Esta \"Libéria Portuguesa\": mudanças políticas e conflitos sociais na Guiné (1910-1920), in: Philip J. Havik, Clara Saraiva & José Alberto Tavim (eds.) Caminhos Cruzados em História e Antropologia: ensaios em homenagem a Jill Dias, Lisbon: Instituto de Ciências Sociais (ICS), 2010: 123-41.

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Philip J. Havik

Capítulo 6

Esta «Libéria Portuguesa»: mudanças políticas e conflitos sociais na Guiné (1910-1920) A Guiné numa encruzilhada: entre a pacificação militar e a agitação política Após os primeiros contactos feitos no século XV na costa da Guiné, verificou-se um rápido incremento do comércio de produtos e escravos na região. Mas a competição das nações europeias rivais e a oposição interna por parte das populações nativas levaram a uma diminuição do interesse português na sua exploração a partir do século XVII. Tanto o clima tropical como a influência dos filhos da terra cuja influência aumentou consideravelmente a partir do século XVII, foram vistos como uma ameaça à presença europeia na zona. Apesar de a introdução no século XIX de culturas de renda, como o amendoim ou mankara, ter levado alguns a considerar a Guiné um «novo Brasil», este entusiasmo foi de pouca dura.1 A rápida expansão da produção de amendoim foi de pouca dura, quando a queda das cotações de mankara e as guerras entre sociedades africanas no território resultaram no abandono de explorações agrícolas, as chamadas pontas, no último quartel de Oitocentos. A intervenção dos governantes portugueses nestes conflitos regionais foi duramente criticada por ter contribuído para a instabilidade na região e a perda de oportunidades de negócio por parte de casas de comércio, muitas das quais estrangeiras.2 A intensificação de intervenções militares nas últimas décadas de Oitocentos na Senegâmbia e o falhanço desta política que no caso português não se traduziu em ganhos territoriais levou observadores in loco, principalmente oficiais militares e comerciantes, a afirmar que a «guerra aos gentios 1 Ver Philip J. Havik. Silences and Soundbytes: the gendered dynamics of trade and brokerage in the precolonial Guinea Bissau region (Muenster/New Brunswick, LIT/Transaction Publishers, 2004), 289-99. 2 Ver C. J. de Senna Barcellos. Memória (Lisboa: Typographia da Cooperativa Militar, 1908), 4.

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de todas as raças» se tinha tornado «moda». A «situação pouco desafogada» da Guiné em relação às colónias francesas e inglesas explicava-se segundo eles «nas guerras constantes, provocadas pelas autoridades que deviam imitar a política seguida pelos nossos vizinhos estrangeiros».3 A Guiné tinha sido um «sorvedouro de vidas e de dinheiro, um pesadelo do orçamento e uma ameaça constante de perturbações a que nem sempre tinham sido alheias as imprudências dos nossos e mais de uma guerra tem nascido de causas inconfessáveis».4 Enquanto uns sugeriram que Portugal alienasse o domínio da Guiné por este ser meramente fictício,5 outros não menos críticos atribuíram essas opiniões a uma «seita de oportunistas», avisando que Portugal teria que recuperar o seu prestígio.6 Não eram seguramente alheios a este pessimismo os constantes avanços e recuos das campanhas militares que subestimaram a resistência africana, de tal modo que levaram ao «maior desastre português» às portas de Bissau, o centro comercial do território, sofrido pela tropa metropolitana e auxiliares africanos em 1891.7 Neste situação, o patriotismo regenerado a seguir ao Ultimato inglês não hesitou em lamentar a (in)acção governativa e denunciar o carácter «despótico» desta, que ignorava por completo as «reclamações dos subordinados», deixando um «marasmo de indiferenças e desânimos».8 No meio reinava «a intriga e as prepotências» que resultaram em «vinganças mesquinhas» e «acusações inquisitoriais» e, por conseguinte, tudo tinha caído na «dissolução e rebaixamento moral». O «militarismo de exportação» tinha contribuído para «administrações ineptas, favoritismos escandalosos e guerras irrisórias».9 Concluiu-se que para sair desta «decadência política» seria preciso «reorganizar tudo [...] antes que as nações poderosas se [fossem] apoderando impunemente do que nos pertence».10 Muitos viram a mão de países coloniais vizinhos como a França que alegadamente tentaram aproveitar o manifesto vazio do poder para desenvolver os seus interesses na região.11 Na primeira década do século XX, países como a França e a Inglaterra não viram de bons olhos a situação na Guiné Portuguesa. A incapacidade portuguesa de «pacificar» um território cujas fronteiras ficaram delineadas na conferência de Berlim (1884-1885) e no tratado com a França em 1886, levou a França e a Inglaterra a

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Ver Senna Barcellos, Memória..., 4, 6. D. Francisco Ferreira da Silva «Na Guiné», in Diocese de Cabo Verde: Apontamento para a História da Diocese e da Organização do Seminário Liceu (Lisboa, 1899), 94. 5 D. Francisco Ferreira da Silva. Apreciações (Coimbra, 1891), 31. 6 J. A. Martins. Madeira, Cabo Verde e Guiné (Lisboa, 1891), 264. 7 Em sucessivos confrontos, os Pepel de Intim e Bandim na ilha de Bissau infligiram grandes perdas ao lado português. Ver René Pélissier. Naissance de la Guiné: Portugais et Africains en Sénégambie (1841-1936) (Orgeval, ed. do autor, 1989), 198-205. 8 Martins, Madeira..., 252. 9 Martins, Madeira..., 257. 10 Martins., Madeira..., 269/70. 11 E. J. da Costa Oliveira. Viagem a Guiné Portugueza (Lisboa: Imprensa Nacional, 1890), 48. 4

