Espaços e Sociabilidades na Curitiba da Joaquim

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ESPAÇOS E SOCIABILIDADES NA CURITIBA DA JOAQUIM Gabriel Elysio Maia Braga – [email protected] UFPR – Reitoria Profª Drª Renata Senna Garraffoni - [email protected] UFPR – Reitoria

Resumo: No decorrer do ano de 2012 os integrantes do PET História desenvolveram, coletivamente, a pesquisa intitulada “Literatura e Sociabilidade na Curitiba de Dalton Trevisan”. Para tal, foram utilizadas como principal objeto de estudo as edições da Revista Joaquim, editada e idealizada por Dalton Trevisan entre os anos de 1946 e 1948. O objetivo do grupo foi observar qual era o conteúdo exposto na revista, assim como o posicionamento que seus contribuintes assumiam perante os diferentes pensamentos circulantes na época e como essas relações articulavam-se ao contexto político e social da cidade de Curitiba. Alguns temas se sobressaíram, por isso o grupo se subdividiu em três, para que os diferentes aspectos levantados pudessem ser trabalhados. Pode-se concluir que a Joaquim constituiu veículo importante de crítica à sociedade conservadora curitibana, fosse por meio da exibição de contos e ilustrações que retratavam a cidade de forma não idealizada ou a partir dos textos que evidenciavam uma oposição às ideologias paranista e simbolista, bastante presentes na cidade. Além disso, pode-se observar na revista uma notável preocupação em quebrar as barreiras do provincianismo e inserir a cidade de Curitiba em um contexto mais amplo e mundial, o qual englobava uma dura realidade Pós-Guerra e os projetos de modernização para o Brasil. Palavras Chave: Revista Joaquim. Dalton Trevisan. Curitiba dos anos 1940.

No ano de 2012, o PET-História deu continuidade aos estudos envolvendo literatura e movimento literário, que já haviam sido desenvolvidos no ano anterior, na pesquisa acerca da contracultura na geração beat. Dessa vez, abordamos o tema “Espaços e sociabilidades da Curitiba de Dalton Trevisan”, tendo como fonte primária a revista Joaquim, na qual, Trevisan, foi editor-geral desde sua fundação, em 1946, até a sua última edição, em 1948. A revista funcionava numa gráfica da família de Dalton, na Rua Emiliano Perneta. Suas edições contaram com a colaboração de escritores e artistas paranaenses da época, como Wilson Martins, Poty Lazarotto, Erasmo Pilotto e Antônio Walger. Nas suas páginas podem ser contemplados poemas – originais e traduzidos –, gravuras, artigos jornalísticos, críticas literárias e ensaios, sempre seguindo uma temática modernista, que visava contestar os padrões provincianos da arte do estado, que eram promovidos pela sociedade paranista e grandes figuras do simbolismo do Paraná, cujo maior nome foi Emiliano Perneta. A revista procura trazer discussões de âmbito mundial à população, em especial aos moços, essa geração do pós-guerra, a qual adquiriu grande aversão ao conflito, colocando a responsabilidade dos fatos ocorridos na geração que a precedeu. Esse âmbito mundial também aparece com o intuito de aproximar a província do resto do mundo. Iniciamos a pesquisa com uma análise bibliográfica a partir dos trabalhos de Roberto Nicolatto (2002) e Miguel Sanches Neto (1998), que já exploraram o universo do autor curitibano em teses e artigos. Foi por sugestão de um exintegrante do grupo, Sérgio Rabelo, que decidimos focar utilizar revista Joaquim

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como fonte. Suas edições podem ser encontradas em versão fac-similar na Biblioteca Pública do Paraná. Após leitura e análise dos 21 volumes que compõem a revista, alguns objetos de estudos foram levantados, pois demonstravam diferentes formas de perceber a Curitiba da década de 1940. Nossa metodologia, então, foi a de dividir a equipe em subgrupos, cada qual com um objeto de estudo diferente: uma equipe destinada às propagandas da revista, outra à percepção da II Guerra Mundial pelos autores e seus reflexos na filosofia e no estilo artístico e uma última à representação da marginalidade urbana nos contos. O primeiro grupo, focado nos anúncios comerciais, contou com grande quantidade de material de estudo, já que o leque de produtos e serviços promovidos pela revista era bastante amplo. Roupas, produtos de higiene e saúde, livrarias, papelarias, serviços de médicos e advogados, joalherias. A análise destes itens gerou um levantamento de suas ocorrências, identificando assim, o número total de estabelecimentos e sua frequência ao longo das edições. Este subgrupo dividiu-se em três duplas, uma para os anúncios de estabelecimentos comerciais, outra para os de saúde, e a terceira destinada a explorar a relação da revista com a Universidade do Paraná, uma vez que era significativo o número de médicos e advogados, vinculados à universidade, que anunciavam na revista, além do forte apelo aos estudantes evidenciado em diversos anúncios. Esse método nos possibilitou resultados interessantes. Ao se analisar as propagandas médicas e farmacêuticas, por exemplo, é curioso notar a sua concisão, já que muitas vezes elas contam apenas com o nome do profissional. Para entendermos as transformações da saúde nessa época, foi consultado o livro A Saúde em Frascos: concepções de Saúde, Doença e Cura. Curitiba (1930/45), de Renata Sigolo. Também foram feitas comparações com anúncios de mesma espécie em outros periódicos, como a Gazeta do Povo, jornal que possuía a maior circulação na época, e o jornal da Associação Médica do Paraná. Assim, muito pôde ser depreendido sobre o avanço dos medicamentos industrializados na cidade e a importância da saúde feminina, que sempre era objeto de destaque, já que nela repousava a felicidade conjugal. Em relação à universidade, a pesquisa também nos levou a buscar outras fontes, como os anuários dos anos de 1946 e 1947, referentes aos dois últimos anos de Dalton Trevisan na Faculdade de Direito; e a Revista Logos, publicação acadêmica da Faculdade de Filosofia, nessa documentação, não só foi possível descobrir influências de Dalton na Universidade, com os professores Erasmo Pilotto e Enéas Marques, como também identificar com precisão o lugar do discurso provinciano e conservador combatido pelos intelectuais da revista Joaquim, presentes nos discursos dos professores Homero de Barros e Francisco de Paula Soares. Era grande a quantidade de matérias e menções à guerra, por isso foi designado um subgrupo para este assunto, também foi importante incumbi-lo de analisar a influência da literatura do pós-guerra no pensamento modernista da Joaquim, já que o mundo ocidental como um todo estava passando por revisões em sua cultura. É bastante frequente nos textos a referência a corpos e aos campos de concentração, alusões a uma morte coletiva. Em entrevista a Joaquim, Poty, após voltar de uma viagem a Paris, confessa que os vestígios da guerra ainda estavam presentes em toda parte, mas o que lhe importava era o impacto no campo artístico, sendo ainda difícil para ele discernir o que seria um quadro do pós-guerra. Uma das características mais marcantes desse mundo que emergiu das cinzas do grande confronto foi uma nova esperança de mudança e revolução, que, como afirmou Eric Hobsbawn (1995), passou a ser depositada nos jovens, principais protagonistas do

