Estado de Direito Import/Export: Para um Estudo da Cooperação Parlamentar nos PLOPs

October 10, 2017 | Autor: Bruno Bernardes | Categoria: Parliamentary Studies, Parliamentary Cooperation
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Relatório de Estágio da Licenciatura em Relações Internacionais - Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade Técnica de Lisboa

ESTADO DE DIREITO: IMPORT/EXPORT - Para um Estudo da Cooperação Parlamentar Portuguesa com os PLOPs

Bruno Gonçalves Bernardes Orientadores: Prof. Doutor José Adelino Maltez e Prof. Doutora Raquel Patrício Novembro de 2008

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Tanto Mar Foi bonita a festa, pá, Fiquei contente, Ainda guardo renitente um velho cravo para mim.

Já murcharam tua festa, pá, Mas certamente, Esqueceram uma semente nalgum canto do jardim.

Sei que há léguas a nos separar, Tanto mar, tanto mar, Sei, também, quanto é preciso, pá, "avegar, navegar.

Canta primavera, pá, Cá estou carente, Manda novamente algum cheirinho de alecrim. Chico Buarque

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ABREVIATURAS

AHP – Arquivo Histórico-Parlamentar AIFPLP – Assembleia Interparlamentar do Fórum dos Parlamentos de Língua Portuguesa A)A – Assembleia Nacional de Angola A)CV – Assembleia Nacional de Cabo-Verde A)PGB – Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau A)STP – Assembleia Nacional de São Tomé e Príncipe APCE – Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa APD – Ajuda Pública ao Desenvolvimento APOSCE – Assembleia Parlamentar da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa APEM – Assembleia Parlamentar Euro-Mediterrânica APM – Assembleia Parlamentar do Mediterrâneo AP)ATO – Assembleia Parlamentar da NATO ARM – Assembleia da República de Moçambique ARP – Assembleia da República Portuguesa ASG-PLP – Associação de Secretários-Gerais dos Parlamentos de Língua Portuguesa AUEO – Assembleia da União da Europa Ocidental BE – Bloco de Esquerda CA – Conselho de Administração da Assembleia da República CACDLG – Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias CAE – Comissão de Assuntos Europeus CDS-PP – Centro Democrático e Social – Partido Popular CE – Comissão Europeia CFI – Curso de Formação Interparlamentar CFPI – Centro de Formação Parlamentar e Interparlamentar da Assembleia da República CMP – Comissão Mista Permanente C)ECP – Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidade Portuguesas COSAC – Órgão de Técnicos de Comissões Parlamentares Especializadas na Integração Europeia CPLP – Comunidade dos Países de Língua Portuguesa CRP – Constituição da República Portuguesa DAR – Diário da Assembleia da República DP – Divisão de Protocolo da Assembleia da República DR – Diário da República

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DRI – Divisão de Relações Internacionais EMB – Embaixador/Embaixadora/Embaixada FED – Fundo Europeu para o Desenvolvimento FPLP – Fórum dos Parlamentos de Língua Portuguesa GARIP – Gabinete de Relações Internacionais e Protocolo da Assembleia da República GPA – Grupo Parlamentar de Amizade ILB – Instituto Legislativo Brasileiro I)A – Instituto Nacional de Administração LOFAR – Lei da Organização e Funcionamento dos Serviços da Assembleia da República M)E – Ministério dos Negócios Estrangeiros MPD – Movimento para a Democracia (Cabo-Verde) OAR – Orçamento da Assembleia da República O)U – Organização das Nações Unidas PAICV – Partido Africano da Independência de Cabo-Verde PALOPs – Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa PA)A – Presidente da Assembleia Nacional de Angola PA)CV – Presidente da Assembleia Nacional de Cabo-Verde PA)PGB – Presidente da Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau PA)STP – Presidente da Assembleia Nacional de São-Tomé e Príncipe PAR – Presidente da Assembleia da República PARM – Presidente da Assembleia da República de Moçambique PCP – Partido Comunista Português PE – Parlamento Europeu PEV – Partido Ecologista “Os Verdes” PLOPs – Países de Língua Oficial Portuguesa PM – Primeiro-Ministro P)TL – Parlamento Nacional de Timor-Leste PPTL – Presidente do Parlamento de Timor-Leste PS – Partido Socialista PSD – Partido Social Democrata RAR – Regimento da Assembleia da República SF – Senado Federal Brasileiro SG – Secretário-Geral do Parlamento UE – União Europeia