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considerarem a sua anexação ou compra como a melhor das soluções.12 Observadores admiraram-se bastante com o facto de uma terra potencialmente rica estar a sofrer um «decréscimo económico», visto que o governo não incentivava o comércio e criava obstáculos que levaram populações a retirarem-se para o interior ou para os territórios vizinhos.13 Porém, estas preocupações tinham mais a ver com a fuga de populações rebeldes do Senegal e da Guiné para a colónia portuguesa vizinha, além do tráfico de armas e a continuação da escravatura. As várias missões luso-francesas de delimitação das fronteiras a seguir ao tratado de 1886 evidenciaram a continuada falta de controlo e de conhecimento das zonas limítrofes por parte das autoridades portuguesas.14 Num estudo sobre a situação no território, um oficial que fez parte da missão francesa referiu «a anarquia quase completa que reina na Guiné por causa da falta de poder das autoridades locais para impor a sua vontade».15 E apontava para o facto de faltarem tropas regulares formadas por nativos, não tendo a Guiné o equivalente aos tirailleurs senegaleses. Os interesses da Guiné Portuguesa são vistos por este oficial como «inseparáveis daqueles da África Ocidental Francesa (AOF) em tudo que tem a ver com pacificação do indígena, a valorização da colónia e a sua exploração comercial». As autoridades inglesas não se mostraram menos preocupadas com a incapacidade do governo português de dominar os nativos, que responderam com uma atitude hostil e de desprezo. Esquecidos pela metrópole, os governos nunca chegaram a acabar as campanhas, que nunca tiveram resultados duradouros. A inoperância dos governos também permitiu que a escravatura doméstica continuasse, enquanto o comércio se fazia de forma clandestina. Por estas razões a Guiné era, na opinião das autoridades inglesas, a colónia com a pior administração na África a seguir à Libéria.16 Críticas semelhantes também se fizeram ouvir por militares portugueses que, indo para a Guiné, ficaram chocados com o estado das coisas. «A província está votada ao mais completo, ao mais absoluto desprezo, ao maior abandono; nunca supus que possuíssemos uma colónia em condições tão desgraçadas».17 Nas impressões deste oficial que participou nalgumas campanhas na Guiné ficaram bem patentes o «horror [...] de ver como se acabam abandonadas as [...] riquezas coloniais».18 «De que servem porém tão ricas colónias nas mãos de tão 12 C. Madrolle. Notes d’un Voyage en Afrique Occidentale: de la Casamance en Guinée par le Futah Djallon (Paris: Librarie Le Soudier, 1894). 13 M. J. Étienne Giraud. La Guinée Portugaise, Bulletin de la Societé de Géographie de Marseille, XXIX, 2 (1905): 229. 14 Ver sobre a delimitação das fronteiras norte da Guiné, na região da Casamansa, Maria Luísa Esteves, A Questão da Casamansa e a Delimitação das Fronteiras da Guiné (Lisboa: IICT/INEP, 1988). 15 Paul Brocard, «Étude sommaire de la situation de la Guinée Portugaise vis à vis de l’AOF», 5-5-1909; CAOM, ANS, 579. 16 Braithwaite Wallis, 16-1-1913, para Foreign Office, Londres; Public Record Office/National Archives, FO, 376/342. 17 L. Nunez da Ponte. A Campanha da Guiné (1908): Breve Narrativa (Porto: Typographia Guedes, 1909), 23. 18 Nunez da Ponte, A Campanha..., 55.

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inaptos colonizadores?» – perguntou indignado, ao constatar que a Guiné nem sequer se podia chamar uma colónia.19 Num sinal dos conflitos que se avizinhavam, a sua indignação também se estendia à questão da cor, ao deparar com a «impressão tristíssima» de ver misturados «brancos e pretos, o que vai ferir os mais elementares princípios da diplomacia cafreal, em que o branco é sempre superior ao preto».20 Governadores recém-chegados denunciaram «o estado de abandono» do território, além da má política indígena prosseguida e da falta de ocupação militar que tinham dado lugar a «um movimento de rebelião que ameaçava absorver toda a província».21 Na medida em que as autoridades militares «não tinham o tacto político nem a paciência de lidarem diariamente com populações atrasadas em civilização, a tendência para o autoritarismo era a consequência natural desta militarização da qual não resultam benefícios para a boa administração».22 As sucessivas campanhas militares fizeram também com que as tensões internas na Guiné se agravassem de tal modo que vários agrupamentos e facções políticas contestaram a condução da guerra e as prioridades do governo e da metrópole. A queda da monarquia em Portugal e a chegada dos ventos republicanos à Guiné contribuíram para aumentar os conflitos e as incertezas sobre o rumo a seguir. As petições e diatribes lançadas por uma oposição de carácter republicano contra os governadores nomeados por Lisboa tornam-se no entanto cada vez mais frequentes, ainda na era da monarquia. Uma série de casos são expostos em libelos acusatórios para ilustrar os prejuízos causados pelas políticas seguidas por alguns governadores, descritos como «padrinhos», cujas intervenções foram baseadas em «prepotências», «abusos», «ódios» e «caprichos», e qualificados como «crimes».23 No novo quadro político do regime republicano, as campanhas para eleger deputados, facções e partidos foram lançados enquanto os ânimos exaltados faziam correr muita tinta. A Guiné precisava de «um governo paternal e democrata», e de «progresso de justiça», apelando à metrópole para nomear magistrados «retintamente republicanos de reconhecida probidade cívica em vez de «politiqueiros monárquicos», que favoreceriam os seus próprios interesses.24 No entanto, a ignorância acerca da Guiné associada à sua má fama continuaram a dominar nos meios metropolitanos onde foi vista como uma terra doentia e inóspita, «um cemitério dos Europeus» e uma terra de degredo para estes e para os cabo-verdianos, de tal modo que, uma vez nomeado um funcionário necessário, este «procurava por todos os meios a sua imediata transfe19

Nunez da Ponte, A Campanha..., 101. Nunez da Ponte, A Campanha..., 20. 21 Oliveira Muzanty, Bolama, 28-8-1908, para Ministério da Marinha e Ultramar, Lisboa; AHU, DGU, Guiné, Repartição Militar, cx. 6. 22 Carlos de Almeida Pessanha, Bolama, 12-3-1905, para Ministério da Marinha e do Ultramar; AHU, Fundo do Governo da Guiné (FGG), livro 145. 23 Monteiro de Macedo, Acudam a Guiné..., 7. 24 Barros, Pela Guiné, 12. 20

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rência».25 O mesmo pessimismo se associava aos desaires das campanhas militares, por estas serem essencialmente expedições punitivas contra chefes nativos rebeldes. Quando as tropas se retiravam, os habitantes regressavam às suas aldeias para reconstruírem as suas casas queimadas. «Enfim passados meia dúzia de meses, está tudo como dantes, senão pior».26 Além disso, o treino incompleto dos recrutas e o deficiente material de guerra impediram um entrave às campanhas.27 Se a Guiné era pouco apreciada em Portugal também era malvista pelos funcionários e oficiais militares ali colocados.28 Em termos financeiros, um governador da época considerou que a Guiné ficaria ainda por muito tempo um encargo, apesar de ter recursos que lhe permitiriam ser autónoma em termos financeiros.29 Este magistrado confessou que «a falta de fiscalização efectiva» permitiu casas comerciais de «estabelecer sucursais no interior da província sem pagar foros e sem ter títulos de posse». O governo metropolitano tinha de tomar uma decisão: se queria colónias devia ocupá-las, senão seria melhor abandoná-las.30 O impacto da guerra também se fez sentir no comércio dominado naquela época por casas alemãs e francesas, e pelos intermediários locais, compostos por cabo-verdianos, libaneses, sírios, e filhos da terra. A guerra contínua causou uma diminuição da exportação de borracha, amendoim e noz de palmeira, cuja produção estagnou, aumentando ainda mais o défice que já tinha crescido devido aos custos das campanhas militares e a «militarite aguda» que tinha infectado os governantes.31 Porém, governadores e militares tinham uma outra justificação, nomeadamente que as dificuldades financeiras foram agravadas «pelo estado de revolta latente em que durante bastante tempo se mantém a maior parte da província». Alguns governadores não hesitaram em criticar a atitude do comércio local, que defendia com unhas e dentes, o seu papel de intermediário. Segundo os governantes convinha «a todos os comerciantes manter as suas relações com os indígenas, e conservá-los afastados o mais possível das autoridades, para os explorarem à sua vontade».32 25 Francelino Pimentel, governador, Bolama, 29-11-1909, para MMU; AHU, FGG, 177. O desconhecimento era tal, que até houve quem, no próprio Ministério da Marinha e do Ultramar, pensasse que a Guiné se encontrava a sul do Equador; Pinheiro Chagas, Na Guiné 1907-1908, Lisboa: Typ. J. F. Pinheiro, 1910: IX. 26 Oliveira Muzanty, Bolama, 28-8-1908, para Ministério da Marinha e Ultramar, Lisboa; AHU, DGU, Guiné, Repartição Militar, cx. 6. 27 Pinheiro Chagas Na Guiné..., XVI-XX. 28 Étienne-Giraud, «La Guinée...», 229. 29 Carlos Almeida Pessanha, Bolama, 12-3-1905, Relatório do Governador da Guiné, para o Ministério dos Negócios da Marinha e Ultramar; AHU, DGFC, cx. 179. 30 Pinheiro Chagas, Na Guiné..., XX-XXI. 31 Fonseca Campos, Guiné a Saque: Documentos e Factos para a Sua História (Lisboa: Imprensa Africana, 1912), 43. 32 Oliveira Muzanty, Bolama, 28-8-1908, para Ministério da Marinha e Ultramar, Lisboa; AHU, DGU, Guiné, Repartição Militar, cx. 6.

