Entre pobres, analfabetos e operários: História Social de Parnaíba-PI na primeira metade do século XX

June 22, 2017 | Autor: Alexandre Silva | Categoria: Social History, Historia Social, Parnaíba
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ENTRE POBRES, ANALFABETOS E OPERÁRIOS: HISTÓRIA SOCIAL DE PARNAÍBA-PI NA PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XX Alexandre Wellington dos Santos Silva1 Amanda Maria dos Santos Silva2 RESUMO O presente artigo é um desdobramento das pesquisas realizadas para o Trabalho de Conclusão de Curso do autor, e tem como objetivo caracterizar o espaço urbano vivenciado pelos“marginais”parnaibanos emapear as sociabilidades destes no recorte temporal do início do século XX. Para isto, serão utilizadas as teorias da História Social (SHARPE, 1996; HOBSBAWM, 1983; THOMPSON, 2001; CASTRO, 1997; OGUÍN, 2007) e do Materialismo Sociológico (BAKUNIN, 2014; FERREIRA, 2007) aliadas à pesquisa bibliográfica atravésde memórias, periódicos, almanaques, etc. Divide-se da seguinte forma:“Introdução”, tendo como finalidade explanar de forma mais abrangente a pesquisa; “O revés da opulência”, realizando debate teórico e apontando as contradições inerentes de uma sociedade estratificada em classes;“Conclusão” fazendo um apanhado geral do trabalho e apontando para importância e necessidade de se trabalhar a República Velha em Parnaíba sob outras perspectivas. PALAVRAS-CHAVE: História Social; Materialismo Sociológico; Parnaíba. RESUMEN Este artículo es una rama de la investigación llevada a cabo por el autor en su Trabajo de conclusión de curso, y tiene como objetivo caracterizar el espacio urbano experimentado por los "marginales" parnaibanos y mapear las sociabilidades de estos en el marco de tiempo de comienzos del siglo XX. Para ello, se utilizarán las teorías de la Historia Social (SHARPE, 1996; HOBSBAWM, 1983; THOMPSON, 2001; CASTRO, 1997; OGUÍN, 2007) y el Materialismo Sociológico (BAKUNIN, 2014; FERREIRA, 2007), combinada con la pesquisa bibliográfica a Graduado em História pela Universidade Estadual do Piauí. Membro do Núcleo de Estudos Aplicados ao Meio Ambiente - NEAMA/UESPI. [email protected] 2 Mestre em Educação Brasileira pela Universidade Federal do Ceará. Graduada em História pela Universidade Estadual do Piauí. [email protected] 1

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través de memorias, periódicos, almanaques, etc. Se divide de la siguiente manera: "Introducción", con la finalidad de explicar de modo más integral la investigación; "El revés de la opulencia", haciendo un debate teórico e indicando las contradicciones inherentes de una sociedad estratificada en clases; "Conclusión" trayendo un panorama general del trabajo y apuntando a la importancia y la necesidad de trabajar la Republica Vieja en Parnaíba desde otras perspectivas. PALABRAS-CLAVE: Historia Social; Materialismo Sociológico; Parnaíba.

Introdução Parnaíba, localizada no litoral piauiense,era um dos principais entrepostos comerciais do Nordeste durante o início do século XX. As condições geográficas favoreceram tal fato: Com o acesso ao mar e abundância de flora, composta “principalmente, de carnaubais, buritizais, tucunzais, babaçuais e açaizais” (MAVIGNIER & MOREIRA 2007. p.44), ingressou com facilidade no mercado externo, baseado na“(...) exportação da maniçoba (1900-1915), depois, foi a da cera de carnaúba e da amêndoa do babaçu (1910-1950)” (MEDEIROS, 1995. p. 165). Com o RioIgaraçu, um braço do Rio Parnaíba, a produção circulava para outras cidades do interior, onde “(...) forma-se e se delineia a estrutura econômica do Estado, que encontra em seu curso o escoadouro natural dos seus productos” (BRANCO, 1942. p. 19). A exploração dos recursos naturais e a contenção dos resultados desta extração nas mãos de poucos possibilitou a ascensão de uma elite local, formada por comerciantes, burgueses, políticos, militares de alta patente e intelectuais, unificada com capitalistas estrangeiros vindos principalmente da França, Portugal, Inglaterra e do Oriente Médio. Nessa interação, no ano de 1917 funda-se a ACP - Associação Comercial de Parnaíba, com o intuito “organizar os mais diversos produtores, exportadores comerciantes, em torno de uma instituição que lhes desse maior representatividade e dinamismo de ações” (MENDES, 1994. p. 15). A organização pleiteou recursos e estruturas para dinamizar o capital do município, tendo como principais

