por obras de história, de literatura antiga e moderna, política, física, colecções dos principais academias, jornais franceses, alemães e ingleses e se se acrescentar a isto huma grande quantidade de viagens, de mappas, e de gravuras, desde a origem da Arte até aos nossos dias, facilmente se verá que a poucos particulares tinha que invejar nesta matéria209. O ano de 1795 marcava uma mudança na vida de Araújo. Depois da invasão das Províncias Unidas e a sua transformação em República Batava, a França 204

Ver: IDEM, p. XX. Ver: IDEM, p. XXI. 206 Ver: IDEM, p. XXI-XXIII. 207 Ver: IDEM, p. XXV. 208 Ver: IDEM, p. XXXI. 209 Ver: IDEM, p. XXV. 205

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revolucionária passou a considerar Portugal como potência beligerante no conflito que se começava a desenhar à escala europeia. Perante esta tomada de posição, António de Araújo encetou conversações informais para descortinar as reais intenções francesas e iniciou assim um processo que o haveria de levar a Paris para negociar com o Directório Executivo o célebre tratado de paz de 10 de Agosto de 1797, o momento alto da sua carreira. Em circunstâncias políticas difíceis, António de Araújo obteve um notável Diploma, que então fixou a attenção de toda a Europa numa altura em que difficilmente se podião esperar condições mais vantajosas em nosso favor210. Todavia, o acordo não ficou isento de polémica e veio agudizar as tensões existentes na corte portuguesa. Na verdade, vinte e dois anos após o seu epicentro, às portas da Revolução Liberal portuguesa, essas divergências permaneciam vivas, como se depreende das palavras de Trigoso: Quando a História puder hum dia espalhar hum raio de luz sobre todos os acontecimentos deste período, quando a série de annos fazendo calar as esperanças e os temores permittir que se narrem os sucessos com todas as suas particularidades, he de esperar que então se desenredem todas as tramas, e difficuldades, que o negociador Portuguez teve de vencer, os motivos por que se vio constrangido a deixar Paris antes de concluírem as estipulações; as causas que alli o fizerão voltar outra vez, e a delicada politica que lhe foi necessário usar, até assignar por fim o célebre Tratado de 10 d’Agosto de 1797.211

Atente-se nas primeiras palavras desta citação, no apelo que o paneigirista lança à História – aqui entendida como “memória colectiva”, como tribunal maior – no sentido de expurgar o mal proveniente das correntes de opinião que se desenvolveram desde então e de isentar de culpas o biografado defendendo a sua luta em prol do Reino a qual tinha sido, inclusivamente, sancionada por um Príncipe Regente benévolo e amistoso ao conceder-lhe uma Comenda na Ordem de Cristo. É esta relação Príncipe/ súbdito que Mendo Trigoso vai enfatizar durante a sua narrativa e que deve ser interpretada como uma “conquista” do segundo sobre o primeiro e não como algo inerente à sua condição social. Numa palavra, era o merecimento de Araújo. E esse merecimento reconhecido pelo Regente, estaria na base da sua chamada para o ministério em 1804, período que corresponde ao terceiro período definido no “Elogio”. A nomeação de António de Araújo para Ministro dos Negócios Estrangeiros e da Guerra vinha desarmar a calumnia que se erguera aquando da sua entrada na carreira 210 211

Ver: IDEM, p. XXVIII. Ver: IDEM, p. XXVII.

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diplomática quando espiritos rasteiros e invejosos olhárão talvez estas honras mais como extorquidas, do que como merecidas212. Durante dois anos, Araújo evidenciou-se como ministro vigilante, imprimindo uma lógica de reforma e de modernização à Secretaria de Estado, que está patente na legislação promulgada e publicada a que Trigoso faz referência213, justificando plenamente a sua chamada, em 1806, depois da morte do conde de Vila Verde, para Ministro Assistente ao Despacho e para Ministro do Reino, ambas em regime de interinato, e no início do ano seguinte para Conselheiro de Estado e para Presidente da Real Junta de Comércio. António de Araújo era, a este tempo, um súbdito fiel e coberto de honrarias, mas não bastava […] que elle fosse negociador hábil, e ministro vigilante, não bastava que amparasse as letras com o maior empenho, era necessário que as cultivasse214. Paralelamente aos desempenhos políticos, revelava o seu pragmatismo cultural e científico ao dedicar-se ao estudo da botânica, de que era extremamente apaixonado, tentando criar um jardim botânico junto ao colégio dos beneditinos da Estrela215, ao regressar às sessões da Academia Real das Ciências, na qualidade de Sócio Honorário, e ao assumir a Direcção da Escola de Gravura e dos estudos estabelecidos no Real Mosteiro de São Vicente de Fora216. Todos estes contributos ficariam inacabados devido à irupção das Invasões Francesas. Assim, quando as crescentes pretensões da França e do seu Sistema Continental se manifestaram e a ameaça de invasão se tornou efectiva, tornando a neutralidade num objectivo cada vez mais difícil de se concretizar, a alternativa consistiu na partida da Corte para o Brasil e Araújo Por mais inculpado que estivesse na catastrofe sucedida em Portugal; por mais impossivel que lhe fosse preveni-la ou desvia-la; ainda que todas as ordens e resoluções a este respeito tivessem emanado de S. A. e do Concelho d’Estado, que frequentes vezes se ajuntava para esse fim, com tudo como a Secretaria da sua repartição era aquella por onde principalmente corrião as differentes transacções, cujos resultados nos erão tão damnosos, bem conhecia elle que grande parte do povo, que não discorre, havia de attribuir ao Ministro as desgraças que padecia, e que os invejosos da sua reputação assoprarião estas labaredas, filhas da ignorância e da malevolencia217.

212

Idem, p. XXXII. Idem, p. XXXII, nota. 214 Idem, p. XXIV. 215 Idem, p. XXXVIII. 216 Idem, p. XXXIX. 217 Idem, pp. XLI-XLII. 213

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O quarto quadro cronológico abre a fase brasileira e desenrola-se entre a sua chegada ao Rio de Janeiro, em 1808, e a sua chamada ao Ministério em 1814. Durante esses anos, dedicou-se a repelir o ócio entregando-se à literatura e à ciência da natureza, mas eram os estudos práticos […] os que lhe devião maior desvelo, como testemunham o estabelecimento em sua casa de um laboratório químico, as actividades botânicas com a criação do Hortus Araujensis e a colaboração no Real Jardim da Lagoa de Freitas. Para além disso, revelou um esforço no sentido de providenciar a modernização tecnológica, mandando construir máquinas, como engenhos de serrar madeiras e um alambique à escocesa, para posterior divulgação entre as comunidades locais218. O último quadro cronológico identificado no Elogio Histórico é marcado pela nomeação para Ministro da Marinha e dos Domínios Ultramarinos, em 1814 e prolonga-se até 1817 quando, já nobilitado como conde da Barca, detinha todos os negócios de Estado e perante tamanha empresa veio a sucumbir de uma lenta nervosa a 21 de Junho de 1817219. Não obstante a argumentação apresentada por Mendo Trigoso, que favorecia o surgimento de um consenso em torno da figura de António de Araújo, à historiografia liberal interessava, sobretudo, legitimar o tempo presente. O político e escritor Francisco Solano Constâncio, traçou um quadro desapaixonado de António de Araújo de Azevedo para a Biographie Universelle, que vinha sendo publicada em Paris220. O plumitivo liberal sustentava que era já conhecido de todos que Araújo jamais tivera a intenção de trair o Príncipe Regente, mas, também, era justo dizer-se que foi, sem dúvida, o responsável por expor a família real a perigos eminentes. Para avaliar o desempenho do Ministro, Constâncio recuperava, ainda, o conceito ofensivo que tinha sido veiculado uns anos antes no célebre opúsculo O Estado de Portugal durante os últimos trinta anos221, sem contudo fazer essa referência, ao sustentar que il trompa l’espoir de ses amis et de la nation e mostrará une incapacité absolue comme homme d’état […] il ne fit rien pour son pays, et ne songea qu’à faire la cour au prince-régent et à son ministre favori le comte de Villa Verde222.

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Ver: IDEM, pp. XLIII-XLIV. Ver: IDEM, pp. XLV. 220 Ver: CONSTÂNCIO, Francisco Solano, “ARAÚJO DE AZEVEDO, António de”, in: Biographie universelle ancienne et moderne ou histoire par ordre alphabétique de la vie publique (…) red. par Société de Gens de Lettres et de Savants, Paris : Chez Michaud Fréres, Tome Cinquante-Sixiéme, 1834, pp. 389-395. 221 Ver: “O estado de Portugal durante os últimos trinta anos”, reeditado na colectânea Política, Administração, Economia e Finanças públicas portuguesas (1750-1820), com estudos introdutórios de José Viriato Capela, Braga: Instituto de Ciências Sociais, Universidade do Minho, 1993, p.56 e segs. 222 Ver: CONSTÂNCIO, Francisco Solano – ob. cit., p. 392. 219

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Aliás, às portas da crise, Araújo perdera a oportunidade para se afirmar como o ministro da confiança de um Príncipe que se encontrava atacado por uma profunda melancolia e minado por desgostos domésticos. Todavia, se a prestação governativa em Portugal ficava marcada pela sua insouciance e pela influência francesa no ministério, que lhe consignaram uma dimensão de traidor aos olhos do povo, já no Brasil conservou-se sempre nas boas graças do Príncipe e manteve a sua influência na corte e aí, inegavelmente, il avait rendu dês services au Brésil223. Em jeito de reflexão final, o articulista afirma que Avant d’entrer au ministére, il jouissait dans toute l’Europe d’une grande reputátion; el l’eût probablement conservée, s’il n’était point sorti de la carriére diplomatique […] il n’avait pas les qualités nécessaires pour tenir les rênes de l’état dans ces temps orageux224.

1.3. A VISÃO DO MEMORIALISMO Não obstante a subjectividade que está inerente às memórias particulares, misto de história e de “jornalismo”225, possuam elas um carácter expositivo ou analítico, importa referir as referências dispersas à figura de António de Araújo. Do empreendedorismo e protecção às Belas Letras no Brasil, deu notícia o pintor Jean-Baptiste Debret, em 1834, na sua Voyage pittoresque et artistique au Brésil226, obra de cariz divulgativo, dedicada aos membros da Academia de Belas-Artes do Instituto de França, que tem as suas inspirações nas viagens filosófico-naturalistas, reflexo do cosmopolitismo tardo-Setecentista227. Num pequeno capítulo dedicado às grandes personalidades do Brasil, Araújo é apontado como o novo mecenas do Brasil, o protector da Missão artística francesa que aportou no Rio de Janeiro em 1817. Não obstante ser valetudinário há mais de quinze anos, era verdadeiramente infatigável no 223

Ver: IDEM - p. 394. Ver: IDEM, p. 395. Ver: TORGAL, Luís Reis MENDES, José Maria Amado, CATROGA, Fernando – História da História em Portugal. Séculos XIX-XX, vol. 1, [s.l.] Temas e Debates, 1998, p. 39. 226 Ver: DEBRET, Jean-Baptiste, Viagem Pitoresca e histórica ao Brasil, tradução e notas de Sérgio Millet, São Paulo: Círculo do Livro, s.d., pp. 611-612 (1.ª edição de 1834). 227 Este movimento está na génese das grandes viagens de exploração do século XIX e que originam debates, conferências, exposições e publicações. A viagem naturalista mais emblemática foi a de Alexander von Humboldt (1769-1859) que, entre 1799 e 1804, percorreu e explorou grande parte da América Latina procedendo com carácter sistemático e metodologia própria, à recolha de numerosos dados científicos, o que lhe valeu o epíteto de pai da Geografia moderna, conjuntamente com Karl Ritter (1779-1859). Os elementos constantes dessa recolha foram alvo de vários debates depois do regresso de Humboldt à Europa e integraram a sua obra mais conhecida, o Cosmos. (Ver: FERREIRA, Conceição Coelho, SIMÕES, Natércia Neves – A evolução do pensamento geográfico, Lisboa: Gradiva, 1994, pp. 59-66). Sobre as viagens filosóficas no contexto português do século XVIII, ver CARDOSO, José Luís – O pensamento económico em finais do século XVIII, 1780.1808, Lisboa: Estampa, 1989. Convém lembrar que o cosmopolitismo da viragem do século produziu outro tipo de literatura proveniente das viagens de ilustração como o Grand Tour de que a obra mais conhecida é a de Edward Gibbon A History of the Decline and Fall of the Roman Empire (1776-1788), se bem que os casos mais conhecidos para Portugal são os de Lord Byron, em 1793, de William Beckford, em 1787, 1793 e 1798, e de Carl Israel Ruders. 224 225

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trabalho, pois tinha a sobrecarga das três Secretarias de Estado. Mas, o que verdadeiramente cativou Debret foi a sua grandeza como distinto cultor das Letras e das Artes, como protector das ciências e da indústria que abria aos artistas a sua residência onde existia uma grande sala destinada à biblioteca […] uma oficina para o fabrico de porcelana e […] um laboratório de química para o aperfeiçoamento da destilação da aguardente de cana e, ainda, as peças incompletas de uma máquina de vapor trazidas com grande despesa de Londres228, seguramente a primeira que penetrou no território português. Da sua cultura, erudição e trato polido, deu notícia a célebre Madame Junot, duquesa de Abrantes, considerando-o como o expoente da corte portuguesa naqueles anos de 1804 e 1805. Homem culto, versado em línguas e na literatura, com uma fisionomia viva e espiritual, Araújo sobressaía, de facto, numa corte estática e desinteressante, de tal forma que a memorialista sustentava que tout que je vis M. D’Araújo, je pris une meillure opinion de la Cour de Lisbonne. E conjencturava ainda, il avait été presque tout sa vie absent de Portugal, et c’est peut-être pour cette raisonqu’il était si aimable229. Da carreira diplomática em Paris no inquietante ano de 1797, Inácio José Peixoto, Desembargador e Procurador-geral da Mitra bracarense, registava nas suas Memórias Particulares, recentemente editadas, os ecos que chegavam a Braga, através das gazetas inglesas, de que Araújo tratava com força e cuidado em ajustar a paz com Delacroix, ministro da França, e que no fim desse ano, o embaixador estava prezo em Paris mas o esforço diplomático prosseguia230. Do exercício ministerial em Lisboa o periodista e político liberal José Liberato Freire de Carvalho faz um juízo crítico nas suas Memórias, publicadas em 1855, no qual deixa antever claramente o seu posicionamento político, ao acusar deliberadamente o Gabinete e o Regente de permanecerem estáticos entre as duas potências opressoras, pois como

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Debret comete algumas imprecisões como o facto de atribuir o nome Luís a António de Araújo ou sugerir que não tinha seguido viagem com o Regente, e que só mais tarde teria seguido para o Rio de Janeiro, onde seria censurado pelas suas simpatias pelos franceses. Um outro tópico impreciso foi o de considerar que Araújo tinha entrado na carreira diplomática depois de ter sido secretário particular de D. José I, noção que foi depois repetida em SÁ, Vítor de – “Notícia de manuscritos setecentistas existente no arquivo da Biblioteca Pública de Braga”, in: Bracara Augusta, n.º 28 (65-66), Braga, 1974, p. 311. 229 Memoires de Madame la Duchesse d’Abrantes, Souvenirs historiques sur Napoleón, la révolution, le directoire, le consulat, l’empire et la restauration, Paris: Garnier Frères, 1831-1834, p. 179. 230 Ver: Memórias Particulares de Inácio José Peixoto. Braga e Portugal na Europa do Século XVIII, estudo introdutório de Luís A. Oliveira Ramos, leitura e fixação do texto de José Viriato Capela (coord.), Braga: Arquivo Distrital de Braga/ Universidade do Minho, 1992, pp. 252-253.

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não sabiam decidir-se, pensavam que trapasseando, e ganhando tempo, impediam o golpe que se estava a descarregar sobre elles. Junot à frente do exército francez entrava pelas nossas fronteiras, e já estava quasi às portas de Lisboa, sem que os estúpidos de Lisboa dessem fé da sua marcha231.

2. A HISTORIOGRAFIA ERUDITO-METÓDICA Desde finais do século XIX até aos nossos dias desenvolveu-se, tanto em Portugal como no Brasil, uma corrente de opinião em torno do conde da Barca cuja base principal assenta em propósitos de renovação ou de revisionismo histórico pejada de propósitos encomiásticos que derivaram, em larga escala, da empatia gerada entre o “objecto” e os investigadores. Na verdade, esta escola historiográfica, fortemente influenciada pelo positivismo na sua vertente empírica, coloca a tónica na recolha exaustiva das fontes e da sua posterior divulgação. Sendo designada preferencialmente por escola erudito-metódica, revela-se eminentemente descritiva e factual, dedicando-se a esmiuçar as fontes arquivísticas, a deslindar minuciosamente o facto característico e valioso e a divulgar a “História” que se encontra latente nos documentos232. Se é inegável que tal facto proporciona uma certa objectividade, também não é menos verdade que o mesmo conduz a uma certa monotonia, ao relegar a elaboração para um plano secundário e ao estar desprovida de um esforço de problematização histórica e de crítica conducente ao “conhecimento histórico” de facto. E nesta perspectiva quase recitativa, o trabalho do investigador aproxima-se mais da dimensão de um narrador, uma vez que o seu objectivo primordial assenta no encadeamento cronológico da documentação divulgada. Assim, os biógrafos de Barca possuem várias características em comum: a ausência da formulação de uma questão inicial na abordagem da temática; a ausência de método e de aparato crítico; e, para além disso, partem todos da estrutura linear pré-determinada pelo Elogio Histórico da autoria de Mendo Trigoso que vão tentar aprofundar e complementar através da publicação de variada correspondência inédita. Nesse sentido, a base matricial do seu trabalho quase que se assemelha a um “espartilho”, a um obstáculo que impede constantemente a procura de novas e mais 231

Ver: Memórias da vida de José Liberato Freire de Carvalho, Lisboa: Typographia de José Baptista Morando, 1855, p. 52. Segundo H.-I. Marrou “a história aparece como o conjunto de “factos” que se extraem dos documentos; ela existe latente, mas já é real, nos documentos, mesmo antes de intervir o trabalho do historiador” cit. por MENDES, Amado – A História como Ciência, p. 70 232

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variadas abordagens no intuito de proporcionar um conhecimento histórico contundente. Por outro lado, este estatismo potenciou a estreiteza dos assuntos tratados, incidindo quase exclusivamente na carreira diplomática, na fase política tanto em Portugal como no Brasil, analisada sempre sobre o prisma da dualidade existente entre francófilos e anglófilos - temáticas preferidas desta corrente historiográfica - e na dimensão do letrado e do protector dos grandes vultos da cultura e da ciência. Uma outra razão justifica esta opção: a de que a maior parte da documentação existente no arquivo do conde da Barca incide sobre estas temáticas, o que de certa forma provocou a negligência de outras como a educação, a formação, o contexto familiar de António de Araújo, bem como, uma análise mais aprofundada das práticas de sociabilização do Ilustrado, no verdadeiro sentido do termo, que são, em nosso entender, o principio e o fim do traço que envolve o Homem e a sua mundividência. Assim, importa referir os contextos que envolveram Meneses Brum, Artur da Cunha Araújo, José Baptista Barreiros, António Pedro de Sousa Leite, João Marcos e, finalmente, o engenheiro Eurico Brandão de Ataíde Malafaia, e, depois, identificar as características dos documentos utilizados por cada um deles nas abordagens que fizeram de Barca. A conjugação destes dois factores proporcionará um conhecimento das variações da narrativa. 2.1. OS ESTUDOS HISTÓRICO-BIOGRÁFICOS Em 1940, Artur da Cunha Araújo publica o Perfil do conde da Barca233. Médico e político republicano de renome, amigo de Manuel de Oliveira desde os tempos da Escola Médico-Cirúrgica do Porto, Cunha Araújo distinguiu-se também por ser poeta de fecunda inspiração e colaborador em várias revistas literárias e jornais234. Trinta anos depois de ter dado à estampa umas cartas inéditas do abade Correia da Serra, e de ter reconhecido os valiosos manuscritos do conde da Barca na biblioteca de Manuel de Oliveira, lançava-se na redacção do Perfil. A razão era simples: por entre afazeres profissionais, nestas longas noites de Inverno, buscamos distracção, rebuscando entre velhos papéis e um ou outro livro empoeirado e 233

Ver: ARAÚJO, Artur da Cunha, Perfil do Conde da Barca, Edição do Autor, Porto, MCMXL. Ver: GRANDE ENCICLOPÉDIA PORTUGUESA E BRASILEIRA, vol. III, Lisboa/ Rio de Janeiro: Editorial Enciclopédia, [s.d.], pp. 87-88.

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esquecido, elementos para a feitura deste perfil, brinco de um amador que não aspira a perdurar em letra de forma235.

Apesar de se tratar de uma obra sem a pretensão de um estudo biográfico definitivo236, muito menos de uma obra de análise, o Perfil, com a sua escrita elegante e amena, possuiu o condão de recuperar e divulgar a personalidade junto do público, cativando-o, entre outras coisas, com a publicação de um epistolário onde avultam nomes consagrados como D. Gaspar de Bragança, arcebispo de Braga, a marquesa de Alorna, o abade Correia da Serra, e o próprio Príncipe Regente. Revestindo-se de contornos apologéticos, a obra apresenta, pela primeira vez na História, um messiânico António de Araújo que surge, nos finais do século XVIII, para desfiar a série de inépcias e carrapatas cometidas pelos irmãos Sousas, D. Domingos e D. Rodrigo, pelo ministro Luís Pinto, futuro visconde de Balsemão, e pelo diplomata D. Vicente de Sousa, embaixador de Portugal em Paris ao tempo da Revolução Francesa, e de outros tantos Sousas, que dispunham a seu bel-prazer, nesta época decisiva para o absolutismo, do alvoroçado espírito de Sua Alteza o Príncipe Regente, chamado de surprêsa ao difícil e custoso ofício de reinar237.

Trata-se de um trabalho de reivindicação histórica, de uma tentativa de traçar uma conduta imaculada de António de Araújo invertendo a lógica da crítica, relançando-a contra os seus detractores. Socorrendo-se de uma vasta série de ofícios existentes no arquivo do conde da Barca, Cunha Araújo apresenta um diplomata que adquiriu uma invejável bagagem científica e literária, que não deixaria de avolumar durante a carreira de estadista238 e que durante os mais de dez anos em que percorreu a Europa, marcara com fidalguia e aprumo os primores da sua inteligência e a nobreza do seu trato239. Para o Autor, Araújo foi o nosso mais notável diplomata daquele tempo240, como comprova a negociação que empreendeu em Paris, em 1797. Na verdade, a sua nomeação para aquela missão era justificada pela sua inteligência, pela sua sagacidade, pelo seu aprumo e pelas suas excepcionais qualidades, ninguém

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Ver: ARAÚJO, Artur da Cunha, ob. cit., p. 9. Ver: IDEM, p. 9. 237 Ver: IDEM, p. 5. 238 Ver: IDEM, p. 8. 239 Ver: IDEM, p. 57. 240 Ver: IDEM, p. 43. 236

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melhor estaria indicado241. Durante todo o processo de negociação da paz o único homem público que se mostrara à altura das responsabilidades do seu espinhoso cargo, fôra António de Araújo242, obtendo o tratado mais favorável a que Portugal podia aspirar243, mas era sabido que até o ministro Luís Pinto estava submetido a uma confrangedora subserviência submetida ao beneplácito da Inglaterra e depois da não ratificação do tratado pela Corte portuguesa, aceitava como coisa a mais natural a prisão do nosso embaixador244. Continuando, a distinção com que António de Araújo desempenhou os seus cargos diplomáticos seria novamente evidenciada quando foi nomeado Ministro e Secretário de Estado pois saberia corresponder com lealdade e zêlo ao desempenho de tão ingrata tarefa245 numa época díficil em que nenhum estadista por excepcionais talentos que tivesse, poderia brilhar246. À crise diplomática que se vivia nos anos de 1806 e 1807, acrescia um Príncipe Regente, aqui apresentado à sombra do conceito construído por Oliveira Martins, como um Soberano de poucas palavras e de poucas letras247 cuja decisão de transferir a corte para o Brasil foi o maior crime imputado à [sua] cobardia e pusilanimidade248. É neste contexto que Cunha Araújo analisa o confronto entre o partido francês, encabeçado por Araújo, e o partido inglês, liderado por D. Rodrigo de Sousa Coutinho, que se prolongaria nos primeiros anos de Brasil, já depois de Araújo ter deixado o Ministério. Aliás, o fim da detracção dos Sousas, que ocorre em simultâneo com o declínio da sua influência na Corte, é marcado pela Representação […] de 1810 , à qual D. João VI respondeu com a Grã-Cruz da Ordem de Cristo quebrando os dentes à calúnia. Este episódio esconde uma segunda ordem de motivações para a realização desta depuração da conduta de António de Araújo. Segundo Cunha Araújo, os historiadores integralistas João Ameal e Rodrigues Cavalheiro evocaram António de Araújo, nas Erratas à História de Portugal, só para merecer epítetos de traidor, maçon, homem suspeito e misterioso, etc., numa série de inconsistentes apodos próprios da lógica de denúncia do estúpido século XIX, que marcou a génese dos regimes liberais e da consequente queda de um poder político forte e centralizado, promovida pelos

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Ver: IDEM, p. 33. Ver: IDEM, p. 51. Ver: IDEM, p. 37. 244 Ver: IDEM, p. 49. 245 Ver: IDEM, p. 57. 246 Ver: IDEM, p. 62. 247 Ver: IDEM, p. 62. 248 Ver: IDEM, p. 71. 242 243

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círculos afectos ao Estado Novo. Na verdade, para este Autor, a detracção de Barca teria começado com o ensaísta e defensor da teoria tradicionalista monárquica, António Sardinha, que, não obstante, ser um dos mais brilhantes espíritos da sua geração, corifeu do nacionalismo português, procurou com mais talento do que razão, atingir a personalidade de Araújo censurando os seus mais de trinta anos de dedicação à Pátria através dos mais desinteressados e relevantes serviços de um homem de carácter e português de lei249. A Representação marca também o início da contagem decrescente para Araújo mostrar uma vez mais as suas excepcionais aptidões políticas num tempo em que se tinha afeiçoado realmente ao Brasil250. A sua governação no Brasil ficou marcada pelo grandioso plano de desenvolvimento e o seu primeiro acto governamental foi a elevação da colónia à categoria de Reino251. Em três anos deu ao Rio de Janeiro o aspecto de uma capital europeia, consagrando-se como o verdadeiro Pombal da nova metrópole e o maior e o mais entusiasta propulsor do Brasil252. Mas, é na abordagem ao enquadramento de António de Araújo nas Ideias do tempo que se vislumbra uma clara propensão do Autor para fazer convergir o “objecto” de estudo para os seus próprios ideais, introduzindo uma lógica determinista na análise da acção cultural e científica do mesmo. António de Araújo fora, desde sempre, um diletante das Letras, um cultor do pré-romantismo, que jamais poderia ser um literato na acessão do termo, devido aos desempenhos políticos e sociais que lhe subtraíram o sossego para uma obra de maior fôlego253. Possuidor de uma cultura vasta e enciclopédica254, em permanente actualização, Araújo professava os princípios mais consentâneos com a sua inteligência, mais liberais, chamemos-lhe assim, na pureza extrema do têrmo […] o único que […] quebrava a toada uníssona, com a sua predilecção pelas ideias reivindicadoras da Revolução Francesa255.

Os finais dos anos 50, trouxeram os contributos do coronel José Baptista Barreiros. Antigo professor do Instituto de Altos Estudos Militares, apesar de não ser natural de Braga, bracarizou-se, e aí desenvolveu uma notável acção no domínio 249

Ver: IDEM, p. 74, nota 1. Ver: IDEM, p. 95. 251 Ver: IDEM, p. 96. 252 Ver: IDEM, pp. 98-99. 253 Ver: IDEM, p. 105. 254 Ver: IDEM, p. 103. 255 Ver: IDEM, p. 98. 250

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cultural, seja como director da Delegação Bracarense da Sociedade Histórica da Independência de Portugal, como Presidente da Junta do Distrito, Provedor da Santa Casa da Misericórdia ou através da colaboração com o pelouro camarário da Cultura nos tempos do Presidente Santos da Cunha256. A sua produção escrita quase toda no domínio da história, mostra-se valiosa e grave, no prisma do rigor e do método científico, mas também se denota prescritiva, activista como lição de patriotismo.

Era um investigador vigilante, imbuído de um espírito nacionalista e escravizado às fontes, à investigação e ao método positivo257 e os seus interesses historiográficos passavam maioritariamente pela história militar e pela história da diplomacia portuguesa. Em 1958, publicou O Tratado de paz e 10 de Agosto de 1797 e a prisão de António de Araújo de Azevedo no Templo258, o qual marca o início das suas investigações sobre o conde da Barca que se prolongaram por quatro anos. Baseado essencialmente na correspondência diplomática existente no arquivo do conde da Barca, Baptista Barreiros vagueia pelos meandros da diplomacia europeia e, mais concretamente, pela acção do hábil diplomata António de Araújo de Azevedo que, em 1797, encetou uma negociação das de mais dificultosa execução da nossa história diplomática. As imposições dos franceses Delacroix e Talleyrand259 mas, também, os condicionalismos impostos pela política oscilante adoptada por Luís Pinto de Sousa Coutinho como nosso Ministro dos Negócios Estrangeiros260, lançaram o futuro conde da Barca na prisão da Torre do Templo, acusado de ter conspirado contra a segurança interna da República francesa261. Para Baptista Barreiros, o falhanço desta negociação Era […] a primeira manifestação oficial e ostensiva duma intriga tecida à volta do Tratado de 10 de Agosto, intriga em que Araújo era directamente objectivado e na qual comparticiparam França, Inglaterra, Espanha e Portugal por razões de antagónicos

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Ver: “A personalidade do coronel José Baptista Barreiros apreciada pelo Professor Doutor Sérgio da Silva Pinto”, in: Correio do Minho, de 3 de Abril de 1968. Ver também SOEIRO, Rafael de Barros – Medalhões (Figuras de Braga ou que por ela passaram), 1.ª série, Braga: Delegação Bracarense da S.H.I.P., 1876, pp. 7-16. 257 Ver: “A personalidade do coronel José Baptista Barreiros […]. 258 Ver: BARREIROS, José Baptista, “O Tratado de Paz de 10 de Agosto de 1797 e a prisão de António de Araújo de Azevedo no Templo”, in: Independência Revista de Cultura Lusíada, Tomo XVIII, n.º 18, [s.l.], Sociedade Histórica da Independência de Portugal, Ano XVIII, Junho-MCMLVIII, N.º 18, pp. 17-61. 259 Ver: IDEM, pp. 17-19. 260 Ver: IDEM, p. 22. 261 Ver: IDEM, p. 32.

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interesses políticos, mas interesses cuja consecução seria sempre obtida à custa de sacrifícios do nosso país262.

E neste sentido, As invasões francesa são em mui grande parte consequência da falta de ratificação oportuna do Tratado de 10 de Agosto e se o nosso país não foi talado pelo invasor uns anos antes, conforme por mais de uma vez projectaram o Directório e o consulado, deve-se o facto, em primeiro lugar, às contínuas necessidades que impuseram à República o bater-se contra inimigos internos e externos e o lançar-se nas conquistas da Itália e do Egipto; depois, aos receios que nutria a Corte de Carlos IV quanto às consequências que à sua Coroa poderiam resultar de ser o território de Espanha atravessado pelo exército destinado à conquista de Portugal263.

Impossibilitado de concluir a paz, Araújo rumou à Holanda e dali à Alemanha, para uma viagem de instrução, e nunca mais quis tomar contacto directo com as negociações para o estabelecimento da paz, nem mesmo quando Méjan em nome de Talleyrand e, depois, o cônsul Lebrun, sustentaram que a ocasião era excelente para reatar a negociação264. Opinião bem distinta defendeu Jean Gagé ao observar na correspondência particular existente no Rio de Janeiro a existência de um diplomacia paralela liderada pelo Príncipe Regente, à margem da oficial encabeçada por Luís Pinto de Sousa, a que o diplomata se manteve ligado e extremamente activo, procurando os meios necessários para efectivar a neutralidade portuguesa através de negociações secretas com Talleyrand nos anos de 1798 e 1800265. Em 1960, Baptista Barreiros, retomava e aprofundava a temática no Ensaio de biografia do Conde da Barca266. Na verdade, este Ensaio reconhecia subjectivamente o valor informativo e o ineditismo do “Fundo Barca-Oliveira”. Se ao longo da primeiras dezasseis páginas se denota uma tentativa de erguer uma biografia linear - como se deduz pela ordenação cronológica dada aos capítulos “Nascimento e educação”, “Primeiras actividades sociais”, “O diplomata” e “Ministro em Portugal” -, a narrativa, 262

Ver: IDEM, p. 32. Ver: IDEM, p. 23. As questões que estiveram na base das Invasões Francesas já tinham sido alvo de um estudo mais abrangente do coronel José Baptista Barreiros intitulado Preliminares da 1.ª Invasão Francesa, comunicação ao II Congresso Histórico Internacional de la Guerra de la Independência y su Época, separata da Revista «Independência», Braga: Sociedade Histórica da Independência de Portugal, [Dezembro de 1959]. 264 Ver: BARREIROS, José Baptista, “O Tratado de Paz de 10 de Agosto de 1797 (…), p. 57. 265 Ver: GAGÉ, Jean, “António de Araújo, Talleyrand et les negociations secrètes pour la paix de Portugal”, in: Bulletin des Études Portugaises et de l’Institut Français au Portugal, Nouvelle Série, Tome Quatorziéme, Coimbra: Coimbra Editora, 1950, pp. 39-131. 266 Ver: BARREIROS, José Baptista, Ensaio de biografia do Conde da Barca, Braga: Delegação Bracarense da Soc. Histórica da Independência de Portugal, [1960]. 263

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rapidamente, resvala para uma espécie de roteiro da documentação do “Fundo Barca-Oliveira”, no intuito de demonstrar o potencial da “fonte” para o estudo do Homem e do contexto envolvente ou, se se preferir, para a apresentação do maior número possível de acontecimentos que situaram António de Araújo no centro da vida política e cultural do tempo de D. João. É a partir daqui que a evolução da narrativa passa a estar condicionada pela existência ou não de documentação. Assim se compreende a atenção dada à oposição de Araújo à conspiração de Alorna267, à sugestão de António de Araújo de protelar o embarque para o Brasil sugerindo a deslocação da família real para Peniche268 e ao seu protagonismo nos preparativos da transferência da corte para o Brasil269. As actividades políticas no período brasileiro seguem a mesma linha e apoiam-se, quase exclusivamente, na correspondência de Ambrósio Joaquim dos Reis, conselheiro técnico de Araújo270, fonte indispensável para analisar temáticas como O Congresso de Viena271, o Ataque britânico à Companhia dos Vinhos do Alto Douro em 1812272, a tentativa de elaborar um Projecto dum Acto de Navegação para dotar a Marinha e comércio portugueses de maior eficiência273 e, ainda, a análise das ideias sobre o fomento do Brasil, nomeadamente através da introdução de mecanismos para a destilação de aguardentes e para indústria açucareira274, da ideia da construção de uma nova capital no interior do Brasil275, da promoção da instrução pública, principalmente da criação de escolas técnicas276 e de uma Universidade no Brasil277. Mas outras temáticas, para além da diplomacia e da carreira ministerial, são aqui aprofundadas. O capítulo sobre O literato e o seu interesse pelas ciências justifica-se como uma forma de esclarecer e completar, do que se há escrito278, nomeadamente o incontornável patrocínio que dedicou a literatos portugueses e a produção literária de Araújo. Nesta última, Baptista Barreiros salienta o patriotismo de Araújo quando

267

Ver: IDEM, pp. 17-19. Ver: IDEM, pp. 40-44. 269 Ver: IDEM, pp. 19-39. Em 1962, Baptista Barreiros publica uma série de cartas com uma incontestável importância para uma segura interpretação dos sucessos da política interna e externa portuguesa nos anos de 1806 e 1807, por onde se verifica a volatilidade do gabinete do Ministro dos Negócios Estrangeiros e o acompanhamento constante que o Príncipe consagrava aos assuntos de Estado. A motivação era sempre a mesma: ilibar António de Araújo da acusação de traidor... Ver: IDEM, Correspondência inédita entre o Conde da Barca e José Egídio Álvares de Almeida, secretário particular de El-Rei Dom João VI, Braga: Delegação Bracarense da Sociedade Histórica da Independência de Portugal, 1962. 270 Ver: BARREIROS, José Baptista, Ensaio de biografia (…), p. 58. 271 Ver: IDEM, pp. 56-79. 272 Ver: IDEM, pp. 94-99. 273 Ver: IDEM, pp. 99-101. 274 Ver: IDEM, pp. 102-105. 275 Ver: IDEM, pp. 111-112. 276 Ver: IDEM, p. 113-114. 277 Ver: IDEM, p. 114. 278 Ver: IDEM, p. 124. 268

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decidiu rebater as críticas que os estrangeiros faziam a Portugal, nas seguintes obras: Voyage du Ci-devant Duc de Chatelet en Portugal, Tableau de Lisbonne, Etat du Portugal e Viagem de Murphy279. Outra das evidências do profunda erudição de António de Araújo centra-se na incontornável questão da livraria particular que é abordada através de uma circunstanciada notícia das várias relações de livros hoje existentes na Secção de Manuscritos do A.D.B.. Por outro lado, a vida sentimental de António de Araújo é, também, analisada à luz das cartas particulares da Baronesa de Beaumont que sugerem o quanto se amaram, as quais talvez expliquem a opção de Araújo ter permanecido de alma e coração devotado à política, [e] se conservasse celibatário280. João Marcos pouco ou nada acrescenta no seu estudo biográfico, visto que se baseia exclusivamente na bibliografia impressa, e em especial no trabalho de José Baptista Barreiros. Nas palavras do autor, trata-se de um trabalho sem investigação281, que demonstra que o conde da Barca atingiu pelo seu mérito e a sua personalidade as culminâncias da escala social, o Conde da Barca tinha de ser naturalmente um homem discutível na agitada transição político-social de um século para outro – num dos períodos mais conturbados da História282.

A linha apologética seria retomada, já em 2004, pelo engenheiro Eurico Brandão de Ataíde Malafaia, quando deu à estampa, como reza o prefácio, o primeiro grande trabalho sobre aquela extraordinária figura283. O interesse pelo personagem nasceu em 1999 quando o Autor, ao preparar uma conferência para a Academia Portuguesa de História, apercebeu-se da dimensão da ilustre personalidade que era mal conhecida e, sobretudo, não rigorosamente estudada284. Lançou-se num estudo de maior fôlego que o levou a desenvolver profundas pesquisas documentais em arquivos portugueses e brasileiros285, numa tentativa de apresentar uma obra de divulgação que pretende, documentalmente,

estabelecer

a

verdade

histórica,

neste

caso

particular,

frequentemente distorcida286. Desta longa investigação, que o próprio Autor define 279

Ver: IDEM, pp. 130-131. Ver: IDEM, pp. 139-140. Ver: MARCOS, João, O Conde da Barca: na política europeia do pré-liberalismo, Porto: Civilização, [1993], p. 14. 282 Ver: IDEM, p. 124. 283 Ver: MALAFAIA, Eurico Brandão de Ataíde, António de Araújo de Azevedo. Diplomata e Estadista (1787-1817). Subsídios documentais sobre a época e a personalidade., Braga: Arquivo Distrital de Braga/ Universidade do Minho, 2004, p. XI. 284 Ver: IDEM, p. 2. 285 Em Portugal, desenvolveu pesquisas no Arquivo Distrital de Braga e no Arquivo Histórico do Ministério dos Negócios Estrangeiros, enquanto que no Brasil, repartiu as suas atenções pelo Arquivo Histórico do Itamaraty, pela Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, pelo Arquivo Nacional do Rio de Janeiro e pelo Museu Imperial de Petrópolis. 286 Ver: IDEM, p. 3. 280 281

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como apaixonada, resultou um trabalho em homenagem ao conde da Barca na passagem dos 250 anos da sua nomeação para Ministro dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, como sustentam as seguintes palavras: António de Araújo de Azevedo, notável autodidacta, nobilitado quase no fim da vida como Conde da Barca foi, na diplomacia e na governação, na época (1787-1817) em que as exerceu, alguém que, palmo a palmo, por indiscutível mérito próprio, subiu na vida para atingir uma órbita muito alta, onde viveu, se fixou e, como estrela de primeira grandeza, ali morreu, servindo sempre Portugal e nunca a si próprio!287

Não obstante ser um estudo direccionado exclusivamente para as acções diplomáticas e políticas de António de Araújo, denota-se o esforço do Autor no sentido de providenciar uma abordagem holística do período compreendido entre 1787 e 1817, facto que originou uma narrativa recheada de avanços e recuos e de pequenos equívocos nos conceitos utilizados, o que condiciona uma interpretação objectiva da obra por parte do leitor. Para Eurico Malafaia, o futuro conde da Barca teve, desde novo, uma forte ânsia de saber, grande aplicação, mas também um certo dilentantismo288 que se manifestariam sempre ao longo da sua vida, sendo que a livraria particular é fundamental para compreender a acção do biografado, pois terá sido o primeiro e quase único suporte para a sua vasta erudição289. Herdeiro das Casas de Sá das Choças e da Prova, o Autor aponta que o facto de seus pais serem primos e as evidentes razões de consanguinidade [são as razões] da conhecida debilidade física que Araújo arrastou toda a vida, atravessando frequentes períodos de falta de saúde e que talvez o conhecimento dessa sua fragilidade o houvesse desmotivado para o casamento, pouco ou nada se sabendo, com rigor, da sua vida sentimental290.

As suas actividades sociais e políticas foram sempre marcadas pelo pragmatismo, sendo exemplo disso a intervenção na Sociedade dos Amigos do Bem Público de Ponte de Lima que parece ter sido uma evidência da forte intervenção política de Pombal, cuja influência não deixa de marcar com relevo a mentalidade do 287

Ver: IDEM, p. 2. Ver: IDEM, 18. 289 Ver: IDEM, p. 23. 290 Ver: IDEM, p. 15. 288

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biografado291. Por outro lado, a questão do Tratado de 1797 é amplamente tratada pois todo o contexto negocial que girou à sua volta, constituiu o ponto alto da sua carreira de diplomata292. Nesse tempo, António de Araújo demonstrou ser um liberal nato profundamente influenciado pela independência dos Estados Unidos da América, o elemento da sua mudança de orientação293, mas fugidio em relação aos exageros contidos na Constituição Francesa294. Como governante em Portugal, o conde da Barca empreendeu um luta pela neutralidade, não deixando contudo de revelar uma propensão para a França, a qual seria a solução correcta na conjuntura que se vivia295. E nesse contexto serviu sempre o Regente com a maior lealdade e não se dando por molestado com as acções do inimigo interno – os anglófilos – que tudo iam fazendo para o demolir, conspirando junto do Regente, apodando-o mesmo de traidor296.

A acção de Araújo no Brasil, não teve a marca do seu prestígio como diplomata […] pois estava já muito marcado pelo tempo, deixando transparecer a sua crescente incapacidade física e arrastando-se mesmo pelos gabinetes e secretarias297.

Depois de afastada a influência britânica na Corte, António de Araújo como Conselheiro de Estado e governante lançou um conjunto de iniciativas, tendo em vista o fomento cultural298, de que se destaca a contratação da Missão artística francesa, e sustendo as revoltas de Montevideu e de Pernambuco299. 2.3. AS ABORDAGENS PARCELARES 2.3.1. O LETRADO E A LIVRARIA Para além dos estudos histórico-biográficos, propriamente ditos, os estudos sobre conde da Barca ganharam a forma de abordagens parcelares em artigos de

291

Ver: IDEM, pp. 13; 45. Ver: IDEM, p. 199. 293 Ver: IDEM, p. 45. 294 Ver: IDEM, p. 72. 295 Ver: IDEM, p. 321. 296 Ver: IDEM, p. 322. 297 Ver: IDEM, p. 483. 298 Ver: IDEM, pp. 413-418. 299 Ver: IDEM, pp. 419-437. 292

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revistas, verbetes em obras de referência ou enciclopédias e, ainda, na publicação de fontes documentais. Aqui é possível descortinar dois momentos distintos: o primeiro, é composto pelas abordagens de Meneses Brum, referência incontornável para o estudo da livraria, e de Inocêncio Francisco da Silva que, no seu Dicionário, apontou um conjunto de informações de inegável importância para a compreensão da produção escrita de António de Araújo de Azevedo; o segundo momento diz respeito aos estudos de Alberto Feio, Jean Gagé, António Pedro de Sousa Leite, Nuno Daupiás de Alcochete, Jean de Pins entre outros. José Zeferino Meneses Brum, chefe da divisão de estampas da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, publicou, em 1876 e 1877, um artigo intitulado Do Conde da Barca, de seus escriptos e livraria300 que corporiza a visão do grande estadista, do fiel e incansável servidor do Estado e amigo dedicado do Brasil301. A notícia biográfica representa, em certa medida, a evocação do altruísmo de António de Araújo que não esmoreceu no empenho, que tomára, de trabalhar pelo progresso e civilização do Brazil302, pois sendo dotado […] do mais elevado bom senso, tinha o talento muito especial de bem saber fazer as cousas, e sobretudo de tornar-se um dos homens mais utilitários de sua ephoca; sua casa, sua bolsa, seus bons serviços pessoaes, seus gabinetes scientificos, e enfim sua livraria estiveram sempre à disposição de quem delles precisava303.

E mais adiante Os bons serviços, que o conde da Barca prestou á causa da civilização em geral dão-lhe o direito a uma menção honrosa na Historia; mas os prestados ao progresso e civilização do Brazil em particular fazem sua memoria grata aos brazileiros e nos-impõem o dever de inscrever seu nome immorredouro entre os dos homens illustres e bemfeitores da terra de Sancta Cruz304.

A razão primeira do artigo prende-se com a divulgação da collecção iconographica, parte integrante da Collecção do Conde da Barca, também dita Collecção Araujense.

300

Ver: BRUM, J. Z. Meneses - “Do Conde da Barca, de seus escriptos e livraria”, in: Annaes da Bibliotheca Nacional do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro: Typ. G. Lenzinger e Filhos, 1876-77, Fascículo n.º 1, pp. 5-33; Fascículo n.º 2, pp. 359-403. 301 Ver: IDEM, p. 372. 302 Ver: IDEM, p. 15. 303 Ver: IDEM, p. 19. 304 Ver: IDEM, p. 20.

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No entanto, apesar de ser referido logo na abertura que a bibliographica fica reservada a outro mais competente n’esta especialidade305, este artigo de Meneses Brum tem sido frequentemente citado como o estudo mais desenvolvido sobre a livraria particular do conde da Barca, uma das riquezas da Biblioteca Nacional brasileira a par da Collecção de Diogo Barboza Machado306. Tal facto fica a dever-se talvez à apresentação da crítica interna do catálogo de 1819, até então desconhecido, bem como a transcrição de alguns trechos do mesmo por onde se vê que Araújo detinha várias bíblias, uma delas do século XIV, diversos tratados teológicos, colecções de legislação, um vasto conjunto de obras de História natural, principalmente de botânica; obras corográficas e de viagens, etc., num vasto leque que o configuram como um bibliófilo eclético307. Mas a análise do conteúdo da livraria magnífica composta por mais de 6309 volumes308, todas elas adornadas com o ex-libris, à excepção das que foram modernamente encardenadas309, só é justificada para contextualizar o processo de incorporação da livraria na Biblioteca Nacional e do processo litigioso que o governo manteve durante décadas com a família acerca do pagamento do valor estipulado no leilão de 1819310. Essa é a razão da transcrição da Memória sobre a dívida do Estado a João Piombino, cessionário habilitado dos herdeiros do conde da Barca, e de uma vasta série de pareceres, acórdãos da Relação, certidões diversas, etc. 311, que ilustram a complexidade do processo relativo ao pagamento da venda da livraria aos herdeiros do conde da Barca. Assim, a collecção iconográphica, que deve ser entendida como o conjunto de obras de estampas existentes na livraria, era composta pelo Le Grand Theatre de l’Univers, com mais 130 volumes, numa colecção única e verdadeiramente singular por serem todas as estampas d’ella das primeiras e mais perfeitas provas, mas também pela preciosidade e raridade das peças que a compõem; o Atlas do fallecido Mr. De Boendermaker, trez pequenos catálogos impressos juntos em um fascículo; o catálogo da Collecção de antiguidades romanas e gregas312.

305

Ver: IDEM, p. 5. Ver: IDEM, p. 5. Ver: IDEM, pp. 374-381. 308 Ver: IDEM, p. 383. 309 Ver: IDEM, p. 390. 310 Ver: IDEM, p. 361. 311 Ver: IDEM, pp. 359-373. 312 Ver: IDEM, p. 391. 306 307

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Segundo Meneses Brum, é evidente que não foi o conde da Barca quem organizou a collecção, que hoje tem o seu nome, e sim um iconophilo anonymo de Amsterdam, de muito bom gosto, vindo ella finalmente a cair em mãos de António de Araújo por compra, como o Atlas de Boendermaker foi parar empoder de um dos seus predecessores na legação portuguesa em Haia, o conde de Tarouca313.

Noutro registo, os dicionários temáticos publicados pelos eruditos de finais do século XIX são ainda hoje de consulta obrigatória para quem se dedica à investigação histórica. Estão nesta situação os dicionários bio-bibliográficos de Inocêncio Francisco da Silva, de Esteves Pereira e Guilherme Rodrigues ou, até mesmo, o corográfico de Pinho Leal314. O Diccionário Bibliographico Portuguez de Inocêncio mantém-se, ainda hoje, como uma obra de consulta imprescindível para o conhecimento da produção escrita édita e inédita de António de Araújo. Para além da reduzida síntese biográfica apresentada, o conjunto de informações bibliográficas disponibilizadas, como a data e o local de edição, o valor comercial da obra, o juízo crítico do seu conteúdo, etc., fornecem um primeiro conhecimento do contexto em que os mesmos foram escritos ou publicados. Por ali ficamos no conhecimento de que Araújo possuía um carácter multifacetado, pois escreveu obras de índole política, como a Representação a elrei D. João VI; de polémica social como a Resposta, ou refutação da Carta de um Vassallo nobre ao seu Rei, com que se digladiou com o marquês de Penalva em 1806; que participou no memorialismo patrocinado pela Academia Real das Ciências; para além de ter escrito outras composições literárias, como tragédias originais e traduções dos Antigos e dos Modernos315. Todavia, Inocêncio demonstra alguma hesitação em relação à tragédia Ósmia, texto submetido a concurso sob anonimato na Academia Real das Ciências em 1788. Inicialmente, atribuiu a sua autoria a António de Araújo de Azevedo, seguindo o conceito delineado por José Maria da Costa e Silva, mas, mais tarde, e em entrada própria, recuou perante o formal e auctorizado testemunho de um cavalheiro por tanto títulos respeitável como o é o Sr. António de Mello Breyner, decidindo atribuir

313

Ver: IDEM, pp. 401-402. Ver: LEAL, Augusto Soares d’Azevedo Barbosa de Pinho, “Ponte da Barca”, in: Portugal Antigo e Moderno. Diccionario Geographico, […], Volume Setimo, Lisboa: Livraria Editora de Mattos Moreira & Companhia, 1876, p. 166-167. 315 Ver: SILVA, Inocêncio Francisco da - “António de Araújo de Azevedo”, in: Diccionario Bibliographico Portuguez (…), Tomo I, Lisboa: Imprensa Nacional, 1858, pp. 88-90. 314

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definitivamente a autoria da tragédia à Condessa do Vimiero, D. Teresa de Mello Breyner316. Esta questão haveria de perdurar até meados do século XX, quando Jean Gagé, Professor da Faculdade de Letras na Universidade de São Paulo, sustentando-se na correspondência particular de Araújo existente no Rio de Janeiro, abordou un petit probleme d’histoire dês lettres portugaises. Para este autor, a Ósmia era, de facto, uma obra de juventude de Araújo e até o próprio simbolismo que envolveu a entrega do prémio significava que a autoria pertencia a alguém profundamente devotado às Ciências Naturais, algo por que se distinguiu Araújo e nunca a condessa do Vimieiro317. Por outro lado, o Diccionário Histórico dos eruditos Esteves Pereira e Guilherme Rodrigues é uma obra de maior abrangência no seu conjunto, conforme se indica no subtítulo da obra. Se Inocêncio remete o leitor para bibliografia auxiliar, Esteves Pereira socorre-se dessa mesma informação para esboçar uma ampla notícia biográfica de António de Araújo, sobretudo da carreira diplomática e ministerial, a qual é claramente apoiada no Elogio Histórico e na polémica desenvolvida pela historiografia liberal, apresentando em seguida uma mera listagem da bibliografia activa do conde da Barca318. O segundo momento de análise da livraria e da bibliofilia de António de Araújo de Azevedo seria marcado pelos estudos de Alberto Feio, António Pedro Sousa Leite e Nuno Daupiás de Alcochete. Alberto Feio, director da biblioteca Pública e Arquivo Distrital de Braga, em 1931, traçava o percurso da livraria de António de Araújo até à sua chegada a Lisboa em 1806 e, concomitantemente, reivindicava a contratação do gravador Francisco Bartolozzi que, inclusivé, tinha gravado dois ex-libris para António de Araújo319. Anos mais tarde, retomaria a questão na edição da História da Etiópia do Padre Pêro Pais, que tinha sido oferecida por Joseph Banks a Araújo juntamente com a tradução dos poemas sânscritos intitulados Ramaiana, Mahabarata e Bhágavat Purana, que pertenceram ao Colégio dos Jesuítas de Rachol, e, ainda, das cartas ânuas da Etiópia –

316

Ver: IDEM, Tomo VI, Lisboa: Imprensa Nacional, 1862, pp. 329-330. Ver: GAGÉ, Jean - “António de Araújo de Azevedo, Auteur d’Osmia. Note sur un petit problème d’histoire des lettres portugaises, d’après des documents inédits conservés aux Archives Nationales de Rio de Janeiro”, Separata do Bulletin des Études Portugaises et de l’Institut Français au Portugal, Coimbra : Coimbra Editora, Lda., 1946. 318 Ver: PEREIRA, Esteves, RODRIGUES, Guilherme – “Barca (António d’Araújo e Azevedo, 1.º conde da)”, in: Portugal, Diccionario Histórico, Biographico, Bibliographico, heráldico, Chorographico, Numismático e Artístico […], Vol. II-B-C, Lisboa: João Romano Editor, 1906, pp. 112-114. 319 Ver: FEIO, Alberto, “A Livraria e os ex-libris do Conde da Barca gravados por Bartolozzi. Novos subsídios biográficos do Artista”, in: Anais das bibliotecas e Arquivos, Vol. IX (1-2), Janeiro-Junho (33-34), 1931, pp. 26-34. 317

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designação retrospectiva dos relatórios que os missionários jesuítas enviaram para o superior hierárquico, o Provincial da Índia, entre os anos de 1607 e 1653320. A livraria seria, também, a base fundamental da abordagem protagonizada por António Pedro Sousa Leite ao pretender avaliar o papel desempenhado pelo conde da Barca nas interpenetrações das culturas portuguesa, inglesa e alemã. Na verdade, a análise do catálogo datado de 1802321, existente na Biblioteca Nacional portuguesa (anterior àquele que foi trabalhado por Meneses Brum), bem como de variada correspondência “particular” recebida por António de Araújo, permitiu ao Autor deste trabalho delimitar cronologicamente a acção de um intelectual, aqui considerado como o próprio triunfo do cosmopolitismo. Se através da primeira fonte utilizada, se assiste a uma tentativa de demarcação dos momentos de aquisição de várias obras, num processo meramente dedutivo que atende apenas ao local de edição e ao idioma; já através da análise da correspondência recebida, Sousa Leite deduz que o grau de penetração de Araújo nas culturas alemã e inglesa é extremamente condicionado pela questão do seu domínio ou não dos respectivos idiomas, quando se sabe que, desde a assinatura dos Tratados de Vestefália, o francês emergira paulatinamente como o idioma “universal” e que em meados do século XVIII é a língua falada pelas elites europeias... Para este autor, António de Araújo jamais aspirou à mera satisfação de curiosidades intelectuais ou a uma erudita e estéril acumulação do saber. A cultura que evidenciou para além de ser motivo de grande consolação íntima, foi sempre também uma fecunda riqueza colocada generosamente ao serviço da causa nacional322, de que são exemplos as viagens realizadas pela Alemanha, entre 1798 e 1800, bem como, as diversas passagens pela Inglaterra, entre 1789 e 1802. Neste estudo, publicado na revista Armas e Troféus, o Autor restringiu o campo de acção salientando, até de uma forma algo equivocada, que pretendia, apenas, aquilatar os contributos de Araújo nos domínios cultural e científico deixando de lado a sua absorvente carreira política e diplomática, alheia, quase sempre, ao objectivo deste trabalho. As suas motivações prendiam-se com o pouco que se tinha escrito sobre a figura do Conde da Barca, e esse mesmo sem a amplitude e profundidade que seria de

320

Ver: IDEM – “Nota bio-bibliográfica”, in: História da Etiópia de Pero Pais, Porto: Livraria Civilização, 1945, pp. XXVIIXXXVI. 321 Ver: Bibliotheca araujiana ou catalogue des livres de la bibliothêque de son Excellence, Monsieur le Commandeur d'Araujo d'Azevedo, Envoyé Extra-ordinaire et Ministre Plénipotentiaire de Son Altesse Roiale le Prince Régent de Portugal prés de la Cour de Russie... placée à la maison du bois, prés de la Haye en Septembre 1802 et confiée á... J. D. Nierdt. [1802?]. 322 Ver: IDEM, p. 11.

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esperar, sendo, por isso, notória a falta de uma condigna biografia de um homem que foi tudo ou quase tudo no seu tempo323. António de Araújo emergira na cena nacional à “sombras de avós”, ou melhor, à sombra da estratégia delineada pelos seus antepassados que, vivendo à lei da nobreza, exerceram cargos na governança e nas pequenas magistraturas locais num esforço contínuo de nobilitação individual e familiar. A culminância da trajectória ascensional da sua estirpe vai-se verificar nas acções de António de Araújo como se comprova pela escolha do título de conde da Barca, clara evidência do respeito pelos antepassados que no século XVI se instalaram em Ponte da Barca vindos da Galiza324. Vivendo numa época de transição, em que se assiste ao embate da herança neoclássica com o Romantismo, à substituição do direito divino pelos novos princípios do “contrato social” e da “Declaração dos Direitos do Homem” e ao impacto da Revolução industrial na economia, António de Araújo procurou conciliar estes variados e contraditórios movimentos com raro sentido de equilíbrio, o que o torna eminentemente um homem do seu tempo325. Por isso é que ao reconhecer a extraordinária actividade cultural e científica que se desenvolvia na Alemanha326, encetará uma viagem que seria frutífera para o desenvolvimento científico e tecnológico português. Os contactos que ali desenvolveu permitiram-lhe, anos mais tarde, convidar técnicos germânicos para lançar em Portugal e no Brasil, empreendimentos de interesse nacional, alguns dos quais directamente inspirados naquilo que viu na Alemanha. Se, por outro lado, promoveu facilidades para os sábios alemães que se deslocavam ao Brasil em missão de estudo, por outro, divulgou temas de cultura portuguesa em periódicos alemães, tendo inclusivamente contribuído com achegas sobre o Brasil para a Skizze von Brasilien que D. Joaquim Lobo da Silveira preparava327. Também o dinamismo colocado nas relações culturais com a Inglaterra será frutífero. Logo no início da sua carreira diplomática, Araújo observou o arranque da Revolução Industrial que o levou, mais tarde, a procurar introduzir em Portugal essa nova fonte de riqueza328. No entanto, Sousa Leite não deixa de referir a curiosa dualidade de inclinações pois se se verifica no seu espírito um profundo entusiasmo pela cultura britânica; por 323 LEITE, António Pedro de Sousa, “O Conde da Barca e o seu papel em alguns aspectos das relações culturais de Portugal com a Inglaterra e a Alemanha”, 3.ª ed., Separata da Armas e Troféus, 2.ª série, Braga: [s.n.], 1962, p. 5. 324 Ver: IDEM, pp. 7-8. 325 Ver: IDEM, p. 11. 326 Ver: IDEM, p. 17-18. 327 Ver: IDEM, pp. 44-45. 328 Ver: IDEM, pp. 14-15.

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outro, uma decisão irrevogável de lutar contra a influência britânica nos destinos da Pátria329. Ao contrário da sua passagem pela Alemanha, Araújo penetrou com relativa facilidade nos meios intelectuais ingleses especialmente nos meios literários durante as suas várias passagens por aquele país entre os anos de 1789 e 1802, conforme testemunham o aumento constante da sua livraria, a tradução de poetas ingleses, a contratação de Bartolozzi e até a homenagem de Henry L’Êveque que lhe dedicou a edição dos Costumes of Portugal330. A acção cultural de António de Araújo, no meio diplomático, foi também analisada por Nuno Daupiás de Alcochete. A correspondência trocada entre Francisco José Maria de Brito, secretário e amigo do conde da Barca, com o seu tio D. Frei Manuel do Cenáculo Vilas Boas, bispo de Beja entre os anos de 1789 e 1804, foi o pretexto encontrado para Nuno Daupiás de Alcochete tecer algumas considerações sobre a aquisição de livros antigos e a sua remessa para Portugal, num trabalho divulgativo com inegável interesse para a história das mentalidades, da cultura, da política e da sociedade de finais do século XVIII. O texto centra-se, essencialmente, na acção desenvolvida por Araújo e Brito, dois «estrangeirados», que promoveram o desenvolvimento da cultura nacional não só através do projecto desenvolvido em parceria com o alemão David Ruhnken, professor de Literatura grega em Leiden, para editar as obras de D. Jerónimo Osório331, como também na remessa constante de livros para o bispo de Beja, sobejamente conhecido, pela sua acção humanista e pela promoção de verdadeiros focos de cultura particular332. 2.3.2. A EPISTOLOGRAFIA A edição de fontes arquivísticas patrocinada, essencialmente, pela historiografia erudito-metódica encerrou uma dupla vantagem, pois permitiu recuperar e divulgar o documento inédito e torná-lo acessível a um público mais alargado numa altura em que o acesso ao arquivo do conde da Barca permanecia condicionado e, também, porque permitiu resgatar os autores desses documentos, retirá-los da obscuridade em que se encontravam e proporcionar o conhecimento do(s) quotidiano(s), colmatando as lacunas existentes no conhecimento dos intervenientes nesta conversa à distância. 329

Ver: IDEM, p. 57. Ver: IDEM, pp. 46 e segs. Ver: ALCOCHETE, Nuno Daupiás de, Humanismo e diplomacia: correspondência literária (1789-1804) de Francisco José Maria de Brito com Dom Frei Manuel do Cenáculo, Paris : F.C.G. Centro Cultural Português, 1976, p. 22. 332 Ver: IDEM, p. 28. 330 331

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Essa correspondência dita “particular” recebida (e não expedida) implica que apenas se conheça a visão do “outro” nos temas veiculados, mas um esforço hermenêutico permite identificar a existência de pontos de convergência entre autor e receptor, reconstruir e reinterpretar vivências, identificar referências culturais, interesses políticos e ideológicos, e assim, favorecer o debuxo dos seus perfis psicológicos e uma, não menos importante, reinterpretação da realidade circundante no momento da escrita dessas cartas. O facto de apresentar uma escrita mais solta, mais ou menos subjectiva, distante das amarras da burocracia administrativa, pode contribuir para a compreensão dos vários contextos em que se situou o conde da Barca, algo que é impossível de ser alcançado através da análise exclusiva da sua vida pública. Este epistolário apresenta um quadro policromado composto por personalidades marcantes do panorama português cujas ideias, juízos, sentimentos, convicções, pretensões, sensações etc., afluem para o mesmo destinatário: António de Araújo de Azevedo que ora como Ministro em Portugal, ora como Conselheiro de Estado e Ministro no Brasil, detém uma posição política e social privilegiada para atender aos rogos e às necessidades dos que lhe escrevem. Em 1912, o citado Artur da Cunha Araújo, na altura ainda estudante, dava à estampa um conjunto de cartas que o abade Correia da Serra dirigiu ao amigo António de Araújo de Azevedo333. Depois de ter passado por Londres e Paris em exílio, Correia da Serra decide partir para os Estados Unidos da América e como último recurso se lembrou de mais uma vez appelar para a nunca desmentida amizade do seu amigo de mais de 30 anos, António de Araújo, que a esse tempo tinha acompanhado D. João VI para o Brazil, para elle lhe obter do governo o cumprimento das pensões que, há annos já, deixara de receber”334.

Se a obtenção das pensões foi um facto, o auxílio de Barca veio a revelar-se ainda mais precioso com a nomeação de Correia da Serra para Ministro Plenipotenciário nos Estados Unidos335, onde permaneceria até 1821336. Mas não é só de pedidos de auxílio que se trata nesta correspondência. As vertentes culturais e científicas eram

333

Ver: ARAÚJO, Artur da Cunha, “Cartas do Abbade Correia da Serra ao Conde da Barca”, in: Arquivos de História da medicina Portuguesa, Nova Série – 3.º, Porto: Lemos & C.ª, Suc., 1912, pp. 12-19; 49-54; 99-106; 183-191. Ver: IDEM, p. 15. 335 Ver: IDEM, p.16. 336 Ver: IDEM, p. 100. 334

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objecto da prosa de Correia da Serra que amiudadamente remetia informações botânicas, obras publicadas e comentava os círculos culturais de Filadélfia. A botânica é também o assunto que une António de Araújo a Félix de Avelar Brotero, Director do Museu e Jardim Botânico da Ajuda337. Segundo Abílio Fernandes, esta correspondência vinha lançar mais alguma luz sobre a personalidade de Brotero, mas também ao ilustre estadista, a quem a ciência botânica portuguesa ficou devendo preito de indelével gratidão338. Da pena de Félix de Avelar Brotero sobressaem as lamentações pelos tremendos saques que Geoffroy de Saint-Hilaire fizera às colecções do Museu e Jardim, como também os agradecimentos pela regularização dos soldos e pelo alcance dos meios necessários para poder terminar o primeiro tomo da Phitographia Lusitaniae. Se Brotero remetia plantas para o Brasil como testemunho de um convívio científico, também tomou a decisão, segundo as palavras do próprio de lhe pagar um tributo, de que V. Ex.ª se faz credor pela protecção, com que sempre honrou a Sciência Botânica e os que nela se distinguem dedicando-lhe uma nova planta denominada Araujia sericofera339. A mesma dimensão de amigo e de “protector” sobressai nas cartas que a marquesa de Alorna lhe escrevera, a partir do seu exílio em Londres, como, também, depois do seu regresso a Portugal, quando se empenhou na reabilitação do seu irmão, morto, em Conisberga em 1813, e no resgate das propriedades familiares que tinham sido confiscadas340. Para Hernâni Cidade, compilador e anotador desta selecção de cartas eivadas de fino recorte literário, António de Araújo foi pela fidalguia do sangue e do espírito, dos homens de maior relevo do seu tempo e a sua consideração por Alcipe de quem veneradoramente guardou as cartas, vinha-lhe não apenas de fortuitas relações sociais, mas de vivas afinidades de espírito. Era como ela poeta – e poeta horaciano a quem por igual a poesia nórtica não deixava indiferente, traduzindo de Gray a mesma elegia que Alcipe traduziu341.

337

Ver: FERNANDES, Abílio, “Quatro cartas inéditas de Brotero para o Conde da Barca”, separata da Revista da Faculdade de Ciências da Universidade de Coimbra, vol. XVI, Coimbra: Tipografia da Atlântida, 1947. Ver: IDEM, p. 25. 339 Ver: IDEM, p. 24. 340 Ver: CIDADE, Hernâni, A Marquesa de Alorna. Sua vida e obras reprodução de algumas cartas inéditas, Porto: Companhia Portuguesa Editora, Lda., [1930]. As cartas da marquesa de Alorna para Araújo de Azevedo foram, publicadas segunda vez por VAZ, A. Luís – A marquesa de Alorna. Cartas do exílio em Londres (1804-1814), Braga: Presença e Diálogo, 1974. 341 Ver: IDEM, p. 80-nota 1. 338

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A questão das Letras e da protecção foi aflorada pelo coronel José Baptista Barreiros quando deu à estampa umas “Cartas inéditas para o Conde da Barca”342. No seu entender, seria indesculpável o fazê-las continuar ignoradas dada a sua importância para o estudo psicológico dos seus autores que por aqui imploram o patrocínio do homem que, além de diplomata, foi ministro em Portugal e no Brasil343. A posição privilegiada que António de Araújo detinha na Corte no Rio de Janeiro levou João Pedro Ribeiro, o entretanto nomeado arcebispo de Évora, D. Frei Manuel do Cenáculo, o poeta Tomás António dos Santos e Silva e o Padre Mateus José da Costa, a suplicarem o seu amparo. Segundo Baptista Barreiros, o facto do Padre Mateus José da Costa ter designado o conde da Barca como seu protector nas sucessivas edições da sua obra Tesouro de Meninos ou Resumo de História Natural espelha bem a protecção que o Conde dispensava aos escritores e publicistas e de como estes repetidamente recorriam a um patrocínio de que não há notícia a algum tenha sido recusado344.

Por outro lado, as extensas séries publicadas por Nuno Daupiás de Alcochete têm, necessariamente, um outro contexto, uma vez que possuem um objectivo de recuperação e divulgação das relações luso-francesas nos princípios do século XIX. A génese do seu trabalho está intimamente ligada a uma tentativa de perscrutar o passado da família Ratton (a sua) como se verifica nas Lettres familières de Jacques Ratton345. Na verdade, Nuno Daupiás de Alcochete, por informação de António Pedro de Sousa Leite, veio no conhecimento de que existiam cartas autógrafas e inéditas de Jácome e de Diogo Ratton, no “Fundo Barca-Oliveira”. A partir daqui, lançou uma divulgação destes dois extensos processos, acompanhados de abundantes notas infrapaginais de grande utilidade. As temáticas abrangidas por estes dois processos epistolográficos remetem-nos para os campos da economia e das finanças, mas também, para a questão da modernização social, política e tecnológica do Reino, que aqui surgem precedidas de breves estudos introdutórios destinados à reinterpretação das vivências dos seus intervenientes e da realidade circundante. 342 Ver: BARREIROS, José Baptista, “Cartas Inéditas para o Conde da Barca”, in: Revista de Guimarães, vol. LXIX, Guimarães: Sociedade Martins Sarmento, 1959, pp. 79-100. 343 Ver: IDEM, 1959, p. 79. 344 Ver: IDEM, Correspondência inédita entre o Conde da Barca e José Egídio Álvares de Almeida, secretário particular de El-Rei Dom João VI, Braga: Delegação Bracarense da Sociedade Histórica da Independência de Portugal, 1962, p. 93. 345 Ver: DAUPIÁS, Nuno, «Lettres familières de Jacques Ratton», 1792-1807 , in: Bulletin des Etudes Portugaises, 23, Lisboa : Bertrand, 1961.

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Jácome Ratton, industrial e grande financeiro português de origem francesa, iniciou a correspondência com António de Araújo durante o seu exílio em Inglaterra, depois de ter sido deportado durante a Setembrizada em 1810. As suspeitas de jacobinismo, de maçon, e de colaboracionista durante a ocupação de Junot, foram os motivos encontrados para o seu ostracismo. Todavia, Daupiás de Alcochete, apresenta uma outra perspectiva, pois defende que o verdadeiro motivo deste exílio residiu nas iniciativas dos seus concurrents qui ne lui pardonnaient pas l’ampleur et le succés de ses enterprises industrielles et commercialles346. Os primeiros anos da sua permanência em Londres mostram um homem amargurado, acossado pela imprensa periódica em Londres, que recorre ao seu amigo de longa data no Rio de Janeiro rogando a sua protecção para obter do Regente uma graça honorífica que o reabilite perante os olhos da opinião pública. A partir de 1814, altura em que Araújo regressa ao Ministério, para sobraçar a Pasta da Marinha e dos Domínios Ultramarinos, a correspondência de Jácome Ratton ganha outra profundidade e objectividade e, também, claros contornos de um debate profícuo em torno de ideias políticas e económicas entre um espírito distinto e político hábil e uma inteligência prática, ávida de iniciativas, em prol da dinamização económica para recolocar Portugal e Brasil num lugar condigno na conjuntura económica e política internacional que se começou a desenhar a partir do Congresso de Viena. Segundo Daupiás de Alcochete, Les requêtes personelles et familiales de Ratton ne constituent que le moindre intérêt de ses lettres à Barca. En elles apparaît presque à chaque ligne le commerçant, l’industriel, le financier, le brasseur d’affaires qu’il avait été toute sa vie, toujours à l’affût de créations nouvelle, et plus que jamais sincèrement dévoué au developpement économique, et de ce second Portugal, plus prometteur que le prémier: le Brésil. Sur ce terrain, Barca et Ratton étaient particulièrement fait pour s’entendre.347

Mas, era também, uma preuve indéniable de l’influence personelle qu’il [Barca] exerçait sur le Prince Régent348. As cartas de Diogo Ratton possuem uma valência mais prática: isentas de considerações teóricas e de conjecturas, demonstram inequivocamente o espírito de iniciativa do seu Autor em prol da industrialização de um reino devastado pelas

346

Ver: ALCOCHETE, Nuno Daupiás de, Lettres de Jacques Ratton a António de Araújo de Azevedo, Conte da Barca : 18121817”, in: Bulletin d'Etudes Portugaises, Tomo 25, Lisbonne : Institut Français au Portugal, 1964. -p. 140. 347 Ver: IDEM - pp. 146-147. 348 Ver: IDEM, p. 145.

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invasões francesas e pelo Tratado de Comércio de 1810349. Esta correspondência surge após 1814, e aborda questões importantes para a dinamização dos meios financeiros portugueses, nomeadamente através da renovação do contrato de tabaco para o triénio de 1816-1818350, das tentativas de introdução da máquina a vapor em Portugal e da reconstrução da fábrica de fiação da quinta da Prova a que António de Araújo se dedicava desde 1779. Na mesma linha metodológica surgiu Jean de Pins, arquivista-páleografo e antigo conservador da embaixada francesa em Portugal, ao publicar Sentiment et diplomatie d'aprés des correspondances franco-portugaise: contribution à l'histoire des mentalités au debut du XIXéme siécle351. A lógica assenta na divulgação de fontes portuguesas com interesse para a História das Mentalidades nas relações luso-francesas, à semelhança das pesquisas sectoriais que vinham desenvolvendo Anne Gallut para a literatura, Nuno Daupiás de Alcochete para a economia e António Pedro Vicente para a História Militar352. Jean de Pins abordou o quotidiano de cinco “personagens” no sentido de identificar a sua mundividência e as práticas de sociabilização: Ce faisant, nous visions un double objectif: pour Barca, pour Brito, personnages muets, il s’agissait en somme d’approfundir leurs intentions, en fonction de leur carriére et du peu que l’on peut appréhender de leur comportement d’hommes du monde; pour les femmes, de lire entre les lignes, de démêler le vrai du faux et de découvrir, derrière les conventions verbales, les vicissitudes de leur existence353. C’est donc légitimement que nous nous référons d’abord à elles en parlant de contribution à l’histoire des mentalités354.

A obra assenta em duas partes: a primeira, em torno da evolução das relações entre Portugal e França desde os finais do século XVIII até ao primeiro quartel do seguinte, continuando pela apresentação dos percursos de António de Araújo, Francisco José Maria de Brito, Suzanne Cappadoce-Pereira, Baronesa de Beaumont e Marianne da Silva; a segunda parte revela abundante correspondência particular, na sua maioria pertencente ao “Fundo Barca-Oliveira”, rematada com numerosas notas infrapaginais.

349

Ver: IDEM, Lettres de Diogo Ratton a António de Araújo de Azevedo, Comte da Barca (1812-1817), Paris: Fundação Calouste Gulbenkian, Centro Cultural Português, 1973. Ver: IDEM - p. 14. 351 Ver: PINS, Jean de, Sentiment et diplomatie d'aprés des correspondances franco-portugaise : contribution à l'histoire des mentalités au debut du XIXéme siécle, Paris : Fund. Calouste Gulbenkian, Centre Cult. Portugais, 1984. 352 Ver: IDEM, p. XI. 353 Ver: IDEM, p. VIII. 354 Ver: IDEM, p. 2. 350

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Do seu conjunto sobressaiu a imagem de um homem viajado, de cultura superior, proveniente d’une bonne noblesse de province, en tous cas la meilleure du Minho, que desde o tratado de paz de 1797 vai encetar uma luta pelo estabelecimento da paz com a França sob o claro consentimento do Príncipe Regente. Aliás, para Jean de Pins, o Príncipe est non seulement à l’origine de l’ascension de Barca mais l’instigateur, plus ou moins occulte, de toute son action politique355. As suas opções políticas, tanto como diplomata, como ministro, não eram diferentes das de outras nações da Europa na medida em que pretendia evitar toda a confrontação brutal com a potência dominante356, mas também no sentido de se libertar os Braganças da dominação britânica357. Em conclusão, Jean de Pins sustenta que o grande obstáculo que se criou em volta da acção de Barca foi o da desproporção entre a sua ambição e a fraqueza dos seus meios e que Pour accéder á la dimension d’un Talleyrand ou d’un Pitt, il ne lui manqué finalement qu’un chose: l’autorité qu’un grand pays confére, quasiment malgré lui, à son représentant officiel358

2.4. A HISTORIOGRAFIA CIENTÍFICA Finalmente, para terminar esta longa resenha crítica, resta-nos abordar a perspectiva que emergiu do exercício crítico e científico da História. Em 1987, Joaquim Pintassilgo apresenta uma dissertação de mestrado à Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, intitulada Diplomacia, política e economia na transição do século XVIII para o século XIX: o pensamento e acção de António de Araújo de Azevedo (Conde da Barca)359. Trata-se de uma abordagem de forte cunho interpretativo, com enquadramento em História das Ideias, que pretende analisar no contexto português e europeu as ideias políticas

e

económicas

de

António

de

Araújo,

num

período

delimitado

cronologicamente pelos anos de 1779 e de 1804. O perfil cultural, científico e humano de António de Araújo é típico de um homem das Luzes, de alguém que promove a

355

Ver: IDEM, p. 16. Ver: IDEM, p. 35-36. Ver: IDEM, p. 71. 358 Ver: IDEM, p. 76. 359 Ver: PINTASSILGO, Joaquim, ob. cit. 356 357

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simbiose entre o absolutismo e o iluminismo: cosmopolita, poliglota, bibliófilo, ávido de conhecimentos científicos e participativo nas reuniões literárias e nos salões360. As ideias políticas evidenciadas por António de Araújo de Azevedo, durante a sua carreira diplomática, são analisadas a partir da correspondência oficial, nomeadamente dos ofícios que amiudadamente remetia para o Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, Luís Pinto de Sousa. Joaquim Pintassilgo advoga que, não obstante as simpatias demonstradas pelo constitucionalismo de Burke, António de Araújo tendeu sempre para a concretização do absolutismo reformista361, sendo inquestionável o seu apego à monarquia, à defesa da manutenção da autoridade do Soberano e de um Estado forte e centralizado tendente a desempenhar um importante papel nas iniciativas económicas. Neste sentido, Araújo mostrou ser um Homem de certa formação “iluminista” mais dado à tolerância e à moderação do que aos “extremos”, defensor de uma maior abertura social, mas no interior dos quadros de uma sociedade aristocrática e de um pendor monárquico forte”362.

E este posicionamento político é evidenciado no seu pensamento económico (teoria) e nas iniciativas sociais (prática) que desenvolveu, onde se denota um reformismo mais nítido e até um certo espírito de afirmação empresarial363 de forma a ultrapassar os obstáculos que impediam o desenvolvimento económico do reino364. Apesar de não ser um economista, António de Araújo detinha um inegável interesse pela temática, como se observa principalmente no seu manuscrito Un Voyageur contre quatre […], e em outros textos da sua autoria dispersos no universo do “Fundo Barca-Oliveira”, através do quais se verifica a existência de uma grande preocupação de actualização teórica, que fazia convergir um ecletismo doutrinal permanente e o equibílibrio sectorial entre a agricultura (influenciado pelo naturalismo de feição iluminista), a indústria (defendendo a introdução de novas técnicas, partidário da Revolução Industrial) e a dinamização do comércio365. Por outro lado, a prática visou objectivamente a dinamização agrícola e a criação de manufacturas, de que foi pedra de toque a Sociedade dos Amigos do Bem Público de Ponte de Lima. Apesar de não defender grandes mudanças estruturais como, por 360

Ver: IDEM, p. 369. Ver: IDEM, pp. 8; 114. 362 Ver: IDEM, p. 87. 363 Ver: IDEM, p. 256. 364 Ver: IDEM, p. 225. 365 Ver: IDEM, pp. 224-241. 361

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exemplo, a extinção dos morgadios, Barca é um admirador da Revolução Industrial e protagonizará uma importante acção em prol da modernização tecnológica366. Neste sentido, segundo Pintassilgo, pode mesmo ser considerado como um seguidor de Pombal, porque o pombalismo não se esgota com a queda do ministro em 1777, ao nível da renovação e do fomento industrial e, ainda, na obra administrativa e financeira367. Em suma, para Pintassilgo, politicamente Barca enquadra-se na estrutura absolutista vigente no país embora se vislumbre alguns laivos reformistas políticos e económicos e, por conseguinte, dificilmente poderá ser considerado um liberal muito embora também não seja um conservador ou um tradicionalista368. O seu posicionamento é típico de um homem de meio-termo que tenta aperfeiçoar e adaptar gradualmente, sem convulsões, às novas ideias e aos novos tempos369. Os inícios dos anos noventa trouxeram as abordagens de José Viriato Capela que, em dois artigos, evidenciou a importância do “Fundo Barca-Oliveira” para o estudo do crepúsculo do Antigo Regime português e, mais particularmente, para a compreensão do papel desempenhado por António de Araújo nas relações entre Portugal e Brasil. O primeiro desses trabalhos, essencialmente divulgativo, centra-se na importância do arquivo de António de Araújo de Azevedo, chefe de fila do «partido francês» na corte de D. João VI370, para a história do Brasil no fim do período colonial371. O arquivo era composto pelos manuscritos pessoais de António de Araújo, na sua maioria inédita, ao qual foram depois acrescentadas fotocópias de diversos arquivos nacionais, estrangeiros e brasileiros, no intuito, penso, de reconstruir o fundo original e alargar a sua importância documental372.

As diversas pesquisas que Viriato Capela realizou amiudadamente junto daquele conjunto documental, mas, também, o inédito Inventário do fundo de Manuscritos do Conde da Barca da autoria de Nuno Daupiás de Alcochete, favoreceram uma tentativa de arrumação temática desse vasto conjunto documental. Aí, o Autor identifica cinco 366

Ver: IDEM, p. 369. Ver: IDEM, p. 303. 368 Ver: IDEM, p. 368. 369 Ver: IDEM, p. 190. 370 Ver: CAPELA, José Viriato, “António de Araújo e o Brasil. A importância do arquivo de António de Araújo de Azevedo, Conde da Barca para a história do Brasil no fim do período colonial”, in: Bracara Augusta, vol. XLIII, n.º 94/ 95 (107/ 108), Anos de 1991/ 1992, p. 14. 371 Ver: IDEM, p. 13. 372 Ver: IDEM, p. 13. 367

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grandes núcleos: os documentos pessoais, onde está incluída a sua própria produção literária; os papéis relativos à administração de sua casa, fazendas e empreendimentos científicos, agrícolas, industriais e uma importante acção no desenvolvimento das vias de comunicação brasileiras; os documentos relacionados com a sua vida pública, política e diplomática, ao qual associamos o volumoso conjunto de Memórias, pareceres, instruções e textos afins, elaborados ou recebidos por virtude dessa actividade (…) embora uma boa parte se relacione também com os interesses culturais, históricos, literários ou técnico-científicos de Araújo e são o resultado de intercâmbios culturais373.

Depois identifica as várias séries documentais com interesse para a História do Brasil, com especial enfoque para os mapas demográficos das capitanias, que abre um campo enorme ao estudo da História colonial e às origens da formação e da independência brasileira374. No segundo trabalho, é abordada a questão do Tratado de Comércio de 1810, um dos momentos mais significativos então ocorridos. Consequência do Bloqueio Continental e da partida da Corte375, o Tratado de Comércio beneficiou, essencialmente, os ingleses que, assim, chegavam ao Brasil, que até então tinha sido ciosamente protegido pelo pacto colonial376 e provocou ainda grandes dificuldades às indústrias portuguesas, constituindo-se como um verdadeiro obstáculo ao esforço de modernização do Estado e dos particulares377. A análise de um vasto e diversificado conjunto de documentos inéditos (como por exemplo, pareceres, correspondência particular e diplomática e o próprio Tratado de Comércio de 1810), identifica a essência deste artigo: o debate protagonizado no Rio de Janeiro entre António de Araújo de Azevedo, defensor do proteccionismo, e D. Rodrigo de Sousa Coutinho, principal defensor da aliança comercial com a Inglaterra e um dos rostos do livre-cambismo378. A questão económica fora sempre uma preocupação de António de Araújo, desde os tempos da Sociedade dos Amigos do Bem Público e até da sua longa permanência no estrangeiro, o que fez dele

373

Ver: IDEM, p. 14-15. Ver: IDEM, pp. 19-20. 375 Ver: CAPELA, José Viriato, “O Tratado de 1810 com a Inglaterra e a ruína das indústrias Nacionais. Uma crítica de António de Araújo de Azevedo Conde da Barca”, in: Bracara Augusta, vol. XL, n.º 89/90 (102/103), Anos de 1986/ 87, p. 537. 376 Ver: IDEM, p. 526. 377 Ver: IDEM, p. 560. 378 Ver: IDEM, pp. 522-523. 374

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necessariamente senão um estrangeirado, pelo menos afastaram-no bastante do conservadorismo social da aristocracia tradicional, mas também um grande empreendedor com grande interesse por reformas379.