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Representantes do comércio local, apelando a sentimentos nacionais, pediram insistentemente que o governo proibisse casas estrangeiras de fazer transacções com as populações do interior, limitando o livre comércio no âmbito da sua pretendida «nacionalização».33 Para isso, «insinuam-se no ânimo dos régulos ou chefes tradicionais aconselhando-os a não pagar o imposto, fazendo-lhes ver que o governo não tem força para os obrigar». A falta de capitais mas também a recusa de arriscar nas operações de comércio sem «logo garantir um juro remunerador» levou o comércio a queixar-se.34 Ao mesmo tempo, «endereçaram-se farpas» às casas de comércio francesas e alemãs, por terem tido um papel activo nas revoltas, nomeadamente através do tráfico de armas. Este assunto é abordado em vários despachos oficiais em que se lamentava a forma benigna como interesses estrangeiros eram tratados, sobretudo as casas francesas, por terem um peso muito superior às (poucas) casas portuguesas: «o comércio está por completo – com excepção da casa Gouveia e alguns pequenos negociantes de Cabo Verde – desnacionalizado».35 Muitos «nacionais» insurgiram-se contra o facto de a Guiné ser «mais uma colónia estrangeira do que colónia portuguesa».36 Neste quadro de contestação e de confronto, a administração central sediada na capital, Bolama, e as repartições nos principais centros comerciais como Bissau, Cacheu e Bafatá tornaram-se o principal alvo de críticas e preocupações. Abundaram acusações acerca das «sociedades agrícolas e comerciais» detidas por empregados públicos que fizeram «contrabandos e favores».37 Também se lançaram suspeitas sobre favoritismos por parte do governo ao comércio estrangeiro que levou ao «predomínio do estrangeiro e que a Guiné é portuguesa só em nome». Por conseguinte, como já haviam feito numa petição à metrópole em Abril de 1905, comerciantes portugueses e cabo-verdianos reivindicaram a proibição de firmas estrangeiras se fixarem no interior para proteger o «comércio nacional» e evitar a desnacionalização do indígena».38 Fontes francesas mostraram-se muito críticas acerca destes intermediários locais, cuja alegada colaboração com os alemães era considerada preocupante. Um administrador francês que fornece um pano de fundo sobre a situação na Guiné comentou que o grupo de «novos proteccionistas», composto por «portugueses e cabo-verdianos 33 Sebastião José Barbosa, encarregado do governo da Guiné, Bolama, 25-8-1912, para MMU; AHU, FGG, 171. 34 A. Loureiro da Fonseca, «Guiné», Boletim da Sociedade de Geografia de Lisboa, 23.ª série, 11 (1905): 398. 35 José Duarte de Guimarães, encarregado do governo, Bolama, 28-4-1909, para Ministério da Marinha e Ultramar; AHU, FGG, 177. A chamada «Casa Gouveia» era naquela época uma das poucas casas comerciais de origem portuguesa no território, estabelecida nos anos 90 do século XIX pelo comerciante António da Silva Gouveia. 36 Loureiro da Fonseca, «Guiné...», 398. 37 Valentim Fonseca Campos e Manuel António de Oliveira, Explicação ao Povo da Guiné: Porque Pedimos a Demissão de Vogais da Comissão Municipal de Bissau (Lisboa: Imprensa Africana: 1911), 1. 38 Fonseca Campos e Oliveira (1911), 9.

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brancos e mestiços», queria reinstituir o sistema antigo através do qual os estrangeiros forneciam crédito aos intermediários locais que comerciavam no interior.39 O desejo de reaver «este monopólio» que eles consideravam a «sua pertença» e as dificuldades com a administração e a justiça, que não facilitavam a obtenção de licenças pelas casas de comércio estrangeiras, levou firmas francesas a substituir estes mediadores locais por europeus mais «sérios». A tentativa falhada do governo de atribuir grandes concessões a empresas portuguesas mostrou que estes queriam «reservar a colónia só para eles».40 As firmas alemãs aproveitaram precisamente os serviços destes «portugueses ou mestiços portugueses» para as trocas no interior».41 Missivas francesas tornaram-se progressivamente mais críticas sobre o papel destes intermediários que «mantinham laços de parentesco com os funcionários da colónia e que eles muitas vezes trabalharam por conta destes últimos». Por as contas geralmente resultarem num défice, os estrangeiros acabaram por ser os seus créanciers.42

Inquéritos e inspecções: o caso da Alfândega Com o aumento da intensidade das campanhas de pacificação como pano de fundo, as polémicas em torno da administração do território e os conflitos entre as várias facções intensificaram-se. Da parte dos governantes e de interesses estrangeiros, as críticas focam principalmente dois grupos, ou seja, os cabo-verdianos que ocupavam lugares de destaque na administração e no comércio, e os Kriston, ou grumetes, cujas comunidades compostas por africanos cristianizados habitaram os principais portos da região e serviam como principais intermediários no comércio fluvial. Este discurso que visa alertar para e denunciar a alegada influência política, social e económica destes estratos sociais e atacar a sua ambivalência política, acentua-se progressivamente a partir da viragem do século. O seu impacto fez-se sentir durante todo o período colonial, fazendo-se notar mais até à década de 30, para, depois de um curto intervalo, após a Segunda Guerra Mundial, ser repescado no contexto da guerra colonial (1963-1974). Enquanto os cabo-verdianos são tratados como «civilizados» embora crioulos, os segundos estão na mira das autoridades por causa da sua proximidade com as populações nativas. Porém o sentido deste discurso não é linear