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referenciais de “conquista” a instalação de uma agência do Banco do Brasil e a implantação da Estrada de Ferro Central do Piauí. Esta lógica também refletia na geografia da cidade. A parte nobre de Parnaíba contava com a Igreja da Matriz (Nossa Senhora da Graça), Cine Éden, Cassino 24 de Janeiro e diversas lojas de artigos ingleses e franceses; toda esta profusão arquitetônica girava em torno da Praça da Graça, de forma que era reconhecida como “(...) uma mistura de parque, ponto de encontro, casa noturna, bar ou clube. (...) Lá se desenrolavam os mais cariados tipos de encontros sociais e conversas”. (GOMES, TERTO & BATISTA. apudABREU, 2005. p. 199).O período é tido como a belle époque parnaibana. Lima (2005, p. 211) destaca a materialização da lógica elitista na cidade: A cidade florescia, nas ruas as grandezas dos casarões refletiam o desenvolvimentismo do comércio, artigos de diferentes origens, roupas, perfumes, motores, lojas, empresas de uma variedade sem número de produtos (...); importações e exportações ligavam o Piauí a outros Estados, a outros países, à Europa, símbolo do moderno. Entretanto, esta realidade estava longe de ser vivenciada coletivamente. Despojados de qualquer privilégio, uma massa de homens, mulheres e crianças viviam e sentiam uma cidade diametralmente oposta à dos abastados, embora se tratasse da mesma urbe.

O revés da opulência

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Foi exposta até o momento a Parnaíba das elites, a cidade das riquezas, da modernidade e do fausto.Observaremos agora “o revés da opulência”, a dialética social produzida dentro da lógica do então jovem capitalismo que por sua vez originoua cidade dos “marginais”, dos comuns. Para que tal empresa se realize, faz-se necessário a utilização da História Social. O poema de Bertold Brecht, “Perguntas de um operário que lê”, datado de 1936 já questiona a “História das elites” quando interroga: “Quem construiu Tebas, a das sete portas? Nos livros vem o nome dos reis, mas foram os reis que transportaram as pedras? Babilônia, tantas vezes destruída, quem outras tantas a reconstruiu? Em que casas da Lima Dourada moravam seus obreiros?” A “possibilidade de transformar essa necessidade em ação” (SHARPE, 1990. p. 40) apontou quando o historiador Edward Thompson publicou um artigo de título “The History from Below”. Sharpe (Idem. p. 40-41) indica que“daí em diante, o conceito de história vista de baixo entrou na linguagem comum dos historiadores”. Hobsbawm (1983, p.24) aponta que o desenvolvimento e evolução da História Social devem-se tanto às “mudanças técnicas e institucionais que as disciplinas acadêmicas das ciências sociais sofreram” (tradução nossa) como ao estreitamento do campo dos historiadores “economistas” - chamados assim“devido ao fato de que os problemas que lhes tocavam não eram sequer considerados pela história ortodoxa em geral”. (Idem). A História Social, não é um corpo heterogêneo. Para além da escola inglesa, CASTRO (1997, p.88) aponta que as origens da História Social remetem à Escola dos Annales, A definição dada, então de

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História Social era tudo aquilo que não fosse “História Tradicional” e que dialogasse com as múltiplas ciências humanas de forma uma ampla. Febvre (1989. p. 30.) em polêmica com a distinção entre “História Econômica” e “História Social” declara que “(...) não há história econômica e social. Há simplesmente a história, na sua Unidade. A História que é toda ela social, por definição”, e emBraudel (2013. p. 176), quando discute a obra de Otto Bruner, baseada na dicotomia entre “História Política” e “História Social” este expõe que“não há historiador digno desse nome que não saiba justapor (...): cultural e social, cultural e política, social e econômicas (...). Mas a história é o conjunto dessas vizinhanças, dessas médias, dessas interações infinitas...”. O debate em torno destas concepções refere-se à uma dualidade: Se a História Social é uma especialidade, com propósitos próprios e estabelecidos, ou se o “social” se misturacom a sociedade, o que faria da História Social uma classe que aglutina todas as outras especialidades da história. Por conta disso, Olguín (2007, p. 04) aponta que “A concepção que se tem, então, sobre História Social dependerá unicamente da concepção teórica que o historiador tem sobre a História” (tradução nossa). Baseado nesta premissa, partimos do prisma de uma abordagem que problematiza a História dos “grandes homens”, e dá a possibilidade de pesquisar a História “vista de baixo”, isto é, dos que compõem a margem da sociedade, “a história da gente comum” (THOMPSON, 2001. p. 185), sinalizando“uma inversão de perspectiva em relação à tradicional historiografia que partia do poder dominante” (BARROS, 2005. p. 04). Destacamos as análises presentes em diversas memórias sobre as sociabilidades desenvolvidas na cidade de Parnaíba, juntamente com periódicos da época e demais fontes bibliográficas. Humberto de Campos (1962, p. 119), escritor e poeta que teve assento na Academia Brasileira de Letras, passou parte da sua infância

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e adolescência na cidade de Parnaíba. Saindo de Miritiba (PA) - hoje chamada de Humberto de Campos em homenagem a este -, indo para São Luís (MA) e finalmente desembarcando no litoral piauiense, registrou em suas “Memórias” as impressões da cidade piauiense: Parnaíba era, de algum modo, uma decepção. As ruas eram largas e numerosas, mas de areia solta; dos seus seis sobrados, três achavam-se em ruínas, desabitados, e entregues aos morcegos e às corujas; o comércio guardava o seu sortimento nas prateleiras, nada deixando fora do balcão. Não tinha gás, não tinha carruagens, não tinha bondes (...). Humberto residia no Bairro Campos, localidade marginal na distribuição urbanística da cidade. Durante a juventude,viajou para São Luís em busca de melhor trabalho e, regressando à Parnaíba com a promessa de emprego em Belém, aponta que a urbe continuava a mesma: “Em dois anos, não sofrera a menor modificação. Não se calçara uma rua (...), não se edificara um prédio (...). Por isso, a geração que surgia para a vida prática não tinha, à sua espera, senão a ociosidade”.(CAMPOS, 1962a. p. 123). A periferia da urbe também foi registrada pelo geógrafo anarquista ÉliséeReclus (1900, p. 169) em viagem pelo Rio Parnaíba e seus afluentes, anotandodados acerca da urbanidade em parte da cidade de Parnaíba relatando que “As casas erguem-se na margem direita d'um braço do delta chamado Iguarassú, num terreno humido de alluviões, onde a acclimação não se faz sem perigo”. A região, conhecida como Coroa, sofria constantemente com as cheias do Igaraçu, comprometendo o lar, a saúde e a vida de seus moradores. Branco (1981, p. 20-21) realiza um panorama urbanístico mais complexo e detalhado da cidade de Parnaíba, o qual permite

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perceber os conflitos produzidos pela organização e disposição dos bairros nomunicípio, com uma clara distinção classista: Daí Parnaíba se estendia, primeiro através das ruas comerciais, onde ficavam as casas exportadoras e importadoras e os escritórios de representação. Depois, vinham as lojas dos turcos, os armarinhos, as casas de tecidos. Depois as residências dos empregados do comércio, casas baixas e antigas, pintadas de cores vivas - vermelho, amarelo, azul. E, por fim, a zona mais chique, dos palacetes, dos chalés, dos bangalôs de estilo moderno, cercados de casuarinas, de mangueiras, de palmeiras, de jardins floridos. Em torno deste núcleo, estendiam-se os bairros proletários, uma enorme cinta de palhoças e casebres, onde as ruas não eram calçadas, não havia jardins nem praças arborizadas e onde os fios elétricos não chegavam. Eram a Coroa, os Tucuns e os Campos. A Coroa e os Tucuns começavam também no rio, com seus botecos sórdidos à beira dos barrancos, (...). E daí iam se estendendo, sempre beirando a cidade, a Coroa por um lado, os Tucuns pelo outro, até alcançarem os Campos, que fechava a cidade pelos fundos, completando o anel. Essa população, duas vezes maior que a de Parnaíba propriamente, vivia inteiramente em dependência da cidade (...). É peculiar que o autor destaque a os bairros marginais da“Parnaíba propriamente”, além de sua consideração sobre a “dependência” destas localidades em relação ao centro da cidade,

