Epistemologia e dialética

June 7, 2017 | Autor: Gisiela Klein | Categoria: Epistemología, Dialética, Georges Gurvitch
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UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA – UDESC
CENTRO DE CIÊNCIAS DA ADMINISTRAÇÃO E SOCIOECÔNOMICAS – ESAG
PROGRAMA ACADÊMICO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO


Disciplina: Epistemologia da Ciência em Administração
Turma: Mestrado Acadêmico 2015
Professor: Mauricio C. Serafim
Discente: Gisiela Hasse Klein
Aula: Epistemologia e dialética
Obra estudada: GURVITCH, G. Dialética e Sociologia. São Paulo: Vértice, Editora Revista dos Tribunais, 1987.

Sobre o que é o livro?
O livro é dividido em duas partes. Na primeira, Gurvitch retoma as perspectivas dialéticas dos principais filósofos da história, iniciando por Platão, passando por Plotino, Kant, Fichte, Hegel, Proudhon, Marx e finalizando com Sartre.
Na segunda parte, o autor expõe seu próprio sistema dialético de compreensão do fenômeno humano. Gurvitch apresenta os três aspectos fundamentais da sua proposta, os procedimentos dialéticos operatórios necessários e finaliza apontando a dialética entre a sociologia e as outras ciências sociais.
Dialética e Sociologia foi publicado em 1961 e tem como base o conteúdo de um curso ministrado por Gurvitch na Universidade de Sorbone entre 1960 e 1961.

O que está sendo dito, de modo detalhado, e como está sendo dito?
A primeira parte do livro é um resgate das transformações históricas sofridas pela dialética. Aqui foram analisados os seguintes filósofos e suas perspectivas dialéticas: Platão, Plotino, Kant, Hegel e Marx. Em Platão, Gurvitch nos mostra que a dialética era tratada apenas como um método de apreender o todo e suas diversas partes simultaneamente. Platão desenvolveu, inclusive, um método para o método dialético estabelecendo até a idade mínima e o conhecimento prévio exigidos para a compressão da dialética. Platão acreditava que era possível alcançar o mundo inteligível das Ideias por meio da dialética. É o que Gurvitch chamou de dialética apologética e ascendente. Era a "saída da caverna" de Platão.
Já o filósofo Plotino explorou a dialética mística positiva, criando as etapas do movimento dialético conhecidas como hipóstases. Para Plotino, existiam quatro esferas – o Uno (transcendente), o Ser inteligível e a inteligência (como uma única coisa), a Alma e a matéria. Essas etapas são apresentadas nesta ordem de importância e a dialética é o método encontrado por Plotino para o trânsito entre essas fases. Essa visão foi retomada 150 anos mais tarde por Santo Agostinho.
A leitura que Gurvitch faz de Kant é bastante interessante. O filósofo alemão teria negado a dialética a tal ponto que levou seus sucessores a se ocuparem dela. Kant tentou provar que o método dialético é a fonte de todos os erros em filosofia, mas fez isso usando a própria dialética ao contrapor o fenomênico e o numênico. Para Gurvitch, sem a dialética, os erros seriam ainda maiores, como o dogmatismo.
Em Kant, as categorias do entendimento são aplicadas aos sentidos constituindo a experiência (construída) idêntica ao conhecimento válido do mundo sensível. Experimenta-se, então, uma necessidade de unificação do diverso, típico do conhecimento. Essa necessidade é satisfeita pela razão que tem o poder de ordenar. É a razão que dá unidade à experiência, mas também induz ao erro. Usar a razão para explicar o transcendente é dialético e para Kant isso é impossível. A dialética estaria baseada na pretensão da razão em ser constitutiva, ao passo que só pode ser reguladora. Kant se contradiz, no entanto, ao opor fenomênico e numênico.
O autor não poupa críticas a Hegel apontando um retorno à dialética emanantista de Plotino. Hegel teria desenvolvido uma dialética mística racionalizada ao propor um deus da cólera em oposição à humanidade. "Graças à dialética do espírito, a humanidade, a sociedade e o homem se unem de novo a Deus, depois de estarem alienados do mundo" (página 78).
Ao recuperar a dialética em Marx, Gurvitch se mostra bastante tolerante. Aponta suas críticas no sentido da incompletude, mas não como uma falha marxista. Marx tenta mostrar que a dialética é o próprio movimento da realidade econômica, social e histórica e, de maneira secundária, é um método. Tudo que corresponde à realidade humana é dialético – a dialética liga-se à prática social. O autor concorda com Marx quando este vê na dialética não apenas um método, mas a própria realidade. "Se o homem é, por natureza, social, só desenvolverá sua verdadeira natureza na sociedade" (página 120), contextualiza Marx ao explicar a relação do homem com o social. "O homem produz o homem, a si mesmo e ao outro homem" (pagina 121).
Na segunda parte do livro, nos deparamos com os três aspectos da dialética gurvitchiana: (1) a dialética enquanto domínio da realidade humana, (2) enquanto método e (3) enquanto uma relação entre método, realidade e o próprio objeto dialetizado. Ainda nesta parte, o autor explica o que pode parecer contraditório inicialmente: o termo hiperimpirismo dialético. Para Gurvitch, dialética e experiência são comuns quando ambas se vinculam ao humano. Além disso, as experiências são infinitamente variadas, com quadros de referência que se renovam sem cessar. "Essas experiências sempre mostram novas partidas e novas chegadas inesperadas. Toda experiência é dialética porque implica mediações" (páginas 178 e 179).
Por fim, o autor nos apresenta os cinco procedimentos dialéticos operatórios para a ciência do homem. Esses procedimentos são importantes porque complementam o resgate histórico feito no primeiro capítulo. Lá, cada filósofo explorou um procedimento apenas. Gurvitch propõe abarcar cinco. São eles: complementariedade, implicação dialética mútua, ambiguidade dialética, polarização dialética e reciprocidade de perspectivas.