39 Paul Brocard, administrador de Casamansa, 24-7-1908, para Boyer, comandante do cruzeiro Cassard; CAOM, FM, 1291. 40 Trata-se aqui da concessão atribuída a Matheus Augusto Ribeiro Sampaio e conde de Valle Flor, de todos «os terrenos incultos ou desocupados no actual distrito da Guiné Portuguesa»; ver Boletim Oficial da Guiné Portuguesa (BOGP), 44, 1894. Porém, dois anos antes foi dada uma concessão semelhante a uma empresa francesa liderada pelo conde Raoul Buttler, que incluiu todos «os terrenos públicos baldios da província»; ver BOGP, 2, 1892. 41 Paul Brocard, administrador do Casamansa, 24-7-1908, CAOM, FM, 1291. 42 Paul Brocard, administrador do Casamansa, 24-7-1908; CAOM, FM, 1291.

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nem o seu conteúdo homogéneo, por causa da existência de facções entre os governantes, em que tanto as afiliações partidárias como as preferências pessoais dos magistrados jogaram um papel importante. Esta política de ziguezague seguida pelos governadores e seus seguidores dentro da administração deixou margens de manobra para aqueles que estavam bem colocados dentro do meio restrito da sociedade civil nas praças da Guiné. Os operadores comercias locais são descritos como um «bando de pardos, mestiços Portugueses, cabo-verdianos e brasileiros que exploraram os infelizes nativos da Guiné Portuguesa duma forma vergonhosa».43 Os «mestiços caboverdianos», liderados por um oficial conterrâneo, são particularmente visados por formarem um grupo mercantilo-fonctionnaire, mais tarde conhecido como o «Partido Cabo-Verdiano», que se comporta como um grupo de «pequenos ditadores».44 Os argumentos usados pelo governo da Guiné da época, que defendia que, apesar de apelos neste sentido, ainda não pudesse conceder o pleno exercício de todos os direitos civis ou políticos, mostram preocupações semelhantes. Pelo facto de os europeus serem «uma minoria insignificante» e os naturais da terra ainda não poderem aspirar a estes direitos por causa do «seu atraso», os cabo-verdianos, que «abundam na província onde são quase os únicos representantes do comércio nacional», teriam conseguido o domínio da colónia, só causando «embaraços à acção governativa».45 A substituição de um juiz europeu por outro de origem cabo-verdiana contou com a oposição do governador de então, que sublinhou a gravidade deste «estado de coisas realmente insustentável e deprimente do nosso prestígio». O facto de a vara da comarca estar confiada a «um homem de cor» era considerado uma «grande inconveniência», sobretudo por este ser ali residente «há muitos anos» e estar «ligado pela família e interesses de toda a natureza, e daí a com nenhuma independência na distribuição de Justiça, e mais direi a V. Exa. uma assustadíssima parcialidade pelos seus conterrâneos quando questões ocorrem entre eles e europeus».46 Um outro governador, recém-nomeado, informava os seus superiores na metrópole que a Guiné estava «contaminada de cabo-verdianos e de muitos pretos, que unicamente se dedicam ao roubo e vadiagem».47 O contingente de cabo-ver43 Durac, comerciante francês, Bissau, 27-6-1908 para vice-consul francês na Guiné Portuguesa; CAOM, FM, 1291. 44 Paul Brocard, Bissau 28-6-1908, para Boyer; CAOM, FM, 1291. Apesar de não ter efectivamente existido um tal partido, este discurso anticabo-verdiano continuou a dominar relatórios franceses e portugueses da época, até aos anos 30. Nos anos 20, um governador português ainda se insurgiu no seu relatório anual contra a ideia de a Guiné ser «uma colónia de Cabo Verde» cujos membros viu como uma força de bloqueio à sua acção governativa. Ver Jorge Frederico Vellez-Caroço, Relatório do Governador da Guiné (1921-22) (Coimbra, Imprensa da Universidade, 1923), 26. 45 Carlos de Almeida Pessanha, Bolama, 12-3-1905, para Ministério da Marinha e do Ultramrar; AHU, Fundo do Governo da Guiné (FGG), livro 145. 46 João Augusto de Oliveira Muzanty, Bolama, 12-7-1908, para Ministério da Marinha e do Ultramar (MMU); AHU, FGG, 152. 47 Francelino Pimentel, Bolama, 6-10-1909, para MMU; AHU, FGG, 177.

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dianos era também acusado, tal como estrangeiros de países europeus, de ter provocado as revoltas dos povos da região. Os boatos que espalham «habilmente» servem «ao pequeno comerciante» que prefere ver «a praça fechada» para «depois vender os seus produtos com lucros fabulosos e porque as colunas [militares] sempre rendem».48 Outro «embaraço» eram os grumetes ou Kriston, que se consideravam «como os únicos representantes da força pública e que hoje abusam da sua indispensabilidade».49 Segundo este governador, a «missão civilizadora do Europeu esbarrava a cada passo de encontro à civilização postiça do cidadão «indígena», que tirava proveito da situação. Fazendo uma comparação «muito desfavorável» com Moçambique onde também serviu, um governador frisa que na Guiné «esse prestígio é sustentado apenas pela nossa acção dirigente auxiliada pelos grumetes, hoje nossos aliados por conveniência própria e intimamente aliados por tradição de raças aos nossos inimigos».50 Os grumetes tidos como próximos do «gentio», foram acusados de fornecer armas modernas roubadas aos povos rebeldes, como os Pepel, além de passarem armas de repetição a estes «seus parentes».51 Acusados de «jogar com um pau dos dois bicos», a eficácia e lealdade dos Kriston é cada vez mais questionada durante a primeira década de Novecentos, até as chefias militares se decidirem pela dispensa do seu apoio e serviços, o que resulta num grande aumento de tensão política e social. A nomeação de um novo chefe militar para comandar as operações militares na Guiné em 1912, que resultará no abandono da aliança com os Kriston, e a opção por mercenários vindo de zonas limítrofes, ou seja, colónias francesas, contribui para a crispação do ambiente já de si muito tenso. A hostilização destas comunidades foi feita com a justificação de que as regiões do interior ainda insubmissas eram um «vasto campo para exploração feita pelos grumetes e cabo-verdianos, os quais também ali se refugiam quando cometem delitos de que têm de dar contas às autoridades».52 O comando militar frisa que esta troca de aliados é respondida por uma «guerra surda dos grumetes contra estes novos mercenários, «uma guerra que encontra apoio nos cabo-verdianos, que formam grande parte da população civilizada da Guiné, a ponto de ser o seu dialecto [o crioulo] quase exclusivamente usado pelos indígenas e comerciantes estrangeiros».53 Quando membros destacados destes dois grupos se reúnem em 1911 numa «associação escolar e instrutiva» chamada Liga Guineense, que se autodenomina «uma assembleia dos nativos da Guiné» que pretende «trabalhar [...] para o pro48