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sendo perceptível, mesmo com a tentativa de “denúncia”, sua posição social abastada. A distinção não se dava somente no plano da descrição. Nestas regiões, o nível de analfabetismo era considerável devido a um duplo golpe: A necessidade dos filhos dos trabalhadores ingressarem na lógica laboral para auxiliar na subsistência familiar e a ausência de instituições de ensino para as crianças pobres. Segundo o Almanak Laemmert, no ano de 1919, haviam “duas escolas estadoaes e treze municipaes3”. Para uma cidade de 21.000 habitantes4, o fracasso do poder público em relação à educação era eminente. Esta análise encontra respaldo nas pesquisas de Queiroz (1994, p. 57), quando aponta que (...) o crescimento do número de escolas e do número de alunos articulados sequer acompanhou o crescimento da população escolarizável. Dessa forma, o Piauí continuou, como fora no Império, um dos estados em que o número de analfabetos guardava maior proporção relativa à população total. Nesta conjuntura precária, o destaque da educação volta-se para o setor privado, servindo apenas para as famílias que, não tendo condições de enviar seus filhos para outros centros urbanos, possuíam capital suficiente para pagar o soldo de instrutores particulares Mendes (2007, p.70) discorre sobre este período afirmando que (...), as iniciativas particulares foram as que figuraram como responsáveis por algum 3Almanak

Administrativo, Mercantil e Industrial do Rio de Janeiro: Indicador para o ano de 1919. Rio de Janeiro: Companhia Typographica do Brazil, 1919. p. 3540. 4 Idem.

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desenvolvimento do ensino. As atividades de ensino em Parnaíba, durante a Primeira República, (...) eram todas desenvolvidas nas residências dos professores, (...), mantidos pelas mensalidades dos alunos. Apesar disso, e seguindo o exemplo de outras cidades do país e do mundo, coube aos trabalhadores organizarem seus espaços de instrução. A exemplo disto, o jornal operário “O Artista”, Orgam de Propaganda da Sociedade União Progressista dos Artistas Mechanicos e Liberaes de Parnahyba denota seu esforço para combater o analfabetismo quando declara que A Escola Noturna do bairro dos Tucuns, desta cidade, mantida pela “União Progressista”, sob a competente direcção do talentoso moço sr.Rogaciano Britto, tem a denominação de “28 de Setembro” A União Progressista - já allugou um espasçoso salão, sito á rua Conde d'Eu, para á abertura da escola noturna “24 de Agosto” e funcionamento provizorio da “União Progressista” que o fez passar por um melhoramento hygienico. A “União Progressista” pega á pessoas habilitadas que queiram ensinar a ler e escrever aos meninos notoriamente pobres e filhos de artistas a 1:000 reis mensaes por cada um, podendo mesmo funccionar, por conta da “união”, pequenas Escolas por todos os bairros desta cidade. A tratar com o presidente da “União Progressista” que providenciará no que for preciso, inherente a cartas de A. B. C., livros, tinta e

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papel. (O Artista. Parnaíba-PI. Ano I, n° 03. 5 de Outubro de 1919. p. 03). Em edição posterior, conclamam os próprios trabalhadores a auxiliarem na luta contra a falta de letramento: Os nossos operarios devem pois tomar o compromisso de não mais deixarem os seus filhos analphabetos, e, elles proprios, tentando instruir-se, subirem do nivel moral (...) que os tornem dignos antecessores da humanidade futura. (O Artista. Ano II, n° 06. 24 de Agosto de 1920. p. 03). Percebe-se ainda a inserção das escolas operárias na periferia de Parnaíba, apontando a negligência e o abandono até mesmo das “escolas particulares”. Nestes locais, a situação dos moradores era extremamente precária. Rebello (1920, p. 50), em discurso aos operários parnaibanos proferido na Praça da Graça, deixa-nos registros importantes que possibilitam entrever esta realidade, e que muito contrasta com a prosperidade discorrida na maioria dos livros e trabalhos acadêmicos que versam sobre esta época: (...) Não ha um movel. Os aparelhos culinarios andam pelo chão, ao alcance dos cães e outros animaes domesticos. O chão nú é o único assento. A mesa, logar onde segundo as suas crenças, sempre está presente o Sêr Supremo, não existe. Comem animalmente separados, esparsos pelos quatro cantos da casa, agarrando á mão os alimentos, rasgando carne presa aos dentes com empuxões selvagens.

