Entrevista ao DIÁRIO DE SÃO PAULO
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Curso Básico de Formação em Filosofia Clínica Turma
Felicidade Qua, 04 de Junho de 2014 19:48
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Felicidade É questão pessoal
Ariana Pereira Diário da Região São José do Rio Preto Orlandeli/Editoria de Arte
Cursos de Extensão 1º Semestre 2015 Filosofia Clínica para profissionais da saúde Filosofia da Neurociência Filosofia da Mente e Filosofia Clínica Filosofia Clínica para professores Introdução à Lógica Conhecimento e autoconhecimento em Filosofia Clínica Introdução à Filosofia Mediação de Leitura* Neuroeducação*
“Eu me transformei na própria esperança de alegria: eu não vivia, nadava devagar num mar suave, as ondas me levavam e me
traziam”. Quem nunca se sentiu como a personagem de Clarice Lispector, em “Felicidade Clandestina”? Mas o que determina que uma pessoa seja feliz? Que ande como que carregada pelas ondas em um mar suave? São as posses? Os amigos? Um companheiro ou companheira que ame incondicionalmente? Estudiosos do tema estão cada vez mais convencidos de que felicidade é individual e pessoal. Cada ser traz em si a capacidade de ser feliz. Fatores como ambiente familiar e de trabalho, relacionamentos, tempo e espaço são fundamentais na construção de uma existência harmônica. Tais fatores combinados são raros na sociedade atual, portanto a felicidade precisa ser conquistada por cada indivíduo dentro de suas possibilidades. Segundo o doutor em filosofia pela Universidade Nova de Lisboa, Jorge Humberto Dias, quando não existem estruturas que ajudam as pessoas, proporcionando, por exemplo, liberdade, é difícil que se construa uma felicidade sólida e com qualidade. Por isso, é essencial que cada pessoa elabore sua própria teoria sobre felicidade.
* Cursos oferecidos na Editora FiloCzar Rua Durval Guerra de Azevedo, 511 Parque Santo Antônio São Paulo SP
“À medida que for realizando as suas ‘experiências felicitárias’, adapta sua teoria à prática cotidiana da vida em sociedade. Só assim será possível melhorar a teoria e viver com mais felicidade. Não vejo a felicidade como um estado de perfeição, alcançável com a obtenção de um conjunto de ‘coisas’, mas como uma atitude inteligente de compreensão do lugar do ser humano na vida em sociedade, realizando pessoal e socialmente essa sua‘filosofia de vida’. Viver de acordo com a sua idéia de felicidade é o objetivo de qualquer ser humano”, afirma o português, que realiza consultorias filosóficas sobre felicidade. Para uma criança, a felicidade pode estar em um pirulito colorido ou na boneca nova que ganhou no Natal. Para a noiva, o dia do casamento. Para o psicólogo Renato Dias Martino, no entanto, felicidade está diretamente relacionada às atitudes de uma pessoa em relação a outra. “Felicidade é uma apreciação que encontra muita dificuldade em ser descrita. Cada um tem um conceito diferente sobre essa experiência. Muitas vezes, a felicidade de um pode até estar muito próxima da dor do outro. Contudo, se existe uma felicidade que possa efetivamente ser chamada de real, penso ser aquela que compreende o próximo, já que o real é feito justamente daquilo que tenho de comunhão para com o outro”, diz Martino. Moldes A exaltação de modelos de felicidade e o incentivo ao consumo para se adquirir uma existência feliz seriam alguns dos principais fatores que fazem as pessoas pensarem http://institutointersecao.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=80:felicidade&catid=1:latestnews
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erroneamente que não são felizes, apesar de terem aparentemente tudo o que alguém precisa para isso. “O que acontece muitas vezes é que a mídia exalta modelos de vida e influencia diretamente no comportamento das pessoas, que buscam e consomem o que está sendo vendido. Passam a ‘ter’ o que a mídia mostra e a seguir os paradigmas de comportamento da ‘verdadeira felicidade’. Não se sentem felizes, no entanto, porque ‘têm tudo’ e ‘são nada”, analisa a coordenadora do curso de formação e especialização em filosofia clínica no Rio de Janeiro, Mariana Flores. “Qualquer tipo de receita