O livro é verdadeiro? Todo ele ou somente parte dele?
Não tenho segurança intelectual para afirmar que o livro é todo verdadeiro porque não possuo conhecimento profundo dos filósofos citados no primeiro capítulo. Para aceitá-lo como totalmente verdadeiro, teria de realizar uma pesquisa aprofundada sobre cada um dos filósofos e suas perspectivas dialéticas. Só assim, poderia fazer uma ponderação sobre as colocações de Gurvitch.
Já a segunda parte do livro é coerente e posso toma-la como verdadeira, principalmente porque o sistema dialético apresentado poderia ser facilmente aplicado à complexa realidade social e, principalmente, à sociedade globalizada.
No entanto, acredito que a aplicação de tal sistema deve ser feita com cautela ou pode-se cair em um relativismo ou mesmo em um anarquismo. Na página 175, por exemplo, Gurvitch diz "o método dialético é um apelo à perpétua destruição dos sistemas em favor do aprofundamento sempre renovado dos problemas". Vejo aqui um passo para o anarquismo, principalmente se aplicado ao Direito como fez Gurvitch em sua sociologia do Direito. Já na página 174, Gurvitch coloca que "o homem torna dialético tudo que toca". Aqui, um passo para o relativismo: tudo em função do homem.

E então? Qual a importância do livro para mim?
Creio que é possível partir da dialética gurvitchiniana para analisar a sociedade em rede. A dificuldade dos estudos de sistemas em rede reside justamente no fato de ser impossível isolar os pontos ou "nós" da rede, já que cada movimento individual tem reflexo direto ou indireto em toda rede. Com o sistema proposto por Gurvitch poderíamos analisar as interações humanas em rede sem perder a essência do objeto, que é justamente o todo resultante das unidades. Provavelmente, voltarei a ler Manuel Castells com outras referências a partir de agora.

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