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Percebendoesta distribuição classista de Parnaíba na Primeira República, podemos equipará-la com asideias de Carlos (2008. p. 71), da cidade“enquanto produto de lutas”, isto é, “fruto de relações sociais contraditórias, criadas e aprofundadas pelo desenvolvimento do capital. Assim, no embate entre o que é bom para o capital e o que é bom para a sociedade (...), o urbano se produz, a cidade se estrutura e a paisagem ganha sua configuração”. A dialética do urbanismo se faz nítida, e aproxima-se das proposições de Amorós (2003. s/n) ao abordar a questão urbana espanhola, destacando que“O urbanismo, ao criar bairros burgueses, criou ao mesmo tempo bairros operários; ao segregar a miséria a fez visível;” (tradução nossa). A realidade vivenciada em Parnaíba do início do século XX não se origina apenas das condições econômicas da época, isto é, não é somente “o estado econômico de um povo que determina seu estado social” (PLEKHANOV. s/d, p.32); tampouco deriva simplesmente de aspectos “discursivos”, ou suas contradições intrínsecas sejam “relativas”, dando corpo a uma espécie de análise hedonista-niilista; é antes o resultado multicausal da interferência da natureza, da cultura, da política, e um sem número de outros agentes. A ideia do real como “síntese de muitas determinações” (BERTHIER, 2014. p.11) foi percebida por Bakunin (2014.p.339-340) ainda no século XIX, sendo presente em diversas obras do autor, e fica clara quando este afirma que Tudo o que existe, os seres que constituem o conjunto indefinido do universo, todas as coisas existentes no mundo, seja qual for, aliás, sua natureza particular (...) exercem necessária e inconscientemente, seja por via imediata e direta, seja por transmissão indireta, uma reação e uma ação perpétuas; e toda essa quantidade infinita de

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ações e reações particulares, ao combinar-se em um movimento geral e único, produz e constitui o que chamamos de vida, solidariedade e causalidade universal (...) O filósofo russo - que, longe de corresponder às proposições de Woodcock (2002. p. 163), quando este afirma que o autor “não deixou um único livro em que transmitisse suas idéias à posteridade” desenvolveu consideráveis obras de caráter político, sociológico e filosófico -, intitulava o método de “sociologia”, isto é, “(...) a ciência de leis gerais que presidem a todos os desenvolvimentos da sociedade humana.”, e que “(...) abraça toda a história humana enquanto desenvolvimento do Ser humano coletivo e individual na vida política, econômica, social, religiosa, artística e científica” (BAKUNIN, 2014a. p. 60-62). Esta “causalidade universal”, “produzida e reproduzida pela ação simultânea de todas as causas particulares” (BAKUNIN, 2014a. p. 96), é trabalhada atualmente, a nível acadêmico como “Materialismo Sociológico”, tendo a tese de doutoramento de Ferreira (2007) como a primeira expressão do método, apontando de forma resumida que este“se propõe a tomar a própria mudança como elemento constitutivo da vida material, sendo anoção de ação e de forças agentes as principais”. A lógica da perspectiva assemelha-se consideravelmente da ideia de História em Braudel (2013, p. 176), quando o autor declara que (...) a história não pode ser concebida senão em ndimensões. (...) ela não repele para planos inferiores, até mesmo fora do espaço explicativo, a apreciação cultural ou a dialética materialista ou qualquer outra análise; ela define na base de uma

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história concreta, pluridimensional, como diria Georges Gurvitch. O autor citado por Braudel possuía particularidades consideráveis nos métodos de análise sociológica que utilizava, como por exemplo, a análise multivariada, isto é, a “redução de todo o campo do estudo sociológico a um ‘espaço de variáveis’” (SCHWARTZMAN, 1960. p. 03); este “espaço de variáveis”, por sua vez, denota a tentativa de “apreender o objeto social no máximo de riqueza de determinações que seja humanamente possível”(SCHWARTZMAN, 1960. p. 04), o que o aproxima da “sociologia” Bakuninista e das considerações sobre a História de Braudel. Conclusão Avaliandosob este aspecto, é nos possível escapar das conclusões derivadas de determinações únicas e, unida à História Social, construir uma fuga das infinitas pesquisas voltadas à memória e história dos dominantes e do “progresso”. Filhos e netos dos “grandes vultos históricos” da cidade esforçam-se para que seus pais e avós continuem imortalizados na memória local, para além das ruas, praças e avenidas que levam seus nomes; o desejo é reforçado pela academia, em um misto de saudosismo e decepção com o presente, inebriado com o epíteto que Parnaíba possui atualmente: “a cidade do já teve”. É preciso advertir que, em realidade, esta“nunca teve para todos”, que as riquezas produzidas por muitos, eram usufruídas por poucos, e foram constituídas à custa de suor e sangue deuma imensidão de pobres, analfabetos e operários. Referencial Bibliográfico AMORÓS, Miguel. Urbanismo y orden. In.:PeriferiesUrbanes – Grup de Treball de l'InstitutCatalà d'Antropologia. . Acessado em 24.07.215, às 13:24h.

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