EROS E O ENSINO DE FILOSOFIA

June 1, 2017 | Autor: Samon Noyama | Categoria: Filosofia da Educação, Educação, Ensino de Filosofia, Byung-Chul Han
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Comunicação Oral

EROS E O ENSINO DE FILOSOFIA Samon Noyama1 Jéssica Felski Sokalski*2

Eixo Temático: A docência na escola e a formação de professores

Resumo: Este trabalho aborda uma questão que parece ser vital para a educação e formação do homem desde a Antiguidade grega, ou pelo menos desde o período que costumamos atribuir ao surgimento da filosofia grega, isto é, os séculos VI e V a.C. Desde então a linha tênue que separava a formação intelectual e os laços afetivos transformou-se em tema para a filosofia. De um modo geral podemos afirmar que um dos saldos mais interessantes e problemáticos dessa reflexão é a ideia de que há um espaço reservado para os afetos nos processos de formação cultural do homem, e que, mesmo no caso da filosofia e da ciência, esse espaço mantém-se de forma inegável. Trata-se, evidentemente, de um tema amplo e que deve ser pensado considerando-se as especificidades do período estudado e também, ocasionalmente, do que se entende pelos termos “educação” e “ensino” e como eles se articulam. Diferentemente na época de Sócrates e Platão, hoje o ensino e a educação formais se são num espaço exclusivo, o que chamamos de escola, colégio, universidade ou algo semelhante. Mas, para além disso, o que consideramos muito mais problemático é a condição do homem no século XXI. As inúmeras transformações porque passamos, e especialmente a chamada revolução tecnológica, alterou de forma profunda a condução das atividades que dependem ou exigem a comunicação pessoal e, por conseguinte, as relações afetivas, sejam elas decorrentes do ambiente de trabalho, social ou mesmo no âmbito familiar. O filósofo Byung-Chul Han vem publicando nos últimos anos uma série de livros dedicados a estudar a constituição patológica do homem contemporâneo e sua relação com a economia, a política e tecnologia. Nós, no rastro de Han, vamos partir das suas reflexões e do panorama que ele apresenta sobre os vínculos dessas patologias com as deliberações políticas e econômicas em escala global para discutir como essa condição pode afetar o ensino de filosofia, ainda mais se lembrarmos que se trata de um tema ainda pouco

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explorado, visto que não chega a completar uma década que essa disciplina voltou aos currículos brasileiros. Palavras-chave: Ensino de filosofia; Byung-Chul Han; Eros.

Introdução Na Teogonia de Hesíodo Eros aparece como um deus primordial filho do Caos. Mas também aparece como um deus olímpico, filho de Afrodite. Na filosofia, sua aparição mais famosa é no diálogo Banquete, de Platão. Na ocasião, lembrada com extrema habilidade e beleza pelo filósofo, Eros é definido através de diferentes perspectivas até que, ao final da celebração, é Sócrates que dá contornos finais à definição do deus, inspirado por uma deusa, Diotima. Ainda na filosofia, é muito contundente o trabalho de Herbet Marcuse em Eros e cilivização. São bastante conhecidas também as associações feitas no campo da psicanálise, especialmente por Freud. O presente trabalho é uma investigação sobre o problema dos afetos no mundo contemporâneo e suas reverberações na prática docente, considerando os afetos como uma questão existencial e que toca os indivíduos e interfere na construção do conhecimento da sala de aula. A pesquisa é inteiramente teórica e reflexiva, tendo principal autor a ser trabalhado o filósofo germano-coreano Byung-Chul Han, e duas de suas obras: A sociedade da transparência e A agonia de Eros.

Desenvolvimento O filósofo germano-coreano Byung-Chul Han apresenta, na sua obra A sociedade do cansaço (2010), uma tese perturbadora para aqueles que, de alguma forma, tem interesse em compreender os mecanismos que vem determinando o modo de vida na contemporaneidade e seus reflexos nas mais diversas atividades da vida cotidiana, especialmente as ligadas à educação. Admitindo a ideia de que cada época vive uma epidemia patológica específica, como se houvesse um amálgama entre o modo de vida de uma determinada época de uma sociedade e suas doenças mais recorrentes, Han sustenta que a sociedade contemporânea vive uma epidemia neuropatológica. Já passamos por uma epidemia bacteriológica e uma viral, combatidas por vacinas e antibióticos que funcionaram a partir de um mecanismo semelhante: enfrentar um estranho, algo diferente que acometeu o sistema orgânico e que pedia uma substância capaz de expulsar este outro, no caso, a patologia. Trata-se, nesses dois casos, de uma estratégia de guerra: identificar o corpo estranho, combater o invasor, expulsar o elemento e, dessa forma, recuperar a sanidade do corpo e devolver sua saúde. Esta nova epidemia, porém, representa um estado de coisas muito diferente dos anteriores, caracterizado especialmente por uma invisibilidade ou eliminação do “corpo estranho”. Neste caso, há uma tentativa de negar o estranho, o invasor, o elemento a ser perseguido e combatido. Para evitar o enfrentamento, optamos por dar invisibilidade ao “outro”, através de uma homogeneização e padronização do mundo, isto é, de um processo de unificação por identidade. Embora a discussão proposta pelo filósofo não se refira especificamente ao tema da educação, não podemos ignorar o fato de que buscar compreender as razões que vem determinando nosso modo de vida é uma das funções vitais para os profissionais da educação, porque estamos nós mesmos engendrados nesse sistema muitas vezes sem tomar

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ciência dos motivos que interferem no nosso comportamento e modo de pensar. Aproximemo-nos de duas outras obras do autor que podem nos conduzir nessa investigação: A agonia de Eros (2012) e A sociedade da transparência (2012). Se reunirmos essas reflexões do autor veremos que ele trata dos problemas da vida contemporânea, que se mostra transparente no sentido de negação, de uma positividade exacerbada pautada no esgotamento da negatividade. É uma sociedade uniformizadora, que transforma tudo o que possa ser negativo em positivo, eliminando o olhar e a reflexão sobre o outro, abolindo aquilo que é estranho e diferente. A sociedade positiva, ou ilusão de que ela é positiva manifesta-se no individuo através da aparência. Segundo Han, as coisas tornam-se transparentes quando se exprimem através dos preços e se despojam da sua singularidade. Não há mais convívio em comunidade, apenas aglomerações de indivíduos que são incapazes de agir e pensar uma ação em conjunto. Esse tempo transparente é destituído de destino e de todo acontecimento, as coisas não possuem mais singularidade, a sociedade da transparência é a sociedade da pornografia, que sugere um excesso de acesso, um olhar direto da imagem com o olho, não há a autonomia de olhar o outro demoradamente. As relações transparentes são relações mortas, pois faltam atração e vitalidade. O primeiro capítulo de A agonia de Eros começa com a seguinte afirmação: Nos tempos recentes se proclamou com frequência o fim do amor. Pensa-se que hoje o amor perece pela ilimitada liberdade de escolha, pelas numerosas opções e pela coação do ótimo e que, em um mundo de possibilidades ilimitadas, não é possível o amor. (2014, 9) 3

Na direção contrária do estabelecimento de uma cultura erótica, ainda baseada na composição grega de uma fusão dos contrários, a cultura contemporânea trabalha arduamente no sentido de sustentar uma visão de mundo sem a presença incômoda do outro. É bem verdade que, mesmo naquela ideia grega, esse Eros resultante de uma fusão de contrários trazia à tona as contradições, diferenças, dificuldade de compreensão e instabilidade próprias de uma cultura híbrida, marcada pelo agon, pelo jogo, pela disputa e pelo pathos. Ao refletir sobre a realidade percebe-se que ao longo do tempo o amor perdeu espaço na vida dos indivíduos. Han nos lembra de uma afirmação de Eva Illouz para falar do desaparecimento do outro, e o quão catastrófico isso tem se mostrado para o homem nos dias de hoje. O amor perece pelas múltiplas possibilidades de escolha que o indivíduo dispõe, pois a multiplicidade de oferta “dos outros” faz com que o amor perca espaço na vida cotidiana. O amor ou qualquer forma menos superficial de troca de afetos se torna impossível nesse ritmo de vida desenfreada onde o capitalismo e a tecnologia ocuparam se não toda a vida humana parte dela. Além da oferta excessiva de possibilidades de escolha, há a problemática do eu que se relaciona com esse outro, pois ele agora é um produto de consumo, é procurado como solução para carências e necessidades supérfluas. O outro interessa na medida em que pode oferecer-se como uma solução, quando pode ser proveitoso. Contudo, quando surge a impossibilidade dessa completude pela imposição de um limite, uma negativa, o sujeito desejante se retrai e entende esse “não” como um fracasso, uma derrota, porque o sujeito não é capaz de reconhecer o outro na sua alteridade, nem de o reconhecer na alteridade. Trata-se de um mundo no qual o indivíduo se sente perdido em relação a si e aos outros, porque a sociedade positiva que otimiza tudo (inclusive o ser humano) estabelece 3

Tradução livre do autor. A edição utilizada está em língua espanhola.