Francelino Pimentel, governador, 29-11-1909, para MMU; AHU, FGG, 177. Alfredo Cardoso de Soveral Martins, 12-10-1903, para MMU; AHU, DGU, Guiné, 1.ª Rep., cx. 8. 50 Ibidem. 51 Pinheiro Chagas, Na Guiné…, XXXIII. 52 João Teixeira Pinto, Lisboa, 13-12-1914, ministro das Colónias; AHU, DGC, Repartição Militar, cx. 1. 53 Ibidem. 49

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gresso e desenvolvimento da Guiné Portuguesa»,54 esta, na sequência da instauração da República, rapidamente transforma esta «guerra surda» num conflito de contornos eminentemente políticos num ambiente já bastante crispado. Porém, a subida das tensões também tinha uma vertente económica: as autoridades culpavam estes dois grupos pelos males da província, por terem unicamente em vista o enriquecimento rápido. Como se atingiam lucros entre os 50% e os 300%, estes comerciantes eram acusados de fazer «fortuna em cinco anos, não pagavam contribuições, as comissões municipais e pagavam um imposto aduaneiro insignificante, chegando a concordarem que pagam pouco e a desejarem um aumento, desde o momento que se faça melhoramentos e lhe assegurem o comércio no interior».55 Exemplos abundam de transacções baseadas em práticas já estabelecidas desde que se introduziu o amendoim como cultura de exportação na Guiné no século XIX: em troca de sementes, o produtor nativo pagava taxas de juros entre 100 até 300% sobre o valor do empréstimo, ficando obrigado a vender a colheita ao mesmo negociante.56 Porém, devido a ligações consideradas perigosas entre o sector privado e a administração ainda embrionária, onde os cabo-verdianos e Kriston ocuparam posições de destaque, estes laços «suspeitos» tornaram-se um foco de contestação aberta. Tanto comerciantes como funcionários eram acusados de «explorar o preto».57 A acumulação de várias funções por funcionários públicos – que ao mesmo tempo mantinham laços com a Liga Guineense – era também tida como uma fonte de polémica que segundo os seus acusadores contribuiu para a falta de eficácia da administração, que pecava por favorecimentos ilícitos e uma série de irregularidades. Neste contexto, o caso mais emblemático seria aquele do chefe da alfândega de Bissau, que era ao mesmo tempo tesoureiro da mesma – a principal da Guiné, que gerava três quartos da receita total – recebedor do concelho de Bissau e director dos correios.58 As informações que chegaram a Lisboa multiplicaram-se, e, quase unanimemente, denunciaram o estado das coisas na Guiné. Um governador descreveu aos seus superiores na metrópole, pouco depois da sua chegada, a sua consternação ao encontrar «a administração da província por muitas e variadas causas, n’um verdadeiro caos» concluindo que era preciso «sanear moralmente 54 Ver Estatutos da Liga Guineense (Lisboa: Typographia da Parceria António Maria Pereira, 1911), 3. A Liga Guineense, criada em 1910, mas legalizada em 1911, foi proibida pelo governador da Guiné em 1915, reuniu comerciantes e assalariados crioulófonos, tanto de origem cabo-verdiana como Kriston, e professou o ideal republicano; ver Pélissier, Naissance..., 296-300; Peter Karibe Mendy. Colonialismo Português em África: A Tradição da Resistência na Guiné-Bissau (1879-1959) (Bissau, INEP, 1994), 329-335; Wilson Trajano Filho, Polymorphic Creoledom: The Creole Society of Guinea Bissau, tese de doutoramento (não publicada), cap. 3 (University of Pennsylvania, 1998); e Philip J. Havik, Mundasson i Kambansa, «Espaço social e movimentos políticos na Guiné-Bissau (1910-1994)», Revista Internacional de Estudos Africanos, 18-22 (1995-1999), 120-123. 55 Francelino Pimentel, governador, 6-10-1909, para MMU; AHU, FGG, 177. 56 Pinheiro Chagas, Na Guiné…, XIV 57 Pinheiro Chagas Na Guiné…, XIV. 58 Loureiro da Fonseca, «Guiné...», 403.

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a província e depois estudar os problemas vitais da sua economia... etc».59 Reportando-se à maior parte das denúncias às Alfândegas, o governo em Lisboa ordenou a instauração de um inquérito à delegação de Bissau nos primeiros meses de 1912.60 Este, conduzido por um oficial da repartição da Fazenda da Guiné, analisou as várias queixas contra o director da Alfândega de Bissau, João José Vieira Barbosa de origem cabo-verdiana, acerca de alegadas irregularidades cometidas no despacho de mercadoria importada.61 Este concluiu que as más práticas eram uma «norma constante» sobretudo no que dizia respeito ao despacho de álcool vindo da Alemanha, o principal parceiro comercial da Guiné, através dos barcos da Woermann Linie que mantinham naquela época um serviço regular com a província. Alguns dos maiores comerciantes a operar na Guiné, incluindo casas alemãs e portuguesas, estavam envolvidos, tal como quase todos os funcionários da Alfândega. Devido ao facto de as taxas de importação sobre álcool representarem a maior fatia das receitas não só da alfândega mas também da província, esta questão era muito relevante.62 Ainda mais, se se considerar, que álcool, ou, neste caso, a genebra ou schnaps adulterado, era ao mesmo tempo o principal artigo de permuta com os nativos e servia como pagamento de trabalho, enquanto «nos casamentos, nos batuques e no ‘choro’ por morte de parentes é o álcool que tudo domina».63 Com base no referido inquérito, o governo da metrópole decidiu, no mesmo ano, instaurar uma inspecção aos serviços alfandegários da Guiné, a cargo do comissário geral das Alfândegas da Índia Portuguesa.64 O inspector para ali enviado, apesar de ser confrontado com «imensos obstáculos», confirmou as conclusões do inquérito além de apurar outras irregularidades sobre as quais então circulavam muitos boatos. O principal problema era provar a existência de fraudes por os documentos não permitirem determiná-los, não obstante serem claramente «factos correntes», e de o comércio estar «tão acostumado» a tais «irregularidades». As muitas rasuras nos registos mostraram a facilidade com que se substituía a fórmula do despacho por outra, sendo os valores dos despachos sempre inferiores aos verdadeiros, de vez em quanto menos de 50%.65 Por conseguinte, as estatís59 60

Carlos Pereira, Bolama, 17-11-1910, confidencial; AHU, DGU, Guiné, 1.ª Rep, cx. 8. Inquérito à Delegação da Alfândega de Bissau, Justiniano Luz Fuzeta, 1912: AHU, DGFC,

838. 61 O inquérito à Delegação da Alfândega de Bissau conclui que «O chefe Barbosa fazia assim favores aos negs de Bxo com os dinheiros do Estado»; cf. Inquérito..., (ver n. 60), 56. 62 No ano fiscal 1912-1913, o imposto sobre álcool que incidiu principalmente sobre o schnaps de Hamburgo constituiu mais de 40% do total de receitas da Fazenda; ver Loureiro da Fonseca, «Guiné: alguns aspectos inéditos da actual situação da colónia», Boletim da Sociedade de Geografia de Lisboa, 32.ª série, 12 (1914): 438. 63 Henrique Artur Gonçalves Cardoso, Relatório da Inspecção as Alfandegas da Guiné, 4-1-1913: 191; AHU, DGFC, 838. 64 A inspecção foi instaurada pela portaria ministerial do Ministério de Marinha e Ultramar, n.º 15 de 9-5-1912. 65 Cardoso, Relatório da Inspecção..., 74.