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UIP – União Interparlamentar U)ILEGIS – Universidade do Legislativo Brasileiro U)TAET – Missão Especial das Nações Unidas para Timor-Leste

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AGRADECIME)TOS

Este relatório de estágio é o marco do fim da minha primeira viagem por terras das relações internacionais. O mundo das ciências ditas humanas e sociais, onde se inserem as Relações Internacionais, desenvolve-se através dos valores e não contra eles. Este trabalho de report inscreve-se nesse mundo onde a análise objectiva afinal esconde artifícios outros, onde as sebentas da ciência positivista não chegam a penetrar. Sabendo que a real episteme faz-se também com valores, com amor e entrega não apenas ao trabalho mas também àqueles que nos rodeiam e nos inspiram. Sabendo que a ciência e o método são ferramentas humanizáveis e que é entre o boiar e lutar contra a corrente que vamos encontrando os elementos essenciais da nossa análise. Sabendo que a análise é ela mesma uma religião com hábitos mutáveis. Sabendo tal como Miguel de Unamuno que louco é aquele que não vive poética ou religiosamente, deixo este espaço para agradecer aos demais. Ao Prof. José Adelino Maltez pelas palavras ditas e escritas: pela inspiração pessoal e académica. Á Prof. Raquel Patrício pela disponibilidade e pelos ensinamentos. Também a Cristina Ferreira, chefe da Divisão de Relações Internacionais, um muito obrigado pela disponibilidade, informação e coordenação. Como também a José Manuel Araújo, director do Gabinete de Relações Internacionais e Protocolo e a Domingos de Almeida Machado, chefe da Divisão de Protocolo. Não poderia também esquecer o companheirismo e a ajuda de todos os funcionários do GARIP, com especial carinho por Alexandra Graça, Rita Ferreira, Nuno Paixão, Sofia Pinheiro, Patrícia Grave, Ana Oliveira, Isabel Leal, Paula Cristina, José Manuel Correia, Helena Alves, Zara Almeida. Também a Teresa Paulo da CAE pela informação e disponibilidade, Nélia Monte Cid e Joaquim Ruas da CACDLG, José Diogo, João Viegas e Leonor Bastos; também um saudoso e amigável cumprimento a Lucinda de Almeida. Ainda aos deputados Vítor Ramalho, João Soares, Celeste Correia, João Rebelo, Umberto Pacheco, António Filipe e Ana Catarina Mendonça pelo tempo e paciência.

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Aos colegas de curso: Rui Alves, Pedro Martins, Hugo Palma, Inês Narciso, Carlos Apolinário, Elisabete Gonçalves e Joana Ramalho pela descoberta, amizade e troca de sonhos. O meu pai que sempre viveu o que é. À minha mãe pela coragem e carinho constantes. À avô Laura que me resgatou. Ao Professor Artur Freitas pelos acordes, notas, escalas, arpejos e pautas de música infindáveis, mas sobretudo pela mestria na amizade e na arte de ensinar. Os meus amigos: José Luís, Patrícia e Sílvia pelos anos de profunda amizade e compreensão mútuas; Heitor que mesmo no mar continua a estar próximo; Gémeas Estêvão pelos momentos e pelas palavras; Pietro Rossi e Kim pela aprendizagem mútua no mundo dos sentimentos e dos sentidos; Freddy Roldan pela voz; ao Vítor e à sua família pelo exílio cedido; e principalmente à Sarah que o Atlântico trouxe em amor e que o Atlântico levará com saudade do futuro. Relembro ainda o contributo das mãos do António Pinho Vargas e do sopro do José Nogueira, do saxofone do Julian Arguëlles, das melodias do Coltrane e do Jan Garbarek, da harmonia em dedilhado cromático do Keith Jarrett, das composições inconfundíveis da Carla Bley, da poesia e voz de Leonard Cohen, das palavras sibilantes de Chico Buarque e sobretudo as noites passadas no Hot Clube de Portugal. Obrigado a todos por me ajudarem na busca do poema que há em mim.