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uma barreira invisível entre o eu e o outro, tornando uma relação impossível de ser construída. Se o outro é um objeto estranho e diferente, o que cabe fazer é o afastamento do diferente e daquilo que pode causar negatividade e, nesse sentido, abre espaço para pensarmos na morte de Eros. Mas seria possível afirmar isso? A morte não se dá de forma acidental, ela foi construída ao longo da história do mundo e da cultura ocidentais e, portanto, tem seus desdobramentos em várias fases porque passou o mundo ocidental. É fundamental lembrar que embora tenha sido construída ao longo dos últimos séculos, sua raiz mais próxima está no estabelecimento do sujeito moderno, burguês, ocidental e judaico-cristão. A ideia de pós modernidade se articula como período a partir do qual o projeto moderno europeu de sujeito é levado às últimas consequências. Isto significa que a primeira impressão é a de que este sujeito é livre efetivamente, mas trata-se de uma ilusão. Se o que nos leva à ideia de uma efetiva liberdade é a inexistência da relação senhor x escravo ou mesmo da luta de classes, como sugere o mundo contemporâneo, é urgente perceber que ele não o é. Adentramos numa fase de auto exploração, de uma exploração de si mesmo acompanhada do sentimento de liberdade e de não dominação. O amor passa a ser domesticado porque está ligado ao consumo e ao conforto e não ao sentimento, à paixão e até mesmo à dor, pois a sociedade positiva não admite sentimentos dessa natureza. Não há mais segredo ou sagrado, e tudo parece exposto como mercadoria. Tal valor da superexposição, nessa fase das redes sociais, o rosto vira produto, perde olhar, perde o brilho, é o rosto humano em forma de mercadoria. Han sustenta ainda que na sociedade da transparência o ser humano se transformou completamente em objeto de publicidade, no qual o excesso de exposição transforma tudo em mercadoria, do objeto de exposição o corpo vira um objeto de exploração, importa a beleza e boas condições físicas. Há uma necessidade de coagir o corpo através da superexposição e de subordinar o valor interior em valor exterior. Não há mais reflexão estética, pois o valor de exposição não requer contemplação e não exige o olhar cuidadoso. A transparência tira o encanto, proíbe a fantasia e nega o espaço para a imaginação. Nessa sociedade a pornografia é exaltada e é o que retrata a beleza sem mistério, o corpo fica desprovido de interioridade e de mistério, a pornografia retira o olhar contemplativo, e conduz a sociedade em um ambiente de espetáculo, onde a transparência é pobre. Há, por fim, um esgotamento do amor e dos demais afetos no mundo contemporâneo como sendo resultado de um sistema de produção capitalista que cada vez mais explora a força de trabalho dos homens, processo para o qual vem sendo cada vez mais necessário eliminar a construção e manutenção de laços afetivos. Essa nova sociedade de desempenho mostra como os afetos estão sendo eliminados por uma exigência de transparência no mundo contemporâneo, que vem provocando o desaparecimento dos grandes mistérios, das dúvidas e da relação do homem com o sagrado e o desconhecido. A sociedade é transparente no sentido de negação, de uma positividade exacerbada pautada no esgotamento da negatividade. É uma sociedade uniformizadora, que transforma tudo o que possa ser negativo em positivo, eliminando o olhar e a reflexão sobre o outro, abolindo aquilo que é estranho e diferente. A sociedade positiva, ou ilusão de que ela é positiva manifesta-se no individuo através da aparência. Segundo Han, as coisas tornam-se transparentes quando se exprimem através dos preços e se despojam da sua singularidade. Não há mais convívio em comunidade, apenas aglomerações de indivíduos que são incapazes de agir e pensar uma ação em conjunto. Esse tempo transparente é destituído de destino e de todo acontecimento, as coisas não possuem mais singularidade.