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ticas oficiais publicadas no Boletim Oficial da Guiné Portuguesa sobre a exportação de mancarra (amendoim), coconote (noz de palmeira) e borracha não eram fiáveis. A escrituração, que não permitia uma avaliação rigorosa por ser muito omissa, estava a cargo de um empregado particular do director da mesma delegação, que não mantinha um arquivo. O favorecimento de certas casas de comércio, sobretudo alemãs e portuguesas, que recebiam as suas encomendas sem fiscalização alguma, só pagando aquilo que declaravam, não tinha sido objecto de investigação pelo facto de os funcionários e a direcção da Alfândega da Guiné encobrirem a situação, apesar da existência de inúmeras reclamações. «Cada um exportava o que queria e conforme lhe apetecia com um irrespeito enorme pela lei, e com o tácito consentimento das autoridades.» Até os capitães de navios que sabiam destas práticas entregavam documentos incompletos ou em mau estado, sem serem incomodados. O chefe da Alfândega «dispensava larga protecção» a estes negociantes, e «com os dinheiros do Estado» recebia deles em troca «grande soma de favores», incluindo «empréstimos». Quando o cofre ficava desfalcado, o director e o tesoureiro mandavam os seus funcionários visitar os comerciantes para pedir todo o dinheiro que pudessem.66 Porém, os negociantes que não se entendiam com ele, sofriam «toda a sorte de dificuldades».67 Apesar de só poder exercer o referido cargo por dois anos, permanecia lá durante seis, e actuava ao mesmo tempo como tesoureiro. Além disso, ausentava-se muito «para a sua exploração, ou ponta em Bambadinca, a quatro horas de Bxo, preocupando-se mais com a vida particular que com a pública».68 Além do visado pelo inquérito, o seu superior, o director das Alfândegas da Guiné, César Correia Pinto, um filho da terra com trinta e cinco anos no serviço público, foi acusado de compactuar com as irregularidades cometidas pelos seus funcionários. Apesar de ter feito um inquérito um ano antes, não estranhou as práticas referidas e nunca censurou os funcionários envolvidos, optando por propor louvores e «acobertar o mais possível o pessoal delinquente, mostrando assim uma tácita cumplicidade».69 Este funcionário com várias décadas de serviço na Guiné, foi também censurado por receber favores e de ter feito «resistência passiva», não acatando as decisões do inspector. Um comentário deste último é muito revelador dos laços entre a Guiné e Lisboa, que passaram pelo Partido Republicano então no poder.70 O director da Alfândega da Guiné «estava seguro de que amigos têem em Lisboa, e que me abstenho de indicar seriam a capa para todas as suas diatribes».71 66

Cardoso, Relatório da Inspecção..., 43. Cardoso, Relatório da Inspecção..., 156. 68 Cardoso, Relatório da Inspecção..., 5. 69 Cardoso, Relatório da Inspecção..., 148. 70 O mesmo era acusado de ter «virado» republicano, quando antes ter sido um monárquico convicto; ver Cândido Carlos de Medina, A Guiné dos Constituintes ou Misérias de Um Deputado (Lisboa, Imprensa Africana, 1912), 20. 71 Cardoso, Relatório da Inspecção..., 150. 67

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Esta «Libéria Portuguesa» A Guiné foi durante muitos anos um feudo de alguns influentes, que dispunham a seu bel-prazer de tudo e todos, e aqueles que não acediam aos manejos eram lançados à margem, sendo inúteis todas as suas reclamações. [...] Nenhum critério, nenhuma justiça havia nas colocações de pessoal, e assim para os piores lugares eram atirados aqueles que não tinham o valimento de algum poderoso.72

A situação nos postos no interior do território apontava para a existência das mesmas práticas, também em relação aos descaminhos e ao contrabando, incluindo o tráfico de armas, «os quais são mais graves quanto sendo feitos numa região onde abundam os povos insubmissos, passam armas e munições em larga quantidade vindas do território francês».73 Os testemunhos de funcionários descreveram um meio caracterizado pelo «deixar andar», em que a dança dos lugares girava em torno da colaboração destes no carrossel de favores aos privados e de interesses instalados, em que reinava o sistema da «boquinha calada».74 Escudando-se na «confiança da impunidade», os «nativos» eram acusados de beneficiar da «mesma certeza de alta protecção para qualquer contratempo». Na Alfândega então era terrível dada a preponderância dos nativos e suas naturais relações com o resto da província. Isto era uma espécie de monopólio em que só eles deviam lucrar e num sentido se moviam sempre os melhores esforços de quem desgraçadamente a dirigia.75

Denúncias feitas por comerciantes lesados sobre negócios ilícitos conduzidos por funcionários da Alfândega em vários panfletos revelam as «mancomunicações ilícitas com determinadas casas comerciais em manifesto prejuízo para os dinheiros do Estado».76 Naquelas insurgem-se contra as relações de proximidade entre estes funcionários e certos comerciantes, que tomaram a forma de uma «sociedade comercial secreta», conhecida localmente como «Barbosa e Dedé» (a alcunha do comerciante Joaquim Pinheiro de Figueiredo), que «girava com largo capital».77 Neste «feudo», a amizade e intimidade entre os diferentes actores e suas famílias era de tal modo grande que se hospedavam «em casa uns aos outros por longos tempos e mezes».78 Os funcionários eram cooptados dentro deste teia através de «favores» que incluíram o aluguer de quartos e casas, empréstimos e negócios vários. 72

Cardoso, Relatório da Inspecção..., 52. Henrique Artur Gonçalves Cardoso, Bolama, 25-7-1912, para Director Geral da Fazenda das Colónias em Lisboa; AHU, DGFC, 838. 74 Testemunho de José Gomes, Bissau, 22-8-1912, in Cardoso, Relatório da Inspecção..., 36. 75 Testemunho de José Gomes, Bissau, 22-8-1912, in Cardoso, Relatório da Inspecção..., 37 76 Fonseca Campos, A Guiné a Saque..., 12. 77 Fonseca Campos, A Guiné a Saque..., 12; Cardoso, Relatório da Inspecção..., 41. 78 Fonseca Campos A Guiné a Saque..., 14. 73