Mas, é a partir de 1808 que o futuro conde da Barca vai começar a preparar as futuras relações com a Inglaterra380, dando início a um projecto de modernização económica e tecnológica do Brasil que se estende à área têxtil e à mineração. E, neste sentido, vai assumir-se como o rosto da oposição e intervirá para moderar quer a afirmação do princípio da superioridade e vantagens do sistema mercantil liberal quer a largueza das concessões outorgadas381, pois é sabido que a indústria portuguesa estava intimamente ligada à economia colonial382 e não estava à altura de sofrer o impacto da concorrência inglesa. Possuindo um conhecimento seguro da realidade económica portuguesa, António de Araújo vai revelar-se como um anti-liberal, ou melhor dizendo, um anti-smithiano, para fixar o conceito no seu significado económico383, configurando-se, assim, como o percursor do nacionalismo económico que começava a fazer corpo e que terá Solano Constâncio como uma das maiores expressões384 A temática da administração, da economia e das finanças públicas portuguesas seria retomada por José Viriato Capela numa selecção de textos significativos para compreender a evolução histórica portuguesa na etapa correspondente à crise política do Antigo Regime que se desenrola entre a governação pombalina e a Revolução liberal de 1820385.

Arrumados em cinco partes temáticas386, estes textos permitem abordar a conjuntura definida de vários prismas no intuito de fixar a sua evolução nos horizontes coloniais e metropolitanos da monarquia portuguesa e dos seus condicionalismos nacionais e internacionais387. Os quinze documentos que pertencem ao fundo Barca-

379

Ver: IDEM, p. 539. Ver: IDEM, p. 545. 381 Ver: IDEM, p. 539. 382 Ver: IDEM, p. 574. 383 Ver: IDEM, p. 547. 384 Ver: IDEM, p. 548-549. 385 Ver: Política, Administração e Finanças Públicas Portuguesas (1750-1820), com estudos introdutórios de José Viriato Capela, Braga: I. C. S., Universidade do Minho, 1993, p. 7. 386 A saber: 1) Quadro das transformações políticas nacionais e internacionais; 2) Quadro das novas relações comerciais exteriores portuguesas; 3) Administração, economia e finanças, subdividido em A reforma da Administração financeira e em Programas e intentos de reforma fiscal. Antecipações revolucionárias (1796-1820); 4) Brasil – Programas de fomento demográfico e organização financeira, 5) Administração do território. 387 Ver: IDEM, p. 7. 380

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Oliveira representam uma mescla de tipologias documentais como por exemplo ofícios, cartas régias, cartas particulares, memórias políticas e económicas, tratados, pareceres, escritos literários e discursos, que convergiram numa única figura - António de Araújo e que demonstram, indubitavelmente, o seu ecletismo evidenciado durante a vida pública. Terminamos esta já longa resenha com a síntese debuxada por Armando Malheiro da Silva no verbete biográfico inserido no Dicionário de história da colonização portuguesa no Brasil, dirigido por Maria Beatriz Nizza da Silva. Para o Autor, uma análise mais depurada e liberta de esquemas dicotómicos demasiado redutores permite apreciar que o conde da Barca estava, de facto, integrado nas estruturas absolutistas como um defensor de um absolutismo reformista, visando a adequação, feita a partir de cima, do Estado e da sociedade portuguesa à forte vaga racionalista e individualista que vingava promissora no Novo Mundo e ameaçava, na Europa, a velha ordem política, social e económica.388.

388

Ver: SILVA, Armando Malheiro da – “Barca, Conde da”, in: Dicionário da História da colonização portuguesa no Brasil, coordenação de Maria Beatriz Nizza da Silva, Lisboa/ São Paulo: Verbo, 1994, cols. 99-100.

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CAP. 2 – MORGADO E ADMINISTRADOR DE PROPRIEDADES (1783-1817) 1. O NASCIMENTO António de Araújo de Azevedo nasceu no dia 17 de Maio de 1754, na Casa de Sá, freguesia de Santa Maria de Sá, Ponte de Lima, e foi baptizado aos vinte e três dias do mesmo mês, tendo por padrinhos seu tio António Fernando Pereira Pinto de Araújo com procuração de João Xavier Teles, 5.º conde de Unhão, embaixador em Madrid, e sua tia Apolónia Luísa Pereira Pinto com procuração de D. Antónia Maria de Sousa Monteiro, mulher de António Pereira de Eça, senhor da Casa de Biscainhos, em Braga389. Era o primeiro filho varão de António Pereira Pinto de Araújo de Azevedo Fagundes, cavaleiro da Ordem de Cristo, senhor da Casa de Sá e do Morgado do Outeiro, e de sua prima e mulher Marquesa Margarida de Araújo de Azevedo, herdeira da quinta da Prova e do Morgado de Santo António do Sobreiro em Aboím das Choças. 2. A EDUCAÇÃO: ENTRE A TUTORIA E A UNIVERSIDADE António de Araújo não seguiu a carreira militar conforme era apanágio dos filhos primogénitos das famílias nobres de Antigo Regime. As poucas informações de que dispomos sobre a educação de António de Araújo são veiculadas por Mendo Trigoso, que se refere à sua profícua estadia no Porto e a uma fugaz passagem pela Universidade de Coimbra390. O facto de ter partido para o Porto, em 1765, significava, antes de mais, que a aprendizagem das primeiras letras, ou o saber ler, escrever e contar, tenha sido adquirida em Sá, provavelmente envolto num ambiente familiar habituado a usufruir da livraria da casa, iniciada pelo avô paterno Dr. Tristão Pereira Pimenta de Araújo de Azevedo, ou então sob os ensinamentos de um mestre-escola que, neste tempo, estava invariavelmente ligado à Igreja391.

389 Sentença de Justificação e Habilitação pela qual o Sr. António de Araújo de Azevedo Pereira Pinto se habilitou herdeiro de seu Tio o Sr. António Fernando Pereira Pinto de Azevedo. Ver: ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 3, 74, fl. 29 f. - 30 f. 390 Ver: “Elogio Histórico […]”, pp. XVI-XVII. 391 Segundo Joaquim Ferreira Gomes antes da reforma de 1759, empreendida pelo marquês de Pombal, a obrigação de ensinar, sobretudo as primeiras letras, competia à família e à Igreja, e só supletivamente ao Estado. Ver: GOMES, Joaquim Ferreira – “O marquês de Pombal criador do ensino oficial”, in: Revista de História das Ideias, vol. IV, tomo II, Coimbra: Universidade de Coimbra, 1982-1983, pp. 30-31. Para uma compreensão alargada da educação da criança no Antigo Regime ver: GÉLIS, Jacques –

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Assim, a ida para o Porto teve como objectivo principal a frequência do ensino secundário, ou as Escolas Menores. Devemos ir um pouco mais além destas simples considerações retiradas do “Elogio Histórico” e esboçar um quadro da formação do jovem António de Araújo. Importa, sobretudo, compreender que tanto os estudos menores frequentados no Porto em regime de tutoria, como a subsequente passagem pela Universidade de Coimbra, para frequentar o curso filosófico, correspondem ao período das reformas pombalinas do ensino. Trata-se, portanto, de um tempo de charneira, que se inicia com a “geral reforma” dos estudos menores publicada no alvará de 28 de Junho de 1759 e que decorre até à promulgação dos Estatutos da Universidade de Coimbra em 1772. Uma e outra medida foram motivadas pelas labaredas do racionalismo emergente que vem afastar a peripatética jesuítica, dominante desde há duzentos anos392. Ainda que Rómulo de Carvalho defenda que o alvará de 1759 não introduziu uma reforma de fundo nos estudos menores393, o certo é que a filosofia que lhe está subjacente defende um novo conceito de educação dos jovens portugueses, na senda do que vinha sendo feito um pouco por toda a Europa. Hoje, é bem conhecida a importância que os estudos menores detinham no contexto da filosofia iluminista, sendo exemplo disso o Verdadeiro Método de estudar do frade Barbadinho António Luís Vernei, publicado em 1746, e as Cartas sobre a educação da Mocidade de Ribeiro Sanches, publicadas em 1760394. As duas obras vieram contribuir para o derrube da escolástica e para a introdução no reino da filosofia iluminista, de matriz newtoniana, logo eminentemente empírica, que foi depois disseminada pelo Oratório. Esta Ordem religiosa, ocupando os espaços vazios deixados pela Sociedade de Jesus395, patrocinou a emergência da crítica científica moderna em detrimento da mundividência literária. Na verdade, é sabido que com a reforma de 1759 veio a proibição do uso dos manuais escolares impostos pelos jesuítas e a sua pronta substituição por outros “A individualização da criança”, in: História da vida privada, dir. de Phillipe Ariès e Georges Duby, vol. III, Edições Afrontamento, 1990, pp. 311-329. 392 Segundo Banha de Andrade a acção de pombal no ensino pode ser dividida em dois momentos distintos: o primeiro, compreendido entre 1759 e 1771, é um período de reacção, em que se ocupou da substituição do sistema de ensino em vigor, lançando um novo marcadamente anti-jesuítico; o segundo, balizado cronologicamente pelos anos de 1771 e 1777, caracterizado pela implementação de um modelo original sendo, por isso, uma fase de criação. Ver: ANDRADE, A. A. Banha de – “A reforma pombalina dos estudos menores em Portugal e no Brasil”, in: Revista de História, n.º 112, S. Paulo, 1997, pp. 459-498, cit. por MARCADÉ, Jacques – «Pombal et l’enseignement: quelques notes sur la réforme des “estudos menores”», in: Revista de História das Ideias, vol. IV, tomo II, Coimbra: Universidade de Coimbra, 1982-1983, p. 9. 393 Ver: CARVALHO. Rómulo de – História do ensino em Portugal, […], p. 430 e segs. 394 Sobre a influência de Ribeiro Sanches no ensino e as suas relações com o poder político português, ver: MENDES, António Rosa – Ribeiro Sanches e o Marquês de Pombal. Intelectuais e Poder no Absolutismo Esclarecido, Cascais: Patrimonia, 1998. 395 Ver: BRAGA, Teófilo – História da Universidade de Coimbra nas suas relações com a Instrucção Publica Portugueza, vol. III, pp. 343 e segs.

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aconselhados, e até mesmo redigidos, por membros do Oratório. Assim sendo, o ensino reformado por Pombal seria tudo menos secularizado, mas seria certamente progressista à vista da matriz científico-cultural que lhe está subjacente. Quanto à primeira fase dos estudos de Araújo no Porto, importa salientar o papel do tio António Luís, o Sábio mentor de que fala Mendo Trigoso, que o acolheu e protegeu. Emerge, portanto, daqui a figura do tutor. Outra questão é o local da frequência desses estudos. Também por Trigoso, sabemos que o seu mestre de língua Grega foi o célebre professor Tomás Lany396. Na verdade, não se trata de Lany, mas sim de Tomás Delany professor que granjeava boa fama pelo método de ensino e pelos exames ministrados aos seus alunos no Colégio de São Lourenço397. Na verdade, Delany estendeu a sua actividade como professor régio para além dos anos de 1773398 e 1778399. Ora, o colégio de São Lourenço400 pertenceu aos Jesuítas até 1759, data em que foi incorporado na Universidade de Coimbra. Aí, o jovem Araújo terá frequentado as disciplinas impostas pelo alvará de 1759 como o Latim, base de toda a formação escolar, o Grego, ambas ministradas seguindo o epitome de Port-Royale401, a que se juntava, ainda, o Hebraico e a Retórica. Refira-se que a frequência e o aproveitamento das duas primeiras disciplinas viriam a ser necessárias para a entrada no curso de Filosofia na Universidade de Coimbra, criado pela reforma pombalina402. Ainda no Porto, Araújo terá adquirido a matriz iluminista e alimentado o desejo de seguir os estudos superiores, ao frequentar a disciplina de Filosofia Racional, a qual era já ministrada no primeiro ano do curso filosófico da “novel” Universidade de Coimbra403. Foi provavelmente em 1772 que António de Araújo movido pelo attractivo das Sciências Naturaes404 passou à cidade do Mondego, em cuja Universidade frequentou, em regime de voluntariado, o primeiro ano do curso Filosófico, a grande inovação do ensino do século, cuja introdução e dinamização em Portugal se ficara a dever aos Padres do Oratório no colégio das Necessidades em meados da década de

396

Ver: “Elogio Histórico […]”, p. XVI. Ver: SILVA, Inocêncio Francisco da - Diccionário Bibliographico Portuguez, Tomo XIX, p. 366; Ver a notícia de um acto público de língua grega com o professor régio Tomás Delany, aqui também equivocamente apresentado como “Tomás Daly” em RIBEIRO, José Silvestre – História dos estabelecimentos científicos (…), vol. 1, pp. 237 e segs. 398 Ver: GOMES, Joaquim Ferreira – “Duas listas de professores: uma elaborada pelo governo do marquês de Pombal eoutra pelo de D. Maria I”, in: Revista de História das Ideias, […], p. 52-53. 399 Ver: IDEM, p. 75. 400 Não encontramos referências de maior relevo sobre o colégio de São Lourenço, apesar de se saber da existência do trabalho de síntese, que continua inédito, apresentado para as provas de aptidão pedagógica e capacidade científica de MARTINS, Fausto Sanches – O colégio de S. Lourenço: 1560-1774, Porto, 1986. Sobre o edíficio, ver: FREITAS, Eugénio de Andreia da Cunha e - O colégio de S. Lourenço: alguns documentos para a história da Igreja dos Grilos do Porto, Porto: Livr. Fernando Machado, [s.d.]. 401 Cf. RIBEIRO, José Silvestre – História dos Estabelecimentos científicos (…), tomo I, p. 236-237. 402 CARVALHO, Rómulo de - ob. cit., p. 478-479; RIBEIRO, José Silvestre – ob. cit. (…), tomo I, p. 242. 403 Ver: CARVALHO, Rómulo – ob. cit., p. 479. 404 Ver: “Elogio Histórico […]”, p. XVI. 397

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quarenta405. Aliás, a passagem de Araújo pela Universidade não pode ser anterior a 1772, pois é a reforma deste ano que vai criar a Faculdade de Filosofia em substituição da das Artes406. Segundo Rómulo de Carvalho, o curso teria a duração de quatro anos para obter o grau de bacharel e de mais um para a licenciatura ou doutoramentos. As disciplinas estavam distribuídas da seguinte forma: no primeiro, Filosofia Racional e Moral; no segundo, História Natural e Geometria, esta na Faculdade de Matemática; no terceiro, Física Experimental; e, no quarto, Química. Os alunos dividiam-se entre ordinários e obrigados (aqueles que frequentavam outros cursos noutras Faculdades) sendo que todos eles estavam sujeitos à realização de exercícios escritos, orais e práticos e os professores deveriam trabalhar nos estabelecimentos recém-construídos conduzindo os alunos na prática laboratorial407. A Filosofia, uma das partes mais notáveis da reforma, passou a contar com um ensino baseado na observação e na experimentação tendo sido dotada de um Gabinete de História Natural, do Jardim Botânico, do Gabinete de Física Experimental (que contou com o riquíssimo conjunto de material didáctico transferido do Colégio dos Nobres) e do Laboratório Químico408. Nos capítulos seguintes veremos em que medida ficou inculcado no espírito de António de Araújo a propensão para a aquisição de um saber eminentemente empírico. Apesar de não termos encontrado o assento da sua matrícula na Universidade, a presença de António de Araújo em Coimbra parece ter-se verificado de facto, à vista do Diário da Visita de Pombal a Coimbra, existente na sua livraria particular, em que descreve pormenorizadamente a estadia do governante em Coimbra entre Setembro e Outubro de 1772409. Interrompida a sua passagem fugaz por Coimbra, por motivos que hoje ainda se ignoram, Araújo regressa ao Porto e dedica-se ao estudo das ciências Matemáticas e das Históricas, na qual alcançou huma vastíssima erudição, e a outros ramos do saber a que se chamavam “Belas Letras”. Apesar de, aparentemente, António de Araújo não ter concluido os seus estudos superiores, o certo é que no seu regresso a Ponte de Lima, adquiriu um imenso protagonismo pelo seus conhecimentos e merecimentos. 405

Ver: DIAS, Silva, “Portugal e a cultura europeia (sécs. XVI a XVIII), in: Biblos, volume XXVIII, Coimbra: Universidade, MCMLII, 1953, p. 360; SANTOS, Eugénio dos – O Oratório no Norte de Portugal. Contribuição para o estudo da história religiosa e social, Porto: INIC, 1982, pp. 285-322. 406 Ver: CARVALHO – Rómulo – ob. cit., p. 466. 407 Ver: IDEM, pp. 478-480. 408 Ver: IDEM, p. 466 e segs. 409 Ver: ADB/UM – SIFAA/SSC 08.01/DOC. – MS. 895.48.

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3. AS PRIMEIRAS ACTIVIDADES SOCIAIS É muito provavelmente em 1778 que António de Araújo regressa a Ponte de Lima, onde vai desempenhar as suas primeiras actividades sociais, quer como Presidente da Sociedade dos Amigos do Bem Público de Ponte de Lima, quer como Intendente da Companhia das Vinhas do Alto Douro na Ribeira Lima. A data reveste-se de um importante simbolismo para a história da família: é neste ano que seu pai António Fagundes410 elabora o seu testamento. Talvez uma das razões do seu regresso precoce esteja relacionada com a preparação para suceder na administração da propriedade familiar. Simbolicamente, e não obstante Araújo ter na altura 24 anos, apontamos este momento como o início da sua idade adulta. É neste contexto, pois, que deve ser analisada a sua participação na Sociedade Económica, fundada em 1779 para promover o comércio, as artes e a indústria locais. O âmbito deste trabalho não permite entrar na análise circunstanciada das actividades da Sociedade Económica. A bibliografia sobre o assunto é vasta e sobejamente conhecida411. O nosso objectivo é outro: compreender as motivações que estiveram na génese da colaboração de António de Araújo nesta agremiação e realçar quais os dividendos retirados da mesma. Ainda assim, importa referir que a génese da Sociedade não é unicausal, ou seja, não procede unicamente de um grupo de indivíduos limianos predispostos a dinamizar o comércio, a agricultura e a indústria locais. Esta perspectiva afigura-se demasiado redutora para se compreender o alcance da mesma. Em primeiro lugar, refira-se que este modelo de associativismo elitista que se desenvolveu um pouco por todo o espaço ibérico412 sofreu influências dos países do norte da Europa, nomeadamente da Inglaterra, tendo por base dois vectores: a defesa da aquisição e da divulgação de um saber útil, pragmático, de intervenção, tendo em vista a prosperidade económica e social, tal como era defendido pela doutrina iluminista de Puffendorf, Wolff, dos enciclopedistas, de Vernei e de Genovesi, entre outros; e a

410 Doravante referimo-nos ao pai do futuro conde da Barca como António Fagundes, unicamente com o propósito de distingui-lo entre os demais membros da família que possuíam idêntico nome próprio. 411 Ver: LEMOS, Miguel Roque dos Reis - Anais municipais de Ponte de Lima, rev. e apresent. António Matos Reis. 3.ª ed., Ponte de Lima: Rotary Clube de Ponte de Lima, 2003; AMZALAK, Moses Bensabat – A Sociedade Económica de Ponte de Lima (Século XVIII). Apontamentos para a sua história, Lisboa, 1950; CARDOSO, José Luís – O pensamento económico em Portugal nos finais do século XVIII, 1780-1808, Lisboa: Estampa, 1989; VAZ, Francisco António Lourenço – Instrução e economia. As ideias económicas no discurso da Ilustração portuguesa (1746-1820), Lisboa: Edições Colibri, 2002. 412 Segundo José Luís Cardoso foram pensadas várias Associações para Portugal, nomeadamente no Minho (1779), Elvas (1781), Douro (1783), Beja (1785), Valença (1789) e Évora (1784), mas só a de Ponte de Lima funcionou com alguma regularidade. Ver: CARDOSO, José Luís – O Pensamento económico em Portugal nos finais do século XVIII. 1780-1808. Lisboa: Edutorial Estampa, 1989.

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emergência de um novo conceito de patriotismo baseado na defesa do interesse individual e por complemento dos interesses públicos”413. Assim, este conceito de associativismo está intrinsecamente ligado a uma mudança intelectual de fundo, mais concretamente ao nível das percepções dos fenómenos sociais que patrocina a lenta metamorfose da nobreza em armas para uma redefinição da sua função em prol do reino: o fomento económico. Por outras palavras, a filosofia iluminista coloca o nobre no centro do debate, forçando-o a redefinir o seu papel social414. Daqui advém o empreendedorismo característico da Sociedade Económica e, ainda mais, se tivermos em conta que todos os [seus] instaladores, tirando apenas cinco, e todos os membros do corpo gerente, com honrosa excepção de dois, era gente de “colher sem semear”, indivíduos da classe que usava nomes extensos, muito compridos, mas de ânimos muito pequeninos, eram pretensores a voar largo e alto, mas com as asas dos outros, eram rigorosos sectários do lema: “aprontemo-nos e vão!”. Todos tinham abundantes meios, todos eram abastados proprietários, suficientemente endinheirados e senhores de recursos […]415.

Por outro lado, refira-se que poucos anos antes os institutos vinculares tinham sofrido o primeiro abanão com as leis de 1769 e 1770, que vieram fixar o limiar inferior dos rendimentos dos morgadios416. Ainda como factor motivacional, há a considerar o academismo português seiscentista e de princípios de setecentos de cariz literário e artístico, envoltos numa aura de “bom gosto”, onde se discutia a literatura e a arte dentro do paradigma cultural barroco417, mas que, ao mesmo tempo, atiçava as labaredas do fogo iluminista (ou pré-iluminista) contra a filosofia peripatética que grassava na sociedade portuguesa e de que eram expoentes as principais instituições de ensino do reino que o pombalismo reformista viria a atacar418.

413

Ver: VAZ, Francisco António Lourenço – ob. cit., p. 185. Sobre o debate em torno do papel da nobreza em Setecentos, ver: SERNA, Pierre – “O Nobre”, in: O homem do Iluminismo, direcção de Michel Vovelle, Lisboa: Editorial Presença, 1997, pp. 31-70. 415 Ver: LEMOS, Miguel Roque dos Reis – Anais Municipais de Ponte de Lima, pp. 147-148. 416 Ver: CASTRO, Armando de – “Morgado”, in: Dicionário de História de Portugal, vol. III, dirigido por Joel Serrão, , [s.l.] Iniciativas Editoriais, p. 111. 417 Ver: CASTELO-BRANCO, Fernando – “Significado cultural das Academias de Lisboa no século XVIII”, in: Bracara Augusta, vol. XXVIII, n.º 65-66 (77-78), Braga: Câmara Municipal, 1974, pp. 31-57. 418 Ver: DIAS, José Sebastião da Silva – “Portugal e a Cultura Europeia”, in: Biblos, Vol. XXVIII, Coimbra: Universidade de Coimbra, MCMLII, 1959. 414

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Portanto, se a participação de António de Araújo tinha algo a ver com o aspecto inovador da agremiação e com o interesse no “Bem Público”, tinha também muito a ver com a defesa e a dinamização do seu património fundiário, a sua principal fonte de rendimentos. A actividade de António de Araújo de Azevedo na Sociedade tem sido algo empolada pela quase totalidade dos seus biógrafos que preferem salientar o papel decisivo na criação do grémio, bem como a atribuição da autoria das principais iniciativas levadas a cabo pela Sociedade, principalmente na canalização do rio Lima. Lançando um olhar ao escrito de Miguel Roque dos Reis Lemos, logo vemos que António de Araújo não está presente na comissão instaladora que se reuniu no palácio do visconde de Vila Nova de Cerveira, na tarde de 8 de Maio de 1779419, quando o corregedor de Viana do Castelo, Manuel da Silva Baptista e Vasconcelos, pronunciou o discurso impulsionando o fomento da agricultura, da indústria popular e do comércio, incitando a audiência a se juntar numa “academia rural” tendente a lutar contra o quietismo, inacção e torpor dos povos da sua superintendência comarcã420. O seu nome, tão pouco, surgirá na organização de uma Companhia Comercial Auxiliatória, instituída em 1784, para tomar conta dos negócios industriais da Sociedade421. Se repararmos atentamente no que diz Reis Lemos, notamos que há uma separação entre “instaladores”, que se reuniram em Maio de 1779, e “membros do corpo gerente”, que se formou depois disso. A contribuição de António de Araújo ter-se-á cingido ao período compreendido entre os anos de 1779 e 1784. Tal conclusão não significa, no entanto, que não tenha abraçado efusivamente a agenda da Sociedade, de onde se destaca o projecto do encanamento do Rio Lima, e que não tenha accionado os mecanismos ao seu dispor para cumpri-la. Mas qual foi o seu papel? Nos Estatutos delineados em 1779 e publicados em 1780, ficou patente a necessidade de se eleger um presidente bem preparado e com capacidade para captar a atenção dos poderes existentes na corte de forma a obter o necessário aval régio para o início das actividades. O cargo de Presidente era o emprego mais importante pois cabia-lhe propor todos os negócios […] distribuir, e encarregar aos Sócios as comissões. Por isso devia ser 419

Ver: AMZALAK, Moses Bensabat - A Sociedade Económica de Ponte de Lima (Século XVIII). Apontamentos para a sua história, Lisboa, 1950, p. 9. 420 Ver: LEMOS, Miguel Roque dos Reis – Anais Municipais de Ponte de Lima, p. 143. 421 Ver: AMZALAK, Moses Bensabat - ob. cit., p. 51.

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[…] pessoa tal, que tenha os necessários conhecimentos, e instrução dos meios, com que se adiantam as Artes, e a que maior uso tem na Europa, para que possa entender os Escritos Económicos, que se acham nelas; ouvir os Estrangeiros, que se apresentarem com alguns inventos, ou máquinas, e entreter uma correspondência com as Sociedades, que se estabelecerem no País, ou com as de fora dele; e finalmente com os homens doutos, e instruidos sobre os objectos, que cultiva a Sociedade.

Por outro lado, devia possuir um conjunto de qualidade humanas como ser pessoa de condição afável, acessível, e laboriosa, e que tenha afeição a todos os objectos, sobre que versa a Sociedade; livre de orgulho, e de preocupações vulgares422. Neste sentido, se a nomeação de Araújo é um atestado à sua formação intelectual e humana, é também um reconhecimento do papel desempenhado pelo actor social, na medida em que as suas relações pessoais possibilitariam a abertura de um importante canal de comunicação para a corte destinado a promover a Sociedade aos olhos do poder régio. Para além do patrocínio ardente do arcebispo de Braga, D. Gaspar de Bragança, tio da Rainha, com quem Araújo mantinha contactos, importa salientar uma outra via. Em nosso entender, o papel decisivo na subida do processo à presença régia foi providenciado pela prima de António de Araújo, D. Mariana Joaquina Apolónia de Vilhena Coutinho, açafata da rainha, proveniente dos Vilhenas Coutinhos da Casa do Campo de Touros em Braga, família com larga tradição na corte. Mariana Joaquina viria a casar com Miguel de Arriaga, desembargador da Casa da Suplicação e Secretário das Imediatas Resoluções de Sua Majestade nos seus Exércitos. Era conhecida, na corte, por Mariana de Arriaga tendo granjeado grande fama não só pela sua beleza, como também pelo distinto tratamento que recebia de D. Maria I. A sua ligação a António de Araújo de Azevedo vai muito para além desta breve cronologia, pois no arquivo de Barca avulta hoje uma vasta série epistolográfica entabulada depois da partida da corte para o Brasil, que bem demonstra a forte ligação existente entre ambos423. Uma tradição familiar vem confirmar que António de Araújo, seu parente, depois 1.º conde da Barca, deveu de certo modo à influencia d’esta Senhora, a importância de que 422

Ver: “Estatutos da Sociedade Económica dos Bons compatriotas, Amigos do Bem Público (…)”, publicada a 5 de Janeiro de 1780, apud AMZALAK, ob. cit. p. 16. 423 Ver: Cartas de Mariana Joaquina Apolónia Pereira de Vilhena Arriaga, entre Fevereiro de 1815 e Março de 1817. ADB/UMSIFAA/CR/DOC. 1,33,1 – DOC. 1,33, 11.

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gosou e a posição elevada que depois, com seus merecimentos logrou occupar424.

E quais foram os dividendos retirados por Araújo? Em primeiro lugar, importa salientar que a oportunidade de dirigir uma associação inovadora catapultou-o para a cena nacional providenciando-lhe o ensejo de comunicar com a elite letrada do tempo, nomeadamente com os fundadores da Academia Real das Ciências, o duque de Lafões425 e o abade Correia da Serra426, entre outros. Deste intercâmbio terá resultado, certamente, a nomeação de António de Araújo para Sócio da Academia Real das Ciências de Lisboa em 22 de Maio de 1780427. A participação na Sociedade Económica foi o elemento-chave no percurso de Araújo, franqueando-lhe as portas do restrito círculo cortesão e não admira, portanto, que a mudança de residência para Lisboa se viesse a verificar a breve trecho. Em Novembro de 1786, António de Araújo de Azevedo já se encontrava em Lisboa tendo recebido um convite para assistir à publicação da bula da Cruzada, que contava com a presença de Sua Majestade428. Em Lisboa, amparado por amigos e familiares, encontraria o tempo e o espaço suficientes para demonstrar os grandes cabedaes na linguas e na litteratura estrangeira bem como a sua dimensão de Philosopho sabio e profundo429, aspectos decisivos para a obtenção de um ofício de nomeação régia. Neste caso, tanto a participação na Sociedade Económica como na Academia das Ciências podem ser considerados passos significativos numa estratégia de mobilidade social que o levará, primeiro, à diplomacia em 1787 e, depois, ao topo da hierarquia institucional em 1804.

4. A ADMINISTRAÇÃO DO VÍNCULO DE SÁ

424 Ver: Nobiliário do Minho e da Família dos Vilhenas Coutinhos de Braga, pp. 144-145 apud SILVA, Armando Malheiro da [et alli] – Casas armoriadas do concelho dos Arcos de Valdevez. Subsídios para o estudo da nobreza arcoense, vol. i, 2.ª ed. Revista e aumentada, Arcos de Valdevez: Câmara Municipal, 2000, pp. 167-168. 425 Veja-se a carta que o duque de Lafões escreveu a António de Araújo felicitando-o pelas inciativas da Sociedade Económica e, observando uma rigorosa conveniência de interesses, predispondo-se a manter uma correspondência continuada. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 43,19; foi publicada em AMZALAK, Moses Bensabat – ob. cit., p. 55. 426 Ver a correspondência entre António de Araújo e o abade Correia da Serra em AIRES, Cristovão – Para a história da Academia das Sciências de Lisboa, Coimbra: Imprensa da Universidade, 1927. 427 Ver: ARAÚJO, Artur da Cunha – O Perfil do conde da Barca, Porto: Livraria Tavares Martins, MCMXL, p. 123; Cristovão Aires recorda o nome de Aráujo como um dos que fizeram parte do núcelo inicial da Academia Real das Ciências. Ver: AIRES, Cristovão – ob. cit., pp. 121-125. 428 Ver: Convite de José Ricalde Pereira de Castro para António de Araújo de Azevedo assistir à publicação da Bula da Cruzada na Igreja de São Roque. Lisboa, 1786.11.18. ADB/UM-SIFAA/SSC. 08.01/DOC. 43, 27. 429 Ver: “Elogio Histórico […]”, p. XX.

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Em 9 de Outubro de 1783, na Casa de Sá, era aberto o testamento de António Pereira Pinto de Araújo de Azevedo Fagundes430. O documento é um caso paradigmático de uma família nobre de Antigo Regime, no qual se assiste a um testador que, depois de eleger sepultura e dispor dos sufrágios, lega a totalidade dos seus bens ao filho varão primogénito, prosseguindo, assim, a estratégia de concentração patrimonial iniciada pelos seus maiores. Ao mesmo tempo, define, com rigor, o percurso a ser seguido pelos filhos segundos (a carreira eclesiástica), bem como por aqueles que ficam sem estado (habitar a Casa do sucessor)431. António de Araújo, futuro conde da Barca, sucedia, então, no morgadio de Sá, reforçado pela vinculação do campo da Azenha, em Moreira do Lima432, e no morgado do Outeiro, em Arcos de Valdevez, sendo de salientar, igualmente, que a sua herança vinha acrescida das inevitáveis obrigações pecuniárias que, neste caso, significavam ter de pagar a dívida à Santa Casa da Misericórdia de Braga433. A particularidade deste testamento reside na administração dos bens que vieram ao casal por via feminina, pois António Fagundes reconhecia que sua mulher he senhora e administradora do seu morgado antigo de Santo António do Sobreiro […] e dos prazos de Soutello sito na freguezia de São Martinho de Recezinhos concelho de Penafiel foreiro aos religiosos de São Martinho de Bustelo renovado por nós e dos da Várzea freguesia de Taboado foreiros à Igreja.

Mas, usufruindo do seu estatuto de cabeça de casal, António Fagundes nomeia estes mesmos bens no filho mais velho e no caso da falta dele no que for senhor do morgado desta Caza e dos mais morgados das Choças, Gondoriz, que instituiu […] meu avô Fernando Pereira de Araújo de Azevedo e Senhora Dona Maria Pereira Pinto Fagundes. Todavia, o facto de declarar as posses de sua mulher, significava reconhecer objectivamente o direito a uma reserva de usufruto que teria necessárias implicações na gestão da casa. Em 1788, encontramo-la a dirigir um requerimento ao rei, escrito pela mão de seu filho João António, solicitando licença para se trabalhar na factura do azeite

430 Ver: Treslado do testamento de António Pereira Pinto de Araújo de Azevedo Fagundes. ADB/UM – SIFAA/SSC. 08.01/DOC. 45, 35, fl. 4 f. 431 Ver: IDEM, fl. 5 f. 432 Ver: IDEM, fl. 6 v. 433 Ver: IDEM, fl. 6 f.

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nos dias santos na quinta que a suplicante possue, e administra434 e, em 1808, a arrendar a quinta de Soutelo a José Ferreira Mendes435. Por outro lado, observando uma intenção de garantir o zelo da união familiar, o testador recomenda à minha muito amada prima e minha mulher estimadíssima aos que ficão de tenra idade e no século e sem estado e a mesma recomendação ao sucessor da Caza especialmente as fêmeas, Francisquinho e Luizinho e o mesmo recomendo a meus amantíssimos irmaons, inda que sei não he necessário dando lhes Deos vida436.

Ao sucessor encomenda ainda que, na falta dos irmãos do testador, seja o tutor de seus irmãos e que favoreça as suas irmãs freiras professas no convento de São Bento de Viana do Castelo com alguns mimos dos frutos, mas de pouca despesa porque reconheço não poderá com largueza [e também] lhe recomendo pella bênção de Deos a união com todos os irmaons e irmans especialmente favorecer os mais pequenos que ficão em tenra idade para os seus estudos eclesiásticos437.

Estas disposições terão um significado importante a breve trecho na evolução da família Araújo de Azevedo. A casa de Sá era habitada por 14 pessoas. Para além do casal António Fagundes e Marquesa e dos seus doze filhos, ali viviam dois irmãos do senhor da Casa: António Fernando, abade de Santo Adrião de Vizela, e António Luís, governador da praça de Vila Nova de Cerveira. Como era hábito no Antigo Regime, ambos contribuiriam para o engrandecimento da Casa que lhes deu o ser, fazendo jus ao pedido do irmão primogénito. Ainda antes do falecimento de António Fagundes, o abade de Santo Adrião de Vizela, fidalgo capelão da Casa Real e gentil-homem eclesiástico, doa as duas tenças que possuía às sobrinhas solteiras, provavelmente, no intuito de providenciar-lhes os necessários meios de subsistências ou, até, o dote438.

434

Ver: Licença para poder trabalhar nos dias santos na factura de azeite. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/SR/CARTORIO/DOC. 3, 114. 435 Ver: Arrendamento da Quinta de Soutello que faz a Exma. D. Marqueza Francisca Pereira Pinto de Araújo de Azevedo assistente na vila de Viana a José Ferreira Mendes de São Martinho em 25 de Junho de 1806. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/SR/CARTORIO/DOC. 3, 105. 436 Ver: Treslado do testamento de António Pereira Pinto de Araújo de Azevedo Fagundes, fl. 8-8v. 437 Ver: Treslado do testamento de António Pereira Pinto de Araújo de Azevedo Fagundes, fl. 4 f. 438 Ver: Sentença de Justificação e Habilitação pela qual o Sr. António de Araújo de Azevedo Pereira Pinto se habilitou herdeiro de seu Tio o Sr. António Fernando Pereira Pinto de Azevedo para haver de receber o que se lhe ficou devendo da Tença que tinha no Almoxarifado do Porto. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/SR/CARTORIO/DOC. 3,74.

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Por seu lado, em Agosto de 1780, o governador requer a remuneração dos seus serviços militares e a verificação da respectiva mercê no irmão primogénito439, permitindo assim entroncar na varonia dos de Sá o foro de fidalgo cavaleiro. Não deixa de ser sintomático que, em Janeiro do ano seguinte, todos os filhos de Fagundes receberam idêntica mercê: a 1 de Janeiro, o sucessor António440, João António441, Francisco António442 e Luís António443; e a 9 do mesmo mês, António Fernando444. Tanto o abade como o governador deixaram ao sobrinho sucessor os bens móveis da casa de Sá de que eram senhores, dos quais se destaca a livraria do Dr. Tristão Pereira Pimenta, que anos antes tinha sido repartida em três partes iguais e agora era novamente reunida e, certamente, enriquecida. Em 1783, António de Araújo sucedia na administração do vínculo e totalidade dos bens e as suas primeiras atenções dirigiram-se para os seus irmãos. Ainda que seu pai os encaminhasse para a carreira eclesiástica, António de Araújo parece ter tido um papel decisivo na inflexão registada no percurso de quase todos, fazendo convergir as ambições de cada um deles para o interesse da Casa comum. António Fernando e Luís António prosseguiriam a carreira eclesiástica, mas João António seria redireccionado para a Faculdade de Leis da Universidade de Coimbra e Francisco António para a carreira das Armas. Na inquirição de genere de António Fernando, realizada em 1772445, existe um apontamento indicando que João António também tinha realizado idêntico documento seguindo assim a vontade do progenitor. Na verdade, João António chegou mesmo a tomar ordens menores, uma vez que se encontrou fixado, como clérigo in minoribus, na vila de Barcelos. Todavia, seguirá os estudos na Faculdade de Leis na Universidade de Coimbra, tendo seguido a atractiva carreira da jurisprudência, nesta viragem de século, algo que deteria uma inegável valia para a expressão social da família.

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Ver: Alvará do foro de fidalgo dado a António Pereira Pinto de Araújo de Azevedo em remuneração dos serviços de seu irmão António Luís Pereira Pinto. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/SR/CARTORIO/DOC. 3,86. 440 Ver: Alvará do foro de fidalgo da Casa Real concedido a António de Araújo de Azevedo Pereira Pinto. Lisboa, 1781. 01. 09. IANTT- Registo Geral de Mercês, D. Maria I, liv. 10 (2), fl. 58 v. 441 Ver: Alvará do foro de fidalgo da Casa Real concedido a João António de Araújo de Azevedo. Lisboa, 1781. 01. 09. IANTTRegisto Geral de Mercês, D. Maria I, liv. 10, fl. 80. 442 Ver: Alvará do foro de fidalgo da Casa Real concedido a Francisco António de Araújo de Azevedo. Lisboa, 1781. 01. 09. IANTT- Registo Geral de Mercês, D. Maria I, liv. 10, fl. 80. 443 Ver: Alvará do foro de fidalgo da Casa Real concedido a Luís António de Araújo de Azevedo. Lisboa, 1781. 01. 09. IANTTRegisto Geral de Mercês, D. Maria I, liv. 10, fl. 80. 444 Ver: Alvará do foro de fidalgo da Casa Real concedido a António Fernando de Araújo de Azevedo. Lisboa, 1781. 01. 09. IANTT- Registo Geral de Mercês, D. Maria I, liv. 10, fl. 80. 445 ADB/UM – Inquirições de genere, Pasta n.º 343-Processo n.º 7519.

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Entre as irmãs, Joana Antónia e Antónia Luísa eram já professas no convento de São Bento de Viana. Clara Vitória e Ana permaneceriam solteiras, e Rosa Inácia viria a casar com Roque Ribeiro de Abranches, futuro visconde de Midões446. Como veremos, a trajectória ascendente de António de Araújo será, em certa medida, a base de apoio do idêntico trajecto seguido pelos irmãos. Grande parte dos trinta e quatro anos em que António de Araújo administrou os morgadios, foi marcada pelas suas ausências do locus de gestão: o Entre Douro e Minho. A sua voluntária ausência do locus de gestão implica o estabelecimento de quatro diferentes contextos: o primeiro, entre 1781 e 1785, durante o qual se encontra em Sá e administra directamente as propriedades; o segundo, entre 1785 e 1804, quando se estabelece em Lisboa e entra na carreira diplomática; o terceiro, entre 1804 e 1807, tempo em que esteve em Lisboa à frente do Ministério dos Negócios Estrangeiros; e, o quarto, entre 1808 e 1817, quando permaneceu no Brasil. No primeiro momento, António de Araújo terá, de facto, administrado directamente os morgadios, pois entre 1781 e 1785 permaneceu em Sá, dinamizando o cultivo dos campos e participando activamente no comércio. Se as rendas dos campos, a produção de cereais, do azeite e do vinho eram as principais fontes de rendimento da Casa de Sá, e mesmo escassas como seu pai sustentara no testamento, é necessário não esquecer que o morgado de Sá tinha a seu cargo o sustento de numerosa família e ainda a “obrigatoriedade” de viver “à lei da nobreza”. Tal situação tê-lo-á levado a procurar impulsionar o morgadio e a procurar fontes de rendimento alternativas. Em meados da década de oitenta, António de Araújo surge como intendente da Companhia Geral da Agricultura e dos Vinhos do Alto Douro, na fábrica de aguardente de Ponte de Lima e sua ribeira, cargo que desempenharia pelo menos até 1785. A sua ausência será colmatada por Tomás Vicente Cabeças de Sousa447. O desempenho do ofício estaria, certamente, relacionado com o facto do seu avô paterno, o Dr. Tristão Pereira Pimenta de Araújo de Azevedo, ter alcançado da Câmara do Porto, em 1724, o “privilégio do cutelo” que lhe permitia vender naquela cidade as produções vinícolas das suas propriedades da Ribeira Lima448.

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Ver: RODRIGUES, Abel – ob. cit., p. 112. Ver: Carta régia para diligência do procurador agente da Companhia Geral do Alto Douro.1788.06.30. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/SUBSI CAS/ DOC. 63, 8. 448 Ver: Privilégio de Cutello passado pela Camara do Porto a favor do Sr. Tristão Per.a Pimenta, sendo Juiz dos Orfãos na mesma Cidade pelo qual ficou sendo reputado como Criador de Vinhos, para poder vender as 25 pipas, que importava para aquela cidade, sem pagar direitos alguns, e por mais um real em quartilho. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/SR/CARTORIO/DOC. 2,56. 447

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Por outro lado, a participação na Sociedade Económica dos Amigos do Bem Público vai permitir a convergência dos seus interesses com os de um grupo de indivíduos que concorre para a dinamização da agricultura, comércio e indústria locais, o que tinha um óbvio interesse para as propriedades de cada um deles. É importante referir, novamente, a expressão “dos Amigos do Bem Público”, pois é esse o conceito de patriotismo emergente e de interesse pelo sucesso da Monarquia patrimonialista que desde os tempos da Restauração assentava num regime de prebenda, no qual o Estado devia remunerar aos particulares os serviços prestados.449 O ano de 1785 marca a mudança de António de Araújo para Lisboa, onde, aliás, já tinha estado por diversas vezes. Os contactos que estabelecera em Lisboa, no âmbito da Sociedade, bem como a presença de familiares, facilitaram a sua entrada na corte mariana pois, em Novembro do ano seguinte, encontramo-lo a ser convidado para assistir à publicação da bula da Cruzada, que contava com a presença de S. M.. No entanto, a saída de Ponte de Lima não significava o descurar da administração do morgadio, pois deixara a seus irmãos umas lembranças tendentes a assegurar e a melhorar a produção do azeite, onde se denota uma extrema preocupação com as oliveiras, com o vinho e com os cereais450. Importa referir que a presença de António de Araújo na corte vai potenciar a angariação de réditos provenientes das mercês, extensíveis a toda a Casa, nomeadamente as nomeações para ofícios ou outros cargos, mas também dos foros, hábitos e comendas, etc., todos eles angariadores de verbas pecuniárias e de capital simbólico. A mudança significava a culminância das estratégias definidas desde o pós-Restauração pelas famílias nobres da província451. António de Araújo, com vinte e nove anos, apresenta-se na corte mariana ostentando o título de senhor do Morgado de Sá, a distinção do foro de fidalgo cavaleiro e, à vista da sua liderança na Sociedade Económica de Ponte de Lima, como homem de grandes conhecimentos e merecimentos. Ainda que não houvesse intenção definitiva de se estabelecer em Lisboa, o certo é que a mão benevolente da Rainha D. Maria I não tardaria a recair sobre António de 449

Ver: MONTEIRO, Nuno Gonçalo – “O ethos da aristocracia portuguesa sob a dinastia de Bragança. Algumas notas sobre casa e serviço do rei”, in: Elites e Poder, Lisboa : Imprensa de Ciências Sociais, 2003, p. 100. 450 Ver: Lembrança de algumas coisas que devem fazer-se nesta quinta de Sá e de outras que pode haver nela. [1785]. ADB/UMSIFAA/ SSC 08.01/ DOC. 44, 1. 451 Segundo Nuno Gonçalo Monteiro as estratégias de mobilidade social delineadas pelas famílias nobres da província iniciavam-se pela vinculação de bens e culminariam com a chegada a Lisboa e neste sentido, a ascensão ao circulo da nobreza de corte quase nunca se fazia no intervalo de uma só geração […]. Grosso modo, seriam requeridas três gerações… para se chegar, note-se bem, à nobreza de corte, à elite das elites, e não à simples nobreza […]. Ver: MONTEIRO, Nuno Gonçalo – “Notas sobre nobreza, fidalguia e titulares nos finais do Antigo Regime”, in: Ler História, n.º 10, Lisboa: Edições Salamandra, Lda., 1987, pp. 24-30.

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Araújo. Em Junho de 1787, é nomeado para Enviado Extraordinário nos Estados Gerais das Províncias Unidas. Com a entrada na diplomacia vinha também a distinção de ser nomeado para o Conselho de S. M.452 e o hábito de Cristo453, que era desejado tanto em Portugal, pelos rendimentos que o acompanhavam, como na Europa pelo impacto simbólico que tal distinção acarretava como se verifica pelo facto de ter passado a ser conhecido por chevalier d’Araújo, título frequentemente confundido com cortesia454. No entanto, em razão da brevidade em partir para a Haia e, também, pela sua reconhecida nobreza, António de Araújo alcançou o alvará de 16 de Outubro de 1787 que o dispensou das provanças e habilitações a apresentar junto dos deputados da Mesa da Consciência e Ordens455. No decurso da sua carreira diplomática receberia, ainda, outras mercês régias com valor pecuniário, como a comenda de São Pedro do Sul na Ordem de Cristo que analisaremos no próximo ponto. Contudo, a brevidade da partida seria permutada pela necessidade de se manter em Portugal durante mais dois anos. Durante esse tempo, dedicou-se ao estudo dos tratados e das convenções internacionais, que o habilitaram para o desempenho das suas funções, mas também possibilitou a preparação da melhor forma de providenciar a gestão das suas propriedades na Ribeira Lima. Tal situação implicou o surgimento de um novo conceito na administração das propriedades fundiárias dos Araújos de Azevedo: a emergência da figura do procurador. Doravante teremos dois espaços diferentes que, no entanto, interagem constantemente: o locus de produção documental, onde se situa o homem do terreno juridicamente habilitado pelo senhor a activar os mecanismos conducentes à gestão patrimonial, e como tal um dos produtores da informação; e o locus de recepção, no qual figura o administrador do vínculo, o proprietário, cuja condição está consagrada nos instrumentos típicos de sucessão patrimonial do Antigo Regime, que vai permitir o influxo da maior parte da documentação produzida, destinada a ser preservada atendendo à evolução estrutural da família.

452 Ver: Carta do Conselho de D. Maria I atribuída a António de Araújo de Azevedo. Lisboa, 1787.09.20. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/ DOC. 43, 14. 453 Ver: Decreto do hábito da Ordem de Cristo outorgado a António de Araújo de Azevedo, com 12$000 reis de tença efectiva cada ano. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/ DOC. 43, 18, fls. 2 v.-3. 454 Era frequente atribuir-se o hábito de Cristo aos diplomatas portugueses não titulados, como por exemplo, ao Cavaleiro de Oliveira. 455 Ver: Certidão das mercês outorgadas a António de Araújo de Azevedo, passada a requerimento de João António de Araújo de Azevedo. Lisboa, 1818. 11. 06. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/ DOC. 43, 18, fls. 2-2v.

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O facto de estar ausente não significa que António de Araújo tivesse descurado a gestão das suas propriedades, pois em Abril de 1800, visivelmente satisfeito pelos melhoramentos na administração fundiária dizia a Francisco José Maria e Brito que Da província tive boas noticias, e meu irmão [António Fernando] tem feito maravilhas nas minhas fazendas, o que estimo muito, e lhe mando algumas máquinas de agricultura que mandei fazer na Saxónia456. Segundo o que ele me diz e o que tenho sabido por outras mais se tem melhorado bastante as minhas fazendas e na verdade ele tem trabalhado muito e com proveito sensível […]457.

E dois meses depois que Estimaria também que meu irmão fizesse em Ponte de Lima um viveiro de árvores silvestres que ele poderia fazer vir do Gerez, mas outras se poderião alcançar nessa cidade se he que nela se tem dezestido do detestavel costume de não quererem comunicar as plantas raras, em lugar de as fazerem vulgares. […] Diga-me se se poderão alcançar algumas plantas, como tulipeiros se he que já ahi são vulgares, e outras. Daqui poderei mandar algumas sementes que me fornecerá o célebre Burgsdorf458.

António Fernando assumira a administração do vínculo de Sá. Na verdade, data destes anos a procuração com livre e geral administração de bens que António de Araújo outorgou a seus irmãos António Fernando e João António, concedendo-lhes ao mesmo tempo, o direito de substabelecer esta em tudo ou em parte em um ou muitos procuradores e revoga-los, tudo como bem lhes parecer459. Não consta que este instrumento jurídico tenha sido revogado em momento algum. As ausências de João António que se encontrava a desempenhar os cargos de juiz de fora de Viana do Castelo460 e, depois, de provedor da comarca de Coimbra461, lançaram a responsabilidade de gestão para António Fernando462, que veio a substabelecer os poderes recebidos no padre João António Dias de Sousa, o qual terá 456

Ver: Carta de António de Araújo de Azevedo para Francisco José Maria de Brito, datada de Berlim. 1800.04.12. ADB/UM Arquivo de Francisco José Maria de Brito, Caixa 48, doc. 36 457 Ver: Carta de António de Araújo de Azevedo para Francisco José Maria de Brito, datada de Berlim. 1800.04.19. ADB/UM Arquivo de Francisco José Maria de Brito, Caixa 48, doc. 38 458 Ver: Carta de António de Araújo de Azevedo para Francisco José Maria de Brito, datada de Berlim. 1800.06.28. ADB/UM Arquivo de Francisco José Maria de Brito, Caixa 48, doc. 52 459 Ver: Minuta da procuração geral de António de Araújo de Azevedo passada a seus irmãos António Fernando e João António de Araújo de Azevedo. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/ DOC. 44, 40 460 A carta de nomeação é datada de Lisboa, 1792. 12. 11. IANTT-Registo Geral de Mercês, D. Maria I, livro 23, fl. 236 v. 461 Carta régia de nomeação de João António de Araújo de Azevedo para provedor da comarca de Coimbra com posse e beca na Relação do Porto. IANTT-Registo Geral de Mercês, D. Maria I, livro 14, fls. 171 v. 462 Não colocamos de parte a possibilidade de existir documentação referente à administração da Casa de Sá e dos morgados do Outeiro e do Sobreiro no arquivo da Casa da Tapada, onde foi incorporado o arquivo pessoal de António Fernando em virtude da sua filha ter contraído matrimónio com um dos senhores da casa.

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uma presença efectiva na Casa de Sá pelo menos até 1813. Um e outro realizarão, de forma alternada, diversos actos jurídicos em nome do senhor da Casa. Na verdade, será o padre Dias de Sousa o responsável pela negociação, formalização e renovação463 dos contratos de arrendamento de campos das quintas do Sobreiro, do Outeiro e de Sá, e de outros campos nas freguesias de Nelas e Sabadim, nos anos de 1797, 1799, 1803, 1806 e 1809464. Para além desta tarefa, esteve a seu cargo, o pagamento de parte do empréstimo que a Casa de Sá tinha contraído junto da Santa Casa da Miséricórdia de Braga465. Refira-se que toda a documentação produzida em torno da administração da Casa subirá à presença de António de Araújo realizando o percurso inverso ao da procuração. Exemplo do que aqui se disse verifica-se também na actuação de António de Araújo em Lisboa a partir de 1804, quando é indigitado para Ministro dos Negócios Estrangeiros. Durante os três anos em que permaneceu em Lisboa, António de Araújo de Azevedo habitou um palácio em Belém, provavelmente pertencente à Coroa. O edifício estava recheado de inúmeros bens movéis pertencentes a Araújo, onde para além dos “trastes”, designação usada na época para os movéis de uso comum, contavam-se elementos indispensáveis para o convívio da “boa sociedade” como a enorme livraria particular, as mesas de jogo, o piano forte, tudo disposto pelos salões sob o olhar tutelar dos quadros da Rainha, do Regente e do Príncipe D. José, para além de outras obras de arte como os quadros “Vénus e Narciso” e “São Paulo”466. Aliás, segundo Madame Junot, Araújo era vértice superior de uma corte desinteressante e inditosa467. Será em Belém que Araújo receberá os réditos da comenda de São Pedro do Sul, procedendo ao averbamento dos respeitos valores no livro de contas da casa468, e que providenciará um aumento significativo do seu património com a incorporação dos bens 463

Ainda que a maior parte dos rendeiros demonstre possuir ligação antiga à Casa de Sá, a ausência de dados anteriores à data de 1797 impede-nos de saber objectivamente se estes contratos foram uma simples formalização de acordos verbais anteriores ou, se por outro lado, houve uma renegociação das claúsulas dos contratos. 464 Ver: Contratos de arrendamento de campos das quintas do Sobreiro, do Outeiro, e de Sá. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ /DOC. 44,6 –DOC. 44,36. 465 Ver: ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 44,56. 466 Auto do levantamento do sequestro por ordem do desembargador Manuel José de Arriaga Brum da Silveira, na qualidade de Juiz Administrador dos bens e rendas da casa de António de Araújo de Azevedo ausente do Reino […].ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/DOC. 44, 139. 467 Ver também o cenário debuxado por BRANDÃO, Raul – El-Rei Junot, Lisboa: Arquimedes Livros, 2006, pp. 146 e segs. (ed. facsimilada da 1.ª datada de 1912). 468 Ver: Fragmento do livro de conta corrente da Casa de António de Araújo de Azevedo em Lisboa. 1806. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/SSSC MAP/ DOC. 44, 63

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de Tomás Vicente de Cabeças de Sousa por doação, como analisaremos nos pontos seguintes. Por outro lado, Araújo vai promover o estabelecimento de uma fábrica de fiação na quinta da Prova e facilitar a formação de uma fábrica de vidros no Gerês, iniciativas que bem revelam o seu empreendedorismo e a atenção que dedicava ao fomento industrial como via primordial para a angariação de rendimentos. Ambas simbolizam o início de um conjunto de iniciativas que o tornam num (proto-)empresário. Usufruindo do seu estatuto de Ministro, António de Araújo endereça uma representação ao Príncipe solicitando autorização para fundar uma fábrica de fiação na província do Minho. Obtida a necessária autorização régia, apresentou o projecto a Jácome Ratton, sugerindo-lhe a formação de uma sociedade composta por algumas pessoas que tivessem a seu cargo a administração do empreendimento e por outras que pudessem contribuir com os fundos necessários para a compra dos maquinismos. A seu cargo, ficaria a responsabilidade de aprontar e manter os edifícios e de conduzir a àgua do rio Vez, cabendo-lhe um quinto dos lucros da fábrica. A promoção de um projecto da natureza do que pretendia implementar na sua quinta da Prova indicia que António de Araújo de Azevedo recuperou um dos grandes projectos da extinta Sociedade Económica dos Amigos do Bem Público de Ponte de Lima: o encanamento do Rio Lima. Nos finais de Fevereiro de 1806, Ratton apresentava uma contraproposta ao plano da fábrica. E no dia 1 de Março escrevia a Araújo invocando a necessidade de se remeter ao abade de Lóbrigos a cópia do plano de associação para que, depois de emendado e aprovado, ser apresentado às pessoas de Lisboa e do Porto. O passo seguinte seria o de se imprimir as condições, apólices e letras para se dar início à assinatura e ao encaixe de fundos pela caixa directorial em Lisboa469. O plano de Jácome Ratton consistia basicamente em três pontos: a principal caixa da sociedade seria da sua responsabilidade e estaria sedeada em Lisboa, pelo que dispensava a angariação de mais sócios; a construção de mecanismos seria patrocinada pela mesma; e António de Araújo deveria ser o chefe da Sociedade a quem competeria arrecadar um terço dos lucros em vez de um quinto470. O plano seria enviado a António Fernando que, em 1804, tinha sido apresentado, pelo duque de Lafões, amigo de seu irmão primogénito, para a igreja de São Miguel e 469 470

Ver: Recordaçoens de Jacome Ratton […], Londres, Impresso por H. Bryer, 1813, pp. 49-53. Ver: Recordaçoens de Jacome Ratton […], Londres, Impresso por H. Bryer, 1813, pp. 49-53.

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São João Baptista de Lóbrigos, passando assim a usufruir de um rendimento anual que se estima entre os 16 e os 20 contos de réis471. Do Conselho de Sua Majestade472, viria a ser nomeado, pela carta régia de 27 de Março de 1805, para inspector das obras do encanamento do Rio Lima e das estradas e canais de rega e de transporte e da arborização a realizar na província do Minho473. Estas duas nomeações ficaram a deverse, inegavelmente, ao seu irmão Ministro dos Negócios Estrangeiros. Na verdade, António Fernando seria o “homem do terreno” na província do Minho. Apesar de duvidar da utilidade do empreendimento, talvez por desconfiança do impacto que um investimento desta natureza pudesse ter nas propriedades familiares, manterá um núcleo de aconselhamento composto por Francisco Pereira Peixoto Ferraz Sarmento, Francisco Joaquim Moreira de Sá474 e João Reinaldo Bahon de Kerouale475. Não obstante a sua hesitação, que saiu reforçada com o parecer negativo dado por Francisco Moreira de Sá476, os trabalhos prosseguiam e, em Março de 1806, pedia a seu irmão uma procuração com poderes de compra e venda de terrenos para angariar fundos para o investimento da Prova e informava que João Reinaldo Bahon de Kerouale já tinha apresentado um cálculo aproximado dos lucros e que aguardava pela chegada da planta da fábrica477. O projecto foi avante com as condições propostas pelo industrial de origem francesa e, como o próprio indica, baseado na reciproca estima, boa fé e amizade. O objectivo principal seria o lucro mas, também, a esperança de virem a receber novas mercês régias pelo novo serviço prestado ao Soberano478. Apesar de António de Araújo ter sido premiado, em 1807, pelo seu empreendimento na quinta da Prova, pela Real Companhia do Novo Estabelecimento para as Fiações e Torcidos de Seda, com direito a medalha e documento de honra na

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Segundo Américo Costa, São João Baptista de Lóbrigos era incontestavelmente a mais rica abbadia de Portugal, e mais rendosa de que alguns bispados sendo que o seu abade tinha rendimentos anuais entre 16 e 20 contos de réis. Ver: COSTA, Américo, Diccionário Chorographico de Portugal Continental e Insular (…), vol. VII, Vila do Conde: Edição do Autor, 1940, pp. 667-668. 472 Ver: MACHADO, José de Sousa, Últimas Gerações do Entre Douro e Minho, Braga: «Pax», 1931, vol. I, p. 428. 473 Carta régia de 24.03.1805. cit. por ALMEIDA, Fortunato de – Subsídios para a história Económica de Portugal, Porto, 1920, pp. 31; 52-53; MACHADO, José de Sousa, O Poeta do Neiva, Braga: Livraria Cruz-Editora, 1929, p. 208; VIANA, António Manuel do Couto, “As funções patrióticas do Abade de Lóbrigos”, in: Estudos Regionais, n.º 18, Viana do Castelo: C. E. R., 1997, pp. 41-46. 474 Sobre Francisco Joaquim Moreira de Sá, Ver: MONTEIRO, Fernando M. Moreira de Sá – “Os morgadios do Outeiro, em São Paio dos Arcos e Paçô seus instituidores, administradores e a extinção (a propósito de uma pedra de armas inédita)”, separata da revista Hidalguia, n.º 318, [s.l.] Instituto Salazar y Castro, 2006, pp. 603-631. 475 Ver: Carta de António Fernando de Ararújo de Azevedo para António de Araújo de Azevedo, datada de Viana do Castelo, 1806. 03. 24. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/CR/ 1,38,2. 476 Ver: Carta de Francisco Joaquim Moreira de Sá para António Fernando de Araújo de Azevedo, 1806.03.14, Sá. ADB/UMSIFAA/ SSC 08.01/CR/ DOC. 1,38,2,1. Sobre Francisco Joaquim Moreira de Sá, Ver: MONTEIRO, Fernando M. Moreira de Sá – “Os morgadios do Outeiro, em São Paio dos Arcos e Paçô seus instituidores, administradores e a extinção (a propósito de uma pedra de armas inédita)”, separata da revista Hidalguia, n.º 318, [s.l.] Instituto Salazar y Castro, 2006, pp. 603-631. 477 Carta de António Fernando de Araújo de Azevedo para seu irmão António de Araújo. 1806. 03. 13. ADB/UM-SIFAA/SSC. 08.01/ CR/DOC 1,38,1. 478 Ver: Recordações […], p. 50.

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conformidade do alvará de 6 de Janeiro de 1802479, a fábrica conheceria uma existência efémera. Se as invasões francesas não impediram os sócios de iniciar a produção, chegando a fiar trezentas sacas de algodão, o tratado de comércio de 1810 com a Inglaterra aniquilou-a por completo, impedindo-os de escoar a produção. A situação era de tal forma dramática que, a 26 de Junho de 1812, Diogo Ratton que substituira o seu pai à frente da casa comercial, anunciava a António de Araújo que fôra obrigado a mandar encerrar a fábrica e a despedir todos os oficiais encarregues da construção de mecanismos como restantes empregados, resultando daqui um perda de quase 200 mil cruzados. Lamentando, ainda, por ter despedido os cerca de quinhentos trabalhadores da fábrica da Prova e da fábrica de chapéus, que agora se encontravam totalmente desamparados480. Apesar dos contratempos, o projecto não seria esquecido e, dois anos depois, Diogo Ratton equaciona prosseguir com a fábrica mas só no caso de serem feitas alterações ao Tratado com a Inglaterra481. Idêntico destino teve a fábrica de vidros do Gerês. Por alvará de 15 de Abril de 1807, assinado pelo ministro António de Araújo de Azevedo, era concedida autorização para a criação de uma fábrica vidreira por um prazo de dez anos renováveis, na planície de Linhares, em Vilarinho da Furna, concelho de Terras de Bouro. Se é certo que Araújo não teve participação directa no corpo de accionistas da fábrica do Gerês, o facto de ter providenciado a autorização para se constituir uma sociedade na qual figuravam sua irmã Clara Vitória, como sócia, e o irmão Francisco António, como accionista, revelam as causas do seu interesse. Contudo, também a fábrica de vidros teria curta existência, uma vez que a situação político-económica criada pelas invasões francesas e pela concorrência inglesa fez com que a mesma fosse arrasada em Julho de 1808, depois dos seus accionistas terem investido 60$000 reis que providenciaram pouco mais de um ano de laboração482. Mas, regressemos a 1807. Depois da intensa pressão diplomática dos ingleses e dos franceses a que Portugal esteve sujeito durante mais de um ano, a 27 de Novembro de 1807 a corte partia para o Rio de Janeiro, precavendo-se dos possíveis efeitos da invasão de Junot ou do bombardeamento dos ingleses. Aparentemente, o embarque fez-

479 Ver: Relação das pessoas premiadas em 1807 pela Real Companhia do novo estabelecimento para as fiações e torcidos das sedas […]. Lisboa, 1809. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/CR/ DOC. 43, 33 480 Ver: Carta de Diogo Ratton para António de Araújo de Azevedo, datada de 1812. 06. 26. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/CR/ DOC.10,4,1 481 Ver: IDEM, datada de 1814. 05. 11. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/CR/ DOC. 10,4,4 482 Ver: NORTON, Manuel Artur – “Fábrica de vidros no Gerez (1807-1808)”, in: Distrito de Braga, vol. IV da 2.ª série (VIII), Fasc. I-II-III-IV, Braga: Administração Distrital, 1979, pp. 5 – 16.

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se à pressa e António de Araújo, que embarcou à noite para escapar às investidas do povo descontente, apenas tivera tempo de levar consigo não os moveis do seu uso, mas aquelles que pensou virião a ser mais uteis ao Estado: taes forão huma bella collecção Mineralogica, arranjada pelo grande Werner, collecção indispensavel para o Brazil, onde o estudo da Montanistica deve fazer a primeira base da instrucção publica; e huma Typografia que elle mandara vir de Londres, e que se póde dizer a primeira, ou pelo menos a unica que então appareceu no Rio de Janeiro483

Os bens mais importantes, incluindo a preciosa livraria, ficavam em Lisboa e todos eles vieram a cair no poder (e no usufruto) de Junot e de Laborde484. À semelhança de outras casas insignes de Lisboa, a 29 de Janeiro de 1808485, era lançada a ordem para sequestrar a casa e todos os bens de António de Araújo, incluindo os da província do Minho, que permaneceriam cativos durante oito meses. No dia 1 de Setembro do mesmo ano, François-Antoine Herman, secretário de Estado da Repartição do Interior e das Finanças486, expediu um aviso ordenando o levantamento do sequestro487 e, dois dias depois, o despacho de cumprimento do aviso mandando proceder à entrega dos bens nelle comprehendidos ao Illustrissimo Conselheiro João António de Araújo de Azevedo, immediato sucessor do auzente o Excelentissimo António de Araújo de Azevedo, ou a quem apresentar legitima procuração delle488.

No Minho parece não ter existido uma apropriação efectiva dos bens de Araújo. Mas a questão seria bem mais grave na medida em que, em Março de 1809, Marquesa Francisca e algumas criadas foram mantidas sob prisão na quinta de Lanheses, sendo depois recolhidas ao convento de São Bento. Também o padre João António Dias de Sousa foi ameaçado e a Casa de Sá cobiçada, mas não pelos franceses. Os próprios limianos causaram grandes tumultos perseguindo e “abocanhando” de afrancesados e de 483

Ver: “Elogio Histórico” […], p. XLI. Ver: Autos de provisão e instruções para a Administração da Casa de António de Araújo de Azevedo, ausente do Reino, passados por José António Ribeiro Soares, escrivão dos agravos, revistas e comissões nesta corte e cidade de Lisboa, e Casa da Suplicação. Lisboa, 1808.09.10. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/ DOC. 44, 137, fl. 1-6 v. 485 Ver: Declaração de Manuel Pedro Lacerda atestando que por ordem de Mr. Geouffre […]. Lisboa, 1808.09.11. ADB/UMSIFAA/ SSC 08.01/ DOC. 44, 138, fl. 1 v – 2. 486 Ver: PAIXÃO, Judite Cavaleiro - Do Erário Régio ao Tribunal de Contas: os presidentes, Lisboa : Tribunal de Contas, 1999. 487 Ver: Auto do levantamento do sequestro dos bens existentes na Província do Minho de António de Araújo de Azevedo, em 1 de Setembro de 1808 […]. Lisboa, 1808.09.27. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/ DOC. 44, 139. 488 Ver: Auto do levantamento do sequestro por ordem do desembargador Manuel José de Arriaga Brum da Silveira, na qualidade de Juiz Administrador dos bens e rendas da casa de António de Araújo de Azevedo ausente do Reino […].ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/DOC. 44, 139, fl. 1 v.-2 v. 484

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traidores todos aqueles que tivessem alguma ligação com a presença gaulesa em Ponte de Lima489. A recuperação dos bens constantes nos inventários, bem como os bens móveis de raiz da província do Minho, ocorrerá a 27 de Setembro de 1808, depois de um requerimento de João António de Araújo dirigido ao desembargador Manuel José de Arriaga Brum da Silveira na qualidade de juiz administrador dos bens e rendas da casa de António de Araújo de Azevedo. No documento lê-se que se deve proceder à entrega de todos os bens ao imediato sucessor enquanto durar a ausência de António de Araújo490. Este estatuto de João António de Araújo terá implicações em toda a gestão da Casa, pois formalmente passava a ser o administrador dos vínculos, das demais propriedades e bens, onde se incluía a comenda de São Pedro do Sul. João António usufruía de um estatuto privilegiado na sociedade olissiponense, que viria facilitar a empresa, pois atingira o topo da carreira dos Lugares de Letras, ao ser nomeado conselheiro da Real Fazenda, a 27 de Dezembro de 1804, e mais tarde desembargador ordinário da Real Fazenda por Real Grandeza e Munificência [de S. A.R.] e atendendo a ser irmão do [futuro] conde da Barca, então Ministro e Secretário dos Negócios Estrangeiros e da Guerra491. A partir dessa data será o responsável pela recuperação de todos os bens móveis existentes em Lisboa, produzindo vasta documentação nos seus contactos com o corpo de oficiais de justiça que esteve encarregue da comissão: Manuel José de Arriaga Brum da Silveira, desembargador da Casa da Suplicação e juiz administrador do sequestro; José António Ribeiro Soares, juiz escrivão; o advogado Manuel José Saturnino, procurador; José Manuel Pinto de Carvalho, agente; e Henrique Francisco de Andrade, depositário ou tesoureiro; todos eles auferindo ordenado492. Depois do tratamento das questões legais, João António lançou-se num inventário de bens móveis, elaborando inclusivamente um catálogo da livraria de António de Araújo493, e encarregou-se de proceder ao “enfardamento” e à remessa de 489

Ver: Carta de Francisco Pereira Peixoto Ferraz Sarmento para António de Araújo. [s.d.]. ADB/UM-SIFAA/SSC. 08.01/CR/DOC. 12,13,4. Ver: Auto do levantamento do sequestro dos bens existentes na Província do Minho de António de Araújo de Azevedo, em 1 de Setembro de 1808 […]. Lisboa, 1808.09.27. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/ DOC. 44, 139. 491 Requerimento do Conselheiro João António de Araújo de Azevedo solicitando a remuneração dos serviços prestados nos lugares de Letras. Ver: ADB-UM/SIFAA/SSC 08.02/ DOC. 59, 98. 492 Ver: Lembrança das despesas que faço na condução dos móveis pertencnetes ao mano António de Araújo […]. [1809]. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/DOC. 44, 140, fls. 4-5v. 493 Ver: Cópia do catálogo ou relação dos livros da biblioteca do ausente António de Araújo de Azevedo, achados na dita biblioteca ao tempo que a administração pôde fazer dela o inventário e sequestro que foi determinado e constante das ordens expedidas a esse fim; e que pelos franceses foram depois tirados da casa do Depositário Jacinto José dos Reis, e da dita Administração para a 490

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tudo – bens e documentação produzida - para o Rio de Janeiro, em várias fases ao longo de 1809. Durante a presença de António de Araújo no Brasil, não parece terem existido alterações significativas na forma de gestão do património familiar situado no Minho. Apesar de Marquesa Francisca ter falecido em 1811, o morgadio terá continuado a ser gerido por António Fernando, habilitado que estava pela procuração de seu irmão. A data simbolizará o sancionamento da sucessão de facto de Araújo como senhor do morgado de Santo António do Outeiro, em Aboím das Choças, e da quinta da Prova. Na verdade, apenas dois acontecimentos justificam a nossa atenção: a viagem de João António para o Brasil, provavelmente em 1815, e já analisada na primeira parte deste trabalho; e a organização do cartório da Casa de Sá por Frei Francisco de São Luís. O título de conde da Barca, com honras de grandeza494, representa a culminância do percurso pessoal de Araújo, rapidamente observado pela atribuição dos rendimentos provenientes dos bens da coroa, mas também à estratégia de mobilidade social empreendida pelos Araújos de Azevedo da casa de Sá. Na realidade, o conde da Barca não representa um caso isolado, pelo contrário, faz parte do aumento quantitativo extraordinário que se verificou na nobreza de corte a partir de meados de Setecentos e até ao Vintismo495. Ficou a dever-se à trajectória pessoal empreendida por António de Araújo, nomeadamente o facto de ter passado a integrar a nobreza de corte, um das principais aspirações do fidalgo português do século XVIII496, e aos sucessivos cargos que desempenhou, como se depreende na carta de mercê: […] tendo prezente os distinctos e uteis serviços que António de Araújo de Azevedo, do Conselho de Esatdo, Grã-Cruz das Ordens de Cristo e Torre e Esapada, e Ministro e secretário dos Negócios da marinha e Domínios Ultramarinos, Me tem feito nos muitos e importantes Empregos que tem exercido com toda a honra, desinteresse, intelligencia e zelo do meu Real Serviço; e Querendo darlhe uma publica significação da aprovação e reconhecimento destes serviços, hei por bem promove-lo à grandeza com o título e conde da Barca em sua vida.497

residência de Mr. Geouffre a fim de servirem ao uso de Mr. Junot, segundo consta dos Autos do mesmo Inventário e sequestro. Lisboa, Junho de 1808. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/DOC. 42,11. 494 Ver: Carta de mercê da elevação à grandeza com o título de conde da Barca, dada a António de Araújo de Azevedo em sua vida. Rio de Janeiro, 1815.12.20. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/DOC. 43,17. 495 Ver: MONTEIRO, Nuno – “Notas sobre nobreza, fidalguia e titulares nos finais do antigo regime”, in: Ler História, 1987, p. 31. 496 Ver: IDEM, p. 24. 497 Ver: Carta de mercê da elevação à grandeza com o título de conde da Barca, dada a António de Araújo de Azevedo em sua vida. Rio de Janeiro, 1815.12.20. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/ DOC. 43,17

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Ao que tudo indica a atribuição da mercê do título de conde a António de Araújo andava nas cogitações do Príncipe Regente já desde, pelo menos, 1812, mas a oposição de Lord Strangford, ministro plenipotenciário de Inglaterra no Rio de Janeiro, e do conde de Linhares, ministro dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, terão impedido um público reconhecimento do Príncipe Regente a António de Araújo, tendo em conta que o seu nome, conotado com os interesses franceses, era apontado nos periódicos como o principal causador da crise que vivia a coroa portuguesa e, como tal, poderia colocar em causa as relações económicas com a Inglaterra. A mercê verificava-se em 17 de Dezembro de 1815, já quando a oposição tinha sido afastada e a conjuntura internacional tinha permitido a nomeação de Araújo para o ministério. A designação de Barca terá sido escolhida por António de Araújo que assim vinculava ao seu percurso pessoal a trajectória dos seus maiores, antes e depois da Restauração, sendo inequivocamente de salientar as várias alianças matrimoniais, nomeadamente com a Casa dos Magalhães, os poderosos senhores da Barca, que terão possibilitado o início da definição patrimonial da família que se registaria antes da Restauração e que se consolidaria no decurso de Setecentos, mas também outros antepassados, como Diogo Bernardes e Frei Agostinho da Cruz, oriundos daquela localidade. Por outro lado, Barca significaria também o estabelecimento de uma ponte para as origens medievais da família, daí o ter utilizado sempre como apelidos fortes o Araújo de Lóbios, perpetuado pela varonia, e o Azevedo da casa de São João de Rei, que lhe possibilitavam ser reconhecido como fidalgo de linhagem. 4.1. A ADMINISTRAÇÃO DA COMENDA DE SÃO PEDRO DO SUL NA ORDEM DE CRISTO A atribuição de comendas insere-se na política de mercês régias definida a partir de Seiscentos, tendo desempenhado um papel fundamental na reestruturação da pirâmide nobiliárquica498. Se por um lado podemos considerar as comendas como uma das fontes de rendimentos senhoriais de origem não-dominial directa ou como uma fonte de redistribuição interna dos réditos senhoriais499, por outro lado, importa destacar que a sua atribuição simbolizava, desde o século XVI, uma relevante distinção nobiliárquica500. 498

MONTEIRO, Nuno Gonçalo Freitas – O Crepúsculo dos Grandes, p. 49. Cf. CASTRO, Armando de – A estrutura dominial portuguesa dos séculos XVI a XIX (1834), Lisboa: Caminho, 1992, pp. 106116. 500 MONTEIRO, Nuno Gonçalo Freitas – ob. cit., p. 50. 499

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As comendas e outras mercês régias, nomeadamente as tenças, as moradias e os altos cargos do Estado, serviram para aumentar os rendimentos da nobreza portuguesa dedicada unicamente à exploração fundiária. Todas estas modalidades configuraram-se progressivamente como uma estratégia do monarca de satisfazer os anseios da nobreza, neutralizando as acções de condicionamento da acção régia e/ou de manifestar a sua afeição por determinada pessoa ou acto protagonizado pelo vassalo, numa clara lógica de retribuição. Seja como for, a atribuição destas mercês configura-se como um dos vectores do sentido patrimonialista da monarquia do Antigo Regime. A atribuição de uma comenda a António de Araújo de Azevedo entra nesta última sugestão. Na verdade, foi depois da negociação com a França do tratado de paz de 10 de Agosto de 1797 e da prisão do Plenipotenciário português na Torre do Templo, sob a acusação de ter urdido uma trama contra a República, que o Príncipe Regente estendeu a sua mão benevolente para assinar o decreto de 6 de Janeiro de 1798, que outorgava a mercê da Comenda de São Pedro do Sul, na Ordem de Cristo, situada no concelho de Lafões, bispado de Viseu501. Na carta de comenda, passada a 22 de Setembro de 1800, lê-se que: como por parte de Fr. António de Araújo de Azevedo, cavaleiro profeço da mesma ordem, me foi aprezentado hum alvará [de 23 de Maio de 1798] por mim assignado, registado no Registo Geral das mercês, e passádo pela chancelaria da dita ordem […]. Faço saber quer tendo muito prezentes o zêlo, actividade, constância, e préstimo com que António de Araújo de Azevedo me têm servido, e serve nas cortes da Haya, e de Paris, dando sempre reiteradas próvas da sua honra, e do seu merecimento na execução das Minhas ordens, em benefício da Cauza Pública, do Real Serviço, e de Meus Reynos: sou servida, e na significação de que o estimo, e principio da remuneração, que hei de dar~lhe por serviços tão distinctos, laboriozos, e leais, fazer-lhe mercê da Comenda de São Pedro do Sul, da Ordem de Cristo no bispado de Viseu502.

O que ressalta da doação não é, apenas, a questão do merecimento, mas sim a questão do princípio da remuneração dos serviços, que vem, de facto, confirmar a regra de que o regime político em vigor assentava na prebenda, ou seja, o Estado deve pagar aos particulares em troca dos seus serviços, contribuindo assim para a preservação de uma elite503.

501

Segundo as Notas sobre o arrendamento da comenda de São Pedro do Sul. 1805. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/DOC. 44,67 Carta de mercê da Comenda de São Pedro do Sul da Ordem de Cristo no Bispado de Viseu a António de Araújo de Azevedo. Lisboa, 1800. 09.22. ADB/UM-SIFAA/SC 08.01/DOC. 43, 16. 503 Ver: MONTEIRO, Nuno Gonçalo – “O ethos da aristocracia portuguesa sob a dinastia de Bragança. Algumas notas sobre casa e serviço ao rei”, in: Elites e Poderes, p. 100. 502

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Para além da remuneração, importa também salientar o capital simbólico que tal distinção acarretava, pois é a partir desta altura que António de Araújo deixa de ser conhecido, nas cortes estrangeiras, como chevalier, para passar a ser conhecido por “commandeur d’Araújo”, designação que passa a ilustrar os ex-libris da sua livraria particular. Os dezanove anos de usufruto dos rendimentos devem ser divididos em três momentos distintos, em virtude das alterações que se fizeram sentir no percurso de Araújo. O primeiro momento situa-se cronologicamente entre 1798 e 1801, tempo que medeia o alvará de mercê e o encarte. Neste intervalo, os réditos provenientes da comenda, à semelhança das comendas vagas, foram sendo remetidos ao Erário Régio que depois haveria de prestar contas ao novo comendador não só da arrecadação dos frutos no valor de 2.814$000 rs., referente aos anos de 1798, 1799 e 1800, já depois de ter efectuado o pagamento de três quarto da anata504, pagamento obrigatório que o comendador devia fazer à Santa Sé no primeiro ano de usufruto da Comenda 505. Apesar de Araújo estar ausente do reino, a emissão da carta de comenda verifica-se a 22 de Setembro de 1800506, sendo o processo tratado pelo seu procurador Manuel Francisco Monteiro de Brito. No segundo momento, a partir de 1 de Janeiro de 1801 até 15 de Dezembro de 1807, verifica-se o arrendamento da comenda. A partir de 1806, os valores arrecadados são lançados no livro de deve e haver da Casa de Lisboa507. Na verdade, desde Janeiro de 1801 a comenda estava arrendada ao alferes Manuel Correia de Oliveira, residente na Ponte de São Bartolomeu, freguesia de São Pedro do Sul, pelo valor anual de 1300$000 rs. em dinheiro metálico e oito arrobas de presunto por alturas da Semana Santa, tudo livre e posto em casa do comendador em Lisboa508. A mesma situação verificou-se depois da morte do alferes, sendo o arrendamento suportado pago pela sua viúva Antónia de Figueiredo. O valor do arrendamento pouco subiria durante os dezasseis anos em que Araújo beneficiou da comenda.

504

Ver: Nota sobre o arrendamento da comenda de São Pedro do Sul. ADB/UM-SIFAA/SSC. 08.01/DOC. 44, 67. Ver: CASTRO, Armando de – ob. cit., p. 107 506 Ver: Carta da Comenda de S. Pedro do Sul, bispado de Viseu. IANTT-Registo Geral de Mercês, D. Maria I, liv. 29, fl. 376. 507 Ver: Fragmento de livro de conta corrente da casa de António de Araújo de Azevedo em Lisboa. 1806-1807. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/DOC. 44,63. 508 Ver: Notas sobre o arrendamento da Comenda de São Pedro do Sul. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/DOC. 44, 67. Segundo o fragmento do livro de despesa corrente da casa de António de Araújo em Lisboa dos anos de 1806 e 1807, o pagamento era feito semestralmente vencendo o primeiro no último dia do mês de Junho. Ver: Fragmento de livro de conta corrente da casa de António de Araújo de Azevedo em Lisboa. 1806-1807. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/DOC. 44,63. 505

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O terceiro momento ocorre a partir de 15 de Dezembro de 1807, escassos dezoito dias depois da partida da corte, quando a regência do Reino, por intermédio do Secretário de Estado dos Negócios do Reino, João António Salter de Mendonça, emitiu um aviso ordenando à Mesa da Consciência e Ordens que entrasse na administração de todas as comendas das três Ordens Militares pertencentes às pessoas que saíram do reino na companhia do Príncipe Regente, e que encaminhasse os seus rendimentos para o Erário Régio, sob o pretexto dos mesmos serem canalizados para as tropas lusas509. A comenda de São Pedro do Sul permaneceria sob sequestro até 20 de Setembro de 1808. Com António de Araújo ausente do reino, seria o seu imediato sucessor, o irmão João António, a pugnar pela posse do instituto. Todavia, o administrador Raimundo José de Penaforte, nomeado pelo provedor da comarca no seguimento da ordem da Mesa da Consciência e Ordens, recusou-se a entregar os rendimentos sob pretexto de não lhe ter sido comunicado o levantamento do sequestro datado de Setembro de 1808. António de Araújo, por intermédio do seu procurador, dirigiu, em Novembro de 1810, um requerimento ao provedor da comarca solicitando-lhe que o dito administrador não embaraçasse à arrecadação dos frutos510. Só no final desse ano é que se assiste a recuperação da comenda, mas mesmo assim o embolso dos réditos seria um processo moroso. Como vimos, António Fernando era o procurador de seu irmão, estatuto que veria ser reforçado, em Junho de 1806, com a recepção de uma nova procuração para administrar todos os bens na província do Minho, com direito a substabelecer os procuradores que quiser e revogá-los. No seguimento do aviso de Setembro de 1808, António Fernando substabelece a sua procuração em Miguel António Pereira Tenreiro de Albuquerque, capitão-mor de Senhorim, em Viseu, concedendo-lhe todos os poderes para requerer os necessários ajustamentos das contas da administração da comenda no tempo em que a mesma esteve sob sequestro , bem como autorizando-o a requerer depósito do seu produto passando as necessárias quitações511 (ver Quadro 2). Todavia, em 1808, depois de publicados os autos do levantamento do sequestro da Casa de António de Araújo, João António é declarado como seu legítimo sucessor 509

Ver: Certidão das ordens emitidas pela Secretaria da fazenda das Três ordens Militares para o sequestro da comenda de São Pedro do Sul […]. 1809.02.04, Lisboa. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/DOC. 44, 77. 510 Ver: Mapa ou relação do que rende a Comenda de São Pedro do Sul da Ordem de Cristo […]. 1812. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/DOC. 44, 72, 4. 511 Ver: Certidão da procuração geral de antónio de Araújo de Azevedo, do Conselho do Príncipe, Ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da guerra, nomeando para seu procurador o irmão António Fernando […]. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/DOC. 44, 40.