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A sociedade da transparência se revela em uma sociedade pornográfica, e não é o pornográfico virtual, é o excesso de acesso, é o contato direto da imagem com o olho, não há a autonomia de olhar o outro demoradamente, de comtemplar o rosto e notar os mistérios que nele se esconde. É uma beleza sem mistério, desprovido de interesse, pois a sociedade pornô é a sociedade do espetáculo, e o espetáculo revela tudo sem deixar espaço para o mistério, não há vontade em descobrir o que se esconde por trás do que está sendo visto, pois está tudo revelado através do espetáculo. Nesse sentido o espetáculo é pobre, pois é a vida humana que é esta sendo palco do espetáculo, é o individuo que esta se deixando ver por completo, com total transparência, não instigando mais o jogo do prazer e da descoberta, está dado. Não tem o que revelar, não tem o que contemplar, só há uma atração momentânea e o descarte na sequência. Não há vida. As relações transparentes são relações mortas, pois faltam atração e vitalidade. O amor passa a ser domesticado porque está ligado ao consumo e ao conforto e não ao sentimento a paixão e até mesmo a dor, pois a sociedade positiva não admite sofrimento e dor. As coisas perderam seu valor cultual, não há mais segredo ou sagrado, e as coisas são expostas como mercadorias. Os indivíduos tornaram-se mercadorias que precisam ser expostos a cada momento e vender suas imagens nos espaços virtuais. Nessa fase das redes sociais, há uma superexposição, o rosto vira produto, perde olhar, perde o brilho, é o rosto humano em forma de mercadoria. Como afirma o próprio Han: O rosto humano, com seu valor cultual, desapareceu já há bastante tempo da fotografia. A época do Facebook e do photoshop torna o rosto humano uma face que que se dissolve por completo no seu valor de exposição. A face é o rosto exposto sem a “aura do olhar”. É o rosto humano sob a forma de mercadoria. [...] A fotografia digital apaga toda a negatividade, uma vez que já não precisa nem da câmera escura nem da revelação. Não é precedida por negativo algum. É o positivo puro. Apagam-se o devir, o envelhecer, o morrer... (HAN, A sociedade da transparência, p.23)

Han sustenta ainda que na sociedade da transparência o ser humano se transformou completamente em objeto de publicidade, no qual o excesso de exposição transforma tudo em mercadoria, do objeto de exposição o corpo vira um objeto de exploração, importa a beleza e boas condições físicas. Há uma necessidade de coagir o corpo através da superexposição e de subordinar o valor interior em valor exterior. Não há mais reflexão estética, pois o valor de exposição não requer contemplação e não exige o olhar cuidadoso. A transparência tira o encanto, proíbe a fantasia e nega o espaço para a imaginação. A exposição do corpo leva o individuo a explora-lo, o corpo é coagido a estar sempre em boas condições físicas e possuir sempre beleza, tenta-se em vão não envelhecer, pois o corpo é mercadoria precisa estar exposto para que possa ser consumido, e essa exposição desmensurada e desnudamento sem limites faz com que se perca o prazer, “o prazer exposto diante dos olhos, deixa de ser prazer”, há uma alienação do próprio corpo, na tentativa incansável de não perder o valor de exposição do corpo, se perde o prazer, pois o prazer exige o oculto, o desvendar o mistério que está oculto para se chegar ao prazer. Afinal, A exposição pornográfica produz uma alienação do prazer sexual. Torna impossível experimentar o prazer. A sexualidade dissolve-se na execução feminina do prazer e na ostentação da capacidade masculina. O prazer exposto, posto diante dos olhos deixa de ser prazer. A coação da exposição

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conduz à alienação do próprio corpo. Este coisifica-se como um objeto de exposição que é necessário otimizar. Não é possível habita-lo. É preciso expô-lo, e desse modo explora-lo. A exposição é exploração. O imperativo da exposição aniquila o próprio habitar. (HAN, A sociedade da transparência, p.24)

A transparência, a superexposição que revela a pornografia leva a um esgotamento do amor e dos demais afetos, nesse sistema que estamos inseridos é cada vez mais urgente eliminar a construção e manutenção de laços afetivos por essa exigência de transparência no mundo contemporâneo, porém o que ocorre é um esvaziamento do ser humano, que o leva ao adoecimento. Apenas para não sugerir um edital de funerária, evitaremos afirmar que Eros está morto, e sim, em coma. A liberdade e a espontaneidade perdem espaço, o ser humano se transforma em máquina, tentando controlar seus sentimentos e minimizar possíveis dores que possam acontecer, o intuito dessa sociedade é tirar a cor, a vida, pois o transparente não tem cor, apenas comporta o conforto e apaga o desejos e as paixões.