ou modelo pré definido tornase inútil, inaplicável diante da condição de singularidade que cada indivíduo tem”, completa. Estrutura Felicidade não depende, porém, apenas de um estado interior ou da maneira como a pessoa enxerga a vida. A casa em que mora, o ambiente em que trabalha ou a estrutura social também exercem influências. “Na minha teoria sobre a felicidade atribuo um lugar de destaque aos organismos políticos governamentais, pois considero que têm um enorme poder na gestão da vida dos cidadãos, mas, mais do que isso, na promoção das condições (educação, liberdade e outros) que poderão permitir a construção e realização da felicidade pessoal”, afirma Dias. Além das estruturas oferecidas pela sociedade, o arquiteto Paulo Bispo acredita que a maneira de dispor a própria casa influencia na felicidade das pessoas. “A arquiteta Lina Bo Bardi afirma que uma casa deve ser como uma alma aberta às coisas da vida e não uma casacaverna, uma furna de onça. Mais do que isso, continua Lina, a casa deve ser uma entidade espiritual e moral sem oferecer aparência cenográfica teatral.” Morar em um local, independentemente de poder aquisitivo, que permite ter contato com a natureza, seja por meio de um canteiro ou vasos, ou perceber a mudança de estações é também um meio de se alcançar a felicidade, de acordo com Bispo. “A casa é o espelho de quem a escolhe, independentemente de riqueza ou pobreza. A disposição dos objetos e do prédio pode fazer uma pessoa mais feliz ou triste.” Disso, o arquiteto entende. Bispo mora em um loft construído em uma pequena chácara. Pelo quintal, gansos dividem espaço com uma doce cadela da raça pit bull e um tranqüilo dachshund (o famoso salsichinha). “Ter em casa um móvel de família ou objetos que lembram amigos ou pessoas queridas harmoniza o ambiente e deixa qualquer um mais feliz”, diz. Felicidade depende de ações individuais e intransferíveis Pensar e repensar a vida é a atividade mais proposta para refazer planos e recuperar a alegria que pode estar escondida em aspectos abandonados ou negligenciados ao longo do tempo. Um dos métodos que vem sendo utilizado para refletir as questões do cotidiano é a filosofia clínica. Presidente da Associação Nacional de Filósofos Clínicos (Anfic) e diretora do Instituto Interseção Instituto de Filosofia Clínica de São Paulo , Monica Aiub afirma que problemas existenciais, dificuldades nas relações, insatisfação com os rumos da própria vida, inquietações, sentimentos de inadequação e de não pertencimento são algumas das questões que levam as pessoas ao consultório de um filósofo clínico. O trabalho do profissional é levar a pessoa a contar de maneira ordenada a sua própria história. O fundamento disso, segundo Monica, está no conceito de um ser humano que se constrói a partir de suas vivências. “Na prática, tratase de uma reflexão sobre os problemas da realidade. Ter alguém que acolha e que ouça já é um grande passo. Ter alguém que, além de ouvir, problematize, questione, provoque a pensar, é mais interessante”, diz a filósofa. Encontrar a felicidade individual, independente das imposições da sociedade atual é um dos temas abordados por Monica em entrevista ao Diário: Diário da Região A superficialidade da sociedade impede que as pessoas sejam felizes? Monica Aiub A pressa, a rapidez, o consumo exacerbado, o foco no acúmulo de bens e capital, muitas vezes nos levam a esquecer necessidades, substituindoas por supérfluos. Também nos afasta, por vezes, de um mergulho em nós mesmos tornando nossas vivências superficiais. Há quem se considere feliz na superficialidade. Há quem sinta necessidade de sair dela e colocarse profundamente para viver as intensidades. O que habitualmente vemos no consultório é o sofrimento gerado por ambientes superficiais a pessoas que necessitam de profundidade, ou medo da profundidade por quem só conhece a superfície. Diário Como buscar profundidade de relacionamentos e visões de mundo em uma sociedade acostumada ao “fast”, ao imediatismo? Monica Se o “fast” satisfaz, não se busca ir além dele. Mas ele satisfaz? Talvez satisfaça no momento. Na acomodação provocada pelas soluções oferecidas pelo imediatismo, nos