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em virtude da ausência de António de Araújo do reino. A posse da comenda teria de ser formalmente requerida pelo sucessor. É então que, em 6 de Fevereiro de 1809, João António emite procuração a Miguel António Pereira Tenreiro de Albuquerque para que este possa receber os frutos da comenda de São Pedro do Sul512. Por se achar impedido em deligência do real serviço, o capitão-mor de Senhorim substabeleceu, em 25 de Fevereiro, a procuração em José Cardoso do Amaral, da cidade de Viseu, que viria a requerer os autos de posse a 6 de Março513. A partir de 1809, assiste-se à nomeação de dois administradores para a comenda: o primeiro Luís Monteiro Ferrão e o segundo João Inácio de Almeida. Os dois vão manter uma profícua correspondência com João António acerca da administração do instituto514. Este circuito é, também, perceptível através dos mapas de rendimentos remetidos pelo seu procurador o capitão Luís Monteiro Ferrão referentes aos anos de 1808, 1809 e 1810515, e ainda, através da ordem de João António, datada de 1813, para que o procurador estabeleça o valor de renda em 1450$000 rs. em metal e oito arrobas de presunto, tudo livre de despesas, de tributos, contribuições antigas e modernas, ou então em 1400$000 rs. acrescidos da pitança de vinte arrobas de presunto. Em qualquer dos casos a renda deveria ser paga na sua casa de Lisboa516.

512

Ver: Autos de posse da comenda de São Pedro do Sul na Ordem de Cristo […]. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/DOC. 44, 141, fl.

4.

513

Ver: IDEM. Ver: Cartas de contas da comenda de São Pedro do Sul. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/DOC. 44,80 – DOC. 44,133. 515 Ver: Mapa ou relação do que rende a comenda e terça de São Pedro do Sul da ordem de Cristo […].ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/DOC. 44, 72, 1 – DOC. 44, 72, 3. 516 Ver: Nota de João António sobre o preço do arrendamento da comenda de São Pedro do Sul. 1813.03. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/DOC. 44, 74 514

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Quadro 2 - Administração da comenda de São Pedro do Sul na Ordem de Cristo (1809-1817)

SR/Corresp. SR/Despesas SR/Receitas SR/ Autos de posse SR/Apontamentos SR/ Procurações

António de Araújo Comendador DOC/Procuração

João António

António Fernando

DOC/Procuração

DOC/Procuração

Luís Monteiro Ferrão 1.º adm. depois de 1809 SR/Corresp. SR/Despesas SR/Receitas

SR/Corresp.

João Inácio de Almeida 2.º adm. depois de 1809

Miguel António Pereira Tenreiro de Albuquerque

DOC//Procuração

José Cardoso do Amaral DOC/Autos de posse

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4.2. A DOAÇÃO DE TOMÁS VICENTE CABEÇAS DE SOUSA No arquivo do conde da Barca existe um conjunto de documentos pertencentes a Tomás Vicente Cabeças de Sousa, cavaleiro da Ordem de Cristo, agente em Ponte de Lima da Companhia das Vinhas do Alto Douro. O acervo consiste, essencialmente, em documentos

de

origem

patrimonial

e

de

origem

profissional,

balizados

cronologicamente pelos anos de 1785 e 1807. A abordagem operacional que temos vindo a desenvolver impõe a necessidade de se compreender em que contexto e quais as motivações subjacentes à entrada do arquivo de Tomás Vicente em Sá. Desde 1785, Tomás Vicente Cabeças de Sousa era agente das fábricas de aguardente de Ponte de Lima, substituindo o administrador António de Araújo de Azevedo. A estreita amizade existente entre ambos, assente na protecção que António de Araújo e outros membros da Casa de Sá lhe disponibilizavam, terá ditado que Tomás Vicente doasse a totalidade dos seus bens ao primeiro. Assim, em Julho de 1805, Cabeças de Sousa dirigiu uma petição ao Príncipe Regente solicitando a graça da confirmação da doação dos seus bens ao morgado de Sá517, entretanto já reduzida a escritura pública, elaborada em Lisboa, aos cinco dias do mês de Julho, salientando que sendo solteiro e com moléstia chronica, sem herdeiros necessarios, e nem ainda parentes próximos e lembrando-se da antiga e intima amizade que sempre tivera na Caza do Excellentissimo António de Araújo de Azevedo, e do obzequio com que na mesma fora sempre attendido o seu louvavel comportamento.

Após a consulta do Desembargo do Paço, o Prínicpe Regente confirmava a doação por provisão de 11 de Julho de 1805518. Em 27 de Junho de 1805, António de Araújo de Azevedo, sendo já Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, obtinha a carta régia de confirmação e insinuação da doação ao morgado de Sá dos bens de Tomás Vicente Cabeças de Sousa, cavaleiro professo na Ordem de Cristo, residente em São Miguel da Facha, concelho de

517

As leis de 1769 e 1770 exigiam que a a anexação de institutos vinculares passasem a ter confirmação régia depois da consulta ao Desembargo do Paço. Cf. CASTRO, Armando de – “Morgado”, in: Dicionário de História de Portugal, direcção de Joel Serrão, vol. III, [s.l.], Iniciativas Editoriais, [s.d.], p. 110. 518 Ver: Título de doação e anexação ao morgado de Sá dos bens que deixou a esta casa o Illmo. Senhor Thomaz Voicente Cabeças de Souza, Cavalleiro Professo na Ordem de Cristo. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/DOC. 44,2.

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Santo Estevão de Riba Lima519. É curioso ver que, durante o processo de doação, Cabeças de Sousa recebe o hábito da Ordem de Cristo por decreto de 8 de Julho de 1805, com autorização para logo professar520, algo que, sem dúvida, ficou a dever-se à iniciativa do seu amigo António de Araújo. O doador era reputado por homem de grandes posses que teriam derivado não só da sua ocupação profissional, mas também do empréstimo de dinheiro a juro. Os poucos dados biográficos que conseguimos coligir sobre o doador constam da célebre História Porca do governador de Ponte de Lima, escrita pelo coronel Francisco Pereira Peixoto Ferraz Sarmento521. Segundo este opúsculo, Tomás Vicente era homem de abastados bens, e com fama de muito dinheiro em caixa. Essa fôra a razão do seu assassinato no campo de Sant’Ana, em Braga, a 20 de Março de 1809, sob o pretexto de ser afrancesado à semelhança do que sucedeu a Bernardim Freire de Andrade e Custódio Gomes Vilas Boas, vitimados nesse mesmo dia522. Tomás Vicente Cabeças de Sousa tinha sido convencido por seu primo, o cónego José Valério Veloso, a sair de casa para ir ao Faial com tudo o que mais precioso tivesse. Entrou também neste jogo o amigo particular do cónego, o engenheiro Custódio Gomes Vilas Boas, pois ambos eram muito empenhados pelo velho, isto he, pelo seu dinheiro, que lhe querião infamemente extorquir, pois sabião muito bem que elle de tudo tinha feito doação a António de Araújo, a quem o Engenheiro era muito obrigado, e à sua família, nada menos. Quando o tumulto se ateou em Braga, muitos paizanos armados forão ao Faial, prenderão o cónego, Thomaz Vicente, e outros, que levarão para Barcelos, e de lá para Braga. Estiveram encarcerados no Aljube, até que rompendo os franceses o cerco, e estando perto de accometer a cidade, as Ordenanças forão à Prizão, e entre outros procurárão Thomz Vicente e o Cónego; este pode salvar-se, dando vinte peças aos soldados voluntários de Braga, que o enconbrirão, e lhe derão sahida; e 519 Ver: Carta de confirmação e insinuação da doação do morgado de Sá dos bens de Tomás Vicente Cabeças de Sousa, cavaleiro professo na ordem de Cristo […]. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/DOC. 44,3. 520 Ver: Alvará do hábito de Cristo concedido a Tomás Vicente Cabeças de Sousa, ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/ SUBSI CAS/ DOC. 63, 112. 521 SARMENTO, Francisco Pereira Peixoto Ferraz – História porca, ou breve rezumo das asneiras, e disparates, praticados no meu governo de Ponte de Lima desde o dia 17 de Março até 7 de Abril do prezente anno de 1809, pp. 169-170. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/DOC. 38, 12. 522 Segundo a História Porca: Entre Março e Abril, foram assassinados cerca de 64 indivíduos acusados de traição à pátria ou vítimas de emboscadas. Tal facto ocorreu com o pretexto da invasões francesas. Acusados de traidores eram presos no Aljube e depois arrastados para o campo de Sant’Ana onde eram fuzilados, esfaqueados. Entre os assassinados em Braga contam-se Bernardo José de Passos, desembargador da Relação do Porto e corregedor de Braga (dia 20 de Março); Bernardim Freire de Andrade, no dia 17 de Março, que havia regressado bem conceituado das campanhas do Vimieiro e da Columbeira, mas ao chegar a Braga sentiu a indisposição do povo devido às intrigas do arcebispo e do Deão, especialmente este último que o acusava de traidor. Foi assassinado com um tiro disparado nas escadas do Aljube, julgando-se que que tenha sido obra das Ordenanças do couto de Vimieiro. Custódio Gomes Vilas Boas, no mesmo dia de Bernardim, tenente coronel de engenharia, quartel mestre general dos exércitos do Norte que andava muito mal visto pelas gentes de Braga e Viana pelo pouco que realizou em dez anos de obras do encanamento do rio Cávado e por ter alcançado uma prorrogação de dez anos (por causa das contribuições que o povo pagava). Foi atraído a Viana, já depois da criação da Junta, onde foi preso e a populaça que o queria matar, foi travada a muito custo; pouco depois foi remetido para o Porto onde foi posto em liberdade, mas no conceito da baixa populaça ficou reputado com grande partidista francês. Depois de matarem Bernardim, foram buscá-lo e puseram-no a seu lado fazendo-lhe o mesmo. Ver: SARMENTO, Francisco Pereira Peixoto Ferraz – ob. cit., pp. 169-170. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/DOC. 38, 12.

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poucocuidado lhe deu o seu companheiro e amigo, senhor do dinheiro com que se remio; e até, com razão, todos crem, que ele quiz, e estimou deixá-lo exposto. O certo é que Thomaz Vicente foi arrastádo ao Campo [de Santa Ana], aonde recebeu alguns tiros e cutiladas523

Depois deste infausto acontecimento, António de Araújo tratará de incorporar os bens que recebeu em doação, nomeadamente a Casa de São Miguel da Facha, no concelho de Santo Estevão de Riba Lima524, os bens movéis, o arquivo e o direito de proceder à cobrança de dívidas - de onde se destaca uma de mais de 640$000 réis do convento de Santo António dos Capuchos de Ponte de Lima, de que Tomás Vicente era síndico525 - e a remuneração de serviços – nomeadamente as que decorriam das contribuições de cavalgaduras efectuadas pela casa da Facha ao exército português no tempo da invasão de Soult. Assim, logo em 30 de Junho de 1809, registava-se a tomada de posse dos bens movéis, de raiz e semoventes através do procurador da Casa de Sá, o padre João António Dias de Sousa526. Mas, o panorama era catastrófico conforme participava para o Rio de Janeiro, Francisco Ferraz Sarmento em Maio de 1810: A morte do desgraçado Thomaz Vicente foi cruel, e não só lhe forão roubados todos os dinheiros, e pratas por seu amigo o célebre cónego Joze Valério Vellozo, mas athé o mesmo dinheiro que devia ter entrado no caixa, ou coffre da Bulla o que tinha sido confiado ao cónego, e o não satisfez. Apezar disto havia atrazos nos mãoposteiros menores, que o padre João tem andado a apurar, e elle me disse hontem, se persuadia, que a caldeirada por aquelle lado seria pequena. Os titulos de terras, e de dividas ficarão em desordem, tem dado muita trabalheira, mas o Padre João leva em bons termos a cura deste mal527.

O padre João António Dias de Sousa andava já há algum tempo a apurar as quantias que eram devidas a António de Araújo. E em Julho de 1810, Araújo redigiu uma procuração ao abade de Lóbrigos, consignado-lhe os poderes necessários para tomar posse de todos os bens, bem como o direito de cobrar amigável ou judicialmente

523

Ver: SARMENTO, Francisco Pereira Peixoto Ferraz – ob. cit., pp. 169-170. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/DOC. 38, 12. No Livro de Oiro da Nobreza, Domingos de Araújo Affonso, refere que António de Araújo de Azevedo foi senhor do 1.º vínculo de Arribão da Facha. Ora esta possível dedução não se afigura correcta na medida em que os bens de Tomás Vicente foram incoporados no morgado de Sá conforme ficou assente no título de doação e anexação a que já aludimos. Ver: AFFONSO, Domingos de Araújo, VALDEZ, Ruy Dique Travassos – Livro de Oiro da Nobreza […], Braga: «Pax», MCMXXXII, vol. 1, p. 230 525 Ver: Carta de Francisco Pereira Peixoto Ferraz Sarmento para António de Araújo de Azevedo. Geraz do Lima, 1810.05.03. ADB/UM-SIFAA/SSC. 08.01/ CR/DOC. 12, 13, 6 526 Ver: Certidão do auto de posse de todos os bens movéis, de raiz e semoventes de Tomás Vicente Cabeças de Sousa […]. Ponte da Barca, 1810.10.16. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/DOC. 44, 5 527 Ver: Carta de Francisco Pereira Peixoto Ferraz Sarmento para António de Araújo de Azevedo. Geraz do Lima, 1810.05.03. ADB/UM-SIFAA/SSC. 08.01/ CR/DOC. 12, 13, 6 524

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quaesquer dívidas, a qual foi substabelecida no padre João, em Outubro do ano seguinte528. O panorama não era animador e a empresa avistava-se de longa duração, pois em Dezembro de 1813, o padre João António Dias de Sousa cedia todos os poderes em virtude de moléstia incapacitante529. Desconhecemos a data do término da incorporação da casa da Facha no morgado de Sá, mas é certo que em 1815 não estaria terminada pois Frei Francisco de São Luís, quando organizou o cartório de Sá, não fez qualquer referência aos documentos de Tomás Vicente.

528 Ver: Treslado da procuração de António de Araújo de Azevedo, fidalgo da casa real, Conselheiro de Estado, passada a favor de seu irmão António Fernando Pereira Pinto de Araújo de Azevedo, para que em seu nome possa arrecadar a doação de Tomás Vicente Cabeças de Sousa, Rio de Janeiro, 1810. 07. 05. ADB/UM-SIFAA/ SSC 08.01/ DOC. 44,42 529 Ver: IDEM.

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4.3. A REFORMA DO CARTÓRIO DA CASA DE SÁ Na segunda década de Oitocentos, o cartório da casa de Sá é alvo de uma reclassificação levada a cabo por Frei Francisco de São Luís, futuro cardeal Saraiva. As motivações de António de Araújo de Azevedo para encomendar este trabalho estavam certamente relacionados com o interesse em “conhecer para agir”, fruto da filosofia iluminista, providenciando assim uma melhor gestão do património fundiário, como também para capitalizar o património simbólico da família, reconhecendo a antiguidade da sua família e os serviços prestados à coroa nas centúrias passadas. Importa referir que a reclassificação dos “papéis” da Casa de Sá, não é um caso isolado. Os séculos XVII e XVIII trouxeram uma maior procura dos arquivos em virtude do denominado valor secundário dos documentos530, para o qual contribuíu o renovado interesse nos estudos histórico-literários que “forçaram” os arquivos a abrirem-se a outras finalidades que não apenas as jurídicas e as administrativas531. O racionalismo emergente motivou o surgimento de um ímpeto reclassificador da documentação, de matriz temático-funcional, no sentido de providenciar um acesso célere à informação reconhecendo assim a sua inegável importância para uma optimizada gestão corrente por parte das entidades produtoras. Em Portugal, este movimento surgiu no seio das instituições religiosas532 e daí dimanou progressivamente para as grandes casas senhoriais. Um dos exemplos mais significativos foi, sem dúvida, o do Cabido da Sé de Braga que, no segundo quartel do século XVIII, empreendeu uma profunda reforma da administração fundiária iniciado, precisamente, pelo tratamento da documentação. A reorganização documental contemplou a reconstrução do móvel Arcaz composto por 32 gavetas temáticas cuja estrutura e distribuição funcional consagram o princípio da hierarquia da documentação, bem como pela elaboração de um índice composto por seis volumes533. Refira-se, ainda, que o conhecimento das propriedades e, naturalmente, das rendas daí provenientes, levou a mesma instituição a incumbir o cónego Pacheco Pereira e o padre 530

Sobre o valor dos arquivos de família, ver: PEIXOTO, Pedro de Abreu – ob. cit., pp. 41-51. Ver: SILVA, Armando Malheiro da [et alli] – Arquivística 1: teoria e prática de uma ciência da informação, Porto : Afrontamento, 1999, pp. 95-100. 532 Veja-se a título de exemplo a estrutura imposta à documentação dos diversos conventos e mosteiros em ARAÚJO, António de Sousa, SILVA, Armando Malheiro B. Da – Inventário do fundo monástico-conventual, Braga: ADB/UM, 1985; e em particular da Congregação Beneditina em MATTOSO, José – “Inventário dos Fundos de Antigos Mosteiros Beneditinos existentes no Arquivo Distrital de Braga”, 1967, Separata de Bracara Augusta, Braga, 20, (1966), pp. 358-412. 533 Ver: VASCONCELOS, Maria da Assunção J. de – “Registo de dois móveis do Cartório Capitular de Braga”, in: FORUM, Braga: Conselho Cultural da Universidade do Minho, n.º 9/ 10, Jan.-Jul 1991, pp. 101-108. 531

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Ricardo da Rocha de elaborar o Mapa das Ruas de Braga onde estão representadas setenta artérias da cidade e as respectivas as propriedades do cabido534. Nos finais do século XVIII, um (Cartório) e outro (Mapa) eram elementos indissociáveis e indispensáveis para uma correcta administração da propriedade capitular. Aliás, as instituições religiosas perseguiam a necessidade de proceder ao tratamento e conservação dos documentos que vinham produzindo, de que é também exemplo concreto o trabalho iniciado por Frei Francisco de São Luís, já na viragem para o século XIX, tanto na biblioteca como no arquivo de São Martinho de Tibães, casa-mãe dos beneditinos, e que rapidamente se estendeu a todos os cenóbios daquela Ordem535. Por outro lado, o princípio iluminista da “ordem para o bom uso” rapidamente dimanou para as grandes Casas Senhorias. Um ano após o terramoto de 1755, o cartorário da Casa de Bragança, Manuel António de Ataíde, empreendeu a reforma do cartório por ordem de D. José I devido à necessidade urgente de confirmar obrigações, direitos, regalias, posse de terras, mercês, etc. levou à reorganização e reforma do arquivo536. Anos mais tarde, também a Casa de Mateus, em Vila Real, o faria, quando o 4.º morgado, D. Luís António de Sousa Botelho Mourão, construíu trinta e seis gavetas temáticas no intuito de providenciar a arrumação da documentação, procedendo assim a uma nova etapa na administração da propriedade fundiária da família com a redução dos vários vínculos familiares a um só537. Em todos estes casos existiram motivações subjacentes à reforma dos respectivos cartórios, sendo também visível a imperiosa reforma dos respectivos cartórios se constituir como o primeiro passo de algo mais amplo. Podemos até referir, sem prejuízo, que, no caso das Casas Senhoriais, a organização dos cartórios marcou o fim da estruturação das famílias portuguesas iniciada nos séculos XVI e XVII com a criação dos institutos vinculares e que contribuiu de uma forma determinante para a consolidação do conceito de “Casa” que começou a emergir nos princípios de Setecentos. 4.3.1. O LABOR ARQUIVÍSTICO EM SÁ

534

Cf. Mapa das Ruas de Braga, coordenação e introdução de Maria da Assunção Jácome de Vasconcelos, Braga: Universidade do Minho, 1989-1991, 2 vols. 535 Cf. RAMOS, Luís de Oliveira – O Cardeal Saraiva, volume I, Porto: Faculdade de Letras, 1972, pp. 311-321. 536 Cf. PESTANA, Manuel Inácio – A reforma Setecentista do Cartório da Casa de Bragança, Lisboa: Fundação da Casa de Bragança. 1985, p. 8. 537 Cf. CASA DE MATEUS – Catálogo do arquivo, Vila Real: Fundação da Casa de Mateus, 2005, pp. 20-22; 46-47.

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Frei Francisco São Luís revelou, desde cedo, uma notável dedicação aos arquivos e bibliotecas da Ordem de São Bento. Se, no início, o seu interesse residiu na procura, na publicação e na utilização crítica dos documentos históricos538, paulatinamente, foi emergindo o seu empenho pela descrição, arrumação e conservação das espécies documentais tanto nas bibliotecas, como nos arquivos. Um dos primeiros ofícios detidos por São Luís foi o de cartorário no colégio de Coimbra, seguindo-se, anos mais tarde, o do Mosteiro de Tibães, onde empreendeu a organização da respectiva livraria em 1797-1798, como já aqui referimos539. A partir daí, Frei Francisco de São Luís lançou-se na reorganização e preservação do património documental da Ordem de São Bento, sendo o responsável pela inspecção dos arquivos de todos os mosteiros da Ordem e pela emissão de recomendações tendentes à inventariação e à preservação da documentação cenobítica540. Subjacente a esta vocação pragmática do monge beneditino estava, certamente, uma dimensão de teorizador das práticas a adoptar quando se trata de um cartório. Segundo um manuscrito da sua autoria, que veio a lume em meados da década de cinquenta do século passado, a abordagem operacional junto dos cartórios devia ter por base vectores fundamentais: primeiro, o local do cartório e as condições de acondicionamento dos documentos; e, depois, a ordem e o arranjamento dos títulos541. Em relação ao primeiro item, São Luís advogava que o cartório deveria ser colocado num local de forma a evitar os tres inimigos fataes da conservação dos documentos: os incêndios, a humidade e os insectos. Por outro lado, a boa conservação das espécies exigia que as mesmos estivessem desdobradas, desenrugadas e comodamente estendidas dentro de pastas em pergaminho, em forma de caixa, pois eram mais eficazes que as caixas de papelão. As mesmas caixas deveriam ser colocadas ao alto em armários fechados com grade de arame, que dê entrada ao ar e não deixe meter a mão. Em relação ao segundo tópico, São Luís deixava entrever que a ordem e o arranjamento dos títulos deve depender sempre dos fins com que se leva a cabo a tarefa, existindo, no entanto, quatro metodologias distintas: o arranjamento por ordem de matérias segundo o qual se deve agrupar os documentos em séries tipológicas consoante o seus títulos, ou seja, testamentos, prazos, doações, compras, etc.; o cronológico, que segue unicamente as datas dos títulos; o geográfico segundo o qual os documentos devem estar agrupados 538

Ver: RAMOS, Luís A. de Oliveira – O Cardeal Saraiva, vol. 1, Porto: Faculdade de Letras, 1972, p. 311. Ver: IDEM, pp. 311-312. Ver: IDEM, pp. 314-315. 541 Ver: SÃO LUÍS, Frei Francisco de – “Dois objectos se devem ter prezentes, quando se trata de qualquer Cartório”, in: Arquivo de bibliografia portuguesa, Ano III, Outubro-Dezsembro, n.º 12, Coimbra: Atlântida, 1957, pp. 219-221. 539 540

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consoante a localização geográfica dos bens referidos nos documentos, identificada pela delimitação jurídica de “termo”; e, finalmente, o método misto, o mais vantajoso na óptica do beneditino, pois sendo uma mescla dos anteriores, permitia constituir processos temáticos, dispondo os documentos pela ordem cronológica e esboçando, quando fosse necessário, uma ligeira separação entre cada um dos processos relativamente à localização geográfica dos bens referidos. Estas considerações arquivísticas de Frei Francisco de São Luís se, antes de mais, reflectem a sua preocupação com a preservação e bom tratamento dos documentos, reconhecendo implicitamente o valor informativo dos arquivos para a evolução estrutural da entidade detentora, revelam também a tendência metodológica do tempo e a base teórica dos trabalhos que empreendeu na reforma dos cartórios beneditinos, na Casa de Sá e, mais tarde, na Torre do Tombo, de que foi guarda-mor entre Junho de 1834 e Setembro de 1836. Importa situar, com maior precisão cronológica, o trabalho de São Luís na Casa de Sá. Sabemos que ao longo da sua vida manteve uma presença intermitente em Ponte de Lima, sua terra natal542. Na verdade, a partir de 1807 e durante os dez anos seguintes, São Luís permaneceu no mosteiro do Carvoreiro, próximo de Ponte de Lima, ocupando o cargo de cronista-mor e visitador geral da sua Ordem, abrindo apenas uma excepção para desempenhar funções na Junta Governativa de Viana do Castelo, erigida por ocasião da derrota de Junot. A presença de São Luís no Minho era amiudadamente relatada a António de Araújo de Azevedo pelo seu primo o coronel Francisco Pereira Peixoto Ferraz Sarmento. Em Março de 1816, referia na sua carta que no papel incluzo V. Ex.ª verá o serviço que S. Luiz acaba [de prestar-] lhe543. Estamos em crer que se tratava da carta comunicando o término da inventariação do cartório (ver Anexo VI). Neste sentido, a indicação de Francisco Ferraz Sarmento revelava também um certo desconhecimento de António de Araújo face à iniciativa do tratamento do Cartório, que assim deverá ter sido supervisionada pelo seu irmão abade de Lóbrigos. Não obstante, o facto do monge beneditino ter dirigido uma carta, datada de um enigmático dia 31 de Dezembro, a António de Araújo, senhor da Casa, comunicando o término da tarefa é deveras sintomático sobre quem deve recair a responsabilidade da tarefa. 542 Ver: RAMOS, Luís de Oliveira – “Frei Francisco de São Luís no Minho”, in: Bracara Augusta, vol. XX, Julho-Dezembro, 1966, n.º 45-46 (57-58), pp. 273-283. 543 Ver: Carta de Francisco Pereira Peixoto Ferraz Sarmento para António de Araúo de Azevedo, datada de Ponte de Lima, 1816. 03. 28. ADB/UM-SIFAA/SSC. 08.01/ CR/DOC. 12,13,15

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Em nosso entender, dois motivos explicam a necessidade de se ordenar os papéis de família. Primeiro porque o seu pai no testamento realizado a 1783 nomeou António de Araújo para seu sucessor nos vínculos de Sá e do Outeiro, mas deliberou que a sua mulher Marquesa Margarida se mantivesse como administradora do vínculo do Sobreiro e da quinta da Prova. Logo, só após a morte desta, que vem a ocorrer em 1811544, é que António de Araújo de Azevedo sucede juridicamente na administração da totalidade da propriedade de família. Por outro lado, é sabido que o estado de saúde de António de Araújo deteriora-se a partir de 1814, atingindo a sua culminância a partir de 1815, o que conjuntamente com os condicionalismos inerentes ao homem político, nomeadamente a permanência da corte no Rio de Janeiro, tornaram o seu regresso a Portugal mais do que improvável. Ainda que a organização do cartório não tivesse sido motivada pelas razões que expusemos, é óbvio que a iniciativa marca um momento de charneira na administração da Casa. Na verdade, não devemos considerar o trabalho de São Luís como uma organização, mas sim como uma reclassificação, visto que uma parte significativa dos documentos já possuía títulos e outras anotações, no cabeçalho ou no verso do documento, que tinham sido apostos umas vezes pelos próprios produtores da informação, outras pelos seus descendentes e sucessores. Mas, segundo São Luís anunciava a Araújo, o trabalho fora realizado em três meses, sem grande fadiga e o resultado era o seguinte: Está em fim o cahos a algûa ordem, quero dizer, três caixas de papéis confusos e desordenados a 49 pastas, em que esses papeis ficão arranjados com algum systema, e de tal modo indicado no frontespício de cada hum o seu objecto, numero e pasta a que pertence, que não só com o index na mão se pode facilmente achar qualquer papel, mas também não he facil confundirem-se mais hûa vez que não haja hum total e absoluto transtorno em todo o plano do meu trabalho545.

À luz do Anexo VII, veremos que apenas chegou até nós uma parte residual do inventário, onde não consta o referido índice, que seria um importante instrumento para se compreender a metodologia seguida pelo arquivista beneditino.

544 Ver: Carta do vigário José Barbosa de Brito para António de Araújo de Azevedo, datada de 1811. 07. 29. ADB/UMSIFAA/SSC. 08.01/ CR/DOC. 14,8,1,1. 545 Ver: Carta de Frei Francisco de São Luís para António de Araújo de Azevedo. ADB/UM – SIFAA/SSC. 08.01/CR/DOC. 12,7,1.

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Assim, para se compreender a metodologia aplicada na descrição, arrumação e conservação dos documentos, importa efectuar uma análise crítica de cada um dos elementos que constam nas fichas descritivas dos verbetes que chegaram até nós. A ficha descritiva registada nas capilhas eram compostas por data(s), títulos ou sumários, e cotas. Seguindo o Anexo VIII, vemos que o nível de descrição adoptado oscilou entre o documento simples e os processos compostos pelo próprio arquivista. Se a existência de documentos simples não carece de grandes explicações, já nos processos constituídos por São Luís verifica-se que foram seguidos essencialmente dois critérios: o tipológico e o temático. No primeiro caso, são de referir a título de exemplo, os Baptismos, Recebimentos e Óbitos que agrega todas as certidões da família dispostas por ordem cronológica546; as certidões tiradas da Secretaria das Mercês sobre vários elementos da família547; e, ainda, as cartas patentes de diversos elementos da família548. Também é de referir o processo em que se agrupou as cartas patentes de uma única pessoa549 ou, ainda, o que juntou toda a correspondência recebida de um elemento da família550. No segundo caso, os documentos foram agrupados sem olhar à tipologia documental, como o processo que agrupa todos os documentos referentes aos serviços militares prestados pelos irmãos Diogo Pereira da Cunha e Francisco Pereira Marramaque551; o que agrega diversos documentos que corporizam o título final aposto na capilha, Justificação …552; e também todos os outros respeitantes aos serviços prestados individualmente por cada um dos elementos da família, como Francisco Pereira Marramaque553, Diogo Pereira da Cunha554, António Barreiros Galvão555, Fernando Pereira de Araújo de Azevedo556, João Pereira Pinto557, António Fernando Pereira Pinto558, João de Araújo de Azevedo559, António de Araújo de Azevedo, da quinta da Prova560 e Tristão Pereira Pimenta de Araújo de Azevedo561. Refira-se que todos estes registos receberam um título genérico e dentro de cada um dos processos 546

Ver: Anexo VII, registo n.º 10. Ver: Anexo VII, registo n.º 17. 548 Ver: Anexo VII, registo n.º 79. 549 Ver: Anexo VII, registo n.º 87. 550 Ver: Anexo VII, registo n.º 88. 551 Ver: Anexo VII, registo n.º 16. 552 Ver: Anexo VII, registo n.º 19. 553 Ver: Anexo VII, registo n.º 20. 554 Ver: Anexo VII, registo n.º 21. 555 Ver: Anexo VII, registo n.º 30. 556 Ver: Anexo VII, registos n.º 35 e 36. 557 Ver: Anexo VII, registo n.º 42. 558 Ver: Anexo VII, registo n.º 57. 559 Ver: Anexo VII, registo n.º 54. 560 Ver: Anexo VII, registo n.º 75. 561 Ver: Anexo VII, registos n.º 60 e 81. 547

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encontra-se um vasto número de tipologias documentais como por exemplo certidões de serviços, decretos de nomeações, correspondência, cartas patentes e ordens de serviços, etc. Para além destes, encontram-se ainda processos temáticos centrados nas propriedades familiares, como é o caso da mercê da fortaleza de Chaul na Índia562, os processos relativos ao vínculo do Sobreiro, também dito das Choças563, a licença para haver confessionário na capela da Casa de Sá564 e a justificação de António Pereira Pinto e sua mulher Marquesa para receber a herança do tio Francisco de Araújo de Azevedo falecido no Brasil565. Outros processos, ainda, combinam o critério temático e o tipológico como são os casos das várias escrituras de doação que vários membros da família Brito Barreiros outorgaram em 1718 e 1719 a Tristão Pereira Pimenta de Araújo de Azevedo566, as escrituras de doação dos Casais de Sá no século XVI567 e as cartas de legitimação régia e pontíficia de Tristão Pereira Pimenta de Araújo de Azevedo568. Refira-se que a maior parte destes processos recebeu títulos genéricos induzidos pelo critério com que foram constituídos, sendo de salientar também que outros processos receberam o título formal de um dos documentos que o integram569, e outros que receberam sumários mais ou menos extensos, por vezes, com comentários de natureza qualitativa, jurídica ou, meramente, complementar. Por outro lado, os documentos simples apresentam grande diversidade nos títulos: formais, formais com comentário jurídico570, induzidos, sumários alargados, provavelmente para prevenir das dificuldades de leitura571, induzidos pelo critério temático572, induzidos com informação complementar573, induzidos com comentários qualitativos574 e induzidos com comentários jurídicos575. Esses comentários são, essencialmente, de natureza qualitativa com expressões como “São notáveis estes embargos”576 ou “Minuta de ha muito honroza atestação […]”577; comentários meramente informativos, como “Veja-se o processo que depois 562

Ver: Anexo VII, registo n.º 59. Ver: Anexo VII, registos n.º96 e 97. 564 Ver: Anexo VII, registo n.º 65. 565 Ver: Anexo VII, registo n.º 72. 566 Ver: Anexo VII, registo n.º 51. 567 Ver: Anexo VII, registo n.º 89. 568 Ver: Anexo VII, registo n.º 84. 569 Ver: Anexo VII, registos 60, 65, 72. 570 Ver: Anexo VII, registo n.º 103. 571 Ver: Anexo VII, registo n.º 31. 572 Ver: Anexo VII, registos n.º 20, 37, 38, 61, 62, 98. 573 Ver: Anexo VII, registo n.º 92. 574 Ver: Anexo VII, registo n.º 39, 49, 91. 575 Ver: Anexo VII, registo n.º 41, 99, 100. 576 Ver: Anexo VII, registo n.º 39. 577 Ver: Anexo VII, registo n.º 49. 563

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correio a este respeito”578), “N.B. Parece que não diz respeito à Caza”579; e, finalmente, os comentários de natureza jurídica que são mais frequentes como “Original importante”580, “Copia authentica”581, “Por cópias authenticas”582, “He copia imperfeita e não authentica”583 e “He certidão authentica”584. No que concerne à datação dos processos, vemos que também não houve critério unifome, antes pelo contrário. No caso dos processos, foi mais frequente utilizar-se os limites cronológicos dos documentos, ou seja a data do primeiro e do último documento585, seguido da data formal dos documentos586, da data dos acontecimentos e não da produção documental587; de balizas cronológicas que apontam as datas do acontecimento e do treslado588, da data inicial dos acontecimento relatados589; de datas formais do documento mais significativo do processo590, da data do acontecimento relatado em um dos documentos e não da produção documental591, da data induzida de um dos documentos592. Verifica-se também, documentos sem data593 e, até, com uma data que não coincide com nenhum dos documentos594. Nos documentos simples, vemos que a maior parte são as datas formais, embora ocorra algumas variações como por exemplo a identificação da data do acontecimento e não da emissão do documento em concreto595; da data do despacho da mercê596, da data formal do documento original e não do treslado597, da data formal do treslado e não do documento original598, uma data incorrecta599 e alguns registos não datados, principalmente os nobiliários e as memórias de família600. Finalmente, a ficha descritiva termina com as cotas, compostas por número de pasta e número de processo, as quais, neste caso concreto de Sá, são determinantes para se apurar o critério do alinhamento final da documentação descrita. 578

Ver: Anexo VII, registo n.º 96. Ver: Anexo VII, registo n.º 91. Ver também o registo n.º 92. 580 Ver: Anexo VII, registo n.º 39. 581 Ver: Anexo VII, registo n.º 41. 582 Ver: Anexo VII, registo n.º 45. 583 Ver: Anexo VII, registo n.º 100. 584 Ver: Anexo VII, registo n.º 103. 585 Ver: Anexo VII, registos n.º 16, 57, 58, 59, 65, 81, 87, 88, 89. 586 Ver: Anexo VII, registos n.º 2, 36, 75, 79 e 84. 587 Ver: Anexo VII, registos n.º 10, 42, 45. 588 Ver: Anexo VII, registo n.º 51. 589 Ver: Anexo VII, registos n.º 16, 17. 590 Ver: Anexo VII, registos n.º 21, 29, 54, 60, 66, 72, 96, 101 e 102. 591 Ver: Anexo VII, registo n.º 19. 592 Ver: Anexo VII, registo n.º 97. 593 Ver: Anexo VII, registo n.º 8. 594 Ver: Anexo VII, registos n.º 34 e 35 . 595 Ver: Anexo VII, registo n.º 18. 596 Ver: Anexo VII, registo n.º 38. 597 Ver: Anexo VII, registos n.º 28, 39, 41, 62, 74, 103. 598 Ver: Anexo VII, registo n.º 69. 599 Ver: Anexo VII, registo n.º 24. 600 Ver: Anexo VII, registos n.º 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 9. 579

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O alinhamento final dos documentos e processos constituídos deixa antever uma certa hierarquia da documentação. Em primeiro lugar, surgem os nobiliários que, como já aqui foi referido, foram elaborados por gerações anteriores à do conde da Barca, com a intenção de servirem como instrumento de acesso à diversa documentação existente. Agora, a esses nobiliários não estaria reservada, certamente, a função de instrumento de acesso da documentação, mas sim uma função complementar do índice que Frei Francisco de São Luís realizara para providenciar um rápido acesso aos documentos e dos processos constituídos601. Cabia-lhes, sim, permitir ao utilizador penetrar na história da família, estabelecer as relações familiares entre os diversos ramos e perscrutar a proveniência do património fundiário da família. Segundo a Tabela 2, que permite obter uma panorâmica geral, vemos que das 49 pastas referidas por São Luís, apenas existe notícia das pastas n.º I, II e III, que estão completas, e das pastas n.º IV, V, VI, VII e XIII, que estão incompletas. Assim, para além da falta do índice, faltam também as pastas VIII – XII e XIV-XLIII, bem como registos que deveriam constar nas pastas IV, V, VI, VII e XIII. Neste sentido, torna-se difícil compreender, com precisão, o critério seguido por São Luís na ordenação da documentação. Seguindo a Tabela 2 apercebemo-nos que na pasta I, o arquivista começou por utilizar o critério temático, reunindo os nobiliários e as memórias de família, as certidões de baptismos, recebimentos e óbitos, visto que todos estes permitiam uma rápida e incisiva panorâmica da evolução estrutural da família. A partir da pasta II até à pasta III, recorre ao critério cronológico sucedendo o mesmo, na pasta IV. Por outro lado, as pastas V, VI e VII apresentam como primeiro critério o tipológico e, em seguida, o temático. Da pasta XIII não é possível apurar-se o critério em virtude de só existir um único documento.

601

Desconhecemos a existência deste índice. É certo que o mesmo não existe no A. D.B./U.M., sendo provável que tenha ficado na Casa da Carcaveira, em Ponte de Lima.

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Tabela 2 - Análise da metodologia aplicada por Frei Francisco de São Luís

PASTAS

I

II

III

IV

REGISTOS EXISTENTES

N.º 1 a n.º 20

N.º 21 a n.º 54

N.º 55 a n.º 78

N.º 79 a n.º 88

V

N.º 1 e n.º 7

VI

N.º 1, n.º 2, n.º 3, n.º 4, n.º 11, n.º 18, n.º 19, n.º 20, n.º 31, n.º 33

VII

XIII

CRONOLOGIA TIPOLOGIAS DOCUMENTAIS • Nobiliários; • Memórias e notícias familiares; • Certidões de baptismos, casamentos e óbitos (processo) • Justificações de parentesco; • Certidões de serviços (processo); • Certidões de mercês. • Certidões de serviços; • Certidões de mercês; • Mercês; • Sentenças de dispensa apostólica; • Correspondência; • Justificação de nobreza; • Inquirições; • Sentenças judiciais; • Breve apostólico; • Carta de legitimação; • Sentenças judiciais; • Atestação; • Doações; • Justificações; • Mercês; • Certidões de serviços; • Mercês; • Provisões do arcebispo; • Sentenças apostólicas; • Provisões régias; • Inquirições; • Justificações de parentesco; • Sentenças de habilitação; • Correspondência; • Mercês; • Correspondência; • Legitimação régia e pontifícia;

S (1.º E ÚLTIMO REG.)

CRITÉRIO DE ORGANIZAÇÃO

• s.d. (11 regs.); • 1438 - 1611

• 1.º temático • 2.º cronológico

• Sequência de registos completa.

• 1613 – 1721

• Cronológico e temático

• Continuação da numeração do registos da pasta anterior; • Sequência de registos completa.

• 1722 – 1804

• Cronológico e temático

• Cronológico

• Doações;

• 1529 – 1598

• Temático

• Testamentos; • Sentença de quitação; • Escrituras de vínculos;

• 1538 – 1708

• Temático

• Testamentos; • Subrogação de bens;

• 1731 – 1747

• Temático

• Certidão de inquirição.

• 1501

•?

N.º 46 e n.º 54

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• Continuação da numeração dos registos da pasta anterior; • Sequência completa da numeração dos documentos;

• 1662 - 1787

N.º 3

OBS.

• Continuação da numeração dos registos da pasta anterior. • Reinicia a numeração dos documentos; • Pasta incompleta. • Reinicia a numeração dos documentos; Pasta incompleta. • Continua a numeração da pasta anterior; • Pasta incompleta. • Reinicia a numeração dos documentos; • Pasta incompleta.

Finalmente importa referir que São Luís registou, ainda, alguns conselhos práticos para a preservação da documentação e a incorporação de nova informação, sugerindo que as pastas não devem estar em arcas, mas em estantes, n'uma casa livre de humidade e de incendios, e deve-se pôr hûa excomunhão maior ipso facto a toda a pessoa que tirando hum papel para o ler, o não reposer depois de lido no seu lugar competente. (…) hûa vez que se de ao Cartório algum arranjo, convem conserva-lo, e seguir o mesmo plano nos papeis que de novo forem acrescendo. 602

À luz destes considerandos, podemos concluir que São Luís recorreu ao método misto,

ao

qual



aludimos

anteriormente,

com

clara

predominância

do

temático-funcional. Mas, por outro lado, importa referir que esta abordagem é fruto da dedução do beneditino, pois submete os sumários e os títulos às necessidades da família em matéria de gestão corrente da propriedade, no sentido de providenciar um acesso célere à documentação existente no cartório. Não obstante o inventário da casa de Sá ser um importante testemunho das práticas arquivísticas do século XIX, a informação que ali se encontra cristalizada no suporte documental foi sujeita a uma descontextualização, que procurámos rectificar através da teoria sistémica evitando efeitos verdadeiramente nefastos no acesso à informação.

602

Ver: Carta de Frei Francisco de São Luís para António de Araújo de Azevedo. ADB/UM – SIFAA/SSC. 08.01/CR/DOC. 12,7,1.

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4.3.2. O CARTÓRIO COMO MEMÓRIA DA FAMÍLIA A Casa de Sá, em Ponte de Lima, pertenceu à família dos Pereira Pinto de Araújo de Azevedo. Muito embora os sucessivos vínculos instituídos pela família, maioritariamente nas centúrias de Seiscentos e Setecentos, exigirem o uso do apelido Pereira (de diferentes famílias) e o Pinto pelos administradores dos institutos vinculares, a verdade é que o apelidos fortes utilizados pelo conde da Barca foram sempre o Araújo e o Azevedo. O apelido Araújo está intimamente ligado à questão da varonia e à antiguidade da família, remetendo-nos para a Idade Média e para a Galiza. Em vários nobiliários são apontadas diversas origens como os Aças, Senhores de Lóbios, os Maias, família com grande expressão antes e durante a fundação da nacionalidade, ou ainda o cavaleiro francês Jean Tiranoth (ou João Tirante) rico-homem de Afonso VII, filho de Fernão Anes que povoou a vila de Araújo, na Galiza, em 1150. Estas perspectivas podem ser encontradas em vários nobiliários inéditos, a que Felgueiras Gayo deu maior amplitude no seu clássico Nobiliário de famílias de Portugal603, tal como em outro género de literatura604. Segundo a dedução de Felgueiras Gaio, Araújo é um apelido de origem toponímica que derivou de Aravia (ou Arabia), o qual foi adoptado por Pero Pais, trineto de Gonçalo Trastamires da Maia, assim chamado por ser senhor dessas terras. Seguindo o mesmo linhagista, o apelido Aravia que consta dos livros de armas da Torre do Tombo onde os Araújos estão intitulados chefe da família de Aravia605. O seu filho João Pires da Maia foi rico-homem e senhor das vilas de Araújo, Rio Caldo, Gemide e outras, e seu neto, D. Pedro Pais de Ambia, senhor de Lóbios, apenas teve descendência feminina, onde entrocaria, por via do casamento, o apelido d’Aça. Deste casamento, nasceu Àlvaro Rodrigues d’Aça, senhor da casa de seu pai e do senhorio de Lóbios, que de Comendola Gonçalves teve três filhos que passaram a Portugal: Paio, Vasco e Gonçalo Rodrigues de Araújo. Ora, Paio Rodrigues foi o primeiro a usar o apelido

603

Ver: GAIO, Manuel José da Costa Felgueiras- Nobiliário das Famílias de Portugal, Braga: Carvalhos de Basto, 2ª Edição, 1989, Tomo II, - título “Araújos”. 604 Ver: GRANDE ENCICLOPÉDIA PORTUGUESA E BRASILEIRA, Lisboa/ Rio de Janeiro: Editorial Enciclopédia, Lda., vol. III, pp. 85-86; TÁVORA, D. Luiz de Lancastre e – Dicionário das famílias portuguesas, Lisboa: Quetzal Editores, 1989, p. 82; SOUSA, Manuel de – As origens dos apelidos das famílias portuguesas, [s.l.] Sporpress, 2001, p. 28. 605 Ver: GAIO, Manuel José da Costa Felgueiras - ob. cit., tomo II, p. 11.

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Araújo quando passou a Portugal, no tempo de D. Dinis, e vinculou o seu apelido ao toponímico mais importante das suas propriedades na Galiza. Por outro lado, os diversos nobiliários produzidos pela família, hoje existentes no cartório da casa de Sá, remetem-nos para tempos mais longínquos, anteriores à fundação da nacionalidade onde a lenda se mistura com a realidade, no sentido de dotar a família de um instrumento propiciador de um capital simbólico distintivo (as origens medievais) mas, também, numa perspectiva mais pragmática, de providenciar a regulamentação da propriedade fundiária nos tempos correntes. Não obstante se tratar dessas genealogias em cada um dos seus produtores, devemos apresentar uma rápida panorâmica dos mesmos. Em primeiro lugar, importa referir que as deduções ali apresentadas não diferem muito dos nobiliários publicados, referentes àquelas cronologias, pois é sabido que uns e outros sofreram inegáveis influências do Livro Velho de Linhagens e do Livro de Linhagens do conde D. Pedro, que entraram em circulação, tendo sido corrompidos por cópias sucessivas tresladadas para outros nobiliários de casas senhoriais e mosteiros. Em Sá, os dois nobiliários mais significativos são a Descendência dos Araújos de Galiza606 e o Título Genealógico de Araújos607. Ambos pretendem situar o início da linhagem, passar pelo primeiro utilizador do apelido Araújo, e referir todos os acontecimentos relevantes na evolução estrutural da família, como sejam as alianças matrimoniais e a angariação de sugestivas mercês régias. Uma análise depurada certamente demonstraria a omissão de outros aspectos menos significativos na óptica do linhagista... O primeiro desses nobiliários pretende demonstrar que a descendência da varonia dos Araújos da Galiza principia no rei Ramiro de Leão e seu filho Aboazar Lovesendes – cujo nascimento aparece envolto no mistério da “Lenda de Gaia”608 -, apresentando um total de vinte e duas gerações, sem quebra de varonia, passando pelos poderosos senhores da Maia, até chegar ao século XVII e a Fernando Pereira de Araújo, 2.º morgado do Sobreiro e redactor desta resenha genealógica. O seu propósito parece ter sido o de reforçar o poder simbólico da família logo após a Restauração de 1640. O ponto fulcral desta resenha genealógica situa-se na IX geração, quando se assinala que João Pires da Maia teve por filho D. Pedro Pais de Aravia que foi aquelle de que trata o 606

Ver: Descendência dos Araújos de Galiza. Ver: ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1,2. Ver: Título Genealógico de Araújos. Ver: ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1,1. 608 Veja-se as duas versões da “Lenda de Gaia” em MATTOSO, José – “O Rei Ramiro”, in: Narrativas dos livros de linhagens, Obras Completas, vol. 5, [s.l.] Círculo de Leitores, 2001, pp. 223-240. 607

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conde D. Pedro no Cap. 36609. De facto, o referido conde faz referência a este Pedro Pais, mas em momento algum aponta os laços de parentesco que o morgado do Sobreiro sugere. O segundo desses nobiliários é mais substancial em termos informativos pois descreve as façanhas de vários elementos da família e passa por ser um livro de familias copiado com a mayor certeza de muitos genealogistas verdadeiros com a averiguação de cazamentos e noticia dos modernos e com declaração de bastardos. Recua quatorze gerações a partir do Rei Ramiro, defendendo que os Araújos tem o seu princípio em Leovigildo, 17.º rei Visigodo a partir de 572, que venceo muitas batalhas aos Suevos e Romanos, e veio a falecer em 586 na fé católica, do qual athe o prezente se tem continuado a sua sucessão610. A partir daqui assistimos a um desenrolar de gerações e de indivíduos ilustres, glorificados pelos seus actos como Recaredo a quem o Sumo Pontífice deu o nome de Catolico Christianissimo, Flávio o pay dos pobres, Pelaio que lutou para restaurar a Hespanha do poder dos mouros nas Astúrias, ou ainda outros indíviduos que pelo casamento entraram na família como D. Afonso, primeiro filho de D. Pedro, duque de Cantabria, que venceo aos mouros 34 batalhas, conquistando Braga, Porto, Àgueda, Vizeu, Chaves e outras muitas [e] viveo tão santamente que na sua morte se ouvirão cantar os Anjos611.

Todavia a sequência de gerações a partir do rei Ramiro de Leão não é totalmente coincidente com o primeiro manuscrito, pois para além de reconhecer a quebra de varonia, introduz mais gerações do que aquele. No essencial, defende que Pedro Pais de Arabia, senhor de Araújo e de Lóbios, era filho de Paio Aires de Aravia, por seu turno suposto filho de João Pires da Maia, e que viveo em Galiza, e por isso o conde D. Pedro o não traz entre os mais filhos. O cerne da questão centra-se precisamente na nobre linhagem dos da Maia que supostamente deu origem aos de Araújo, algo que as investigações recentes de José Mattoso e de José Augusto Sotto Mayor Pizarro vieram desmentir612.

609

Ver: Descendência dos Araújos de Galiza. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1,2. Ver: Título Genealógico de Araújos. Ver: ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1,1, fl. 8. 611 Ver: Título Genealógico de Araújos. Ver: ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1,1, fl. 9-9 v. 612 Ver: MATTOSO, José – “A nobreza medieval portuguesa. A família e o poder”, Obras completas, vol. /, [s.l.], Círculo de Leitores, 2011, pp. 157-167; PIZARRO, José Augusto de Sotto Mayor – Linhagens Medievais Portuguesas. Genealogias e estratégias (1279-1325), vol. 1, Porto: Universidade Moderna, 1999, pp. 257-266. 610

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Os Araújos no Entre Douro e Minho Na verdade, em todos os nobiliários que consultamos o consenso em torno da família Araújo só principia com Paio Rodrigues de Araújo, o cavaleiro, com quem iniciamos a resenha genealógica em anexo, provavelmente porque a partir daqui passou-se a distinguir com maior precisão os laços de parentesco e as gerações, em virtude da fixação definitiva do apelido e imutabilidade da propriedade fundiária da família, na sua totalidade situada no Entre-Douro-e-Minho e Galiza. Desconhecem-se as razões da progressiva passagem dos Araújos a Portugal, mas é possível que tal tenha ficado a dever-se a questões políticas na Galiza, bem como o atractivo das mercês régias em Portugal decorrentes da luta contra os mouros e, depois, da empresa ultramarina, bem como as importantes alianças matrimoniais, que possibilitavam a acumulação de património e definição do papel social dos Araújos. Assim, o primeiro membro desta família a passar a Portugal terá sido Paio Rodrigues conhecido como o “cavaleiro de Araújo” por ser senhor daquelas terras entre muitas outras, capitão da guarda e estribeiro-mor do rei D. Dinis, que o fez alcaide-mor de Lindoso e Castro Laboreiro, por ter tomado a parte do monarca português contra Fernando IV de Castela613. A sua existência parece confirmar-se com uma nota num dos nobiliários da Casa de Sá informando que dele achou-se prazos no ano de 1292. Filho primogénito da casa dos de Aça, casou com D. Brites Velho de Castro, filha de Nuno Velho de Castro, alcaide-mor de Melgaço, e neto de João Velho que tinha sido embaixador a Aragão para pedir a mão da Rainha Santa Isabel614. Deste casamento houve, para além de outro, Vasco Rodrigues de Araújo que foi senhor da casa de seu pai e aquele que os nobiliários referem como o primeiro que se estabeleceu definitivamente em Portugal. Foi fronteiro na Galiza e, depois de passar a terras lusas, capitão da guarda de D. Dinis. Provavelmente, pelo seu casamento com D. Leonor (ou Maria) Rodrigues Velho, filha de Pedro Anes Velho, Mestre de São Tiago, terá seguido idêntico caminho do sogro, pois Felgueiras Gaio aponta-o como um dos treze comendadores de São Tiago615. Dos seis filhos deste casal, o primogénito sucedeu na casa e nos demais senhorios, mas tendo falecido sem geração, tais direitos passaram a seu irmão Pedro 613 Ver: AFFONSO, Domingos de Araújo, VALDEZ, Ruy Dique Travassos – Livro de Oiro da Nobreza: apostilas à resenha das famílias titulares do Reino de Portugal de João Carlos Foo Cardoso Castelo Branco e Torres e Manoel de Castro Pereira de Mesquita, Braga: «Pax», MCMXXXII, vol. I, p. 228. 614 Ver: Título Genealógico de Araújos. Ver: ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1,1, fl. 12 v. 615 Ver: GAIO, Manuel José da Costa Felgueiras – ob. cit., tomo II, p. 13.

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Anes de Araújo que pelo casamento com D. Inês ou Joana Veloso, descendente do infante D. Rodrigo Veloso ou D. Gonçalo Rodrigues Veloso que fez a terra de Lóbios e por este casamaneto se uniu a Caza de Lóbios aos Araújos616. O filho de ambos, Gonçalo Rodrigues de Araújo, senhor da casa dos seus maiores, serviu o rei D. Fernando I com quatro lanças tendo recebido em mercê as terras de Vilar das Vacas, Cidrais e Casal das Donas, em Barroso, como também o Castelo de Lindoso e os direitos reais de Castro Laboreiro. Na verdade, é este mesmo Gonçalo Rodrigues que passa a usufruir da protecção dos Magalhães, senhores da Barca, em virtude de ter casado com Froilos de Magalhães, filha de Gil Afonso de Magalhães, alcaide-mor do castelo da Nóbrega, e de sua mulher Teresa Freire de Andrade, filha do 6.º Mestre da Ordem de Cristo. De Gonçalo e Froilos houve sete filhos. O quarto, Gonçalo Rodrigues de Araújo herdou os direitos reais de Lindoso e Curral das Vacas, enquanto que o mais velho, Pedro Anes de Araújo, segundo alguns senhor da Torre de Quintela na Barca, sucedeu na casa de seu pai, mas perdeu todas as terras que possuía em Portugal por ter estado na defesa de Ponte de Lima contra D. João I. Mais tarde, com o perdão régio beneficiou novamente de Lindoso entre outras617. Do seu segundo casamento, com Leonor Gonçalves de Pedroso, filha de Rui Gonçalves, senhor do couto de Pedroso junto à cidade do Porto, teve quatro filhos. O primeiro deles foi Paio Rodrigues de Araújo, “o Cavaleiro” glorificado nas crónicas régias pela sua valentia militar ao serviço de D. João I, de que foi exemplo o escalamento de Tui quando, com os seus filhos, foi o primeiro a subir os muros. Também da sua participação nas guerras do Norte de África, rezam as crónicas, principalmente em Ceuta, para onde foi com 300 homens à sua custa e foi ordenado cavaleiro; e, mais tarde, em Tânger como guarda-mor do Infante D. Henrique618. Manuel de Faria e Sousa na sua África Portuguesa disso mesmo dá um testemunho quando refere que Paio Rodrigues de Araújo com outros cavaleiros da Ordem de Cristo de que era Mestre e outros que sendo dela […] o seguirão e todo o Reyno, e se ouve com tanta magnificencia que a sua casa era a segunda dipois da Real619.

616

Ver: IDEM, tomo II, p. 13. Ver: IDEM; tomo II, pp. 13-14. 618 Ver: GAIO, Manuel José da Costa Felgueiras – ob. cit., tomo II, p. 14; AFFONSO, Domingos de Araújo, VALDEZ, Ruy Dique Travassos – Livro de Oiro da Nobreza: apostilas à resenha das famílias titulares do Reino de Portugal de João Carlos Foo Cardoso Castelo Branco e Torres e Manoel de Castro Pereira de Mesquita, Braga: «Pax», MCMXXXII, vol. I, p. 228. 619 Ver: SOUSA, Manuel de Faria e – “África Portuguesa”, cap. 3, fls. 38, cit. por GAIO, Manuel José da Costa Felgueiras, tomo II. 617

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À vinda de Ceuta, o grande cavaleiro foi nomeado embaixador em Castela e capitão da guarda do Conselho del Rei. Segundo uma justificação e atestação sobre a fidalguia, parentesco e vários senhorios e morgados de Araújos, feita em 1607, consta que foi capitão da guarda de El Rey D. João o Primeiro e seu Embaixador a El Rey de Castella, comendador de Paderne e Rio Frio, Senhor e Alcaide-mor das terras e Castello de Lindoso, e direytos reaes da villa de Monsão, e Crasto Laboreiro, e terras de Villar das Vacas, Cidrais e Cazal de Donas em terras de Barrozo por doação feita por El Rey D. Fernando de Portugal aos antepassadios do dito Payo Rodrigues de Araújo que lhe forão confirmadas por outera doação que lhe fes o dito D. João o primeiro e D. Duarte seu filho e no reino de Galiza foi Senhor o dito Payo Rodrigues de Araújo das terras e torre de Aravia, coutos de Rio Caldo, Azeredo e Gendive, Ovios, Alieteu, Gemide, Vale de Plodros, Santa Cruz, Soutello, e Panoya, e do Palácio de Lobeos, e de suas terras e justiças civeis e crimes como consta de papeis authenticos feitos athe aqueloe tempo do dito Payo Rodrigues de Araújo e depois delle por diante consta o sobredito senhorio e jurisdição do Palácio de Lobeos e de seus coutos pelos ditos autos de inquirição que se fes dos filhos e nettos, bisneto, terceyros netos e quartos netos que herdarão e socederão na dita Caza e morgado de Lobeos620.

Do seu casamento com Leonor Pereira, filha herdeira de Bernardim de Barbudo, senhor do castelo de Barbudo, de Bouro e de Sabariz, houve treze filhos que foram cobertos de prestígio pelas mercês régias. De entre eles, destacam-se o primogénito, Fernão Velho de Araújo com quem continuaremos esta resenha; Paio Rodrigues de Araújo que sucedeu na quinta de Barbudo, em Sabariz e nos direitos de Monção; Gonçalo, senhor de Milmenda, que em 1486 recebeu o padrão de tença de 20$000 réis pelos seus serviços, o qual é o documento mais antigo referente aos Araújos existente no cartório da casa de Sá621; Álvaro, comendatário de Rio Frio; e, finalmente Lopo que sucedeu nos senhorios de Campelo e Vale de Poldros, foi alcaide-mor de Sande na Galiza e de Lindoso em Portugal, e casou com Brites de Sousa Magalhães, filha de João de Magalhães, senhor da Barca e da Nóbrega, de quem vem o 4.º governador do Castelo de Lindoso nos princípios do século XVIII622. De Fernão Velho de Araújo sabe-se que serviu nas guerras de Granada à sua custa e que 620

Ver: Justificação e Atestações sobre a Fidalguia, parentescos e vários Senhorios e Morgados de Araújos. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1, 19. 621 Ver: Padrão de tença dado a Gonçalo Rodrigues de Araújo. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 4, 118, 2. 622 Ver: Título Genealógico de Araújos. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1,1, fl. 13 v.

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antigamente em seu tempo foi fidalgo antigo das cazas do solar & senhor da Caza de Lóbios & de outras terras que erdou de seu pai Paio Rodrigues de Araújo no Reino de Galiza por ser seu filho legitimo & como tal cazou o dito Fernão Velho de Araújo com hua filha legitima desta minha caza de São João de Rei D. Constança de Azevedo623.

Deste casamento na Casa de São João de Rei, resultou a adopção do apelido “Azevedo” pela família dos Araújos, que vai perdurar até meados do século XIX nos diferentes ramos da família. Fora seu filho primogénito e sucessor Tristão de Araújo de Azevedo, sucessor nas terras em Portugal e no solar de Lóbios, casado com D. Isabel Coelho de Vasconcelos, ou de Azevedo, segundo Felgueiras Gaio624, filha de Gonçalo Pires Coelho, 3.º senhor de Felgueiras e de Vieira e da casa de Cergude, e de sua segunda mulher Violante de Magalhães procedente da casa da Barca625. A geração seguinte fica marcada pelo acontecimento mais significativo na história da família: a implementação definitiva no Entre Douro e Minho. Na verdade, Gonçalo Rodrigues de Araújo viu-se na contingência de fugir para Portugal em virtude de ter assassinado Lopo Soares, mordomo do bispo de Ourense. Na sequência deste acontecimento, foi sentenciado a ser degolado e a perder as terras que possuía na Galiza em benefício da diocese de Ourense e do solar de Araújo para o conde de Monte Rei. Na posse da família ficaria apenas o solar de Lóbios, que seria reivindicado judicialmente, em 1542, por seu filho primogénito Fernão Velho de Araújo que dá origem à linha da casa de Sinde em Braga, representantes dos Araújos de Lóbios. Com Gonçalo fugiu para Portugal o seu irmão Fernão Velho de Araújo que foi quem originou a segunda linha dos Araújos: os da casa de Sá, os da Prova, os de Santa Marta de Viana do Castelo, entre outros ramos626. Implicado no crime do irmão, Fernão Velho veio para Portugal onde obteve o couto de Rio Caldo e residiu na Torre de Pousada, freguesia de São Tomé de Vade, termo da Barca. Do seu casamento com Ana Nunes Bezerra, filha do desembargador do Paço Nuno Gonçalves Bezerra, senhor da Torre de São Gil de Perre, houve oito filhos. O mais velho, Paio de Araújo de Azevedo casou com Ana Gomes Pimenta, irmã dos poetas Diogo Bernardes e Frei Agostinho da Cruz, tendo obtido em dote o ofício de 623

Ver: Justificação e Atestações sobre a Fidalguia, parentescos e vários Senhorios e Morgados de Araújos. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1, 19, fls. 23 f. – 24 f. Ver: GAIO, Manuel José da Costa Felgueiras - ob. cit., tomo II, p. 15. 625 Ver: Título Genealógico de Araújos. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1,1 fl. 14. 626 Ver: IDEM. 624

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escrivão dos orfãos de Ponte da Barca em Agosto de 1558627. Foi este Paio de Araújo de Azevedo o quarto avô do conde da Barca, e o seu casamento na Torre dos Pimentas da Barca marcaria indelevelmente a sua mentalidade, como veremos. Deste casamento nasceu Fernão Velho de Araújo que viria a ser senhor da casa de seu pai e que andou reputado por homem de poucos bens e muitas dívidas628, não obstante ter casado na Barca, em 1652629, com Catarina da Costa Veloso, terceira neta por legitima descendência de Ruy Lopes da Costa fidalgo e vassalo que foi do Senhor Dom Afonço Quinto que Santa gloria aja (…) cazado com Violante Fernandes de Magalhães (…) filha legitima do donatário da dita villa” da Barca630.

As Guerras da Restauração e a definição patrimonial O tempo da Restauração será o momento de definição da propriedade fundiária da família e a estruturação definitiva dos Araújos de Azevedo. O filho primeiro de Fernão Velho e Catarina da Costa Veloso, chamado Paio de Araújo de Azevedo, cavaleiro da Ordem de Cristo, e natural sucessor na casa, distinguiu-se na Armada e nas guerras do norte de Àfrica, tendo inclusivamente ficado cativo em Argel em 1645. Depois de resgatado pelo seu irmão, João de Araújo, a troco de 700 mil réis, rumou ao Brasil tendo se estabelecido na Baía, onde viveu muito rico e deixou geração631. A sua ausência definitiva terá invertido a natural rota de seu irmão João – a eclesiástica – pois, segundo uma tradição familiar, não tirou filhamento, porque era filho segundo e não fazia tenção de cazar632. Seguiu, então, a carreira militar tendo sido capitão de Ordenanças em Ponte da Barca, entre os anos de 1643 e 1652633, data do seu falecimento. E o seu casamento com Catarina Pereira, filha ilegítima do vigário de Cabana Maior, António Pereira de Brito, significará a posse de um significativo património fundiário localizado em Arcos de Valdevez e a principal fonte de rendimentos das três gerações seguintes. 627 Ver: GAMA, Alvaro Pimenta da – “Diogo Bernardes. Apontamentos genealógicos e biographicos”, in: O Instituto, vol. 57.º, Coimbra: Imprensa da Universidade, 1910, pp. 758-768. 628 Ver: Vínculo do Sobreiro. Treslado do processo que correu entre o Sr. Fernando Pereira de Araújo, e as Freiras do Salvador de Braga sobre a trasladação dos Ossos do Sr. João de Araújo de Azevedo. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 3, 98. 629 Ver: GAIO, Manuel José da Costa Felgueiras - ob. cit., tomo IV, p. 548. 630 Ver: Justificação e Atestações sobre a Fidalguia, parentescos e vários Senhorios e Morgados de Araújos. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1, 19. fl. 20 f. 631 Ver: Título Genealógico de Araújos. Ver: ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1,1, fl. 15. 632 Ver: IDEM. 633 Ver: Certidão de Papeis que se acham na Secretaria das Mercês. Ver: ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 2, 54, 1.

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Foi este vigário de Cabana Maior, o instituidor do morgado do Sobreiro, também dito das Choças por ter os seus bens na freguesia de Santo Estevão de Aboím das Choças, chamando para seus primeiros administradores João de Araújo e Catarina Pereira, com a obrigação do uso do apelido Pereira, de missas na capela de Santo António do Sobreiro e com a exclusão de ilegítimos na sucessão do vínculo634. Para além disso, João de Araújo recebia em dote as fazendas do Ribeiro na mesma freguesia, o paço do Outeiro, na freguesia de Gondoriz, o prazo de Cabana Maior em Ponte da Barca e mantinha o prazo de Vade que herdara de seu pai. Por outro lado, as gerações de João e de seus filhos ficariam ligadas à restauração do reino em virtude dos serviços prestados nas companhias de ordenanças, reinstituídas logo após Dezembro de 1640, para defender a legitimidade de D. João IV perante Filipe III de Espanha635. Para além dos notórios privilégios que eram reconhecidos àqueles que podiam alistar-se nestas associações (para)militares - desde logo, o facto de poder alistar-se era já considerado um factor distintivo de nobreza636 -, refira-se que os principais motivos da participação dos Araújos de Azevedo, tal como de muitas outras famílias nobres, residiu, na isenção de tributos de guerra, impedindo a saída dos réditos das propriedades familiares, e que providenciava a remuneração dos serviços prestados durante as guerras que faziam reverter para a família os almejados foros, ofícios de nomeação régia, tenças e outros, conforme ordenava o alvará de 24 de Novembro de 1645637. O casal teve quatro filhos: Fernando, primogénito e sucessor no morgadio, capitão de infantaria auxiliar638; António, que alcançou o posto de tenente-general de infantaria e que sucedeu a seu irmão no vínculo; Maria que casou com Francisco Pinto Barbosa, de Viana do Castelo; e Ana de São Joaquim que professou no Convento do Salvador em Braga. Em 1652, João de Araújo de Azevedo, no regresso da Corte, adoeceu em Braga e veio a falecer no convento do Salvador. No seu testamento, datado de 11 de Maio desse ano, vinculou ao morgado do Sobreiro o terço dos bens livres, depois de deduzidos os legados, e chamou para sua administradora a mulher Catarina Pereira e, 634

Ver: Título Genealógico de Araújos. Ver: ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1,1, fls. 15-15 v. Sobre a evolução destes organismos (para)militares ver o estudo de síntese de AMARAL, Manuel Everard do – “As Ordenanças e as Milícias portuguesas, de 1570 a 1834”, in: BORREGO, Nuno Gonçalo Pereira Borrego – As ordenanças e as milicias em Portugal: subsídios para o seu estudo, Lisboa: Guarda-mor, 2006, pp. 57-74. 636 Ver: MAGALHÃES, Joaquim Romero de – “Os nobres da governança das terras”, in: OPTIMA PARS. Elites ibero-americanas do Antigo Regime, organização de Nuno Gonçalo Monteiro [et alli], Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2005, pp. 65-76. 637 Ver a legislação sobre as Ordenanças e as Milícias em BORREGO, Nuno Gonçalo Pereira Borrego – As ordenanças e as milicias em Portugal: subsídios para o seu estudo, Lisboa: Guarda-mor, 2006. 638 Ver: Serviços do Sr. Fernão Pereira de Araújo, filho do Sr. João de Araújo de Azevedo. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 2, 36. 635

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depois dela, o filho primogénito Fernando Pereira de Araújo de Azevedo e seus descendentes na linha do que fora instituído pelo vigário de Cabana Maior639. O falecimento de João de Araújo em Braga veio originar profundas crises na administração do vínculo. Duas delas ocorrem em simultâneo, mas têm um carácter distinto. A primeira tem a ver com o facto de João de Araújo não ter eleito sepultura o que vinha pôr em causa o cumprimento dos legados que instituiu. Catarina Pereira e seu filho Fernando mantiveram uma disputa com as freiras do convento do Salvador de Braga que durou até 1686, ano em que alcançaram o breve apostólico a autorizar a trasladação dos ossos de João de Araújo para a capela de Santo Estevão de Aboím das Choças, para assim poderem dar cumprimento aos legados instituídos640. A segunda, já com carácter interno na família, diz respeito à luta mantida entre Catarina Pereira e seu filho Fernando pela posse do vínculo do Sobreiro. Durante os anos de 1658 e Setembro de 1665, Catarina administrou o vínculo e segundo o seu filho foi a responsável pela depredação do património familiar, pois para além de nunca ter prestado contas das rendas arrecadadas, vendeu ao desbarato uma parte de bens móveis e de raiz vinculados para satisfazer as necessidades do filho António e para compor o dote da filha Maria. Também tinha perdido uma cadeia de ouro que emprestara a seu primo Jácome Cassão de Brito que a empenhou para providenciar o ingresso das suas sobrinhas num convento. Para além disso, o panorama em relação às casas era desolador pois, se em Gondoriz, o exército castelhano se aquartelou e incendiou o paço quando ia para o castelo da Nóbrega, já em Ponte da Barca, a casa ficara destruída pela presença das tropas de infantaria portuguesas641. Findas as Guerras da Restrauração, Fernando Pereira de Araújo de Azevedo é desmobilizado e inicia uma intensa luta com a mãe pela posse dos bens familiares, invocando os pressupostos que o vigário de Cabana Maior incluira na instituição do

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Ver: Vínculo do Sobreiro. Treslado do processo que correu entre o Sr. Fernando Pereira de Araújo, e as Freiras do Salvador de Braga sobre a trasladação dos Ossos do Sr. João de Araújo de Azevedo. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 3, 98, fl. 6f. 640 Ver: Papeis sobre a execução do Testamento, e trasladação dos Ossos do Sr. João de Araújo de Azevedo, que foi sepultado no Salvador de Braga, e sua mulher e filho o queriam trasladar para a Capela do Morgado do Sobreiro. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 3, 96, fl. 2 f.; Breve Apostólico para se trasladarem de Salvador de Braga para a Capella de Santo António das Choças os ossos do Senhor João de Araújo de Azevedo. Cópia authentica ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 2, 41. 641 Ver: Certidão de Papeis que se acham na Secretaria das Mercês. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 2, 54, 1.

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vínculo. A fúria de Fernando voltou-se contra sua mãe, não sem litígios dos seus irmãos, deixando-a a viver na miséria na casa das Choças e levando-a à loucura642. Em 1665 entrou, então, na posse dos bens familiares e lançou um conjunto de medidas tendentes a reorganizar o património fundiário e a consolidar a expressão simbólica da família no termo dos Arcos. O capital que a família Araújo de Azevedo usufruirá nas centúrias seguintes passa muito pelo rigor com que Fernando desempenhou a tarefa de reorganizar a propriedade familiar, reedificando as casas e tomando medidas para cumprir as vontades do instituidor do vínculo, e os legados de seu pai. Na verdade, quando João de Araújo de Azevedo vinculou o terço de seus bens livres, um Provisor de Braga declarou esta parte do testamento nula em virtude de constar serem mais as dívidas (…) do que os bens. Aí Fernando comprometeu-se, por escritura pública de 2 de Abril de 1678, a cumprir o legado de seu pai por conta do rendimento dos bens que comprara, pois era certo que o avô António Pereira tinha pago grande parte das dívidas, nomeadamente o resgate de 700 mil réis de Paio de Araújo, para não perturbar as legítimas dos seus descendentes nem tão pouco serem arrematadas na praça pública os bens de Gondoriz e da Barca643. Por outro lado, é bem sabido que a aclamação de D. João e a subsequente guerras geraram efeitos, a curto e a médio prazo, nos diversos mecanismos de estruturação de elites sociais num tempo em que começou a emergir o regime de prebenda644. Um deles foi, sem dúvida, a remuneração régia dos serviços prestados nas Guerras da Restauração. Este factor vai ser aproveitado por Fernando Pereira de Araújo que junta diversos atestados e ordens de serviço e manda correr folhas na correição de Viana para, então, requerer os serviços prestados645 com a intenção de fazer convergir para a Casa as tão desejadas mercês régias. Ainda dentro deste ponto, o pedido do treslado de uma justificação de nobreza que havia sido elaborada a requerimento de seu primo Gaspar de Araújo é sintomático de uma família que pretende consolidar a sua afirmação social646.

642 Ver: Papeis da Família. Querendo o Sr. Fernando Pereira de Araújo entrar na Administração dos bens de sua mãe a Senhora Catarina Pereira de Araújo, opuseram-se os senhores António de Araújo de Azevedo e Francisco Pinto Barbosa. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 2, 39. 643 Ver: Testamento do Sr. Fernando Pereira de Araújo de Azevedo morador na Casa de Sá. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 3, 99, fl. 4 v. 644 Ver: MONTEIRO, Nuno Gonçalo – “Poderes e circulação das elites em Portugal. 1640-1820”, in: Elites e Poder. Entre o Antigo Regime e o Liberalismo, 2.ª edição, Lisboa: ICS, 2007, p. 116 e segs. 645 Ver: Lembranças de alguns serviços militares do senhor capitão Fernando Pereira de Araújo de Azevedo. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 2, 35; Serviços do Sr. Fernão Pereira de Araújo, filho do Sr. João de Araújo de Azevedo. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 2, 36. 646 Ver: Justificação de Nobreza que fez o Sr. Gaspar de Araújo de Azevedo, morador em Ponte de Lima. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 2, 31.

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Também o seu casamento com Maria Pereira Fagundes, procedente do segundo morgado de Bertiandos, senhora dos quartos de Sá, em Ponte de Lima, e dos prazos de Fornelos e de São Sibrão, ambos em Moreira do Lima, denunciava a estratégia de ascensão social que ele delineara. Maria Pereira Fagundes era filha primogénita de António Pereira Pinto “o Gordo”, moço fidalgo da Casa Real, que combateu nas guerras da Aclamação, filho segundo da Casa de Bertiandos, que procurara no seu casamento com a prima Violante Pereira, herdeira da quinta da Lage na freguesia de Santa Maria de Sá, em Ponte de Lima, os bens patrimoniais de que não beneficiou na casa paterna. Pelo casamento, certamente, benficiou também do cargo de guarda-mor da freguesia de Sá (ver Quadro 3). Na verdade, a quinta da Lage, em Santa Maria de Sá, provinha do ramo desta Violante Pereira, filha de António Pereira Felgueira, Filgueira, Felgueiras ou, ainda, Folgueira, fidalgo da Casa Real, vereador da Câmara de Ponte de Lima e Capitão de Infantaria auxiliar em Ponte de Lima647, que herdara os quartos de Sá de sua mãe Juliana Barbosa, filha de Gomes Felgueiras, escudeiro, e de sua mulher Violante Barbosa, os quais, por seu turno, os tinham adquirido em 1529 por doação de João da Cunha e Beatriz Barbosa648. António Lopo Felgueira era filho segundo de Lopo Pereira, e neto de António Pereira, abade de São Martinho de Cunha, e irmão de Francisco Pereira Marramaque e Diogo Pereira da Cunha, gente a quem a Índia e a religião costumou dar boa acolhida, conforme diria D. Francisco Manuel de Melo649.

647 Ver: Certidão de um Assento do Livro da Câmara de Ponte de Lima, por onde consta que Lopo Pereira foi nomeado Alferes da Companhia de seu pai António Pereira Filgueira, fidalgo da Casa Real. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1, 24. 648 Ver: Doação, pela qual João da Cunha, Escudeiro, e sua mulher Beatriz Barbosa, da freguesia de Brandara doaram a sua filha Violante Barbosa, os Casais de Sá, que eram foreiros ao Mosteiro de Azere, reservando só o usufruto em suas vidas. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 3, 89, 2. 649 Ver: MELO, D. Francisco Manuel de – “Carta de Guia de casados”, Porto, 1.ª ed., 1651, p. 193, cit. por MONTEIRO, Nuno Gonçalo, 1993, p. 941.

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Quadro 3 - Esquema genealógico dos Pereiras Pintos de Bertiandos

Lopo Pereira c. c. Inês Pinto Instituidores dos dois morgados de Bertiandos

Francisco Pereira Senhor do 1.º morgado De quem vem a sucessão na Casa de Bertiandos

Francisco Pereira Abade de Moreira do Lima

João Pereira Pinto c. em 2.ª núpcias c. Francisca de Barros Barbosa

Francisca Pinheiro

António Pereira Senhor do 2.º Morgado

N

Francisco Pereira, sucessor, c. c. Maria Fagundes

Lopo Pereira c.c. Juliana Barbosa, filha de Gomes Felgueiras, sr. dos quartos de Sá

António Pereira, sucessor c. .c. Perpétua Jácome Dá início à linha de Biscaínhos

António Pereira Felgueira c. c. Maria Velho

Francisco Pereira Pinto, sucessor na Casa

António Pereira Pinto, o “Gordo”

Violante Maria c. c. Dr. Tristão Pereira Pimenta

Maria Pereira Fagundes c. c. Fernando Pereira de Araújo

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Violante Pereira

O primogénito, Francisco Pereira Marramaque recebera, em 1600, o foro de fidalgo cavaleiro com a obrigatoriedade de se passar à Índia para efectivar a mercê650, o que satisfez nesse mesmo ano651. Por lá ficaria até à morte, prestando valorosos serviços na armada e na defesa das praças nos tempos dos vice-reis Aires de Saldanha e D. Martim Afonso de Castro, sendo de salientar que o seu desempenho na luta contra o turco no Estreito do Norte, em 1603, valeu-lhe ser armado cavaleiro652, bem como, três anos depois, por idênticos serviços, receber a mercê da donataria de Salsete de Baçaím653. Como do seu casamento com Cecília de Brito houve uma menina que faleceu antes da idade de casar, nomeou para seu herdeiro universal o irmão Diogo Pereira da Cunha, que veio a obter a remuneração dos serviços por carta testemunhável de Filipe II de 16 de Dezembro de 1618654. Diogo Pereira da Cunha seguiu os passos do primogénito. Em 1603, abalançou-se em direcção à Índia para efectivar a mercê do foro de fidalgo cavaleiro que lhe pertencia por seu pai655, tendo permanecido por lá até 1613, ano em regressou ao reino na nau do capitão D. João de Almeida. Três anos depois de chegar a Portugal, recebeu a mercê da capitania da fortaleza de Chaul, no dia 4 de Junho, com a obrigação de realizar a viagem por terra para a Índia e de passar pela corte de Madrid para recolher as cartas de Sua Majestade. O seu desempenho no Oriente português foi muito além da actividade militar, pois em 1619, vêmo-lo a expor ao monarca a sua insatisfação pela anexação do arcebispo de Goa e seus vigários aos mercadores gentios, brâmanes e baneanes, que considerava a causa de graves danos à coroa e à sua fazenda, colocando em causa a evangelização que vinha sendo efectuada no Oriente656. Tanto para Francisco Pereira Marramaque como para Diogo Pereira da Cunha, a ida à Índia significou uma viagem sem retorno, ao contrário das mercês recebidas. António Pereira Felgueira fôra, por isso, chamado à sucessão nas propriedades de seus pais, património que acumulou com os bens que lhe vieram pelo casamento realizado, em 1603, no arrabalde de São João da vila de Ponte de Lima657. E por essa união com Maria Velho, foi chamado para administrador do morgado de Serdedelo que 650 Ver: Certidão da Mercê que teve do Foro de Fidalgo o Sr. Francisco Pereira filho de Lopo Pereira e neto de António Pereira, sendo acrescentado a Fidalgo Cavaleiro. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1, 22, 2. 651 Ver: Serviços de Diogo Pereira da Cunha, e Francisco Pereira Marramaque pelos anos de 1600 em diante. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1, 16, 17, fl. 1 f. 652 Ver: IDEM, fl. 6 f.-6 v. 653 Ver: IDEM. 654 Ver: Serviços de Francisco Pereira Marramaque. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1, 20. 655 Ver: Certidões tiradas da Secretaria das Mercês, por onde constam algumas das que os Senhores Reis fizeram a Senhores da Casa. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1, 17, 1. 656 Ver: Serviços de Diogo Pereira da Cunha. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1, 21, 1, fl. 1 f.-3 v. 657 Ver: Vínculo instituído pelo Sr. António Anes. Libelo que deu Manuel Pereira de Castro contra a Casa de Sá, para reivindicar este Vínculo. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 3, 101, 1.

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o sogro António Anes tinha instituído com a obrigação de uma missa semanal na Misericórdia de Ponte de Lima. Todavia, a escassez dos frutos advindos desse instituto levou o casal a realizar uma escritura de subrogação pela qual vinculavam à obrigação das missas impostas por António Anes, bens sitos dentro da quinta da Lage em Sá, em detrimento dos de Serdedelo658. Esta simples permuta levantará questões melindrosas na família, mais de cem anos depois, como veremos. Portanto, para além do património fundiário que Maria Pereira Fagundes, neta de António Felgueira, trazia em dote, era inegável o dimensão do capital simbólico que ofereceria ao seu marido. Na escritura de casamento constava que não procriando filhos de entre ambos, cada um sairia com os bens que tivesse levado para o casal ficando livres de comunicação pela sociedade conjugal e que outrossim seria a dita mulher usufructuária do terço dos bens livres pertencentes [ao marido]659.

A situação não tardaria a mudar. Fernando Pereira de Araújo de Azevedo estabelece-se, então, na quinta da Lage, na freguesia de Santa Maria de Sá, e o processo de mudança de casa é um marco importante na evolução estrutural da família sendo claramente perceptível na mudança do brasão de armas dos Araújos, que antes traziam as armas dos Araújos, dos Costa, dos Azevedo e dos Pimentas660 e que, duas gerações depois, o morgado António Pereira Pinto de Araújo de Azevedo Fagundes, usará o brasão esquartelado com os apelidos Pereira, Pinto, Araújo e Azevedo, que seu filho o conde da Barca projectaria ad eternum nas àguas-fortes gravadas pelo célebre mestre florentino Francesco Bartolozzi. Como, porém, Fernando Pereira de Araújo não deixava sucessão legítima, o morgado do Sobreiro, segundo os pressupostos jurídicos que nortearam a sua constituição, passaria para seu irmão António de Araújo de Azevedo, tenente-general de infantaria, que desde 1673 vivia na quinta da Prova, em Ponte da Barca, fruto das partilhas amigáveis que ambos tinham realizado661. Em 1708, Fernando e sua mulher Maria Fagundes, impossibilitados que estavam de legar descendência, elaboraram uma 658

Ver: Vínculo instituído pelo Sr. António Anes. Libelo que deu Manuel Pereira de Castro contra a Caza de Sá, para reivindicar este Vínculo. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 3, 101, 3. 659 Ver: Alegação para a Causa de Alimentos que movia uma bastarda da Casa, chamada Isabel Maria Pereira. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1, 9, fl. 1 f. 660 Ver: Testamento do Sr. Fernando Pereira de Araújo de Azevedo morador na Caza de Sá. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 3, 99, fl. 8. 661 Ver: Papeis da Família. Querendo o Sr. Fernando Pereira de Araújo entrar na administração dos bens de sua mãe a senhora Catarina Pereira de Araújo, opuseram-se os senhores António de Araújo de Azevedo e Francisco Pinto Barbosa. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 2, 39.

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convenção destinada a assegurar a sucessão na propriedade familiar. De todo este processo dá relevante notícia o testamento de Fernando, o qual pode ser considerado um caso paradigmático de uma família nobre de província uma vez que está centrado em dois vectores: a demonstração do viver “à lei da nobreza”662 e o estabelecimento de normas rígidas tendentes a perpetuar a casa, bem material e simbólico revelador da notoriedade da família. Para além da distribuição de esmolas pelos caseiros, pobres e confrarias locais, e do estabelecimento de sufrágios por seu almas e pelas de seus pais, Fernando elegeu para sepultura a capela-mor de São Julião de Moreira, devendo o seu corpo ser amortalhado na túnica de São Francisco por ser irmão terceiro da mesma ordem. A questão do morgado antigo de Santo António do Sobreiro, em Aboím das Choças, é tratada com um excepcional rigor, visto que o testador lega ao seu sucessor o vínculo na exacta medida em que o mesmo tinha sido instituído e com os acrescentamentos fundiários feitos por si e por seu pai (ver Quadro 4). Ainda assim, tendo em conta a espoliação sofrida durante a administração de sua mãe, o testador ordena que se devem fazer e findar as partilhas dos bens que ficarão de nossos pays e avós e os coherdeiros destas partilhas devem repor ao monte todos os bens que tem levantado do ditto monte para serem avaliados [de novo]663.

Estavam, neste caso, as fazendas que compuseram o dote de sua irmã Maria, bem como o dinheiro para as galas e para o vestido de casamento, porque ambos resultaram da venda de propriedades do avô vigário de Cabana Maior; as casas de Vilar de Mouros que Catarina Pereira vendeu em barato preço; as rendas arrecadadas em 1658 e a totalidade dos frutos arrecadados ilegitimamente durante nove anos em que administrou o vínculo; o dinheiro gasto a armar António de Araújo como soldado de cavalo no tempo das guerras passadas, no tempo em que foi servir na província de Trás-os-Montes e o dinheiro gasto para o aparelhar para seguir viagem para a Ilha Terceira, que não chegou a efectuar; os bens que seu irmão António de Araújo retirou dos bens do pai João de Araújo sitos na Vila da Barca, que pertenceram a Fernão Velho

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Segundo Joaquim Romero Magalhães viver à lei da nobreza, neste contexto, significava possuir criados e armas, andar a cavalo, não trabalhar com as mãos, nem possuir antepassados com ofícios mecânicos. Ver: MAGALHÃES, Joaquim Romero – ob. cit., p. 69. 663 Ver: Testamento do Sr. Fernando Pereira de Araújo de Azevedo morador na Casa de Sá. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 3, 99, fl. 6 v.

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e a Ana Gomes Pimenta, tal como outras propriedades que o mesmo António vendeu664; os justos valores que António recebia indevidamente do arrendamento dos moinhos da freguesia de Vade, bem como os 7 mil cruzados que retirou dos bens de Cabana Maior, Grade, Vade, São Jorge e vila da Barca, que tinham ficado fora do inventário de Catarina Pereira. Por outro lado, no inventário de António Pereira, vigário de Cabana Maior, constava uma cadeia de ouro que tinha de peso cento e doze mil e novecentos reis e que se perdeu, em Fevereiro de 1659, quando o exército castelhano entrou em Monção, pois Catarina Pereira tinha emprestado a seu primo Jácome Cassão de Brito para ser empenhada no sentido de permitir a entrada de suas primas no convento de São Bento daquela localidade. Apesar das tentativas de Fernando, a cadeia de ouro não foi encontrada, mas o facto de ter gasto mais de 70 mil cruzados na reedificação das casas do Sobreiro para se não perder a memoria do instituidor que fez o ditto vinculo para conservação da sua nobreza e familia libertavam-no dessa obrigação de reposição665. Finalmente a entrada do sucessor na posse do vínculo deveria ser regulamentada por uma escritura pública no prazo máximo de um ano, onde deveria constar o compromisso de cumprir os legados do pai e as obrigações impostas pela legítima de sua irmã Ana. O segundo momento significativo deste testamento diz respeito à instituição de um novo vínculo em Santa Eulália de Gondoriz, em Arcos de Valdevez, nomeando para primeiro administrador o filho que houvera de Maria de Brito Barreiros, da freguesia de Andiviso, Tristão Pereira Pimenta de Araújo de Azevedo, agora legitimado pelo monarca e por Sua Santidade666. Também aqui devia o sucessor elaborar escritura pública de posse, tal como os seus sucessores. Para além desta partilha, deveriam convergir para o novo vínculo, que agora intituía, em Gondoriz, idêntica quantia dos bens que vinculou ao Sobreiro para cumprir o desejo de seu pai, que vinculou o terço dos seus bens ao Sobreiro; a legítima de sua irmã Ana de São Joaquim que lhe doou antes de professar em troca de uma pensão vitalícia de dez mil réis anuais. O reforço patrimonial futuro deste novo vínculo não foi descurado, pois o testador impôs ao herdeiro, não só, a faculdade de permutar bens em benefício do 664

Ver: IDEM, fl. 8 v. Ver: IDEM, fl. 7 f. 666 Ver: Legitimação Régia e Pontifícia do Sr. Tristão Pereira Pimenta de Araújo. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 3, 84. 665

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morgadio, com obrigação de elaborar sempre escrituras públicas, como também a obrigação de todos os sucessores acrescentarem e comprarem bens de raiz de campos que tenham àgua de regar e limar que bem valha 10 mil réis pelo menos uma vez na vida. E na impossbilidade de se cumprir tal desígnio mandava e declarava que os ditos bens deste morgado se ponhão todos em depósito e sequestro até ue do seu rendimento se faça o dinheiro que bvaste para comprar a dita fazenda, ou no caso de não haver bons campos para adquirir, que o morgado colocasse 250 mil réis a juro até se achar boas propriedades667. Instituindo o novo morgadio para conservação de sua família a sucessão na administração, depois de Tristão, far-se-ia pelo filho primogénito varão, com exclusão de eclesiásticos e varões que casem com mulher de conhecida raça cristã-nova e no caso de não haver varão, deveria ser escolhida a fêmea mais capaz. O sucessor deveria usar sobrenome Pereira ou Araújo ou Azevedo668. Em relação aos bens não vinculados, Fernando deixava a seu filho o prazo do Casal da Porta, junto às casas do Outeiro, o prazo do campo dos Vacelos, em Gondoriz, o prazo do seu terço das veigas de Sá e o prazo de São Pedro de Vade, em Ponte da Barca, que fora sucessivamente do Bispo de Angra, D. João Pimenta de Abreu, de Fernão Velho e de João de Araújo de Azevedo. Refira-se que o testamento de Fernando Pereira desencadeou intensas disputas entre o sucessor no morgado do Sobreiro, que deu origem aos Araújos da Prova, e o filho Tristão669, que se prolongarão até 1753. Por seu lado, Maria Pereira Fagundes consentiu na definição de um contrato de casamento entre Violante Pereira Pinto, sua prima, e Tristão para que eles desposados e os filhos que de entre ambos tiverem deste legítimo matrimónio sejam senhores deste morgado e da herança670. Em 21 de Abril desse mesmo ano, Maria Fagundes realizou uma escritura de dote a sua prima segunda Violante Maria Pereira Pinto Barros Barbosa, nomeando-a sucessora no novo vínculo que agora instituía em Sá sem a obrigatoriedade de comunicar os frutos e rendimentos do vínculo à pessoa que com ela casasse. Por outro lado, dotava igualmente à referida Violante, e desta feita ao seu marido, os

667 Ver: Testamento do Sr. Fernando Pereira de Araújo de Azevedo morador na Casa de Sá. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 3, 99. 668 Ver: IDEM, fls. 12 v. - 13 669 Ver: Carta de segurança passada a favor do senhor Tristão Pereira Pimenta de Araújo e de seus procuradores e criados, contra o senhor António de Araújo e seus filhos (…). ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1, 46. 670 Ver: Testamento do Sr. Fernando Pereira de Araújo de Azevedo morador na Casa de Sá. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 3, 99, fl. 12.

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serviços prestados na Índia por Diogo Pereira da Cunha, fidalgo da Casa Real, e seus irmãos Francisco Pereira Marramaque e Lopo Pereira, tios da dotadora671. Tristão e Violante casaram a 26 de Agosto de 1708 na Igreja Matriz de Sá672, e a sua geração seria a herdeira do património formado pelos vínculos do Outeiro e de Sá. Violante Maria Pereira Pinto Barbosa de Barros Fagundes era filha herdeira do Mestre de Campo João Pereira Pinto e de sua segunda mulher Francisca de Barros Barbosa, procedente da casa da Carcaveira, moradores na sua quinta de Nelas, na freguesia de Moreira do Lima (ver Quadro 3). João Pereira Pinto, moço fidalgo da Casa Real, era filho do abade de Moreira do Lima, Francisco Pereira, e bisneto de António Pereira, senhor do segundo morgado de Bertiandos, voltado a poente com a torre, que seguira carreira eclesiática tendo sido abade de Santa Maria de Cunha, Gondarém, Mentrestido, Sá e São Tomé da Correlhã. Depois do concílio tridentino, este António Pereira secularizou-se. O casamento com os Pereiras Pintos em duas gerações consecutivas marcou definitivamente os Araújos de Azevedo. Ainda antes de suceder no vínculo, Tristão tinha seguido os estudos de Cânones em Coimbra tendo obtido, em 1704, o alvará de quatro meses de licença para realizar “Actos Grandes” na sua Faculdade673. A partir daí, abraçou a carreira das leis obtendo grande reconhecimento674 nos desempenhos de cargos como o de juiz de fora e dos órfãos de Melgaço675, juiz de fora de Vila Nova de Cerveira com predicamento de cabeça de comarca676, juiz dos órfãos da cidade do Porto e provedor da comarca de Guimarães677. Mas, o doutor Tristão Pereira Pimenta não descurou a administração do vínculo pois acrescentou diversas propriedades e dinamizou o vínculo com a obtenção do “privilégio do cutelo” passado pelo Senado da Câmara do Porto, o que lhe permitiu vender o vinho produzido nas propriedade próximas ao Rio Lima678. Requereu a 671 Ver: Escritura de dote de casamento de D. Maria Pereira Fagundes a sua prima Violante Maria Pereira Pinto. ADB/UM – Registo geral, livro n.º 43, fls. 302 f. – 304 v. 672 Ver: Baptismos, Recebimentos e Óbitos de Senhores da Família. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1, 10, 45. 673 Ver: Alvará de quatro meses de mercê concedidos ao Sr. Tristão Pereira Pimenta, Estudante de Cânones na Universidade de Coimbra, que pretendia fazer Actos Grandes, na sua Faculdade. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 2, 43. 674 Segundo Joana Estorninho de Almeida, o processo de centralização do direito na regularização da ordem social, tornava a jurisprudência um conhecimento de grande valia social. Em causa estava a importância do saber jurídico para o governo da república. Ver: ALMEIDA, Joana Estorinho de - A forja dos homens : estudos jurídicos e lugares de poder no séc. XVII, Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2004, p. 49 e segs. 675 Ver: Cartas de Juiz de Fora de Melgaço, e Juiz de Fora de Vila Nova de Cerveira, lugares que serviu o Sr. Tristão Pereira Pimenta de Araújo. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 3, 81, 2. 676 Ver: Serviços do Sr. Tristão Pereira Pimenta de Araújo nos Lugares de Letras. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 2, 61, fls. 43 f. – 44 v. 677 Ver: Alvará do Cargo de Provedor da Comarca de Guimarães, de que El-Rei fez mercê ao Sr. Tristão Pereira Pimenta. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 2, 60. 678 Ver: Privilégio de Cutello passado pela Camara do Porto a favor do Sr. Tristão Pereira Pimenta, sendo Juiz dos Orfãos na mesma cidade pelo qual ficou sendo reputado como criador de vnhos, para poder vender as 25 pipas, que importava para aquela Cidade, sem pagar direitos alguns, e por mais um real em quartilho. ADB/UM – SIFAA/SSC. 08.01/ SR/CARTÓRIO/DOC. 2, 56.

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remuneração de serviços militares de seu tio materno, António Barreiros Galvão, e promoveu uma primeira reorganização do cartório da Casa, através da elaboração de genealogias, nas quais pretendia demonstrar a antiguidade da família como manter um instrumento actualizado que lhe permitisse gerir a documentação existente na Casa de Sá. Tristão Pereira Pimenta de Araújo e sua mulher Violante Maria Pereira Pinto de Barros Barbosa tiveram quatro filhos: António, o primogénito e sucessor na Casa de Sá e no Paço do Outeiro, António Fernando, que seguiria a carreira eclesiástica, António Luís, que seguiria a carreira das Armas, e Antónia Ventura. O fervor religioso da família é bem patente no facto dos três filhos possuirem ordens menores e todos eles, em 1730, se acharem fixados a uma Igreja679, mas deve aqui ser salientado o ambiente cultural que se vivia em Sá conforme indicia a livraria de Tristão Pereira que, anos mais tarde, seria repartida pelos seus três filhos varões680. Depois da morte de Tristão, Violante Maria administrará o morgado de Sá em conjunto com o filho primogénito António Fagundes. É durante este tempo que alcançam uma provisão do Arcebispo de Braga, D. José de Bragança, para colocar confessionário na capela com invocação de Nossa Senhora do Rosário681, e que a casa ficaria definitivamente na posse da família. Em 1731, Manuel Pereira de Castro, vereador da Câmara de Ponte de Lima, e sua mulher Ventura de Melo Pereira moveram um libelo contra Violante Maria reivindicando os seus direitos sobre bens existentes dentro da quinta da Lage em Sá. Em causa estava o morgado de Serdedelo instituído na centúria anterior por António Anes para perpetuar a sua família. Como Maria Pereira Fagundes não deixara geração, Manuel Pereira de Castro, seu primo, vem reivindicar a sucessão no vínculo e, como tal, o direito a bens sitos dentro da quinta da Lage que estavam obrigados aos sufrágios do instituidor682. O processo prolongou-se por vários anos e só a 10 de Janeiro de 1747, Violante Maria e seu filho António Fagundes elaboraram uma escritura de obrigação, pela qual pagaram 576$400 réis pelos bens sitos dentro da quinta da Lage e, em 28 de

679

Ver: Papeis Eclesiásticos, e Patrimoniais do Sr. António Pereira Pinto. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 2, 57, 4 Ver: IDEM. 681 Ver: Licença do Sr. Arcebispo Primaz para haver Confessionário na Capela da Casa de Sá. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 2, 65, fl. 6 f. 682 Ver: Vínculo instituído pelo Sr. António Anes. Libelo que deu Manuel Pereira de Castro contra a Casa de Sá, para reivindicar este vínculo. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 3, 101, 1. 680

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Junho de 1741, subrogaram o campo do Jardim, na freguesia de Serdedelo, pela casa sobradada de Sá e a fazenda circundante, livrando-se assim da perda da casa683. Regulamentada a posse da quinta da Lage, também a breve trecho seriam resolvidos os diferendos entre os Araújo da Prova e os Araújos de Sá. O casamento de António Pereira Pinto de Araújo de Azevedo Fagundes com sua prima Marquesa Francisca, senhora da quinta da Prova e do morgado do Sobreiro, veio permitir não só a anulação das disputas pelas propriedades, como veio, de facto, permitir a concentração partimonial e conceder à família uma maior expressão social. Em 6 de Agosto de 1752, casavam na capela de Nossa Senhora do Rosário da quinta da Lage, em Sá, com sentença de dispensação apostólica (…) por serem parentes no 3.º grau de consanguinidade684. O ramo dos Araújos da Prova tinha sido originado pelas partilhas de 1673685 e pela sucessão no vínculo do Sobreiro em 1708 (ver Quadro 4). O filho segundo de João de Araújo, António de Araújo de Azevedo vivia na quinta da Prova, freguesia de Paçô, em Ponte da Barca. Era familiar do Santo Ofício, capitão de ordenanças, um dos maiores homens do seu tempo em andar a cavalo686, que prestou valorosos serviços nas guerras da Restauração, nomeadamente em incursões na Galiza. Os proventos de sua casa foram providenciados, essencialmente, pela remuneração de serviços prestados durante as Guerras da Restauração. Primeiro, ainda antes de casar, sua mãe e irmãos, doaram-lhe os serviços e as perdas que o pai João de Araújo de Azevedo e o avô Fernão Velho de Araújo tinham experimentado durante as invasões dos exército castelhano687, bem como, seu primo Jácome Cassão de Brito e sua mulher Maria de Azevedo, da quinta da Costa, em Arcos de Valdevez688. Já depois do casamento com Luísa Maria Bandeira, realizado a 23 de Abril de 1679689, seria o sogro Manuel Fernandes Bandeira, vedor e contador geral de gente de guerra da província do Minho, a assegurar a angariação de remunerações régias que reverteram para António de Araújo. São de salientar, a pensão anual de 40 mil réis na

683

Ver: Composição que fizeram os Senhores de Sá com Manuel Pereira de Castro sobre o vínculo de Sá instituído pelo Sr. António Anes. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 3, 102, 1. 684 Ver: Sentença de dispensação apostólica para poderem casar a Sra. D. Marquesa Francisca de Araújo e Azevedo, filha legitima do Sr. Luís de Araújo de Azevedo, natural da freguesia de Recezinhos, bispado do Porto, com o Sr. António Pereira Pinto de Araújo de Azevedo da Casa de Sá. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 3, 67. 685 Ver: Papeis da família. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 2, 39. 686 Ver: GAIO, Manuel José da Costa Felgueiras – ob. cit., tomo IV, p. 550. 687 Ver: Certidão de Papeis que se acham na Secretaria das Mercês. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 2, 54, fl. 4f. 688 Ver: IDEM. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 2, 54, fl. 11 f. 689 Ver: Baptismos, recebimentos e óbitos de senhores da Família. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1, 10, 7.

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comenda de Alcácer do Sal, o ofício de escrivão da provedoria de Viana em 1679690, e o hábito da Ordem de Cristo com 20 mil réis de pensão efectiva691 e o foro de fidalgo da Casa Real, em 1692. Teve este casal nove filhos: João de Araújo que foi mestre de campo na Baía; Matias, sargento-mor de infantaria que foi assassinado em 1744 em Viana do Castelo; Luís de Araújo, o sucessor; Francisco, sargento-mor na Baía; João Velho, que foi para o Brasil com seu irmão; Sebastião, vigário geral de Viana, abade de Boivães e desembargador da Relação de Braga; D. Félix de Santo António, crúzio que depois foi abade em Arcos de Valdevez; Catarina; e Joana de Araújo, freira em São Bento de Viana. A ausência do primogénito e o assassinato do secundogénito levaram Luís de Araújo, fidalgo da Casa Real, cavaleiro da Ordem de Cristo, alferes de cavalaria em Trás-os-Montes, a suceder na quinta da Prova, no morgado do Sobreiro e no prazo de Cabana Maior. Casou, em primeiras núpcias, com Clara Luísa de Magalhães Pinto, natural de São Martinho de Recezinhos, em Penafiel, filha de Gonçalo de Magalhães Pinto e Filipa Abreu, de quem teve dois filhos varões que morreram meninos, Bernarda, que conheceu idêntico destino, e duas gémeas que sobreviveram: Marquesa Francsica e Maria Engrácia. Depois da morte de Clara Luísa, e sem ter conseguido descendência varonil, dever fundamental nas famílias nobres do tempo, Luís de Araújo casa segunda vez com D. Angelina, irmã de Gonçalo de Queirós, que faleceu sem deixar descendência e uma terceira vez, em 6 de Outubro de 1752, com a sua prima da casa de Sá, Antónia Ventura Pereira Pinto, para a qual obteve sentença de dispensação apostólica692. Este casamento duraria pouco tempo, e dele não haveria novamente geração, visto que, escassos quatro meses após a celebração, Luís de Araújo vem a morrer na Quinta da Prova693. A luta pela propriedade familiar era agora encabeçada por Antónia Ventura contra seus irmãos, pois Luís de Araújo, no testamento feito pelo próprio punho, nomeara a sua mulher por testamenteira e herdeira no terço dos bens livres. 690 Ver: Certidão das Mercês que houve dos senhores Reis deste Reino a Manuel Fernandes Bandeira, da Vila de Viana. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SUBSI – FEB/SSC. 01.02/DOC. 3, 108. 691 Ver: Informação dos Pais e Avós do Senhor António de Araújo de Azevedo, do termo dos Arcos, tirada por certidão do arquivo da Mesa da Consciência, onde estava a justificação que ele fez para tomar o hábito da Cavalaria de N. S. Jesus Cristo. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 2, 53; Certidão de Papeis que se acham na Secretaria das Mercês. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 2, 54, fl. 29 f. - 29 v. 692 Ver: Baptismos, Recebimentos e Óbitos de Senhores da Família. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1, 10, 21; Sentença de Dispensação Apostólica para casar o Sr. Luís de Araújo de Azevedo, da Freguesia de Santa Maria de Paçô, com a Sra. D. Antónia Ventura Pereira, da Caza e Freguesia de Sá, parentes no 2º e 3º grau de Consanguinidade. Ver: ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 3, 68, fl. 9 v. 693 Ver: Baptismos, Recebimentos e Óbitos de Senhores da Família. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1, 10, 6.

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Quadro 4 - Esquema genealógico dos Araújos de Azevedo

João de Araújo de Azevedo c. c. Catarina Pereira 1.º Senhores do Morgado do Sobreiro

Fernando P. A. Azevedo 2.º Senhor do Morgado do Sobreiro Institui Morgado do Outeiro

Vínculo do Sobreiro

António de Araújo de Azevedo 3.º Senhor do Morgado do Sobreiro

Ilegítima

Luís de Araújo de Azevedo 4.º Senhor do Morgado do Sobreiro

Tristão Pereira Pimenta de Araújo de Azevedo 1.º Senhor do Morgado do Outeiro

António Pereira Pinto de Araújo de Azevedo Fagundes 2.º Senhor do Morgado do Outeiro 2.º Senhor do Morgado de Sá

c.c.

António de Araújo de Azevedo, 1.º conde da Barca 3.º Senhor do Morgado de Sá 3.º Senhor do Morgado do Outeiro 6.º Senhor do Morgado do Sobreiro

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Marquesa Francisca de Araújo de Azevedo 5.º Senhora do Morgado do Sobreiro

O usufruto da quinta da Prova por Antónia Ventura parece ter durado algum tempo, pois no mesmo ano em que seu irmão toma posse do Sobreiro, ela alcança uma provisão régia de protecção contra as investida de António Fagundes e António Fernando, alegando que tinha sido impelida pelos irmãos a contrair casamento com Luís de Araújo, os quais negavam-lhe, agora, o direito de posse e usufruto. Assim, Antónia Ventura impôs-se como cabeça de casal na forma da lei de todos os bens alodiais e dos prazos conforme estava regulamentado pelos meios ordinários694. Juridicamente, Antónia Ventura estava obrigada a entregar a posse do Sobreiro a Marquesa Francisca, sua prima e filha do seu marido, mas manteve a Prova e a administração da capela de São Caetano, conforme é testemunhado pelo padre de Paçô Francisco de Sousa Barros no inquérito paroquial de 1758695. A ira de António Fagundes e de seu irmão António Fernando, abade de Santo Adrião de Vizela, ficou expressa nas margens da própria provisão régia em que foram rebatendo as acusações que lhe eram dirigidas pela irmã, acusando-a de ingratidão e de se ter esquecido que tinham sido eles quem lhe ofereceu o dote e financiaram os seus estudos no convento de Vale de Pereiras. O receio de ambos também era legítimo: se Antónia Ventura, na altura com 33 anos, voltasse a contrair matrimónio e dele houvesse geração, a quinta da Prova deixaria de estar na posse da família. Desta forma, o vínculo de Santo António do Sobreiro, em Aboim das Choças, voltava à descendência de Fernando Pereira de Araújo, visto que António Fagundes entrou na sua administração a 13 de Setembro de 1753696. Por aqui também se compreende a necessidade de António Fagundes em elaborar genealogias familiares para regulamentar a posse das propriedades e reivindicar serviços, de que se destacam o Título genealógicos de Araújos697, a Árvore de minha mulher por parte de sua mãe698 e os Fragmentos genealógicos do título de Araújo699. Por outro lado, os rendimentos da Casa de Sá, a partir de agora assim denominada para distinção entre as demais, parece ter sido providenciado, principalmente, pela exploração agrícola, mas também pelas inevitáveis mercês régias

694 Queixa que fez a Sra. D. Antónia Ventura a El-Rei contra seus irmãos. Ver: ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 3, 69. 695 Ver: As freguesias do distrito de Viana do Castelo nas “Memórias Paroquiais” de 1758. Alto Minho: Memória, História e Património, coord. de José Viriato Capela, Braga: Casa Museu de Monção/ U. M., 2005, p. 900. 696 Ver: Testamento do Sr. Fernando Pereira de Araújo de Azevedo morador na Caza de Sá. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 3, 99, fl. 5f. (nota lateral). 697 Ver: Título Genealógico de Araújos. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1, 1. 698 Ver: Apontamentos da Ascendência da Sra. D. Marquesa Francisca de Araújo Azevedo. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1, 6. 699 Ver: Fragmentos genealógicos do título de Araújos. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1, 4.

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como a moradia de mil réis proveniente do alvará de moço fidalgo700 e a carta de padrão de 12 mil réis pelos serviços de seu pai nos lugares de Letras701. O engrandecimento da casa foi providenciado também pelas recompensas dos serviços dos irmãos. Por exemplo, António Luís serviu nas armas mais de cinquenta anos até 1787, ano em que foi reformado no posto de brigadeiro com o soldo por inteiro702. Aliás, o prestígio que António Luís usufruía fica bem patente na carta que o visconde de Vila Nova de Cerveria lhe endereçou, nomeando-o para procurador do Príncipe Regente para assistir a um baptismo na província do Minho703. A doação dos seus serviços ao irmão primogénito permitiu entroncar na Casa a mercê do foro de fidalgo cavaleiro704 que, como se sabe, era perpetuado nas famílias pelos descendentes legítimos por varonia, arrecadando assim novas moradias que contribuem para o enriquecimento da casa mas dotando-a, também, de um poder simbólico, visto que a mercê de nomeação para o foro lançava a família na principal nobreza do reino depois dos títulos705. É curioso ver-se que a 1 de Janeiro de 1780, todos os filhos de António Fagundes receberam o alvará de fidalgos da Casa Real. Por outro lado, o abade António Fernando Pereira Pinto de Araújo estava também coberto de honrarias. Formado em Cânones pela Universidade de Coimbra, foi abade de Bertiandos, desembargador da relação de Braga706 e vigário geral de Vila Real707, para além do importante cargo de comissário do Santo Ofício708. Em 1770, já como fidalgo capelão da Casa Real e gentil-homem eclesiástico, recebeu o título de abade da igreja de Santo Adrião de Vizela709. Em 1780 doou duas tenças às suas sobrinhas sem estado. Importa, também, salientar que com António Fagundes residente em Sá, terão tido os seus irmãos António Fernando e António Luís uma importante colaboração na educação dos filhos do irmão primogénito, principalmente do futuro conde da Barca,

700

Ver: Alvará em que sua Majestade toma por seu Moço Fidalgo com 1000 reis de moradia por mês, e alqueire de cevada por dia ao Sr. António Pereira Pinto. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 2, 47. 701 Ver: Carta de padrão de 12 mil réis dada por D. João V a António Pereira Pinto. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 3, 106. 702 Ver: IDEM. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 3, 87, 3; doc. 3, 87, 4. 703 Ver: Aviso da Secretaria de Estado para o Sr. António Luiz Pereira Pinto assistir a um Baptismo como procurador do Príncipe Nosso Senhor. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 3, 88, 1. 704 Ver: Mercê do Foro de Fidalgo feita ao Sr. António Pinto de Araújo Azevedo. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 3, 86. 705 A respeito do foro de fidalgo de cavaleiro, seu conceito, mercê e enquadramento jurídico, ver, por exemplo, OLIVEIRA, Luís da Silva Pereira – Privilégios da Nobreza e Fidalguia de Portugal, Lisboa, Associação da Nobreza Histórica de Portugal, 2002, pp. 230-231. 706 Ver: Título Genealógico de Araújos. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1, 1, fl. 16 f. 707 Ver: Baptismos, Recebimentos e Óbitos de Senhores da Família. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1, 10, 40. 708 Ver: Fragmentos genealógicos do título de Araújos. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 1, 4, fls. 2 v. 709 Ver: Título de Abade de Santo Adrião de Vizela. ADB/SIFAA/SSC 08.01/SR/CARTÓRIO/DOC. 3, 85.

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natural sucessor nos vínculos e herdeiro de todo o capital simbólico dos Araújos de Azevedo da Casa de Sá.

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5. A PROPRIEDADE NO BRASIL À chegada ao Rio de Janeiro, António de Araújo adquiriu uma casa situada na Rua Passeio, onde instalou os bens trazidos de Portugal: a colecção mineralógica, o laboratório químico e os prelos. O rés-do-chão seria cedido à Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros, liderada por D. Rodrigo de Sousa Coutinho, para assegurar a entrada em funcionamento dos prelos da Impressão Régia criada pelo decreto de 13 de Maio de 1808710. No pavimento térreo do n.º 44 da rua do Passeio, imprimiu-se o primeiro trabalho intitulado Relação dos despachos publicados nesta corte […]711, e a partir de 10 de Setembro desse ano, a Gazeta do Rio de Janeiro712, primeiro periódico com tendência oficiosa no Brasil. Pedida a exoneração dos cargos públicos “executivos”713, António de Araújo mantém-se como Conselheiro de Estado, intervindo na governação pontualmente através da emissão de pareceres solicitados pelo Regente. Nos seis anos subsequentes manterá alguma ligação ao exercício do poder, mas será às actividades particulares que dará maior atenção. Entre as actividades de Araújo há a salientar a entrada em funcionamento do laboratório químico e diversas aquisições e arrendamentos de propriedades. Entre estas contam-se a tentativa de adquirir uma fazenda para instalar um engenho, o qual veio a funcionar regularmente nos finais de 1813, a exploração agrícola de uma fazenda no Rio de Janeiro, o arrendamento da chácara do Bom Retiro a partir de 1815, as tentativas de fundar uma fábrica de papel, a sociedade montanística com Guilherme, barão de Eschwege, e o interesse na máquina a vapor. A casa da Rua do Passeio será, simultaneamente, locus de recepção e locus de produção de toda a documentação referente à administração das propriedades de António de Araújo no Brasil.

710

Ver: História da tipografia no Brasil, São Paulo: Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand, 1979, p. 8. Ver: Relação dos despachos publicados na corte pelo expediente da secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros, e da Guerra no faustissimo dia dos annos de S.A.R. o Príncipe Regente Nosso Senhor e de todos os mais, que se tem expedido pela mesma Secretaria desde a feliz chegada de S. A. R. Aos Estados do Brasil até o dita dia, Rio de Janeiro, na Impressão Régia, 13 de Maio de 1808. 712 Ver: SILVA, Inocêncio da - Diccionario bibliographico portuguez (…), tomo XIX, Lisboa: Imprensa Nacional, MCMVIII, p. 286. 713 Ver: Decreto de exoneração de ministro e secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, solicitado por António de Araúo de Azevedo. Palácio do Rio de Janeiro, 1808. 03. 11. ANRJ, Secção Histórica, colecção 15, livro 1, fl. 1 v. 711

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5.1. SENHOR DO ENGENHO Poucos tempo após a chegada ao Rio de Janeiro, António de Araújo demonstra interesse em procurar algum terreno para implantar um empreendimento, conforme se depreende da carta que dirigiu ao Ouvidor de Macau, Miguel de Arriaga Brum da Silveira: No Brasil há imensos territórios não cultivados e que se podem cultivar com vantagem em diferentes géneros; eu meditei muito sobre a escolha e finalmente vim a escolher um sítio entre esta cidade e a Baía […] um magnífico terreno no Rio de […] que tem uma pequena vila na sua foz chamada S. V. de Porto Alegre, situada na Capitania de Porto Seguro, estou fazendo engenhos de serrar madeira para se mandar para lá, onde tenho abundante água para os estabelecer e, atendendo à muita quantidade que aqui se emprega no aumento da cidade, e aqui as madeiras do Brasil têm sempre reputação na Europa, espero tirar algum proveito naquela empresa […]714.

O momento era aliciante pois com a chegada do Príncipe Regente a questão das sesmarias é tratada dentro de um amplo projecto de incentivo à agricultura, conforme foi publicado no decreto de 25 de Novembro de 1808, reforçado pelo alvará de 25 de Janeiro do ano seguinte, que veio instituir em todas as vilas de Capitanias os cargos de juiz e piloto para a medição e demarcação das sesmarias715. O seu primeiro alvo foi a imponente fazenda que tinha pertencido ao arcediago António de Sequeira Quintal, situada em Guaraparim, na Capitania de Espírito Santo. A Capitania era um fruto apetecível, pois em Setembro de 1810 tinha findado a sua subordinação à da Baía, impondo-se como Capitania de pleno direito. A sua actividade económica conhecia tempos de grande prosperidade devido ao cultivo do café, do milho, do feijão, do bicho-da-seda e à produção de aguardente. Por outro lado, o Rio Doce, que recortava o território, começava a ganhar um grande significado pois para além de permitir o escoamento das produções, permitia também estabelecer a ligação com Minas Gerais. Não admira que nesse tempo se assistisse à colonização das suas margens716.

714

Ver: Minuta da carta de António de Araújo de Azevedo para Miguel de Arriaga Brum da Silveira, Rio de Janeiro, 1811.08.04 apud PINTASSILGO, Joaquim – ob cit., pp. 228 – 229. 715 Ver: LEONZO, Nanci – “A propriedade”, in: O império luso-brasileiro. 1750-1822, coord. de Maria Beatriz Nizza da Silva, Harold Johnson e Fréderic Mauro, vol. VIII, Lisboa: Editorial Estampa, 1986, pp. 67-68. 716 Ver: REIS, Arthur Cezar Ferreira – “Espírito Santo”, in: Dicionário de História de Portugal, dirigido por Joel Serrão, vol. II, Lisboa: Iniciativas Editoriais, 1965, pp. 107-108.

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António de Araújo lançou-se, então, no estudo da propriedade e das suas acessibilidades, recorrendo à sua livraria particular, de onde se destacam as memórias descritivas e os mapas geográficos produzidos por exploradores a soldo da coroa e até pelos governadores das Capitanias717. Por outro lado, recebia informações que constavam do inventário do arcediago realizado em Outubro de 1792. A fazenda ficava localizada a sul da cabeça de comarca, à distância de oito léguas, da parte do mar, principiando antes do rio Perocão e findando no sítio da Aldeia Velha da parte do sul com fundos para o sertão. A fazenda possuía dois engenhos, um do campo que utilizava a tracção animal, e outro chamado “novo” que aproveitava as àguas do rio, mas que não fazia tão bom açucar em virtude da proximidade da àgua do mar. Por outro lado, os pastos eram bons, possuía muita madeira incluindo bons matos para serem aproveitados para os engenhos. Não tinha gado porque os não criavam, mas dava todos os legumes do país. O preço rondava os 40 e tantos contos718. Em 1769, depois da morte do arcediago, a fazenda tinha sido incorporada na Fazenda Real, dado que o seu testamento tinha sido declarado nulo por ser contrário às leis do reino. Como não tinha herdeiros forçados, o sacerdote reivindicando ser homem de conhecida nobreza, instituíu por seu universal herdeiro o coração santíssimo de Nosso Senhor Jezus Christo para ser venerado para sempre nesta Igreja, que fiz nesta villa devendo a administração ficar a cargo do Bispo719. Ora, na prática, as suas disposições testamentárias indicavam a instituição de um vínculo, o que foi negado pela ouvidoria local. Como a fazenda pertencia aos bens próprios da Coroa, Araújo dirige-se também à Mesa da Consciência e Ordens solicitando informações720. Será à vista destas informações que Araújo, recorrendo ao seu estatuto de Conselheiro de Estado, vai elaborar um requerimento dirigido ao Príncipe Regente, manifestando o seu objectivo usufruir da fazenda, por aforamento ou arrendamento, no intuito de aumentar agricultura e do comércio. O estado da fazenda era deplorável, visto que o Estado não possuía meios para administrá-la convenientemente, porque depois 717

Ver. Memória sobre a navegação do Rio Doce e outros por Manuel Vieira de Albuquerque e Tovar. 1810. 07. 18, Rio de Janeiro. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/DOC. 38,7; Memoria dirigida sobre o Rio Doce dirigida ao conde de Linhares por Francisco Manuel da Cunha. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/DOC. 40,18. Memória sobre o rio Doce dedicada a Abntónio de Araújo de Azevedo por Francisco Manuel da Cunha. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/DOC. 40,17. 718 Ver: Nota sobre a localização da fazenda do arcediago. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/DOC. 45, 10. 719 Ver: Requerimento de António Joaquim Coelho Coutinho e do Padre Padre Domingos José da Silva e Sá de Jesus, presbítero secular, ambos residentes no Rio de Janeiro, sulicando a S. A. R. que lhes venda os bens do arcediago António de Sequeira Quintal. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/DOC. 45,9. 720 Ver: Nota da Mesa da Consciência e ordens para António de Araújo. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/DOC. 45,11.

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que o respectivo Ouvidor da comarca tomou posse destes bens por parte da Real Coroa passou a nomear administradores e desde então até agora tem sido administrador por conta da Real fazenda. A experiencia tem assaz provado e a razão o mostra que semelhante systema de administração em vez de produzir vantagens não produz ordinariamente nada senão depredações com atrazo e estrago da Agricultura. Assim socedo com as Fazendas assima referidas porqeu se achão em deploravel damnificação, e não rendem actualmente para a Fazenda Real mais do que quando muito trez ou quatro caixas de assucar por anno; apezar de se ter augmentado o numero de escravos ate 400, pouco mais ou menos […]721

Todavia, as informações que António de Araújo recolhia no terreno apontavam para um desfecho que lhe seria desfavorável. Em Julho de 1812, Francisco Àlvares de Matos Prego informava que o Padre Domingos José da Silva e Sá, como procurador de Geraldo Castelo Branco de Quadros e mais pessoas de Lisboa, tinha tomado posse dos bens do arcediago por ordem do ouvidor desta comarca722, notícia que seria confirmada em Março do ano seguinte723. A concorrência acabava por arrematar as fazendas por 800$000 réis a mais sobre o valor que forem constantemente estimadas724. Em Março de 1813, António de Araújo abdicava da fazenda do Arcediago Quintal, mas não do engenho. A fazenda da Ponte do Gentio (1813-1817) As suas atenções viraram-se então para a fazenda da Ponte do Gentio, onde procurará instalar um engenho de serrar madeiras nas cachoeiras do rio de Caravelas, projecto de que se vai ocupar entre 1811 e 1817. A denominação de Gentio ficava a dever-se ao facto de ser muito combatido de gentio conforme se lê nos autos de erecção e criação da vila de São Bernardo de Alcobaça, comarca de Porto Seguro725. A propriedade ficava situada na vila de Alcobaça, sobejamente conhecida pelas suas imponentes fazendas como pela

721

Ver: Requerimento de António de Araújo ao Príncipe Regente. [1812?]. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/DOC. 45,8. Ver: Carta de Francisco Álvares de Matos Prego a António de Araújo de Azevedo. 1812.07. 22. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/DOC. 45,12. 723 Ver: Carta de Filipe de Mesquita e Sousa para António de Araújo de Azevedo. 1813.03.06. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/DOC. 45,13. 724 Ver: Requerimento de António Joaquim Coelho Coutinho e do Padre Padre Domingos José da Silva e Sá de Jesus, presbítero secular, ambos residentes no Rio de Janeiro, sulicando a S. A. R. que lhes venda os bens do arcediago António de Sequeira Quintal. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/DOC. 45,9. 725 Ver: Autos de erecção e demarcação da nova vila de Alcobaça, na capitania de Porto Seguro. Arquivo Histórico Ultramarino, Colecção Castro e Almeida, doc. 8578, em . (consultado a 2007.08.10). 722

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proximidade com a vila de Caravelas, um dos principais portos de escoamento da produção de Minas Gerais. A dimensão da fazenda era de meia légua de frente e duas de fundo, ficando situada a dois dias de caminho (ida e volta) da sede da comarca726. Adquirida a fazenda em regime de sesmaria, em Junho de 1813, Araújo negociou um contrato com Lourenço Westin, para que este adquirisse as madeiras produzidas e preparadas na fazenda727 a troco do adiantamento de 4 mil cruzados para ajudar a edificar o moinho de serrar728. Para a concepção do projecto de construção do engenho, António de Araújo contratou, em Julho de 1813, Ernesto Kramer o qual deveria, depois, ficar encarregue da inspecção, administração e direcção dos cortes de madeira e dos mais trabalhos do dito engenho729. A troco de 900 réis por dia e de uma quinta parte da madeira serrada depois do engenho começar a trabalhar, o mestre carpinteiro deveria partir imediatamente para o local e possuir livro de inventário dos instrumentos, ferramentas, utensílios, escravos e gado que deverá ser remetido de seis em seis meses a Araújo, tal como livro de férias e despesas do engenho e um diário para lançar a madeira serrada do qual se extrairá uma conta mensal730. As instruções que Kramer levou eram claras: chegando a Caravelas, devia dirigir-se à presença do ouvidor para seguir as suas determinações e assim dar início ao estabelecimento com aquella brevidade e segurança possível se transportarão todas as peças do engenho de serrar para aquelle sítio logo que estiver prompto o assento e tilheiro para assim o fazer; porque desejo mais que nunca que tudo que o dito engenho principie a trabalhar, visto ter havido tantas cazualidades que tem empedido até agora esta vantagem731.

726 Ver: Nota sobre a conta da medição e demarcação da sesmaria da Ponte do Gentio, distrito da vila de São Bernardo de Alcobaça, comarca de Porto Seguro. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/DOC. 45, 14. 727 Ver: Nota de João António de Araújo de Azevedo referente ao contrato projectado entre o conde da Barca e Lourenço Westin. [1817 d.]. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.02/DOC. 45,25,1. 728 Ver: Carta de Lourenço Westin para António de Araújo de Azevedo, datada de Rio de Janeiro, 1813.05.01. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/DOC. 45,25,2. 729 Ver: Apontamento de João António sobre os contratos assinados com Ernesto Kramer e o oficial carpinteiro António Rodrigues. [1817 d.]. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.02/PROC. 45, 26 730 Ver: Condições estipuladas entre António de Araújo de Azevedo e o mestre Ernesto Kramer. Rio de Janeiro, 1813. 07.30. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/PROC. 45,26,1. 731 Ver: Instruções de António de Araújo de Azevedo para Ernesto Kramer. Rio de Janeiro, 1815.07.19. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/DOC. 45,26,3

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Com Kramer viajava um ajudante, o carpinteiro António Rodrigues, 5 escravos negros e seis chineses para trabalhar na agricultura, nomeadamente no cultivo da mandioca e da farinha. Por outro lado, a dinamização da fazenda da Ponte do Gentio passou também pela construção de uma estrada, ponto fulcral pois permitia ao proprietário valorizar as terras. Por isso, o proprietário da sesmaria era, regra geral, um homem poderoso, não pela vastidão da sua terra, mas pela capacidade de valorizá-la732. É sabido que o melhoramento das redes viárias no Brasil foi uma das prioridades do Príncipe Regente, que incentivou o empreendedorismo dos particulares. No imenso Brasil, a construção de estradas, principalmente da costa marítima em direcção ao sertão, facilitaria a circulação dos transportes permitindo uma melhor circulação de pessoas e um deslocamento das populações para ocuparem as províncias interiores e, por outro lado, possibilitaria também uma animação dos trabalhos de qualquer género de indústria. Foi esta a intenção manifestada por António de Araújo. Numa memória sobre a utilidade de se abrir estradas no Brasil, defendia que Executando-se a estrada se facilitará o transporte e a exportação de produtos da agricultura d’esta capital de milho, feijão, mandioca e carne de porco, do que tanto preciza depois do aumento da sua população; também por aquele lado se favorecerá o commercio [do] caffé, assucar, salitre e algodão. Este ultimo género he de boa qualidade nas Minas Novas; tem-se continuado a sua cultura nas margens de Gequitinhona e não se augmenta mais porque a distancia tanto para a Bahia como para o Rio de Janeiro passa de 200 léguas733.

Por esta declaração de intenções se denota uma perfeita simbiose entre o interesse do Regente (o interesse público) e o particular. A

concepção

da

ideia

passou

pela

troca

de

informações

com

o

capitão-engenheiro Guilherme Cristiano Feldner, que depois seria encarregue da abertura da estrada. Araújo concebeu, então, a ideia de que era necessário, entre outras coisas, criar uma divisão militar, liderada por um alferes e composta por 40 soldados dos quais metade guardaria o depósito de mantimentos e a outra acompanharia a pessoa que vai abrir a estrada e, finalmente, um botecudo que sirva de língua734. 732 Ver: FONSECA, Célia Freire A. – “Sesmarias no Brasil”, in: Dicionário de História de Portugal, dirigido por Joel Serrão, vol. III, Lisboa: Iniciativas Editoriais, 1965, pp. 847-848. 733 Ver: Memória sobre a utilidade de abrir estradas no Brasil. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/DOC. 45, 31. 734 Ver: Apontamento do que julgo necessário para se efectuar a abertura da estrada de Mucuri para Vendas Novas, [1812]. Ver: ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/DOC. 45, 32.

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Após cuidado estudo, na maior parte leituras de memórias de alguns exploradores, e sabendo que S. A. R. tinha projectado abrir três estradas para Minas Gerais (a de Ilhéus, de Gequitinhona e do Rio Doce), Araújo, na altura conselheiro de Estado, dirigiu um requerimento ao rei advogando que […] huma estrada do Rio Mucuri, na costa da Capitania de Porto Seguro para o centro da Província de Minas, com hum ramo dela dirigido a Lorena de Tocoios em Minas Novas, será muito mais certa e cómoda do que as outras projectadas, intenta abrir a dita estrada à sua custa, tanto por interesse público, como pelo seu particular, para que tomou huma sismaria na margem do dito rio de Mucuri, onde as terras virão por este meio a ter grande valor735.

Para iniciar a empresa, o requerente apenas solicitava da Coroa o empréstimo de vinte espingardas, dois morteiros, alguma pólvora e outras munições para a defesa contra o gentio que infesta os certoens por onde há de atravessar a expedição736. Por outro lado, a sua dedicação à mineralogia, vinha ao de cima ao sugerir a S. A. R. a utilidade de mandar acompanhar a expedição um mineralogista que ao mesmo tempo fosse examinando, se há signaes de aparecer productos no Reino Mineral que possa augmentar a riqueza da Real Coroa e do Estado. Assim, António de Araújo recebia frequentemente e em simultâneo vasta documentação do administrador do engenho, Ernesto Kramer, e do responsável pela abertura da estrada o capitão-engenheiro Guilherme Feldner (ver Quadro 5). A partir de Julho 1814 será o administrador de um e de outro empreendimento, o Ouvidor da comarca José Marcelino da Cunha, situação que se manterá até 1817. Depois da morte do conde da Barca, o ouvidor entregou a fazenda a Isabel Joaquina da Purificação737. Refira-se que, no final de 1816, quando o Príncipe Maximiliano de Neuwied realizou a sua viagem filosófica pelo Brasil, teve oportunidade de visitar e descrever a fazenda da Ponte do Gentio a convite de António de Araújo de Azevedo que fôra o seu anfitrião, conforme tinha sido solicitado por José Joaquim Lobo da Silveira, embaixador de Portugal em Berlim e ministro plenipotenciário no Congresso de Viena738. 735

Ver: Requerimento de António de Araújo de Azevedo dirigido ao Príncipe Regente, [1812]. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/DOC. 45,30. 736 Ver: IDEM. 737 Ver: Carta de Isabel Joaquina da Purificação para João António de Araújo de Azevedo, datada de Fazenda da Ponte do Gentio, 1819. 07. 20. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.02/DOC. 45,24,2. 738 Ver: Carta de José Joaquim Lobo da Silveira para António de Araújo de Azevedo, datada de Viena, 1815. 01. 25. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/CR/DOC. 13,10,19.

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Quadro 5 - Administração da fazenda da Ponte do Gentio (1813-1817)

Guilherme, barão de Eschwege

António de Araújo Proprietário

SR/Corresp.

Felisberto Caldeira Brandt Pontes

Domingos Borges de Barros

SR/Corresp. SR/Recibos SR/Planos SR/Memórias

Ernesto Kramer

SR/Corresp. SR/Recibos SR/Facturas SR/Memórias

José Marcelino da Cunha

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SR/Corresp. SR/Recibos SR/Facturas SR/Memórias

Guilherme Feldner

5.2. A FAZENDA DO PORTO DA ESTRELA (1815) No arquivo do conde da Barca identificamos ainda certa documentação maioritariamente de 1815, relacionada com a administração da fazenda do Porto da Estrela, situada no Rio de Janeiro. A administração da fazenda principia em António de Araújo que encarregava verbalmente Manuel Anastácio Xavier de Brito, oficial maior da Secretaria de Estado da Marinha e dos Domínios Ultramarinos, de remeter, por escrito, as suas ordens para o administrador da fazenda e para o almoxarife739 (ver quadro VI). Ao administrador competia sobretudo tratar das vendas da fazenda, nomeadamente o capim que era vendido às reais cavalheirices740. Nos primeiros seis meses de 1815, parecem ter sido administradores, primeiro, o sargento Lúcio José Machado Rego741, e a partir de 1 de Agosto, Bento José Veloso742. Ao que tudo indica a mudança ficou a dever-se ao subaproveitamento das potencialidades da fazenda. 5.3. A CHÁCARA DO BOM RETIRO (1815-1817) Em Maio de 1815, António de Araújo arrendou a chácara do Bom Retiro, situada no Rio de Janeiro, onde, aliás, viria a falecer. As chácaras eram pequenas propriedades rurais com casas de habitação que passaram a ser utilizadas pelas famílias abastadas da corte para apanharem ares do campo aos fins-de-semana. Como se percebe, as motivações, desta feita, eram diferentes. Araújo estava doente e tinha-lhe sido recomendado que passasse uns tempos no campo. A 6 de Maio de 1815 pagou pela posse da chácara, escravos, trastes e benfeitorias 4.991$320 réis conforme se vê na relação passada por Jorge March, procurador de Gustavo Kieckhoefer. O arrendamento duraria até ao falecimento de António de Araújo em Junho de 1817.

739

Ver: Processo das despesas feitas com a casa e fazenda de António de Araújo de Azevedo no Rio de Janeiro. 1815. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/DOC. 45,4. 740 Ver: Relação de Manuel Anastácio Xavier de Brito referente à conta do capim que tem vindo da Fazenda de S. Ex. o conde da Braça para a repartição das Reais Cavalheirices e da despesa feita pelo administrador da dita fazenda nos meses que decorreram desde o 1.º de Abril até 31 de Julho de 1815. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/DOC. 45,28,3 741 Ver: Processo das despesas feitas com a casa e fazenda de António de Araújo de Azevedo no Rio de Janeiro. 1815. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/DOC. 45,4 742 Ver: Relação de Manuel Anastácio Xavier de Brito relativa ao produto do capim e fazenda do Illmo. e Exmo. Senhor conde da Barca desde 0 1.º de Abril até ao fim de 1815. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/DOC. 45, 28, 1

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Quadro 6 - Administração da fazenda do Porto da Estrela (1815)

António de Araújo de Azevedo Ordem verbal

Manuel Anastácio Xavier de Brito SR/Ordens SR/Contas SR/Recibos SR/Receitas SR/Corresp.

SR/Ordens

Administradores 1.º Lúcio José Machado Rego 2.º Bento José Veloso

Almoxarife

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5.4. TESTAMENTEIRO DE POMBAL A 24 de Junho de 1812, falecia no Rio de Janeiro o conselheiro de Estado Henrique José de Carvalho e Melo, 2.º marquês de Pombal743. No seu testamento terá incumbido António de Araújo de fazer cumprir as suas últimas vontades , nomeando-o por testamenteiro. O desempenho desta tarefa motivará a produção de vária documentação que, anos mais tarde, será cotejada por João António de Araújo à procura dos valores pagos por seu irmão744. A escolha de Araújo encontra-se patente na carta escrita por D. Maria Leonor de Carvalho e Melo: [recebi] a triste notícia da falta de meu Pai, o que V. Exa. poderá supor qual seria a minha aflição, mas esta mais suavizada quando vi que ele se tinha lembrado do seu maior amigo para ficar fazendo para comigo as vezes de Pai745

O facto de ser testamenteiro de Pombal motivou a emergência de um eixo de comunicação composto por si, pela filha única e herdeira D. Maria Leonor de Carvalho e Melo, casada com o governador de Rio Grande do Norte, pelo visconde de Mesquitela, administrador da Casa Pombal em Lisboa, e por vários negociantes credores de Pombal. O elevado peso das pensões que Pombal deixara fez com D. Leonor se declarasse herdeira a benefício de inventário, como sugerira Araújo, remetendo uma procuração geral e o inevitável pedido de protecção para a obtenção de um despcaho pecuniário746. Na verdade, a tarefa de António de Araújo seria árdua, pois teria de incidir também sobre as propriedades e as dívidas alimentadas constantemente, tanto no Rio de Janeiro como em Portugal. E nesse sentido escreve ao visconde de Mesquitela, armador-mór, administrador da Casa de Pombal desde 1808 pondo-o ao corerente da situação. Na volta do correio, mais concretamente em Setembro de 1812, Mesquitela acusava a recepção da procuração geral, mas recusava ser testamenteiro invocando para isso, motivos pessoais (pela complexidade da empresa), motivos de família (por estar intimamente ligado com o marques que o tinha constituido Administrador da Casa, com

743 Sobre a descendência e a sucessão do 2.º marquês de Pombal ver: CANEDO, Fernando de Castro da Silva – A descendência portuguesa de el-rei D. João II, Braga: Fernando Santos e Rodrigo Faria de Castro, 2ª Edição, 1993, vol. III, p. 93; COSTA, Luís Moreira de Sá e – A descendência do marquês de Pombal, Porto, 1937. 744 Ver: Rol da dívida que se diz dever-se ao mercador. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/CR/DOC.15,3. 745 Ver: Carta de D. Maria Leonor de Carvalho e Melo para António de Araújo de Azevedo, datada de cidade de Natal, 1812. 11. 01. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/CR/DOC.15,1. 746 Ver: IDEM.

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a sua herdeira e com o sucessor na Casa que há-de contestar com a testamentaria sobre muitas coisas) e, ainda, por motivos puramente morais (gravosos para a sua consciência moral e política, nascidos da íntima convicção da inutilidade dos esforços singulares a benefício da testamentaria e por dificuldades escabrosas que se haveriam de surgir em vários negócios e que implicariam a necessidade de medidas violentas, como o recurso judicial). Por isso, sugeriu a António de Araújo que obtivesse um decreto de estabelecimento de uma Junta de Administração testamentária composta por Juiz privativo, escrivão, tesoureiro, contador, curador letrado, e procurador, e com amplos poderes não só de ajustar contas passadas e as que presentemente estão ou estiverem por ajustar747.

Segundo o mesmo, a junta deveria tratar748: - do apuramento das contas do administrador geral da Casa de Pombal até ao momento do falecimento do marquês; - da liquidação das contas na parte final da administração de Mesquitela até ao momento em que toma posse o conde da Redinha, sucessor na Casa; - do inventário da maltratada livraria existente no Palácio das Janelas Verdes, tarefa que exigia “homens inteligentes” para fazerem o catálogo geral e para proceder à avaliação dos livros; bem como a necessidade de alugar umas casas para estender os livros no caso do Enviado de Inglaterra, Charles Stuart, permitir que os mesmos sejam retirados das Janelas Verdes; - do exame escrupuloso e jurídico da existência ou não de bens livres, o que era uma “espinhosa tarefa” que devia ser dirigida por um curador letrado em parceria com o juiz privativo e com um procurador inteligente; - da demonstração da insuficiência dos rendimentos da comenda de S. Miguel de Três Minas para o pagamento das dívidas; - das vendas de bens inventariados, pois como o imediato sucessor não está obrigado a pagar as dívidas, há necessidade de vender os bems da mesma herança (que poucos são) para o dito pagamento. 747

Ver: Carta do visconde de Mesquitela para António de Araújo de Azevedo, datada de Quinta da Mutela, 1812. 09. 12. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/CR/DOC. 8,24,1. 748 Ver: Nota do visconde de Mesquitela. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/CR/DOC. 8,24,1.1.

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O assunto era de tal forma complexo que o visconde Armador-mor desabafava com António de Araújo: Considere V. Ex.ª o estado deste negócio como elle he, e compare-o com aquelle que se figurou na imaginação do Tio Pombal quando fez as suas dispoziçoens749.

Tudo isto deveria ser precedido de inventários exactos, de avaliações legais e de leilões judiciais em conformidade da lei. A sucessão na Casa veio a recair no irmão do 2.º marquês de Pombal, José Francisco Carvalho Melo e Daun, 1.º conde da Redinha e futuro 3.º conde de Oeiras e 3.º marquês de Pombal, que tinha casado, em primeiras núpcias, com D. Isabel Juliana de Sousa Monteiro Paim, o bichinho de conta, e, em segundas núpcias, com D. Francisca Maria da Silveira Lorena.

749 Ver: Carta do visconde de Mesquitela para António de Araújo, datada de Quinta de Mutela, 1812. 10. 08. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/CR/DOC. 8,24,2.

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CAP. 3 – O HOMEM PÚBLICO ILUSTRADO (1787-1817) 1. O DIPLOMATA 1.1. BREVE EVOLUÇÃO DA DIPLOMACIA PORTUGUESA A evolução da diplomacia pode ser dividida em dois momentos momentos: o primeiro, desde os finais do século XV até à ultima década do seguinte; o segundo, desde o Tratado de Vestefália até ao Congresso de Viena. Na Idade Moderna, as descobertas marítimas, o incremento do comércio e o Renascimento provocam uma profunda transformação da diplomacia, tornando-a num instrumento político indispensável ao serviço dos Soberanos. Data desta altura, o início da utilização dos embaixadores residentes, motivados pelas exigências de contactos frequentes dos diversos reinos italianos sendo que, pouco tempo depois, a Santa Sé começa a receber embaixadores permanentes. Neste sentido, a génese da diplomacia permanente verifica-se em Itália, e a partir daí o conceito difundiu-se um pouco por toda a a Europa de forma assíncrona. Castela, por exemplo, a partir de 1496 tem um embaixador permanente em Inglaterra; o Imperador Maximiliano de Aústria, a partir de 1494, procura estabelecer um sistema de embaixadores residentes em Roma, Veneza, Milão, Inglaterra, França e Espanha, mas as dificuldades económicas obstaram à prossecução dos seus intentos; a Inglaterra com Henrique VII esboça uma tentativa, mas só com Henrique VIII é que são criadas embaixadas permanentes nos Países Baixos, junto do Imperador e, mais tarde, em França e Veneza. De todas as potências europeias, a França foi aquela que mais tempo demorou a estabelecer um sistema de representação diplomática. Por seu lado, o primeiro embaixador de Portugal foi João de Faria, jurista de formação, que, em 1512, liderou a missão enviada à Santa Sé. Depois, com D. João III assiste-se a um investimento no dispositivo diplomático, centrado nas relações com Roma, Castela, Império e a França, contando-se mais de setenta missões entre os anos de 1521 e 1557750. Até 1580, a tendência manteve-se751. 750

Ver: CARDIM, Pedro [et alli] – “A diplomacia portuguesa no Antigo Regime. Perfil sociológico e trajectórias”, in: MONTEIRO, Nuno G. F., CARDIM, Pedro, CUNHA, Mafalda Soares da (org.) – OPTIMA PARS. Elites Ibero-Americanas do Antigo Regime, Lisboa: ICS, 2005, p. 282. 751 Para a evolução estrutural da diplomacia portuguesa, ver: Ver: BRANDÃO, Fernando de Castro - Para uma bibliografia da história diplomática portuguesa, Lisboa : Ministério dos Negócios Estrangeiros, 1989; IDEM - Sinopse cronológica de história diplomática portuguesa, Lisboa: Ministério dos Negócios Estrangeiros, 1984; MACEDO, Jorge Borges de - História diplomática portuguesa, constantes e linhas de força: estudo de geopolítica, 2.ª ed. rev. Lisboa: Tribuna da História/ Instituto de Defesa Nacional, 2006; MAGALHÃES, José Calvet de - Breve história diplomática de Portugal, Mem Martins: Europa América, 1990; MARTINEZ, Pedro Soares - História diplomática de Portugal, Lisboa : Verbo, 1986.

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Durante este tempo, a diplomacia era uma prática fortemente condicionada por um entendimento orgânico do conjunto formado pelas entidades políticas cristãs, um sistema de relações vertical e hierarquizado, pautado por uma flagrante ausência de igualdade em que os diplomatas dos países mais pequenos submetiam-se, por vezes, aos desígnios das autoridadesque acalentavam planos de domínio territoriais752. Todavia, as guerras que começaram a surgir por volta de 1560 vieram abalar o sistema de representação diplomática permananente, de tal forma que em 1589, devido às guerras religiosas, os contactos diplomáticos foram interrompidos, a não ser entre os seguidores da mesma orientação religiosa. O segundo momento inicia-se com a assinatura do Tratado de Vestefália de 1648, que veio colocar um termo à Guerra dos Trinta Anos. Vestefália significou muito mais do que a paz. Na série de acordos assinados entre 14 e 24 de Outubro nas cidades de Münster e Osnanbrück, assistiu-se, também, ao lançamento de algumas das bases do direito público e internacional como, por exemplo, o direito à soberania interna, exercida sobre os povos, e à externa, que encontra no direito à existência de fronteiras políticas a sua maior expressão. O direito à soberania pode ser entrevisto no princípio cuius regio eius religio – cada príncipe teria a sua religião oficial nos seus domínios territoriais - enquanto que a conservação de fronteiras políticas tem a sua génese no assentimento de que a conservação do império germâmico era conveniente para toda a Europa. Neste sentido, soberania e diplomacia são conceitos que se interpenetram, visto que o segundo é a melhor prova do reconhecimento do primeiro. A efectivação do príncipio de soberania externa marca, também, a insistente procura do equilíbrio entre Estados e promove a necessidade dos soberanos definirem um expediente próprio, baseado num protocolo rígido, para regulamentar as relações com outros reinos usando três instrumentos complementares de política externa: a diplomacia, tendente a negociar acordos e compromissos entre Estados – jus tractum -, o direito a ter representantes diplomáticos – jus legationes – e o direito de fazer a guerra – jus belli753. A efectiva conjugação destes três factores promove a assunção do conceito de soberania externa.

752 753

VER: CARDIM, Pedro [et alli] – ob. cit., p. 282. CLUNY, Isabel – D. Luís da Cunha e a ideia de diplomacia em Portugal, Lisboa: Livros Horizontes, 1999, pp. 99-102.

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Em Portugal, os momentos que precederam a paz de Vestefália foram determinantes para a actividade diplomática em virtude da restauração da independência. A partir de 1641, D. João IV passou a enviar os seus representantes a diversos reinos para anunciar a restauração e, mais tarde, mantém representações permanentes em Paris, Londres, Haia, Suécia e Roma numa tentativa de angariar apoios para a defesa da independência, nomeadamente, durante os vinte e sete anos em que guerreou com a Espanha754. A tendência manteve-se no século seguinte, sendo de salientar que, a partir de 1736, a Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra providencia a existência de um expediente especializado que se vai reflectir na nomeação de diplomatas e, consequentemente, na definição de estratégias da política externa. Durante o século XVII e XVIII assistiu-se à consolidação da diplomacia a nível internacional, sendo exemplo disso a publicação de diversas obras teóricas que visam normalizar a praxis do diplomata como o pequeno tratado El embajador da autoria de Juan António Vera (1620), mais tarde traduzido para francês, Histoire du Gouvernement de Venice de Amelot de La Houssaye (1676), Le ceremoniale historique et politique de Gregori Leti (1685), L’Ambassadeur et ses fonctions de Wicquefort (1690), Actes et mémoires des negociations de la paix de Ryswick de Adrien Moetjens (1699), De la maniére de negocier avec les Souverains de François Callières (1716) e que se constituiu como o manual dos diplomatas durante Setecentos, e Discours sur l’art de negocier de Pecquet (1737), entre tantos outros755. Em Portugal cumpre registar o impulso dado e a preocupação didática dos diálogos III e IV da Corte na Aldeia de Rodrigues Lobo, bem como as memórias de diversos diplomatas portugueses como Cunha Brochado, D. Luís da Cunha, Cavaleiro de Oliveira e Sebastião José de Carvalho e Melo que, apesar de algumas apenas terem sido publicadas anos mais tarde, conheciam uma profícua divulgação através de sucessivas cópias manuscritas que circulavam em ambientes restrictos. Em 1815, o Congresso de Viena, reunido para normalizar a situação política europeia depois da queda do império napoleónico, formalizou as normas internacionais sobre etiqueta, hierarquia, cerimonial e precedência na diplomacia internacional que ainda hoje vigoram756.

754

Ver: BRAZÃO, Eduardo – A Restauração – Relações diplomáticas de Portugal de 1640 a 1668, Lisboa: Bertrand, 1939. Ver: CLUNY, Isabel – D. Luís da Cunha e a ideia de diplomacia em Portugal, Lisboa: Livros Horizontes, 1999, pp. 34-35. 756 Ver: MARTINEZ, Pedro Soares – História Diplomática de Portugal, Lisboa: Verbo, 1986. 755

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Depois desta breve panorâmica, importa, também, abordar alguns conceitos básicos da diplomacia como o carácter do embaixador e as tipologias documentais. O carácter é o estatuto jurídico que o soberano atribui ao diplomata através da Instrução e da Carta Credencial757 e que está relacionado com o próprio estatuto do monarca que nomeia, como com o grau das relações existentes entre os dois reinos envolvidos. Durante o século XVIII foram emergindo diversos carácteres que, juridicamente colocavam o diplomata ao abrigo do Direito das Gentes. Entre os diplomatas de primeira ordem, encontra-se o embaixador, o grau mais elevado na escala diplomática, que podia ser “ordinário”, de representação permanente, como “extraordinário”, de durabilidade reduzida e com o propósito de representar o soberano em ocasiões especiais. Tanto um como outro relevam a excelência das relações entre os dois reinos. No pessoal de segunda ordem conta-se o enviado extraordinário e o ministro plenipotenciário. A designação de enviado começa a emergir após a a paz de Nimégue de 1678, para se distinguir e sobrepor aos “residentes”, e era utilizado em enviaturas com alguma duração. O plenipotenciário surge quando o diplomata é destacado para uma missão ou negociação formal de curta duração, sendo autorizado pela carta de plenos poderes que o configura como uma espécie de “procurador” do soberano. Finalmente, entre os elementos de terceira ordem, contam-se os residentes, a quem compete a representação permanente, os agentes, destacados para a resolução de assuntos pontuais, e os encarregados de negócios, que tratam essencialmente de supervisionar os interesses económicos da sua nação758. Todavia, por vezes podia verificar-se, a título temporário, a coexistência de alguns destes graus na mesma legação, como também o carácter de ministro plenipotenciário podia ser associado aos de embaixador ou de enviado extraordinário, sem que se verificasse alterações nos conceitos subajcentes a cada um deles, conforme se depreende das palavras de D. Luís da Cunha: O carácter de Plenipotenciário é diferente do de Embaixador, porque pode haver Embaixador sem ser Plenipotenciário, e Plenipotenciário sem ser Embaixador, ou 757

CLUNY, Isabel – D. Luís da Cunha e a ideia de diplomacia em Portugal, Lisboa: Livros Horizontes, 1999, p. 37, nota 25. Ver: CARDIM, Pedro [et alli] – “A diplomacia portugfuesa no Antigo Regime. Perfil sociológico e trajectórias”, in: MONTEIRO, Nuno G. F., CARDIM, Pedro, CUNHA, Mafalda Soares da (org.) – OPTIMA PARS. Elites Ibero-Americanas do Antigo Regime, Lisboa: ICS, 2005, pp. 286-290; SAMPAYO, Luiz Teixeira de – O Arquivo Histórico dos Negócios Estrangeiros […], Coimbra: Imprensa da Universidade, pp. 33-35. 758

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para melhor dizer a qualidade de Plenipotenciário não é um carácter representativo no primeiro grau e somente mostra a expressão do poder e autoridade do que a tem, sem acrescentar alguma coisa ao carácter do Enviado759.

Apesar da correspondência diplomática760 possuir diversas categorias e obedecer a formulários rigorosos eminentemente ligados ao protocolo, ao ceremonial e à etiqueta, devemos centrar a nossa atenção nos organismos que produzem aquela informação. Assim, a partir de 1736, toda a correspondência expedida passa pelo expediente da Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, independentemente de ser assinada pelo próprio monarca, pelo Ministro e Secretário de Estado, por ambos ou por outros oficiais da secretaria. Neste sentido, devemos identificar o sentido dessa correspondência. As “Cartas a Príncipes”, primeira categoria identificada por Teixeira de Sampayo, surgem como um exemplo de comunicação horizontal, porquanto estabelecem a comunicação entre dois soberanos que têm o seu poder devidamente fundamentado. São redigidas em tom cerimonioso e moldadas em função das relações entre os dois Estados, podendo ser subdivididas em cartas de chancelaria, redigidas em papel de grande formato, seladas com obreia e chancela, em que o soberano declina os seus títulos; e cartas de gabinete escrita pelo punho real, com um carácter menos solene e com fórmulas variáveis, sendo por isso uma manifestação de intimidade do Soberano. Em segundo lugar, centrando-nos na figura do Ministro e Secretário de Estado, cumpre realçar as tipologias descendentes, ascendentes, endógenas e exógenas. No sentido descendente e dentro da estrutura político-administrativa portuguesa, encontram-se diversos instrumentos que habilitam o diplomata ao desempenho das funções. A credencial ou carta de crença acredita o embaixador junto do soberano estrangeiro. A carta revocatória dá por finda a missão do diplomata, enquanto que a recredencial tem por finalidade responder à revocatória. Por outro lado, na carta de plenos poderes, assinada pelo Soberano e pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros, são expostos os objectos da negociação e a extensão dos poderes de que fica investido o diplomata, sendo exigida para negociar um tratado e que, como tal, era profundamente examinada pela outra parte. As instruções são o conjunto de ordens, conselhos e informações dados ao diplomata antes de ele partir para a sua missão, regulando assim o 759

Ver: Memórias de D. Luís da Cunha […], apud SAMPAYO, Luiz Teixeira de – ob. cit., p. 34 A correspondência diplomática foi estudada por Luiz Teixeira de Sampayo, segundo um critério temático que reflecte a própria estrutura do acervo do Arquivo Histórico do Ministério dos Negócios Estrangeiros. Ver: SAMPAYO, Luiz Teixeira de – ob. cit., pp. 27-48 760

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seu procedimento, podendo ser públicas ou secretas e ter parágrafos adicionais também eles públicos ou secretos. A instrução familiar, geralmente concedida antes da primeira enviatura de um diplomata, serve para colmatar a inexperiência do mesmo, indicando as regras gerais de conduta. Finalmente, a carta de ratificação é um instrumento pelo qual se aprova um tratado, constando na mesma a assinatura e os selos do Soberano e a assinatura do Ministro e secretário de Estado dos Negócios Estarngeiros. Ainda no sentido descendente, verifica-se que a comunicação do Ministro para o diplomata é feita através do despacho o qual é, muitas vezes, designado genérica e impropriamente de ofício. Outra tipologia é despacho instrutivo ou carta instrutiva que é um complemento da instrução, sendo que um conjunto de despachos instrutivos pode ser uma instrução, que abrange toda a missão, prevendo conjunturas e afirmando princípios reguladores da acção do diplomata no terreno. O despacho de leitura, que por vezes pode seguir em anexo ao despacho, tem por finalidade ser lido na presença do Ministro dos Estrangeiros do governo anfitrião ou ser-lhe dirigido por cópia para para ser conservado. Por seu lado, do diplomata para o Ministro, logo no sentido ascendente, avistamse os ofícios, geralmente numerados sequencialmente com algarismos àrabes para suprir eventuais falhas devido ao extravio, os quais são, em algumas ocasiões, acompanhados de diversa documentação em anexo, numerada sequencialmente com algarismos romanos. As cartas do diplomata para o seu superior hierárquico são concebidas de forma diferente, pois, apesar de se debruçarem sobre matérias oficiais, saiem do protocolo e revelam uma certa intimidade na forma como são escritas, sendo um testemunho da confiança recíproca entre o diplomata e o Ministro. Considerando o diplomata como o representante do seu soberano junto de um outro soberano estrangeiro cujo poder está legitimado, e, apesar do seu procedimento ter um enquadramento jurídico no Direito das Gentes, as comunicações com o governo anfitrião devem ser consideradas como horizontais exógenas. Neste caso, encontramos, antes de mais, os discursos que são proferidos na audiência solene da entrega da carta de crença. Depois, ao nível das comunicações com o Ministro dos Negócios Estrangeiros local, encontramos a nota que é um género de carta oficial reservada a assuntos graves; a nota verbal que é um documento curto que não excede as dez linhas, sem assinatura e que se supõe ser entregue em mão própria; o Memorandum ou Memória que são documentos extensos nos quais o diplomata solicita informações ou expõe, - 182 -

pormenorizadamente, um assunto; e, o bilhete de recado que abre com cumprimentos na terceira pessoa e destina-se a ser remetido e não entregue pelo próprio. Finalmente, na correspondência trocada com o corpo diplomático português, logo endógena, como com o corpo diplomático estrangeiro, por sua vez exógena, encontram-se os ofícios, rigorosos na forma e objectivos no contéudo; e as cartas, em que se trocam informações recíprocas que complementam as informações dos ofícios.

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1.2. ENVIADO EXTRAORDINÁRIO NA HAIA (1787-1802) 1.2.1. O EXERCÍCIO DE FUNÇÕES E AS COMPETÊNCIAS António de Araújo de Azevedo foi nomeado para Enviado Extraordinário junto dos Estados Gerais das Províncias Unidas pelo aviso de 25 de Julho de 1787, assinado pelo ministro Martinho de Melo e Castro761, sendo que o início de funções ocorre com a entrega da carta credencial na Haia a 6 de Agosto de 1790762. A sua presença na Haia durou até 1802, quando recebe a carta revocatória, muito embora se tenham registado algumas interrupções. É possível identificar quatro momentos distintos: o primeiro, desde a entrega da credencial até Setembro de 1796, altura em que se deslocou a Paris para negociar o tratado de paz com o Directório Executivo763; o segundo, entre Maio764 e 26 de Julho de 1797, quando empreende o regresso a Paris para tentar nova negociação de paz765; o terceiro, entre Maio de 1798766 e Dezembro de 1798, altura em que parte para Hamburgo em comissão de serviço767 e, em seguida, para a Alemanha para realizar uma viagem de instrução em regime de licença de serviço; o quarto e último momento ocorre entre Agosto de 1801768 e Agosto de 1802769, já depois da missão de Port Lorient. A 28 de Setembro de 1802, António de Araújo deixa definitivamente a Haia e parte para São Petersburgo770. As competências do Enviado Extraordinário na Haia estão consignadas nas instruções assinadas pelo Ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra. A conservação e a normalização das relações comerciais existentes entre Portugal e a Holanda, especialmente o comércio marítimo, terão sido o objecto de trabalho do diplomata luso, num momento em que o governo anfitrião mantinha a 761 Ver: Aviso da Secretaria de Estado participando ao Exmo. Senhor António de Araújo de Azevedo havê-lo S. Majestade nomeado seu Enviado Extraordinário aos Estados Gerais das Províncias Unidas. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/SR/ CARTÓRIO/DOC. 3, 75. 762 Ver: ARAÚJO, Artur da Cunha – Perfil do conde da Barca, p. 25. 763 Ver: Minuta do ofício n.º 408 de António de Araújo para Luís Pinto de Sousa, datado de 1796.09.30. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 1,26. 764 Ver: Cópia da carta de António de Araújo de Azevedo para Luís Pinto de Sousa, datada de 1797.05.06. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2,133. 765 Ver: Minuta do ofício n.º 24 de António de Araújo de Azevedo para Luís Pinto de Sousa, datado de 1797.07.26. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2,142. 766 Ver: Minuta do ofício n.º 1 de António de Araújo para Luís Pinto de Sousa, datado de 1798.05.01. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 1,35. 767 Ver: Minuta do ofício n.º 24 de António de Araújo para Luís Pinto de Sousa, datado de 1798.12.[?] ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 1,59. 768 Ver: Cópia da carta recredencial do Príncipe Regente nomeado António de Araújo pata Enviado Extraordinário na Haia, datada de 1801.08.28. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3,314. 769 Ver: Ofício de Mr. Van der Goes, Secretário de Estado dos Negócios da República Batava, para António de Araújo, datado de 1802.08.09. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3,315. 770 Ver: Minuta do ofício de António de Araújo para D. João de Almeida e Castro, datado de 1802.09.28. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3,316.

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Companhia das Índias a laborar em contextos geográficos próximos aos do império português, nomeadamente na costa africana e nas possessões do Oriente. Por outro lado, o diplomata estaria incumbido de prestar apoio aos cidadãos portugueses que aportavam na Haia, com destaque para os comerciantes, nomeadamente nas relações com o governo holandês. 1.2.2. A PRODUÇÃO INFORMACIONAL O acto de nomeação de António de Araújo de Azevedo para Enviado Extraordinário deveria marcar o início das necessárias comunicações do diplomata a montante. Todavia, só dois anos depois é que se verifica a partida do diplomata português, já depois de ter sido nomeado para Ministro de Luís Pinto de Sousa, futuro visconde de Balsemão771. É, pois, com Luís Pinto de Sousa que António de Araújo se vai corresponder a título oficial (ver Quadro 7). O primeiro despacho de Luís Pinto de Sousa é datado de 10 de Junho de 1789 e nele António de Araújo era incumbido da sua primeira tarefa: intervir junto dos Estados Gerais a fim de garantir os direitos da Santa Casa da Miséricordia do Porto na herança de José de Campos e Silva772. O enquadramento institucional que promove estas comunicações ditava que o Ministro servisse de intermediário entre o poder efectivo, o Príncipe Regente, e o diplomata, sendo que os seus despachos consubstanciavam um género de documentação descendente, veiculando ordens que o diplomata devia cumprir, informações que devia utilizar e conselhos que devia observar no desempenho das suas funções. O despacho é, assim, o instrumento regulador da acção do diplomata e, neste caso, é concebido de forma simples, objectiva e rigorosa, para não permitir interpretações dúbias ao receptor, raramente excedendo uma página com 20 linhas. A multiplicidade de temas veiculados ao longo desta série implica que, apenas, se apresente uma abordagem sintética, reunindo a título ilustrativo as diversas motivações que estiveram na sua génese. Assim, em primeiro lugar, deve ser referida a normalização da acção do diplomata com o governo da Haia, primeiro objecto da sua missão. Veja-se, por exemplo, a aprovação de S. M. das medidas tomadas por Araújo 771

Luís Pinto de Sousa é nomeado para Ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra em 15 de Dezembro de 1788. Cf. SUBTIL, José – “Os poderes do centro”, p. 178-179. 772 Ver: Despacho de Luís Pinto de Sousa para António de Araújo de Azevedo, datado de Lisboa, 1789.06.10. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 143.

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em negociações com os Estados Gerais, sobre o comércio na costa de África773; o despacho com a ordem para encetar uma negociação com o governo holandês, através da apresentação de uma memória sobre a extinção da Companhia Ocidental e a criação de um novo sistema de administração das colónias dos Estados Gerais774; para solicitar explicações ao mesmo governo, através do entabulamento de correspondência directa, sobre o apresamento ilegítimo de navios neutros775; ou para agradecer ao governo das Províncias Unidas a restituição do navio português776, ordem para averiguar as condições de paz estabelecidas entre os Estados Gerais e a regência de Argel777. Ligada à interacção do diplomata com o governo holandês, está o conjunto de informações sobre a corte portuguesa. São de realçar: a notícia da assunção da regência de D. João devido a uma melancolia mais do que ordinária da Rainha778; a decisão da coroa portuguesa face a acontecimentos externos como o assassinato legal da Rainha Cristianíssima, ordenando a Araújo que esteja atento ao partido que tomará S. M. Prussiana779; o convite endereçado pelas cortes aliadas para S. M. aderir à aliança contra a França com o fim de por termo às desordens780 ou a informação de que a corte de Lisboa está prestes a assinar duas convenções particulares com as cortes de Madrid e de Londres781; as alterações no corpo diplomático português782. As movimentações militares portuguesas também constam dos despachos do Ministro, como a notícia da partida do corpo expedicionário comandado pelo general Forbes para a Catalunha para auxiliar o exército de S. M. C.783; bem como, as comerciais, como a entrega do contrato dos diamantes a Joaquim Pedro Quintela784.

773

Ver: Despacho de Luís Pinto de Sousa para António de Araújo de Azevedo, datado de Salvaterra de Magos, 1791. 02. 09. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 151. 774 Ver: Despacho de Luís Pinto de Sousa para António de Araújo de Azevedo, datado do Palácio de Mafra, 1791. 09.07. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 158. 775 Ver: IDEM, datado do Palácio de Nossa Senhora da Ajuda, 1794. 05. 31. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 189. 776 Ver: IDEM, datado de Palácio de Queluz, 1796. 01. 01. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 205. 777 Ver: IDEM, datado de Palácio de Queluz, 1795. 09. 26. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 203. 778 Ver: IDEM, datado de Lisboa, 1792. 02. 15. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 162. 779 Ver: IDEM, datado de Palácio de Queluz, 1793. 11. 27. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 179. 780 Ver: IDEM, datado do Palácio de Queluz, 1792. 09. 12. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 164. 781 Ver: IDEM, datado do Palácio de Queluz 1793. 07. 10. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 176. 782 Ver: IDEM, datado de Palácio de Nossa Senhora da Ajuda, 1791. 06. 22. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 156. 783 Ver: IDEM, datado do Palácio de Queluz, 1793. 08. 28. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 177. 784 Ver: IDEM, datado de Salvaterra de Magos, 1791. 03. 12. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 154.

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Quadro 7 - Enviado Extraordinário na Haia (1789-1802) Comunicações a montante e na horizontal

Príncipe Regente

SENEG

SR/ Ofícios SR/ Cartas

Estados Gerais

SR/ Despachos

SR/ Cartas SR/ Tratados SR/ Sentenças

SR/ Memórias

Corpo diplomático português

DOC/ Cartas DOC/ Cartas

Enviado Extraordinário na Haia SR/ Notas

SR/ Notas

Corpo diplomático na Haia

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Também por esta via, desciam as ordens necessárias para se abrir as comunicações a jusante do diplomata, nomeadamente com João Gildemeester, cônsul português em Amsterdão785, ou para prestar assistência a súbditos portugueses como os naturalistas portugueses em viagem pela Europa (José Bonifácio de Andrada e Silva, Manuel Ferreira da Câmara e Joaquim Pedro de Fragoso da Mota de Sequeira786), ou a Henrique Roberto Thomazini787, bem como a ordem para cessar a mesma assistência788. Do Ministro vinha também a ordem para proceder à contratação de militares para servir no exército português789 ou para a aquisição de livros pretendidos para a Real Academia de Fortificação790. Da mesma forma que o Ministro incita o diplomata a interagir, também restringe a sua acção quando, por exemplo, ordena a Araújo que se retire para Londres e que tome medidas para salvaguardar o arquivo da secretaria791, que não conceda passaportes às pessoas que vêm de Londres pois essa era uma incumbência do diplomata daquela legação792 ou, mais tarde, quando ordena que parta para um local neutro sem se despedir, ou quando envia os plenos poderes para negociar com a República Francesa793. Mas os despachos do ministro não possuem apenas ordens. Alguns deles contêm pedidos de informação sobre a política e o comércio na Holanda, como os interesses da Companhia das Índias, o novo sistema de Fazenda dos Estados Gerais794, a posição holandesa face à possibilidade de criação de uma Liga Geral na Europa, bem como sobre a aliança entre Berlim e Londres795. A política internacional está também presente, como por exemplo a pacificação do Norte, o Congresso de Sistow e a sucessão na coroa da Polónia. Por vezes, com os despachos seguiam anexos, como legislação publicada em Lisboa796, documentos relacionados com as relações bilaterais como o despacho de 785

Ver: IDEM, datado de Palácio de Queluz, 1791. 09. 14. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 159; Ver: IDEM, datado de Palácio de Nossa Senhora da Ajuda, 1793. 04. 01. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 172. Ver: IDEM, datado de Palácio de Queluz, 1792. 09. 12. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 164; IDEM, datado de Palácio de Queluz, 1792. 10. 06. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 165; IDEM, datado de Palácio de Queluz, 1794. 10. 22. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 191. 787 Ver: IDEM, datado de Palácio de Queluz, 1793. 11. 27. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 178. 788 Ver: IDEM, datado de Palácio de Queluz, 1796. 05. 17. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 210. 789 Ver: Despacho de Luís Pinto ordenando que António de Araújo para trate da contratação do almirante Kinsbergen para liderar a Marinha portuguesa, datado do Palácio de Queluz, 1796. 06. 04. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 211. 790 Ver: IDEM, datado de Palácio de Nossa Senhora da Ajuda, 1794. 01. 20. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 183. 791 Ver: Despacho de Luís Pinto de Sousa para António de Araújo de Azevedo, datado de Palácio de Nossa Senhora da Ajuda, 1793. 03. 30. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 171. 792 Ver: IDEM, datado de Palácio de Nossa Senhora da Ajuda, 1793. 01. 23. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 168. 793 Ver: IDEM, datado de Palácio de Queluz, 1796. 07. 13. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 214. 794 Ver: IDEM, datado de Salvaterra de Magos, 1791. 01. 15. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 150; IDEM, datado de Palácio de Queluz, 1791. 10. 09. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 160. 795 Ver: IDEM, datado de Palácio de Mafra, 1791. 08. 31. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 157. 796 Ver: IDEM, datado do Palácio de Queluz, 1790. 09.22. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 147. 786

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leitura para ser apresentado ao governo das Províncias Unidas sobre o nascimento de um Príncipe português797, o ofício do barão de Spaen, enviado dos Estados Gerais em Lisboa798 ou o mapa dos grãos encomendados nos portos das Províncias Unidas para consumo nesta cidade de Lisboa799. Assiste-se ao envio de documentos respeitantes ao funcionamento interno da legação, como decretos para pagamento de contas da secretaria da legação800, uma cifra para Araújo se corresponder com Lisboa801, envio da patente do vice-cônsul para António de Campos Silva, sugerindo que a execução da mesma deve receber a aprovação do cônsul João Gildemeester802. Até se remete as instruções para António de Araújo ir a Paris negociar a paz803. Há pedidos de remessa de documentos oficiais para Lisboa, como o artigo 16.º do projecto de tratado de comércio entre a Inglaterra e a República804, ou até de periódicos holandeses que deviam chegar a Lisboa duas vezes por semana para evitar que o gabinete português tomasse conhecimento das notícias tardiamente805. No sentido ascendente, portanto do diplomata para o Ministro dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, seguiam ofícios extensos, redigidos em papel de grande formato e numerados sequencialmente, cujas minutas permaneceram no seu arquivo. Nestes, o diplomata relata circunstanciadamente a sua acção nas relações com o governo anfitrião, mas também as movimentações militares e os acontecimentos políticos sucedidos nos Estados próximos das Províncias Unidas806. Era o próprio diplomata quem minutava e escrevia a versão definitiva dos ofícios a expedir para Lisboa, o mesmo não acontecendo com a profusão de anexos que acompanhavam esta série documental.