Avaliação / Discussão dos resultados Essa nova sociedade de desempenho mostra como os afetos estão sendo eliminados por uma exigência de transparência no mundo contemporâneo, que vem provocando o desaparecimento dos grandes mistérios, das dúvidas e da relação do homem com o sagrado e o desconhecido. Essa sociedade que celebra a exploração do indivíduo por ele mesmo, num ritmo cada vez mais eficiente e alucinante, é marcada pelo registro recorde de patologias psíquicas e pelo adoecimento generalizado do homem. O mundo transparente é a morada de um homem que tem a impressão de conhecer tudo e dominar tudo a natureza através da técnica e da tecnologia. Han deixa claro que o desenvolvimento das ferramentas de eficiência do sistema de produção capitalista contribuiu e muito para a explosão das patologias psíquicas nas últimas duas ou três décadas, e que algumas dessas patologias, especialmente burnout e depressão, vem atingindo inegavelmente profissionais da saúde e da educação. Além disso, sabemos que a oscilação psíquica tem atingido jovens entre 15 e 25 anos de forma mais intensa e que, depois dessa idade, as patologias começam a regredir ou ficar menos agressivas. Portanto, trata-se de um problema que pode interferir no processo de estudantes do Ensino Médio, do Ensino Superior e, ainda, de jovens profissionais docentes recémformados. Nosso trabalho pretendeu analisar essas questões sobre dois aspectos fundamentais: primeiro, no que diz respeito aos efeitos dessa característica do mundo contemporâneo na constituição psíquica e na capacidade dos jovens de enfrentar esse problema, seja na condição de estudantes ou de profissionais; segundo, no que diz respeito ao existencialismo como tema da filosofia. O primeiro problema nos parece observável a partir de muitas contribuições, a começar pelos índices de suicídio entre jovens, pela crescente dificuldade em escolher uma profissão ou mesmo um curso de ensino superior, além dos dados assustadores de diagnósticos das neuropatologias que alcançam um percentual perturbador entre os nossos jovens. Não significa dizer que a depressão é um problema meramente psicológico tampouco admitir que ele não seja um distúrbio neurológico, mas sim, expandir a capacidade de fazer esses diagnósticos entendendo que a depressão está intimamente ligada a uma perda de referências seguras, de ausência de afeto na infância e de insegurança. Mas não queremos sugerir insegurança no sentido de dizer que uma criança segura se tornará um adolescente capaz de fazer suas escolhas e não errar. Excluir a

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dimensão do erro é justamente um processo decorrente do que se pensa sobre esse sujeito contemporâneo livre de alto desempenho. Queremos apenas chamar atenção para a importância de reconhecer e incorporação o erro, o fracasso, a incompletude. Reconhecer que não podemos pensar a juventude como um processo de desempenho, e de que a educação pode se restringir a avaliar capacidades de desempenhos, sobretudo se voltados para o mercado de trabalho. A formação é um processo muito mais sério, complexo e comprometido com a criação de laços afetivos para que cada sujeito possa construir sua história, repleta de erros e acertos que não são em si mesmos importantes. Não pretendemos esgotar as discussões sobre esses temas até porque elas engendram outras discussões extremamente importantes, tanto do ponto de vista dos conteúdos de disciplinas quanto em relação à tratamento psicoterapêuticos, mas acreditamos ser possível fazer algumas considerações sobre os desafios a serem enfrentados e, especialmente, defender a ideia de que é urgente e necessário pensar tais problemas a partir da filosofia.

Referências

FREUD, Sigmund. O mal-estar na civilização. Traduçãod e Paulo César de Souza. SP: Companhia das Letras, 2010. HAN, Byung-Chul. La agonia de Eros. Traducción de Raúl Gabás. Barcelona: Herder, 2014. ____. A sociedade da transparência. Tradução de Miguel Pereira. Lisboa: Relógio d’água, 2014. ____. A sociedade do cansaço. Tradução de Enio Giachini. Petrópolis: Vozes, 2015. HESÍODO. Obras y fragmentos. Traducción de A. Jiménez y A. Díaz. Madrid: Gredos, 1982. MARCUSE, Herbert. Eros e civilização. Tradução de Álvaro Cabral. RJ: Zahar, 1968. PLATÃO. O banquete. Tradução de Carlos Alberto Nunes. Belém: UFPA, 2011.

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