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ABSTRACT

O objectivo deste relatório de estágio é o de enriquecer o estudo da cooperação parlamentar portuguesa, tendo como case study os seis meses em que estagiei na divisão de relações internacionais da Assembleia da República. O relatório analisa a actividade da cooperação parlamentar da ARP com os países africanos de Língua Portuguesa e com Timor-Leste. A escolha que recai sobre estes países permite avaliar o trabalho da Assembleia da República nos processos póscoloniais de democratização, especificamente na capacitação da vida parlamentar desses Estados. O primeiro capítulo é de ordem metodológica; incluímos o quadro teóricoconceptual e dois temas agregados: 1) Administração Colonial Portuguesa e 2) A Voz da Democracia. Estes temas inserem a cooperação parlamentar no pós-colonial português e mais especificamente nos processos democratizantes em países com défice de estatalidade. Este défice é analisado sobre o prisma da teoria da divisão dos poderes e sob a sombra do Direito Público ou das suas formas exportadas. É por isso que incluo um primeiro ponto subordinado ao tema da Administração Colonial, onde podemos fazer alguma pré-análise comparativa entre o período colonial e o pós-colonial ao nível do aprendizado político, jurídico e institucional. O ponto seguinte abarca os processos de importação e exportação do acervo do Estado de Direito em África e na Ásia de Língua Portuguesa. O segundo capítulo aborda as competências internacionais da Assembleia da República

em

variados

níveis:

PAR,

GARIP,

Comissões,

Organizações

Interparlamentares e GPAs. Esta primeira parte serve para apresentar as actividades de diplomacia parlamentar da ARP. O terceiro capítulo integra todas as actividades de cooperação parlamentar ligada aos PLOPs em que participei ou onde fui observador na qualidade de estagiário, tais como reuniões de trabalho com deputados ou funcionários parlamentares, reuniões de Grupos Parlamentares de Amizade, reuniões de comissões, reuniões de trabalho, cerimónia do 25 de Abril e conferências parlamentares. Para além de descritiva, esta

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parte do trabalho especifica as tipologias da cooperação parlamentar portuguesa com os PLOPs ao nível dos serviços internos da ARP. O quarto capítulo é uma reflexão sobre o esforço de capacitação dos parlamentos de Língua Portuguesa na actualidade. Até que ponto estas actividades desenvolvidas têm impacto na democratização daquelas sociedades? Que tipo de aprendizagem jurídica, administrativa e política temos vindo a implementar no espaço lusófono? Que futuro para o interparlamentarismo de língua portuguesa? São algumas das questões que tentaremos responder. Por fim incluímos um pequeno estudo comparativo entre a formação parlamentar que é feita na ARP e no SF.

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§1 QUESTÕES DE MÉTODO

Como qualquer outro trabalho científico, devemos primeiro debruçarmo-nos sobre os objectivos e os caminhos que queremos percorrer para analisarmos o objecto de estudo a que nos propusemos. Os objectivos são o mote, ou se quisermos enveredar por caminhos poéticos, podemos considerá-los como a ânsia da descoberta tornada paixão de analisar, tendo sempre presente a objectividade e a imparcialidade devida que nos compete. Temos, então, de ser justos com a informação disponível e, criteriosos na indução da restante. Só assim poderemos transformar a informação em conhecimento, com o menor enviesamento possível a partir da sua origem. A origem aqui é importante. Num trabalho final de curso em que nos é proposta a escrita de um relatório de estágio, temos de ter a atenção necessária para o agrupamento dos dados segundo o tema e o objectivo, num quadro de experiência profissional de seis meses. Essa experiência permitiu-nos, não só adquirir uma série de novos conhecimentos técnicos, como também ter acesso a bibliografia especializada e a um sem fim de informação recolhida no local, através dos próprios agentes ou actores. Os caminhos são ditados por um método previamente definido, mas estão também dependentes do que possamos intuir ao longo da análise dos dados. Esses caminhos justificam a busca de uma conclusão que nos permita confirmar ou infirmar as hipóteses de que partimos, e verificar, através do quadro teórico-conceptual, do ajustamento do método ao conteúdo do trabalho.

Primeiras Linhas Neste primeiro esboço tentaremos traçar um plano metodológico, os objectivos e os caminhos possíveis a percorrer para descrever e analisar a cooperação parlamentar portuguesa, tendo presente a nossa experiência como estagiário na Divisão de Relações Internacionais da Assembleia da República.

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O tema encerra em si dois conceitos que interessaria descortinar nesta secção do trabalho: cooperação parlamentar e espaço lusófono. Se o primeiro diz respeito à temática central do trabalho, o segundo divide-o metodologicamente através do elemento geográfico. Entendemos cooperação parlamentar como uma das ferramentas utilizadas pela diplomacia

parlamentar,

no

quadro

da

inter-ajuda

entre

parlamentos;

se

compreendermos a diplomacia parlamentar como o fazemos em relação à diplomacia clássica, podemos inseri-la numa dada política dirigida de médio, longo prazo com fins a atingir, ou seja, como uma das ferramentas de uma política externa dos parlamentos. Ora isso não se verifica no actual quadro das relações interparlamentares, visto que apesar de existir uma agenda definida por cada parlamento, esta não está nem dependente do governo, observada a regra da separação dos poderes entre órgãos soberanos, e muito menos segue um documento oficial com uma determinada doutrina, estratégia continuada e princípios irrevogáveis. Temos, então de definir um outro quadro para o conceito, que não esteja limitado por uma visão intergovernamentalista. Se introduzirmos uma análise sociológica, podemos considerar que a cooperação parlamentar faz-se num regime de reciprocidade entre parlamentos, tidos como órgãos soberanos, numa continuada relação que conduz ao aprofundamento do processo democrático e liberalizante das sociedades a partir de aprendizagens e mimetismo social. Tal como o poder executivo é eleito para fazer executar uma política governamental e uma doutrina, ao poder legislativo cabe-lhe fiscalizar e controlar o poder executivo, ou seja, assumir o papel da representação das variadas realidades sociológicas que habitam um determinado Estado. Nesse sentido, a cooperação parlamentar é uma das vertentes externas dos parlamentos, que possibilita a exportação de um quadro mental ocidental de organização política e técnica, tendo como final objectivo aplicar um modelo de controlo e fiscalização do poder executivo cada vez mais eficaz: detectar e prevenir abusos, comportamentos arbitrários ou condutas ilegais ou inconstitucionais por parte do governo e de instituições públicas, proteger os direitos dos cidadãos, controlar o uso dos dinheiros públicos, melhorar a eficiência da aplicação da legislação aprovada e monitorizar a sua efectividade no terreno e melhorar a

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transparência das operações governamentais, aumentando a confiança dos cidadãos nas instituições e na administração pública1. Mas podemos não estar satisfeitos com esta caracterização conceptual e podemos continuar a desbravar pela floresta de conceitos que afloram quando abordamos este tema. Se ao considerarmos que a cooperação parlamentar é uma das ferramentas da tal diplomacia parlamentar e, se ao considerarmos que ela pode ser feita em palcos diferenciados e através de vários agentes parlamentares, podemos dividir o conceito em dois componentes: do ponto de vista da relação, ou seja, se é bilateral ou multilateral; e do ponto de vista do conteúdo, sendo técnico ou político. