ESTAÇÃO SÃO BERNARDO 1867 – O VERDADEIRO MARCO ZERO DA HISTÓRIA ANDREENSE

June 5, 2017 | Autor: Claudio Cox | Categoria: History, Social History, Historia, Santo Andre
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CENTRO UNIVERSITÁRIO CLARETIANO CLAUDIO JOSÉ DA SILVA

ESTAÇÃO SÃO BERNARDO 1867 – O VERDADEIRO MARCO ZERO DA HISTÓRIA ANDREENSE

POLO 2015

ESTAÇÃO SÃO BERNARDO 1867 – O VERDADEIRO MARCO ZERO DA HISTÓRIA ANDREENSE

Curso: Licenciatura em História – EaD Disciplina: Trabalho de Conclusão de Curso Tutor a Distância: Giani Vendramel de Oliveira

POLO 2015

A tradição de todas as gerações mortas oprime como um pesadelo o cérebro dos vivos. E justamente quando parecem empenhados em revolucionar a si e as coisas, em criar algo que jamais existiu, precisamente nesses períodos de crise revolucionária, os homens conjuram ansiosamente em seu auxílio os espíritos do passado, tomando-lhes emprestado os nomes, os gritos de guerra e as roupagens, a fim de apresentarse nessa linguagem emprestada (MARX, 1986, p. 17-18).

RESUMO

A história de Santo André transmitida nas escolas da cidade começa no ano de 1553 com a fundação da vila de Santo André da Borda do Campo pelo bandeirante João Ramalho, cuja localização nunca foi definitivamente esclarecida, sabe-se que foi em algum lugar entre a Serra do Mar e o planalto de Piratininga. A não ser por essa remota localização – que pode ou não ter sido no atual território andreense, não existe nenhuma ligação da atual cidade de Santo André com a vila de Santo André lá do século XVI, nada. A cidade que hoje estamos começou a se formar e se desenvolver em meados do século XIX com a construção da Estrada de Ferro São Paulo Railway (Santos – Jundiaí), principalmente quando a Estação São Bernardo (atual Estação Prefeito José Daniel) foi inaugurada em 1867, ou seja, o verdadeiro marco zero da cidade. Palavras Chave: Vila de Santo André; Historiografia, Estação São Bernardo.

INTRODUÇÃO

A história da cidade de Santo André, reverberada pelas instituições do município, remete a sua fundação diretamente ligada ao começo da colonização do Brasil pelos portugueses, mais precisamente ao ano de 1553 com a vila de Santo André da Borda do Campo. Essa construção historiográfica da cidade – desenvolvida a partir de 1938, ano em que o atual município foi emancipado, pela elite intelectual da cidade liderada pelo Dr. Octaviano Armando Gaiarsa – tinha o objetivo claro de atribuir um papel de destaque ao município na historiografia do país e se sobrepôs inadvertidamente as origens mais recentes e, teoricamente reais, da atual formação do município, que remete a meados do séc. XIX com a construção da Estrada de Ferro de São Paulo. Sabe-se que a vila ergueu-se em algum lugar entre a Serra do Mar e o planalto de Piratininga, e só, o resto é especulação. Em 1560 a sede administrativa da vila foi transferida para o Pátio do Colégio de São Paulo – marco zero na história da cidade de São Paulo – e o local foi abandonado e perdeu-se no tempo. Passados três séculos uma nova vila surge ao redor de uma estação da estrada de Ferro de São Paulo ou São Paulo Railway (rebatizada posteriormente de Santos-Jundiaí), era a estação ferroviária São Bernardo. Essa vila, que a princípio pertencera ao município de São Bernardo, tornar-se-ia já em pleno séc. XX o atual município de Santo André.