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Outro indicador revelador das preocupações do inspector é a sua afirmação de que o único europeu que trabalhava nas Alfândegas foi discriminado injustamente com base no «ódio de cor». O chefe do Círculo Aduaneiro da Guiné, César Correia Pinto, que é descrito pelo inspector como um cabo-verdiano, usava «discricionariamente o seu lugar e compraz-se em aviltar o funcionário que não é da sua cor ou da sua raça. Assim a distribuição dos lugares mais proveitosos ou em pontos mais salubres é geralmente injusta e intolerável, funcionários havendo que toda a sua carreira têm feito no mato».79 No interior que ainda estava em grande parte sob o domínio das sociedades africanas, os comerciantes também dependeram em larga medida das relações de proximidade e de parentesco que os funcionários com estes mantinham. Porém, para a maioria das pessoas era «muito arriscado sair fora da praça, não podendo os negociantes entreter com o gentio outras relações comerciais que não sejam as realizadas em Bissau». 80

Uma nova Libéria? Longe de se calarem a seguir à inspecção, o coro de queixas que alimentava a polémica em torno da questão da cor intensificou-se. Na troca de correspondência oficial, na imprensa e nas publicações da época, alimentada pelo circuito dos bokasiñu ou rumores, sobressai a questão do domínio exercido por nativos guineenses e mestiços cabo-verdianos sobre os serviços administrativos, e sobretudo na repartição aduaneira.81 Apesar de o relatório da inspecção ter sido aprovado pelo governador da Guiné e pelo ministro das Colónias, e alterações terem sido introduzidas numa reorganização das Alfândegas em 1913, pouco parece mudar.82 Enquanto tardaram em ser tomadas resoluções na metrópole, passados dois anos o governador pedia a Lisboa medidas urgentes para pôr termo ao compasso de espera. A nomeação de um «administrador absolutamente idóneo e competente», já que a Alfândega era «um serviço dos que maior influência tem na administração desta província», era proposta «sobretudo de entrada no momento presente que deve constituir como que o início e a verdadeira instalação de novo regime».83 No ano a seguir à ocupação efectiva do território continental em 1915, o Conselho Colonial ainda estava a apreciar o caso, pedindo mais elementos e queixando-se da demora do seu envio da 79

Cardoso, Relatório da Inspecção...,152. Cardoso, Relatório da Inspecção..., 87. 81 Sobre os bokasiñu, ver Trajano Filho, Polymorphic..., parte II. 82 A justificação dada então pelo Ministério para encetar uma reorganização foi «que o serviço alfandegário da Guiné se encontrava em um estado de desorganização vizinha do caos» e que uma «das nossas mais ricas e prometedoras colónias» precisava de se «modernizar». Decreto n.º 138, de 17-9-1913, Ministério das Colónias, Organização dos Serviços Aduaneiros da Guiné, Lisboa, Imprensa Nacional, 1913; AHU, DGFC, 838. 83 Oliveira Duque, Bolama, 22-9-1914, para Ministério das Colónias; AHU, DGFC, 838. 80

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Guiné. A falta de esclarecimentos e a continuada chuva de queixas, levou a metrópole a decidir a instauração de um novo inquérito, desta vez em forma de sindicância, à repartição das Alfândegas da Guiné, a cargo de um antigo governador. No seu relatório, o sindicante critica duramente o director das Alfândegas da Guiné, que identifica como um «preto» e um «indígena», para centrar as suas conclusões precisamente nas questões raciais. Afirmo sem a menor dificuldade que me era profundamente desagradável ver um preto no lugar de chefe de serviço e de um serviço daquela natureza em que tem de lidar com numerosos brancos de categoria e um número dos quais estrangeiros, alguns cônsules de várias nações. E não é só isso: na sua qualidade de chefe de serviço tem superioridade sobre brancos, quando os haja no quadro, e pior de tudo, tem a autoridade de infligir-lhes castigos! É tudo o que há de mais deprimente para a raça branca e para nós europeus, os descobridores e conquistadores desta como doutras colónias [...]. A história diz que [os pretos] são os conquistados, e consequentemente não podem ter domínio sobre os conquistadores».84

Todos os funcionários, à excepção de um, eram «pretos ou mulatos porque o administrador consegue-se desfazer dos brancos que lá lhe apareçam». Porém, a culpa desta situação não era somente atribuída ao director mas também à própria metrópole, que não mandou abrir concursos e não colocou europeus naquela repartição, já que nas colónias estrangeiras não se concedia «a superioridade de pretos sobre brancos».85 Mas além de se insurgir contra o domínio numérico dos cabo-verdianos nos serviços públicos, o que talvez seja mais revelador acerca das relações dentro da repartição, ele afirma que o chefe desta é descrito como um nativo, «um beafada, da circunscrição de Buba» oriundo da região de Quínara no Sul da Guiné. O seu ódio pela raça branca é manifesto e toda a gente sabe que ele era presidente da «Sociedade do mata branco» e era depois um dos sócios mais importantes da «Liga Guineense» que punha e dispunha dos jornaleiros e operários, fazendo-se superior à autoridade administrativa e antepondo-se-lhe as deliberações. E o arbítrio manda dentro daquela Alfândega de modo que as preterições, os castigos e as más colocações são o apanágio dos que se não subordinam incondicionalmente às indicações e ingestões do administrador César Correia Pinto, e daqueles que lhe são mais afeiçoados».86

A descrição do modo de funcionamento desta «quadrilha» mostra que o director em questão operava essencialmente como um «juiz do povo», um cargo 84 Manuel Maria Coelho, Relatório Sindicância à Alfândega, Bolama, 10-7-1917; AHU, DGFC, 838. 85 Coelho, Relatório Sindicância..., 2. 86 Coelho, Relatório Sindicância..., 3.