797

Ver: Despacho de Luís Pinto de Sousa para António de Araújo de Azevedo, datado do Palácio de Queluz, 1795. 04. 18. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 200; Despacho de leitura de Luís Pinto de Sousa para António de Araújo de Azevedo, datado de Palácio de Queluz, 1795. 03. 21. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 200,1. 798 Ver: IDEM, datado de 1793. 03. 30. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 171; Ver: Ofício do barão de Spaen para Luís Pinto de Sousa, datado de Lisboa, 1793. 02. 28. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 171. 799 Ver: Despacho de Luís Pinto de Sousa para António de Araújo de Azevedo, datado de 1794. 06. 14. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 190. 800 Ver: Despacho de Luís Pinto de Sousa, datado de Palácio de Queluz, 1792. 10. 06. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 165; IDEM, datado de 1793. 08. 28. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 177; IDEM, datado de Palácio de Queluz, datado de 1795. 02. 09. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 197. 801 Ver: IDEM, datado de Palácio de Queluz, 1794. 12. 31. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 195. 802 Ver: IDEM, datado de Palácio de Queluz, 1793. 11. 27. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 178. 803 Ver: IDEM, datado de Palácio de Queluz, 1796. 07. 19. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 215. 804 Ver: IDEM, datado de Palácio de Queluz, 1791. 04. 13. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 155. 805 Ver: IDEM, datado de Salvaterra de Magos, 1791. 01. 15. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 150. 806 Ver a série de ofícios de António de Araújo de Azevedo para Luís Pinto de Sousa Coutinho, entre 1796 e 1801. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 1, 19 – DOC. 1, 26; DOC. 1,35 – 1, 77; DOC. 2,133 – 2,142.

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Aliás, os anexos dos ofícios que subiam à presença do Ministro português eram preparados na secretaria de legação por Francisco José Maria de Brito, oficial maior da Secretaria de Estado destacado para o serviço de expediente da embaixada da Haia. Na imediata dependência do diplomata, está a legação que assegura a recepção da correspondência e outra documentação referente ao governo da Haia, como notas sobre questões económicas e financeiras na Holanda, nomeadamente os empréstimos realizados pela Companhia das Índias807, memórias sobre as dívidas da Holanda808, e diversa legislação em vigor nos domínios das províncias Unidas809. Toda a documentação era copiada pelo secretário da legação, anexada ao ofício redigido pelo diplomata e numerada sequencialmente em caracteres romanos para depois ser reecaminhada ao Ministro dos Negócios Estrangeiros português (ver Quadro 8). A secretaria era também ela produtora de informação, havendo notícia de copiadores de correspondência expedida para a secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra810, ou para várias pessoas811. Mas há outros documentos: o inventário dos trastes e efeitos existentes na Legação da Haia realizado no momento da chegada de António de Araújo812; diversos apontamentos sobre a documentação reunida813; uma série de apontamentos sobre as despesas da secretaria e capela na Haia814; ou, ainda, apontamentos sobre os números dos periódicos em falta na livraria da legação815. Pelo expediente da secretaria, corriam também os assuntos ligados à gestão dos bens patrimoniais da legação da Haia, como a capela da legação e o pagamento dos soldos aos capelães816.

807

Ver: Notas sobre questões económicas e financeiras na Holanda […]. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 5, 467. Ver: Dettes de la Province de Hollande. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 5, 469. Ver: Decreto da Assembleia Geral dos Estados Gerais da Holanda, datado da Haia, 1655. 05. 04. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 17, 17; Ordenanças sobre os incêndios em Amesterdão, 1685-1767, ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18; Extracto da ordenança para os guardas da noite, ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 17,19; Extrait des résolutions de L. N. & H. P. Contenant le placard de la levée du 25em. Dérnier […], ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 17,22; Ordonnane touchant les impots de monture […],ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 17, 26; Extrait de l’avis de la négociation de la compagnie des Indes Orientales por la Chambre de la Zélande, en forme de loterie d’obligations […], 1791. 02. 03, ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 17,27; Decreto que proíbe a importação de chá estrangeiros em benefício da Companhia holandesa das Índias Orientais, 1791. 07. 14 – ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 17, 28; Ordonnance de L. N. & H. P. Arrête le 2 Septembre 1791, touchant une argumentation de l’impôt sur la consomption du caffé, thé, chocolat, lemonade, eau de fruits et autres boisoons […], ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 17, 29. 810 Ver: Copiador da correspondência da embaixada de Portugal na Haia para a Secretaria de Estado. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 5, 473. 811 Ver: Livro que serviu para copiar diversas cartas […]. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 5,474. 812 Ver: Inventário dos trastes e efeitos que existiam legação de Portugal na Haia. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 472. 813 Ver. Algumas memórias das negociações minhas na Holanda. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 5, 470. 814 Ver. Notas sobre contas pessoais. 1794. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 527; Recibo […] ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 5,528. 815 Ver: Lista dos números do Moniteur em falta […]. 1796. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 5, 475. 816 Ver: Série de recibos dos capelães da Capela de S. M. na Haia. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 5,529. 808 809

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Quadro 8 - Enviado Extraordinário na Haia (1789-1802) Comunicações a jusante

Príncipe Regente

SENEG

Secretaria

SR/ Cartas SR/ Recibos

Pensionistas régios

Ministro Plenipotenciário em Paris

SR/ Recibos DOc/ Memoria

Capelães

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SR/ Cartas SR/ Memorias

João Gildemeester Cônsul

Vejamos, agora, as comunicações com o governo holandês que devem ser consideradas como comunicações horizontais exógenas. Do diplomata português, surgem várias tipologias documentais, sendo de salientar as memórias em que expõe pormenorizadamente um determinado assunto ao governo Batavo, dissecando todos os seus aspectos, entre os quais a posição da coroa portuguesa, de que é exemplo a que foi apresentada aos Estados Gerais sobre os direitos portugueses sobre o comércio e a navegação na costa de África817. Do governo holandês, António de Araújo recebia, sobretudo, ofícios818, cartas819, tratados820, sentenças com interesse para os vassalos portugueses821, etc.. Devemos considerar como horizontal exógena a correspondência com o corpo diplomático presente na Haia, como Pinsot, encarregado de negócios da República Francesa na Haia822, ou com outros representantes militares como Richard, representante do povo francês no exército do norte823. As comunicações a jusante, dentro da estrutura administrativa portuguesa, englobam a correspondência expedida e recebida do cônsul geral de Portugal em Amesterdão, João Gildemeester, que estava encarregado de exercer o papel de intermediário entre os concidadãos portugueses e as autoridades locais, exercer a jurisdição cível e correccional entre os membros da comunidade, verificar o pagamento dos direitos alfandegários devidos pelos mercadores e zelar pelo cumprimento dos seus privilégios. Ao cônsul competia também, mediante a ordem do Ministro dos Negócios Estrangeiros, manter o arquivo da legação e a Casa do embaixador na ausência deste, bem como assegurar o funcionamento das relações entre Portugal e Holanda824.

817

Ver: Minuta da Memória dirigida aos Estados gerais da República Batava sobre os direitos portugueses no comércio e na navegação na costa de África, datada da Haia, 1791. 03. 09. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 1, 2. 818 Ver: Ofício dos Estados Gerais dirigidos a António de Araújo de Azevedo [1791]. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 1, 3. 819 Ver: Carta de H. Gagel para António de Araújo de Azevedo, datada da Haia, 1790. 11. 26. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 1, 1; Cópia da carta que os directores da Escola de Marinha de Amesterdão escreveram à Escola da Marinha de Lisboa a pedido de António de Araújo de Azevedo, datada de Amesterdão, 1792. 02. 01. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 1, 5. 820 Ver: Carta de W, Quarles para António de Araújo remetendo dois exemplares do tratado de paz, de amizade e de aliança assinado na Haia em 1795. Datada de 1795. 06. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 1, 6, 1. 821 Ver: Sentença da Corte da Holanda, Westrissa e Zelândia pela qual concede à Santa Casa da Misericórdia da cidade do Porto o direito de serem herdeiros universais de José de Campos e Silva, tal como tinha ordenado em seu testamento. 1791. 12. 16, Haia. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 1, 16. 822 Ver: Ofício de Pinsot para António de Araújo de Azevedo, datado de 1795.. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 1, 10. 823 Ver: Ofício de António de Araújo de Azevedo para Richard, datado da Haia, 1795. 08. 29. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 1, 9; Ofício de Richard para António de Araújo de Azevedo, datado de 1795.09.23. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 1, 11. 824 Ver: Ofício de João Gildemeester para António de Araújo informando que recebeu um despacho de Luís Pinto de Sousa porque julgava que o diplomata já não se encontrava na Haia, datado de Amesterdão, 1796. 08. 13, Amesterdão. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 1, 13; Ofício de João Gildemeester dirigido a António de Araújo comunicando que procedeu ao pagamento de algumas facturas e ao seu carregamento na lista de despesas da secretaria da Legação na Haia, datado de Amesterdão, 1797. 12. 28. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 1, 14.

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É pela via do cônsul que sobem ao diplomata as representações dos comerciantes portugueses825. No seu posto da Haia, António de Araújo de Azevedo teve por incumbência efectuar o pagamento do soldo aos naturalistas portugueses826, José Bonifácio de Andrada e Silva, Manuel Ferreira da Câmara, Joaquim Pedro Fragoso da Mota de Sequeira827.

825

Ver: Certidão extraída do jornal deviagem de Domingos Pinto, capitão e piloto do bergantim português “Prima Vera”, relativa à reclamação apresentada pelas autoridades de Ulie. Assinada e selada com as armas de João Gildemeester, cônsul português em Amesterdão. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 1, 18. 826 Ver a série de recibos de Joaquim Pedro Fragoso da Mota de Sequeira, Manuel Ferreira da Câmara e José Bonifácio de Andrada e Silva. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 5, 476 – DOC. 5, 526. 827 Ver: DIAS, Graça e J. S. da Silva – Os primórdios da maçonaria, vol 1, tomo II, pp. 424 e segs.

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1.3. MINISTRO PLENIPOTENCIÁRIO EM PARIS (1796-1798; 1801) 1.3.1. O EXERCÍCIO DE FUNÇÕES E AS COMPETÊNCIAS Como vimos, António de Araújo ainda estava na Haia, quando foi nomeado para negociar a paz com o Directório Executivo. O despacho de Luís Pinto de Sousa, datado de 19 de Julho de 1796, concedia-lhe o carácter de Ministro Plenipotenciário828. As negociações conducentes à assinatura do tratado de paz de 10 de Agosto de 1797 decorreram em dois momentos: o primeiro entre 12 de Outubro de 1796829 e 26 de Abril do ano seguinte830 quando teve como intelocutor Charles Delacroix, ministro das Relações Exteriores. De permeio, a 6 de Dezembro de 1796, António de Araújo recebeu a carta de plenos poderes, nos quais está averbada a autorização para empreender, prosseguir e concluir até ao ponto de ratificação o tratado que houvesse de concluir com Directório Executivo da República Francesa831. Mais tarde, a 10 de Junho de 1797, recebeu a carta patente de plenos poderes para negociar e assinar o tratado de paz com o Enviado extraordinário de S. M. B. e o Ministro Plenipotenciário da República Francesa832. A circunstância marcava a abertura para a segunda fase das negociações que, desta feita, decorreria com Charles Maurice de Talleyrand e Charles Delacroix, entre 5833 e 10 de Agosto de 1797, dia em que assinou o tratado de paz834. A 20 de Dezembro de 1797, depois do Directório ter dado o tratado por nulo, em virtude da tardia ratificação da corte de Lisboa, Luís Pinto remete nova carta patente na qual refere que tendo inteira confiança na pessoa de António de Araújo de Azevedo, concede-lhe plenos poderes para poder negociar, estipular, conferir e assinar qualquer tratado que se haja de concluir com a República Francesa835. Todavia, esta nova tentativa seria baldada, em virtude da tardia ratificação portuguesa e o diplomata seria encarcerado na Torre do Templo. Portugal via, assim, o 828

Ver: Despacho de Luís Pinto de Sousa para António de Araújo de Azevedo, datado de 1796.07.19. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2,215. 829 Ver: Minuta do ofício n.º 1 de António de Araújo para Luís Pinto de Sousa, datado de 1796.10.15. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2,114. 830 Ver: Minuta de ofício de António de Araújo para Luís Pinto de Sousa, datado de 1797.04.26. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2,132. 831 Ver: Carta patente de plenos poderes para António de Araújo negociar, aceder, conferir e assinar qualquer tratado, datada de Palácio de Queluz, 1796. 12. 06. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 43,9. 832 Ver: Carta patente de plenos poderes para António de Araújo negociar, aceder, conferir e assinar qualquer tratado, datada de Palácio de Queluz, 1797. 06. 10. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 43,10. 833 Ver: Minuta de ofício não numerado de António de Araújo para Luís Pinto de Sousa, datado de 1797.08.05. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 1,78. 834 Ver: Minuta do ofício n.º 25 de António de Araújo para Luís Pinto de Sousa, datado de 1797.08.12. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 1,81. 835 Ver: Carta patente nomeando António de Araújo de Azevedo ministro plenipotenciário para concluir e assinar o tratado de paz entre Portugal e a República Francesa, datada de Palácio de Queluz, 1797. 12. 20. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 43,11.

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espectro da França revolucionária se abater sobre si. Detido durante três meses, Araújo continuou a comunicar com o seu superior hierárquico em Lisboa. A 29 de Março de 1798 recebeu ordem de soltura e regressou de imediato a Haia836. Mais tarde, já em 1801, assiste-se a uma nova tentativa de negociar a paz. António de Araújo, em viagem pela Alemanha, é chamado a Lisboa e é nomeado para ir a Paris recebendo as cartas patentes de plenos poderes datadas de 28 de Março de 1801 para negociar com a República Francesa837 e com a Espanha838. Dirigiu-se, então, a Port Lorient mas a negociação não ocorreria pois o diplomata não obteve autorização para passar à capital francesa. Regressou a Lisboa em meados de Junho seguinte, tendo tomado conhecimento de que a paz tinha sido assinada em Badajoz, a 5 de Junho de 1801, entre Luís Pinto de Sousa, Godoy e Luciano Bonaparte839. 1.3.2. A PRODUÇÃO INFORMACIONAL A nomeação de António de Araújo para ir a Paris, em 1796, ocorreu através da soma de diversos despachos instrutivos que foram identificando não só o carácter do diplomata, como ajustando o âmbito da negociação. Pelo despacho de 6 de Julho de 1796, o Ministro dos Negócios Estrangeiros Luís Pinto de Sousa definiu-lhe o carácter de Ministro Plenipotenciário e salientou que, em breve, seriam remetidos os plenos poderes. Como tal, o diplomata devia solicitar ao Directório o envio dos necessários passaportes para poder passar a Paris840. Nesse mesmo despacho instrutivo, anunciava ao diplomata que no caso dos Países Baixos, recém-invadidos pela França, anuírem às pressões do invasor para declarar guerra a Portugal, rompendo assim a neutralidade portuguesa, o diplomata deveria sair imediatamente do seu posto deixando o arquivo e a Casa aos cuidados do cônsul de Portugal, João Gildemeester. A 13 de Julho, ordenava a António de Araújo que partisse para um local neutro sem se despedir do governo holandês841 e a 19 do mesmo mês

836

Cf. MALAFAIA, Eurico de Ataíde - ob. cit. , pp. 239 e segs. Ver: Carta patente nomeando António de Araújo de Azevedo ministro plenipotenciário para negociar, estipular, conferir e assinar até ao ponto de ratificação qualquer tratado com a República Francesa, datada de Palácio de Queluz, 1801. 03. 28. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 43, 12. 838 Ver: Carta patente nomeando António de Araújo de Azevedo ministro penipotenciário para negociar, estipular, conferir e assinar até ao ponto de ratificação qualquer tratado com a Espanha, datada de Palácio de Queluz, 1801. 03. 28. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 43,13. 839 Cf. MALAFAIA, Eurico de Ataíde - ob. cit., p. 297. 840 Ver: Despacho de Luís Pinto de Sousa para António de Araújo de Azevedo, datado de 1796.07.06. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2,213. 841 Ver: IDEM, datado de Palácio de Queluz, 1796. 07. 13. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 214. 837

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remetia as instruções, em anexo842. A 9 de Agosto, enumerava as cinco condições base para Araújo inciar a negociação, remetendo em anexo a documentação necessária: 1.º Cessão das terras do Cabo do Norte, desde o Rio Calcuena até o Oyapok; estando S,. Magestade decidida a não ceder mais couza alguma, porque tendo todos os mais rios, que jazem ao sul do dito Calcuena comunicaçoens por canaes com o Amazonas, seria abrir huma porta a immensos contrabandos, e facilitaria não só a fuga, mas a revolta dos escravos em todo o domínio do Pará; 2.º Renuncia S. Magestade a todas as compensaçoens das prezas que se lhe tem feito durante a guerra, as quaes são tão consideráveis como V. S.ª reconhecerá do cálculo n.º 9, porém V. s.ª pugnará igualmente para que a mesma renúncia seja reciproca; porque ainda que Portugal tenha pouco que restituir, deve-o pedir assim a razão da decência; 3.º Que S. Magestade Fidelíssima admittirá nos seus Portos todos os Navios Francezes, assim de Commercio como de Guerra, na forma que vai descripto mais amplamente no papel n.º 3, devendo V. S.ª observar ao Governo Francez que a prohibição dos Corsários he commua [sic] para todas as nações beligerantes, depois da regulação que a corte de Lisboa estabeleceu na última guerra. Esta estipulação a respeito da admissão dos navios de guerra será porém absoluta; sem que V. S.ª faça mensão alguma da rogatóriado artigo 4.º da última convenção concluida com a Grã-Bretanha; devendo V. S.ª abster-se de fallar nella ao Governo Francez, quando lhe fôr possivel; e no caso de o não poder evitar, responderá, que aquelle artigo fica por si mesmo derrogado à vista da prezente estipulação. Tendo V. S.ª o maior cuidado de não propôr, nem estabelecer artigo algum derrogatório, de Tratado ou Convenção alguma particular, mas de cingir-se unicamente a estabelecer principios geraes, na forma que vão propostos; 4.º Sua Magestade concederá aos vassalos franceses todas as vantagens de commercio concedidas às naçoens mais favorecidas, na forma que se acha exposto no papel n.º 3; porem não pode admittir os lanificios, sem que se lhe conceda hum equivalente igualao que lhe concede a Grã-Bretanha; e neste ponto V. S.ª prezistirá absolutamente. Sua Mageste levantará igualmente as prohibiçoens que existem a respeito da introdução de coiros e bezerros francezes, contanto que sejam admittidos os nossos azeites de peixe debaixo dos mesmo direitos, que pagam os da America do Norte. Finalmente, S. Magestade se não negará a formar com a França hum Tratado de Commercio reciproco, debaixo dos mesmos principios que estabeleceo com a Russia. 5.º Que a Rainha Fidelissima satisfará ao Governo francez a somma de dous milhoens de cruzados, na forma que se acha exposto no papel n.º 5, e estenderá mais esta quantia na forma da nota que vai posta ao artigo 1.º do papel n.º 10.

842

Ver: IDEM, datado de Palácio de Queluz, 1796. 07. 19. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 215.

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Quadro 9- Ministro Plenipotenciário em Paris (1796-1798) Comunicações a montante

Príncipe Regente

SER SENEG SR/ Cartas SR/ Ofícios SR/ Cartas DOC/ Tratado DOC/ Decreto

SR/ Despachos SR/ Instruções DOC/ Ratificação

Ministro Plenipotenciário em Paris DOC/ Carta DOC/ Carta

Secretário da Legação

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Em anexo a este despacho seguiu um vasto conjunto de cópias de documentos que serviram de apoio ao diplomata português, como uma carta de Pérignon, embaixador da República Francesa em Madrid, em que declara ao Príncipe Regente que Portugal não se encontra em estado de neutralidade pois entrou na coligação de potências que combateram a sua Pátria843; despachos de Luís Pinto para Diogo de Carvalho e Sampaio solicitando explicações com liberdade e sem rebuço sobre a verdadeira situação de Portugal junto do ministério espanhol844; e a Convenção assinada entre Portugal e a Grã-Bretanha em Londres por D. João de Almeida de Melo e Castro e Lord Greenville845; cálculo do valor das presas que os franceses têm feito a Portugal durante a presente guerra846. Assim, desde a nomeação até à partida de Araújo para Paris, no dia 4 de Outubro de 1796, toda a preparação das negociações conhecerá tramitação pela legação da Haia. O início efectivo de funções em Paris regista-se no dia 12 de Outubro de 1796 data em que procede à entrega dos plenos poderes a Charles Delacroix, ministro das Relações Exteriores, que por seu lado os haveria de apresentar ao Directório Executivo847. A partir deste momento, verifica-se a recepção de correspondência de Luís Pinto de Sousa, com um sentido descendente e que se reveste de um cariz normativo e regulador das dinâmicas adoptadas pelo diplomata na negociação848 (ver Quadro 9). Estes despachos originais autógrafos obedecem a uma estrutura formal rigorosa, nunca são numerados, raramente ultrapassam um ou duas páginas, onde está escrito um texto sucinto, escrito de forma sóbria, clara e objectiva para não permitir ao diplomata vacilar no terreno das negociações. É o veículo de comunicação primordial nesta correspondência descendente. Com o despacho segue, em anexo, as instruções, os plenos poderes, a ratificação de tratados e toda a documentação necessária ao diplomata para um eficaz desempenho da sua missão. Estes documentos, estão balizados

843 Ver: Ofício de Pérignon, embaixador da República Francesa em Madrid, em resposta à carta do Príncipe Regente de Portugal. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 217, 2. 844 Ver: Despacho de Luís Pinto de Sousa para Diogo de Carvalho e Sampaio, datado de Palácio de Queluz, datado de 1796. 06. 25. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 217, 3; Extracto de uma carta de Luís Pinto de Sousa para a Diogo de Carvalho e Sampaio, datada de 1796. 07. 16. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 217, 5. 845 Ver: Convenção entre Portugal e Inglaterra assinada em Londres por D. João de Almeida de Melo e Castro e Lord Greenville, datada de 1795. 09.26. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 217, 7. 846 Ver: Cálculo do valor das presas que os franceses têm feito aos portugueses durante a presente guerra. 1796. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 217, 8. 847 Ver: Minuta do ofício n.º 1 de António de Araújo de Azevedo para Luís Pinto de Sousa, datado de Paris, 1796. 10. 15. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 114. 848 Ver: Despachos de Luís Pinto de Sousa para António de Araújo de Azevedo. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 228; DOC. 3, 236; DOC. 3, 246; DOC. 3, 238.

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cronologicamente por 6 de Julho de 1796849 e 5 de Maio de 1798, data em que se ordena ao diplomata, já então na Haia, que abdique das conversações informais com Delacroix, também ele diplomata na Haia, pois o Directório Executivo recusa terminantemente a admissão de Araújo para qualquer negociação e, também, porque o estabelecimento da paz decorria agora pela corte de Madrid sob a mediação de S. M. C.850. Por esta via, o Ministro concedia autorização a António de Araújo para comunicar com diplomatas portugueses como Diogo de Carvalho e Sampaio, em Madrid851, D. João de Almeida de Melo e Castro, em Londres852, e D. Lourenço de Lima, em Viena853, ou com diplomatas estrangeiros, como Lord Malmesbury854, abrindo assim as portas das comunicações horizontais endógenas e exógenas. Ou ainda, para obter um crédito sobre casas abonadas para fazer face a despesas pontuais, logo que haja certezas que o Directório aceita a ratificação portuguesa do tratado de 10 de Agosto855. Importa referir que os despachos referentes à missão de Paris confundem-se sobremaneira com os da legação da Haia, uma vez que a sua estrutura formal não contempla a aposição do local de destino, bem como pelo facto de, neste intervalo de dois anos, o tema primordial das comunicações do Ministro ser o estabelecimento da paz com a França. No sentido ascendente, seguiam os ofícios numerados de Araújo, que se iniciam a 15 de Outubro de 1796, três dias depois da chegada do diplomata português à capital francesa, e se prolongam até 27 de Abril de 1797, data em que é intimado a sair do território francês pela falta de vontade do Directório em prosseguir com a negociação. O rompimento da negociação obrigava-o a sair no prazo de 24 horas, o que seria satisfeito, com uma passagem por Hamburgo antes de passar à Haia856, de onde continuaria a escrever oficialmente ao seu superior hierárquico mantendo a numeração sequencial iniciada em Paris857.

849

Ver: IDEM, datado de Palácio de Queluz, 1796. 07. 06. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 213. Ver: IDEM, datado de Palácio de Queluz, 1798. 06. 05. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 261. 851 Ver: Despacho de Luís Pinto de Sousa para António de Araújo de Azevedo, datado de Palácio de Queluz, 1796. 11. 02. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 225. 852 Ver: IDEM, datado de Palácio de Mafra, 1797. 10. 08. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 244. 853 Ver: IDEM, datado de Palácio de Queluz, 1797. 06. 12. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 238. 854 Ver: IDEM, datado de Palácio de Queluz, 1796.11.23. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 226; IDEM, datado de Palácio de Queluz, 1796. 12. 30. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 227. 855 Ver: IDEM, datado de Palácio de Mafra, 1797. 10. 09. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 245. 856 Ver: Ofício n.º 19 de António de Araújo de Azevedo para Luís Pinto de Sousa, datado de Paris, 1797. 04. 26. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2,132. 857 Ver a série de cartas de António de Araújo de Azevedo para Luís Pinto de Sousa. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 133; DOC. 2, 134; DOC. 2, 135; DOC. 2, 140; DOC. 2, 141. Ver: Ofícios de António de Araújo de Azevedo para Luís Pinto de Sousa. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 2, 136; DOC. 2, 137; DOC. 2, 138; DOC. 2, 139; DOC. 2, 142. 850

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Os ofícios de António de Araújo de Azevedo têm por função levar ao governo português e à Real Presença os contornos da negociação no terreno. Escritos em papel de formato grande, possuem um carácter expositivo, narrando minuciosamente todos os passos dados pelo diplomata, mas solicitam, também, instruções complementares e pareceres pontuais sobre os assuntos em debate com os ´ministros franceses. No arquivo de António de Araújo estes ofícios figuram hoje sob a forma de minutas. Refira-se que, durante o tempo em que esteve preso na Torre do Templo, António de Araújo continuou a escrever ao superior hierárquico de forma oficial, muito embora não se alongasse muito nos pormenores da sua prisão. Será a partir da Haia que reunirá toda a documentação relacionada com a sua prisão e a remeterá a Luís Pinto de Sousa. No esquema de comunicações a montante denota-se também a existência de um canal de comunicação em direitura ao Ministro do Reino, José de Seabra da Silva. Trata-se de uma série de cartas, cujas minutas António de Araújo conservou no seu arquivo. Não possuem a rigidez dos ofícios enviados para o SENEG, porque revelam traços de correspondência particular, sem tramitação burocrática. Além disso, têm uma evidente importância no rumo das negociações, pois demonstram a existência de uma segunda corrente de opinião no gabinete ministerial de Lisboa, nomeadamente a do próprio Príncipe Regente858. Esta questão vem levantar a pertinência de uma ténue linha entre os documentos de cariz oficial que conheceram tramitação burocrática na Secretaria de Estado e os restantes, sendo de salientar que tanto uns como outros têm impacto nas negociações encetadas pelo diplomata (ver Quadro 9). Como vimos, é pelos despachos de Luís Pinto de Sousa que se abrem as portas das comunicações horizontais endógenas para António de Araújo (ver Quadro 10).

858 Ver: Minutas das cartas de António de Araújo para José de Seabra da Silva. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 300; DOC. 3, 301.

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Quadro 10 - Ministro Plenipotenciário em Paris (1796-1798) Comunicações horizontais

Directório Executivo

Príncipe Regente

SR/ Pareceres

SENEG Diogo de C. e Sampaio Emb. em Madrid

SR/ Cartas

SR/ Notas SR/ Cartas SR/ Mem.

SR/ Cartas D. João de Almeida Emb. em Londres

D. Lourenço de Lima

SR/ Notas SR/ Cartas SR/ Memorias SR/ Pareceres

Ministro Plenipotenciário em Paris

Delacroix Min. Rel. Exteriores

SR/ Notas SR/ Cartas SR/ Cartas

Talleyrand Min. Rel. Exteriores

SR/ Cartas

E. E. Congresso Lille

SR/ Cartas

SR/ Oficios SR/ Cartas

Du Ramel Min. Finanças

SR/ Pareceres

Rep. do Povo Comissão de análise do Tratado

A correspondência com Diogo de Carvalho e Sampaio, embaixador em Madrid859, está relacionada, em primeiro lugar, com a necessidade de se ter alguém na corte espanhola, para auscultar e intervir sempre que necessário em benefício da negociação de Paris. Depois, a localização geográfica da legação permitia ao embaixador em Madrid funcionar como uma espécie de intermediário na remessa dos correios tanto ascendentes como descendentes860, ganhando especial relevo a ratificação da coroa portuguesa861 e até a orientação da remessa dos diamantes destinados a pagar a indemnização acordada com o tratado de 10 de Agosto de 1797862. As cartas originais do embaixador português em Madrid estão balizadas cronologicamente entre 20 de Novembro de 1796 e 27 de Dezembro de 1797, véspera da prisão de Araújo. Apesar de apresentarem uma estrutura formal próxima da correspondência particular, devem ser consideradas como cartas oficiais. A sua importância no contexto negocial é inegável, pois asseguram o funcionalmento do eixo de comunicação Lisboa-Paris e, paralelamente, contêm um conjunto diversificado de informações sobre as movimentações políticas que se fazem sentir na corte de S. M. C., parte interessada no desfecho das conversações de Madrid863. À semelhança da comunicação com Diogo de Carvalho e Sampaio, também será por despacho do SENEG que António de Araújo iniciará uma correspondência com D. Lourenço de Lima, mas já depois da primeira negociação. No decorrer das negociações em Paris, Araújo fora encarregado pelo Ministro de passar ao congresso de Lille para negociar os artigos 5.º e 6.º do tratado, bem como para negociar a paz conjunta com a França, Inglaterra e a Espanha. Teria por companheiro D. Lourenço de Lima, também ele investido do carácter de Ministro Plenipotenciário. Seria de Bosbeck, próximo de 859 Diogo de Carvalho e Sampaio foi embaixador em Madrid entre os anos de entre Julho de 1796 e Janeiro de 1801, substituindo D. Diogo de Noronha “embaixador de família”. Ficou conhecido também por ser físico, sócio da Academia das Ciências de Lisboa, tendo publicado o Tratado das Cores […] em 1787, Dissertação sobre as cores primitivas […] em 1788 Elementos de Agricultura, em 1790. (Ver: SAMPAYO, Luis Teixeira de – ob. cit., p. 98; SILVA, Inocêncio Francisco da – ob. cit., Tomo II, MDCCCLIX, p. 151). 860 São várias as cartas em que Diogo de Carvalho de Sampaio se refere ao reecaminhamento dos correios com ofícios de Araújo para Lisboa e dos despachos de Luís Pinto no sentido inverso. Ver: Cartas de Diogo de Carvalho e Sampaio para António de Ararújo de Azevedo. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 275; DOC. 3,281; DOC. 3,282; DOC. 3,284; 861 Ver: Cartas de Diogo de Carvalho e Sampaio para António de Araújo de Azevedo, sobre o envio da ratificação para Paris, ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3,287; DOC. 3,289 862 Ver: Cartas de Diogo de Carvalho e Sampaio para António de Araújo de Azevedo sobre o correio dos diamantes, ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 279; DOC. 3,289; DOC. 3, 291. 863 Na carta de 6 de Janeiro de 1796, Carvalho e Sampaio aconselha a António de Araújo que, durante a negociação, evite remeter notas escritas aos negociadores franceses, sendo preferível optar pelas informações verbais que deveria, depois ser comunicadas porescrito para a corte portuguesa. (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3,274); Noutra dessas cartas Diogo de Carvalho e Sampaio aconselhava Araújo a mostrar-se mais franco com o embaixador de Espanha em Paris para evitar ciúmes e desconfiança. Nessa mesma carta salienta que mesmo que os franceses não aceitem as propostas de Araújo “será sempre melhor demorar a negociação do que rompê-la” (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 275); Na carta de 21 de Agosto de 1797, acusando a recepção da notícia de conclusão da paz, participa que o Príncipe da Paz demonstrou grande satisfação pela conclusão da paz (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3,278); Mais tarde, em virtude do atraso na ratificação portuguesa, o Príncipe da Paz diria a Diogo de Carvalho e Sampaio que “se os franceses duvidassem fazer a paz com Portugal, debaixo das condições expressas, que não contassem com a Espanha para fazer a guerra a Portugal”. 1797.12.27 (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3,294).

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Haarlem, que, a 25 de Julho de 1797, Araújo dirigiu o ofício n.º 1 a D. Lourenço de Lima participando que partia para Paris, de onde remeteria os necessários passaportes para passar ao congresso864. A 7 do mês seguinte, informava que tinha remetido um expresso a Hamburgo com o despacho de nomeação e com o passaporte, mas informava que o Ministro das Relações Exteriores ainda não tinha convocado os aliados para o congresso865. As cartas de D. Lourenço de Lima, embaixador em Viena de Aústria, nem só ao congresso de Lille dizem respeito866. Na verdade tratam de outros assuntos como o apoio a José Bonifácio de Andrada e Silva, Manuel Ferreira da Câmara e Joaquim Pedro Fragoso da Mota de Sequeira, naturalistas portugueses que viajavam pela Europa numa viagem de instrução como pensionistas da coroa portuguesa867. As

comunicações

horizontais

exógenas

correspondem

à

negociação,

propriamente dita, com o ministros plenipotenciário francês e outros membros do Directório (ver Quadro 10). A negociação formal decorreu através de conferências e debates que juntam os dois negociadores frente-a-frente, mas tal não significa a inexistência de documentação. Do lado português regista-se o envio de memórias868, notas diplomáticas referentes a um único assunto869; notas verbais não assinadas, possivelmente entregues em mão pelo próprio, destinadas a assuntos menores como acusar a recepção de correspondência870 ou a marcar a data de uma conferência871; e ainda cartas, neste caso, a título de cortesia, em que expressa amizade pelo destinatário e lamenta o falhanço das negociações872. Por outro lado, a documentação remetida por Charles Delacroix é manifestamente superior e tipologicamente mais diversificada. Para além das cartas, utilizadas fora da negociação873, verifica-se o envio de notas que sustentam uma negociação sem a obrigatoriedade presencial e que rebatem profundamente os aspectos 864 Ver: Ofício de António de Araújo de Azevedo para D. Lourenço de Lima, datado de Bosbeek, 1797.07.25. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 295. 865 Ver: Minuta da carta de António de Araújo de Azevedo para D. Lourenço de Lima, datada de Paris, 1797.08.07. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 296. 866 Ver: Cartas de D. Lourenço de Lima para António de Ararújo de Azevedo, sobre o congresso de Lille, recepção da nomeação e dos passaportes, ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3,298; DOC. 3,299. 867 Ver: Carta de D. Lourenço de Lima para António de Araújo de Azevedo, datada de Viena, 1796.01.09. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 297. 868 Ver: Série de memórias enviadas por António de Araújo de Azevedo a Charles Delacroix. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3,323; DOC. 3,324; DOC. 3,328; DOC. 3,329; DOC. 3, 330; DOC. 3,331; DOC. 3,333; DOC. 3,334; DOC. 3,335. 869 Ver: Série de notas de António de Araújo de Azevedo para Charles Delacroix. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 332; DOC. 3, 327; DOC. 3, 332; DOC. 3, 336; DOC. 3, 342. 870 Ver: Nota de António de Araújo de Azevedo para Charles Delacroix. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 325. 871 Ver: IDEM. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 326 872 A carta de António de Araújo é datada de 27 de Abril de 1797, um dia depois de se ter chegado ao impasse negocial. Ver: Carta de António de Araújo de Azevedo para Charles Delacroix, datada de Paris, 1797.04.27. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 336 873 Ver: Carta de Charles Delacroix para António de Araújo de Azevedo, datada de Paris, 1797.06.02. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 348

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defendidos por Araújo, que marcam conferências874, apresentam outras soluções875 e definem prazos para a aceitação das propostas876. Durante a ausência de Araújo de Paris, que criou um vazio na legação portuguesa local, Talleyrand, recém-nomeado Ministro das Relações Exteriores, dirigiu-lhe diversas notas oficiais principalmente sobre assuntos comerciais, as quais acabariam por ser remetidas para a corte em Lisboa por manifesta falta de poderes do diplomata português877. Na segunda fase das negociações, o conjunto de interlocutores de Araújo é composto por Charles Maurice Talleyrand, Ministro das Relações Exteriores, Delacroix, Ministro Plenipotenciário nomeado pelo Directório, e Ramel de Nogaret, Ministro das Finanças. O tempo da chegada de Araújo a Paris para a segunda fase e a assinatura do tratado será relativamente curto: apenas 7 dias durante os quais decorreram negociações presenciais. No dia 10 de Agosto procedeu-se à assinatura do tratado de paz878, bem como dos projectos de artigo secreto, ambos assinados pelos dois negociadores, o segundo destes validado com os respectivos selos de armas em lacre879. Depois da assinatura do tratado e durante a espera pela ratificação da coroa portuguesa, que viria a revelar-se longa, é que Talleyrand começa a remeter cartas para António de Araújo de Azevedo880, as quais seriam depois copiadas pelo secretário do diplomata e remetidas para o SENEG, permanecendo os originais no seu arquivo881. De Delacroix, conta-se, ainda, variada documentação como memórias corográficas intitulada Observations sur les limites de la Guyane882 e um conjunto de outras cinco sobre o mesmo tema883, a cópia do artigo do tratado provisional concluído

874

Ver: Nota de Charles Delacroix para António de Araújo de Azevedo, datada de Paris, 1797.03.01. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 338 Ver: Nota em que Delacroix apresenta o projecto dos artigos de paz entre a república Francesa e S. M. F., datada de Paris, 1797.03.03. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 339 876 Na carta de 12 de Novembro de 1796 Delacroix solicita a António de Araújo uma resposta decisiva sobre os pontos capitais do tratado proposto pelo Directório Executivo, apresentado na última conferência. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 337. A 22 de Abril de 1797 comunica a Araújo as intenções do Directório para a conclusão da paz e recusa o prolongamento do prazo para que Araújo receba novos poderes da sua corte. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 345. 877 Ver: Minuta das cartas de António de Araújo para Charles Maurice de Talleyrand. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 355; DOC. 3, 356; DOC. 3, 357. 878 Ver: Cópia do tratado de paz e de amizade entre S. M. F. a Rainha de Portugal e a República Francesa. Paris, 1797.08.10. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 4, 377. 879 Ver: Artigo separado e secreto no qual S. M. F: se obriga a ceder à República Francesa uma soma de 10 milhões de francos, metade em dinheiro e metade em diamantes. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 4, 371. 880 Ver: Cartas de Charles MAurice de Talleyrand para António de Araújo de Azevedo. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3,359 – DOC. 3,370. 881 No cabeçalho dos originais, António de Araújo anotava o número e a data do ofício em que as cartas de Talleyrand seguiram para Lisboa. Ver a título de exemplo ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 359. 882 Ver: Observations sur les limites de la Guyane. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 4, 413. 883 Ver: Conjunto de cinco memórias relativas aos limites das Guianas francesa e portuguesa, apresentado ao Directório. DOC. 4, 414. 875

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em Lisboa a 12 de Abril de 1700884. Já depois da assinatura do tratado de 10 de Agosto é por esta via que chegam a Araújo uma série de pareceres sobre o tratado, nos quais se incluem os do Directório Executivo885, os da Comissão886 e os de diversos cidadãos como Girardot, De Laage, Chaumot e Lecomte887. Por seu lado, Ramel de Nogaret888 terá sido chamado a intervir na negociação para se pronunciar sobre a indemnização a pagar por Portugal à República Francesa, coadjuvando assim o ministro das Relações Exteriores. Nessas funções remete a Araújo diversas notas em que anuncia uma audiência do ministro das Relações Exteriores889 ou, já depois da assinatura do tratado, em que remete os artigos secretos e separados assinados por Delacroix890. A jusante do diplomata português, e segundo o Quadro 11, encontra-se uma série de representações dirigidas ao diplomata português por negociantes portugueses, como José Carvalho, e por comerciantes franceses como Jacques Lebrun, Roel, Gillet, Garésche e Dupetit Houars891. Ainda no mesmo quadro, verificamos a existência de correspondência trocada com diversas pessoas sobre a abertura de um crédito, em Outubro de 1797, devidamente autorizado pelo SENEG. O anúncio da autorização é dado, como vimos, pelo despacho de Luís Pinto que paralelamente o comunica a Jacinto Fernandes Bandeira. Será Fernandes Bandeira a informar, por carta, o ministro plenipotenciário português da abertura do crédito892. Os contornos do crédito e o início do saque podem ser analisados na correspondência trocada entre Araújo e Henrique Gildemeester, em Amsterdão893, e João Gabe & Cia. em Hamburgo894. A missão de 1801 possui contornos substancialmente diferentes. Em primeiro lugar, importa referir que no início desse ano a Secretaria de Estado tinha sido dividida 884

Ver: Cópia do artigo do tratdo provisional comcluído em Lisboa a 12 de Abril de 1700. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 393. Ver: Série de Pareceres. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 4, 380; DOC. 4, 381; DOC. 4, 382; DOC. 4, 383. 886 Ver: Parecer da Comissão sobre o tratado de paz e amizade de 10 de Agosto de 1797 assinado entre Portugal e a República Francesa. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 4, 378. 887 Ver: Parecer dos cidadãos Girardot, De Laage, Chaumote Lecomte sobre o tratado de paz. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 4, 379 888 Ramel de Nogaret, ou simplesmente Ramel como assina os documentos, foi ministro das Finanças do Directório executivo entre 14 de Janeiro de 1796 e 20 de Julho de 1799. Cf. Dictionnaire Historique de tous les Ministres, depuis la Revolution jusqu’en 1827, publié par M. Léonard-Gallois […], Paris, Charles-Béchet, Libraire-Commissionaire, 1828, pp. 400-401 889 Ver: Carta de Du Ramel para António de Araújo de Azevedo, datada de Paris, 1797. 08. 15. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3,353 890 Ver: Ofício de Du Ramel para António de Araújo de Azevedo, datado de Paris, 1797. 08. 19. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 4,372 891 Ver: Série de representações de negociantes franceses dirigidas a António de Araújo de Azevedo. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 4, 384; DOC. 4, 385; DOC. 4, 386; DOC. 4, 387; DOC. 4, 388. 892 Ver: Carta de Jacinto Fernandes Bandeira para António de Araújo de Azevedo, datada de Lisboa, 1797.10.10. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 400. 893 Ver: Cartas de Araújo para Henrique Gildemeester. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 402; DOC. 403, fl. 2 v.; Cartas de Henrique Gildemeester para Araújo, ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 401; DOC. 404. 894 Ver: Carta de António de Araújo de Azevedo para João Gabe. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 403, fl. 1. 885

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em duas: a da Guerra, entregue ao duque de Lafões, também Ministro Assistente ao Despacho e Conselheiro de Estado; e a dos Negócios Estrangeiros que fica sob a égide de Luís Pinto de Sousa Coutinho, também ele Conselheiro de Estado895. Esta simples alteração do gabinete ministerial provocará alterações profundas na tramitação documental, conforme se depreende pelo Quadro 12. O aviso de convocatória para a Real presença dirigido a Araújo, datado de 28 de Março de 1801, é assinado pelo duque de Lafões896, e nessa ocasião, o diplomata terá sido informado do estado das relações com a Espanha e com a França. O agravamento das mesmas fez com que, a 14 de Abril, o secretário particular do Príncipe convoque António de Araújo para vir imediatamente à Real Presença pois o Principe Regente acaba de receber hum expresso com cartas de Madrid897. Araújo terá recebido as ordens régias para partir imediatamente para ir negociar a Paris para negociar a paz. O conteúdo das cartas e avisos de Lafões deve ser considerado como oficial, muito embora tenha sido concebida à margem das regras formais devidas. É por esta via que se assiste à preparação e ao envio das instruções e os parágrafos adicionais assinados pelo Regente e por Lafões, que legitimarão a acção de António de Araújo. Foram estas cartas os documentos normativos da missão de Araújo como se depreende do exemplo seguinte: O Principe Meu Senhor tendo-se dignado conferir-me a direcção da comissão que V. S.ª se acha encarregado para concluir e asignar a Pax de Portugal com a Republica Franceza assim como tambem de Portugal com a Hespanha foi servido ordenar para huma e outra negociação as instruções que na Carta Regia junto remeto a V. S.ª da parte do mesmo Senhor a fim de que por ellas se regulle cumprindo o seu theor exactamente. O mesmo Senhor ordena outro sim que no decurso destas negociações, haja V. S.ª de lhe remeter directamente os seos officios correpondendo-se tambem consigo, imidiatamente sobre este mesmo objecto, para o que remeto a V. S. duas cifras pelas quais unicamente se deverá fazer esta correspondencia898.

As instruções remetidas a Araújo, para negociar um tratado de paz com a França e hum accomodamento com a Hespanha, são assinadas pelo duque de Lafões e pelo Regente, possuindo uma estrutura formal. São redigidas em papel de grande formato, 895

Cf. SUBTIL, José – “Os poderes do centro”, p. 178. Ver: Aviso do duque de Lafões para António de Araújo de Azevedo. Lisboa, 1801. 03. 28. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 4, 431. 897 Ver: Carta de José Egídio Álvares de Almeida para António de Araújo de Azevedo, Palácio de Queluz, 1801. 04.14. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 4, 451. 898 Ver: Aviso do duque de Lafões para António de Araújo de Azevedo, datado de 1801.04.13. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 4,436. 896

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com escrita objectiva e rigorosa, seguindo os necessários pressupostos formais e identificando claramente o objecto da negociação, o percurso geográfico a seguir até ao local e os principais artigos sobre a forma de empreender a negociação899. Mas é também o Ministro da Guerra, que coordenava o gabinete, quem recolhe dos restantes toda a documentação necessária ao diplomata para o desempenho das suas funções, assistindo-se à requisição de cópias de tratados em vigor à Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e a outros documentos à Secretaria da Marinha. A preparação da negociação exige do diplomata um esforço de compreensão dos últimos acontecimentos registados envolvendo as três potências. Por um lado, pesquisa nos periódicos os últimos desenvolvimentos900 e, por outro, elabora uma memória sobre os documentos a requisitar à Secretaria de Estado por onde corre o negócio. Segundo esse documento, aos Negócios Estrangeiros, deviam ser requisitados pelo ministro da Guerra os tratados em vigor e outros acordos, com especial destaque para o de 10 de Agosto de 1797 e a sua ratificação condicional e plena que se mandou para as cortes de Madrid e Paris; as cópias dos ofícios de Araújo até ao tempo da sua prisão na Torre do Templo; os ofícios que se enviaram para Londres depois da assinatura daquele diploma; as instruções dadas ao conde de Vila Verde, embaixador em Madrid; os ofícios trocados com Londres em especial os de Lord Greenville que foram alvo de apreciação em Conselho de Estado; os pareceres de Barbée Marbois, membro do Conselho dos Anciãos, sobre os artigos do tratado de 10 de Agosto referentes à demarcação dos limites da América; e o último tratado com a Rússia. À Secretaria da Marinha, devia ser requisitado um mapa o mais fiel possível dos limites de Caiena e do Pará; o sumário das notícias topográficas realizadas pelo governador do mesmo distrito; a balança de comércio entre Portugal e suas colónias e países estrangeiros; e a notícia sumária do estado em que se acha a reclamação de um navio português tomado pelos ingleses.

899 Ver: Instruções do Príncipe Regente para António de Araújo de Azevedo, datado de 1801.04.13. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 4, 436,1. 900 Ver: Cópia da representação dos espanhóis a seu rei depois de declarar guerra a Portugal. Impressa em Madrid no princípio do ano de 1801 e logo suprimida. Madrid, 1801. 03.03. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 4, 422.

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Quadro 11 - Ministro Plenipotenciário em Paris (1796-1798) A jusante

Príncipe Regente

SENEG

Ministro Plenipotenciário em Paris

DOC/ Carta

DOC/ Carta

SR/ Cartas DOC/ Carta

Jacinto F. Bandeira

Henrique Gildemeester

João Gabe & Cia.

SR/ Cartas

João Gildemeester

SR/ Representações

SR/ Representações

Negociantes portugueses

Negociantes franceses

Quadro 12- Ministro Plenipotenciário em Paris (1801) Comunicações a montante

Secretário Particular

Príncipe Regente

MSEG e MAD

DOC/ Aviso

MSENE

MSEMDU

DOC/ L.º Registo DOC/ Aviso

SR/ Despachos DOC/ Carta Patente DOC/ Aviso DOC/ Tratado

SR/ Ofícios

SR/ Despachos SR/ Avisos SR/ Cartas DOC/ Instruções DOC/ Parecer C. E. SR/ Ofícios

SR/ Ofícios DOC/ Nota SR/ Cartas

DOC/ Aviso

António de Araújo Min. Plenipotenciário

Nas palavras do diplomata português: A comunicação de todos estes papéis hé indispensável para o negociador cumprir com os seus deveres, e não ver esterilizado o seu zelo em ocazioens oportunas pela carencia de notícias, evitando-se assim o risco de falsas conjecturas, e combinações erradas.901

O que se depreende desta situação é que Luís Pinto de Sousa, Ministro dos Negócios Estrangeiros, foi colocado numa posição secundária e lateral nesta negociação, estando apenas incumbido, por um lado, de fornecer ao Ministro da Guerra a documentação necessária existente nos livros de registos da sua Secretaria, para poderem baixar ao diplomata por cópia, e, por outro lado, de cumprir as obrigações inerentes aos Negócios Estrangeiros como mandar lavrar a carta patente de plenos poderes, o instrumento que outorga ao diplomata a capacidade de negociar em nome do seu Soberano, e os decretos relativos às ajudas de custo902. Por outro lado, esta estrutura administrativa, coloca Araújo numa situação de dupla responsabilidade: tem de informar o Príncipe, via Ministro da Guerra, dos contornos da negociação que empreende, e é obrigado a endereçar à Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros os comprovativos das despesas efectuadas durante a mesma903. Toda a documentação coligida pelo negociador português, nomeadamente no âmbito dos seus contactos com as partes envolvidas na negociação os dignitários franceses e o embaixador espanhol, é conservada no arquivo do diplomata, mas sobe à presença do Secretário de Estado da Guerra por cópia e como anexo dos seus ofícios. Por exemplo, as cartas de Denis Decrés, principal interlocutor de Araújo nos dias de Lorient, são copiadas e remetidas ao superior hierárquico do negociador português, enquanto que o documento original é conservado pelo diplomata no seu arquivo, sendolhe aposto o número e a data do ofício em que seguiu para Lisboa904. Já aqui referimos que a negociação propriamente dita não vem a acontecer, muito embora se tenha registado um fluxo informacional horizontal exógeno.

901

Ver: Lista de documentos. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 4, 427, 2. Ver: Despacho de Luís Pinto de Sousa para António de Araújo de Azevedo, datado de 1801. 05. 28. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 4, 454. 903 Ver: Série de ofícios de António de Araújo para Luís Pinto de Sousa. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 4, 443; DOC. 4, 444; DOC. 4, 445; DOC. 4, 446. 904 A este propósito veja-se o ofício de Denis Décres datado de Port Lorient, 1801. 06. 09, no qual Araújo anotou: N.º XXIII. Pertencente ao officio n.º 9 escrito de Lorient em 10 de Junho de 1801. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 4, 458. 902

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Antes da sua partida de Lisboa, António de Araújo escreveu uma carta a Talleyrand informando que o Príncipe Regente tinha abdicado da mediação de S. M. C. e que o havia nomeado para ir a Paris negociar a Paz. Nessa carta participou que se dirigia em direitura a Port Lorient onde desembarcaria e solicitava ao Ministro francês, a quem intitula de Pacificateur, o envio dos necessários passaportes905. As mesmas informações seriam dadas por carta ao embaixador francês em Madrid, comunicando que partia no dia 16 de Abril para França, num navio parlamentar, e solicitando-lhe que informe o Primeiro Cônsul da sua iniciativa906. À chegada a Port Lorient, Araújo recebe uma carta de Talleyrand na qual é informado de que o Primeiro Cônsul é da opinião de que as negociações devem prosseguir em Madrid e não em França907. Como o diplomata fica retido em Lorient e impossibilitado de passar à capital francesa, o seu interlocutor passa a ser o contra-almirante Denis Decrés, prefeito marítimo daquela cidade portuária, responsável por assegurar a via de comunicação para Paris. Na verdade, seria este contra-almirante a citar uma carta de Talleyrand, na qual sustentava que a presença de Araújo em França era uma contradição pois o Príncipe da Paz estava em território português e a corte de Lisboa tinha enviado um negociador a Badajoz, o embaixador da República Francesa em Espanha estava encarregado de negociar a paz com S. M. C. e o próprio Araújo, depois de vinte e sete dias de espera em Lorient, pretendia iniciar uma negociação para a qual tinha poderes insuficientes et pour ainsi dire illusoires. Como tal, deveria partir imediatemente para a Corunha e, depois, passar a Madrid para negociar a paz das três potências908. À chegada a Lisboa, recebe o aviso do visconde de Anadia transmtindo a ordem de S. A. R. para Araújo devolver na Secretaria de Estado da Marinha os ofícios do governador e capitão-general da capitania do Pará que respeitam aos confins topográficos daquela capitania que são contíguos aos domínios franceses909.

905 Ver: Minuta de ofício de António de Araújo de Azevedo para Charles MAurice de Talleyrand. Datado de Lisboa, 1801.03.31. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 4,440. 906 Ver: Minuta da carta de António de Araújo de Azevedo para o emabixador francês em Madrid. Lisboa, 1801.04.15. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 4, 452. 907 Ver: Carta de Charles Maurice de Talleyrand para António de Araújo de Azevedo, datada de Paris, 1801. 05. 29. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 4,455. 908 Ver: Ofício de Denis Décres para António de Ararújo de Azevedo, datado de Lorient, 1801. 06. 09. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 4, 458. 909 Ver: Aviso do visconde de Anadia para António de Araújo de Azevedo, datado de Palácio de Queluz, 1801. 07. 10. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 465.

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1.4. ENVIADO EXTRAORDINÁRIO EM SÃO PETERSBURGO (1802-1803) 1.4.1. O EXERCÍCIO DE FUNÇÕES E AS COMPETÊNCIAS António de Araújo de Azevedo foi nomeado para a legação portuguesa em São Petersburgo com o carácter de Ministro Plenipotenciário e apresentou credenciais a 19 de Dezembro de 1802910. A 31 de Outubro de 1803, recebeu a carta revocatória escrita pelo punho do visconde de Anadia, Ministro e secretário de Estado da Marinha e dos Domínios Ultramarinos, portanto sem tramitação burocrática pela secretaria dos Negócios Estrangeiros e da Guerra911. A missão de Araújo teve por objectivo negociar uma aliança com o Imperador. 1.4.2. A PRODUÇÃO INFORMACIONAL Da passagem de António de Araújo por São Petersburgo restou apenas uma percentagem

residual

de

documentação

produzida.

Na

verdade,

os

fluxos

informacionais respeitam as linhas já descritas nas anteriores enviaturas. O diplomata encontrava-se na Haia, quando recebeu a nomeação para Enviado Extraordinário em São Petersburgo por despacho de D. João de Almeida de Melo e Castro912. Terá sido durante a viagem para São Petersburgo, onde chegou em Dezembro de 1802, depois de ter passado por Amesterdão, Hamburgo, Copenhaga e Estocolmo. Desde o momento da sua partida da Haia e até à entrega da carta de crença em São Petersburgo, António de Araújo de Azevedo endereçou ofícios913 ao Ministro dos Negócios Estrangeiros e da Guerra e esses documentos devem ser entendidos como parte integrante de um subsistema de informação Legação em São Petersburgo, porque foram precedidos do despacho de nomeação do SENEG. A carta de crença estabelece efectivamente o início das funções do diplomata, mas toda a documentação trocada com a Secretaria de Estado antes disso, não pode ser olvidada. Da Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e Guerra, por intermédio do oficial Santos António Ramos, assiste-se, também, ao envio de documentação imprescíndivel para regular a acção do diplomata na legação, nomeadamente os dois 910 Cf. INSTITUTO DIPLOMÁTICO – Relações Diplomáticas Luso-Russas. Colectânea documental conjunta (1722-1815), volume I, Lisboa: Instituto Diplomático, p. 751. 911 Ver: Carta do visconde de Anadia para António de Araújo de Azevedo, datada de 1803.10.31. ADB/UM/SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3,319. 912 Não encontramos o referido despacho, mas no seu ofício de 2 de Setembro de 1802, António de Araújo de Azevedo informava o seu superior hierárquico que no passado dia 12 tinha entregue a recredencial ao Presidente do Governo Batavo e ue no dia 7 de Setembro iniciaria a sua viagem para São Petersburgo. Ver: Ofício de António de Araujo de Azevedo para D. João de Almeida de Melo e Castro, datado de Haia, 1802. 09. 02. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3,311. 913 Ver: Minuta do ofício n.º 113 de António de Araújo de Azevedo, datado de São Petersburgo, 1802 [?]. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 317.

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tratados em vigor existentes entre Portugal e a Rússia: o tratado de Amizade, Navegação e Comércio, assinado a 27 de Dezembro de 1798; e o Tratado de Aliança Defensiva de 7 de Setembro de 1799914. Também António Joaquim de Morais, oficial da Secretaria de Estado, por carta dirigida a Araújo, acusa a recepção do ofício com a lista de despesas da legação de São Petersburgo, com comentários sobre os dinheiros do vice-cônsul José Maria Roversi e solicita ao diplomata para reduzir a réis o valor da despesa para que se pudesse mandar lavrar o decreto que ordena o pagamento dos valores915. Por aqui vislumbra-se um foco de comunicações a jusante nomeadamente com o vice-cônsul José Maria Roversi e, por ele, com os comerciantes portugueses em São Petersburgo onde Portugal detinha uma feitoria e uma não menos importante representação da Companhia da Agricultura dos Vinhos do Alto Douro. No desempenho das funções, assistimos ao entabulamento de comunicações horizontais quer endógenas quer exógenas. Nas primeiras, será de salientar a documentação dos diplomatas portugueses, como D. José Maria de Sousa, embaixador em Paris, que, por nota, solicita a António de Araújo que entregue o ofício incluso em Lisboa 916; nas segundas, a recolha de documentos provenientes do governo russo917. Curiosamente, a carta revocatória ou carta de chamada é assinada pelo Ministro da Marinha e dos Domínios Ultramarinos, visconde de Anadia portanto fora do circuito burocrático da própria secretaria da SENEG. Concebida com notória informalidade, tem no entanto, a advertência no próprio texto de que hé officio, e como tal transmite António de Araújo de Azevedo a ordem positiva [de S. A. R., para] que V. Ex.ª logo que receba esta, se ponha a caminho para esta corte, deichando [ilegível] o [Francisco José Maria de] Britto por Encarregado de Negócios, devendo V. x.ª fazer tal diligencia nesta jornada que este Ministério não saiba desta Real Resolução, se não pela sua chegada, e por V. Ex.ª mesmo. Comunico-lhe esta Real Ordem com o maior prazer possível, não me sendo possivel por ora dizer mais nada sobre o motivo da sua apressada e ordenada vinda, o que farei à sua chegada, devendo V. Ex.ª logo dirigir-se à minha Caza918. 914 Ver: Nota de Santos António Ramos remetendo duas cópias dos tratados celebrados entre Portugal e a Rússia, [s.d.]. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 5,530,21. Estes dois tratados encontram-se publicados na íntegra em INSTITUTO DIPLOMÁTICO – Relações Diplomáticas Luso-Russas. Colectânea Documental Conjunta (1722-1815), vol. I, 2004, pp. 440-454; 481-486. 915 Ver: Carta de António Joaquim de Morais, oficial da Secretaria de Estado, para António de Araújo de Azevedo, datado de Lisboa, 1803.04.09. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 318. 916 Ver: Nota de D. José Maria de Sousa para António de Araújo de Azevedo, datada de Paris, 1804. 03. 29. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3, 321. 917 Ver: Oukase do Imperador Alexandre I da Rússia agraciando com a Grã-Cruz de São Vladimir o conde de Schérémétoff. São Petersburgo, 1803. 04. 25. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 16,68. 918 Ver: Carta oficial do visconde de Anadia para António de Araújo de Azevedo, datada de Lisboa, 1803. 10. 31. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 3,319.

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2. O MINISTRO E SECRETÁRIO DE ESTADO 2.1. A GÉNESE E A EVOLUÇÃO DAS SECRETARIAS DE ESTADO É sabido que desde os primórdios da monarquia portuguesa o rei agia cum consilio, ou seja, era aconselhado na governação do reino por um grupo restrito de elementos que ele próprio nomeava e convocava. Na lógica governativa própria de uma sociedade feudal, o vassalo ficava obrigado a comparecer e a comunicar verbalmente o seu parecer cumprindo, assim, um dos deveres de lealdade para com o suzerano919. Em meados do século XIV, o segundo regimento de D. Pedro I contempla o cargo de Escrivão da Puridade, o qual foi ganhando protagonismo nos assuntos da governação,

ultrapassando

mesmo

a

figura

do

chanceler,

em

virtude

do

desenvolvimento das relações internacionais de Portugal, que extravasaram o quadro peninsular chegando à Grã-Bretanha920. Daí em diante foi mesmo presença efectiva junto do monarca pelo menos até 1619921. Com D. Fernando, surge como a figura principal da Administração, que concentra nas suas mãos todos os negócios políticos ainda os mais confidenciais, todas as negociações com países estrangeiros, toda a organização militar, todos os assuntos de maior consequência para os destinos da nação922.

Com D. João I, a sua influência aumenta de tal forma que, segundo Eduardo Brazão, se pode falar mesmo numa espécie de “Primeiro Ministro”. Com o regimento do Conselho de Estado promulgado por D. Sebastião, em 1569, passam a figurar na estrutura do Conselho de Estado um conjunto de secretários a quem compete tomar notas para serem presentes ao rei que não assistia à reunião: o do Reino, o das Mercês, o da Fazenda, e o dos Negócios da Repartição da Índia923. Portanto, é do interior do Conselho de Estado que se assiste à emergência de figuras que passam a ser responsáveis pelo despacho régio e será este núcleo a sofrer

919

Ver: TOVAR, Conde de – “O Arquivo do Conselho de Estado”, in: Anais da Academia Portuguesa de História, II Série, 11, 1961, p. 54. 920 Ver: BRAZÃO, Eduardo – “A secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros, criação de D. João V”, in: Revista Portuguesa de História, Tomo XVI, Coimbra: Faculdade de Letras, 1976, p. 52. 921 Ver: IDEM - p. 52-53. 922 Ver: TOVAR, Conde de – “O Escrivão da Puridade”, in: Estudos históricosI, tomo III, Lisboa, 1961, apud BRAZÃO, Eduardo – “A secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros (…), pp. 51-52. 923 Ver: MERÊA, Paulo – “Da minha gaveta. Os secretários de Estado do antigo regímen”, in: Boletim da Faculdade de Direito, vol. XL, Coimbra: Universidade de Coimbra, 1964, p. 174.

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transformações graduais durante as quase duas centúrias seguintes até à reforma das Secretarias de Estado em 1736. Em 1602, durante o domínio filipino, no seio do recém-criado Conselho de Portugal, figuravam quatro secretários, entre os quais um secretário “de Estado”, a quem competia todas as matérias e negócios de Estado e Justiça, e o provimento de todos os ofícios; o secretário responsável pelas matérias e negócios eclesiásticos e das Ordens Militares; o secretário do património e fazenda real; e o secretário das petições de parte e despacho delas924. Cinco anos depois, fazia-se nova alteração, optando-se pela concentração dos negócios em apenas duas secretarias: das matérias de Estado, as Eclesiásticas, das Ordens Militares e as de Justiça e Governo, a quem competia os provimentos de cargos e ofícios; e a do despacho das petições, mercês, provimentos de comenda e fazenda925. Em 1631, cria-se a nova secretaria de Estado da Índia e Conquistas que vinha juntar-se à Secretaria de Mercês, Ordens e Padroado e à Secretaria da Fazenda e Justiça, mas no final do domínio filipino, havia apenas duas secretarias: a de Estado e a das Mercês926. Depois da Restauração, a dinastia de Bragança viu-se na contingência de alargar os seus contactos pela Europa no sentido de legitimar a sua presença no trono português, dando origem a um novo quadro diplomático português. Com D. João IV, assiste-se à escolha de alguns dos membros do Conselho de Estado para seus secretários. Em 1643, era nomeado um Secretário “de Estado”, que despachava com o rei927. Pelo alvará de 29 de Novembro do mesmo ano, seriam reguladas as competências do secretário de Estado e instituída a secretaria das Mercês e Expediente que se ocuparia das restantes consultas, despachos e ordens com o intuito de distinguir a natureza dos vários negócios e tornar mais fácil o despacho régio. As mesmas razões estão na criação da secretaria da Assinatura em finais do século XVII928. Com D. Afonso VI, assiste-se à recuperação do cargo de Escrivão da Puridade, o qual foi entregue ao conde de Castelo Melhor que, com a sua destreza, impôs a sua 924 Ver: MEREA, Paulo – ob. cit. ; SUBTIL- Os poderes de centro, in: História de Portugal, dirigida por José MATTOSO, vol. 5, dirigido por António Manuel HESPANHA, [s.l.], Círculo de Leitores, 1993, pp. 176-177. 925 Ver: MERÊA, Paulo – “Da minha gaveta. Os secretários de Estado do antigo regímen”, in: Boletim da Faculdade de Direito, vol. XL, Coimbra: Universidade de Coimbra, 1964, p. 176. 926 Ver: IDEM - p. 176-178. 927 Segundo a “Forma com que El Rei Dom Joãoo 4.º que Deus tem despachava os negocios”: Às noites costumava [o Rei] despachar com o secretário de Estado, mas sem regra certa, segundo o pediam os negócios; umas vezes três e quatro noites continuadas, outras vezes passavam duas e três sem haver negócio que pedisse despacho; daquele e em todos os do dia entrava a falar o Secretário de estado prontamente ainda que Sua Majestade estivesse em qualquer outro despacho porque as ocupações daquele posto pedem muitas vezes resolução com brevidade e tocam quase todas masi ao serviço de El-Rei que ao benefício das partes. Apud SAMPAYO, Luis Teixeira de – ob. cit., pp. 9-10. 928 Ver: SUBTIL, José – “Os poderes do centro”, p. 177.

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supremacia num triunvirato ministerial. Pelo regimento de 12 de Março de 1663, o Escrivão da Puridade tinha funções equiparadas à de ministro do despacho dos reis, tendo substituído o cargo de chanceler-mor, e que durante a vigência de Castelo Melhor adquire incumbências dos negócios externos929. Competia-lhe gerir todos os assuntos que “tocavam ao Estado”, na expressão do alvará, isto é a correspondência com Príncipes estrangeiros em matérias de paz ou de guerra, os tratados, contratos, casamentos, alianças, as instruções públicas ou secretas aos diplomatas lusos. O escrivão detinha protagonismo no governo do reino, pois as suas ordens deviam ser cumpridas pelos secretários e tribunais como se fossem dadas pelo próprio rei por ser o escrivão da puridade uma voz nossa930. Com o afastamento de D. Afonso VI e a desgraça de Castelo Melhor, deixa de existir o cargo de escrivão da Puridade e as suas atribuições foram distribuídas por secretários do rei, ministros assistentes ou simplesmente privados que eram encarregados de vários assuntos pendentes. No fim da segunda década de Setecentos, as três secretarias criadas por D. João IV (a “de Estado”, a “das Mercês” e a “da Assinatura”) começariam a manifestar uma certa inoperância devido à imprecisão das respectivas atribuições [que] forçava à constante repetição dos circuitos burocráticos, sendo, com frequência, a mesma matéria despachada nas três instâncias931. O

Absolutismo932

vai

provocar

profundas

mudanças

no

aparelho

político-administrativo, no sentido de providenciar uma maior especialização burocrática, decorrente da complexificação do expediente e do próprio Estado. Se por um lado se assiste a uma tentativa de tornar célere o processo de decisão, por outro é inevitável falar-se em reforço de poder régio. Como vimos, a crescente complexificação e burocratização dos negócios públicos levaram D. João V a reestruturar as Secretarias de Estado. O alvará de 28 de Julho de 1736 marca a emergência da configuração moderna do governo do Reino, tendo provocado um progressivo apagamento da influência do Conselho de Estado e a derivação do exercício do poder desta instituição para as Secretarias de Estado. 929 Ver: MERÊA, Paulo – “Da minha gaveta. Os secretários de Estado do antigo regímen”, in: Boletim da Faculdade de Direito, vol. XL, Coimbra: Universidade de Coimbra, 1964. 930 Ver: IDEM - p. 182. 931 Cf. LOURENÇO, Maria Paula Marçal – “Estado e Poderes”, in: SERRÃO, Joel, MARQUES, A. H. de Oliveira (dir.) – Nova História de Portugal, vol. VII, coord. de Avelino de Freitas Meneses, [s.l.] Editorial Presença, p. 48. 932 Cf. MACEDO, Jorge Borges de - “Absolutismo”, in: SERRÃO, Joel (dir.) Dicionário de Hsitória de Portugal, [s.l.] Iniciativas Editoriais, [s.d.], vol. 1, pp. 8-14.

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No plano interno, esta reforma permitirá obter maior eficácia e rapidez no processo da decisão política e do despacho régio absorvendo, assim, a crescente burocratização procedente do reforço das prerrogativas políticas da monarquia em matéria de punição criminal e da protecção régia. No plano externo, permitirá acompanhar a evolução seguida pelos diversos Estados da Europa logo após a Conferência de Vestefália, nomeadamente, no reconhecimento do direito de soberania e do estabelecimento de relações diplomáticas entre os Estados. Mas, as razões da mudança prenderam-se sobretudo com a falta de Diogo de Mendonça Corte Real, e, segundo Eduardo Brazão, D. João V foi o primeiro a verificar que se tinha de entrar noutro sistema onde se não contasse apenas com o valor dos chefes, mas também com a preparação dos que haviam de preencher os lugares subalternos das Secretarias e a sua melhor arrumação dos documentos933.

Mas, o grande mentor da criação das Secretarias de Estado foi o Cardeal da Mota que, seguindo a influência francesa, dirigiu ao monarca uma carta de 23 de Maio de 1736, alertando para a necessidade da criação de três secretarias de Estado: a do Reino, a dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, e a da Marinha e Domínios Ultramarinos934. O preâmbulo do referido, depois de salientar o complicado esquema burocrático existente, cria três Secretarias: a dos Negócios Interiores do Reino, por onde deviam transitar todos os negócios que não tocassem ao expediente particular das outras duas, a saber, a da Marinha e dos Domínios Ultramarinos e a dos Negócios Estrangeiros e da Guerra935. Segundo Paulo Merêa, para além destas três secretarias, havia, ainda, o cargo de Ministro Assistente ao despacho, sucessor do de escrivão da Puridade, e que de certa forma completava o elenco ministerial.936 É também neste tempo que os ministros passam a designar-se por Secretários de Estado, tendo direito a receber o tratamento que a lei de 16 de Setembro de 1597 dava

933

Ver: BRAZÃO, Eduardo – “A Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros, criação de D. João V”, in: Revista Portuguesa de História, tomo XVI, Coimbra: Faculdade de Letras, 1976, p. 56. Cf. Carta do cardeal da Mota para D. João V, datada de 1736. 05. 23 apud BRAZÃO, Eduardo – ob. cit., pp. 56-58. 935 Ver: MERÊA, Paulo – ob. cit., p. 183. 936 Ver: IDEM - ob. cit. , pp. 183-184. 934

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ao Regedor da Casa da Suplicação e a outros cargos superiores937 e que beneficiariam, ainda, da distinção de terem voto em Conselho de Estado. Cada uma das secretarias de Estado ficavam dotados de um oficial maior e dos demais pessoal necessário para o seu expediente, conforme veremos. Mas, a missão fundamental destes secretários consistia em fazer subir à presença régia as consultas ou petições encaminhadas pelos secretários dos conselhos e tribunais e expedir, posteriormente, as resoluções tomadas938. Desta forma, participavam de forma activa no processo de decisão régia, pois competia-lhes aconselhar o monarca em diversos casos, propor e apoiar medidas legislativas nas suas áreas de comepetência. Segundo Ricardo Raimundo Nogueira, aos secretários de Estado competia apresentar a Sua Majestade os requerimentos que lhe dirigem os particulares, ou os tribunais e ministros, despachá-los na sua presença e receber da voz do Soberano as ordens que, em seu real, nome devem dirigir aos indivíduos e corporações a quem elas dizem 939 respeito .

Em suma, podemos referir que a lenta e gradual transformação da administração central portuguesa, principalmente após a Restauração de 1640, permitiu que os secretários de el-rei, existentes no seio do Conselho de Estado, se fossem transformando em verdadeiros ministros de Estado, tendo um raio de acção perfeitamente definido e um tratamento destinado. De facto, no início do seu reinado, D. João V era coadjuvado no governo do Reino pelo Conselho de Estado, mas o certo é que, a partir de 1736, os secretários começaram a assumir um invulgar protagonismo ao serem ouvidos pelo soberano acerca dos negócios da respectiva secretaria e ao velarem pela execução das ordens régias, facto que é bem perceptível na aposição da sua assinatura em diplomas régios940. Na verdade, pode dizer-se, com Merêa, que era pelos secretários de Estado que, sem quebra dos princípios monárquicos e do poder absoluto, pertencia o governo da nação941. Como tal, podemos sustentar que, a partir de 1736, assistiu-se a um lento esbatimento de uma estrutura de governo assente no regime polissinodal (Conselhos, 937

Ver: IDEM - p. 183. Ver: SUBTIL, José – “Os poderes do centro”, p. 178. 939 Ver: NOGUEIRA, Ricardo Raimundo – Prelecções de Direito Público, feitas no ano lectivo de 1795-1796 (Coimbra, 1858), p. 172 apud MEREA, Paulo – ob. cit., p. 184. 940 Ver: MERÊA, Paulo – “Da minha gaveta. Os secretários de Estado do antigo regímen”, in: Boletim da Faculdade de Direito, vol. XL, Coimbra: Universidade de Coimbra, 1964, p. 185. 941 Ver: IDEM - p. 185. 938

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Mesas e Tribunais)942 em detrimento da centralidade e que as Secretarias de Estado foram assegurando na estrutura político-administrativa do Reino. Quase meio século depois da criação das Secretarias de Estado, a Rainha D. Maria I, pelo decreto de 15 de Dezembro de 1788, anexou as presidências do Erário Régio e da Junta do Comércio e uniu-lhes o cargo de Ministro e Secretário de Estado da Repartição da Fazenda que, no entanto, só seria organizada em 6 de Janeiro de 1801. O alvará de 17 de Dezembro de 1790 vem anexar ao Erário Régio o Conselho de Fazenda e alarga, sobremaneira, as competências do Ministro e Secretário de Estado943. A carta de lei de 6 de Janeiro de 1801 desdobra a Secretaria dos Negócios Estrangeiros e da Guerra em duas, mas logo a 23 de Julho do mesmo ano, seria novamente reagrupada. O regime inaugurado em 1788, com quatro secretarias de Estado, mantem-se sem alteração para além da partida da corte para o Brasil, sendo apenas de notar a introdução da Regência do Reino, regida pelo alvará de 1736, que estava na dependência do governo no Rio de Janeiro.

942 943

Ver: LOURENÇO, Maria Paula Marçal – ob. cit., pp. 42 e segs. Ver: MERÊA, Paulo – ob. cit., p. 187; SUBTIL, José – “Os poderes do centro”, p. 178.

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2.2. MINISTRO

E

SECRETÁRIO

DE

ESTADO

DOS

NEGÓCIOS ESTRANGEIROS

E DA

GUERRA (1804-1808; 1815-1817) 2.2.1. A NOMEAÇÃO E AS COMPETÊNCIAS DO SENEG António de Araújo de Azevedo foi nomeado para Ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra por aviso do conde de Vila Verde datada de 6 de Junho de 1804944 e liderará o ministério durante a turbulenta crise diplomática que envolveu a Inglaterra e a França. Acompanhará a corte para o Rio de Janeiro nessas funções e só requer a exoneração de funções à chegada ao Rio de Janeiro945. Mais tarde, regressa ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, com certeza, depois de 24 de Janeiro de 1817, em substituição do falecido marquês de Aguiar946. Todavia, a vasta documentação existente no seu arquivo relacionada com o expediente desta secretaria leva-nos a crer que António de Araújo esteve incumbido interinamente da secretaria desde a morte do conde das Galveias, ocorrida a 18 de Janeiro de 1814947, ou então que coadjuvou o marquês de Aguiar no exercício destas funções. Exerceu funções até à sua morte em 21 de Junho de 1817. O Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra era o vértice superior de uma pesada máquina burocrática encarregue de gerir simultaneamente as relações diplomáticas com os Estados Estrangeiros e o aparelho militar português. Segundo o cardeal da Mota, a criação da Secretaria dos Negócios Estrangeiros era imprescindível mas como estes por si só não occupão entre nós huma Secretaria, e a elles pertencem Tratados de Paz e guerra e commercio exterior, lhe uno o expediente da Guerra ou da milícia, que ainda em tempo de paz dá que fazer a dois tribunaes, a saber, o Conselho de Guerra e Junta dos Três Estados; e assim as Consultas de ambos, Despachos de Mercês de Militares e mais requerimentos desta qualidade e da Administração das Vedorias, Hospitaes, Fortificações, etc., devem correr pela primeria Secretaria948.

944

Ver: Aviso do conde de Vila Verde para António de Araújo de Azevedo, datado de 1804.06.06. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 43,15. 945 Ver: Decreto de exoneração do cargo de Ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, solicitado por António de Araújo de Azevedo. Palácio do Rio de Janeiro, 1808.03.11. ANRJ-Secção Histórica, Colecção 15, livro 1, fl. 1v. 946 O marquês de Aguiar D. Fernando José de Portugal e Castro faleceu a 24 de Janeiro de 1817 deixando vagas as secretarias do Reino e dos Negócios Estrangeiros e Guerra. Ver: NOBREZA DE PORTUGAL E DO BRASIL, dir. de Afonso Zuquete, Lisboa: Editorial Enciclopédia, 1989, vol. II, p. 211. 947 ID., vol. II, p. 631-634. 948 Ver: Carta do cardeal da Mota a D. João V, datada de 1736.05.23. apud BRAZÃO – ob. cit., p. 57.

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Nas palavras do mentor da reforma das Secretarias de Estado nota-se a ténue linha divisória entre o expediente dos Negócios Estrangeiros e o da Guerra. Esse será um ponto fulcral na organização do expediente desta Secretaria de Estado. Com efeito a inquirição da produção informacional deste órgão da administração central implica que se conheça o seu correcto posicionamento na estrutura do Gabinete, bem como a sua orgânica. Porventura, as únicas alterações dignas de registo, ao nível do seu enquadramento no ministério e do cumprimento das suas competências, ocorrem em 1787 quando foi desdobrada temporariamente em duas repartições que foram entregues em regime de interinato a outros dois ministros: os Negócios Estrangeiros foram entregues ao Ministro da Marinha e os Negócios da Guerra entregue ao Secretário dos Negócios do Reino949. Já depois da viragem do século, mais propriamente a 6 de Janeiro de 1801, verifica-se nova cisão, sendo que a secretaria da Guerra, cometendo-se os respectivos negócios ao duque de Lafões, que acumulava com o cargo de ministro Assistente ao Despacho, enquanto que os Negócios Estrangeiros ficaram a cargo de Luís Pinto de Sousa, visconde de Balsemão nesse mesmo ano. No entanto, a alteração orgânica duraria pouco tempo, pois pelo aviso de 23 de Junho do mesmo ano voltou-se a unir os dois expedientes950. Mas, se o posicionamento da Secretaria de Estado não sofreu grandes alterações, desde o tempo da sua criação até ao Vintismo, a verdade é que a jusante foram-se registando alterações com os organismos dependentes num claro esforço de adequação às necessidades do seu objecto de gestão. A Secretaria de Estado estava dotada de uma secretaria, por onde corria o expediente das duas àreas referidas, permitindo o influxo de toda a documentação produzida pelos orgãos que estão na sua dependência, como também garantia a produção e a remessa dos documentos de carácter oficial nos sentidos ascendente, descendente e horizontal. Em 1807, era composta um oficial maior, um oficial maior graduado e um oficial de línguas; 20 oficiais (contando com os que estão no serviço diplomático no estrangeiro e outros ausentes), 1 ajudante de línguas, 2 ajudantes (um deles em Berlim) e 2 porteiros e guarda-livros951. Nos Negócios Estrangeiros estavam-lhe subordinados, a nível endógeno, as legações diplomáticas portuguesas no estrangeiro, como Madrid, Paris, Roma, Nápoles, Londres, Haia, Copenhaga, Berlim, Estocolmo, São Petersburgo, Viena de Aústria, 949

Ver: MERÊA, ob. cit., p. 183, nota 36. Ver: IDEM, p. 187. 951 Ver: Almanach do anno de 1807 […], p. 100-101. 950

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Sardenha e as Cidades Hanseáticas952, mas também os consulados e vice-cônsulados953 e, ainda, a Inspecção-Geral do Correio. Ao nível exógeno, contam-se em primeiro lugar as comunicações com os Soberanos e ministros estrangeiros, e depois com o corpo diplomático na corte de Lisboa. Por outro lado, importa referir que no âmbito dos negócios da Guerra estavam na dependência desta Secretaria de Estado diversos organismos, cada um deles com o rerspectivo de pessoal adstrito, como o Conselho da Guerra, orgão de natureza consultiva com atribuições de gestão logístico-militar e jurisdicional, como seja a conservação de fortalezas e arsenais, provimento de postos militares, negócios relativos à expedição de tropas e julgamento das causas relativas aos militares954.

Depois: o corpo militar das três armas, da metrópole e do ultramar, composto por Estado Maior, Corpo de Oficiais, o Real Corpo de Engenheiros, o Governador Armas da Corte e Província da Extremadura, com seu corpo miltar adjunto, o Governador e Capitão-general do Reino do Algarve, os Governadores de Armas das Províncias do Alentejo, Beira, Minho, Trás-os-Montes, Partido do Porto e os Governadores de Armas de praças e fortalezas. Na dependência da SENEG estava também a Junta dos Três Estados, criada em 1643, a quem competia administrar os fundos necessários à manutenção de todo o aparelho militar955, a Junta do Arsenal Real do Exército, uma pesada máquina burocrática criada pelo alvará de 12 de Janeiro de 1802, a Junta do Arsenal Real de Artilharia e depósito de Armas e Munições de Guerra da Cidade do Porto, criado pelo decreto de 12 de Julho de 1802, os hospitais militares e o Arquivo Militar, criado pelo decreto de 4 de Setembro de 1802, A partir de 1808 e até 1821, a Secretaria de Estado, no Brasil, manterá comunicações constantes com a Regência do Reino estabelecida em Lisboa.

952

Cf. Almanach do anno de 1807, p. 46-47. Veja-se a extensa relação de consulados e vice-consulados portugueses em Almanach para o anno de 1807, pp. 479-482. 954 Cf. SUBTIL, José – ob. cit., pp. 180-181; Cf. HESPANHA, António Manuel – As vésperas do Leviathan (…), pp. 256-257; IANTT - Direcção de Serviços de Arquivística - "Conselho de Guerra", in: Guia Geral dos Fundos da Torre do Tombo: Instituições do Antigo Regime, Administração Central (2), coord. de Maria do Carmo Jasmins Dias Farinha; António Frazão; elab. Maria do Carmo Jasmins Dias Farinha, Lisboa: IANTT, 1999, pp. 119-142. 955 Cf. SUBTIL, José – “Os poderes do Centro”, pp. 181-182; IANTT - Direcção de Serviços de Arquivística - "Junta dos Três Estados”, in Guia Geral dos Fundos da Torre do Tombo: Instituições do Antigo Regime, Administração Central (2), coord. Maria do Carmo Jasmins Dias Farinha; António Frazão; elab. António Frazão; Lisboa: IAN/TT, 1999, vol. 2, pp. 147-152. 953

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2.2.2. A PRODUÇÃO INFORMACIONAL As comunicações a montante legitimam o exercício do poder do Ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, na medida em que têm como principal interlocutor o Príncipe Regente (ver Quadro 13). Todavia, essa comunicação é assegurada por diversas vias: em primeiro lugar, através de contactos directos com o Soberano; depois, recorrendo a intermediário como o secretário particular do Príncipe Regente ou o ministro do Reino, que nestes anos acumulava com o cargo de Ministro Assistente ao Despacho. As notas do Príncipe Regente, escritas pelo seu proprio punho, referentes ao ano de 1807, constituem um instrumento que possibilita ao soberano exercer directamente a sua autoridade sobre o SENEG, mas manifestam também uma certa afectividade pois é sabido que o soberano raramente escreve cartas pelo próprio punho, manda-as escrever. O conde de Vila Verde diria, mais tarde, a Araújo que S. A. R. lê sempre as suas cartas956. Os assuntos contidos nesta correspondência estão exclusivamente ligados ao despacho de gabinete como, por exemplo, quando o Príncipe informa o Ministro do resultado das conversações que manteve, a 26 de Outubro de 1807, com o ministro de Inglaterra e salientava que faço estas regras para seu governo ou, mais tarde, já em 1816, quando aprova documentação que subiu do expediente da Secretaria de Estado, salientando que aprovo o officio incluzo e lembro a António de Araújo se o marques não seria próprio para o unir a Navarro no negócio que hontem quando me despedi lhe fallei, estou serto que António de Araújo me ha de proporcionar hum meio de eu conseguir quanto antes o que eu tanto dezejo957.

956 Ver: Carta do conde de Vila Verde para António de Araújo de Azevedo, datada de Salvaterra de Magos, 1805. 02. 28. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 7, 27. 957 Ver: Carta do Príncipe Regente para António de Araújo de Azevedo. 1816 [?].ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18,74.

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Quadro 13 - Ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra (1804-1807) Comunicações a montante

Príncipe Regente

Secretário particular do P. Regente

SER

SENEG

Oficial Maior da Secretaria

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Também por outras vias, o Príncipe Regente exerceu a sua autoridade, nomeadamente, quando desencadeou o processo através de ordem verbal dada ao seu secretário particular José Egídio Álvares de Almeida958, futuro marquês de Santo Amaro. A correspondência de José Egídio trata de diversificados assuntos como as audiências para despacho959, a recepção de cartas de Araújo960, a remessa das pastas da Real Assinatura lhes dar o seu devido expediente961, a ordem do Regente para serem apresentados os uniformes do exército962, o despacho de pretensões de militares963, a remessa de cartas patentes964 e credenciais965 devidamente assinadas pelo Regente. Também se denota o uso de outras vias pelo Regente, nomeadamente quando recorre aos préstimos dos seus validos mais próximos, e mesmo independentes do aparelho político-administrativo, como é o caso de Francisco José Rufino de Sousa Lobato, futuro visconde de Vila Nova da Rainha, que a bordo da nau Príncipe Real dá uma ordem em nome do Soberano para mandar embarcar os dois regimentos do Porto em lugar do regimento de Peniche966. Este não é um caso isolado, pois nos primeiros anos do Brasil, verificar-se-á a convocatória para o Conselho de Estado pela mesma via, conforme veremos. Mas, o canal de comunicação principal entre o Príncipe e o Ministro dos Negócios Estrangeiros e da Guerra ocorre por intermédio do ministro do Reino, conde de Vila Verde. Entre os anos de 1804 e 1806, Vila Verde parece ter acompanhado sempre o Regente nos seus itinerários por Queluz, Salvaterra de Magos e Vila Viçosa, enquanto António de Aráujo permanecia em Lisboa, subindo apenas à presença do Soberano para despacho, provavelmente, uma vez por semana. A extensa série de cartas e avisos do conde de Vila Verde, escritas entre Julho de 1804 e Novembro de 1806, deixa antever que é a este elemento quem cabe a coordenação do gabinete ministerial ao promover o influxo informacional das Secretarias de Estado para ser presente ao Príncipe (ver Quadro 14). Devem ser 958

A correspondência trocada entre António de Araújo de Azevedo e José Egídio Álvares de Almeida encontra-se publicada em BARREIROS, José Baptista – Correspondência inédita entre o conde da Barca e José Egídio Álvares de Almeida, secretário particular de El-Rei D. João VI, Braga: Selegação Bracarense da Sociedade Histórica da Independência de Portugal, 1962. 959 Ver: Carta de José Egídio Álvares de Almeida, secretário particular do Príncipe Regente, para António de Araújo de Azevedo. Datada de Vila Viçosa, 1806. 04. 09. apud BARREIROS, ob. cit., p. 78. 960 Ver: IDEM. Datada de de Paço de Vila Viçosa, 1806. 01. 27. Apud BARREIROS, ob. cit., pp. 71-72. 961 Ver: IDEM. Datada de Vila Viçosa, 1806. 02. 24. apud BARREIROS, ob. cit., p. 73. 962 Ver: IDEM. Datada de Vila Viçosa, 1806. 02. 16. apud BARREIROS, ob. cit., p. 72. 963 Ver: IDEM. Datada de Vila Viçosa, 1806. 03. 04. apud BARREIROS, ob. cit., pp. 73-74. 964 Ver: IDEM. Datada de Vila Viçosa, 1806. 03. 28. apud BARREIROS, ob. cit., pp. 76-77. 965 Ver: IDEM. Datada de Mafra, 1806. 08. 01. apud BARREIROS, ob. cit., p. 80. 966 Ver: Nota de José Rufino de Sousa Lobato para António de Araújo de Azevedo. Datada de 1807. 11. 28, a bordo da nau Príncipe Real. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 14, 108.

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interpretadas como o veículo dos documentos que conheceram tramitação nos expedientes das duas Secretarias de Estado, e por esse motivo o seu surgimento só ocorre quando algum acto oficial juridicamente enquadrado assim o exige. Por esse motivo, não devem consideradas como cartas oficiais, pois não foram registadas nos livros da Secretaria de Estado, nem tão pouco são lavradas segundo rígidos formulários. Revelam, antes, uma grande informalidade, sancionada pelo tratamento de “amigo” utilizado pelo autor, sendo também esta característica aquilatada no tratamento das pessoas referidas nos textos que nunca são acompanhadas dos cargos que possuem. Todavia, o seu valor informativo outorga-lhes uma inegável importância para se compreender os fluxos informacionais descenendente e ascendente. Por outro lado, os avisos seguem as linhas protocolares pré-estabelecidas e, como tal, são documentos jurídicos, devidamente registados nos livros do expediente da Secretaria do Reino. O conde de Vila Verde é o intermediário privilegiado que faz subir à presença régia a mala da Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e Guerra, possibilitando ao Regente a leitura dos ofícios dos diplomatas portugueses, os requerimentos e as representações de elementos do corpo militar português. É também o ministro do Reino o responsável pelo reencaminhamento do processo no sentido descendente depois de sancionado pelo punho régio. Cabe também ao ministro do Reino remeter a António de Araújo a correspondência e os processos que conheceram tramitação em outros organismos da Administração Central, como o Erário Régio, a Junta do Comércio967, ou as Alfândegas968. Pelo conteúdo desta documentação torna-se possível identificar a documentação que sobe à presença régia, como a mala dos ofícios dos diplomatas portugueses para ser presente ao Soberano e recolher a sua apreciação969, os despachos para serem analisados antes de serem assinados e enviados970, os pareceres de governadores de Armas e do Conselho da Guerra sobre a promoção de oficiais militares e o provimento de cargos971 e, ainda, as minutas de decretos para serem presentes ao Soberano972.

967

Ver: Carta do conde de Vila Verde para António de Araújo de Azevedo, datada de Porcalhota, 1805. 07. 12. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 7, 36. Ver: IDEM. Datada de Vila Viçosa, 1806. 02. 04. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC.7, 65. 969 Ver: IDEM. Datada de Mafra, 1804. 10. 21. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 7,7; IDEM, datada de Vila Viçosa, 1806. 01. 20. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 7, 58. 970 Ver: IDEM. Datada de Salvaterra de Magos, 1805. 02. 17. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 7, 23. 971 Ver: IDEM. Datada de Salvaterra de Magos, 1805. 02. 26. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 7, 26. 972 Ver: IDEM. Datada de Porcalhota, 1805. 06. 12. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 7, 35 968

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Quadro 14 - Gabinete Ministerial (1804-1808) Comunicações a montante e na horizontal

Príncipe Regente

SENEG

SER

SEMDU

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SENF

No fluxo descendente, e dentro da estrutura administrativa portuguesa, encontram-se as credenciais assinadas pelo Soberano para um cargo diplomático bem como as indicações para o desempenho do cargo973, o aconselhamento sobre a correspondência e a conduta dos diplomatas portugueses974, decisões sobre a atribuição de soldos975 e a autorização para a remessa de armamento do Arsenal Real do Exército para a Madeira976. A nível exógeno, registam-se comentários às intenções dos diplomatas estrangeiros em Lisboa977, ao cerimonial de recepção a embaixadores estrangeiros978 e audiências979, a remessa de minutas de cartas para Soberanos, ministros estrangeiros e para o Papa980. Este fluxo informacional com o Ministro do Reino manteve-se no Brasil, como se depreende da carta do marquês de Aguiar em que devolve a António de Araújo um escrito do marechal Beresford981. Também no sentido descendente, em direitura a António de Araújo, encontra-se a correspondência do oficial maior da Secretaria de Estado dos Negócios do Reino, Joaquim Guilherme da Costa Posser, por ordem do seu suprior hierárquico, as quais versam assuntos que passam no expediente desta Secretaria982. As comunicações horizontais são pautadas pelo intercâmbio de informações com os colegas do ministério e envolvem correspondência recebida e expedida. Veja-se, por exemplo, a troca de informações com visconde de Anadia, para suster uma conspiração que levaria à sublevação do Brasil, bem patente num ofício de 20 de Maio de 1807, que não se registou por ser matéria de muito segredo. Mais tarde, com o agravamento da crise política, os dois ministros iniciarão a preparação da partida da corte para o Brasil, o que de certa forma reflecte a tomada de posição do Conselho de Estado, de que ambos faziam parte (ver Quadro 14). Entre estes dois ministros verifica-se também a comunicação de processos, como por exemplo o da questão Bonafous et Sauvaget, referente à apreensão no Rio de Janeiro de mercadorias pertencentes a negociantes franceses em Lisboa, e, ainda, o 973

Ver: IDEM. Datada de Mafra, 1804. 07. 14. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 7,5 Ver: IDEM. Datada de Salvaterra de Magos, 1805. 02. 17. ADB/UM-SIFAA/DOC. 7, 16; ADB/UM-SIFAA/DOC. 7, 23. 975 Ver: IDEM. Datada de Salvaterra de Magos, 1805. 04. 19. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 7, 30. 976 Ver: IDEM. Datada de 1805. 01. 10 [s.l.]. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 7, 19. 977 Ver: IDEM. Datada de Salvaterra de Magos, 1805. 02. 17. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 7, 23. 978 Ver: IDEM. Datada de Salvaterra de Magos, 1805. 02. 15. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 7, 21. 979 Ver: IDEM. Datada de Salvaterra de Magos, 1805. 04.19. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 7, 30; IDEM, datada de Salvaterra de Magos, 1805. 04. 21. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 7, 31. 980 Ver: IDEM. Datada de Salvaterra de Magos, 1805. 02. 15. ADB/UM-SIFAA/DOC. 7, 21; IDEM, Datada de 1805. 05. 26. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 7, 34; IDEM, datada de Porcalhota, 1805. 07. 12. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 7, 36. 981 Ver: Nota do marquês de Aguiar para António de Araújo de Azevedo. Datada do Rio de Janeiro, 1816. 01. 11. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 15,9. 982 Ver: Cartas de Joaquim Guilherme da Costa Posser, oficial maior da Secretaria de Estado do Reino, para António de Araújo de Azevedo. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 7,138 - ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 7,146. 974

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processo relativo a Pascoal Turry, cônsul de França em Faro, que foi preso por desavenças com o meirinho da superintendência dos tabacos e alfândegas do Algarve. Na imediata dependência do Ministro e Secretário de Estado estava, antes de mais, a secretaria, sendo esta simultaneamente produtora e receptora de informação, ascendente, descendente e horizontal, como temos visto. É no expediente da secretaria que se assiste à preparação de cartas do príncipe Regente para o Príncipe da Paz983, para o Imperador da Rússia984, as quais foram conservadas no arquivo particular do Ministro sob a forma de minutas escritas pelo seu próprio punho ou com correções e aditamentos autógrafos. No normal funcionamento do expediente da secretaria são, também, trasladados para copiadores diversos ofícios ou realizadas súmulas dos ofícios mais importantes que entraram na secretaria. É o caso do copiador contendo as súmulas dos despachos e ofícios expedidos e recebidos referentes aos anos de 1804 e 1806985, o copiador contendo ofícios e cartas do Ministro986, e um outro contendo extractos de despachos de António de Araújo para diversas legações portuguesas no estrangeiro987. Aqui são concebidos os despachos, muitas vezes autógrafos do próprio ministro, para a legação de Londres liderada por D. Domingos António, para Paris que contou sucessivamente com D. José Maria de Sousa988, D. Lourenço de Lima989, com o secretário da legação Francisco José Maria de Brito990, com Fernando José Álvares, encarregado de negócios. Também a embaixada do marquês de Marialva, discutida em Conselho de Estado, conhece tramitação pela SENEG e no seu expediente se trata das respectivas cartas credenciais991, cartas patentes992, instruções ostensivas993 e

983 Ver: Minuta da carta do Príncipe Regente para o Príncipe da Paz, felicitando-o pelas graças que o rei de Espanha lhe tinha concedido. Mafra, 1807. 03. 07. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 12,45. 984 Ver: Minuta da carta do Príncipe Regente ao imperador da Rússia felicitando-o por ter contribuido para o estabelecimento da paz no continente. Mafra, 1807. 03. 20. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 12,34. 985 Ver: Copiador da SENEG, contendo com os embaixadores portugueses em Londres, Madrid, São Petersburgo, Paris; com o ministro francês das Relações Exteriores, com o ministro inglês dos Negócios Estrangeiros, como o ministro Russo, com o ministro da Rússia em Londres, com Silvestre Pinheiro Ferreira, em Berlim, e Francisco Caillé de Guine em Madrid.1804-1806. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 12,48. 986 Ver: Copiador de correspondência expedida para Caillé, Talleyrand, Czartorinsky e Príncipe da Paz, bem como umas “Reflexões” a um ofício de D. Domingos de Sousa Coutinho. 1804-1807. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 12,49. 987 Ver: Copiador dos despachos do SENEG para D. Domingos de Sousa Coutinho, Rodrigo Navarro de Andrade, D. Lourenço de Lima, conde da Ega e João Paulo Bezerra. 1804-1807. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 12,50. 988 Ver: Minuta do despacho de António de Araújo para D. José Maria de Sousa, datado de Queluz, 1804. 06. 06. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 9,110. 989 Ver: Minuta dos despachos de António de Araújo para D. Lourenço de Lima, entre Fevereiro de 1806 e Outubro de 1807. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 9, 115 – DOC. 9, 127. 990 Ver: Minutas dos despachos de António de Araújo para Francisco José Maria de Brito. 1807. 03. 19. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 9,135 – DOC. 9, 136. 991 Ver: Carta credencial do Príncipe Regente para o Imperador dos Franceses ter nomeado o marquês de Marialva para embaixador em Paris, minutada por António de Araújo. 1807. 10. 28. (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC.13,7); Carta credencial do P. R. para o Imperador nomeando Francisco José Maria de Brito para secretário da embaixada do marquês de Marialva. 1807. 10. 28. (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 13,5). 992 Ver: Carta patente do Príncipe Regente nomeado o marquês de Marialva seu embaixador extraordinário junto do imperador dos franceses com poderes para concluir, assinar e ratificar qualquer tratado com a França. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 13,8.

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secretíssimas994, todas elas minutadas por António de Araújo. Para Madrid, seguiram os despachos para o conde da Ega escritos a partir de Queluz, Mafra, da Ajuda e de Belém, entre 1805 e 1807995, e para São Petersburgo, para Rodrigo Navarro de Andrade, entre 1806 e 1807996 (ver Quadro 15). Também para o corpo diplomático em Lisboa foram concebidos diversos ofícios e notas, nomeadamente, para os representantes britânicos como Lord Robert Fitzgerald997, Sir James Gambier998, Lord Strangford999 e para o embaixador francês Jean Andoche Junot1000, sendo que neste caso é conservado, também, o copiador de correspondência expedida e recebida1001. Na ausência de Junot, a legação francesa foi assegurada pelo encarregado de negócios Rayneval, para o qual António de Araújo dirigiu diversa correspondência1002. A jusante do SENEG e a nível endógeno (ver Quadro 12), encontra-se o corpo diplomático português, distribuído por várias legações, sendo de destacar, também, as embaixadas extraordinárias para representar o Reino em Congressos e, ainda, as comissões de serviço no estrangeiro sem carácter diplomático. Da legação em Londres, liderada pelo embaixador D. Domingos de Sousa Coutinho, futuro conde e marquês de Funchal, chegam à Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros diversos ofícios numerados e profusamente documentados com cartas do referido diplomata para ministros ingleses1003 e do governo inglês para o mesmo diplomata1004, extractos das gazetas inglesas como o The London Gazette”1005 e um conjunto de diversos documentos soltos, que supostamente foram apartados do documento matriz, como a cópia da nota de D. Domingos para George Canning, cópias

993

Ver: Minuta das instruções para o marquês de Marialva se apresentar em Paris para tratar de negociar uma aliança com as duas potências, declarando levar plenos poderes para o fazer. 1807. 11. 10.; Minuta do aditamento às instruções de António de Araújo 1807. 11. 15. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC.13,10. 994 Ver: Minuta das instruções secretíssimas de António de Araújo de Azevedo para o marquês de Marialva para evitar a pretensão dos franceses de introduzirem tropas em Portugal. 1807. 11. 10. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC.13,7. 995 Ver: Despachos de António de Araújo de Azevedo para o conde da Ega, entre 1805 e 1807. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 8, 20 – DOC. 8, 49. 996 Ver: Despachos de António de Araújo de Azevedo para Rodrigo Navarro de Andrade, entre 1806 e 1807. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 8,5 – DOC. 8,7. 997 Ver: Notas de António de Araújo de Azevedo para Lord Robert Fitzgerald, em Outubro de 1806. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 10,1 – DOC. 10,2. 998 Ver: Nota de António de Araújo de Azevedo para Sir James Gambier. Mafra, 1807. 10. 03. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 10,143. 999 Ver: Notas de António de Araújo de Azevedo para Lord Strangford, entre Outubro e Novembro de 1807. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 10, 109 – DOC. 10, 116. 1000 Ver: Cartas de António de Araújo para o general Junot, em Fevereiro de 1806 (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC.11,83) e entre Outubro e Novembro de 1807. (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 11, 71 – DOC. 11, 72). 1001 Ver: Copiador da correspondência de António de Araújo de Azevedo com o general Junot, referente a 1805. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 11,80. 1002 Ver: Notas de António de Araújo de Azevedo para Rayneval. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 11,59 – 11,68. 1003 Ver: Cópia da carta de D. Domingos de Sousa Coutinho para George Canning, anexa ao ofício de 1806. 03. 26. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 9, 96 1004 Ver: Carta da carta de Geroge Canning para D. Domingos de Sousa Coutinho. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 9,106. 1005 Ver: The London Gazette, enviado com o ofício n.º 205 de 1806. 09. 30. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 7,27.

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de correspondência do ministério britânico para o embaixador português, cópias de acordos entre as duas partes1006 e diversa documentação sobre os bens dos portugueses em Inglaterra1007. Da legação de Paris, chegavam os ofícios de D. José Maria de Sousa, o morgado de Mateus, contendo cópias da nota de Talleyrand para o diplomata português acerca da retirada de Lannes de Portugal1008 e uma convenção pela qual a França reconhece a neutralidade de Portugal na presente guerra a troco de uma indemnização pecuniária de 16 milhões de cruzados1009. Depois, durante a enviatura de D. Lourenço de Lima, que teve por objectivo cumprimentar o Imperador, regista-se o mesmo fluxo informacional, muito embora António de Araújo só tenha conservado no seu arquivo particular alguns extractos dos ofícios daquele diplomata1010. Também do secretário desta legação Francisco José Maria de Brito se encontram diversas cartas que, na sua maior parte, foram decifradas na Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra1011, e, ainda, as cartas de Fernando José Álvares, encarregado de negócios em Paris depois da partida de D. Lourenço de Lima1012. Por seu lado, da legação em Madrid, assiste-se a documentação resultante das missões de Cipriano Ribeiro Freire e do conde da Ega. Seguindo a prática instituída, António de Araújo de Azevedo comunicou a Cipriano Ribeiro Freire o ter sido nomeado para ministro dos Negócios Estrangeiros e, ao mesmo tempo, ordenava que, logo que a corte de Madrid tomasse resolução ulterior sobre o reconhecimento do novo imperador dos franceses, o diplomata deveria avisar S. A.R. sem perda de tempo1013. Este documento marca o início da correspondência de Cipriano Ribeiro Freire para o ministério liderado por António de Araújo1014.

1006 Ver: Cópia do accord entre Son Excellence Mr. Canning et moi datada de 1807. 09. 12. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 9, 108. 1007 Ver: Relação sucinta sobre a situação dos bens portugueses em Inglaterra, refere-se aos navios portugueses e seus carregamentos apreendidos pelos ingleses depois da adesão de Portugal à causa do continente e às diligências levadas a cabo para serem restituídos aos seus proprietários. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18,1. 1008 Ver: Cópia da nota de Talleyrand a D. José Maria de Sousa, datada de 1802. 09. 24. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 9,112. 1009 Ver: Convenção assinada entre a França e Portugal a 1804. 03. 19. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 9,113. 1010 Ver: Extractos de 3 ofícios de D. Lourenço de Lima: 1 de 30 de Julho de 1807 relativo à adesão de Portugal à causa continental; outro de 11 de Agosto em que participa a saída de Talleyrand do ministério; outro com datada de 29 de Agosto de 1807 sobre as cartas que lhe dirigiu o cônsul de Nantes e o cônsul de Bayona, com os protestos dos capitães, sobre a saída daqueles portos a navios neutros sem que se declarasse embargo e que vão copiadas nos ofícios n.º 3 e 4 de 29 de Agosto de 1807. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 9,129 – DOC. 9,130. 1011 Ver: Série de cartas decifradas de Francisco josé Maria de Brito para António de Araújo de Azevedo. Entre Abril e Outubro de 1807. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 9, 137 – DOC. 9,143; DOC. 9, 145 – DOC. 150. 1012 Ver: Cartas de Fernando José Álvares para António de Araújo, datado de Paris, 1807. 10. 20 Paris), Sévres, 1807. 10. 24. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 9, 131 – DOC. 9, 132. 1013 Ver: Despacho de António de Araújo de Azevedo para Cirpiano Ribeiro Freire, datado de Queluz, 1804. 06. 06. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 9, 128. 1014 Ver: Série de ofícios de Ribeiro Freire, Enviado Extraordinário em Madrid, para António de Araújo de Azevedo. 1805. 06. 06. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 8,3.

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Quadro 15 - Ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra (1804-1808) Os Negócios Estrangeiros

SR/ Cartas

Soberanos e ministros Estrangeiros

SENEG SR/ Cartas Régias SR/ Cartas

SR/ Ofícios SR/ Cartas SR/ Convenções

Corpo diplomático português

Embaixadores Enviados Min. Pleni

SR/ Despachos SR/ Instruções SR/ Cartas SR/ Notas SR/ Cartas Patentes SR/ Avisos SR/ Decretos

SR/ Cartas SR/ Notas SR/ Avisos

SR/ Cartas SR/ Notas SR/ Avisos

Corpo diplomático estrangeiro em Lisboa

Embaixadores Enviados Min. Pleni

Cônsules Vice-Cônsules

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Cônsules Vice-Cônsules

A partir de 1805, a missão de Madrid, passa a ser liderada pelo conde da Ega, e, nos dois anos ulteriores, verificou-se um abundante fluxo de ofícios numerados1015 em direcção ao Ministro dos Negócios Estarngeiros, comunicou abundantemente com o seu superior hierárquico. Pela via de Madrid chegavam, também, à Secretaria de Estado, as cartas do embaixador de França em Madrid, o general Bernouville, datadas de 184 e 18051016, e as cartas de Francisco Cailhé de Guine, espião ao serviço da coroa portuguesa1017. Já no tempo do Brasil, António de Araújo desempenhava interinamente o cargo de Ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra. Assim, foi o responsável pela nomeação da legação portuguesa ao Congresso de Viena, recebendo amiudadamente as notícias do desenvolvimento das negociações por cartas particulares do conde de Palmela1018, António de Saldanha da Gama, depois conde de Porto Santo1019, Joaquim José Lobo da Silveira, futuro conde da Oriola1020, e pelos secretários Francisco José Maria de Brito, Ambrósio Joaquim dos Reis1021 e Manuel Rodrigues Gameiro Pessoa1022. Dessa via de comunicação restou também variada documentação sobre a abolição do tráfico de escravos, como a cópia do tratado assinado pelos plenipotenciários portugueses em Viena a 22 de Janeiro de 1815 que se refere aos prejuízos sofridos pelos portugueses e à indemnização de 3000 mil libras1023, o fragmento de uma nota relativa às negociações entre portugueses e ingleses sobre a abolição do tráfico dos escravos1024, um memorial relativo aos prejuízos sofridos pelos

1015 Ver: Série de ofícios do conde da Ega para António de Araújo de Azevedo, ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 8, 50 – DOC. 8, 156. 1016 Ver: Cartas do general Bernouville para António de Araújo de Azevedo, entre 1804 e 1805. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 12,21 – DOC. 12, 23. 1017 Ver: Cartas de Francisco Cailhé de Guine para António de Araújo de Azevedo, entre Maio e Julho de 1805. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 12, 24 – DOC. 12, 31. 1018 Ver: Cartas do conde de Palmela para António de Araújo de Azevedo. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ CR/ DOC. 9,11,2 – 9,11,3. 1019 Ver: Cartas de António Saldanha da Gama para António de Araújo de Azevedo. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ CR/ DOC. 5,7,1-DOC. 5,7,9. 1020 Ver: Cartas de Joaquim José Lobo da Silveira para António de Araújo de Azevedo. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ CR/ DOC. 13,10,16 – DOC. 13,10,22. 1021 Ver: Cartas de Ambrósio Joaquim dos Reis para António de Araújo de Azevedo. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ CR/ DOC. 11,1,16 – DOC. 11, 1, 24. 1022 Ver: Cartas de Manuel Rodrigues Gameiro Pessoa para António de Araújo de Azevedo. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ CR/ DOC. 9,19, 1- DOC. 9, 19, 6. 1023 Ver: Extracto do tratado assinado no Congresso de Viena contendo as cláusulas referentes à indemnização dos vassalos portugueses […]. 1815. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18,96 1024 Ver: Apontamento sobre as proposições de Lord Greenville acerca dos negócios de escravos. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18,97.

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portugueses devido à acção dos cruzadores ingleses1025, e uma nota sobre o trato dos escravos que faziam no Rio Zaire os ingleses e os franceses1026. Mas, também de comissões de serviço esporádicas se ocupou a Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra. Em 1804, Silvestre Pinheiro Ferreira partiu para a Alemanha com a missão de contratar um grupo de espingardeiros para virem a Portugal montar uma fábrica. Desta comissão de serviços, o negociador remeterá diversos ofícios para Araújo, alguns deles com anexos, como cartas de outras pessoas envolvidas na negociação, e o contrato original que foi celebrado a 2 de Setembro de 1806 com os espingardeiros1027. Ao nível exógeno, os Negócios Estrangeiros compreendiam a correspondência recebida do corpo diplomático e dos cônsules estrangeiros em Portugal. Aí encontramse cartas, notas e ofícios dos representantes de S. M. B. em Lisboa como Lord Robert Fitzgerald, Enviado Extraordinário e Ministro Plenipotenciário da Grã-Bretanha em Lisboa, entre 1805 e 18061028; Lord George Rosslyn, iniciada em Saint James a 9 de Agosto de 1806, e terminada em Lisboa a 20 de Setembro de 18061029; Lord Saint Vincent para António de Araújo, todas escritas a bordo do “Hibernian” ao largo de Lisboa entre Agosto e Outubro de 18061030; Sir James Gambier, cônsul-geral, , entre Fevereiro de 1806 e 18071031; de Lord Strangford, em 1806 e 18071032, algumas delas com anexos como cartas, requerimentos e processos1033; e uma carta do conta-almirante Sir G. Sidney Smith informando que não tendo Portugal executado as claúsulas da Convenção de 22 de Outubro, tinha ordens para bloquear o Tejo com a sua esquadra1034. Também nos tempos do Rio de Janeiro se regista o influxo de diversas notas de Chamberlain, encarregado de negócios da Grã-Bretanha, para o conde da Barca, escritas

1025 Ver: Memória sobre os prejuízos sofridos pelos portugueses devido à acção dos cruzadores ingleses. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18,98. 1026 Ver: Nota sobre o comércio de escravos que fazem no Rio Zaire os ingleses e franceses. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18,99. 1027 Ver: Ofícios de Silvestre Pinheiro Ferreira para António de Araújo de Azevedo, entre 1804 e 1807. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ CR/ DOC. 8,9 – DOC. 8,19. 1028 Ver: Notas de Lord Robert Fitzegrald para António de Araújo de Azevedo, de 1806. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 10,1 – DOC. 10, 27. 1029 Ver: Notas de Lord Rosslyn para António de Araújo de Azevedo, de 1806. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 10,28 – DOC. 10, 40. 1030 Ver: Notas de Lord Saint Vincent para António de Araújo de Azevedo, de 1806. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 10, 46 – DOC. 10,56. 1031 Ver: Notas de Sir James Gambier para António de Araújo de Azevedo, entre 1806 e 1807. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 10, 144 – DOC. 10, 154. 1032 Ver: Notas de Lord Strangford para António de Araújo de Azevedo, de 1807. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 10, 117 – DOC. 10, 142. 1033 Ver: Nota de Lord Strangford para António de Araújo de Azevedo, datada de 1807. 10. 23. Anexo: Processo relativo à reclamação de negociantes ingleses sobre o apresamento de um navio. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 10, 130 – DOC. 10, 131. 1034 Ver: Carta do contra-almirante Sir Sidney Simth, a bordo da nau Hibernian 1807. 11. 22. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 13,41.

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entre 10 de Janeiro e 21 de Junho de 1817, que, na sua maioria, são relativas à saída de paquetes ingleses para a Europa1035. Da embaixada de França, sobem à presença do ministro a correspondência do embaixador Junot, a qual é composta de cartas, notas, cartas referentes aos anos de 1805 e 18061036; as notas de Serrurier, comissário geral das relações comerciais e encarregado dos negócios1037; e as notas de Rayneval, encarregado de negócios de França depois da retirada de Junot, datadas de 1805 e 18071038. Refira-se que, entre 1804 e 1807, António de Araújo desempenhou, também, as funções de Inspector do Correio Geral e, para retomar a questão da normalização dos correios entre Portugal e Espanha, dialogando com o conde de Campo Alange1039, recuperou o processo da correspondência trocada, em 1799, entre Luís Pinto de Sousa e o seu homólogo duque de Frias e Ucedas. Por outro lado, do expediente da Guerra (ver Quadro 16), conservam-se no arquivo de António de Araújo de Azevedo diversos copiadores mistos contendo despachos e ofícios de e para diversos militares, para a Junta da Administação Central dos Hospitais militares, referentes a 21 de Outubro e 26 de Novembro de 18071040, a 10 de Outubro e 26 de Novembro1041. Mas, também, encontram-se outros copiadores contendo, apenas, ofícios recebidos dos governadores de armas Florêncio José Correia de Melo, general Sepúlveda, Gonçalo Pereira Caldas, conde Monteiro-mor1042; e do marquês de Alorna1043.

1035 Ver: Notas de Chamberlain para António de Araújo de Azevedo, do ano de 1817. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,87 – 19,102. 1036 Ver: Ofícios de Jean Andoche Junot para António de Araújo de Azevedo, entre 1805 e 1807. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 11, 69 – DOC. 11, 70; DOC. 11, 76 – DOC. 11, 78; DOC. 11, 70; DOC. 11, 73. 1037 Ver: Notas de Serrurier, comissário geral das relações comerciais e encarregado dos negócios de França em Lisboa, para António de Araújo de Azevedo. 1805. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 11, 81 – DOC. 11, 82. 1038 Ver: Notas de Rayneval para António de Araújo de Azevedo. 1806 – 1807. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 11, 31 – DOC. 11-58. 1039 Ver: Notas do conde de Campo Alange para António de Araújo de Azevedo. 1805 – 1807. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 9, 14 – 9, 48. 1040 Ver: Copiador de correspondência recebida. 1807. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 14,27. 1041 Ver: Copiador de Correspondência. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 14,27. 1042 Ver: Copiador de correspondência recebida. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 13,1. 1043 Ver: Copiador de correspondência recebida do marquês de Alorna. 1806-1807. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 14,28.

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Quadro 16 - Ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra (1804-1808) O expediente da Guerra

SENEG

Conselho da Guerra

Corpo Militar

Arsenal Real do Exército

Estado-maior Corpo de Oficiais Real C. Engenheiros Gov. de Armas Gov. de Praças e Fort.

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Guarda Real da Polícia

Hospitais Militares

Arquivo Militar

Os preparativos para a defesa do Reino, em 1807, provocam o influxo de diversificada documentação como memórias dos governadores de praças sobre o estado do armamento1044 e as movimentações de corpos militares1045. Neste âmbito são de salientar a diversa correspondência avulsa e outras memórias dos governadores de armas da província da Extremadura1046, da Província do Minho1047, do Partido do Porto1048, de Trás-os-Montes1049, da Beira1050, do Alentejo1051. A defesa de Lisboa, só por si, foi alvo de intensas reuniões, das quais brotaram documentos como cartas1052, assentos de conferências1053, pareceres e apontamentos1054, projectos de estratégias militares1055 e representações1056. Mas, também se assistiu ao apronto das milícias do Entre Douro e Minho, tendo, muito provavelmente, o governador de Armas locais sido o responsável pela remessa de mapas das revistas passadas aos regimentos de Barcelos1057, Vila do Conde1058, Braga1059, Arcos de Valdevez1060, Viana do Castelo1061, Guimarães1062, Ponte da Barca1063, Basto1064.

1044

Ver: Memórias resumidas do estado actual das baterias que defendem o porto de Setúbal assinada por D. Tomás de Noronha, brigadeiro e governador da praça. 1807. 09. 04. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 14,10. 1045 Ver: Trânsitos que devem seguir os regimentos de infantaria e cavalaria da província de Trás-os-Montes, que vão acantonar-se em Tomar e Torres. Quartel-general de Bragança, 1807. 11. 22. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 14,9. 1046 Ver: Ofícios do marquês de Vagos, governador de Armas da corte e Província da Extremadura, para António de Araújo. Novembro de 1807. (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 14,19; DOC. 14,23). Ver: Representação do marquês de Vagos, governador de Armas da província da Extremadura, dirigida ao Príncipe Regente sobre a questão da Brigada Real da Marinha. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 7,157. 1047 Ver: Ofícios de Gonçalo Pereira Caldas, governador de armas da Província do Minho, para António de Araújo. Outubro e Novembro de 1807. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 14,44; DOC. 14,53. 1048 Ver: Ofícios de Luís de Oliveria da Costa de Almeida Osório, brigadeiro e governador interino, governador de Armas do Partido do Porto, para António de Araújo de Azevedo. Outubro e Novembro de 1807. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC.12,30; DOC. 14,31. 1049 Ver: Ofícios de Manuel José Gomes de Sepúlveda, governador de armas de Trás-os-Montes, para António de Araújo de Azevedo. Setembro e Novembro de 1807. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 14,54 – DOC. 14,58. 1050 Ver: Ofícios de Florêncio José Correia de Melo, governador de armas da Província da Beira, para António de Araújo sobre a defesa da província. Outubro e Novembro de 1807. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 14,33 – 14, 43. 1051 Ver: Cartas do marquês de Alorna, Governador de Armas da Província do Alentejo, para António de Araújo de Azevedo. Agosto de 1806 e Novembro de 1807. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 14,65 – 14,98. 1052 Ver: Carta do brigadeiro D. Miguel Pereira Forjaz em que descreve a posição que debem tomar as tropas para a defesa de Lisboa. 1807. 10. 10 (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 14,18); Cartas de Gomes Freire de Andrade e Castro para António de Araújo sobre a defesa do Porto de Lisboa remetendo em anexo um mapa com a relação das tropas. Lisboa, 1807. 10. 18. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 14, 26. 1053 Ver: Resultado da conferência feita em 21 de Novembro de 1807 sobre diversos objectos da defesa do Porto de Lisboa; 1807.11.21. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 14,22. 1054 Ver: Apontamentos para a defesa de oficiais serem empregados na defesa de Lisboa. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 14,14. 1055 Ver: Projecto da posição das tropas para a defesa da maregm do norte do Tejo, assinado por D. José Carcome Lobo. 1807. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 14,20. 1056 Ver: Representação dos comandantes das divisões que guarnecem as margens do Tejo, sobre a defesa de Lisboa. Assinado por Gomes Freire de Andrade e Francisco da Cunha Meneses, 1807. 11. 23. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 14,24. 1057 Ver: Mapa sobre o estado do armamento do regimento de milícias de Barcelos assinado pelo sargento-mor, António José Lucas de Sobral. Barcelos, 1807. 10. 24/ 27. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 14,7. 1058 Ver: Mapa do armamento e estado do mesmo regimento de Vila do Conde, pelo Sargento-mor, António José Lucas de Sobral. 1807. 10. 25. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 14,6. 1059 Ver: Mapa do estado do armamento de milícias de Braga na revista passada a 3 de Novembro de 1807, assinado pelo Major Graduado João Baptista de Sousa. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 14,2. 1060 Ver: Mapa do estado do armamento do regimento de milícias dos Arcos, na revista passada em 25 de Outubro de 1807, assinado pelo major graduado José Joaquim Chamapalimaud. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 14,3.

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Finalmente, em 1815, chega às mãos do Ministro um processo remetido pela Regência do Reino referente aos ofícios trocados entre D. Miguel Pereira Forjaz e o Marechal Beresford a propósito do estatuto dos oficiais ingleses no seio do exército português1065, bem como sobre o Conselho de Guerra a que foi submetido o coronel Cox sob a acusação de ter abandonado Almeida ao inimigo em 18101066. Do Conselho da Guerra, liderado pelo marquês de Angeja, sobe à presença do ministro a carta do marechal Beresford participando que, devido às dificuldades criadas pela Regência do Reino, estava disposto a empreender a viagem para o Brasil1067.

1061

Ver: Mapa do estado do regimento de milícias de Viana na revista passada a 25 de Outubro de 1807, assinado pelo tenentecoronel, Félix Pereira da Silva. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC.14,5. Ver: Mapa do estado do armamento do regimento de milícias de Guimarães, na revista passada a 27 de Outubro de 1807, assinado pelo major graduado, João Baptista de Sousa. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 14,8. 1063 Ver: Mapa do estado do armamento do regimento de Milícias da Barca, na revista passada em 29 de Outubro de 1807, assinado pelo capitão do 9.º regimento de infantaria de linha, Francisco Xavier Calheiros Bezerra de Araújo. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 14,4. 1064 Ver: Mapa do estado de armamento do regimento de milícias de Basto, na revista passada em 31 de Outubro de 1807, assinado pelo major graduado, João Baptista de Sousa. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 14,1. 1065 Ver: Copiador dos ofícios trocados entre D. Miguel Pereira Forjaz e o Marechal Beresford a propósito do estatuto dos oficiais ingleses no exército português. Setembro de Novembro de 1814. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 15,4; DOC. 15,5; DOC. 15,6. 1066 Ver: Copiador dos ofícios trocados entre D. Miguel Pereira Forjaz e o Marechal Beresford sobre o coronel Cox. Outubro e Novembro de 1814. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 15,7. 1067 Ver: Carta do Marechal Beresford para o marquês de Angeja, datada de Lisboa, 1815. 07. 15/ 25. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 15,8. 1062

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2.3. MINISTRO E SECRETÁRIO DE ESTADO DO REINO (1807-1808; 1817) 2.3.1. O EXERCÍCIO DAS FUNÇÕES E AS COMPETÊNCIAS DO MINISTRO António de Araújo desempenha o cargo de Ministro do Reino durante pouco tempo e em regime de interinato. Primeiro, entre Fevereiro de 18071068 até à chegada ao Rio de Janeiro, tempo em que deteve concomitantemente os cargos de Ministro e Secretário dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, conselheiro de Estado e Presidente da Real Junta do Comércio. No Brasil, voltou a sobraçar a Pasta do Reino entre 24 de Janeiro de 1817 e 21 de Junho de 18171069. As competências desta secretaria de Estado eram muito vastas. Segundo o cardeal da Mota, sua designação deveria ser Repartição do Reino, ou dos Reinos metendo o Algarve, e o seu expediente deve reduzir-se a toda a qualidade de negócios, excepto os da guerra, que anda separados estes lhe fica bem que cuidar, no Despacho de todos os Tribunaes, à reserva dos de Guerra e Ultramar; ainda que para este devem despachar os Ministros de letras, pela razão que já disse; e com o Conselho de Guerra também poderá ter que fazer1070.

Assim, ao Secretário de Estado dos Negócios do Reino, para além de possuir alguma centralidade no ministério, estavam, também, acometidas um vasto conjunto de incumbências próprias como o serviço e expedientes do Paço e Casa Real, da Casa das Rainhas, da Casa do Infantado e da Casa de Bragança. A partir de 4 de Setembro de 1804, foi criada, na sua dependência, a Direcção da Comissão dos Negócios de Roma, cujo inspector era o ministro de Estado1071. Segundo o Sistema que regula a divizão, e colocação dos papeis do archivo desta Secretaria de Estado dos Negócios do Reino […] organizado […] em 18081072, era certo que a mesma possuía um posicionamento crucial na estrutura das Secretarias de Estado e no sistema de informação e no controle burocrático, na medida em que recepciona as consultas ao rei, trata dos seus despachos, 1068

Ver: “Elogio Histórico […]”, p. XXXIII Ver: “Elogio Histórico […]”, p. XLV Ver: Carta do cardeal da Mota para D. João V, de 1736.05.23. apud BRAZÃO, 1976, pp. 57-58 1071 Ver: Almanach do anno de 1807, pp. 96-97 1072 Apud José Subtil – “Os poderes do centro”, p. 178 1069 1070

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regista-os e remete-os para os tribunais e conselhos. Além das consultas, ocupa-se também das mais diversas áreas de governo, incluindo os negócios eclesiásticos e o expediente do Paço e casa real […] ao secretariar o rei no despacho e tornar-se o fiel depositário dos arquivos e expediente régio, ganha lugar de “centralidade” política, cabendo-lhe, cumulativamente, tarefas de apoio à decisão régia, como a de propor medidas legislativas e executivas1073.

A centralidade desta Secretaria de Estado face às demais e mesmo perante toda a administração central leva a que a mesma proprocione o influxo de documentação de vários organismos da administração central e local, como a Casa das Rainhas, Casa Real, Colégio dos Nobres, Conselho de Estado, Conselho da Fazenda, Conselho da Guerra, Conselho Ultramarino, Desembargo do Paço, Erário Régio, Intendência Geral da Polícia, Junta do Comércio, Junta do Tabaco, Junta do Depósito Público, Junta dos Três Estados, Mesa da Conseiência e Ordens, Ministérios dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, Ministério da Marinha e dos Domínios Ultramarinos, Real Mesa Censória, Secretaria das Mercês e Tribunal do Santo Ofício1074. A Secretaria do Reino tinha funções extremamente vastas e competia-lhe gerir o governo interior do Reino, a administração da Justiça assim como orientar o bem comum dos povos. Entre as suas vastas atribuições contam-se a criação e os provimentos de títulos e de oficiais maiores da Casa Real; a doação de senhorios de terras; alcaiadarias-mores, jurisdições, privilégios e rendas; tomar os preitos e homenagens de qualquer governo, fortaleza ou capitania; despachar todas as mercês, por graça, ou por remuneração de serviços. Estava também encarregada da expedição das nomeações de todos os prelados do reino e domínios ultramarinos, do provimento de presidentes e ministros para todos os Tribunais, Relações e lugares de letras; da eleição do reformador, reitor ou governador e lentes da Universidade de Coimbra e de todos os assuntos que lhe diziam respeito, nomeadamente a apresentação de canonicatos. Cabia-lhe também decidir da concessão de benefícios das Ordens Militares, pelo que respeita às igrejas do Reino assim como dos demais assuntos relativos a estas Ordens. O secretário tinha em seu poder os selos reais1075. Para o todo o expediente estava o Ministério do reino dotado de uma Secretaria composta por um corpo de oficiais, de onde se destaca 1 oficial maior, 2 oficiais maiores graduados, 24 oficiais (contando com os que “assistem” em diversos locais de 1073

Cf. SUBTIL – “Os poderes do centro”, p. 178. IANTT - Guia Geral dos Fundos da Torre do Tombo. Primeira Parte. Instituições do Antigo Regime. Volume II. Administração Central (2). Lisboa: IAN/TT, 1999, vol. 2, p. 185. 1075 Ver: SERRÃO, Joel [et alli] – Roteiro de fontes […], vol. II, 1984, p. 258 1074

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Lisboa, outros que estão de licença para viajar, outros que estão em comissões diplomáticas no estrangeiro e um que é secretário particular do príncipe regente), e demais funcionários como 1 oficial de línguas, 1 porteiro e guarda-livros e seu ajudante1076. 2.3.2. A PRODUÇÃO INFORMACIONAL Como vimos anteriormente o ministro do Reino detinha um acesso privilegiado ao Príncipe Regente. Se antes da partida da corte para o Brasil é pela via de José Egídio Álvares de Almeida que Araújo contacta mais frequentemente como Soberano1077, já nos primeiros seis meses de 1817 denota-se um acesso directo ao monarca remetendo documentos para assinatura real. No sentido descendente, e do próprio punho do Príncipe Regente, saíam notas extremamente sintéticas que acompanhavam a documentação de cariz oficial, sem abertura de carta nem remate, mas com a assinatura autografa, em que é concedida autorização ao Ministro do Reino para expedir documentação não identificada1078, para minutar um ofício1079, para deliberar vários assuntos conforme lhe parecer justo1080, mas, também solicitando informações sobre a desordem dos chinas na fazenda de Santa Cruz1081 ou remetendo requerimentos para serem novamente analisados1082. Competia ao Ministro do reino assegurar as comunicações entre ministério, bem como providenciar os mecanismos conducentes à reunião do Conselho de Estado, conforme veremos (quadro 17).

1076

Ver: Almanach do anno de 1807 […], pp. 94-96. Ver: Cartas de José Egídio Álvares de Almeida para António de Araújo de Azevedo, entre 11 de Janeiro e 24 de Novembro de 1807. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 7, 190 – DOC. 7, 242. 1078 Ver: Nota do Príncipe Regente para António de Araújo de Azevedo [Rio de Janeiro, 1817?]. DB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC.18, 83. 1079 Ver: ID., [Rio de Janeiro, 1817?], ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18, 84 1080 Ver: ID., [Rio de Janeiro, 1817?], ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18, 73 1081 Ver: ID., [Rio de Janeiro, 1817?], ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC.18, 71 1082 Ver: ID., [Rio de Janeiro, 1817?], ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC.18, 77 1077

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Quadro 17 - Ministro e Secretário de Estado do Reino (1807) Comunicações a montante e na horizontal

Príncipe Regente

Conselho de Estado

SENIR

SENEG

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SEMDU

SENF

Por outro lado, no expediente da Secretaria de Estado, António de Araújo preparava notas sobre as quais deveria receber as reais ordens como a preparação do casamento das infantas em Espanha e respectivos dotes e a aclamação de D. João VI1083. O expediente da Casa Real e das suas propriedades era uma das suas àreas de actuação e por esse motivo se compreende a existência de documentos relacionados com a administração da fazenda Real de Santa Cruz1084. A jusante verifica-se, ainda, a recepção de diversos requerimentos solicitando mercês régias1085, cartas como do marechal Beresford sobre o almoxarifado de Torres Novas1086, ou simples cartas de felicitações pela aclamação de D. João VI1087.

1083

Ver: Apontamento do conde da Barca sobre os assuntos de que deve receber as reais ordens. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18, 95 1084 Processo composto por contas prestadas ao conde da Barca e a Tomás António de Vila Nova Portugal sobre compras de gados, que inclui as contas do sargento-mor João Fernandes da Silva, 1.º administrador em 1816; a relação da despesa que por ordem do conde da Braca, fez o coronel Francisco Joaquim de Araújo Magalhães na compra dos gados que remeteu para a Real Fazenda de Santa Cruz (1815-1817); o recibo passado por António de Araújo a João Rodrigues Pereira de Almeida (rio, 16 de setembro de 1814); Mapa de toda a despesa feita na abertura das valas da real Fazenda de Santa Cruz (2 de Maio de 1816). Pagamento feito pelo barão de Rio Seco a 3 de Janeiro de 1818, do retso do dinheiro pertencente à fazenda de Santa Cruz que tinha ficado em seu poder depois da morte do conde da Barca. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,44 – DOC. 19,45. 1085 Ver: Requeimento de Luís António de Oliveira Mendes Dias Lobato que invoca os serviços prestados na Universidade de Coimbra para solicitar a nomeação para Juiz de Fora da Vila de Santo Amro da Purificação na Baía. [1817]. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/CR/DOC. 7,18,3,1. 1086 Ver: Carta do marechal Beresford para o marquês de Aguiar, datada de Lisboa, 1817. 01. 31. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,67. 1087 Ver: Carta do Povo de Recife dirigida ao marquês de Aguiar congratulando-se pelo faustoso dia em que S. M. ia tomar posse do trono de seus Augustos Avós. Recife, em Câmara, 1817. 03. 01. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,68.

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2.4. MINISTRO E SECRETÁRIO DE ESTADO DA MARINHA E DOMÍNIOS ULTRAMARINOS (1814-1817) 2.4.1. O EXERCÍCIO DE FUNÇÕES E AS COMPETÊNCIAS DO MINISTRO António de Araújo foi nomeado para Ministro e Secretário de Estado da Marinha e Domínios Ultramarinos a 11 de Fevereiro de 18141088. Exerceu funções até à sua morte, ocorrida a 21 de Junho de 1817. Segundo a carta do Cardeal da Mota, a pasta da Marinha e dos Domínios Ultramarinos era assim designada porque a primeira por si só também não he tal que mereça ter um secretario chamado só da Marinha; e unida ao Ultramar tem bastante em que trabalhar nas correspondências dos Vice-Reis, Governadores e Ministros de todas as conquistas, nas Consultas do Conselho Ultramarino e nas do Conselho da Fazenda, que respeitão à Índia, Ilhas e Mazagão, e aos armazéns, e da Meza da Consciência quanto às Igrejas do Ultramar, e do Conselho da Guerra dos Postos da Marinha, officios da mesma Marinha e despachos de Mercês de toda a dita Repartição1089.

Assim, era da competência do Ministro, superintender os negócios da Marinha e administrar os territórios ultramarinos exercendo a sua autoridade na forma de governo, nos domínios da justiça, fazenda régia e comércio. A administração do Ultramar compreendia a nomeação de vice-reis, governadores e capitães-generais dos Estados da Índia, Brasil, ilhas da Madeira, Açores e Cabo Verde e, ainda, as fortalezas africanas. Para todo o serviço de expediente, estava dotada de uma secretaria composta por 1 oficial maior, 1 oficial maior graduado, 20 oficiais (contando os que estão dispensados por terem outras incumbências do real serviço e os que possuem cargos diplomáticos no estrangeiro), 1 intérprete de língua arábica, 5 oficiais supranumerários (um deles o oficial maior do Reino). O restante pessoal resumia-se a 1 ajudante1090. Na dependência da Secretaria de Estado estavam o Conselho Ultramarino, criado por D. João IV em 14 de Julho de 1643, a quem competia o governo dos territórios ultramarinos à excepção das ilhas e norte de África e que, mais tarde, foi incorporado na

1088 Ver: Decreto de nomeação para o cargo de Ministro e Secreta´rio de estado dos Negócios da Marinha e dos Domínios Ultramarinos. Rio de Janeiro, 1814.02.11. ANRJ-Secção Histórica, Colecção 15, livro 3, fl. 153 v. 1089 Ver: Carta do cardeal da Mota para D. João V, de 1736.05.23. apud BRAZÃO, 1976, p. 57 1090 Ver: Almanach do anno de 1807, pp. 98-99

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Secretaria de Estado, tendo perdido parte das suas competências1091; o Conselho do Almirantado, criado por decreto de 25 de Abril e pelo de 20 de Agosto de 1795 e confirmado por carta régia de 26 de Outubro de 17961092; a Real Junta da Fazenda da Marinha, criada pela lei de 26 de Outubro de 17961093; o corpo da Armada Real (onde se inclui o Estado Maior Superior, o Estado Maior Inferior, e demais oficiais)1094, a Brigada Real de Marinha (com Estado Maior e 2 Divisões)1095, os Oficiais da Marinha do Estado da Índia1096; os Armazéns de Guiné, Índia e Armadas1097 e a sua Contadoria1098; a Cordoaria1099; o Almoxarifado1100; e a Ribeira das Naus1101. 2.4.2. A PRODUÇÃO INFORMACIONAL A gestão da Marinha era da competência do Ministro que recebeu, assim, diversos cartas1102 e requerimentos do corpo da Armada1103, memórias sobre o estatuto da oficialidade da Marinha1104, bem como relações sobre a composição da Brigada Real de Marinha1105 (ver: Quadro 18).

1091

Cf. HESPANHA, António Manuel – As vésperas do Leviathan (…), pp. 255-256; SUBTIL, José – “Os poderes do centro”, p. 182; IANTT - Direcção de Serviços de Arquivística - "Conselho Ultramarino". in Guia Geral dos Fundos da Torre do Tombo: Instituições do Antigo Regime, Administração Central (2), coord. Maria do Carmo Jasmins Dias Farinha; António Frazão; elab. António Frazão; Lisboa: IAN/TT, 1999, vol. 2, pp. 143-146. 1092 Em 1807 o Presidente era o próprio ministro da Marinha. Cf. Almanach (…), p. 267-269. 1093 Em 1807, o Presidente era o próprio ministro da Marinha. Cf. ID. p. 270-271. 1094 Cf. Almanach do anno de 1807, pp. 163-175. 1095 ID., pp. 176-182 1096 ID., pp. 183-184 1097 ID., p. 272-273 1098 ID., p. 274 1099 ID., p. 275 1100 ID., p. 275 1101 ID., p. 276 1102 Ver: Carta de Inácio da Costa Quintela para o conde da Barca sobre a relação dos oficiais que se encontram em Porto Seguro. Rio de Janeiro, 1816.01.20. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,115; Carta de José Maria de Almeida acerca das ordens do sereníssimo Senhor Infante Almirante General relativas às madeiras das matas que deviam ser entregues nas reais Cocheiras e Cavalariças. Refere-se às desordens provocadas no Rio de São João por oficiais da Marinha empregados na intendência das madeiras. [1814 d.]. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,47 1103 Ver: Requerimento de Manuel Joaquim Ferreira, escrivão extraordinário da Armada, solicitando o lugar de escrivão da fragata "Principe D. Pedro". [s.d.]. (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 15,29); Ver: Requerimento documentado de Domingos Freire Rebocho, 1.º tenente da Armada Real e ajudante do inspector do Arsenal Real da Marinha, solicitando ao Principe Regente a promoção para capitão-tenente. (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC.15,44); Ver: Requerimento documentado de José Gomes da Silva, escrivão dos navios da Armada Real, solicitando ao Principe regente o lugar de pagador ajjudante. (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC.15,49). 1104 Ver: Memória acerca da oficialidade de Marinha (…) por Paulino Joaquim Leitão, Segundo tenente da Armada Real. Rio de Janeiro, 1815. 10 04. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 36,27. 1105 Ver: Relação dos praças da Brigada Real de Marinha que se acham presos pelos crimes de primeira, segunda ou terceira deserção simples ou agravada. 1816. 05. 28. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,61.

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Quadro 18 - Ministro e Secretário de Estado da Marinha e dos Domínios Ultramarinos (1814-1817)

Príncipe Regente

Secretaria

SEMDU

Governadores das Capitanias

Vice-rei da Índia

Intendente-geral da Polícia

Corpo da Armada Real

Brigada Real de Marinha

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Alfândega do Rio Janeiro

Também a Alfândega do Rio de Janeiro1106 e a Intendência Geral da Polícia comunicaram com António de Araújo. A Intendência da Polícia remeteu informaçes o desembarque de tripulações1107, o pagamento de dívidas a um navio1108, e o armistício e declaração oficial a ser realizada em Agosto de 18161109. Em Agosto de 1816, durante um curto espaço de tempo que António de Araújo esteve impossibilitado de exercer as suas funções, toda a documentação correspondente à Secretaria da Marinha foi sendo remetida ao marquês de Aguiar seu substituto que, depois, procedeu à sua entrega a Araújo conforme se deduz pela carta de Paulo Fernandes Viana apresentando queixa contra um oficial daquela Secretaria de Estado1110 ou quando remete representações acerca de requerimentos que correm pelo expediente da Marinha1111. Também a nomeação do vice-rei da Índia passava pelo crivo da Secretaria de Estado da Marinha e dos Domínios Ultramarinos, sendo de registar a nomeação do conde de Rio Pardo para Vice-rei da Índia1112, que foi objecto de correspondência trocada entre oficiais da secretaria1113 e entre o oficial maior e o Ministro1114. Por outro lado, competia também ao Ministro e Secretário de Estado superintender as Capitanias do Brasil. De entre os vários projectos delineados por Araújo contam-se, na iniciativa pública, o aumento da população para o qual solicitou um parecer a José da Silva Lisboa1115, e a questão da normalização dos correios1116. Mas, verificou-se também a predisposição para favorecer a iniciativa privada atendendo projectos de um contrato de carnes secas na capitania de São Pedro que foi mandado para consulta ao governo e câmara de Rio Grande1117, o estabelecimento de uma fábrica de cordoalha na Baía1118 ou o favorecimento da construção naval1119. 1106

Ver: Relação dos rendimentos da Alfândega do Rio de Janeiro. 1817. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,11. Ver: Carta de Paulo Fernandes Viana para António de Araújo de Azevedo, datada de 1815. 08.28. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,107. 1108 Ver: Carta de Paulo Fernandes Viana para António de Araújo de Azevedo, datada de 1816. 08.14. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,109. 1109 Ver: Carta de Paulo Fernandes Viana para António de Araújo de Azevedo, datada de 1816. 08.14. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,110. 1110 Ver: Ofício de Paulo Fernandes Viana para o marquês de Aguiar, datada de 1816. 03.30. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,65. 1111 Ver: Carta de Paulo Fernandes Viana para António de Araújo de Azevedo, datada de 1816. 03.31. ADB/UM-SIFAA/SSC. 08.01/DOC. 19,108. 1112 Ver: Carta do conde de Rio Pardo para António de Araújo de Azevedo. Goa, 1816.11.29. ADB/ UM-SIFAA/CR/DOC. 11,6,5. 1113 Ver: Nota de José Joaquim da Silva Freitas, oficial maior da secretaria de Estado da Marinha, para José Joaquim Xavier de Brito, oficial da mesma. [Rio de Janeiro, 1816]. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,71. 1114 Ver: Carta de José Joaquim da Silva Freitas para António de Araújo de Azevedo. Rio de Janeiro, 1816.01.12. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,112. 1115 Ver: Parecer dado por ordem de S. A. R: sobre os expedientes necessários ao progresso e melhoramento da população do Brasil por José da Silva Lisboa. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 39,38. 1116 Ver: Mapa geral dos dias das partidas e chegadas dos correios da capitania de Pernambuco. (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,21); Ver: Apontamento relativo ao estabelecimento de um serviço de correios entre o Rio de Janeiro e a Capitania de Rio Grande do Sul [1814 d.]. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,41. 1117 Ver: Projecto de um contrato de carnes secas na Capitania de São Pedro […]. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,27. 1107

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Ainda que os assuntos relativos à governação das terras conhecessem tramitação no expediente da secretaria de Estado sob a forma de processos e outros instrumentos sujeitos a fórmulas rígidas, a correspondência dos capitães-generais, que oscila entre o público e privado, são registos a ter em conta. De entre os vários governadores, encontram-se cartas de Fernando Delgado Freire de Castilho, de Goiás1120, Caetano Pinto de Miranda Montenegro, de Pernambuco1121, D. Manuel de Portugal e Castro, de Minas Gerais1122, do conde dos Arcos, de Porto Seguro1123, de D. Diogo de Sousa, depois conde de Rio Pardo, governador de Rio Grande do Norte1124, do bispo D. Mateus de Abreu Pereira, membro do governo interino da capitania de São Paulo1125, do conde da Palma, de São Paulo1126 Pela mesma via, deverá ter subido à presença do Ministro e Secretário de Estado diversos mapas de rendimentos e despesas da da Baía1127 e de Pernambuco1128, mapas demográficos do Ceará1129, da Ilha de Santa Catarina e de São Pedro de Rio Grande do Sul1130, de São Paulo1131, Rio Grande do Norte1132; Mapas de exportação da capitania do Ceará1133 e de São Paulo1134; Mapas de despesas militares de Rio Grande de São Pedro do Sul1135 e outros registos quantitativos de produções1136. Refira-se que entre 1815 e 1816, é também por esta Secretaria de Estado que correm os assuntos referentes à campanha de Montevideu registando o influxo de

1118 Ver: Certidão da resolução do Príncipe regente concedendo a António Vieira da Costa, negociante da baia, o aumento da sua fábrica de cordoalha na capitania da Baía. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,49. 1119 Memória sobre o método de se pôe em actividade a construção naval na capitania do Ceará […].ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,57. 1120 Ver: Carta de Fernando Delgado Freire de Castilho para António de Araújo de Azevedo. 1814.03.27, Vila Boa. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ CR/DOC. 3,14,1. 1121 Ver: Carta de Caetano Pinto de Miranda Montenegro. Recife, 1815. 04. 24. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ CR/DOC. 8,35,2. 1122 Ver: Cartas de D. Manuel de Potugal e Castro para António de Araújo de Azevedo. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ CR/DOC. 3,18,1-DOC. 3,18,4. 1123 Ver: Carta do conde dos Arcos para António de Araújo de Azevedo. Baía, 1814.09.29. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ CR/DOC. 1,32,7. 1124 Ver: Carta de D. Diogo de Sousa para António de Araújo de Azevedo. 1815.09.05. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ CR/DOC. 11,6,3. 1125 Ver: Cartas de D. Mateus de Abreu Pereira para António de Araújo de Azevedo, entre 7 de Outubro de 1814 e 31 de Janeiro de 1817. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ CR/DOC. 9,17,1-DOC. 9,17,4. 1126 Ver: Cartas do conde da Palma para António de Araújo de Azevedo, entre Maio de 1816 e Março de 1817. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ CR/DOC. 9,10,7-9,10,12. 1127 Ver: Mapa de rendimento e despesas da capitania da Baía. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,2. 1128 Ver: Mapa dos rendimentos reais da capitania de Pernambuco e da de Itamaracá (…) assinada pelo escrivão deputado Maximiniano Francisco Duarte. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,20. 1129 Ver: Mapa demográfico da capitania do Ceará. 1813. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,3. 1130 Ver: Mapa demográfico da Ilha de Santa Catarina e de São Pedro do Rio Grande do Sul. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,5. 1131 Ver: Mapa demográfico da capitania de São Paulo. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,6. 1132 Ver: Mapa demográfico da capitania de Rio Grande do Norte. 1811. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,23. 1133 Ver: Mapa de exportação da capitania do Ceará. 1813. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,7. 1134 Ver: Mapa comparaativo da exportação da capitania de São Paulo para os portos do Reino. 1800-1807. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19,8. 1135 Ver: Mapa de despesas militares da capitania de São Pedro do Sul. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 19, 54. 1136 Ver: Mapa comparativo das produções do distrito da Ilha Grande com a declaração do que se consumiu e se exportou no ano de 1816. Vila da Ilha Grande, 1817.02.01. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 35, 13.

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relações sobre os efectivos que desembarcaram no Rio da Prata1137, notas sobre a guerra e a vitória das tropas lusas1138, proclamações1139 e correspondência dos oficiais portugueses1140.

1137

Ver: Relação das tropas que vão desembarcar no Rio da Prata. (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18,115); Nota sobre a Campanha de Montevideu, (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18,116). 1138 Ver: Nota sobre a praça de Montevideu depois da entrada das tropas portuguesas. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18,117. 1139 Ver: Proclamação dos deputados reunidos na Assembleia de Buenos Aires dirigida às Províncias espanholas da América do Sul. (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18, 118); Proclamação do Tenente General Carlos Frederico Lecor aos habitantes de Montevideu. (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18, 122). 1140 Ver: Ofício do tenente-general Carlos Frederico Lecor para o conde da Barca sobre o estado actual da praça de Montevideu. (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18,127); Ver: Série de cartas de Sebastião Pinto de Araújo Correia para António de Araújo de Azevedo. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ CR/DOC. 4,8.

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3. PRESIDENTE DA REAL JUNTA DO COMÉRCIO (1807; 1817) 3.1. A GÉNES DA REAL JUNTA E AS COMPETÊNCIAS DO PRESIDENTE A Real Junta do Comércio foi criada pelo decreto de 30 de Setembro de 1755, tendo obtido a confirmação dos seus estatutos pelo decreto de 16 de Dezembro de 1756. Pela lei de 5 de Junho de 1788 foi elevada a Tribunal Supremo, passando a designar-se por “Real Junta do Comércio, Agricultura, Fábricas e Navegação”1141. Segundo as Recordaçoens de Jácome Ratton, competia ao Presidente garantir o bem comum do comércio, admitir nos seus registos a matrícula dos negociantes que o requererem; a inspecção imediata sobre todas as companhias de indivíduos empregados na Alfândega Grande de Lisboa; a nomeação e provimento os procuradores dos navios em cada uma das Alfândegas de Lisboa (Tabaco e Casa da Índia); a nomeação e provimento dos guardas de navios respeitantes à Alfândega de Belém; a matrícula da equipagem dos navios mercantes portugueses destinados aos portos estrangeiros e do ultramar; a administração dos faróis; a inspecção da Aula de Comércio e matrícula de seus alunos; a inspecção sobre a mesa das classes de retalho; a inspecção, policiamento e conservação da casa que serve de praça de comércio e seguros; a habilitação de negociantes estrangeiros para a sua naturalização portuguesa pela mesa do Desembargo do Paço; propôr ao Soberano por meio de consultas tudo o que se oferecer de novo em utilidade do comércio e bem do Estado; consultar o Soberano sobre os requerimentos das partes que pretendem privilégios exclusivos em matéria de fábricas ou de novos inventos, assim como sobre isenção de direitos de entrada e de saída relativamente às manufacturas; passar provisões a favor das fábricas privilegiadas para a livre entrada ou saída sem pagar direitos; passar provimento aos mercadores das classes para poderem abrir loja, matricular os caixeiros; habilitar os navios que se destinam aos portos da Ásia; criar, custear e administrar as fábricas de lanifícios; e cobrar uma percentagem sobre os bens entrados nas Alfândegas do Reino1142. A estrutura orgânica da Real Junta do Comércio era composta por 1 presidente, 6 deputados (todos eles ligados ao comércio), 1 juiz conservador, 1 fiscal, 1 juiz dos falidos, 1 porteiro do tribunal, 1 secretário do tribunal, e no corpo de oficiais 1 oficial 1141

Ver: IANTT - Direcção de Serviços de Arquivística - "Junta do Comércio", in: Guia Geral dos Fundos da Torre do Tombo: Instituições do Antigo Regime, Administração Central (2), coord. Maria do Carmo Jasmins Dias Farinha; António Frazão, Lisboa: IAN/TT, 1999, vol. 3, p. 1-34. 1142 Ver: Recordaçoens de Jacome Ratton […], Londres, Impresso por H. Bryer, 1813, pp. 258-282.

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maior, 1 oficial maior graduado, 8 imediatos. Na sua dependência estava a Contadoria, com uma superintendência geral dos contrabandos e descaminhos dos Reais Direitos. 3.2. O EXERCÍCIO DE FUNÇÕES António de Araújo é nomeado para Presidente da Real Junta do Comércio a 25 de Fevereiro de 1807, portanto no mesmo dia em que foi nomeado Conselheiro de Estado1143. A 23 de Fevereiro de 1817, António de Araújo é novamente nomeado para Presidente da Real Junta do Comércio do Reino do Brasil e Domínios Ultramarinos1144. 3.3. A PRODUÇÃO INFORMACIONAL Do desempenho do cargo de Presidente da Real Junta do Comércio, António de Araújo apenas conservou no seu arquivo documentação proveniente das relações a jusante, como a representação e requerimentos colectivos como individuais. Nos primeiros é de salientar, a representação dos negociantes da praça de Lisboa que se empregam no comércio da Ásia reclamando contra as escandalosas arbitrariedades com que são tratados pela Junta do Comércio, depois da promulgação do alvará de 4 de Fevereiro de 18111145. Nos segundos destaque-se o requerimento documentado de António Baptista de Sales, negociante da praça de Lisboa: confiando no alvará de 4 de Fevereiro de 1811, mandou crenar o navio, mas as condições excessivas que lhe foram impostas, levam-no a reclamar contra os impedimentos que garantem uma isenção de direitos1146. Outro género de requerimentos que sobem à presença do Presidente da real Junta do Comércio dizem respeito à obtenção de mercês honoríficas como é o caso do coronel Manuel Caetano Pinto, negociante da praça do Rio de Janeiro, solicitando ao Príncipe Regente a mercê de uma comenda honorária1147, e o de Manuel da Silva Franco, fidalgo cavaleiro da Casa Real, alcaide-mor de Sines, deputado da Real Junta do Comércio e inspector da contadoria do mesmo tribunal, que solicitava a remuneração dos seus serviços, nomeadamente as contribuições financeiras dadas ao Estado durante as

1143 Ver: “Elogio Histórico […]”, p. XXXIII. No suplemento do Almanach de 1807 vem referido que António de Araújo foi nomeado no decurso desse ano, mas sem especificar a data. Almanach de 1807, p. 641. 1144 Ver: Decreto da mercê do cargo de Presidente da Real Junta do Comércio, Agricultura, Fábricas e navegação do Reino do Brasil e Domíniso Ultramarinos. Rio de Janeiro, 1817.02.03. ANRJ-Secção Histórica, Colecção 15, livro 5, fls. 81 v. – 82. 1145 Ver: Requerimento dos negociantes da praça de Lisboa que se empregam no comércio da Ásia […].ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 15,1. 1146 Ver: Requerimento de António Baptista Sales [1815]. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 15,3. 1147 Ver: Requerimento de Manuel Caetano Pinto. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 15,41.

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invasões francesas, para requerer a mercê da verificação de uma vida na Alcaiadariamor de Sines e a comenda dos mercadores de Setúbal no seu filho mais velho e o hábito de Cristo para outro1148.

1148

Ver: Requerimento de Manuel da Silva Franco. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 15,31.

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4. O CONSELHEIRO DE ESTADO (1817-1817) 4.1. ORIGENS E EVOLUÇÃO DO CONSELHO DE ESTADO Como já vimos, desde os primórdios da monarquia portuguesa, o rei estava rodeado por um conjunto de validos que o auxiliavam na governação do reino. Neste pressuposto procuravam-se na corte homens prudentes, avisados e de boa memória capazes de auxiliar o Rei1149. Desde

então,

a

evolução

do

Conselho

del

Rei

conheceu

algumas

particularidades. Se com D. Afonso III os documentos mostram pela primeira vez a existência de um conselho real, reunindo elementos que desempenham cargos palatinos1150, já com a subida ao trono do Mestre de Avis, o Conselho assume um papel determinante na governação do reino. Com D. Duarte são tomados os primeiros apontamentos das sessões para referência ulterior1151. No sentido moderno, o Conselho de Estado data da emergência do Estado Moderno em Portugal. Foi criado em 1562 pelo Cardeal D. Henrique, quando tomou posse da regência, mas só decorridos sete anos é que foi dotado do primeiro regimento, por alvará de 8 de Setembro, de D. Sebastião que lhe atribuiu a função de propor ao rei as notícias respeitante ao seu serviço em ordem ao bom governo do Reino tanto na paz como na guerra1152. Como já vimos, de acordo com o regimento de 1569, passam a figurar na estrutura do Conselho quatro secretários a quem compete tomar notas para depois serem presentes ao rei, que não assistia à reunião1153. O alvará de D. Sebastião constituiu-se como um mero acto de formalização do Conselho de Estado, inscrito numa atitude omnipresente do Soberano no Estado do período moderno que estava baseada numa estrutura político-administrativa sustentada por um

1149

Ver: GARCIA, Maria da Glória Ferreira Pinto Dias – Do Conselho de Estado ao actual Supremo Tribunal Administrativo, Lisboa: Supremo Tribunal Administrativo, 1998, p. 15. 1150 Ver: IDEM - p. 18. 1151 Ver: TOVAR, Conde de – “O Arquivo do Conselho de Estado”, in: Anais da Academia Portuguesa de História, II Série, 11, 1961, p. 56. 1152 Ver: CAETANO, Marcello – “Conselho de Estado. HIST.”, in: Verbo. Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura, vol. 7, cols. 970-971; TORRES, Ruy d’Abreu – “Estado, Conselho de “, in: Dicionário de História de Portugal, dirigido por Joel Serrão, vol. II, Lisboa: Iniciativas Editoriais, 1965, pp. 109-110. 1153 Ver: MERÊA, Paulo – ob. cit., p. 174.

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processo em que a diferenciação orgânica se associa à especialização burocrática – Conselho da Fazenda, Mesa da Consciência e Ordens, Conselho de Estado, Conselho das Índias -, conseguem manter uma ideia de abertura do poder ao lado dos três tribunais superiores – Casa da Suplicação, Relação do Porto e Desembargo do Paço1154.

A partir de então, o Conselho de Estado passa a reunir três vezes por semana, sendo a sua presidência exercida em sistema rotativo pelos conselheiros. Após o debate verbal, seguia-se a votação nominal sendo que as resoluções tomadas eram assentadas, com os devidos fundamentos, pelo secretário para serem presente ao rei. Assim, os assentos deviam ser assinados pelos conselheiros que tivessem aprovado a resolução, ainda que se devesse mencionar o nome daqueles que discordaram do texto final1155. Relativizada a sua importância no domínio filipino, o Conselho de Estado é reavivado pelo decreto de D. João IV de 1645 e passa a reunir todas as segundas-feiras e o Secretário “de Estado”, existente desde 1643, estava incumbido de levar ao monarca os assuntos exarados em livro próprio para que fosse anotada, na margem, a resolução tomada sobre cada um deles1156. No entanto, com a crescente especialização dos outros conselhos e dos tribunais da corte, bem como com a criação da “junta especial”, espécie de conselho privado do rei - inspirada na junta dela noche castelhana, com a qual o monarca e depois D. Luísa de Gusmão estabeleceram um colaboração constante1157 -, o Conselho de Estado viu o seu raio de acção ser restringido às questões de Estado, tornando-se quase num órgão honorífico1158. A partir de 1683 os assuntos de maior gravidade passavam pelo Conselho de Estado e competia aos seus membros, escolhidos entre os grandes da nobreza e do alto clero, conhecer todas as matérias de política em geral, tanto interna como externa, e pronunciar-se sobre a nomeação de embaixadores para o estrangeiro e a nomeação para altos cargos do Estado e da Casa Real1159. Durante o reinado de D. Pedro II, este órgão conheceu uma extraordinária actividade havendo notícia da nomeação de dezoito novos conselheiros em 17041160. 1154

Ver: GARCIA, Maria da Glória Ferreira Pinto Dias – ob. cit., p. 21. Ver: TOVAR, Conde de – ob. cit., p. 58. 1156 Ver: TORRES, Ruy d’Abreu – “Estado, Conselho de”, in: Dicionário de História de Portugal, dirigido por Joel Serrão, vol. II, Lisboa: Iniciativas Editoriais, 1965, p. 110. 1157 Ver: TOVAR, Conde de – ob. cit., p. 60. 1158 Ver:GARCIA, Maria da Glória Ferreira Pinto Dias – ob. cit., p. 22. 1159 Ver: LOURENÇO, Maria Paula Marçal – “Estado e Poderes”, in: Nova História de Portugal, direcção de Joel SERRÃO e A. H. de Oliveira MARQUES, vol. VII, coordenação de Avelino de Freitas de Meneses, Lisboa: Editorial Presença, p. 44. 1160 Ver: TOVAR, Conde de – ob. cit. p. 64. 1155

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Esta estrutura manteve-se durante as duas primeiras décadas do reinado de D. João V que, apesar de não ter efectuado nenhuma nomeação, conservou os conselheiros nomeados por seu pai. Tal facto, tem sido atribuído, por um lado, à timidez e irresolução do monarca na governação face a uma conjuntura marcada pelo mau estado dos negócios públicos, em parte motivados pelo facto dos cofres estarem exauridos1161, mas também devido a questões externas nomeadamente o envolvimento na Guerra da Sucessão1162. Neste modelo, era o “Secretário de Estado” quem convoca os conselheiros para as conferências em sua casa e é ele quem comunica ao Soberano os pareceres sobre as várias questões debatidas1163. A partir dos anos 20, o Conselho de Estado já quase não reunia, talvez pelo facto dos seus membros não terem sido substituídos ou, então, devido à criação de juntas de composição reduzida e variável. Depois do alvará de 1736, o despacho foi encaminhado para as Secretarias de Estado e o Conselho viu ser reforçada a sua natureza de órgão eminentemente consultivo, de convocatória esporádica e sem poder decisório, não obstante, o referido diploma ter atribuído aos Secretários de Estado a condição de Conselheiros de Estado “natos”1164. A partir daí, desconhece-se a actividade deste órgão. Sabe-se que, em 1754, não existia nenhum conselheiro sobrevivente para além dos ministros de Estado1165 e que, em 1755, o terramoto veio destruir as actas que se registavam há, pelo menos, trezentos anos1166. Mas, com D. José I e o marquês de Pombal, o Conselho é reabilitado e, em 1760, são nomeados cinco novos conselheiros, ao mesmo tempo que o alvará de 7 de Março estabelecia as precedências1167. Contudo, como não se substituíram os conselheiros que foram perecendo, em 1792 o Conselho estava novamente reduzido aos quatro Secretários de Estado. Refere-se, recorrentemente, que o ano 1796 marca a revitalização do Conselho de Estado devido à decisão de D. Maria I de nomear catorze novos conselheiros1168. Todavia, tal facto não nos parece plausível pois, como é sabido, a Rainha foi declarada 1161

Ver: Quadro Elementar das relações, políticas e diplomáticas de Portugal com as diversas potências do mundo (…), ordenado e composto pelo visconde de Santarém (…), Tomo Quinto, Paris: Em casa de J. P. Aillaud, MDCCCXLV, p. CCXXXV; CCXXXIX. 1162 Ver: LOURENÇO, Maria Paula Marçal – ob. cit., p. 45. 1163 Ver: IDEM - pp. 44-45. 1164 Ver: TOVAR, Conde de –– ob. cit., p. 65. 1165 Ver: IDEM - p. 64. 1166 Ver: IDEM - p. 63. 1167 Ver: IDEM– p. 65. 1168 Ver: IDEM - p. 65; CAETANO, Marcello – “Conselho de Estado. HIST.”, in: Verbo. Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura, vol. 7, cols. 970-971; SUBTIL, José – ob. cit., p. 180; MONTEIRO, Nuno Gonçalo – O crepúsculo dos Grandes (…), p. 537.

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incapaz de governar no inverno de 17921169. Na verdade, o que se assistiu, quatro anos antes, foi a uma inversão da norma de convocação do Conselho sustentada num invulgar protagonismo do plenário dos Secretários de Estado1170 que, perante os sinais evidentes de incapacidade da Soberana, e movidos pela sua honra e fidelidade e pela obrigação de seus cargos, decidiu deliberar a atribuição da regência ao Príncipe D. João1171. Neste sentido, podemos considerar que o Conselho de Estado, e os próprios Secretários de Estado, ganhou um protagonismo crescente com a regência que era, ela própria, sinónimo da fragilidade da monarquia. A partir daqui, o Conselho entra num novo ciclo que vai atravessar toda a crise política, diplomática e económica que perdura até ao Vintismo. Como se disse, em Julho de 1796 assistiu-se à nomeação de doze novos conselheiros1172 que se juntaram aos três secretários de Estado, sendo reconhecidas a uns e outros as honras, as preeminências e as distinções inerentes a tão elevada dignidade. As motivações para uma tão vasta nomeação estiveram relacionadas, certamente, com razões de política externa devido ao panorama que se começou a desenhar a partir do Tratado de Basileia, assinado em Junho de 1795, entre a França do Directório e a Espanha Bourbon que coloca um ponto final na Guerra do Rossilhão, mas que lançou sobre Portugal as atenções da França revolucionária. A partir de então, a política do Príncipe Regente, devidamente escudada nos pareceres dos conselheiros de Estado, passará a centrar-se na tentativa de normalização das relações diplomáticas com a França e na defesa da neutralidade, cujo início ficou marcado pelo entabulamento de negociações de paz em Paris, em 1796 e 1797, por António de Araújo de Azevedo. Assim, se em 1796, o Conselho de Estado reuniu-se duas vezes, a 9 de Julho no Palácio das Necessidades1173 e a 16 de Agosto no Palácio de Queluz, já no ano de 1798, 1169

Ver: RAMOS, Luís de Oliveira – D. Maria I, [s.l.], Círculo de Leitores, 2006, p. 215. Nesta altura, o Conselho de Estado era composto pelo marquês de Ponte de Lima, mordomo-mor e Ministro da Fazenda e Presidente do Real Erário, Martinho de Melo e Castro ministro da marinha e dos domínios Ultramarinos, José de Seabra da Silva Ministro dos Negócios do Reino, e por Luís Pinto de Sousa, ministro e secretário dos Negócios Estrangeiros e da Guerra. Ver: PEDREIRA, Jorge, COSTA, Fernando Dores – D. João VI, [s.l.] Círculo de Leitores, 2006, p. 51. 1171 O ofício com a notícia do afastamento do poder de D. Maria I, remetido à Universidade de Coimbra, começa assim: Os quatro ministros do despacho do gabinete […] únicos membros do Conselho de Estado, segundo a sua última e actual composição, representaram com o mais profundo respeito a Sua Alteza o príncipe nosso Senhor, movidos pela sua honra e fidelidade e pela obrigação de seus cargos, que nas presentes circunstâncias do notório impedimento da rainha nossa senhora para expedir os negócios do reino […]. apud RAMOS, Luís de Oliveira, ob. cit., pp. 293-295. 1172 A 4 de Julho foram nomeados o D. Francisco José de Mendonça (cardeal-patriarca), o duque de Lafões, os marqueses de Castelo Melhor e de Angeja, os condes de Resende, de Vale de Reis e de Pombeiro, Luís de Vasconcelos e Sousa (antigo Vice-rei do Brasil), João de Saldanha e Oliveira e Sousa (o morgado de Oliveira), D. Alexandre de Sousa Holstein e D. Diogo de Noronha (ambos diplomatas); a 12 do mesmo mês, juntou-se-lhes o 2.º marquês de Pombal (Presidente do Senado da Câmara de Lisboa). Cf. PEDREIRA, Jorge, COSTA, Fernando Dores – ob. cit., p. 57. 1173 Ver: TOVAR, Conde de – ob. cit., p. 65. 1170

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provavelmente devido ao fracasso da negociações em Paris, reuniu-se com maior assiduidade existindo notícia de sessões nos dias 20 de Abril, 9 de Maio, 22 de Junho e 6 de Novembro, esta última já com a presença de D. Rodrigo de Sousa Coutinho que havia sido nomeado para Ministro da Marinha e dos Domínios Ultramarinos, em Setembro desse ano1174. Nos anos seguintes, o Conselho de Estado manteve a sua importância sendo consultado durante as crises de 18011175 e 18031176 e 18041177, ainda antes do apogeu registado em 1807, quando reuníu treze vezes e ficou indelevelmente ligado à falência da política adoptada pelo Príncipe Regente marcada simbolicamente pela partida da corte para o Brasil1178. Portanto, não é plausível afirmar-se que a partir de 1801, e face à inexistência dos assentos das reuniões, o Conselho de Esatdo tenha conhecido um progressivo apagamento conforme foi defendido, em primeira mão, nos anos 60 pelo conde de Tovar1179. Entre 1808 e 1810, já no Brasil, o Conselho de Estado voltou a reunir e deteve um papel preponderante na governação do reino, conforme veremos. 4.2. O ESTATUTO DO CONSELHEIRO DE ESTADO No Almanaque de 1807, os conselheiros de Estado ocupam o primeiro lugar na lista das pessoas, que occupão os Empregos, e officios de maior consideração, ou dependência nas várias repartições da Administração Pública1180. Também, através do manuscrito Preeminências dos Conselheiros de Estado, existente no arquivo do Conde da Barca, a dignidade de Conselheiro avista-se como a dignidade mais sublime, e excellente da Monarquia a que correspondem várias 1174

SILVA, Andrée Mansuy-Diniz – Portrait d’un homme d’État: D. Rodrigo de Souza Coutinho, comte de Linhares. 1755-1812, vol. II: L’homme d’État. 1796-1812, Paris: Centre Culturel Calouste Gulbenkian, 2006, p. 12. 1175 Em 1801 o Conselho de Estado reuniu em Junho. Ver a síntese de pareceres em MALAFAIA, Eurico Brandão de Ataíde – António de Araújo de Azevedo, conde da Barca, Diplomata e Estadista, 1787-1817. Subsídios Documentais sobre a época e a personalidade, Braga: Arquivo Distrital de Braga/ Universidade do Minho, 2004, pp. 293-296. 1176 Ver: PEDREIRA, Jorge, COSTA, Fernando Dores – ob. cit., pp. 98-102. 1177 Ver: IDEM - p. 58. 1178 Ver: FILHO, Eneas Martins - O Conselho de Estado Português e a transmigração da família real em 1807, Rio de Janeiro: Ministério da Justiça, 1968; BARREIROS, José Baptista, “Cartas Inéditas para o Conde da Barca”, in: Revista de Guimarães, vol. LXIX, Guimarães: Sociedade Martins Sarmento, 1959, pp. 79-100. 1179 Ver: TOVAR, Conde de – ob. cit., pp. 60 e segs.; Esta alegação repercutiu-se em estudos posteriores e está mais ou menos considerada como inabalável. Ver a título de exemplo, MERÊA, Paulo – ob. cit., p. 185; SUBTIL, José – “Os poderes do centro”, in: História de Portugal, dirigida por José MATTOSO, vol. 5, dirigido por António Manuel HESPANHA, [s.l.], Círculo de Leitores, 1993, p. 180; HESPANHA, António Manuel – As vésperas do Leviathan. Instituições e poder político. Portugal – século XVII, Coimbra, Livraria Almedina, 1994, p. 248; CUNHA, J. da Silva, ALMEIDA, Carlos Marques de – História das Instituições (Aulas Teóricas), II volume, Manuais da Universidade Portucalense, Porto: Centro de cópias António Silva Lemos, 1998, p. 704; MONTEIRO, Nuno Gonçalo – O crepúsculo dos Grandes. A Casa e o património da aristocracia em Portugal (1750-1832), 2.ª edição, Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 2003, p. 537. 1180 Cf. Almanach do anno […], p. 93.