contentamos com um tamanho existencial, por sequer sabermos que existem outras possibilidades. Muitas vezes sofremos, nos sentimos mal diante dessa situação, mas pensamos ser a única possibilidade existente, seja nos aspectos sociais, culturais, existenciais. Em se tratando desses últimos, se nós os criamos, podemos modificálos. A abertura para conhecer o outro e a aceitação da legitimidade de outras formas de vida, diferentes da nossa, são aspectos que propiciam o aprofundamento, tanto nas relações, quanto em nossa visão de mundo. Diário Pela propaganda de fugir do sofrimento, não seria mais complicado as pessoas optarem pela filosofia que é algo que faz pensar e pode gerar crises? Monica Sim. É muito mais fácil tomar um medicamento ou usar uma droga que traga http://institutointersecao.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=80:felicidade&catid=1:latestnews
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felicidade rapidamente do que enfrentar os problemas existenciais, modificar hábitos, provocar a transformação em sua própria vida. Se minha vida não é satisfatória para mim, se não estou feliz com ela, poderei tomar um medicamento, uma droga, para anestesiar a dor. Contudo, a situação continuará a mesma. Por outro lado, a avaliação da própria vida, principalmente quando não estamos satisfeitos com ela, pode trazer sofrimento, pode gerar crises, pode nos levar a constatar que estamos nessa situação devido às nossas escolhas, a nossos posicionamentos. Diário Por que as pessoas, mesmo tendo tudo o que faria alguém feliz, não se dão conta e continuam em uma constante busca? Monica Platão já dizia que desejamos somente aquilo que não temos, porque quando o temos, não desejamos mais. Talvez nossa natureza seja, como diziam filósofos como Schopenhauer e Nietzsche, de insatisfação, de inquietação. E por isso uma busca constante. Por outro lado, a sociedade capitalista possui uma exagerada valorização de tais buscas. Nós compramos a idéia, não apenas no que se refere a produtos, a serviços, a bens, e a incorporamos à totalidade de nossa existência. É como se precisássemos cada vez mais, e nada nos satisfizesse. Diário Aprofundarse no que é ser humano é ser constantemente insatisfeito? Monica Quando você olha para além da superfície, você pode ver a beleza da existência, mas também suas mazelas. A dicotomia traçada entre bem e mal, belo e feio, justo e injusto é ilusória. Há, em todos nós e em todas as coisas, elementos de tudo isso. A superficialidade nos mostra a aparência, a máscara que esconde a dor e a insanidade, a maquiagem que esconde as imperfeições. Tudo parece leve, belo. Mas quando nos deparamos com as profundidades, as máscaras se tornam invisíveis, a maquiagem desaparece, a aparência se esvai. Diário Compreender a realidade é capaz de nos tornar felizes? Monica Não faria uma associação direta entre as duas coisas. Podemos entristecer ao compreendermos determinados aspectos da realidade; podemos enraivecer. Podemos nos sentir movidos a vivêla intensamente, a modificála, a transformar a nós mesmos... são muitas as possibilidades. Compreender a realidade não garante felicidade, mas nos oferece elementos para que possamos nos situar diante dela e, consequentemente, se essa for nossa escolha, tornar nossas vidas melhores. Diário Há algumas dicas que as pessoas possam seguir para buscar a felicidade por meio da filosofia? Monica A primeira dica é procurar partilha. Platão propõe como alternativa o diálogo, pois as provocações do outro nos levam a avaliar nossos argumentos, pontos de partida, conclusões. Outra dica é contextualizarmos o que disseram os filósofos, relacionando ao que viviam como problemática de sua época. O que pensaram diz respeito às questões, aos problemas de suas respectivas realidades. Temos a tendência a ficar repetindo o que disseram, tentando encontrar respostas prontas na história da filosofia. O que podemos aprender com os filósofos não é reproduzir suas respostas, mas buscar caminhos para nossas necessidades, como eles buscaram para as deles. Última atualização em Qua, 04 de Junho de 2014 22:02
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