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entretanto extinto pela reforma administrativa de 1912, cujos ocupantes eram eleitos pelos seus pares, ou seja, os «grandes» das comunidades Kriston das praças da Guiné. O «juiz do povo» controlava o mercado de trabalho nas praças e entrepostos comerciais, monopolizado pelos chamados «grumetes», que se prestavam a executar tarefas como marinheiros, remadores, pilotos, intérpretes, auxiliares, agentes, intermediários, vendedores e domésticos. A figura deste magistrado, surgida no século XVII, no quadro da crescente autonomia destas comunidades que ocuparam bairros periféricos nas praças de Cacheu, Bissau, Farim, Geba e Ziguinchor, tornou-se incontornável nas transacções entre os povos do interior e a administração portuguesa.87 Não é de estranhar que o sindicante, actuando como governador, proibisse o uso do crioulo na administração pública, por ir contra a pretensa «nacionalização» da Guiné, sendo esta precisamente a língua franca no território, falada pelos Kriston (na sua variante continental, o kriol) e pelos cabo-verdianos (e insular, o kriolu).88 É notável, nesta sindicância, a mudança de tom – que logo desde a primeira página se concentra na questão da cor –, comparado com o relatório da inspecção de 1913, e o facto de que o seu autor «reescreve» a biografia do funcionário em causa cujo estatuto social muda de «mestiço» para «preto», e cujas origens se trocam, mudando de Cabo Verde para a Guiné. O facto de o administrador do Círculo Aduaneiro da colónia ocupar o cargo ininterruptamente há mais de quarenta anos em 1917, ilustra bem a eficácia das redes de parentesco e de afinidades que o sustentaram, além de lhe permitir fazer resistência passiva aos sindicantes enviados por Lisboa.89 Este funcionário, que somente tinha completado o ensino primário na escola provincial na Praia, em Cabo Verde, enquanto o seu subalterno, o director da Alfândega de Bissau por ele nomeado, era diplomado pela Escola Politécnica de Lisboa, era um actor extremamente hábil e bem conectado, que sobreviveu, intacto, à primeira sindicância. Porém, apesar de reunir apoios de todos os quadrantes, inclusive de comerciantes locais, funcionários públicos, governadores e também nos meios republicanos da metrópole, não conseguiu evitar o seu afastamento. A ocupação militar da Guiné e a implantação de uma administração colonial contribuíram para uma mudança do clima político, de tal modo que a sua substituição por um europeu era em 1917, quando a nova Carta Orgânica da Guiné foi proclamada, um facto consumado. Na sua justificação, o 87

Ver Havik, Silences and Soundbytes…., 135-137; e Barros, Pela Guiné, 13-19. Manuel Maria Coelho, Portaria 38, 9-2-1917; BOGP, 6, 10-2-1917. O decreto em questão era anunciado como uma medida contra «o uso constante do crioulo como se fosse essa a língua nacional», achando «inadmissível que deixe de se usar constantemente nas relações dos funcionários entre si e até nas que com o público hajam de entreter». 89 Coelho, Relatório Sindicância..., 1. Anos mais tarde, o então governador da Guiné também se queixou da mesma «resistência passiva» por parte de uma certa coterie que mercê da instabilidade dos governadores tem dominado na Guiné»; ver Vellez Caroço, Relatório…, 5. O referido governador instaurou um inquérito contra o então secretário do governo, de origem cabo-verdiana, por «fomentar as intrigas e campanhas de descrédito» contra o recém-chegado magistrado; ibidem, 155-156. 88

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sindicante excluía a mera hipótese de nomear um nativo, por o funcionário em questão também ser «um preto [que] não tem competência alguma». Mesmo assim, o sindicante observou que tendo o novo director tomado posse, «todos os funcionários de cor, que o são todos menos o terceiro oficial José Gomes, o único branco, adoptaram como sistema resistir passivamente às determinações do novo administrador». Esta situação levou o mesmo sindicante a avisar que «elementos mestiços e com ainda mais razão os elementos negros não deviam de maneira nenhuma predominar sobre o elemento europeu».90 Apesar de as autoridades terem professado em 1919 que a sua «soberania [...] se pode considerar efectiva em toda a província»,91 as próximas décadas serviriam para mostrar que fora dos poucos centros urbanos este domínio era efectivamente exercido pelos «elementos» cabo-verdianos e Kriston, cuja presença continuou a ser muito significativa na administração e no comércio da Guiné. Quando surgiram, nos escândalos, inquéritos, inspecções e sindicâncias, sempre houve quem apontasse o dedo acusador às «forças de bloqueio» compostas por «indivíduos negros ou cabo-verdianos que afirmam coisas que não viram a troco de qualquer favor».92 É revelador que foi precisamente o «único europeu» na Alfândega que descreveu a Guiné como «nesta Libéria Portuguesa».93 Apresentado pelos relatórios como vítima, na opinião deste funcionário, a comparação feita por diplomatas internacionais e autoridades metropolitanas e coloniais entre a Guiné e a Libéria era legítimo: afinal a péssima administração da Guiné sofria da «preponderância dos nativos e suas naturais relações com o resto da província. Isto era uma espécie de monopólio em que só eles deviam lucrar e num sentido se moviam sempre os melhores esforços de quem desgraçadamente a dirigia».94 Porém não deixa de ser revelador, pelos laços entre os vários actores desta peça, que o mesmo funcionário que denunciava os «nativos» com tanta ênfase, tivesse visto a mulher do chefe da Alfândega de Bissau, como uma «mãe e irmã», que o tratava com afecto e o acolheu com grande hospitalidade. Numa perspectiva mais alargada, a circunstância de existir um consenso implícito acerca do estatuto da Guiné, uma terra pouco conhecida e quase ignorada, onde «as paixões politicas» eram consideradas «particularmente violentas», também tinha implicações a nível regional e internacional. Cobiçada pela França e Alemanha, a sua continuação em mãos portuguesas parecia estar por um fio no período turbulento das relações internacionais durante a Primeira 90 Manuel Maria Coelho, 1917, citado no despacho do vice-cônsul francês em Bissau, Gustave de Coutouly, 6-6-1917, para Ministère des Affaires Étrangers, em Paris; CAOM, FM, 1291. 91 Relatório, Bolama, 19-2-1919, Movimento Comercial e Marítimo da Guiné, 1918; AHU, DGFC, 838. 92 Fernando de Oliveira, director da Alfândega de Bissau; Relatório, Lisboa, 26-11-1920, Secretaria de Estado das Colónias, Direcção Geral de Fomento; AHU, DGAPC, 446. 93 José Gomes, depoimento, Bolama, 22-8-1912; Cardoso, Relatório Sindicância..., fols. 35-37. 94 Testemunho de José Gomes, Bolama, 22-8-1912; Relatório de Inspecção…, anexos, AHU, DGFC, 838.

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Guerra Mundial. A opinião generalizada de que a administração portuguesa não estava na posse efectiva do território, que a sua administração era débil e permitia abusos de vária ordem, justificava as reivindicações das grandes potências europeias. As referências à situação interna e os conflitos entre diferentes facções políticas e estratos sociais serviram para identificar a Guiné como problema exigindo soluções rápidas que Portugal era incapaz de implementar num dos «mais ricos e mais acessíveis territórios em África».95 A alegação de que um «Partido Cabo-Verdiano» ou «Kriston», composto por «jovens católicos», tinha «opiniões revolucionárias e separatistas», e que ambicionava estabelecer «uma república negra parecida com a Libéria»,96 associava-se nitidamente à rivalidade entre países europeus e à sua cobiça por colónias «embrionárias» como a Guiné. O facto de tanto governos franceses como alemães discutirem a «compra» da Guiné na época em questão usando estes pretextos, quando os conflitos internos estavam no seu auge, ilustra claramente até que ponto o território e as suas lutas internas constituíram uma peça no xadrez geopolítico regional e global de então.

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95

Braithwaite Wallis, 16-1-1913, para Foreign Office, Londres; Public Record Office/National Archives, FO, 376/342. 96 Martial Merlin, Gouverneur Général AOF, Dakar, 16-10-1919, para Ministère des Colonies, Paris; CAOM, FM, 597.

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