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preeminências, e honras com que o Soberano os distinguem1181. Para compreendermos o seu exacto posicionamento na hierarquia e protocolo da Corte, devemos recorrer aos conceitos de Nobert Elias para salientar que a sociedade do Antigo Regime é a expressão de uma cadeia de poder em que os privilégios de uns e de outros estão enredados, sendo que a pressão inferior força-os a defender os seus privilégios através de um conjunto de práticas que estão consubstanciadas na etiqueta e na lógica do prestígio1182. O conselheiro de Estado tinha um estatuto bem definido na corte, estando sujeito a uma etiqueta rigorosa, detendo um conjunto de grandes prerrogativas e especialíssimos privilégios que se manifestam no juramento, no exercício do cargo, nas cerimónias públicas associadas à vida da família real, na esfera civil e no domínio da gestão patrimonial. Por exemplo, no juramento, que constitui uma espécie de ritual “iniciático”, os conselheiros que são príncipes dão o juramento nas mãos do rei, enquanto que os restantes o fazem nas mãos dos mais antigos, respeitando assim uma certa escatologia baseada na antiguidade. A partir deste momento, fazem parte do Soberano, deixando cair qualquer mediação entre eles. Para além disso, têm honras de Grande, sendo-lhes permitido cobrir-se e sentar-se na presença do monarca, gozando ao mesmo tempo dos privilégios dos oficiais mores do Paço. Por outro lado, nas cerimónias públicas associadas à vida da família real e, por conseguinte à vida cortesã, os conselheiros têm um lugar imediato à família real. Estas ocasiões solenes deixam antever a prática de um protocolo rigoroso e inflexível, que exclui o improviso, tendente a exteriorizar uma hierarquia dos privilégios de onde vão sobressair os caracteres distintivos de todos os intervenientes numa espécie de ritual litúrgico destinado, por um lado, a reforçar a exaltação do poder monárquico e, por outro, o prestígio das elites cortesãs. Isso é visível nos nascimentos, baptizados e casamentos, quando o conselheiro de Estado é informado do acontecimento pelo próprio Rei ficando, assim, compelido a apresentar as suas felicitações pela mesma ordem e preferência com que se juntam e se sentam, cabendo ao mais velho felicitar Sua Majestade por todos. Nestas ocasiões, o monarca recebe-os na casa interior, onde promove uma audiência para os conselheiros, a corte e os oficiais da Casa Real. E, mesmo aqui, o beija-mão configura-se como uma

1181 1182

Ver: Preeminências dos Conselheiros de Estado. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ MS. 624.3. Ver: ELIAS, Norbert – A sociedade de corte, 2.ª edição, Lisboa: Editorial Estampa, 1995, p. 60.

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oportunidade para distinguir os Conselheiros, pois a estes dá a mão a beijar despida de luva, enquanto que aos outros a apresenta meia coberta. Nas ocasiões de doença do Soberano e do falecimento de pessoas reais também o protocolo avista-se inflexível: nas primeiras, os conselheiros visitam juntos o soberano e, se o mesmo estiver de cama, falam-lhe de joelhos; nas segundas, ainda antes de acabar o enterro, os conselheiros juntam-se na antecâmara e são mandados entrar antes da restante corte, usando da palavra o conselheiro mais antigo, sendo que o Soberano recebe-os de pé, acompanhado dos Príncipes. No que concerne às audiências, aos conselheiros é-lhes permitida a entrada à Real Presença a toda a hora, seja para tratar ou propor algum negócio, mas nestas ocasiões não passam da antecâmara sem serem chamados, num movimento que é designado por entrada civil. A este conjunto de prerrogativas inseridas nos rituais da corte, juntam-se outros especialíssimos privilégios de distinção pública, militar e civil. Em primeiro lugar, élhes concedido assento superior ao dos ministros em todos os tribunais, tal como acontece aos Grandes. Depois, podem ir ao Conselho da Guerra sempre que o entenderem e aí obter o melhor lugar, sendo certo que ao serem convocados para os conselhos plenos são intitulados de Conselheiros de Estado e Guerra, recebendo as honras militares devidas aos príncipes, cardeais e embaixadores. E no caso do conselheiro pertencer ao exército, receberá o santo viático como os generais, permitindo-se-lhes vivandeiros próprios, isenção de tributos civis e do pagamento de direitos sobre as aquisição para o gosto da sua família e, ainda, o direito a receber bagagem por conta da caixa militar. De natureza patrimonial e familiar, é de realçar que os bens adquiridos pelos conselheiros são reputados de natureza castrense dos quais podem testar livremente, enquanto que os que comprarem em nome de algum filho não podem ser partíveis entre irmãos. A seus filhos são conferidos, em primeira instância, o lugar de deputado da Mesa da Consciência e Ordens, com dispensa de exame de admissão. Por outro lado, estão isentos do dever de aposentadoria e alojamento, mesmo face à necessidade de alojar a corte, e os bandos públicos não são permitidos em frente às suas casas. Os conselheiros de Estado, bem como os seus criados, estão isentos de toda a contribuição e imposição ordinária e pessoal, e o reporte de qualquer encargo só pode ser efectuado mediante a apresentação de ordem régia. Finalmente, aos conselheiros de Estado não é permitido pôr cominação de prisão. - 259 -

A estas práticas distintivas do exacto posicionamento do conselheiro de Estado na estrutura hierárquica do Estado, baseadas essencialmente numa tradição que evoluirá progressivamente para a regulamentação jurídica, associam-se um outro conjunto de acções individuais e particulares do conselheiro que importa aqui referir. Na verdade, o estatuto do conselheiro de Estado deve ser considerado como a súmula da etiqueta de corte e do seu procedimento individual, numa estreita afinidade entre a esfera pública e privada, característica própria das sociedades de Antigo Regime. E, assim, se compreende que, na sua vida privada, o conselheiro se configure como um simulacro do Soberano, patrocinando requerimentos de mercês e concedendo apoio mecenático à produção artística e literária, tornando visível uma dimensão paternalista e providencialista, ao procurar patrocinar a justa remuneração dos serviços prestados pelo vassalo, numa lógica de promoção do mérito determinada pela filosofia racionalista de inspiração iluminista. 4.3. A COMPOSIÇÃO DO CONSELHO DE ESTADO E O EXERCICIO DE FUNÇÕES Em 1807, o Conselho de Estado era formado pelo Cardeal Patriarca, os marqueses de Angeja, de Pombal e o de Belas, o visconde de Anadia, Luís de Vasconcelos e Sousa, D. Rodrigo de Sousa Coutinho e D. João de Almeida de Melo e Castro1183. No decorrer desse ano, serão nomeados António de Araújo de Azevedo e D. Fernando José de Portugal e Castro1184. António de Araújo é nomeado a 25 de Fevereiro de 18071185 e vai desempenhar essas funções ininterruptamente até à sua morte em 21 de Junho de 1817. A sua acção deve ser medida em dois momentos distintos: o primeiro, durante a crise diplomática de 1807, quando acumula com a Secretaria dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, com a Secretaria de Estado dos Negócios do Reino e como cargo de Ministro Assistente ao Despacho, estas duas em regime de interinato1186. No decorrer desse ano, será chamado, ainda, para Presidente da Real Junta do Comércio1187. O segundo momento, decorre a partir da chegada da corte ao Brasil, quando pede a exoneração dos restantes cargos, e vai decorrer até 1817, ano da sua morte.

1183

Ver: Almanach do anno de 1807 […], p. 93. Ver: IDEM - p. 641. 1185 “Elogio Histórico […]”, p. XXXIII. No suplemento do Almanach de 1807 vem referido que António de Araújo foi nomeado no decurso desse ano, mas sem especificar a data. Almanach de 1807, p. 641. 1186 “Elogio Histórico […]”, p. XXXIII. 1187 Almanach do anno de 1807 […], Suplemento, pp. 648-649. 1184

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António de Araújo vai desenvolver uma extraordinária operosidade no seio deste órgão desde os tempos que precederam a partida da corte para o Brasil até ao momento da assinatura do Tratado de Comércio com a Grã-Bretanha em 1810. 4.4. A PRODUÇÃO INFORMACIONAL A caracterização do processo informacional a montante do conselheiro de Estado afigura-se, à primeira vista, como algo simples se tivermos em conta, apenas, o carácter de órgão consultivo de que se revestiu o Conselho de Estado e que o afasta aparentemente da estrutura burocrática que envolve o expediente das secretarias de Estado. Apesar do facto do Conselho de Estado estar desprovido de uma estrutura administrativa de apoio, não devemos supor que o processo de convocatória e de consulta baseia-se no estabelecimento de contactos directos bidireccionais a nível descendente e ascendente. Esta é, sem dúvida, uma perspectiva redutora do funcionamento do Conselho e, por conseguinte, tem reflexos negativos na avaliação concreta do funcionamento deste orgão e do seu peso no processo de decisão régia. Neste sentido, sabendo que desde 1736, os ministros de Estados são conselheiros “natos”, importa inquirir outros canais de comunicação por onde se desenrola o aviso de convocatória ou o pedido de consulta. A análise da correspondência do Regente e do seu secretário particular com o ministro do Reino revela que é por esta via que vai ser desencadeado o processo de convocatória (ver Quadro 19). O Príncipe Regente comunica verbalmente a sua decisão ao secretário particular, o qual informa a régia deliberação por carta dirigida ao Ministro do Reino:

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Quadro 19 – Processo de consulta do conselheiro de Estado (1807-1817)

Príncipe Regente

Informa verbalmente da decisão de convocar o C. E.

Secretário de Estado (Cons. de Estado)

Informa por carta

Aviso de convocatória e documentação sobre objecto de consulta

Parecer

Acta Parecer

Secretário Particular (oficial maior)

Aviso de convocatória

Conselheiro de Estado

Reunião em Conselho

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Lembra-se S. A. R. de ouvir os seus Concelheiros de Estado, mandando-os vir aqui, dizendo-lhes o que ha para depois virem dar em Concelho a sua opinião. Quarta-feira de manhã falará S. A. R. aos seus Concelheiros de Estado, cada hum de per si; e quer que V. Ex.ª saiba isto, e fique prevenido desta Sua Real Deliberação.1188

O Ministro do Reino estava, também, incumbido de informar previamente os conselheiros do assunto a ser debatido. O mesmo procedimento ocorrerá quando o Regente decide nomear um novo conselheiro, incumbindo o ministro do Reino de lavrar o aviso de nomeação de D. Fernando José de Portugal e Castro1189, futuro conde e marquês de Aguiar, que pouco tempo antes tinha cessado as suas funções como vice-rei do Brasil. Mas nem sempre a convocatória foi um processo linear e imediato. Veja-se por exemplo a preparação para a reunião que viria a ocorrer a 26 de Agosto. No dia 24, José Egídio comunica a decisão de S. A. R. em consultar o Conselho de Estado e pergunta a Araújo, atendendo aos assuntos que tem em mãos, qual o melhor dia para tal. Araújo é de opinião que se deveria convocá-lo o quanto antes. No dia seguinte, José Egídio informa que quer S. A. R. que se convoque o Conselho para amanhãa, ressalvando mesmo que, como não está presente Joaquim Guilherme da Costa Posser, oficial maior da Secretaria de Estado, deve ser o próprio António de Araújo a redigir os avisos de convocatória1190. Outra situação registada, e esta é uma verdadeira inovação bem representativa do protagonismo do Ministro, ocorre a 29 de Agosto quando é o próprio António de Araújo quem recomenda a convocatória do Conselho de Estado a José Egídio, defendendo que: Ha tanta coiza que se prever, e precaver que me parece que S. A. R. fazia muito bem em convocar outro Conselho de Estado na semana que vem. Não pode lembrar tudo de hua vez, nem tratar-se tudo em hua sessão1191.

O pedido é renovado a 30 de Agosto e no dia seguinte José Egídio informa que

1188

Ver: Carta de José Egídio Álvares de Almeida para António de Araújo de Azevedo, datada de Mafra, 1807.08. 16. apud BARREIROS, José Baptista – ob. cit., p. 95. 1189 Ver: IDEM, datada de Mafra, 1807. 08. 25. Apud, BARREIROS, José Baptista – ob. cit., p. 98. 1190 Ver: IDEM, datada de Mafra, 1807. 08. 24. Apud BARREIROS, José Baptista – ob. cit., p. 95-96. 1191 Ver: Carta de António de Araújo de Azevedo para José Egídio Álvares de Almeida, datada de Mafra, 1807.08. 29. apud BARREIROS, José Baptista – ob. cit., p. 100.

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[S.A.R.] Manda-me repetir a V. Ex.ª que authoriza V. Ex.ª para convocar o Conselho no dia que lhe parecer, a vista do trabalho que V. Ex.ª tem de fazer, que ha-de servir para S. A. R. tomar as suas Reaes deliberações, depois de ouvir o mesmo Conselho; V. Ex.ª prevenirá a S. A. R. da convocação que S. A.R. deixa ao arbitrio de V. Ex.ª para não retardar hum só momento a deliberação em negócios de tanta importância1192.

Araújo sugere que se realize o quanto antes e aponta para a quarta-feira sustentando que Eu me apressaria quanto puder nos apontamentos que devo fazer, ainda que não leve feitos alguns papéis que devem estar prontos, mas ao menos S. A. R. poderá de antemão resolver o que se ha-de obrar. Preparo pois os avisos para os Conselheiros mas não os expesso sem nova ordem do Mesmo Senhor.

Por outro lado, refira-se, ainda, que nem sempre houve reunião em Conselho de Estado, optando o Regente por solicitar o parecer do Conselheiro. A 15 de Novembro do mesmo ano, era endereçado o aviso a D. Fernando José de Portugal e Castro, que redigiu texto em sua casa, conforme se deduz das seguintes palavras: He V. A. R. servido ordenar-me, como me participou o Conselheiro Jozé Egidio Alvares de Almeida por carta de hontem, que dê o meu voto por escrito […]1193 Nesta situação, verificamos que o documento descendente, o aviso, é lavrado pelo secretário particular do Príncipe, mas o documento ascendente, o parecer, sobe à presença régia pela secretaria de Estado do Reino, conforme é comprovado pela existência do mesmo no arquivo de António de Araújo. Era da competência do ministro do Reino receber os pareceres individuais de todos os conselheiros, reuni-los num processo, atribuir-lhes um título relacionado com o assunto em causa e anexar-lhes um resumo de cada um dos pareceres para subir à Real presença1194.

1192

Ver: Carta de José Egídio Álvares de Almeida para António de Araújo de Azevedo, datada de Mafra, 1807.08. 31. apud BARREIROS, José Baptista – ob. cit., p. 102. 1193 Ver: Parecer de D. Fernando José de Portugal e Castro, conselheiro de Estado. Datado de 1807. 11. 15. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 13,34. 1194 Ver: Processo composto pelos pareceres dos Senhores conselheirso de Estado em Lisboa para se instar a Lord Strangford e Gambier que saissem de Lisboa. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 13,34.

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Se António de Araújo, como Ministro do Reino, detém um papel importante no processo de convocatória do Conselho de Estado, também há que ter conta a sua dimensão de Ministro dos Negócios Estrangeiros. Durante todo o ano de 1807 os assuntos levados a Conselho são todos relacionados com a crise diplomática que envolve a França e a Inglaterra, assuntos esses que conhecem tramitação pela Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra. Logo, para além de fornecer a documentação a ser analisada pelos conselheiros, também os pareceres destes, detém importância na produção informacional da Secretaria de Estado: Neste sentido, devem ser lembradas, a título de exemplo, as questões relacionadas com a resposta às solicitações de Rayneval, encarregado de negócios da França, ou até da oferta de socorros pela Inglaterra1195. A resposta a Rayneval, por exemplo, foi discutida e redigida no Conselho realizado a 25 de Setembro de 1807 no Palácio de Mafra, tendo sido lavrada a seguinte indicação: Approvamos a piquena alteração feita nesta nota. (as.) Marquez de Pombal 1196 Visconde de Anadia

Outro exemplo do que aqui se refere foi a preparação da embaixada do marquês de Marialva a Paris, para cumprimentar o imperador Napoleão Bonaparte. Do Conselho do dia 13 de Novembro no Palácio da Ajuda, sairam umas instruções secretíssimas onde consta a seguinte indicação do punho de Araújo: Estas instruçoens secretissimas que se hão-de dar ao Marquez de Marialva, Embaixador Extraordinário a Paris forão aprovadas pelos Concelheiros de Estado abaixo assinados na Augusta Prezença do Principe Regente Nosso Senhor. Palacio de Nossa Senhora da Ajuda, 13 de Novembro de 1807. (as.) Marquez de Pombal Marquez Regedor Visconde de Anadia D. Fernando Joze de Portugal e Castro António de Araújo de Azevedo

1195 Ver: Apontamento de António de Araújo de Azevedo sobre os assuntos a serem debatidos em Conselho de Estado. [s. d.]. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 13, 22. 1196 Ver: Adenda à nota de resposta a Rayneval votada em Conselho de Estado. Palácio de Mafra, 1807. 09. 25. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 13,23.

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O mesmo ocorrerá quando foi decidida a clausura dos portos à Inglaterra1197 e, mais tarde, quando foi discutida a expulsão de Lord Strangford e se redigiu a carta do Príncipe Regente para esse efeito. A carta do Regente é autógrafa de António de Araújo, sendo que, no final, foi aposta a decisão do Conselho e a assinatura de todos os presentes por ordem de antiguidade e assinalado o nome daqueles que se pronunciaram de forma diferente: Os concelheiros de Estado abaixo assinados aprovarão esta carta, e S. A. R. ordenou que se expedisse a Lord Strangford. Também foram de parecer os Concelheiros de Estado sobreditos que se Lord Strangford se demorar em responder ou tergiversar se lhe deve intimar que parta de Lisboa para Lagos dentro em quarenta e oito horas, excepto o Marquez de Belas que foi de parecer, que se lhe não intimasse por ora o prazo de quarenta e oito horas (…). (as.) Marquez de Pombal Marquez Regedor Visconde de Anadia D. Fernando Joze Portugal e Castro António de Araújo de Azevedo1198

E mesmo nas vésperas da partida da corte, reuniu-se o Conselho de Estado e da Guerra realizada em Belém, na casa de Araújo, que juntou quatro conselheiros marquês de Belas, marquês de Pombal, visconde de Anadia, D. Fernando José de Portugal e Castro – aos conselheiros da Guerra – João Forbes Skellater, D. António Soares, D. Francisco Xavier de Noronha, Francisco da Cunha Meneses e os brigadeiros conde de Sampaio e D. Miguel Pereira Forjaz – para deliberar sobre a defesa do reino1199. Para além dos pareceres aqui referidos, parte das actas lavradas neste ano de 1807 encontra-se no arquivo do conde da Barca. Como temos visto, tal ocorrência deve-se, sem dúvida, ao facto de deter o cargo de Ministro do Reino1200, facto também explicado pela inexistência de convocatórias, pois esta Secretaria de Estado ao secretariar o Rei torna-se na fiel depositária dos arquivos e do expediente régio1201. 1197

Ver: Cópia dos votos dos conselheiros de Estado sobre a clausura dos Portos. 1807.10.19. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 13,31. Ver: Carta do Príncipe Regente intimando Lord Strangford a sair de Portugal num espaço de 48 horas. Palácio da Ajuda, 1807. 11. 17. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 13,35. 1199 Ver: Acta do Conselho de Estado e da Guerra realizada em casa de António de Araújo de Azevedo, em Belém, 1807. 11. 24. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 13, 37. 1200 Ver: Acta da reunião do Conselho de Estado na qual foi votado unanimemente aumentar as forças de defesa da capital para prevenir o desembaque das tropas inglesas. 1807. 10. 03. (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 13,30); Acta do Conselho de Estado na qual fica estipulado que as consequências para a coroa portuguesa serão as mesmas se as tropas francesas entrarem em Portugal sob o pretexto de amizade ou com o intuito de conquista. 1807. 10. 06. (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 13, 29). 1201 Ver: SUBTIL, José – “Os poderes do centro”, ob. cit., p. 178. 1198

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Para além disso, a actividade individual de António de Araújo de Azevedo pode ser aquilatada em diversos documentos da sua autoria como umas Reflexões sobre o plano para o Brasil1202; minutas de decretos1203, e uma série de pareceres que hoje se conservam no seu arquivo1204. Nos primeiros anos no Brasil, foi mais frequente o Monarca recorrer aos pareceres individuais, sem convocar o plenário. Entre 1808 e 1810, o Príncipe auscultou o Conselho no sentido de justificar publicamente a presença da corte no Brasil e para discutir a negociação do Tratado de Comércio com a Inglaterra, que viria a ser assinado em 1810. Durante esse tempo, António de Araújo permanecerá afastado do elenco ministerial e a sua vida pública estará, exclusivamente, centrada na acção como conselheiro de Estado. Por isso, o desencadeamento do processo de consulta é mais perceptível. Como vimos, os avisos dimanam das pessoas que detinham maior proximidade com o Monarca. No Rio de Janeiro, a maior parte das vezes das convocatórias saiu da Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, conhecida que era a ligeira ascendência de D. Rodrigo de Sousa Coutinho na corte e no círculo de decisão política nesses tempos1205. Mas, também se assistiu à redacção do aviso por detentores de cargos palatinos como é o caso de Matias António de Sousa Lobato, guarda-roupa do Soberano e escrivão da Câmara de S. M. no Registo Geral de Mercês no Rio de Janeiro1206. No caso de D. Rodrigo de Sousa Coutinho, isto ocorre quando os assuntos a serem analisados passam pela sua secretaria, sendo que a maior parte desses documentos registados nos livros da Secretaria de Estado, conforme se infere pelo símbolo “r.” aposto no canto inferior esquerdo. A 13 de Abril de 1808, o ministro e secretário de Estado endereça a António de Araújo um aviso solicitando o parecer por escrito sobre o esboço do manifesto que o 1202

Ver: ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 13,32. Ver: Minuta do decreto do Príncipe Regente relativo à sua adesão ao Sistema Continental e clausura dos portos portugueses ao comércio inglês. (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 13,28); Minuta de decreto do Príncipe Regente declarando que não obstante a decisão de se retirar para o Brasil não deseja interromper a negociação com o Imperador dos franceses. (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 13,13). 1204 Ver: Série de pareceres do conselheiro de Estado António de Araújo de Azevedo. (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 13,26; DOC. 13,25; DOC. 13,20). 1205 Segundo Oliveira Lima, se traçarmos um quadro cronológico do alto pessoal governativo que rodeou Dom João VI no Brasil e formou os seus reduzidos gabinetes de três ministros para seis pastas, veremos que coincidem os característicos das fases com as diferentes influências individuais que preponderaram a corte do Rio de Janeiro entre 1808 e 1821. Os quatro primeiros anos, de 1808 a 1812, pertencem decididamente a Linhares e à sua febril atividade reformadora. Ver: LIMA, Oliveira – D. João VI no Brasil, 3.ª edição, Rio de Janeiro: Topbooks, 1996, p. 150. 1206 Matias António de Sousa Lobato (1769-1826), 1.º barão (dec. de 13.05.1810) e 1.º visconde de Magé (dec. de 17.12.1811), 1.º Senhor de São João de Rei, do Conselho de S.M.F. D. João, seu guarda-roupa, comendador das Ordens de Cristo, de Nossa Senhora da Conceição e da de Torre e Espada, escrivão da Câmara de S. M: no Registo Geral de Mercês no Rio de Janeiro. Ver: Nobreza de Portugal e Brasil, […], vol. 2, p. 714. 1203

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Príncipe Regente pretendia publicar para justificar a sua conduta aos olhos dos vassalos. Para além de remeter o esboço do manifesto, o Ministro alerta o Conselheiro para a necessidade de se manter e de se justificar aos olhos da opinião pública, a aliança com a Inglaterra e de afastar todos os laços que pudessem envolver Portugal com a França. A 14 de Outubro de 1808 reunía-se, novamente o Conselho, para analisar o exacto papel desempenhado pela Junta do Porto e para deliberar sobre a redacção de uma carta régia dirigida ao bispo e à Junta devido à situação de efervescência em que Portugal se encontrava. Note-se que, neste caso, foi depois da reunião que António de Araújo reuníu um conjunto de documentação sobre o tema como proclamações1207 e cartas régias1208, que serviram de base à redacção do seu parecer datado de 11 de Novembro1209. Esta questão seria novamente debatida e desta vez aprovada a 22 de Dezembro de 1808, durante o qual D. Rodrigo de Sousa Coutinho leu uma nova versão da carta régia na presença do Príncipe Regente1210. Outro assunto que mereceu a análise de António de Araújo foi o processo que correu sobre Silvestre Pinheiro Ferreira1211. Em resposta ao aviso, António de Araújo dizia: Precizo de ver os livros de registo dos meus ofícios que se achão na Secretaria de Estado, onde também existirão alguns ofícios do referido Silvestre Pinheiro. Suplico a V. Ex.ª queira facilitar-me a inspecção de tudo isto para que eu possa cabalmente cumprir as ordens de S. A. R.1212

É curioso ver-se que, depois de consultada a documentação pretendida, António de Araújo redige o seu parecer e conserva no seu arquivo um processo composto pela minuta do mesmo parecer, umas reflexões sobre o assunto e o extracto do requerimento de Silvestre Pinheiro1213.

1207 Ver: Solene proclamação do Príncipe Regente aos povos de Portugal sobre a restauração da Soberania do Príncipe em Portugal. 1808. 09. 28. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18,60. 1208 Ver: Cópia da carta régia para o Bispo e Junta do Porto sobre a restauração da soberania em Portugal depois da expulsão dos franceses e constituição de uma única junta governativa [1808]. (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18,55); Cópia da carta régia para o juiz do Povo da cidade do Porto, respondendo à que convidava o Príncipe Regente a regressar a Portugal. (ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18,56); Cópia da carta régia para a Câmara do Porto agradecendo a tomada na Restauração do Reino. (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18,53). 1209 Ver: Parecer de António de Araújo e Azevedo, conselheiro de Estado sobre o papéis que foram objecto do Conselho realizado a 14 de Outubro de 1808. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18,51. 1210 Ver: Minuta do parecer de António de Araújo de Azevedo, conselheiro de Estado. Datado de 1808. 12. 26. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18,52. 1211 Ver: Aviso de D. Rodrigo de Sousa Coutinho para António de Araújo de Azevedo, datado de Palácio de Santa Cruz, 1809. 11. 09. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18,27. 1212 Ver: Minuta da carta de António de Araújo de Azevedo para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, datada de Rio de Janeiro, 1809.11.25. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18,39. 1213 Ver: Processo relativo ao parecer de António de Araújo sobre o requerimento de Silvestre Pinheiro Ferreira. Rio de Janeiro, 1809.12.29. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18,85.

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A questão da negociação do Tratado de Comércio com a Grã-Bretanha não difere do que aqui se referiu. Na verdade, Araújo debruçou-se sobre o primeiro tratado que se negociou no Rio de Janeiro entre o conde de Linhares e Lord Strangford1214, e sobre as reflexões do negociador português1215 para se inteirar da base negocial. Depois disso, redigiria um extenso parecer, dissecando ponto por ponto o tratado de comércio condenando em absoluto o seu teor e antecipando a ruína da indústria nacional1216. Mas, nem só pelo Ministro e secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra desceram as convocatórias para o conselheiro. Também por pessoas exteriores ao aparelho político-administrativo, o Príncipe Regente fez chegar a sua decisão ao conselheiro como foi o caso de Matias António de Sousa Lobato, que a 3 de Maio de 1810, convocou António de Araújo para uma reunião a se realizar hoje pelas ave marias na Real Chácara da Boa Vista. Dessa reunião, apenas resultou a seguinte nota de Araújo aposta na mesma carta de Lobato: Este chamamento foi para eu, e os outros Concelheiros de Estado votarmos sobre o mais extaordinario negócio que se podia pensar. Consistia em uma carta de Lord Strangford ao Príncipe representando a fraqueza que se achava o governo de Portugal, e para o forteficar propunha o Principal Souza para membro do governo; aprezentou ao mesmo tempo copea de uma carta do Ministro de Estado Wellesley a Mr. Villiers, então enviado em Lisboa, dizendo-lhe que se visse que a nação queria cortes, e que isto lhe dava energia, auxiliasse esta ideia, e conduzisse tudo de maneira que se seguissem os antigos direitos e costumes. O conde de Linhares escreveu uma carta ao Príncipe apoiando a posição de Lord Strangford, e que por este meio se evitavão cortes; ao menos assim o dava a entender. Votamos contra e por escrito sem nos juntarmos; e contudo vai nomeado o Principal Sousa ainda que com outros novos membros. Coiza digna de admiração. Semelhante intriga tem uma grande rameficação e foi traçada há muito tempo, e por isso se diminuirão os membros da regência D. Francisco Xavier de Noronha e Francisco da Cunha. Há muito que dizer, e reflectir sobre este objecto.1217

Por outro lado, os convites endereçados ao conselheiro de Estado, para cerimónias na corte ou para acontecimentos religiosos, brotavam da pena do secretário de Estado por onde o assunto tramitava. 1214 Ver: Cópia do tratado de comércio entre Portugal e Inglaterra, datado de 1809.02.28. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18,63. 1215 Ver: Reflexões do conde de Linhares ao projecto de tratado de comércio com a Inglaterra de 1809.02.28. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18,64. 1216 Ver: Minuta do parecer de António de Araújo de Azevedo, conselheiro de Estado. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18,66. 1217 Ver: Nota de Matias António de Sousa Lobato para António de Araújo de Azevedo, datada de Real Chácara da Boa Vista, 1810.05.03. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18,42.

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As audiências a embaixadores estrangeiros1218, nomeadamente aquelas em que se registava a entrega de credenciais1219, ou, ainda, o luto real pelo falecimento de um Soberano estrangeiro1220, eram comunicados por aviso do Secretário dos Negócios Estrangeiros e da Guerra. Os convites para acompanhar as cerimónias religiosas e civis a realizar na corte provinham de D. Fernando José de Portugal e Castro, Ministro do Reino, pois era pela sua Secretaria que corria o expediente da Casa Real. Nas primeiras, geralmente compostas por missa solene e Te Deum, incluiam-se a celebração do dia de Nossa Senhora da Conceição, padroeira do reino1221, a festa de purificação de Nossa Senhora, na Capela Real1222, a procissão do Corpo de Deus1223; nas segundas, geralmente compostas por audiências seguidas de celebrações eucarísticas, comemorava-se acontecimentos recentes como, por exemplo, a completa restauração da cidade de Lisboa e de todo o reino de Portugal1224 ou pela rendição de Caiena1225. Refira-se, ainda, que todas estas ocasiões estavam sujeitas à observância das regras de etiqueta de corte, sendo referido no próprio convite a obrigatoriedade do uso do uniforme de gala ou, por vezes, o papel a desempenhar pelo Conselheiro de Estado.

1218

Ver: Aviso de D. Rodrigo de Sousa Coutinho para António de Araújo de Azevedo, datado de Palácio do Rio de Janeiro, 1808.03.19. (ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18, 21); IDEM, datado de Palácio do Rio de Janeiro, 1809. 05. 03. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18, 23. 1219 Ver: Aviso de D. Rodrigo de Sousa Coutinho para António de Araújo de Azevedo, datado de Paço, 1808.07.29. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18, 8. 1220 Ver: Aviso de D. Rodrigo de Sousa Coutinho para António de Araújo de Azevedo, datado de Paço, 1808.09.24. ADB/UMSIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18, 13. 1221 Ver: Aviso do conde de Aguiar para António de Araújo de Azevedo, datado do Paço, 1808. 12. 06. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC.18, 43. 1222 Ver: IDEM, datado do Paço, 1808. 12. 16. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC.18, 45. 1223 Ver: IDEM, datado do Paço, 1809. 05. 30. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18, 48. 1224 Ver: IDEM, datado do Paço, 1808. 12. 16. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18, 44. 1225 Ver: IDEM, datado do Paço, 1809. 05. 28. ADB/UM-SIFAA/SSC 08.01/ DOC. 18, 47.

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CONCLUSÃO Ao longo deste trabalho fomos retirando diversas conclusões parcelares. No entanto, devemos apresentar uma síntese global apresentando, primeiro, algumas considerações de cariz histórico e, em seguida, algumas noções de índole arquivística. Em primeiro lugar, importa referir que percurso social ascendente de António de Araújo, segue uma lógica própria do seu tempo, em que se assiste à acumulação de sucessivas mercês régias que o levam a atingir o topo da hierarquia social com a ascensão à Grandeza através do título de conde da Barca. No entanto, António de Araújo configura-se como um personagem invulgar, na medida em que essa caminhada é iniciada, não pela fidalguia do “sangue”, a qual também é existente, mas pelo merecimento, reconhecido nos sucessivos diplomas de mercês régias, pelo empreendedorismo demonstrado numa permanente angariação de novas formas de obtenção de rendimentos que assentou permanente e simultaneamente, na procura do bem privado e do bem público. Estas características estão eminentemente ligadas à sua condição de Homem de Letras que, numa lógica voltairiana, defendeu a aplicação da Razão forte aos diversos ramos de um Saber inovador totalmente liberto dos dogmas até então dominantes. Logo, esta simbiose foi, de facto, a força motriz da sua ascensão social, de tal forma que podemos até referir que António de Araújo se configura como um caso excepcional, na medida em que a “meritocracia” só vem a ser cultivada pelo Regime Liberal. Como referimos logo no início deste trabalho, as suas dimensões de Morgado e de Ilustrado são o princípio e o fim do traço que envolve o actor social. Por outro lado, julgamos que através dos procedimentos comunicacionais adoptados por António de Araújo, foi possível lançar algumas achegas para a compreensão do exacto posicionamento do detentor de cargos públicos na estrutura político-administrativa do Estado no Antigo Regime, bem como das práticas seguidas ao nível do estabelecimento de vias de comunicação espontâneas e/ou intencionais e, ainda, das motivações que estavam subjacentes à custódia por particulares dos documentos de índole oficial. Depois, devem ser retiradas algumas conclusões arquivísticas. A estrutura da narrativa é, em si própria, uma conclusão, na medida em que reflecte uma necessária distinção entre os diversos contextos de produção informacional. Como vimos, o trajecto do Morgado e do administrador de propriedades não é semelhante ao do - 271 -

diplomata, nem ao do Ministro. Não obstante a produção informacional decorrer em simultâneo, seria incorrecto reduzir a génese da mesma a um único contexto, pois tal facto permitiria uma descrição e ordenação equivocadas ao patrocinar o desvirtuamento das

motivações

e

das

estruturas

que

motivaram

a

emergência

do

acto

info-comunicacional. A análise do papel de António de Araújo em cada situação concreta passa, inequivocamente, pela compreensão dos elementos estruturais que condicionaram as suas divrsas realizações. Assim, impõe-se uma estrutura sistémica ao acervo documental, que define a existência

de

uma

Subsecção

Morgado

e

Administrador

de

Propriedades,

eminentemente estrutural, e de vários subsistemas de informação “de função” conjunturais. Em relação à primeira, importa referir que na sua imediata dependência, devem estar agrupadas as séries tipológicas referidas no Cap. 2. Esta noção deve-se ao facto de, a partir de 1808, todos os bens terem convergido para o conceito unificador de Casa, sendo uns e outros administrados da mesma forma, independentemente das diferenças jurídicas que estão na base dos vínculos e dos demais bens. Por outro lado, a condição de Morgado proporcionou a António de Araújo o ensejo de tomar duas decisões que devem ser tidas em conta na organização da documentação: primeiro, o facto de ter reorganizado o cartório da Casa de Sá, leva-nos a concebê-lo como uma série informacional funcional que deve, por isso, ser incluída em bloco nesta subsecção; depois, a inclusão na Casa de Sá do arquivo de Tomás Vicente Cabeças de Sousa, demonstra inequivocamente a emergência de um subsistema de informação de natureza familiar, pois os contextos e as motivações associadas à produção informacional que o mesmo encerra, situaram-se fora da linha de evolução da família Araújo de Azevedo. Em relação aos segundos, deve ser referido que a informação decorrente do desempenho de cargos públicos está intimamente ligada aos procedimentos administrativos característicos de cada um dos organismos em que prestou funções, os quais estão sujeitos às normativas e à legislação em vigor. Neste sentido, agrupar toda a documentação produzida nos diversos cargos seguindo um critério tipológico seria incorrecto. Tornou-se necessário definir vários subsistemas de informação, cada um com a sua própria lógica de funcionamento, como o Enviado Extraordinário na Haia, Ministro Plenipotenciário em Paris, Ministro Plenipotenciário em São Petersburgo, Ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, Ministro e Secretário de Estado do Reino, Ministro e Secretário de Estado da Marinha e dos - 272 -

Domínios Ultramarinos, Presidente da Real Junta do Comércio e, finalmente, o Conselheiro de Estado. Em suma, refira-se que a abordagem sistémica ao arquivo do conde da Barca permitiu erguer uma estrutura orgânica interna que reflecte as causas da produção da documentação, reconhecendo os diversos contextos genésicos da mesma. Se, por um lado, a convergência de António de Araújo de Azevedo para a estrutura imposta pelo cartório da Casa de Sá permite compreender o seu contributo para a evolução estrutural da família, por outro lado, o facto de se identificar e isolar a documentação que conheceu tramitação nos diversos expedientes em que prestou serviços, contribui para suprir a inexistência dessa mesma documentação nos Arquivos nacionais e estrangeiros onde se encontram os respectivos acervos.

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Estados do Brasil até o dita dia, Rio de Janeiro, na Impressão Régia, 13 de Maio de 1808. VALDEZ, António – Annuario Portuguez, Histórico, Biographico e Diplomático, seguido de uma synopse de Tratados e convenções celebrados entre Portugal e outras potencias, Lisboa: Typographia da Revista Universal, 1855. NEVES, José Acúrsio das – Obras completas, com estudos introdutórios de António Almodôvar e Armando Castro, [s.l.], Edições Afrontamento, [s.d.], 6 vols. Recordaçoens de Jácome Ratton […] sobre ocurrências do seu tempo em Portugal, durante […] Maio de 1747 a Setembro de 1810 […], Londres, Impresso por H. Bryer, 1813.

III. BIBLIOGRAFIA ESPECÍFICA 1. ANTÓNIO DE ARAÚJO DE AZEVEDO, CONDE DA BARCA. 1.1. PERIÓDICOS E PANFLETOS [Carta do “Português Velho” ao Redactor de “O Campeão Português”], in: O Campeão Português …, vol. II, n.º XX, 16 de Abril de 1820, pp. 284-286. [Juízo critico do ministério de António de Araújo de Azevedo], in: O Portuguez ou Mercúrio Político, Comercial e Literário, Londres: Impresso por W. Lewis, Julho de 1817, pp. 957-958, cit. por BRUM, J. Z. “Do Conde da Barca, de seus escriptos e livraria”, in: Annaes da Bibliotheca Nacional do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro: Typ. G. Lenzinger e Filhos, 1876-77, Fascículo n.º 1, pp. 18-19. “As quatro coincidências de datas”, in: O Campeão Portuguez ou o Amigo do Rei e do Povo, vol. 1, N.º V, Setembro de 1819, Londres: Impresso por L. Thompson, pp. 151-159; N.º VI, pp. 187-195. “Representação que a S. M. fez António de Araújo de Azevedo no anno de 1810”, in: O Campeão Portuguez ou o Amigo do Rei e do Povo, vol. 1, N.º VI, Outubro de 1819, Londres: Impresso por L. Thompson, pp. 266-274. Resposta Pública à denúncia secreta que tem por título “Representação que a Sua Magestade fez António de Araújo de Azevedo em 1810”, offerecida ao juízo do público e da posteridade (para que appellou o Correspondente do Campeão Portuguez,) por seu autor R. da C. Gouveia, Londres: R.E.A. Taylor, 1820. 1.2. ESTUDOS HISTÓRICO-BIOGRÁFICOS “Elogio Histórico do Conde da Barca, recitado na Assembleia Pública de 24 de Junho de 1819 pelo sócio Sebastião Francisco de Mendo Trigoso”, in: História e Memórias da Academia real das Sciencias de Lisboa, Tomo VIII, Parte II, Lisboa: Typographia da Academia, 1823, pp. XV-XLVI. ARAÚJO, Artur da Cunha - Perfil do Conde da Barca, Edição do Autor, Porto, MCMXL. - 276 -

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CATROGA, Fernando – O Republicanismo em Portugal – Da formação ao 5 de Outubro de 1910, Coimbra: Faculdade de Letras, 2.º vol., 1991. MAGALHÃES, Francisco de - “Médicos de Ponte de Lima”, Separata do Elucidário Regionalista de Ponte de Lima, Ponte de Lima: Tipografia de Augusto de Sousa, 1950. RAMOS, Luís de Oliveira – “Memória sobre os deputados do Minho às Constituintes de 1911”, in: Bracara Augusta, vol. XXX, II tomo, Ano de 1976 (JulhoDezembro), N. 70 (82), Braga: Câmara Municipal, pp. 384. RAMOS, Luís de Oliveira – “Os descendentes do brasileiro Thomaz: uma família da burguesia minhota”, in: O Tripeiro, 7.ª série, 10 (4), Abril de 1993, p. 107. SOUSA, Amadeu José Campos de – Braga do entardecer da monarquia ao tempo da 1.ª República (1890-1926). Abordagem de História política, Braga: Edições Casa do Professor, 2004, pp. 61 e segs. 3. ARQUIVÍSTICA E CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO 3.1. OBRAS DE REFERÊNCIA “Arquivo”, in: Verbo, vol. 2, col. 1272-1302. “Arquivos Distritais Portugueses”, in: Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, vol. 3, pp. 308-310. ALVES, Ivone[et al.] - Dicionário de terminologia arquivística, Lisboa : Instituto da Biblioteca Nacional e do Livro, 1993. COSTA, Avelino de Jesus da – princípios gerais da elaboração de instrumentos de trabalho em Arquivologia: arquivos públicos e arquivos eclesiásticos, Coimbra: Universidade, 1966. Separata do Encontro dos bibliotecários e Arquivistas portugueses,1 CRUZ, António – “Arquivos Portugueses”, in: Dicionário de História de Portugal, vol. 1, dirigido por Joel Serrão, Lisboa: Iniciativas Editoriais, pp. 201-206. FARIA, Maria Isabel, PERICÃO, Maria da Graça, Novo dicionário do livro da escrita ao multimédia, [Lisboa] : Círculo de Leitores, 1999. 3.2. TEORIAS E ESTUDOS BARBEDO, Francisco – “Documentos Particulares e correspondência em arquivos de Família”, in: Arquivos de Família e Pessoais – Seminário, Vila Real: Associação Portuguesa Bibliotecários Arquivistas e Documentalistas – Grupo de trabalho Arquivos Família e Pessoais, 1997, pp. 123-133. BELLOTO, Heloísa Liberalli – “Diplomática luso-brasileira do século XVIII: tipologia dos documentos ascendentes e dos documentos descendentes”, in: Páginas a&b, n.º 3, Lisboa: Edições Colibri, 1999, pp.19-30. BERTOLETTI, Esther Caldas – “Preservação e acesso de acervos de documentos históricos considerados como património comum”, in: Páginas a&b, n.º 1, Lisboa: Edições Colibri, 1997, pp. 113-127. - 281 -

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ANEXOS

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ANEXO I - TESTAMENTO DE ANTÓNIO DE ARAÚJO DE AZEVEDO, CONDE DA BARCA

Certifico que revendo o livro de registo de testamentos que serve neste Juízo numero outenta e dous de alternativa sentar nelle a folha huma se acha registado o testamento com que falleceo o Illustrissimo e Excelentíssimo conde da Barca António de Araújo de Azevedo, de quem hé testamenteiro então o Illustrissimo Conselheiro José Egídio Alvares de Almeida e cujo testamento he do teor seguinte: Em nome de Deos Amen. Eu António de Araújo de Azevedo, conde da Barca, Conselheiro de Estado, Ministro e Secretario de Estado dos Negócios da Marinha e Domínios Ultramarinos etc. tenho sempre prezente a pouca duraçam da vida e a certeza da morte em saber quando terminarão meos dias, achando-me bastante enfermo de cama, porem em meo perefeito juízo e entendimento, e desejando de um modo solene declarar a minha constante e última vontade sobre as pias e justas intenções de meo ânimo, tomei a deliberação de fazer testamento e ordenar pela forma e maneira seguinte. Declaro que por Divina Providencia sou christão e como tal felizmente educado e nunca me apartei da fé e sociedade da Igreja Catholica Romana antes sempre cri e creio em tudo quanto ella nos ensina e manda crer, esperando salvar-me, não pelos meos merecimentos mas pelos da Paixão e Morte do Nosso Senhor Jezuz Christo Redentor e Salvador do Mundo, protesto permanecer nesta crença e fé athe o ultimo momento da minha vida e para a que haja de passar à melhor, implorei sempre ao Anjo da minha guarda e todos os Santos da minha devoção para que intercedam por mim e pelo seu valimento consiga o perdão dos meos pecados. Peço e rogo, em primeiro lugar, ao Conselheiro Senhor José Egídio Álvares de Almeida e, em segundo lugar, ao Dezembargador Senhor José Duarte da Silva Negrão Coelho queiram, por serviço de Deos, serem meos Testamenteiros com livre e geral administraçam de todos os meos bens porque os hei por abonados em real administraçam de todos os meos bens porque os hei por abonados em Juízo e fora delle, pela confiança que dos mesmos tenho por conhecer nelles a possibilidade e terem dado prova de verdadeiros amigos no decurso de muitos annos. Sempre me conservei no estado de solteiro, não tenho por isso herdeiros forçados, e por isso instituo por meo universal herdeiro a meo Irmão o Conselheiro - 292 -

João António de Araújo de Azevedo que prezentemente está em minha companhia e nelle nomeio os prazos de livre nomeação na forma que direito for. Tenho a honra de servir a El-Rey Nosso Senhor e como fica declarado ainda que desvellando-me sempre por satisfazer ao que me cumpria e cumpre a prol do Real serviço do Publico e das Partes, todavia se contra minhas intençõens procedi como não devia ou tive algumas ommissoens de tudo peço perdão a Sua Magestade, ao Estado e a todas e a cada huma das pessoas que de mim recebessem algum aggravo esperando na indefectível Piedade e Grandeza de El-Rey Nosso Senhor haja de attender com a competente remuneração não só todos os meos serviços taes quaes fossem dignos de Sua Régia contemplação, ordeno ao meo Irmão e herdeiro para que possa imediatamente requerer a El Rey Nosso Senhor qualquer remuneração que seja servido e do útil ter cada huma das minhas sinco irmãs, residentes em Vianna, duzentos mil réis durante a vida de cada huma dellas, que à proporçam que forem vagando reverterão para a Casa de meo herdeiro universal. Tendo tido várias contas com a Caza de Gaspar José Antas Coelho, declaro aqui que estas contas se achão saldadas por parcellas provenientes de arrendamentos que deva receber o dito Gaspar José Antas Coelho por tempo determinado e como constará do contracto que se há de fazer cujo arrendamento é da Casa de minha residência defronte do Passeio e do Laboratório Chimico que pertence ao mesmo prédio. Espero os ditos meos testamenteiros tragam digo testamenteiros pelo bem da minha alma hajão de mandar fazer todos os sufragios como pede a caridade christã e nada mais tendo de recommendar-lhes sobre este importante objecto e muito menos a respeito do meo funeral que será disposto com a moderação que convém, assim hei por concluído este meo Testamento requerendo as Justiças a quem o seu conhecimento haja de pertencer que o fação executar e roguei a João Nepomuceno de Assis o escrevesse a quem o dito João Nepomuceno fiz de mandado do Illustrissimo e Excelentíssimo Senhor Testador como Sua Excellencia o dictou e pela achar escripto nesta conformidade comigo o assignou. Rio de Janeiro dezassete de Junho de mil oitocentos e dezassete. Como testemunho que este fiz de mandado e ordem de Sua Excellencia – João Nepomuceno de Assis. Declaro que por não poder Sua Excellencia assignar em razão de se achar muito trémulo pediu que a seu rogo assignasse o Senhor Luiz António da Costa - 293 -

Barradas, Official da sua Secretaria. Assigno por ordem de Sua Excellencia pelo motivo acima ditto digo acima declarado – Luís António da Costa Barrada. Aprovação – Saibam quantos este publico instrumento de approvaçao de testamento virem que, no anno do nascimento de Nosso Senhor Jezus Christo de mil outocentos e dezassete, aos dezoito dias do mês de Junho, na chácara aonde reside o Illustrissimo e Excelentíssimo Senhor António de Araújo de Azevedo, conde da Barca, Conselheiro de Estado, Ministro e Secretário de Estado dos Negócios da Marinha e Domínios Ultramarinos, aonde eu Tabellião fui vindo e sendo ahi o achei gravemente enfermo de cama, porem em seu perfeito juízo e entendimento segundo o acerto e palavras com que me respondeo as perguntas que lhe fiz, e por ele me foi ordenado lhe escrevesse o seu testamento, ao que satisfiz sendo por elle dictado e o não assignou por se achar muito tremulo assigna por Luiz António da Costa Barradas, official da sua Secretaria com o exercício no Gabinete, e sendo lhe lido o achou conforme e o queria aprovado o qual contem trez meias folhas escriptas todas e numeradas e rubricadas por mim com o meo appellido “Assis” e não têm vício emendas ou couza que duvida faça por isso lho aprovei praticando todas as formalidades que a ley recommenda e rogou o Excelentíssimo testador as Justiças de Sua Magestade Fidelíssima o façam cumprir como nelle se contém e declara e pela razão acima delcarada assignou a rogo de Sua excelência o dito Luiz António da Costa Barradas, com as testemunhas prezentes João Joaquim Xavier de Brito, Ildefonso Leopoldo Bayard, Manoel Rodrigues Gameiro Pessoa, todos officiaes da dita Secretaria de Estado, o coronel Joaquim Norberto Xavier de Brito, o Marechal dos Reaes Exércitos João de Mendonça Corte Real, todos com as qualidades em a Ley recommendadas. Eu João Nepomuceno de Assis, tabellião que o escrevy e assigney em público e razo. Em testemunho da Verdade estava o signal publico – João Nepomuceno de Assis. A rogo de Sua Excellencia passo – digo – Luiz António da Costa Barradas. João de Mendonça Corte Real. José Joaquim Xavier de Brito. Manuel Rodrigues Gameiro Pessoa. Ildefonso Leopoldo Bayard. Joaquim Norberto Xavier de Brito. Fonte: BIBLIOTECA NACIONAL DO RIO DE JANEIRO/Secção de Manuscritos/Cód.II-35,5,5 - Cópia do traslado existente às folhas 30 verso a 36 dos autos de incorporação dos Próprios e Nacionais da casa sita na rua do Passeio e que fora do excelentíssimo Conde da Barca, de 17.8.1825.

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ANEXO II - REQUERIMENTO DO CONSELHEIRO JOÃO ANTÓNIO ARAÚJO DE AZEVEDO DIRIGIDO A S. M. REQUERENDO

DE A REMUNERAÇÃO DOS SERVIÇOS PRESTADOS PELO SEU IRMÃO CONDE DA BARCA.

Com o maior respeito e acatamento reprezenta a V. Magestade João António de Araújo de Azevedo, do Conselho de V. Magestade e Conselheiro da Fazenda, que seu irmão o Conde da Barca António de Araújo de Azevedo no testamento, com que falleceo, cuja cópia he o documento junto, instituiu o supplicante por seu herdeiro universal, e contando com os effeitos da Real munificência de V. Magestade, deixou ao supplicante os seus serviços, para que podesse requerer immediatamente qualquer remuneração, que V. Magestade fosse servido conferir ao supplicante, impondo-lhe o ónus de dar annualmente do útil dessa remuneração duzentos mil reis a cada huma das suas sinco irmãas durante a sua vida. He, pois, em consequência da sobredita dispozição testamentária, que o supplicante confiando, como seu irmão, na Real grandeza de V. Magestade, vem aos pés do throno requerer e pedir humildemente a V. Magestade a remuneração dos sobreditos serviços, os quaes não podendo o supllicante provar, como porventura fora necessário, se fossem de outra natureza, vai contudo expô-los na Augusta prezença de V. Magestade, recordando as épocas em que o irmão do supplicante entrou no serviço de V. Magestade, em que tempo e porque maneira serviu, os empregos que ocupou por mercê de V. Magestade, as commissões de que foi encarregado, e finalmente os annos que teve a honra de ser empregado no Real serviço. O irmão do supplicante entrou na sarreira diplomática no anno de 1787, nomeando-o a Augusta mãe de V. Magestade por seu enviado extraordinário e ministro plenipotenciário junto aos Estados Geraes de Holanda: na sua viagem para Haia, vizitou a Inglaterra e a França, travou rellaçõens e correspondências com os sábios destes paizes, e continuando as suas assíduas applicações ao estudo das Sciencias Filozóficas e Administrativas, necessárias a todo o homem de Estado, grangeou reputação, e se preparou para bem servir a V. Magestade. Os sabidos sucessos da Europa levarão os Francezes à Hollanda em 1795, e foi nesta época critica que o Irmão do supplicante seguindo vereda diversa dos seos collegas, que estavão em iguaes rellações politicas com a França, se conservou firme no seu posto. Esta conducta que a Europa louvou, que o inimigo respeitou, e que - 295 -

mereceu a Real Approvação de V. Magestade facilitou os meios de entrar em negocianções com a França cujos reprezentantes declararão então, que nos reputavão em guerra. Sendo tudo isto prezente a V. Magestade pelas rellações officiaes de seu ministro na Haia, e tendo V. Magestade resolvido fazer a paz com a França, mandou V. Magestade que o irmão do supplicante revestido do mesmo carácter de seu ministro plenipotenciário passasse a Pariz para tratar e concluir a paz da Coroa portugueza com aquelle Governo. Tratar com um Governo immoral e revolucionário, não compromettera nossa harmonia e allianças politicas, que subsistião havia quaze hum século, e obter por fim a tranquilidade de que carecia a Monarchia, era tarefa a mais árdua, mas foi emprehendida, e levada a fim; e se foi tal qual a publicaram naquelle tempo as folhas publicas, o negociador de V. Magestade, manejou este negocio com tanta dexteridade, que nem foram ofendidas as antigas allianças, nem compormetido o decoro e dignidade Soberana. Contudo V. Magestade não houve por bem ratificar esta obra, por motivos sem dúvida da maior ponderação; e aquelle Governo sem ley vendo-se illudido, e não podendo com as suas seduções fazer determinar o Negociador a mudar de conducta o fez prender na prizão do Templo em Pariz, dando-lhe por este nunca visto procedimento opportuna ocazião de elle poder provar a energia e constância Portugueza. Nesta prizão vio a sua vida muitas vezes exposta a barbaridade da revolução, até que novas mudanças o puzerão a salvo e livre para continuar no Real Serviço. Segunda e terceira vez voltou à França para conseguir a paz, e tendo esta sido concluída em Madrid segundo as ordens de V. Magestade, voltou a Lisboa, de onde V. Magestade o mandou a Petersburgo, em 1801, como seu ministro junto do Imperador da Rússia. Nesta Corte, onde seu nome já tinha chegado pela sua reputação literária, e pela credibilidade que lhe derão os sucessos da sua vida política, foi acolhido com muita distinção. As suas maneiras nobres e polidas, e os conhecimentos que havia adquirido nas suas viagens à Alemanha, à Saxónia, á Prússia, e à Suécia, cujas constituições e interesses havia estudado muito de perto, o habilitaram para merecer, como mereceo, a consideração do Imperador e de toda a Família Imperial, e igualmente a amizade do Primeiro Ministro que o ouvia sobre os negócios políticos, e com o qual tratava os que ocorriam do serviço de V. Magestade com a maior franqueza e facilidade. - 296 -

Nos fins do anno de 1803, ordenou V. Magestade que elle se recolhesse sem demora a Lisboa; postos de parte todos obstáculos, obedeceo, e se pôs a caminho e, atravessando quaze toda a Europa, chegou a Lisboa no dia 2 de Junho e a 6 do mesmo mez do anno de 1804, houve V. Magestade por bem de nomear por seu Ministro e Secretario de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra. Elevando-o, depois, em Fevereiro de 1807 ao lugar de Conselheiro de Estado e dando-lhe no mesmo anno a Presidência da Junta do Comercio. Na Historia da Monarchia Portugueza não há huma época que se possa comparar como a que decorreo principalmente desde o anno de 1804 até Novembro de 1807, nenhum outro Ministro serviu a V. Magestade nos Negócios Estrangeiros, que se achasse em crize mais melindroza e arriscada além dos cuidados que era precizo empregar na direcção dos diversos ramos da Repartição da Guerra e da industria que fomentou como se viu, principalmente, em promover o estabelecimento da fábrica de fiação e tecellagem do nosso linho, era mister manejar de maneira os árduos negócios políticos daquella crize que nos seus pareceres, submetidos à Soberana sanção de V. Magestade, se guarda-se a justiça não comprometendo-se o decoro e a dignidade Real, e attendendo-se aos oppostos interesses das duas grandes potências da Europa qe se debelavam incarniçadamente. As Soberanas rezoluções de V. Magestade em tão árdua conjuntura foram admiradas e respeitadas em toda a Europa, o Rey de Inglaterra o manifestou ao Conselho em 25 de Novembro de 1807 para a protecção dos Navios do Comercio Portuguez, foi illudida a ambição do tirano uzurpador, e V. Magestade com a sua enérgica, magnânima e memorável rezolução do dia 26 de Novembro salvou a sua Sagrada Pessoa, a sua Augusta Família, a Monarchia, e os seus fieis vassalos. Constante na crença e adhezão Portugueza aos seus legítimos Soberanos não balançou e se determinou a acompanhar V. Magestade, concorrendo até com o seu dinheiro para o preparo da não Meduza, em que se embarcou. Este facto he publico, e não foi menos a firmeza e valentia com que na câmera da mesma Nau, na prezença de vários pessoas rebateo a insolente ouzadia com que Lord Strangford ameaçou de que o Almirante Inglez aprezaria a Esquadra Portugueza logo que sahisse a barra de Lisboa; ameaças cuja consequências tomou sobre si para não inquietar a V. Magestade fazendo assim naquelle momento da véspera da partida hum marcado serviço a V. Magestade. Obtendo aqui a demissão do lugar de Ministro e Secretario de Estado que desde Lisboa havia supplicado a V. Magestade, se entregou ao estudo e prática das Sciencias - 297 -

mais úteis a este rico paiz; concorreo facilitando parte de sua caza para nella se estabelecer a Imprensa, que fizera vir consigo de Lisboa, como quem conhecia bem, que sem este meio se não pode avançar na instrucção e a civilização pública; estabeleceo um Laboratório Chimico, de que muitos moços se tem aproveitado ouvindo as lições de seu director e tudo lhe grangeou huma opinião tal de amante deste paiz que de toda a parte lhe enviavão Memórias e produtos naturaes que eram ensaiados para se conhecerem os seus uzos e applicações. Comtudo seria esta conducta coherente com a que guardou sempre no curso da sua vida, sem a Real consideração de V. Magestade que se dignou de ouvir o seu parecer nos negócios do Estado, ou fóra ou nos Conselhos de Estado, poderam enfrear a malevolência dos seos gratuitos inimigos, e o irmão do supplicante teve de sofrer, como por vezes reprezentou a V. Magestade, não os riscos da vida, como sua prizão do Templo, mas a angústia de saber que por seu respeito sua mãe e irmãos estiveram expostos a serem assassinados, e sobretudo a mancha da sua honra e de toda a sua Família, que mais que a vida vale. O tempo e a bondade do coração de V. Magestade inacessível aos imbustes da maldade cicatrizarão feridas tão penetrantes, dignando-se V. Magestade de elevar o irmão do supplicante à dignidade de Grã-Cruz da Ordem de Christo, a 17 de Março de 1810, e nomeando-o em Fevereiro de 1814 para Ministro e Secretário de Estado dos Negócios da Marinha e Domínios Ultramarinos. Nesta Repartição, e na dos Negócios Estrangeiros, de que principlamente V. Magestade o encarregou, trabalhou com zello mui destinto e assiduidade que parecia incompatível com o estado das suas forças fízicas vizivelmente diminuídas, depois da grave moléstia que o atacou em Maio de 1814. Pelo falecimento do marquez de Aguiar foi o irmão do supplicante outra vez nomeado por V. Magestade para Prezidente da Junta do Comercio, mas recaindo sobre elle o expediente dos negócios de todas as Secretarias de Estado, sucumbio ao pezo da gravidade dos negócios e do trabalho conservando e manifestando mesmo no leito da morte o seu zelo pelos negócios do Estado, acabando a vida pronunciando por últimas palavras os seus agradecimentos a V. Magestade por todas as mercês e lugares que havia recebido da Sua Real Bondade. Serviços assim obrados pelo espaço de quaze trinta annos, à custa de tantos incómmodos, riscos e fadigas, sendo os mais importantes testemunhados por V. Magestade por serem feitos immediatamente debaixo das suas vistas só podem ser avaliados pela Soberana Consideração de V. Magestade: No Decreto de 6 de Janeiro - 298 -

de 1798 V. Magestade os declarou destintos, laboriozos e leais, fazendo mercê ao irmão do supplicante por principio de remuneração da Comenda de São Pedro do Sul da Ordem de Christo, bispado de Vizeu. Esta Real rezolução, e as expressõens do decreto pelo qual V. Magestade Tendo attenção a estes serviços se dignou elevar à Grandeza o irmão do supplicante com o título de conde da Barca, dão ao supplicante a bem fundada esperança de que na prezente occazião estes serviços não só serão tidos e havidos como distintos, laboriozos e leaes, mas serão caracterizados como os mais relevantes feitas à Coroa de V. Magestade, para por elles merecer o supplicante as graças e mercês que forem do Real agrado de V. Magestade, das quais o supplicante se julga digno, por isso que também tem a honra de ser empregado no Real Serviço. Premiar serviços he perpetuar a memória dos bons servidores do Estado, e he incitar os vassalos para bem servirem; esta tem sido a máxima constante de todos os Soberanos Augustos Predecessores de V. Magestade, que mais que nenhum outro tem dispensado graças e mercês com mão verdadeiramente Augusta e liberal. O despacho dos sucessores à Caza de Anadia, e outro muitos que não seria fácil numerar, provam esta verdade, e he por isso que o supplicante pondo toda a sua confiança na Magnanimidade e Grandeza de V. Magestade, com a mais rendida submissão e respeito

Para V. Magestade que sendo servido de tomar na sua Real consideração os serviços obrados pelo conde da Barca, que acima ficão referidos, haja por bem em remuneração delles conferir ao supplicante as mercês que forem mais do seu Real agrado, esperando o supplicante que hão-de corresponder não menos à relevância dos dittos serviços, que à Grandeza de V. Magestade, que há-de querer perpetuar assim a memoria de hum vassallo sempre fiel, e de um criado zellozo que com tanto apego e disvelo servio a V. Magestade E. R. M. (as.) JOÃO ANTÓNIO DE ARAÚJO DE AZEVEDO - 299 -

FONTE: BIBLIOTECA NACIONAL DO RIO DE JANEIRO /Colecção biográfica/C-521,18 Requerimento do Conselheiro João António de Araújo de Azevedo dirigido a S. M. requerendo a remuneração dos serviços prestados pelo seu irmão conde da Barca.

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ANEXO III - Catálogo dos livros de João António de Araújo de Azevedo. Encontram-se algumas obras que pertenceram ao conde da Barca e algumas que o conselheiro adquiriu posteriormente. N.º de Título ordem A dictionary of the portuguese and english languages etc.. By Anthony Vieyra 1 Transtagano. London, 1794. Abrègé portatif du dictionnaire geographique de la Martiniere. Paris, 1759. 2 3 4

A lyrica de Horacio Flacco em verso portuguez, por Elpino Duriense. Lisboa, 1807. Atlas celeste, arranjado por Flamsteed, etc., traduzido por (…) e revisto e correcto pelo Doutor Francisco António Ciera e pelo Coronel Custodio Gomes Villas Boas. Lisboa, 1804.

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As obras do Doutor Francisco de Sá de Miranda, por Vicente Álvares. 1614.

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Avis aux péres et méres sur l'inoculation de la petite verole, por D. de la Roche. Paris. Folheto. Idem. A bucolica de Francisco de Pina e de Mello. Coimbra, 1755.

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Advertencias sobre a carta chronographica da vida e reinado dos Augustos Reys de Portugal. Folheto. Argus lusitanum, ou cartas analyticas sobre o merecimento do jornal Correio Braziliense. Londres. Folheto. Arte da grammatica da lingua do Brazil, pelo Padre Luiz Figueira. Lisboa. 1755. A Philosopha por amor, ou etc. Rio. 1801. Brochado.

13

Analyse dos privilegios concedidos aos militares que se aplicam às sciencias mathematicas. Por Manuel de Castro Correia de Lacerda. Lisboa, 1804.

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Anályse da profissão de fé do Santo Padre Pio Sexto, por Antonio Pereira de Figueiredo. Lisboa, 1791.

15

Analyse da memória publicada pelo Doutor Jozé Martins da Cunha Pessoa em o n.º 52 do Investigador Portuguez em Inglaterra, por António Nicolau de Moura Stockler. Rio, 1816. Folheto.

16

Appel à la nation anglaise, etc. pour Mr. de la Santine. Londres, 1807. Folheto.

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Appel au peuple français, et au corps legislatif. An 5. Folheto.

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Arithmetica política. He um papel manuscrito. Apontamentos para corregedores. He hum livro manuscrito, mas somente começado. - 301 -

20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 39 40 41 42 43 44

Allegação de Direito a favor de D. Manoel Coutinho etc., por Diogo Lopes de castro. Lisboa, 1687 Abrègé de l'histoire universel en figures, etc. Paris, 1785 Alfonsiada, poema heroico, etc, por António Jozé Osorio de Pina Leitão. Bahia, 1818. A virtude coroada na felicissima acclamação da Rainha Nossa Senhora no sempre memorável dia 13 de Mayo de 1777. Lisboa, 1777. A technologia do Doutor Belkmann para servir de preludio aos diccionarios de artes e officios, etc. por Gregorio Joze de Seixas, redactor do mesmo diccionario. Lisboa, 1813. São 4 exemplares, e por conseguinte 4 vol. Barboza (Manoel), Remissiones doctorum etc. Ulissipone, 1681. Idem Biblioteque philosophique du legislateur, etc. pour J. P. Brissot de Wrville. Berlim, 1782. Bibliotheque phisico-economique, instructive, et amusant. Paris, 1788. (he o tomo segundo). T[runcada]. Breves instrucções aos correspondentes, etc. Folheto. Collecção da legislação antiga, e moderna do reyno de Portugal, parte 2.ª. Legislação moderna, Coimbra, 1789. 5 livros em 3 vol.. Collecção chronologica dos assentos das Cazas da Suplicação e do Civel. Coimbra, 1791. Classes dos crimes por ordem systematica, etc. por Joaquim Jozé Caetano Pereira e Souza. Lisboa, 1803. Idem Collecção das leys, decretos, alvarás, etc. desde 1750. Lisboa, 1771. etc. Collecção dos breves pontificios, e leys regias, publicadas desde 1741, sobre a liberdade das pessoas, bens, e commercio dos índios do Brazil, etc. Collecção das provas à Dedução Chronologica, e analitica do Doutor Joze de Seabra da Silva. Lisboa, 1767. Compendio histórico do estado da Universidade de Coimbra no tempo da invasão dos denominados Jesuítas, etc. Lisboa, 1771. Constituições Sinodaes do Arcebispo de Braga, ordenadas em 1639, e impressas em Lisboa, em 1697. Cordeiro (Joannes Rodrigues) Dubitationes in foro frequentes etc. Conimbrico. 1713. Cabedo (Jorge de) Prima et Secunda pars decisionum senatus regni Lusitanio. Ulissipone. 1602-1604. Carvalho (João de) Novas et methodicus tratatus de una et altra quarta, legitima falcidia, etc. Conimbrico. 1631. Chronica da Companhia de Jesus do Estado do Brazil, etc. pelo Padre Simão de Vasconcellos. Lisboa, 1663. He somente o tomo 1.º. Chronica dos reis de Portugal, por Duarte Nunes de Leão. Lisboa, 1677. Chronicas d'El Rey D. João 1.º, D. Duarte, D. Affonso 5.º, por Duarte Nunes de Leão. Lisboa, 1780. - 302 -

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Collecção de Principios geraes para o estabelecimentoconservação, e aumento de hum Imperio, etc. Por João Anastacio de Souza Pereira da Sylva Portilho. Rio, 1817.

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Costume of Portugal, Bay [sic] Henry l'Eveque. Folio. Clave Geografica para aprender Geografia los que non tienem maestro, por el R. P. Mra. Fr. Henrique Flores. Madrid, 1769. Constitution de l'Angleterre ou état du Gouvernement anglais, etc. por M. de Lolme. Geneve, 1793. Collecção de versos e descripções dos quadros allegoricos, etc. que em sua caza expoz Joze Pedro da Silva. Lisboa, 1812. Comedia Ulyssipo de Jorge Ferreira de Vasconcellos, copiada por Bento Joze de Souza Farinha. Lisboa, 1787.

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Composições poeticas de Belchior Manoel Curvo Semmedo. Lisboa, 1803

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Compendio da obra da Riqueza das Nações de Adam Smith, por Bento da Silva. Lisboa, Rio, 1811. Certidão dos auttos de libello crime contra o reverendo João Rodrigues Lopes do bispado de Bragança. Lisboa, 1813. Compendio de Botanica ou etc., por Felix de Avellar Brutero. Coimbra, 1793. Cultura da granza ou raiva dos tintureiros, etc. Lisboa, 1803.

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Caroli Linné. Sistema vegitatibilium Cur. Jo. Frid. Gmelin. Lugduni, 1796.

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Codice pe Delitté. Vienna, 1803. Collecção das peças literarias que se repetirão na Sessão de 13 de Mayo feita etc. Lisboa, 1816. Compilação de reflexões de Sanches, e outros ácerca das causas e remedios das doenças dos exércitos, por Alexandre Antonio das Neves. Lisboa, 1797. Cozinheiro moderno, ou nova arte de cozinha, etc. por Lucas Rigaud. Lisboa, 1807. Considerations importantes sur l'abolition gènèral de la traite de négres, par un Portugais. Paris, 1814. Folheto. Idem. Folheto Collecção de noticias para a Historia e Geographia das Nações Ultrmarinas, que vivem nos dominios portuguezes, etc. pela Academia Real das Sciencias. Lisboa, 1812. Collecção de memórias sobre os estabelecimentos de humanidade. Traduzidas pelo Bacharel Feliciano Fernandes Pinheiro. Lisboa, 1801. T[runcada]. Calendrier de Lisbonne pour l'an 1808. Lisboa. Copia de provizoes, ordens, e leis espedidas à Superintendência das Coudelarias. Manuscrito. Clavis juridica. Manuscrito. Chronica do Imperador Beliandro. Manuscrito. Censura do Padre F. ao Glossario do Padre Me. Dor. Fr. Francisco de São Luiz; e resposta deste à dita sensura. He um papel Manuscrito. Copia de hum parecer ou voto sobre o plano militar da defeza do reino de Portugal. He papel manuscrito que se diz feito por Gonçalo Lourenço Botelho. Collecção de várias obras de autores portuguezes feita em 1745. Manuscrito.

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Carta de privilégios dos inglezes no reino e dominios de Portugal etc., Londres, 1736. he hum Manuscrito. Correspondência authentica e completa dos Ministros de Sua Santidade com os agentes, e generaes francezes. Lisboa, 1809 e 10. folhetos. Congratulação de Portugal aos manes de seus primeros heroes, pela Nova Liberdade. Lisboa, 1808. folheto. Canção régia. Carta escrita por L. P. A. P. a hum patricio da cidade da Bahia. Lisboa. 1808. folheto. Dedução chronologica e analitica, etc., pelo Doutor Jozé de Seabra da Silva. Lisboa, 1767. Diccionario françois, latin, italien, etc., por Mr. l'Abbé Annibal Antonine. Lyon, 1770. o 2.º Tomo. (T.) Diccionario portuguez, francez e latino. Por Joaquim Joze da Costa e Sá. Lisboa, 1794. Diccionario da lingua portugueza, pelo Padre D. Rafael Bluteau. Reformado, etc. por António de Moraes Silva. Lisboa, 1789. Diccionario lusitanico latino de nomes proprios de regioes, reinos, provincias, etc. por Fr. Pedro de Poyares. Lisboa, 1667. Diccionario de agricultura etc. por Francisco Soares Franco. Coimbra, 1804. Diccionario abreviado da fabula, etc. por Mr. Chompre. Traduzido etc.. Lisboa, 1798. Diccionaire geographique portatif, etc. traduit de l'Anglais par Vosgien. Paris, 1803. Diccionario geografico ou noticia historica de todas as cidades, villas, rios, etc. do reino de Portugal, e Algarves. Por Antonio Patricio. Lisboa. Hé o 1.º Tomo. T[runcada]. Diccionario portuguez das plantas, arbustos, mattas, árvores, animaes, etc., por Jozé Monteiro de Carvalho. Lisboa, 1817. Diccionaire élémentaire de Botanique, ou etc. Par M. Buliard. Paris, An. 6 Discurso jurídico, económico, politico, etc., por Doutor. Nunes de Oliveira. Lisboa, 1788. Direito Patrio, explicado por Luiz Joaquim e castello, em a Universidade de Coimbra, etc.. Manuscritos. De jure lusitano, etc. por Matheus Homem Leitão. Conimbrico, 1675. De manu regia, tractatis prima, pars, etc., por Gabriel Pereira de Castro. Ulissipone, 1622. De munere provisoris praticum compendium, par D. Simão d'Oliveira da Costa. Ulissipone, 1688. Descripção de Portugal etc., Por F. M. D. F. C. D.C.D.P.E.A.. Lisboa, 1788. D. D. Didacus à Britto in Rubicam et titulum de - Locato. Ulissipone, 1744. Description abrègé de tous les traveaux tant d'amalgamation, que de fonderies, etc. Por Mr. Fragozo de Siqueira. Dresde, 1800. Dissertation sur la maniere d'approfonsir les fleuves à leurs embouchures, etc. Pour M. A. Val. Haye, 1755. Des droits de l'homme sur le lien conjugal ou traite. Pour M. Renoul de Baschamp. Paris, 1790. - 304 -

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Discurso sobre la iducacion popular de los artesanos, y su fomento. Madrid, 1775. Des prisons de Philadelphie. Pour un Européen. Ambourg, 1797. folheto. Documentos que authorizão a água de Inglaterra de António Jozé de Souza Pinto. Lisboa, 1811. Dedução dos votos do Supremo Conselho Provisorio, que iluminarão a decisão final do Conselho da Guerra feito ao chefe de Divizão Rodrigo Jozé Ferreira Lobo. Londres, 1817. Diagnosis tipografica dos caracteres gregos, hebraicos, e arabicos, etc. por Custodio Jozé de Oliveira. Lisboa, 1804. Discurso sobre as utilidades do desenho. Por Joaquim Machado de Castro. Lisboa, 1788. folheto. Dialogo entre Braga e o Porto. 1808. Londres. Folheto. IDEM. Diario para uso comodo dos ministros e officiaes da Relação e Caza do Porto. Lisboa, 1801. Folheto. Decrectos do intruso Governo francez em Portugal, etc. Dissertação histórica crítica a respeito da vida de Rodrigo Rey dos Godos. Por Fr. Manuel de Figueiredo. Lisboa, 1786. Folheto. Discurso sobre o voto de castidade, que professão os freires de Santiago da Espada. Por D. Jozé Manoel da Camara. Rio, 1815. Folheto. Descripção das festas com que a Câmara do Porto celebrou a entrada dos regimentos de Infantaria n.º 6 e 18. Lisboa, 1814. Folheto. Discurso fundamental sobre a população, etc. traduzido por Luiz Prates de Almeida de Albuquerque. Rio, 1814. Description d'une machine à battre les bleds, etc., pour Mr. Michel Missel. Dresden, 1803. Folheto. Demonstração das grandes utilidades da fiação e tecelagem do algodão em Portugal. Por xx. Lisboa, 175. Folheto. Direcções sobre o uso da àgua de Inglaterra, etc. por António Jozé de Souza Pinto. Lisboa, 1809. Folheto. Das contribuições públicas. Discurso etc., composto por Ganilh, e traduzido, etc. por hum Portuguez em Caiena, 1816. Folheto. Idem. 1816. Folheto. Dilecto filis Bartholomeo Ruspoli, etc. 1802. Folheto. Dissertação em que se mostra, que a razão humana he mui fraca se não he illustrada pela revelação, pelo Padre Francisco Clouts Vanzeller. Lisboa, 1815. Folheto. Drama aluzivo ao caracter, e talentos de Manoel Maria Barboza du Bocage, por Eloi Ottoni. Lisboa, 1806. Folheto. Enciclopedie méthodique, ou par ordre des Martires, etc., Finance. Apadoue, 1784. Estatutos (antigos) da Universidade de Coimbra, confirmados em 1653 pelo Senhor D. João 4.º. Coimbra, 1654. Estatutos (modernos) da Universidade de Coimbra, compilados no feliz reinado do Sr. D. Jozé 1.º, etc. Lisboa, 1772. Elucidário das palavras, termos, e frazes, etc. por Fr. Joaquim de Santa Roza de Viterbo. Lisboa, 1798. - 305 -

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Ensaio económico sobre o comércio de Portugal e suas colónias, etc. Por Jozé Joaquim da Cunha d'Azevedo Coutinho. Lisboa, 1794. Escala actual do corpo da Marinha de S. M. Fidelíssima, por Gonçallo Lourenço Botelho de Castro, em 7 de Junho de 1766. He hum pequeno volume manuscrito. Ensaio sobre a crítica de Alexandre Pope. Traduzido em Portuguez pelo Exmo. Sr. Marquez d'Aguiar, e reduzido a verso heroico solto por Joaquim Ignacio da Motta. 1816. Manuscrito. Ephemeride Historial. Manuscrito. Ensaio sobre as Minas. Por Jozé Anastácio da Cunha. Hum volume manuscrito. Elogio Histórico de Pascoal de Mello Freire dos Reis, etc. por Francisco Borja Garção Stockler. Lisboa, 1799. Epitome único da dignidade de grande e maior ministro da Puridade. Por Fr. Francisco do Santíssimo Sacramento. Lisboa, 1666. Elementos de arithmética por Mr. Bezout, traduzidos do francez. Coimbra, 1791. Estudo de Guitarra etc. por António da Silva Leite. Porto, 1796. folheto em papel. Embargos offerecidos no juizo da Coroa por parte da Senhora D. Maria Balbina etc. contra a sentença a favor da Senhora D. Maria Leonor etc. e seu marido. Lisboa, 1806. folheto em papel. Essai sur l'Histoire du Droit Naturel. Londres, 1757. Elementos de higiene, ou etc. por francisco de Mello Franco. Lisboa, 1814. Experiences et reflexions relatives à l'analyse du Bled, et des farines, por M. Parmentier. Paris, 1776 Experiencias, e observações sobre a liga dos bronzes etc. por Carlos Antonio Napion. Traduzidas por Carlos Julião. Lisboa, 1801. Idem. Escola mercantil sobre o comercio assim antigo como moderno entre as nações etc. Por Manoel Luiz da Veiga. Lisboa, 1803. Exposição verídica e sincera da falsidade do facto, e depoimentos contra Fortunato Jozé Barreiros. Por. F. J. B.. Bruges, 1815. Folheto. Epistola de Heloisa a Abaylard. Traduzida em verso português por xxx M.os. Londres, 1821. folh. Fol. Exposição dos factos que derão cauza à emigração de Jozé Valério Velozo. Bordéus, 1816. Brochado. Essai sur les causes qu'en 1649 amènerent en Angleterre etc. por Bailay (de la Meurthe). Paris, An 7. Ensaio sobre o estabelecimento de bancos etc.. Rio, 1812. Folheto. Eloge de Montesquieu, Discours etc. por M. Vellimain. Paris, 1816. Folheto. Ensaio sobre o chinchonino etc. por Bernardino Antonio Gomes. Folheto. Idem. Elegia de Gray escrita no adro de huma igreja de aldeia, traduzida por António de Araújo de Azevedo. Eloge de M. Marmontel etc. por Mr. l'Abbé Morellet. Paris, 1805. Folheto. Exame dos artigos históricos e politicos do Correio Braziliense, etc. Extrait du ceremonial relatif au couronnement de leurs Majestés Imperiales. Folheto. - 306 -

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Echelles graphiques pour la comparaison de l'aune de Paris avec le mètre, etc. Folheto. Extrait de la Revue Philosophique Litteraire et Politique. Folheto. Fontes proximas da compilação Filipina, ou índice etc. por Joaquim José Ferreira Gordo. Lisboa, 1792. Ferreira (Manoel Lopes) Pratica Criminal, etc.. Porto, 1767. Flores de Espanha, excelencias de Portugal, etc. por Antonio de Souza de Macedo. Coimbra, 1737. Fundação, antiguidades, e grandezas de Lisboa, por Manoel António Monteiro de Campos. Lisboa, 1753. Fisionomia, e vários segredos da Natureza por Jerónimo Cortez. Coimbra, 1706. Formule de cérimonies et de priéres pour le sacre de leurs Majestés Imperiales etc. Paris, 1804. folh. Guerreiro (Didacus Guerreiro Camacho de Aboym) De munere judicis orphanorum de inventario. Conimbrico, 1699. T[runcada]. Gomes (Alexandre Caetano) Manoal pratico judicial, civil, e criminal, etc. Lisboa, 1751. Idem. Lisboa, 1792. Glossario das palavras, e frases da lingua franceza, etc., que se tem introduzido na locução portugueza moderna, etc., pelo Padre Me. Dor. Fr. Francisco de S. luiz, hum vol. manuscrito. Geographie moderne etc., por Mr. l'Abbé Nicolle de la Croix. Paris, 1777. 8.º Geographie universelle etc., por le P. Buffier. Paris, 1772.

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Galatea ecloga, por António Joaquim de Carvalho. Rio, 1810. folheto. História do Direito de Portugal, período 1.º que acaba na entrada dos Romanos nas Espanhas. Manuscrito. Historia romana, dictada em Coimbra pelo lente Francisco Xavier de Vasconcellos. Manuscritos. Historia da America Portugueza desde 1500 até 1724, por Sebastião da Rocha Pita. Lisboa, 1730. História do futuro. Livro anteprimeiro etc., pelo Padre António Vieira. Lisboa, 1718. Histoire du detronement d'Affonse 6.e Roi de Portugal, traduit de l'Anglois. Paris, 1742. Historia do Direito de Portugal. Man[uscrito]. Horas Mariannas ou o officio menor da Santissima virgem Maria Nossa Senhora etc. por Fr. Francisco de Jesus Maria Sarmento. Lisboa, 1772. Histoire du Droit publique, ecclesiastique françois, etc., par Mr. D. B. Londres.

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Histoire naturel du Troment, por Mr. l'Abbé porcelet. Paris, 1779. Jo. Gottlieb Heinecii Operas. Geneve, 1771. Introdução ao Direito particular de Portugal. 1789. Manuscrito. Jurisconsultos portuguezes, que escreverão sobre as Leys Patrias. Manuscritos.

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Instrucção do estabelecimento das mitreiras ou fábricas de salitre artificial. Vertida em Portuguez em 1806. Manuscrito.

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Indice militar de todas as leis, alvarás etc., desde 1752 até 1810, por Domingos Alvares Branco Moniz Barreto. Rio, 1812 Instituições oratórias de M. Fabio Quintiliano, traduzida por Jeronimo Soares Barboza. Coimbra, 1788. Index chronológico dos alvarás, cartas, provizões, etc.. Manuscrito. Impugnação compendioza aos embargos da Sra. D. Maria Balbina de Souza Coutinho contra a sentença a favor da Senhora D. Maria Leonor Carolina da Conceição Manoel de Vilhena Costa e Freire, e seu marido Jozé Sebastião de Saldanha de Oliveira e Daun sobre a fazenda e morgado de Pancas, pelo Advogado Miguel Lopes de Lião. Lisboa, 1806. Instrução sobre o novo methodo de preservar os navios de naufragarem por cauza de água aberta. Por Joaquim Carneiro da Silva. Lisboa, 1805. Folheto. Indice chronologico remissivo da legislação portugueza, etc., por João Pedro Ribeiro. Lisboa, 1815. Instrucção sobre a forma dos exames dos professores de latim. Coimbra, 1800. Hum papel impresso. Introducção para a historia ecclesiastica do bispado Lamecens, por I. M. D. C. D. C. D. P. E. A. Lisboa, 1787. Folheto. Informações para os negociantes do Brazil, que dezejão, etc., por Jozé Maria Roversi. Londres, 1809. Folheto. Instruction sur le Foyer, n.º 11, de l'invention du citoyen Desernod. Paris, 1803. Folheto. Truncado Introduction à l'étude des medailles, pour A. L. Callillin. Paris, 1796 Leis extravagantes colligidas pelo licenciado Duarte Nunes de Leão por mando do Sr. D. Sebastião. Coimbra, 1796. Leis da décima. Liber utilissimus judicibus et advocatis, ab Antonio Cardozo do Amaral. Conimbrico, 1695. Lima (Mauri Ludovici) Commentaria ad ordenationes regni Portugaliae etc., ad perficiandum opus commentariorum ab Emmanuel Gonçalves Silva. Olissipone. 1761. T. he o 1.º tomo. Lara (ildefonso Peres de) De anniversariis et capellaniis. Ostii Moguntinorum, 1610. Leitão (Antonio Lopez) Liber utilissimus ad praxim de judicio finium regundorum. Conimbrico, 1690. L'Eneide di Virgilio del Commendatore Annibal Caro. Parigi, 1760. Le Sacre et le Couronnement de Napoleon Premiere etc.. Paris, 1805. Legislation primitive considerée dans les derniéres temps, etc., por L. G. A. de Bonald. Paris, 1802. Luz da liberal e nobre arte de cavalaria, por Manuel Carlos de Andrade. Lisboa, 1790. La Scienza della legislazione del cavalier Gaetano Filangiere. Venezia, 1782. Le Droit Public de l'Europe fondé sur les traités. Por Mr. l'Abbé de Mably. Genéve, 1776. L'Art du dentiste etc.,, por Alexandre Lenti, dentist. Hambourg. L'éloquence du corps ou l'action du predicateur, pour Mr. l'Abbé Denouart. Paris, 1761. L'eclésiastique citoyen, ou etc.,. Paris, 1787. - 308 -

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Le politique danois. Copenhague, 1759. Les milles et un jour, contes persans traduits en Français, par M. Petis de la Croix. Paris, 1778. La vida e fabulas del Esopo. 1607. Laurel de entreméres varios. Por Juan de Ibar. Zaragoça, 1663. Luziadas de Luiz de Camões. Coimbra, 1800. T[runcada,] he o 2.º tomo. Lettres de ninon de Lenclos au Marquis de Sevigné. Amsterdam, 1757. T[runcada,] he o 1.º Tomo. La Lusiade de Camoens. Traduction poetique avec des notes historiques, et critiques, etc., por Mr. de la Harpe. Londres, 1776. La science des negociants et teneurs de Livres, ou etc.,, por feu de la Porte. Amsterdam, 1783. Les lois éclairées par les sciences phisiques, ou traité de medicine legale, etc., pour François Emmanuel Federé. Paris, An 7e. T[runcada,] he o 1.º tomo. Livrinho ou folheto de contas, etc., por xxx . Lisboa, 1796. Lettre de M. Aristide Du Petite Houars à ses suscripteurs. Folheto. Lettres originals de Montesquieu, aux Chevalier Daydie. Paris, 1797. Folheto. Le triomphe de la bonne cause etc., Paris, 1816. Folheto. La mort de Ignez de Castro; et Adamastor, etc., por Suplice Gaubier de Barrault. Lisbonne. Folheto. Livro que serve para trasladar ordens, e cartas importantes, e de officio, etc., alli tem tambem uma cópia do regimento do despacho das mercês de onze de Janeiro de 1671. (Manuscrito) Les participes français mis a la portée de tous ceux qui se font une loi de parler e d'ecrire correctement. Folheto. Leçons de Grammaire et de Geographie, por L. Gaulter. Lettres original de Commerce, etc., traduit de l'allemand de Mr. Busch. Haye, 1801. Mendes a Castro (Emmanuelis) Pratica lusitana. Conimbrica, 1739. Monteiro (Manoel Antonio) Tractado pratico juridico civel e criminal. Lisboa, 1765. Moraes (Silvestre Gomes de) Tractatus de executionibus instrumentorum, et sentenciarum etc., Conimbrico, 1729. Memoria para servir de indice dos foraes das terras do reino de Portugal, e seus domínios, por Francisco Nunes Franklin. Lisboa, 1816. Memorias para a história das inquirições dos primeiros reinados de Portugal, etc., colligidas pelos discipulos da Aula de Diplomatica. Lisboa, 1815. Memorias de Literatura portugueza, publicadas pela Academia Real das Sciencias de Lisboa. Lisboa, 1792. Memorias economicas da Academia Real das Sciencias de Lisboa, etc.,. Lisboa, 1789. Methodo para construir as estradas em Portugal, por Jozé Diogo de Mascarenhas Netto. Porto, 1790. Manuel Epistolaire à l'usage de la Jeunesse etc.,. Par L. Thillipon, la Madelaine. Paris, An 13e. Memoires sur les pretendus emigrés savoisiens. 1796. Folheto. - 309 -

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Memória sobre a absoluta necessidade que há de mitreiras nacionaes, etc. por Manoel Jacinto Nogueira da Gama. Lisboa, 1803. Mercador exacto nos seus livros de contas etc., por João Baptista Bonavie. Lisboa, 1779. Methode facile de conserver les grains, et les farines, pour Mr. Parmentier. Londres, 1784. Memória sobre a conducta do Doutor Bernardo Jozé d'Abrantes e Castro, etc., Londres, 1810. Memória para a história das confirmações régias neste reino, etc., coligidas pelos discípulos da Aula de Diplomatica. Lisboa, 1816. Memória sobre a cultura das oliveiras em Portugal, etc., pelo Doutor João António Dalla Bella. Coimbra, 1786. Memória sobre o estado actual das fábricas de lanificios da villa da Covilhã, etc., pelo bacharel João António de Carvalho Rodrigues da Silva. Lisboa, 1804. Memoria abreviada etc., dos importantes serviços que fes a nação o Senhor Manoel Jorge Gomes de Sepúlveda, por Francisco Xavier Gomes de Sepulveda. Lisboa, 1809. Methodo novo de curar segura e prontamente o antraz ou carbunculo, e a pustula maligna, por Luiz de Santa Anna Gomes. Rio, 1811. Folheto. Methodo para a salga da sardinha, por Clemente Ferreira França. Lisboa, 1802. Folheto. Memoria sobre hum projecto de Pasigrafia por Jozé Maria Dantas Pereira. Lisboa, 1800. Folheto. Modern London etc.,. London, 1805. Manuscritos de Sanches. Livro de Montaria etc., e de diferentes materias. Manuscrito. Mapa da avaliação, e dos direitos da Alfândega do Porto, etc., por Francisco Gomes Velloso d'Azevedo. Porto, 1814. Folheto. Manuscrito. Memorias para a matéria dos agravos no auto de processo e de petição, ou instrumento, feito por F. L. de S. B.. Manuscrito. Memoria sobre o Direito e prática das licitações etc., pelo Bacharel António Joaquim de Gouveia Pinto. Lisboa, 1819. Folheto. Memória relativa aos regimentos de signaes da Marinha por Francisco António Marques Geraldes. Rio, 1820. Manifesto dos procedimentos do Concelho Real de Hespanha, etc., traduzido em Portuguez. Lisboa, 1808. Brochado. Memoria sobre o modo de fazer tombos etc., por Luiz Gonzaga de Carvalho Britto. Coimbra, 1806. Brochado. Novo sistema de agricultura de Arndt, ou methodo de preparar, e semear as terras com charruas etc. traduzido por Joaquim Pedro Fragozo de Siqueira. Manuscrito. Folheto. Nova arte de Violla etc., por Manoel da Paixão Ribeiro. Coimbra, 1789. Noticia da mithologia, etc. traduzida do francez por A. J. T. Lisboa, 1803. Narrative of a five years expeditions, against the revolted Negroes of Suriname etc. by Captain I. G. Stedman. London, 1806. Nouveau dictionnaire françois portugais, par le Capitain Emmanuel de Souza, et augmenté por Joachim Joseph da Costa e Sá. 1734. - 310 -

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Nova grammatica da língua ingleza, etc., por Agostinho Neri da Silva. Lisboa, 1779. Novo methodo das partidas dobradas, etc., por Manoel Luiz da Veiga. Lisboa, 1803. Noticias biographicas de Francisco Homem de Magalhães Pizarro pelos seus ajudantes de ordens. Rio, 1819. Folheto. Note circulaire addressé par le comte du Funchal, etc., Londres, 1815. Folheto. Noticia da sopa de Rumford. Lisboa, 1800. Folheto. Nouvelle instruction sur les poids et mesures, etc. par C. A. Prieur. Paris, An 4. Folheto Nouveau dictionnaire de poche français-allemand, et allemand-français. Leipzig, 1802. Nobiliarchia portugueza, etc., por Antonio de Villas Boas e Sampaio, da Villa de Barcellos. Lisboa, 1727. Nobiliario de D. Pedro. Roma, 1640. Observações bothanico-médicas sobre algumas plantas do Brazil por Bernardino António Gomes. Lisboa, 1803. Ordenações e leis do reino de Portugal, etc., (São as chamadas Filipinas). Lisboa, 1727. em 8.º. Ordenações do Sr. D. Affonso 5.º. Coimbra, 1792. Ordenações do Senhor D. Manoel. Coimbra, 1797. Oliva (Feliciano de Oliva e Souza) Tractatus de fora ecclesia. Colonia, 1733. Oeuvres philosophiques de Paw, ou recherches philosophiques sur les americains, sur les egypciens, et chinois, e sur les grecs. Paris, na 3e. de la Republique. Oeuvres de Condillac etc., Paris, an 6e. 1798. O feliz independente do mundo e da fortuna, ou etc., pelo Padre Theodoro de Almeida. Lisboa, 1779. T[runcada] (he o Tomo 2.º). Os frades julgados no tribunal da Razão, obra posthuma de Fr. xxx Lisboa, 1814. Obras de Jozé Anastacio da Cunha. Manuscritas. Os Luziadas de Camões copia de hum rarissimo manuscrito tirada em Paris. 1788. Officium biata Maria Virginis etc., Venetiis, 1772. O filosofo inglez, ou historia de Mr. Cleveland filho natural de Cromwel, Traduzida do francez por F. F. I. T. Lisboa, 1802. O Plutarco revolucionário, etc., traduzido do inglez. Lisboa, 1809. Oeuvres de Jacques Delille, ou les trois regnes de la Nature. Paris, 1808. Observações sobre o commercio franco no Brazil pelo auctor dos Princípios de Direito Mercantil. Rio, 1808. 1.ª 2.ª e 3.ª parte. Opúsculo filológico para entender o Mercúrio, Gazetas, etc., pelo novo calendário francez. Lisboa, 1796. Folheto. Observations chimiques etc., dans l'art de faire le vin rouge etc., par M. de Sampaio. Paris, 1807. Idem. Observações acerca do cravo da Índia. Folheto. Ode de Dryden para o dia de Santa Cecília, traduzida por António de Araújo de Azevedo. Folheto - 311 -

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Ósmia, tragedia, etc.,. Lisboa, 1795. Folheto. Observações sobre a agricultura do Brazil, etc., traduzida do inglez. Rio, 1810. Folheto. Oração gratulatória pelo milagre da preservação da vida do Sr. Rey D. José 1.º em 3 de Setembro de 1758: recitada pelo Padre Mestre Fr. Joaquim de Santa Anna. Lisboa, 1759. Ode patriotismo etc., por hum Patriota de Lisboa. Lisboa, 1808. Folheto. Observações sobre a prosperidade do Estado, etc., por José da Silva Lisboa. Rio, 1810. Brochado. Ode à Senhora D. Maria 1.ª contando 74 annos de idade em 17 de Dezembro 1808. Lisboa, 1808. Folheto. Observations carpologiques par Mr. Correa da Serra. Folheto. Princípios de Direito Divino, e Natural, Publico, Universal e das Gentes etc., pelo bacharel Felippe José Nogueira Coelho. Lisboa, 1777. Primeiras Linhas sobre o Processo Civil, por Joaquim Jozé Caetano Pereira e Souza. Lisboa, 1810. Primeiras linhas sobre o processo militar, por J. J. C. P. e S. Lisboa, 1785. Idem. Pratica cível e crime. Manuscrito. Pratica secular. Manuscrito. Folheto. Pratica judicial. Manuscrito. Pecúlio jurídico. Manuscrito. Pecúlio. Manuscrito. Princípios do Direito Mercantil, e leis de Marinha, etc., por José da Silva Lisboa. Lisboa, 1801. T[runcada]. Princípios de Economia Politica, para servir de introducção à tentativa económica do auctor dos Princípios do Direito Mercantil. Lisboa, 1801. Princípios de Agricultura Filosófica, por Felix de Avellar Brotero. Coimbra, 1793. Projecto Económico sobre o Lima etc., pelo Bacharel Jozé Fernandes da Silva. Manuscrito. Prodigiosa lagoa descoberta nas Congonhas das Minas do Sabará, etc., reimpresso no Rio de Janeiro em 1820, à custa de Francisco António Geraldes. Folheto. Projecto de melhoramento dos trez importantíssimos esteios da felicidade do Estado Portuguez. Porto, 1814. Folheto. Manuscrito. Papeis políticos. Manuscrito Panegyricus Historicus Sempiterna Memoria Paschoalis Jozephi de Mello T,. dos R. etc.,. Ulissipone, 1802. e nelle está também a História Juris Lusitani. Ulissipone, 1800. Paschalis Josephi Mellii Freirii Institutiones Juris Civilis Lusitani. Ulisipone, 1789. Paschalis Josephi Mellii Freirii Institutiones Juris Criminalis Lusitani. Ulisipone, 1794. Idem. Toda a obra sobredita a excepção do seu Elogio em Portuguez, que já fica lançado na Letra E. Postila da noticia geral do comércio. Manuscrito Pegas (Emmanuelis Alvares) Commentaria ad Ordenationes Regni Portugalia. Ulisipone, 1729. - 312 -

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Pegas (Emmanuelis Alvares) Tractatus de Exclusiones et Inclusione Successione et Erectione Majuratus. Ulissipone, 1685. Pegas (Emmanuelis Alvares) Resolutiones Forenses Praticables. Ulissipone, 1682. Pegas (Emmanuelis Alvares) Tractatus Varii. Ulissipone, 1730. Pegas (Emmanuelis Alvares) Tractatus de Competentiis inter Archiepiscopos, Episcopos de, et Nuntium Apostolicum, etc., Ulisipone. 1740. Paiva e Pona (Antonio de) Orphanologia Pratica. Lisboa, 1713. Phobo (V. Cl. Belchioris) Decisiones Senatus Regni Lusitania. Ulissipone, 1678. Hum volume que contem o 1.º, e 2.º Tomo, e os Arestos; e outro volume que contem somente o tomo 2.º Profecia politica etc.,. Madrid 1762. Prelecções filosóficas, por Silvestre Pinheiro. Rio. São alguns folhetos Perguntas de agricultura, etc., Lisboa, 1787. folheto. Poesias de Elpino Duriense. Lisboa, 1812, 1817. Philosophie de Kant, ou etc., pour Charles Villers. Metz, An 9. 1801. Pensées de Mr. le Comt d'Oxenstein sur divers sujets, etc. Paris, 1772. - he o Tomo 2.º. - T Poemas luzitanos do Doutor António Ferreira. Lisboa. 1598. Portugal (D. Domingos Antunes) Tractatus de donationibus jurium et bonorum régia corona. Lugduni, 1689. Prosodia in vocabolarium bilingue latinum et lusitanum digesta, etc., a Benedicto Pereira. Ebora, 1711. Petite metrologie, etc., Paris, An 12e., 1803. Folheto. Prospectus pour placer a la tête de l'ouvrage intitulée administration du marquis de Pombal, etc., Amsterdam, 1786. Perpetual war, etc., by the Ver. Edward Hankin, M, A; M. D. 1805. Folheto. Prospectus, ou explication succinte du plan au quel Mr. du Metant travaille depuis plusieurs anées. Folheto. Repertório das Ordenações do reino de Portugal etc. Lisboa, 1749. em folheto. Repertório das Ordenações do Reino, etc., Coimbra, 1795. Reinoso (Michaelis de) Observationes pratica. Conimbrica, 1675. Recueil de memoires sur les étabeliciments d'humanité: traduit de l'Allemand et de l'Anglais. Paris, An 7e. de la Republique. Recreações do Homem sensível ou etc., traduzida de Mr. d'Arnaud par A. de M. S. Lisboa, 1788. Regras da arte da pintura, etc. por José da Cunha Taborda. Lisboa, 1815. Révolution de Portugal, por M. l'Abbé de Vertot. Paris, 1792. Raphaelis Thori de pacto carmino libriduo, etc., por Fr. Jozé Mariano Velozo. Ullisipone, 1800 Recreations phisiques, chimiques et économiques de Mr. Model, traduit de l'Allemand par Mr. Parmentier. Paris, 1781. Recordações de Jácome Ratton, etc., Londres, 1813. 3 exemplares. Resolução analítica dos problemas geométricos, etc. por Joze Joaquim Rivara. Coimbra, 1815. Folheto. Resumo da arte de destilação por Alexandre António Vandelli. Lisboa, 1813. Folheto. - 313 -

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348 349

350 351 352 353 354 355 356 357 358 359 360 361 362 363 364 365 366 367 368 369 370 371 372 373

Resposta ao manifesto do Tenente-General D. João Carrafa contra a obra intitulada Successos do Alentejo, por Theodoro José Biencardi. Lisboa, 1811. Folheto. Reflexões sobre a conduta do Príncipe Regente de Portugal por Francisco Soares Franco. 1809. Hum folheto em portuguez e outro em francez. Manuscrito Reflexões críticas sobre a obra de Jozé da Silva Lisboa intitulada Princípios de Direito Mercantil. Feitas por hum homem da mesma profissão. Lisboa, 1803. Folheto. T[runcada]. Regulamento geral para o correio, etc., Lisboa, 1815. Folheto Regimento dos preços dos medicamentos simples e compostos, etc. Rio, 1813. Folheto Regulamento para os Hospitaes Militares. Lisboa, 1805. Regulamentos para os Hospitaes Militares. Lisboa, 1813. Regulamento do corpo militar dos Engenheiros de Portugal, etc., Manuscritos. Recueil des piéces les plus interessantes, etc., q'on paru a l'occasion du voyage e du séjour du Pape Pie 6e. à Vienne. Vienne, 1783. Régles du Jeu de reverses pour Mr. xxxx revue e corrigé par Mr. le Marquis de Longes de Beaurret. Folheto. Manuscrito. Reflexão sobre o estado actual do Commercio dos Estados do Brazil. 1814. Folheto. Manuscrito. Reino da estupidez, poema de (…) Coimbra, 1784. Manuscrito. Reflexões sobre a diferença do reino de Portugal, pelo Capitão J. M. de N. C. Lisboa, 1806. Manuscrito. Reflexions sur les bases d'une constitutions, por le Citoyen xxx. Paris, An 3e. Folheto. Relation véritables de la mort cruel et barbare de Charles 1e. Roi d'Angleterre. Traduit en français par J. Ango. Paris, 1792. Raport du grand juge au premier Consul. Folheto. Regimento de Signaes para os Telégrafos da Marinha. etc., Lisboa, 1804. Folheto. Relation exacte et veritable de tout ce qui vien de se passer en Rome, etc., Rome, An 6e. 1798. Folheto. Relação do que se praticou em Guimarães em aplauso da Feliz Restauração do Reino. Lisboa, 1808. Folheto. Refutação das declamações contra o comercio inglez por Jozé da Silva Lisboa. Rio, 1810. Folheto. Reflexões sobre o comércio dos seguros de 1810. Folheto. Sistema do Direito Portuguez, que contem o direito publico e o Direito particular. Manuscrito. Sistema do Direito Publico e Particular. Manuscritos. Com capa de pergaminho. Sistema ou collecção dos regimentos reaes etc., por Jozé Roberto Monteiro de Campos Coelho e Souza. Lisboa, 1783. Sistema ou collecção dos regimentos reaes, etc., por Antonio Maniscal. Lisboa, 1718. Sepulveda patentiado etc.. Londres, 1813. Sur les machines à vapeur. Porthmann, 1810. folheto. - 314 -

374 375 376 377 378 379 380 381 382

Sentença do Padre António Vieira. Manuscrito. Silva (Manuel Gonçalves) Commentaria ad ordinationes regni Portugalia. Ulissipone, 1741. ad perficiendum opus Commentariorum ab Emmanuel Alvares Pegas. Sentenças a favor do dezembargador João Jozé Mascarenhas d'Araújo e Silva. Lisboa, 1814. Sentença a favor de Pedro de Mello Breyner. 1809 Segunda parte do processo de justificação de Pedro de Mello Breyner. 1810. Súplica a S. A. Real feita pelo Doutor Bernardo Jozé de Abrantes e Castro. Londres, 1810. Synopsis Chronologica de Subsidios etc., por Jozé Anastacio de Figueiredo. Lisboa, 1790. Secours contre les incendies, e pour sauver les incendiés par Mr. Treslhard. Folheto. Saynetes ou Entremezes, em Hespanhol. Manuscritos.

383

Severo exame do procedimento dos portuguezes depois do dia 29 de Novembro 1807, até 30 de Setembro de 1808. Lisboa, 1808. Folheto.

384

Tratado prático de morgados, por Manoel d'Almeida Souza de Labão. Lisboa. 1807. Tratado sobre a origem e natureza dos testamentos etc., por Joze António de Sá. Lisboa, 1783. Tratado da forma dos libelos etc. por Gregorio Martins Caminha, etc., Coimbra, 1731. Tratado da conservação da saúde dos povos, etc., Lisboa, 1757. Tractado da versificação Portugueza. Lisboa, 1777. Tractado de agrimensura, etc., por Estevão cabral. Lisboa, 1795. Tractado da educação física dos meninos, etc., por Francisco de Mello Franco. Lisboa, 1790. Tratado conciso de comércio, etc., com hum diccionario de fazendas em onze línguas por João Henriques de Sequeira. Lisboa, 1811. T[runcada]. São 3 números ou folhetos do 1.º Tomo. Tractado da educação física dos meninos, etc. por Francisco Jozé de Almeida. Lisboa, 1791. Traité de la culture des arbres fruitiéres, etc., par. M. W. Forsyth. Paris, 1803. Theorie du luxe, ou traité dans le quel etc., 1771. Traité de la chataigne par M. Parmentier. Bastia, 1788. Traité des délits et des peines par M. le Marquis de Beccaria, traduit de l'italien por Mr. l'Abbé Morellet. Amsterdam, 1771. Tansformaciones de morpheo, ó Tratado de Sueños, por Mossch Almosnino, etc., Amsterdam, 5494. Tableau de Lisbonne en 1796, etc., Paris, 1797. Toilette, et laboratoire de flore etc.,, par M. Buc Hoz, D. en M. Paris, 1784. Taboa cosmográphica das longitudes e latitudes dos portos, cabos, ilhas, etc., Folheto. Manuscrito. Theorie des equivalents, ou principes sur la nature, la valeur etc.; traduit de l'anglois de Mr. Craufurd, por Mr. La Fitte. Rotterdam, 1794. T[runcada]. 1 folheto que he a 1.ª parte. - 315 -

385 386 387 388 389 390 391 392 393 394 395 396 397 398 399 400 401

402 403 404 405 406 407 408 409 410

Valasco (Tomé) Augustissimo Joanni 4.º Lusitanorum Regi; explanationes in Novam Justitia Reformationem etc., Coimbra, 1677. Vocabulaire françois, ou abrègé du dictionaire de l'Academie Françoise. Paris, 1772. Versão da arte de fabricar o salin, ou sal alcali, e potassa, etc.,. 1806. Manuscrito Valasco (Álvaro) De jure emphiteutico. Conimbrica, 1731. T[runcada]. He a 1.ª parte. Voyage de deux français dans le nord de l'Europe fait en 1790-1792. Paris, 1796. Voyage du ci-devant Duc de Chatelet en Portugal etc. par J. Fr. Bourgoing. Paris, An 6e. de la Republique. Voyage en Portugal par M. le Comte de Hoffmansegg redigé par Mr. Link. Paris, 1805. Vida do Infante D. Duarte, pelo mestre André de Rezende etc. Lisboa, 1789. Ullysea libertada, drama heróico por Miguel António de Barros. Lisboa, 1809. Folheto.

FONTE: ADB/UM – SIFAA/SSC. 08.02/DOC. 42, 53 – Catálogo de livros.

- 316 -

ANEXO IV - INVENTÁRIO SIMPLES

DO

“FUNDO BARCA-OLIVEIRA”,

RECOMENDADO

PELO DESPACHO DE 9 DE MAIO DE 1986 DA REITORIA DA UNIVERSIDADE DO MINHO.

1. Fundo do Conde da Barca - constituía-se como o fundo principal e estava subdividido em cinco grandes áreas temáticas: 1.1. Actividade diplomática – documentação produzida durante as várias enviaturas diplomáticas ocorridas entre 1787 e 1803; 1.2. Actividade politica – documentação relacionada com a política interna (como legislação e assuntos militares) e externa (que abarca o período de 1787 e 1817, e que engloba correspondência com Príncipes e outras entidades oficiais e, ainda, vários textos de carácter diplomático); 1.3. Correspondência Particular – vasto conjunto de cartas dirigidas ao conde da Barca por vários autores como a marquesa de Alorna, Félix de Avelar Brotero, o abade Correia da Serra, Jácome Ratton, entre muitos outros; 1.5. Livraria – cópias manuscritas de textos diversos de cariz literário, económico, político, militar etc.; 1.6. Papéis Pessoais – Administração do bens do conde da Barca, de seus irmãos e da família em geral; e uma secção denominada de “vária”. Por seu lado, os “Papéis pessoais” eram compostos da seguinte forma: 1.6.1. subfundo de João António de Araújo de Azevedo, desembargador da Casa da Suplicação e sucessor de Barca na Casa de Sá; 1.6.2. subfundo de António Fernando de Araújo de Azevedo, abade de Lóbrigos e inspector das obras do encanamento do rio Lima e das estradas e canais de rega e de transporte e da arborização na Província do Minho; 1.6.3. subfundo de Francisco António de Araújo de Azevedo, irmão dos precedentes, brigadeiro, governador e capitão-general dos Açores; 1.6.4. subfundo de António de Araújo de Azevedo Pereira Pinto, sobrinho do conde da Barca, tenente-coronel de cavalaria e sucessor na Casa de Sá. - 317 -

1.6.5. subfundo Cartório da Casa de Sá, entendido como um conjunto de documentos familiares que estavam, na sua maioria, relacionados com a gestão da propriedade familiar. 1.6.6. “Vária” – documentos da família Cabeças de Sousa, cartas de Francisco José Maria de Brito e uma colecção de gravuras.

- 318 -

ANEXO V - QUADRO

ORGÂNICO-FUNCIONAL DO

SISTEMA

DE INFORMAÇÃO

FAMÍLIA

ARAÚJO DE AZEVEDO

SISTEMA DE INFORMAÇÃO

SECÇÃO 01 Subsecção 01.01

RODRIGUES DE ARAÚJO Gonçalo Rodrigues de Araújo (Séc. XV)

SECÇÃO 02 Subsecção 02.01

MELO Francisco de Melo, o Galego (Séc. XV-XVI)

SECÇÃO 03 Subsecção 03.01

ARAÚJO DE AZEVEDO Gaspar de Araújo de Azevedo (Séc. XVII)

SECÇÃO 04 Subsecção 04.01

ARAÚJO DE AZEVEDO João de Araújo de Azevedo (f. 1652) Catarina Pereira (f. 1685. 12. 15) Catarina Pereira (f. 1685. 12. 15)

Subsecção 04.02 SECÇÃO 05 Subsecção 05. 01

PEREIRA DE ARAÚJO DE AZEVEDO Fernando Pereira de Araújo de Azevedo (b. 1640. 03. 04 – f. 1708. 05. 18) Maria Pereira Fagundes (n. 1640. 07. 06 – f. 1723. 12. 19) v. Subsistema PEREIRA PINTO

Subsecção 05.02

Fernando Pereira de Araújo de Azevedo (b. 1640. 03. 04 – f. 1708. 05. 18) Maria Pereira Fagundes (n. 1640. 07. 06 – f. 1723. 12. 19) António de Araújo de Azevedo (Sécs. XVII-XVIII)

Subsecção 05.03 Subsecção 05. 04 SECÇÃO 06 Subsecção 06.01

PEREIRA PIMENTA DE ARAÚJO DE AZEVEDO Tristão Pereira Pimenta de Araújo de Azevedo (f. 1731. 06. 20) Violante Maria Pereira Pinto Barbosa de Barros Fagundes (n. 1678) - 319 -

v. Subsistema PEREIRA PINTO, DA QUINTA DE NELAS v. Subsistema BRITO BARREIROS Subsecção 06.02 Subsecção 06.03

Tristão Pereira Pimenta de Araújo de Azevedo (f. 1731. 06. 20) Violante Maria Pereira Pinto Barbosa de Barros Fagundes (n. 1678 – f. 1758)

SECÇÃO 07

PEREIRA PINTO DE ARAÚJO DE AZEVEDO FAGUNDES Subsecção 07.01 António Pereira Pinto de Araújo de Azevedo Fagundes (n. 1710. 05. 28 – f. 1783. 10. 09) Marquesa Francisca de Araújo de Azevedo (n. 1737. 04. 07 – f. 1811) v. Subsistema ARAÚJO DE AZEVEDO, DA QUINTA DA PROVA Subsecção 07.02 Subsecção 07.03 Subsecção 07.04 Subsecção 07.05 Subsecção 07.06

António Pereira Pinto de Araújo de Azevedo Fagundes (n. c. 1709 – f. 1783. 10. 09) Marquesa Francisca de Araújo de Azevedo (n. 1737. 04. 07 – f. 1811) António Fernando Pereira Pinto, Abade de Bertiandos (n. 1713. 03. 21 – f. 1781. 02. 11) António Luís Pereira Pinto (n. 1714. 04. 10) Antónia Ventura Pereira Pinto (n. 1720. 07. 14 – f. a. 1778)

SECÇÃO 08 Subsecção 08.01

ARAÚJO DE AZEVEDO António de Araújo de Azevedo, 1.º conde da Barca (n. 1754.05.14 – f. 1817. 06. 21) v. Subsistema FERNANDES BANDEIRA v. Subsistema CABEÇAS DE SOUSA

Subsecção 08.02

João António de Araújo de Azevedo (n. 1764. 12. 26 – 1823. 06. 14)

Subsecção 08.03

Francisco António de Araújo de Azevedo (n. 1772. 12. 21 – f. 1821. 04. 03)

Subsecção 08.04

António Fernando de Araújo de Azevedo, Abade de Lóbrigos (n. 1759.11. 12 – f. 1823. 04. 14)

Subsecção 08.05

Clara Vitória de Araújo de Azevedo (n. 1761. 11. 17 – f. 1827. 02. 16) - 320 -

Subsecção 08.06 Subsecção 08.07 Subsecção 08.08 Subsecção 08.09 SECÇÃO 09 Subsecção 09.01

Subsecção 09.02 Subsecção 09.03

SECÇÃO 10 Subsecção 10.01

Joana Antónia da Conceição de Araújo de Azevedo (n. 1755. 10. 17 – f. 1827. 02. 15) D. Antónia Luísa de Araújo de Azevedo, Abadessa no Convento de São Bento de Viana (n. 1757. 04. 16 – f. 1834. 01. 18) Rosa Inácia de Araújo de Azevedo (n. 1769. 07. 13) Ana Eugénia de Araújo de Azevedo (n. 1762. 06. 18 – f. 1836. 05. 01) ARAÚJO DE AZEVEDO PEREIRA PINTO António de Araújo de Azevedo Pereira Pinto (n. 1809. 07. 25 – f. 1868. 08. 09) Ana Maria dos Prazeres Calheiros Magalhães Barreto Amorim (n. 1818. 04. 01 – f. 1875. 04. 03) António de Araújo de Azevedo Pereira Pinto (n. 1809. 07. 25 – f. 1868. 08. 09) Ana Maria dos Prazeres Calheiros Magalhães Barreto Amorim (n. 1818. 04. 01 – f. 1875. 04. 03) ARAÚJO DE AZEVEDO Marquesa Margarida de Araújo de Azevedo (n. 1847. 02. 06 – f. 1909. 11. 09) José Mimoso de Barros e Alpoim (n. 1834. 07. 26 – f. 1909. 06. 12)

- 321 -

SUBSISTEMAS DE INFORMAÇÃO SUBSISTEMA PEREIRA PINTO SECÇÃO 01 Subsecção 01.01

PEREIRA PINTO António Pereira Pinto, o Gordo (f. 1680.03. 31) Violante Pereira Filgueira (b. 1604. 02. 22 – f. 1671. 03. 23) v. Subsistema PEREIRA FILGUEIRA

Subsecção 01.02

António Pereira Pinto, o Gordo (f. 1680.03. 31) SUBSISTEMA PEREIRA FILGUEIRA

SECÇÃO 01 Subsecção 01.01

PEREIRA Lopo Pereira Juliana Barbosa (Séc. XVI) v. Subsistema FILGUEIRA

SECÇÃO 02 Subsecção 02.01

PEREIRA FILGUEIRA António Pereira Filgueira Maria Velha (Sécs. XVI-XVII)

Subsecção 02.02

António Pereira Filgueira (Sécs. XVI-XVII)

Subsecção 02.03

Diogo Pereira da Cunha (Sécs. XVI-XVII) Francisco Pereira Marramaque (n. c. 1573 – f. 1607)

Subsecção 02.04 SECÇÃO 03 Subsecção 03.01

PEREIRA Lopo Pereira (Séc. XVII)

Subsecção 03.02

Frei Nuno de Santo António (Séc. XVII) SUBSISTEMA FILGUEIRA

SECÇÃO 01 Subsecção 01.01

FILGUEIRA Gomes Filgueira Violante Barbosa v. Subsistema CUNHA - 322 -

SUBSISTEMA CUNHA SECÇÃO 01 Subsecção 01.01

CUNHA João da Cunha Beatriz Barbosa

SUBSISTEMA PEREIRA PINTO, DA QUINTA DE NELAS SECÇÃO 01 Subsecção 01.01

PEREIRA Francisco Pereira Pinto, Abade de Moreira do Lima (n. 1587. 01. 31)

SECÇÃO 02 Subsecção 02.01

PEREIRA PINTO João Pereira Pinto (n. c. 1628 – f. 1704. 01. 28) Ana Correia Osores Francisca de Barros Barbosa (n. c. 1645. 02 – f. 1687. 02. 10) v. Subsistema BARROS BARBOSA

Subsecção 02.02

João Pereira Pinto (n. c. 1628 – f. 1704. 01. 28)

SECÇÃO 03 Subsecção 03.01

PEREIRA PINTO António Pereira Pinto (n. 1670. 05. 12)

Subsecção 03.02

Apolónia Luísa Pereira Pinto (n. 1683. 04. 08) SUBSISTEMA BARROS BARBOSA

SECÇÃO 01 Subsecção 01.01

BARROS Bernardo de Barros Isabel Barbosa (Sécs. XVI-XVII) v. Subsistema GONÇALVES BARBOSA

Subsecção 01.02

Pedro de Barros, Abade de Arcozelo (Sécs. XVI-XVII)

SECÇÃO 02 Subsecção 02.01

BARROS Pedro de Barros Francisca Barbosa de Barros Inês Barbosa (Sécs. XVII-XVIII) - 323 -

SUBSISTEMA GONÇALVES BARBOSA SECÇÃO 01 Subsecção 01.01

GONÇALVES BARBOSA Fernão Gonçalves Barbosa (Séc. XV) SUBSISTEMA BRITO BARREIROS

SECÇÃO 01 Subsecção 01.01

BARREIROS GALVÃO António Barreiros Galvão (n. 1622)

SECÇÃO 02 Subsecção 02.01

BRITO BARREIROS Maria de Brito Barreiros (n. c. 1655)

SUBSISTEMA ARAÚJO DE AZEVEDO, DA QUINTA DA PROVA SECÇÃO 01 Subsecção 01.01

ARAÚJO DE AZEVEDO António de Araújo de Azevedo Luísa Maria Bandeira (Sécs. XVII-XVIII)

Subsecção 01.02

António de Araújo de Azevedo (Sécs. XVII-XVIII)

SECÇÃO 02 Subsecção 02.01

ARAÚJO DE AZEVEDO Luís de Araújo de Azevedo (b. 1687. 09. 10 – f. 1753. 02. 14) Clara Luísa de Magalhães Pinto Antónia Ventura Pereira Pinto (n. 1720.07.14)

Subsecção 02.02

Luís de Araújo de Azevedo (b. 1687. 09. 10 – f. 1753. 02. 14)

Subsecção 02.03

Matias de Araújo de Azevedo (b. 1687. 07. 10 – f. 1744. 12. 07)

Subsecção 02.04

João Velho de Araújo de Azevedo (b. 1700. 09. 29)

Subsecção 02.05

Sebastião de Araújo de Azevedo (b. 1703. 01. 28) - 324 -

SECÇÃO 03 Subsecção 03.01

ARAÚJO DE AZEVEDO Marquesa Francisca de Araújo de Azevedo (n. 1737. 04. 07 – f. 1811) SUBSISTEMA FERNANDES BANDEIRA

SECÇÃO 01 Subsecção 01.01

FERNANDES BANDEIRA Manuel Fernandes Bandeira Joana de Araújo (Séc. XVII)

Subsecção 01.02

Manuel Fernandes Bandeira

SECÇÃO 02 Subsecção 02.01

BANDEIRA António Luís Bandeira Maria Antónia da Fonseca (Séc. XVII-XVIII) v. Subsistema VELHO FAGUNDES

Subsecção 02.02

António Luís Bandeira

SECÇÃO 03 Subsecção 03.01

FONSECA Manuel José da Fonseca (n. 1702. 08. 15) v. Subsistema BANDEIRA SUBSISTEMA VELHO FAGUNDES

SECÇÃO 01 Subsecção 01.01

VELHO FAGUNDES Inácio Velho Fagundes Antónia da Cunha Maciel

Subsecção 01.02

Inácio Velho Fagundes SUBSISTEMA BANDEIRA

SECÇÃO 01 Subsecção 01.01

BANDEIRA João Bandeira

- 325 -

ANEXO VI - CARTA AZEVEDO,

DE

FREI FRANCISCO

DE

S. LUÍS

PARA

ANTÓNIO

DE

ARAÚJO

DE

COMUNICANDO O TÉRMINO DA INVENTARIAÇÃO E CATALOGAÇÃO DO

CARTÓRIO DA CASA DE SÁ. Illmo. Senhor, Está em fim o cahos a algûa ordem, quero dizer, trez areas de papeis confusos e desordenados reduzidos a 49 Pastas, em que esses papeis ficam arranjados com algum systema, e de tal modo indicado no frontespício de cada hum o seu objecto, número e pasta a que pertence, que não só com o index na mão se pode facilmente achar qualquer papel, mas também não he facil confundirem-se mais hûa vez que não haja hum total e absoluto transtorno em todo o plano do meu trabalho. Veja V. Ex. como foi fácil concluir em 3 mezes sem grande fadiga hum objecto que de outra sorte levaria anno a pôr-se em ordem. Lance V. Excia. os olhos ao index, e se no systema que adoptei achar algûa irregularidade ou inconveniente, eu explicarei a razão por que assim o arranjei, e o modo com que se pode remediar qualquer defeito. No que tocar à beleza typografica das pastas e do index V. Excia. a pode mandar melhorar quando quizer. As pastas são mais delgadas do que eu queria podem fazer-se mais fortes e até eu mandaria encadernar algûas, ficando os papeis na ordem em que vão. O index foi feito em papel baixo porque eu esperava que ele levasse muitas emendas, e fazia-se como hum borrão para depois se copiar em limpo. Se V. Excia. quiser, mande-o copiar em melhor papel e por melhor letra. As pastas não devem estar em arcas, mas em estantes, n'ua casa livre de humidade e de incendios, e deve-se pôr hûa excomunhão maior ipso facto a toda a pessoa que tirando hum papel para o ler, o não reposer depois de lido no seu lugar competente. Enfim, hûa vez que se dê ao Cartório algum arranjo, convem conserva-lo, e seguir o mesmo plano nos papeis que de novo forem acrescendo. Estimarei que V. Excia. se dê por contente do meu trabalho, ou ao menos da minha boa vontade, e que acredite por este pequeno serviço os muitos que eu lhe faria, se na minha mão estivesse mostrar todo o respeito, reconhecimento e affecto com que sou de V. Excia. Fielmente e obrigadíssimo (as.) FREI FRANCISCO DE SÃO LUÍS 31 de Dezembro - 326 -

P.s. Esqueci-me dizer a V. Excia. que não extraviei papel algum se não hûa carta que levou o Sr. Francisco Pereira, e tratava dos tardos, e duendes, e essa que vai incluza, e que me toca por caza, principalmente na nota, que tem por letra do senhor Brigadeiro. Mas como V. Excia também nella tem seu quinhão não me escandalizo na parte que dis respeito aos frades. FONTE: ADB/UM/ SIFAA/SSC. 08.01/CR/DOC. 12,7,1 – Carta de Frei Francisco de São Luís para António de Araújo de Azevedo. [1815?]. 12. 31

- 327 -

ANEXO VII - INVENTÁRIO DO CARTÓRIO DA CASA DE SÁ POR FREI FRANCISCO DE SÃO LUÍS N.º de registo 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

Ficha descritiva Título genealógico de Araújos Pasta I. N.º 1.º Descendência dos Araújos de Galiza Pasta I. N.º 2.º Pereiras Pintos de Bertiandos – apontamentos genealógicos. Pasta I. N.º 3.º Fragmentos genealógicos do título de Araújos. Pasta I. N.º 4. Memórias da família. Pasta I. N.º 5.º Apontamentos da ascendência da Sra. D. Marqueza Francisca de Araújo Azevedo. Pasta I. N.º 6 Apontamentos da Família da Sra. Maria de Brito Barreiros, mãe do Sr. Tristão Pereira Pimenta de Araújo de Azevedo. Pasta I. N.º 7.º Notícia a respeito de Manoel Pereira de Castro da Rua do Pinheiro. Pasta I. N.º 8.º Allegação para a cauza de alimentos que movia huma bastarda da Caza, chamada Isabel Maria Pereira. Tem algumas notícias curiosas. Pasta I. N.º 9. Baptismos, recebimentos e óbitos de senhores da Família Pasta I. N.º 10 1604 - A 2 de Fevereiro foi baptizada na igreja de Ponte do Lima a Sra. Violante Pereira filha do Sr. António Pereira Filgueira e de sua mulher a Sra. Maria Velho. 1640 - A 4 de Março foi baptizado na Igreja de Gondoriz o Sr. Fernando Pereira de Araújo de Azevedo filho do Sr. João de Araújo de Azevedo e da Sra. Catarina Pereira. 1642 - No 1.º de Julho foi baptizada em Sá a Sra. D. Maria Pereira Fagundes, filha do Sr. António Pereira Pinto e da Sra. D. Violante Pereira. 1672 - A 22 de Setembro foi baptizado Pascoal de Brito Barreiros em S. Jorge dos Arcos. 1674 - A 8 de Novembro foi baptizado na mesma igreja António de Brito Irmão do dito. 1684 - A 22 de Maio foi baptizado na mesma igreja Gonçalo de Brito 1694 - A 8 de Setembro foi baptizada na mesma igreja Valeriana irmã dos sobreditos, e todos quatro filhos de Pascoal Dias e sua mulher Páscoa de Brito, do Lugar do Barreiro. 1752 - Recebeu-se a Exma. Sra. D. Marqueza Francisca de Araújo de Azevedo com o Sr. António Pereira Pinto de Araújo de Azevedo na Capella de Sá a 6 de Agosto. 1753 - A 15 de Fevereiro faleceo o Sr. Luís de Araújo de Azevedo, morador que foi na Quinta da Prova. Consta tudo das Certidões que aqui se acham. Certidões de Recebimentos, Baptismos, Óbitos &c. 1679 – A 23 de Abril cazou o Sr. António de Araújo de Azevedo filho de João de Araújo e da Sra. Catarina Pereira com a Sra. D. Luiza Maria filha do Vedor Geral Manoel Fernandes Bandeira, e de Sua mulher a Senhora Joanna de Araújo. 1686 – A 10 de Julho foi baptizado o Sr. Mathias de Araújo filho dos sobreditos. 1687 – A 10 de 7bro. foi baptizado Luiz filho dos ditos. 1752 – A 6 de Agosto se recebeu o Sr. António Pereira Pinto Cavaleiro da Ordem de Cristo com a Sra. D. Marqueza Francisca. 1754 – A 14 de Maio nasceo António filho dos ditos , e foi baptizado a 23 do mesmo mez. 1755 – A 17 de Outubro nasceo Joana filha dos ditos e foi baptizada a 28 do mesmo mez. 1721 – A 12 de Março faleceo a Madre Anna de S. Joaquim no Salvador de Braga. 1744 – A 7 de Dezembro faleceo o Sr. Mathias de Araújo de Azevedo na Vila de Viana. 1753 – a 14 de Fevereiro faleceo o Sr. Luiz de Araújo de Azevedo na sua Quinta da Prova.

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1686 – 1719 Datas de Baptismos, cazamentos e óbitos 1676 – A 20 de Janeiro foi baptizado o Sr. Sebastião Pereira filho do Sr. João Pereira Pinto e da Sra. D. Francisca de Barros. 1685 – a 15 de Dezembro faleceo a Sra. Catarina Pereira viúva do Sr. João de Araújo de Azevedo. 1687 – a 11 de Fevereiro faleceo a Sr. D. Francisca de Barros mulher do Sr. João Pereira Pinto de Moreira 1704 – A 28 de Janeiro faleceo o Sr. João Pereira Pinto de Moreira do Lima 1708 – Faleceo o Sr. Fernando Pereira de Araújo de Azevedo marido da Sra. D. Maria Pereira Fagundes em Sá 1710 – A 28 de Maio nasceo o Sr. António Pereira Pinto filho do Sr. Tristão Pereira Pimenta de Araújo e da Sra. D. Violante Pereira Barbosa de Barros. 1714 – a 10 de Abril nasceo o Sr. António Luís Pereira Pinto de Araújo filho do Sr. Tristão Pereira e da Senhora D. Violante acima ditos. 1713 – a 21 de Março nasceo o Sr. Fernando Pereira Pinto de Araújo Irmão do dito 1719 – Justificou a Sra. Maria de Brito Barreiros ter a idade 65 até 69 annos. 1737 – a 7 de Abril nasceo a Sra. D. Marqueza Francisca filha do Sr. Luís de Araújo de Azevedo e da Sra. D. Clara Luiza de Magalhães. 1752 – a 6 de Agosto se recebo o Sr. Luiz de Araújo de Azevedo com a Sra. D. Antónia Ventura. Certidão do Baptismo do Sr. Fernando Pereira de Araújo de Azevedo filho do Sr. João de Araújo de Azevedo e de sua mulher a Sra. Catarina Pereira de Araújo do termo dos Arcos. Baptizado solemnemente a 4 de Março de 1640. 1719-1720 Folhas corridas do Sr. Tristão Pereira Pimenta de Araújo e de sua mãe, e certidões de óbitos, cazamentos, e baptismos dos parentes desta, que doarão Serviços ao dito Sr. 1700 Assento do baptismo do Sr. João Velho de Araújo e Azevedo filho do Sr. António de Araújo de Azevedo e de sua mulher a Sra. D. Luiza Maria de Araújo da Quinta da Prova; por onde consta ser baptizado a 29 de Setembro de 1700. 1713 A 21 de Março deste anno nasceo o Sr. António Pereira Pinto de Araújo e Azevedo. Filho do Sr. Tristão Pereira Pimenta e de sua mulher a Sra. D. Violante Pereira Barbosa de Barros. Consta da certidão do seu baptismo que aqui está. 1713 Assento do baptismo do Sr. Fernando depois chamado António Fernando Pereira Pinto de Azevedo filho do Sr. Tristão Pereira Pimenta de Araújo, e de sua mulher a Sra. D. Violante Maria Pereira Pinto da Caza de Sá, nascido a 21 de Março de 1713. 1713 Attestações de seu procedimento, e bons costumes, da sua Fixação à Igreja, e de ter sido alguns annos Vigário Geral de Vila Real. 1723 Certidão do óbito, e outras memorias do Reverendo André Pereira Pinto Cónego Magistral na Sé Oriental de Lisboa, falecido em Pontevel a 19 de Dezembro de 1723. Certidão do óbito da Sra. D. Maria Pereira Fagundes, que faleceo na Cidade do Porto a 19 de Dezembro de 1723, e veio sepultar-se em Sá, conforme o que ordenara em seu testamento.

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Certidões de recebimentos e baptismos 1708 – A 26 de Agosto se receberão os Senhores Tristão Pereira Pimenta de Araújo com a Sra. D. Violante Maria Pereira Pinto Barboza de Barros. 1710 – A 28 de Maio nasceo o Sr. António Pereira Pinto filho dos sobreditos, e foi baptizado a 13 de Junho do dito anno. Caderno de algumas lembranças de família mandado fazer pelo Pai do Sr. António Pereira

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Pinto de Moreira. Pasta I. N.º 11. 1438. Justificação feita a requerimento de Fernão Gonçalves Barboza Fidalgo, morador em Aborim do Julgado de Aguiar de Neiva, termo de Barcellos, pela qual se mostra: 1º Que Alda Martins, e Chamoa Martins eram irmãs, e que a dita Chamoa fora Mãe de Gonçalo Fernandes Barboza. 2º Que as ditas irmãs e depois o dito Gonçalo Fernandes de Barboza tiveram o couto de Brandara, o qual era coutado e honrado, e nelle não entrava Meirinho, nem Jurado, nem Porteiro de el-Rei, nem Mordomo, salvo os que punham os ditos Senhorios. 3º Que os moradores do Couto pagavam cada hum, cada anno, aos ditos Senhorios dois alqueires de Cevada e dois feixes de palha e de Luctuosa, quando morriam, hum maravedil da moeda antiga, e eram obrigados a lhe darem ajuda para adubar suas herdades. 4º Que os mesmos moradores eram izentos de pagar talha que fosse posta pelo Concelho de Ponte do Lima &c. 5º Que o dito Couto e Honra depois da morte de Gonçalo Fernandes de Barboza viera a Fernão Gonçalves e seus irmãos. Pasta I. N.º 12 1544. Carta régia dirigida a Martim Vaz pedindo-lhe dinheiro emprestado para pagamento da grande dívida, que a Coroa devia em Flandres. A quantia havia de ser-lhe indicada por Brás de Araújo, Cavaleiro Fidalgo, a quem El-Rei havia encommendado este negócio. Está aqui também um assignado do Visconde, em que dá poder a Gonçalo Mendes de Ponte de Lima para lhe arrecadar a renda de Beiral de Lima. Pasta I. N. 13 1548. Justificação de sete testemunhas feita a requerimento de João Soares, Belchior Soares, e Fernão Soares, em que provaram que seu pai, Francisco Soares à hora da sua morte, declarara que elles eram seus filhos; que os tinha legitimado e que deixava seus universaes herdeiros. Pasta I. N.º 14 1599. Sentença crime dada em Braga contra Francisco Pereira filho de Lopo Pereira de Ponte do Lima, por ter contrahido Matrimónio Clandestino e conversado carnalmente com Catarina Pinto do lugar de Cabaços. Este Francisco Pereira cuido que era irmão do Sr. António Pereira Felgueira. Pasta I. N.º 15. 1600. Serviços de Diogo Pereira da Cunha, e Francisco Pereira Marramaque pelos anos de 1600 em diante. Pasta I. N.º 16. 1603 – 1722. Certidões tiradas da Secretaria das Mercês, por onde constam algumas das que os Senhores Reis fizeram a senhores da Caza, e são as seguintes: 1603 - Foro de Fidalgo Cavaleiro ao Sr. Diogo Pereira da Cunha, filho de Lopo Pereira, Fidalgo da C. R. e neto de António Pereira. 1613 - Capitania da Fortaleza de Chaul ao mesmo. 1673 - Mercê dos Ofícios de Escrivão da Câmara e Almoçataria dos Arcos ao Sr. António de Araújo de Azevedo. 1683 - Mercê de renunciar os ditos ofícios em Miguel Pereira Pinto, concedida ao mesmo. 1692 - Foro de Fidalgo ao mesmo Senhor. 1697 - Foro de Fidalgo Cavaleiro ao Sr. Mathias de Araújo de Azevedo, filho do Sr. António de Araújo de Azevedo, Fidalgo da Casa Real e Cavaleiro da Ordem de Christo, e neto do Sr. João de Araújo Azevedo. 1721 - Mercê do Hábito de Christo a António Pereira Pinto de Araújo com 12$000 reis de tença efectiva; 1711 – Foro de Moço Fidalgo ao Sr. António Pereira Pinto filho do Sr. Tristão Pereira e neto do Sr. João Pereira Pinto, que foi Moço Fidalgo e filho do Sr. Francisco Pereira Pinto. Pasta I. Num. 17. 1605. Carta de confirmação de António Pereira Pinto, Clérigo in minoribus em Abbade de Bertiandos, de que tomou posse em Fevereiro de 1605.

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Pasta I. N.º 18. 1607. Justificação e Attestações sobre a Fidalguia, parentescos e vários Senhorios e Morgados de Araújos. Pasta I. N.º 19. 1611. Serviços de Francisco Pereira Marramaque. Pasta I. N.º 20. 1613. Serviços de Diogo Pereira da Cunha. Pasta II. N.º 21 1614. Foro de Fidalgo concedido ao Sr. Lopo Pereira, filho do Sr. António Pereira, e neto de outro Lopo Pereira Fidalgo da mesma Casa. 1600. Certidão da mercê que teve do foro de Fidalgo o Sr. Francisco Pereira, filho de Lopo Pereira e neto de António Pereira, sendo acrescentado a Fidalgo Cavaleiro. Pasta II. N.º 22. 1622. Alvará pelo qual S. Magestade ha por bem tomar por Fidalgo de sua Caza e seu Capellão ao Sr. Francisco Pereira Pinto, filho do Sr. Francisco Pereira, Moço Fidalgo da C. R. Pasta II. N.º 23. 1623. Certidão de um assento do livro da Câmara de Ponte de Lima, por onde consta que Lopo Pereira foi nomeado alferes da Companhia de seu pai António Pereira Filgueira, Fidalgo da C. R. por elle o haver apprezentado para o dito cargo, e deo o juramento do costume. O dito António Pereira Filgueira era também Vereador. Pasta II. N.º 24. 1633. Alvará pelo qual S. Magestade faz mercê de tomar por Moço Fidalgo de sua Caza com 1000 rs. de moradia por mez e alqueire de cevada por dia ao Senhor António Pereira Pinto filho do Sr. António Pereira Pinto, também Moço Fidalgo da C. R.. Pasta II. N.º 25 1637 Notícia de hum António Pereira de Almeida, que se dizia filho do Reverendo António Pereira Vigário de Cabana Maior, e que o obrigou por alimentos. Pasta II. N.º 26. 1639. Sentença de Dispensação Apostólica para cazar o Sr. António Pereira Pinto com a Sra. Violante Pereira, parentes no 3º grau de consanguinidade. Pasta II. N.º 27 1641. Cópia authentica de huma Carta do Sr. Payo de Araújo de Azevedo, escrita de Argel, onde esteve captivo, a seu Irmão. Pasta II. N.º 28. 1642. Papeis por onde constam os serviços militares, que fez António Barreiros Galvão, natural dos Arcos, e que assentou praça para servir à sua custa. Pasta II. N.º 29. 1650. Patente de alferes da gente paga do castello de Viana dada a António Barreiros Galvão pelo Visconde Governador das Armas e Exército de Entre Douro e Minho. 1643-1654. Serviços militares de António Barreiros Galvão. Pasta II. N.º 30 1643. Justificação de nobreza que fez o Sr. Gaspar de Araújo de Azevedo, morador em Ponte de Lima. Pasta II. N.º 31 1648. Justificação do Sr. António Pereira Pinto, Fidalgo da C. R. pela qual justificou: 1º Que era filho do Sr. António Pereira Pinto; 2º Que deste só ficarão por sua morte três filhos, a saber o Suplicante, o Sr. Francisco Pereira Pinto e o Sr. Gaspar Pereira; 3º Que o dito Sr. Gaspar Pereira faleceo solteiro em hum encontro que teve com o inimigo na vila de Valença, servindo de Alferes na Companhia do Capitão Francisco Pereira Pinto seu Irmão. Pasta II. N.º 32 1648. Justificação que fez o Sr. António Pereira Pinto, Fidalgo da C. R. morador em Ponte do Lima, em como estava legitimamente cazado com a Sra. D. Violante Pereira filha legítima do Sr. António Pereira Felgueira e que por morte deste ficara sua única herdeira, a dita Sra. D. Violante por não haver outro filho nem filha que lhe sucedesse. Mostra-se que a Sra. D. Violante Pereira tinha mais hum irmão e huma irmã, aquelle frade e esta freira professos na Ordem de S. Francisco.

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Pasta II. N.º 33 1652. Inquirições sobre a nobreza e limpeza de sangue de João Miranda, morador no arrabalde d'além da ponte da Villa de Ponte de Lima, em que provou ser das Famílias dos Mirandas, Cerqueiras e Araújos, e cazado com Francisca Pacheco das famílias dos Pachecos, Amorins, Calheiros e Borges &c. Pasta II. N.º 34 1661. Lembranças de alguns Serviços Militares do Sr. Capitão Fernando Pereira de Araújo de Azevedo Pasta II. N.º 35 1661-1676. Serviços do Sr. Fernão Pereira de Araújo, filho do Sr. João de Araújo de Azevedo. Pasta II. N.º 36 1667-1668. Lembrança de alguns Serviços Militares do Sr. António de Araújo de Azevedo. Pasta II. N.~e 37. 1674. Merce do Hábito de Christo, com tença de 60$000 rs., dos quaes 40$ rs. seriam effectivos, mesmo em pensão para hum seu filho, ou cazamento de filha impostos na commenda vaga de Alcácer do Sal, concedida esta mercê ao Sr. Manoel Fernandes Bandeira Cavaleiro Fidalgo da C. R., Vedor e Contador Geral da Gente de Guerra, na Província do Minho Pasta II. N.º 38 1682. Papeis da Família. Querendo o Sr. Fernando Pereira de Araújo entrar na administração dos bens de sua mãe a Sra. Catarina Pereira de Araújo, opposeram-se os senhores António de Araújo de Azevedo e Francisco Pinto Barbosa, filho e genro da dita Senhora, e nos seus embargos allegaram os maus tratamentos que o Sr. Fernando Pereira havia feito a sua mãe &c. São notáveis estes embargos. Pasta II. N.º 39. 1684. Ordem do General da Província do Minho para qual o Sr. Mestre de Campo João Pereira Pinto foi encarregado do Alistamento, ou leva de soldados para o Exército Pasta II. N.º 40. 1686. Breve Apostólico para se trasladarem de Salvador de Braga para a capella de Santo António das Choças os ossos do Senhor João de Araújo de Azevedo. Cópia authentica. Pasta II. N.º 41 1688. Certidão por onde consta q o Sr. João Pereira Pinto da Freguesia de Moreira do Lima Entrou Capitão de Infantaria em 20 de Fevereiro de 1688 tendo sido precedentemente Mestre de Campo de hum Terço Auxiliar Passou a Capitão reformado no 1º de Fevereiro de 1691 Passou a aposentado em Agosto de 1702 E faleceo em 28 de Janeiro de 1704 Pasta II. N.º 42. 1704. Alvará de quatro mezes de mercê concedidos ao Sr. Tristão Pereira Pimenta, estudante de Cânones na Universidade de Coimbra, que pretendia fazer Actos Grandes, na sua Faculdade. Pasta II. N.º 43 1705. Alvará pelo qual S. Magestade há por bem que o Sr. António de Araújo de Azevedo, proprietário do Offício de Escrivão da Provedoria de Viana, o possa renunciar em pessoa apta. Pasta II. N.º 44. 1708. Cartas de legitimação real e apostólica a favor do Sr. Tristão Pereira Pimenta de Araújo, filho do Sr. Fernando Pereira de Araújo e Azevedo. Por Cópias authenticas. Pasta II. N.º 45. 1710. Carta de Segurança passada a favor do Sr. Tristão Pereira Pimenta de Araújo, e de seus Procuradores e Criados, contra o Sr. António de Araújo de Azevedo, e seus Filhos do termo dos Arcos, que os ameaçavam, e eram seus inimigos &c. Pasta II. N.º 46. 1711. Alvará em que sua Magestade toma por seu Moço Fidalgo com 1000 rs. de moradia por mez, e alqueire de cevada por dia ao Sr. António Pereira Pinto, filho do Sr. Tristão Pereira, e neto do Sr. João Pereira Pinto que também foi Moço Fidalgo.

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Pasta II. N.º 47 1714. Assignado do Juiz, officiaes e freguezes da freguezia de Sá, pelo qual consentem que os Senhores de Sá tenham sepultura própria n’aquella Igreja, por haverem dado quatro moedas para se reformar o lageado do Corpo da dita Igreja. Pasta II. N.º 48 1717. Minuta de huma muito honrosa attestação dada pelo Arcebispo de Braga em favor do Sr. Luís de Araújo de Azevedo clerigo in minoribus, filho legítimo do Sr. António de Araújo de Azevedo e de sua mulher a Sra. D. Luísa Maria de Araújo. Pasta II. N.º 49 1718. Alvará de foro de Fidalgo concedido ao Sr. Sebastião de Araújo de Azevedo, filho do Sr. António de Araújo de Azevedo, Fidalgo da C. R. e Cavaleiro da Ordem de Christo e neto do Sr. João de Araújo de Azevedo. Pasta II. N.º 50. 1718-1719. Doações dos serviços militares de Domingos de Brito, e Agostinho Gomes de Brito, feitas ao Sr. Tristão Pereira Pimenta de Araújo, pelos herdeiros dos ditos, e pela Sra. Maria de Brito Barreiros, mãe do dito Senhor. Pasta II. N.º 51 1719. Atestação dos serviços que fez em benefício da República e da boa administração da Justiça, o Sr. Tristão Pereira Pimenta, sendo Juiz de Fora de Vila Nova de Cerveira, e das importantes diligências de que foi encarregado. Pasta II. N. 52 1721. Informação dos Pais e Avós do Senhor António de Araújo de Azevedo, do termo dos Arcos, tirada por Certidão do Archivo da Meza da Consciência, onde estava a justificação que elle fez para tomar o Hábito da Cavallaria de N. S. Jesu-Cristo. Pasta II. N.º 53 1721. Certidão de Papeis que se achão na Secretaria das Mercês por onde constam: 1º Os Serviços do Sr. João de Araújo de Azevedo feitas na Campanha desde 1643 até 1652; 2º As perdas que teve a Caza do dito Sr. e sua mulher a Sra. Catarina Pereira, na invazão do inimigo em 1662. 3º As perdas que também teve na mesma invazão o Sr. Jácome Cação de Brito, Primo da dita Sra. Catarina Pereira; 4º As Doações que de todos os ditos Serviços, e Perdas fizeram os sobreditos e outros ao Sr. António de Araújo de Azevedo; 5º Que estes Serviços foram decretados a favor do dito Sr. em 14 de Novembro de 1676. Segue-se um papel com a lembrança das mercês que o dito senhor teve pelos ditos serviços e perdas. Pasta II. N.º 54 1722. Alvará para ser armado Cavaleiro da Ordem de Christo o Sr. António Pereira Pinto de Araújo, e certidão de como recebeu a dita Ordem de Cavallaria. Pasta III. N.º 55. 1724. Privilégio de Cutello passado pela Câmara do Porto a favor do Sr. Tristão Pereira Pimenta, sendo Juiz dos Órfãos na mesma Cidade pelo qual ficou sendo reputado como Criador de Vinhos, para poder vender as 25 pipas, que importava para aquela Cidade, sem pagar Direitos alguns, e por mais um real em quartilho. Pasta III. N.º 56 1725-1730. Papeis ecclesiásticos, e Patrimoniais do Sr. António Pereira Pinto Barboza, filho do Sr. Tristão Pereira Pimenta de Araújo. Pasta III. N.º 57 1725-1730. Carta de Fixação passada pelo Cabido do Porto, sede vacante, pela qual o Sr. António Pereira Pinto de Azevedo foi adido à Igreja da Sé da dita Cidade para ficar gozando dos privilégios Ecclesiásticos. Certidão de se achar o mesmo senhor addido depois à Igreja da sua freguezia de Sá. Pasta III. N.º 58. 1726. Papeis sobre a Mercê da Fortaleza de Chaul e faculdade de a renunciar concedida por S. Magestade à Sr. D. Maria Pereira Fagundes, e transferida depois na Sra. D. Violante Maria Pereira Pinto. Pasta III. N.º 59. 1726. Alvará do Cargo de Provedor da Comarca de Guimarães, de que el-Rei fez mercê ao

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Sr. Tristão Pereira Pimenta, com outros relativos ao mesmo Cargo, e Ordens que lhe foram dirigidas. Pasta III. N.º 60. 1726. Serviços do Sr. Tristão Pereira Pimenta de Araújo nos lugares de Letras. Pasta III. N.º 61 1726. Papeis sobre o padroado da igreja de S. Pedro de Gondarém, alias de Mangoeiro, pertencente à família de Pereiras de Bertiandos. Pasta III. N.º 62. 1728. Carta de fixação passada a favor do Sr. António Pereira Pinto de Araújo, Clérigo in minoribus, filho do Sr. Tristão Pereira Pimenta de Araújo, pela qual o Arcebispo o há por addito à Igreja de Sá para gozar o foro e privilégios ecclesiásticos. Pasta III. N.º 63 1729. Provisão do Arcebispo Primaz para que os Senhores da Família e seus successores possam ter sepultura própria na Igreja de Sá. Pasta III. N.º 64. 1742-1773. Licença do Sr. Arcebispo Primaz para haver confessionário na capella da Caza de Sá, e nelle se poderem confessar as pessoas da Família, e as de fora, excepto pela obrigação da Quaresma. Pasta III. N.º 65 1751. Licença para ter porta de communicação das Cazas para o Coro, tanto na capella de Sá, como na de Gondoris, e para nesta se collocar Confessionário. Pasta III. N.º 66 1752. Sentença de dispensação apostólica para poderem cazar a Sra. D. Marqueza Francisca de Araújo e Azevedo, filha legítima do Sr. Luís de Araújo de Azevedo, natural da Freguesia de Recezinhos, Bispado do Porto, com o Sr. António Pereira Pinto de Araújo de Azevedo da Caza de Sá, por serem parentes no 3º grau de consanguinidade. Pasta III. N.º 67 1752. Sentença de dispensação apostólica para cazar o Sr. Luiz de Araújo de Azevedo, da Freguezia de Santa Maria de Paçô, com a Sra. D. Antónia Ventura Pereira, da Caza e Freguesia de Sá, parentes no 2º e 3º grau de consanguinidade. Pasta III. N.º 68 1753. Queixa que fez a Sra. D. Antónia Ventura a El-Rei contra seus irmãos. Provizão de ElRei para estes serem obrigados a fazer termo de a não molestarem, nem occuparem seus bens, seguindo a respeito deles os meios ordinários. Termo que fizeram em conformidade da ordem régia, protestando porem mostrarem a falsidade da queixa &c. Pasta III. N.º 69. 1753. Certidão por onde consta que o Sr. António Pereira Pinto de Araújo tinha 30$000 rs. de tença pagos pela Caza da Fruta de Lisboa, e que 12$000 rs. eram pelo Hábito de Christo que tinha. Pasta III. N.º 70 1756. Carta de inquirição pela qual o Sr. António Pereira Pinto de Araújo e Azevedo pretendia mostrar a ascendência de Sua mulher a Sr.ª D. Marqueza, e os serviços que por esta parte lhe pertenciam. Pasta III. N.º 71 1770. Justificação do Sr. António Pereira Pinto de Araújo e sua mulher, e outros, em que mostram pertencer-lhe a herança de seu Tio, o Sr. Francisco de Araújo de Azevedo falecido nos Estados do Brazil, provando o parentesco próximo que com ele tinham. Pasta III. N.º 72 1775. Authentica de algumas partículas do Santo Lenho. Pasta III. N.º 73 1783. Sentença de justificação e habilitação pela qual o Sr. António de Araújo de Azevedo Pereira Pinto se habilitou herdeiro de seu tio o Sr. António Fernando Pereira Pinto de Azevedo para haver de receber o que se lhe ficou devendo da tença que tinha no Almoxarifado do Porto. Pasta III. N.º 74. 1787. Aviso da Secretaria de Estado participando ao Exmo. Senhor António de Araújo de Azevedo havê-lo S. Magestade nomeado seu Enviado Extraordinário aos Estados Geraes das Províncias Unidas. Decretos para receber ajuda de custo para a sua viagem e quatro mesadas adiantadas do seu

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ordenado. Outro decreto dispensando-o das provanças, e habilitações para receber o Hábito de Cristo. Tudo por cópia. Pasta III. N.º 75. 1787. Cópia de decreto pelo qual o Sr. António Luiz Pereira Pinto de Araújo Coronel de Cavallaria, e Governador da Praça de Villa Nova de Cerveira, foi reformado no Posto de Brigadeiro de Cavallaria com o soldo por inteiro. Pasta III. N.º 76 1791. Provizão que permitte ao Sr. João António Pereira Pinto de Araújo o uzo de espingarda carregada com balla nas jornadas. Pasta III. N.º 77 1804. Copia da carta que o duque de Lafões escreveu à Ex.ma S.ra D. Marqueza, respondendo a outra que S. E.xa lhe dirigira, quando o Duque apprezentou a igreja de Lobrigos no Sr. António Fernando de Araújo de Azevedo. Pasta III. N.º 78. 1662. Patente do Sargento-mor do Terço auxiliar de Vianna passada ao Sr. João Pereira Pinto. 1665 - Patente do Mestre Campo do dito Terço passada ao d.o Sr. 1705 - Patente de Capitão de Infantaria passada ao Sr. Mathias de Araújo de Azevedo. 1714 - Patente de Sargento-mor de Cavallaria do Sr. António Pereira Pinto. Pasta IV. N.º 79 1688 . Carta passada pelo Dezembargo do Paço, encartando a Fernando Borges de Araújo no Offício de Tabelião do Publico Judicial e Notas da Vila de Canavezes, e Couto de Tuias, e do Concelho do Porto do Carreiro das Comarcas de Guimarães e Porto, por nomeação que nelle fizera seu pai Gaspar Borges de Araújo que também servira e tivera o dito Officio, e alcançara de El-Rei Alvará para o nomear em data de 24 de Setembro de 1680. Pasta IV. N.º 80. 1711 – 1715 . Cartas de Juiz de Fora de Melgaço, e Juiz de Fora de Villa Nova de Cerveira, Lugares que serviu o Sr. Tristão Pereira Pimenta de Araújo. Pasta IV. N.º 81 1732. Padrão de tença effectiva a favor de Luiz de Araújo de Azevedo, para a gozar com o Hábito de Christo, de que já tinha mercê. Pasta IV. N.º 82 1765. Carta escrita ao Sr. António Pereira Pinto Fagundes por José dos Santos de Negreiros Corte-Real e Araújo natural da Baía, mostrando-se parente próximo da Caza. Pasta IV. N.º 83. 1708 - Legitimação régia e pontifícia do Sr. Tristão Pereira Pimenta de Araújo. Pasta IV. N.º 84. 1770 - Título de abbade de Santo Adrião de Vizela passado a favor do Sr. António Fernando Pereira Pinto de Azevedo. Pasta IV. N.º 85. 1780 - Mercê do foro de Fidalgo feita ao Sr. António Pinto de Araújo Azevedo filho do Sr. Tristão Pereira Pimenta, em remuneração dos serviços de seu irmão o Sr. António Luiz Pereira Pinto de Araújo Pasta IV. N.º 86 1735-1787. Patentes do Sr. António Luiz Pereira Pinto desde o posto de Capitão de cavallos, até o de Brigadeiro reformado de Cavalaria. Patente de Ajudante de Ordens do Governo das Armas de Trás-os-Montes, e de Governador da Praça de Vila Nova de Cerveira. Pasta IV. N.º 87. 1786 – 1787. Avizo da Secretaria de Estado para o Sr. António Luiz Pereira Pinto assistir a hum baptismo como Procurador do Príncipe N. Senhor. Algumas cartas de pessoas egrégias, escritas ao mesmo Sr. Pasta IV. N.º 88 1529. Doação, pela qual João da Cunha, Escudeiro, e sua mulher Beatriz Barboza, da freguezia de Brandara doaram a sua filha Violante Barboza, os cazaes de Sá, que eram foreiros ao Mosteiro de Azere, rezervando só o usufruto em suas vidas. E declararão, que nenhum outro seu filho entrará à partilha delles por ser couza que nunca se partiu, mas que sempre andou n’aquela pessoa, que os Senhorios nomeiam. Posse que tomou dos ditos cazaes a doada Violante Barbosa. 1536. Outra escritura pela qual os doadores cedem da metade dos fructos dos cazaes de Sá,

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em benefício da dita sua filha Violante Barbosa cazada com Gomes Filgueira, Escudeiro, ficando estes obrigados a pagarem também a metade do foro ao Mosteiro de Azere. Pasta V. N.º 1. 1598. Escritura de Doação do cazal de Vera e Suas pertenças, sito no Concelho de Penella, feita por Duarte de Barros e sua mulher Maria Barbosa a seu filho Pero de Barros. Pasta V. N. 7.º 1538. Reducção a pública forma de Testamento nuncupativo, com que faleceu Francisco Soares de Ponte do Lima, nomeando por herdeiros a seu filho Belchior Soares, e a outro filho chamado Joane. N. B. Parece q não diz respeito à Caza. Pasta VI. N.º 1.º 1540. Testamento que fez Gonçalo Anes da Guerra morador na aldeia de Vila Chã, concelho de Santo Estevão de Riba de Lima; e fragmento do Inventário que se fez por sua morte. N. B. Não vejo que diga respeito á Caza se não por huma verba do Testamento, em que declara, que elle Testador e seu irmão devem a Guomes Folgueira de Ponte do Lima trinta e seis mil reis em dinheiro, que lhes emprestara. Pasta VI. N.º 2.º 1546. Testamento de Martinho Anes da Freguezia de Moreira. Pasta VI. N.º 3.º 1598. Testamento de Beatriz Gonçalves viúva em que deixa suas Cazas de Ponte do Lima, onde vivia, a sua sobrinha Catarina Pinto, instituindo nellas vínculo, ou capella. Pasta VI. N.º 4.º 1636. Capela da Carcaveira. Sentença de quitação, e absolvição de censuras a favor de Pero Barros, Francisco de Barros e suas irmãs, contra quem se tinha procedido por não darem cumprimento ao testamento e Bens de alma da sua Mãe Izabel Barboza. Por esta sentença se vê que a dita Isabel Barboza instituíra Capella no seu terço, tomando para elle as Cazas da Quinta da Carcaveira, Horta, Pomar, Eira e Recios. E que deixara o prazo da Carcaveira foreiro a Palme a seu marido Bernardo de Barros &c. Pasta VI. N.º 11. 1673. Papeis sobre a execução do testamento, e trasladação dos ossos do Sr. João de Araújo de Azevedo, que foi sepultado no Salvador de Braga, e sua mulher e filho o queriam trasladar para a Capella do Morgado do Sobreiro. Veja-se o processo que depois correu a este respeito. Pasta VI. N.º 18. 1677. Vínculo do Sobreiro. Pasta VI. N.º 19 Processo que correu entre o Sr. Fernando Pereira de Araújo, e as religiosas do Salvador de Braga, sobre a trasladação, que o dito Sr. queria fazer dos ossos de seu pai o Sr. João de Araújo de Azevedo, da igreja das ditas religiosas para a sua Capella de Santo António. Está aqui o testamento do dito Sr. João de Araújo de Azevedo, em que vincula o seu Terço, deduzidos os Legados, chamando para administradora a Sra. Catarina Pereira sua mulher, e depois della, o seu filho mais velho o Sr. Fernando Pereira de Araújo. Está também huma Escritura, pela qual o dito primogénito, tendo provado em Juízo, que seu pai tinha dividas, e que do seu terço nada restaria para a dita Capella, e querendo cumprir a vontade do dito seu pai, supre pelo seu terço delle próprio Fernando Pereira aquella falta, annexando bens seus, e separados para o seu terço, à sua Capella de Santo António do Sobreiro, com as obrigações impostas no testamento de seu Pai, e com as mesmas vocações do vínculo primordial do Sobreiro. Propriedades anexadas por esta escritura: - O campo do Vinhal censuário à Casa de Giela; - O campo da Eira Velha; - A vinha do Coto, que parte com os mesmos campos; - A vinha de Outrello que parte com a sobredita; - O campo do Outrello; - A vinha do Outrello que está no mesmo campo; - O campo da Eira-velha de cima;

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- Tudo sito na Quinta do Morgado de Sobreiro, freguezia de Aboim. Obrigações desta Capela: - 1 missa cada mez na Capella de Santo António com seu responso no fim; - 1 Offício de nove lições cantado por cinco Padres que também dirão Missa, no dia dos fieis de Deos, ou no primeiro dia desoccupado, com tanto que a demora não exceda a oito dias. - Havendo falta de alguma das missas, ou offício se satisfará em dobro essa falta que houver. Mais bens desta annexação declarados no fim da escritura. - O campo da Urea que foi do Camacho de Bouças; - A leira que está no mesmo campo; - O campo de Figueiras junto ao de cima; - O campo de Juya censuário à igreja de Aboim. Todos juntos ao campo de Juya já vinculado. 1677. Vínculo do Sobreiro. Traslado do processo que correu entre o Sr. Fernando Pereira de Araújo, e as freiras do Salvador de Braga sobre a trasladação dos ossos do Sr. João de Araújo de Azevedo. Testamento do Sr. João de Araújo. Subrogação de bens ao seu terço para annexar ao Vínculo do Sobreiro. Pasta VI. N.º 20 1708. Testamento do Sr. Fernando Pereira de Araújo de Azevedo morador na Caza de Sá. Original importante. Pasta VI. N.º 31 1708. Testamento do Sr. Fernando Pereira de Araújo e Azevedo da Caza de Sá Pai do Sr. Tristão Pereira He cópia imperfeita e não authentica. Está aqui junto um mappa de todos os Bens de Vínculo, Prazos, e Leiras de que o dito S.r esteve de posse até à sua morte, e he importante para o conhecimento individual dos mesmos bens e suas naturezas. Pasta VI. N.º 33. 1731. Vínculo instituído pelo Sr. António Annes. Libello que deo Manuel Pereira de Castro contra a Caza de Sá, para reivindicar este Vínculo. Por elle se mostra a ordem da sucessão nas duas Famílias. Consta d’aqui também, em que bens foi instituído este Vínculo ou capella originariamente; e como estes bens que eram em Serdedelo foram subrogados pela Caza e Quinta de Sá. Pasta VII. N.º 46 1747. Compozição que fizeram os senhores de Sá com Manuel Pereira de Castro sobre o Vínculo de Sá instituído pelo Sr. António Annes. Subrogação de Bens. Provisões. &c. Pasta VII. N.º 54. Acha-se aqui junto a escriptura de doação que fez a Senhora D. Maria Pereira Fagundes, a sua prima a Senhora D. Violante Pereira de Barbosa aos 21 de Abril de 1708. 1747. Vínculo instituído por António Anes, e subrogação da quinta de Sá. Termo de composição que fez a Caza com Manuel Pereira de Castro, da Rua do Pinheiro, na Cauza em que disputavam sobre a successão do referido vínculo, e subrogação. Provisões que autorizaam esta Composição pela qual parece haverem ficado à Caza do Pinheiro os bens de Serdedelo em lugar da Quinta de Sá &c. &c. Pasta VII. N.º 54 1501. Cazaes do Mosteiro de Azere hoje prazo da commenda do mesmo nome. Inquirição e atombamento destes cazaes feito em 1501 pelo Abbade do Mosteiro de Ermello, de mandado do Bispo de Ceuta, a quem n’aquelle tempo pertencia a jurisdição ecclesiástica além do Lima, que hoje he Comarca ecclesiástica de Valença. He certidão autêntica. Pasta XIII. N.º 3.º

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ANEXO VIII - ANÁLISE DO INVENTÁRIO DO CARTÓRIO DA CASA DE SÁ ELABORADO POR FREI FRANCISCO DE SÃO LUÍS Num. de registo 1 2 3 4 5 6 7 8

Cota

Nível descritivo

Sumário

Pasta I. N.º 1 Pasta I. N.º 2 Pasta I. N.º 3 Pasta I. N.º 4 Pasta I. N.º 5 Pasta I. N.º 6 Pasta I. N.º 7 Pasta I. N.º 8

D D D D P D D P

9 10

Pasta I. N.º 9 Pasta I. N.º 10

D P

11 12

Pasta I. N.º 11 Pasta I. N.º 12

D D

13

Pasta I. N.º 13

D

14 15 16

Pasta I. N.º 14 Pasta I. N.º 15 Pasta I. N.º 16

D D P

17

Pasta I. N.º 17

P

Induzido pelo critério tipológico

18

Pasta I. N.º 18

D

Induzido

19

Pasta I. N.º 19

P

Induzido pelo critério temático

20

Pasta I. N.º 20

D

21

Pasta II. N.º21

P

22

Pasta II. N.º 22

P

23 24 25 26 27 28

Pasta II. N.º 23 Pasta II. N.º 24 Pasta II. N.º 25 Pasta II. N.º 26 Pasta II. N.º 27 Pasta II. N.º 28

D D D D D D

Induzido pelo critério temático Induzido pelo critério tipológico Formal pelo critério temático Formal Induzido Formal Induzido Induzido Formal

Formal Formal Formal Induzido Induzido Induzido Formal Induzido pelo critério temático Induzido Induzido por critério tipológico

Induzido Formal + sumário do conteúdo Formal + sumário do conteúdo Induzido Induzido Induzido pelo critério temático

- 338 -

Datas s. d. s. d. s. d. s. d. s. d. s. d. s. d. s. d. s. d. Dos baptismos, recebimentos e óbitos e não das certidões s.d. Formal Formal Formal Formal Data inicial dos acontecimento s relatados Data dos acontecimento s relatados e não da produção documental Data do acontecimento e não do doc. Data do acontecimento relatado no 1.º doc. e não do processo Formal

N.º de docs. 1 1 1 1 3 1 1 4 1 46

1 1 1 1 1 17

7

1 7

1

Formal do último doc. Formal

5 2

Formal Data errada Formal Formal Formal Data da carta e

1 1 1 1 1 1

29

Pasta II. N.º 29

P

Induzido pelo critério temático Induzido pelo critério temático Induzido + sumário alargado Induzido Induzido Induzido

30

Pasta II. N.º 30

P

31

Pasta II. N.º 31

D

32 33 34

Pasta II. N.º 32 Pasta II. N.º 33 Pasta II. N.º 34

D D P

35

Pasta II. N.º 35

P

Induzido pelo critério temático

36

Pasta II. N.º 36

P

Induzido pelo critério temático

37

Pasta II. N.º 37

D

38

Pasta II. N.º 38

D

Induzido pelo critério temático Induzido pelo critério temático

39

Pasta II. N.º 39

D

Induzido + comentários de natureza qualitativa

40 41

Pasta II. N.º 40 Pasta II. N.º 41

D D

Induzido Formal + comentário de natureza jurídica

42

Pasta II. N.º 42

P

Formal

43 44 45

Pasta II. N.º 43 Pasta II. N.º 44 Pasta II. N.º 45

D D P

Formal Formal Formal + comentário de natureza jurídica

46 47 48 49

Pasta II. N.º46 Pasta II. N.º 47 Pasta II. N.º 48 Pasta II. N.º 49

D D D D

50 51

Pasta II. N.º 50 Pasta II. N.º 51

D P

Formal Formal Induzido Induzido com comentários de natureza qualitativa Formal Formal

- 339 -

não do treslado Data formal do doc. 2 Limites cronológicos Formal Formal Formal Data não coincide com nenhum dos docs. Data não coincide com nenhum dos docs. Data formal de alguns documentos e à data de autenticação do doc. Datas formais Data do despacho (a mercê ocorre dois anos depois) Data do doc. Original e não desta certidão Formal Data do doc. Original e não desta certidão Data da nomeação para capitão constante no doc. 1 e não das certidões Formal Formal Data das legitimações régia e apostólica Formal Formal Formal Formal Formal Data das doações; datas dos treslados

4 16 1 1 1 3

2

21

1 1

1 1 1 2

1 1 2

1 1 1 1 1 7

52 53 54

Pasta II. N.º 52 Pasta II. N.º 53 Pasta II. N.º 54

D D P

Induzido Induzido Induzido pelo critério temático Formal Formal Induzido pelo critério temático

55 56 57

Pasta III. N.º 55 Pasta III. N.º 56 Pasta III. N.º 57

D D P

58

Pasta III. N.º 58

P

Formal

59

Pasta III. N.º 59

P

Induzido pelo critério temático

60

Pasta III. N.º 60

P

61

Pasta III. N.º 61

D

62

Pasta III. N.º 62

D

Formal do 1.º doc.; induzido dos restantes Induzido pelo critério temático Induzido pelo critério temático

63 64 65

Pasta III. N.º 63 Pasta III. N.º 64 Pasta III. N.º 65

D D P

Formal Formal Formal

66

Pasta III. N.º 66

P

Induzido

67 68 69 70 71 72

Pasta III. N.º 67 Pasta III. N.º 68 Pasta III. N.º 69 Pasta III. N.º 70 Pasta III. N.º 71 Pasta III. N.º 72

D D D D D P

Formal Formal Induzido Induzido Formal Induzido do 1.º doc.

73 74

Pasta III. N.º 73 Pasta III. N.º 74

D D

Induzido Formal

75

Pasta III. N.º 75

P

76 77 78 79 80 81

Pasta III. N.º 76 Pasta III. N.º77 Pasta III. N.º 78 Pasta IV. N.º 79 Pasta IV. N.º 80 Pasta IV. N.º 81

D D D P D P

82 83 84 85 86 87

Pasta IV. N.º 82 Pasta IV. N.º 83 Pasta IV. N.º 84 Pasta IV. N.º 85 Pasta IV. N.º 86 Pasta IV. N.º 87

D D P D D P

Induzido pelo critério temático Induzido Induzido Induzido Formais Induzido Induzido pelo critério temático Formal Induzido Formal Formal Formal Induzido pelo critério

- 340 -

Formal Formal Formal do 1.º doc. Formal Formal Datas formais do 1.º e último doc. Data formal do 1.º e último doc. Data formal do doc. n.º 1 e do doc. n.º 7 Formal do 1.º doc. Formal Data dos Autos beneficiais e não desta certidão Formal Formal Data formal do 1.º e do último doc. Data do despacho do 1.º doc. Formal Formal Do treslado Formal Formal Data formal da justificação (doc. 1) Formal Data da sentença de habilitação Formal dos 4 docs. Formal Formal Formal Formais Formal Formal do 1.º e último doc. Formal Formal Formal Formal Formal Formal do 1.º

1 1 2 1 1 5 2 7 10 1 1

1 1 4 3 1 1 1 1 1 3 1 1 4 1 1 1 4 1 4 1 1 2 1 1 4

88

Pasta IV. N.º 88

P

89

Pasta I. N.º 1

P

90 91

Pasta V. N.º 7 Pasta VI. N.º 1

D D

92

Pasta VI. N.º 2

D

93 94 95 96

Pasta VI. N.º 3 Pasta VI. N.º 4 Pasta VI. N.º 11 Pasta VI. N.º 18

D D D P

97

Pasta VI. N.º 19

P

98

Pasta VI. N.º 20

D

99

Pasta VI. N.º 31

D

100

Pasta VI. N.º 33

P

101

Pasta VI. N.º 46

P

102

Pasta VII. N.º 54

P

103

Pasta XIII. N.º 3

D

tipológico Induzido pelo critério tipológico Induzido pelo critério temático Induzido Induzido + comentário de natureza qualitativa Induzido + comentário de natureza complementar Induzido Induzido Induzido Induzido pelo critério temático + comentário de natureza complementar Induzido pelo critério temático + sumário dos documentos Induzido pelo cirtério temático Induzido + comentário de natureza jurídica Induzido + comentário de natureza jurídica Induzido Induzido pelo critério temático Formal + comentário de natureza jurídica

- 341 -

e último doc. Formal do 1.º e último doc. Formal do 1.º e último doc. Formal Formal

1 1

Formal

1

Formal Formal Formal Data do despacho do doc. n.º 2

1 1 1 3

Induzida do doc. n.º 6

21

3 4

Induzida

1

Formal

1

Formal do doc. n.º 1 Data formal do doc. 2 Formal do doc. n.º 1 Formal do doc. e não da certidão Total de docs.

2 3 9 1 314

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