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século XX. Os intelectuais da Joaquim, seguindo a linha desse movimento, tentaram romper com o velho pensamento da província, enaltecendo a juventude e valorizando artistas estrangeiros, numa tentativa de aproximar os moços de Curitiba dos de Paris e Moscou. A ideia da guerra como um marco divisório pode ser percebida nesse discurso, que encarregava a “geração da guerra” a responsabilidade de apontar novos rumos para a humanidade e não deixar que os mesmos erros se repitam. Toda a angústia desses tempos refletiu em uma nova abordagem filosófica, cuja maior tendência consistia no existencialismo. Vários textos de Sartre e Kafka, entre muitos outros, podem ser lidos nas páginas da revista, confirmando a vontade dos editores de sentirem-se próximos do que estava sendo produzido na Europa. Por fim, o último subgrupo ficou encarregado de analisar a representação da marginalidade e os contos da revista. Todas as edições da Joaquim contavam com um ou dois contos em sua composição, em sendo a maioria de autoria de Dalton Trevisan. É importante notar que a alegria e o amor, num sentido positivo, são temas raros nos contos de Trevisan. Quase sempre prevalecem a dor e o sofrimento. Ao analisar os contos do autor, o subgrupo tratou especificamente de um tema: o espaço, pois observamos ser um tema recorrente e de presença relevante nos contos da revista. Com base na ideia de topoanálise, desenvolvida por Ozíres Borges Filho (2008), que consiste nas inferências sociológicas, filosóficas e estruturais no âmbito íntimo e social do espaço, este subgrupo buscou analisar o significado que os lugares representados possuíam nas obras do autor. Parece-nos ter sido importante para Trevisan a descrição da cidade e da sociedade Curitibana. Na tese de Nicolatto (2002), por exemplo, há a apresentação do escritor como uma espécie de flâneur. Em muitos de seus contos são representados lugares reconhecíveis de Curitiba Entre os vários tipos de espaço apresentados, destacaram se o bar e a igreja, considerados ambientes antagônicos em seus significados. Tanto significado para as narrativas,nos leva a concluir que esses espaços possuíam de fato algum significado social mas que possuíam em comum a proximidade com o cotidiano dos personagens. No sentido de apreender todas essas questões, a metodologia acabou mostrando-se muito positiva, visto que o uso de revista e periódicos em geral como fonte histórica, sempre traz uma grande possibilidade de observações.Sob vários pontos de vistas diferentes, seja do comércio, da literatura, da filosofia, da saúde ou da educação, a equipe percebeu que a revista Joaquim era testemunha de uma cidade em transformação, onde jovens buscam seu espaço frente aos mais velhos, e novas tendências encontram o seu caminho em meio a vielas da tradição. Além disso, também constatamos que a própria revista acaba por tornar-se uma pequena reprodução do espaço sentimental de seus autores, possibilitando-nos traçar um mapa sentimental da cidade. Referências: Fontes: Revista Joaquim, Curitiba 1946-1948, 21 volumes editados por Dalton Trevisan. Bibliografia

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BORGES, Ozíres. Espaço e literature: introdução a topoanálise. In: Anais do XI congresso internacional da ABRALIC. São Paulo: 2008. P. 1 Disponível em: http://www.abralic.org.br/anais/cong2008/AnaisOnline/simposios/pdf/067/OZIRIS_FIL HO.pdf Acessado em 4/4/13, 18:35. HOBSBAWM, Eric. Era dos Extremos: o breve século XX – 1914-1191. Trad. Marcos Santarrita. São Paulo: Companhia das Letras, 1995 NICOLATO, Roberto. Literatura e cidade - O universo urbano em Dalton Trevisan.(Dissertação Mestrado em Letras). Universidade Federal do Paraná, UFPR, 2002. SANCHES NETO, Miguel. A reinvenção da província: a revista Joaquim e o espaço de estréia de Dalton Trevisan. Campinas, 1998. Tese (Doutorado em Teoria Literária) – Instituto de Estudos da Linguagem, Unicamp, Campinas, 1998. SIGOLO, R. P. A Saúde em Frascos: concepções de Saúde, Doença e Cura. Curitiba (1930/45). 1. ed. Curitiba: Aos Quatro Ventos, 1998

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