1°CAPÍTULO – A VILA DE SANTO ANDRÉ Entre a descoberta do Brasil e o processo de colonização passaram-se longos 30 anos. Durante todo esse período a coroa Portuguesa estava mais empenhada nas transações comerciais com as Índias do que em colonizar as novas terras. Esse cenário começou a mudar quando a concorrência com as outras potências comerciais da época – França e Inglaterra principalmente – impôs aos portugueses uma revisão mercadológica, e uma das saídas foi justamente a de colonizar e explorar as novas terras. Neste contexto, diante de uma crise financeira que inviabilizava o processo de colonização a próprio punho, a coroa portuguesa opta por um sistema de concessões de terras, onde os concedidos – com recursos próprios, tinham a responsabilidade de conquistar, colonizar, defender e explorar as novas terras. Esse sistema ficou conhecido como Capitânias Hereditárias e dividiu o território colonial em 15 faixas de terra. Entretanto, o alto custo e a imprevisibilidade do negócio ditou o ritmo do interesse, poucos se aventuraram – duas foram bem-sucedidas, Pernambuco e São Vicente – e o sistema das Capitânias em pouco mais de 10 anos estava prestes a fracassar. A coroa resolve retomar as rédeas da colonização e nomeia um Governador-Geral com o intuito de conduzir politicamente o processo de colonização. Além das Capitânias e do Governador-Geral, surgiram nesse começo de colonização, criadas pelos colonos, as câmeras municipais nas sedes das cidades e vilas. E foi em 1553 que o então Governador-Geral, Thomé de Souza, deu o título de vila a um povoado liderado por um bandeirante chamado João Ramalho, Santo André da Borda do Campo foi o nome de batismo. 1.1 O FUNDADOR JOÃO RAMALHO Sobre a existência da vila e de seu “fundador” não restam dúvidas, o que ainda paira sobre pontos de interrogação é a sua localidade – uma das questões dessa pesquisa – e a biografia do personagem chave, João Ramalho. Em um capítulo inteiramente dedicado a vila de Santo André da Borda do Campo no livro “Terra de Santa Cruz”, Viriato Corrêa expõe: Que ambos existiram – o arraial e o fundador – é que não há mais dúvida. Para muitos o arraial de Santo André da Borda do Campo não era mais que uma furna de bandidos, um

numeroso rancho de malfeitores, colocados no planalto paulista, logo após as muralhas da cordilheira do Mar, ali vivendo como salteadores terríveis, escravizando indígenas, de arcabuz e flechas impedindo que alguém transpusesse os sertões incultos. João Ramalho não era mais que o maioral dessa quadrilha. (CORRÊA, 1956, p. 30)

A tese de que João Ramalho fora mais um degredado deixado na costa brasileira entre 1510 e 1530 – pena muito comum empregada por Portugal naquela época – ganha um apelo ao juntar-se as teorias da sua relação com os índios, Ramalho teria sido resgatado pela tribo Guainases e acabou ganhando prestigio entre os nativos, vide seu casamento com a filha do cacique Tibiriçá, Bartira. Outro episódio que causa discórdia entre autores é o motivo pelo qual o Governador-Geral Mem de Sá ordenou a mudança da vila de Santo André para a vila de São Paulo. O mais provável é que o motivo tenha sido político, sendo que uma atrapalhava o desenvolvimento da outra e na queda de braço entre Ramalho e os Jesuítas, os religiosos levaram a melhor. A vila de Santo André desapareceu do mapa, sem vestígios, e isso nos leva a aceitar a sua fragilidade e precariedade – não restou uma pedra para simplesmente indicar a sua localização exata – e partir desse ponto finalmente, pode-se afirmar que não existe nenhuma relação da vila quinhentista com a atual cidade de mesmo nome.

2°CAPÍTULO – BRASIL IMPERIO, INTEGRAÇÃO NACIONAL E A FREGUESIA DE SÃO BERNARDO Um fato que marca de maneira categórica o começo da separação entre Brasil e Portugal foi a abertura dos portos brasileiros em 1808. Se o monopólio sobre a produção é que determina a submissão, com a abertura dos portos a elite agrária ficou “livre” para negociar, principalmente com a Inglaterra, que por sua vez, com o avanço da indústria e do liberalismo, estava ávida por novos consumidores e fornecedores. Com a queda do absolutismo português em 1820, foi inaugurado um novo sistema politico em Portugal chamado de monarquia constitucional. Os burgueses que tomaram o poder tinham planos de recolonizar o Brasil. Diante desse novo cenário D. João VI – radicado em território brasileiro com toda a corte desde 1808 – viu-se obrigado a voltar. Entre o dilema da recolonização e de uma possível independência republicana, a aristocracia brasileira arquitetou a independência do Brasil de uma maneira que não afetasse os seus interesses, ou seja, mantendo latifúndio e a escravidão. D. Pedro acabou ficando no Brasil, contrariando a corte, e em troca de manter o sistema socioeconômico colonial do jeito que estava, tornou-se Imperador do Brasil com o apoio da aristocracia. A independência do “sete de setembro” de 1822 portanto foi apenas a consolidação do processo de ruptura politica e econômica que já se arrastava por 14 anos. Não houve nenhuma mudança drástica no quadro social-econômico brasileiro no pós-colônia, continuamos com o trabalho escravo e com o latifúndio, a república demoraria quase 70 anos para dar as caras. A Freguesia de São Bernardo – cujo território atualmente corresponde a região do Grande ABC – foi criada durante esse processo de independência do Brasil, no ano de 1812. Em 1887 – dois anos antes da Proclamação da República – a sua população era de pouco menos de 2.000 habitantes. Tudo girava em torno de duas fazendas: Fazenda São Bernardo e Fazenda São Caetano, propriedades dos padres do mosteiro de São Bento desde o final do séc XVII até 1870 quando foram arrematadas pelo Estado. 2.1 A ESTRADA DE FERRO Além da necessidade de integrar o território após a independência antes que processos

separatistas ganhassem fôlego, outro fator que tornou-se determinante para o desenvolvimento da ex-colonia era a sua posição perante a nova ordem mercadológica mundial. Éramos um país rural e a produção agrícola escorria com dificuldades entre o porto e o planalto Paulista e daí para o interior do Brasil. Espelhando-se em um dos seus principais parceiros comerciais, os ingleses, o Governo Imperial viu nas estradas de ferro a solução para compactar o tempo de percurso dentro do nosso extenso território. Entre estudos e processos políticos iniciados em 1835, foi somente em 1852 com a aprovação do Decreto n°641 – que autorizava a concessão para companhias privadas construírem estradas de ferro em solo brasileiro –, que efetivamente o projeto começou andar. A “São Paulo Railway Company Ltd”, assumindo os compromissos do Decreto Imperial n° 1.759 de 26 de abril de 1856, deu início a construção no ano de 1860 a primeira estrada de ferro paulista que ligaria as cidades de Santos e Jundiaí. Batizada de “São Paulo Railway” a primeira fase de operação entrou em vigor no ano de 1867, mas somente em 1° de agosto de 1868 foi oficializada completa a obra e entregue pelo Ministro da Agricultura e Obras Públicas. 2.2 ESTAÇÃO SÃO BERNARDO Um dos principais pontos no projeto da ferrovia, elaborado por engenheiros ingleses, era de que não houvesse ocupação urbana ao longo da via, a fim de diminuir os custos com desapropriações. As primeiras estações intermediárias – que tinham como objetivo principal o reabastecimento das locomotivas, mas também atrair mercadorias que circulavam por caminhos aos arredores – correspondiam a esse perfil, entre elas estava a Estação São Bernardo (atual Prefeito Celso Daniel) na Freguesia de São Bernardo pertencente ao município de São Paulo. A construção da estação foi literalmente o início do povoamento do atual município de Santo André. O começo das operações datam o ano de 1867 e a partir deste, ao redor da estação, começaram a surgir as primeiras atividades tipicamente urbanas, tais como: depósitos, armazéns, alfaiatarias, carpintarias e, principalmente, vias de acesso a outras localidades que não eram atendidas pela ferrovia.

2.3 DISTRITO DE SANTO ANDRÉ

Com a proclamação da República no ano de 1889 a Freguesia de São Bernardo passa a ser um município independente, Lei nº38, de 12 de março de 1889. No entanto, no ano de 1910 o acelerado desenvolvimento promovido pela ferrovia e a forte influência política da família Fláquer, elevam o Bairro da Estação para a condição de Distrito, que recebe o nome de Santo André pela Lei estadual n°1222-A de 14 de dezembro de 1910. Desde o final do séc. XIX as instalações de várias indústrias nas proximidades da Estação São Bernardo ditavam o ritmo migratório para a região. Na década de 1930 o então Distrito de Santo André tornara-se um poderoso parque industrial, paralelamente a força política da elite local também prosperou e no final da década, em novembro de 1938, o Decreto nº9775 passou a sede administrativa do município de São Bernardo para Santo André, anexando a ele os demais distritos da região na época. Em “Antecedentes Históricos do ABC Paulista”, o autor Wanderley dos Santos afirma que fora do senador José Luiz Fláquer a tese de que a localidade onde encontrava-se construída a Estação São Bernardo era a mesma da vila quinhentista de Santo André da Borda do Campo. O político chegou a procurar especialistas do IHGSP para fundamentar essa sua teoria, no entanto, claro, não foi possível confirmá-la. Mas mesmo diante da negativa, a sugestão do nome Santo André para o novo distrito, baseada na tese do senador, acabou sendo acatada e prevaleceu quando este foi elevado para município. A construção da historiografia andreense após a emancipação do Distrito apropriou-se dessa tese/hipótese do senador Fláquer, mesmo não fundamentada, e a partir dela tratou-se de argumentar a ligação entre a vila quinhentista e o atual município. Na sua tese de mestrado, “A invenção da Cidade”, Sandra Perez conclui: (…) o objetivo era o de atribuir um papel grandioso à cidade em origem. Dessa forma, a origem recente da cidade deveria ser esquecida e substituída por uma nova versão sobre a origem, localizada em um passado remoto, o século XVI. A escolha dessa data coincide com a mais antiga referência sobre a ocupação portuguesa no planalto com o povoado, e depois vila em 1553, de Santo André da Borda do Campo. Esta é a razão para substituir-se o nome do município de São Bernardo pelo de Santo André em 1938, j u n t o a mudança de sede do município. Essa mudança, também foi estratégica, pois valorizou o distrito que havia sido fundado recentemente e, portanto as posses dos Fláquer, principais responsáveis pela mudança. (PEREZ, 2010, P.117)

Portanto, assim a história da cidade que nasceu na beira da estrada de ferro e das indústrias, pela mão de imigrantes e migrantes pobres em busca de uma condição melhor de vida, a formação

da classe operária – um movimento importantíssimo da recente história do Brasil – foi trocada pela remota vila do “herói” bandeirante e seus parentes.

3°CAPÍTULO – SANTO ANDRÉ: O POVOADO DA ESTAÇÃO DO CENTRO PARA O SUBÚRBIO A paisagem do Bairro da Estação – como ficou conhecida a região que, após o começo das operações da São Paulo Railway, formaria algumas décadas a frente a cidade de Santo André – no incio da década de 1860 era de um isolamento total. Foi a partir da Estação São Bernardo que a cidade começou a tomar a forma que apresenta atualmente, como relata a doutora em arquitetura Sílvia Passareli em sua tese “Proteção da Paisagem Ferroviária: Memória e Identidade do Bairro Estação São Bernardo (atual Santo André, SP)”: Ao redor da Estação São Bernardo, podemos conferir a abertura de muitos caminhos e estradas interligando as estações ferroviárias, os núcleos não atendidos diretamente pela viaférrea e o Caminho do Mar no levantamento topográfico elaborado pela Comissão Geographica e Geológica de São Paulo, cuja a edição preliminar data de 1906, formando o desenho inicial das ruas estruturadoras da cidade que partem da estação para os arredores e daí para os povoados. A estação torna-se, portanto, o centro irradiador das ruas e avenidas. (PASSARELI, 2005, P.31)

A expansão industrial no Brasil está diretamente ligada as estradas de ferro, os pátios industriais se formavam aos arredores das estações, na futura Santo André não seria diferente. Ainda no séc. XIX as primeiras instalaram-se na região a fim de usufruir das facilidades que a via-férrea proporcionava, a Tecelagem Silva Seabra & Cia, conhecida popularmente Fábrica Ypiranguinha, foi uma delas, inaugurada em 1885 voltada para a produção de brim de algodão. Assim como na Inglaterra do incio do séc.XIX, a economia industrial na região tem como consequência a aglomeração de pessoas no espaço urbano, o anseio por melhores condições econômicas ou até mesmo pela própria sobrevivência promove essa nova realidade social, a vida urbana. Essa transformação acarretou poder econômico e politico para a região do Bairro da Estação, que na década de 1910 tornava-se um Distrito do município de São Bernardo. Com a vinda de industriais de capital internacional no final da década de 1910, os empreendimentos imobiliários tornam-se mais frequentes, segundo Passarelli, a Villa Ypiranguinha foi o primeiro loteamento que tem registros nos arquivos da Prefeitura de Santo André. 3.1 O POVO DA MÃO DE OBRA

A população da Freguesia de São Bernardo – cujo território atualmente corresponde a região do Grande ABC – era de pouco menos de 2.000 habitantes em 1887, segundo Gaiarsa em “Santo André: Ontem, Hoje e Amanhã”, uma obra mais voltada para a cidade de Santo André atual, diga-se século XX. Ainda é muito nítida a tendência eurocêntrica do autor, que agora lança-se sobre os novos heróis municipais, os imigrantes, principalmente os italianos. Vale lembrar que Gaiarsa, nascido em Santo André, era neto de imigrantes italianos. Os primeiros imigrantes chegaram ao Brasil a 28 de janeiro de 1877, desembarcando no Porto de Santos, tendo sido encaminhados para as terras de S. Caetano. A leva seguinte chegou em julho, dia 22. Seus componentes foram encaminhados para as colônias de São Bernardo, cujas terras, cedidas pelos beneditinos haviam sido adquiridas pela importância de dezoito contos de reis. Outras levas se sucederam e os resultados colhidos pelo Governo superaram as expectativas. O homem simples e laborioso demonstrou-se ativo e ordeiro. (GAIARSA, 1991, P. 45)

A migração interna para a região do ABC foi intensificada somente a partir dos anos 1930, com um aumento significativo no número de indústrias e também devido a crise do café no interior do Estado. Ademir Medici em “Migração, Urbanismo e Cidadania” reconstrói essa cidade dos bairros operários, das antigas colônias de imigrantes europeus que vão cedendo o seu espaço às industriais e aos loteamentos residências. A formação de cada bairro é traduzida através do depoimento dos moradores, boa parte a partir dos anos 1940 e 1950, período onde se concentra um maior crescimento demográfico e, consequentemente, uma explosão urbana na cidade. Peculiaridades como a construção da “Vila Popular” em 1947, na Vila Santa Teresinha, com aproximadamente 500 casas populares destinadas aos operários da cidade ou da “Vila Sem Reboque” como ficou conhecido popularmente o Bairro Camilópolis nos anos 1930, por conta das casas construídas pelos migrantes do interior do Estado que permaneciam longos períodos sem acabamento externo. Outro trabalho que resgata esse importante momento do povoamento da cidade a partir dos anos 30 é “Memória e História de Negros e Negras na Cidade de Santo André”, produzido no ano de 2006 em uma parceria entre a própria prefeitura da cidade e a Soweto Organização Negra – grupo ativista ligado ao movimento negro de combate ao racismo.

Se o trabalho na indústria era o objetivo de quase todos que resolviam mudar-se para a região, para os negros esse objetivo continha um grau de dificuldade ainda maior, segundo os autores: “O ingresso de trabalhadoras e trabalhadores negros nas indústrias de São Paulo fora, desde o início, desproporcional em relação ao número de trabalhadores brancos imigrantes”. Ainda no final da década de 1920 existia um incentivo do Estado para imigrantes europeus e mesmo com o fim dessa prática, o racismo se incumbia de fechar as portas das fábricas para negros. Foi no trabalho informal foi que grande parte desses homens e mulheres negros de Santo André construíram boa parte da cidade, principalmente a periferia. Uma das depoentes do livro, Dona Claunidia, relata essa Santo André já no começo dos anos 1960: "Quando me mudei para o Jardim São Camilo, aqui não tinha rua, não tinha nada. O pessoal catava veado e buscava lenha para cozinhar, porque não tinha fogão a gás."

CONSIDERAÇÕES FINAIS Essa discussão entre a história de uma cidade que é representada por um suposto herói bandeirante do século XVI com a cidade operária do século XIX precisa ser levada para o ensino básico municipal, não pode ser restrita a uma pequena parcela privilegiada da população em centros acadêmicos. No estudo e na construção da nova História, a chamada escola de Annales, as histórias econômicas e sociais ganharam visibilidade e uma nova abordagem sobre a originalidade das fontes históricas que desencadeou um processo de desmitificação histórica, bem como a utilização e análise de novas fontes ancoradas por outras ciências. Tudo isso confrontou a história tradicional do séc. XIX construída basicamente sob a ótica dos grandes eventos e de seus principais protagonistas, caso de Santo André. A história desses imigrantes e migrantes pobres aqui da região do ABC Paulista – que a partir de uma estação ferroviária, desenvolveram a cidade que consequentemente acabou se tornando o berço da industrialização do país – faz parte dessa nova ótica, contrasta com a construção historiográfica de um protagonista único, acolhe novos personagens que começam a se reconhecer dentro desse contexto histórico, ou seja, a história de uma cidade é a história das pessoas que a habitam.

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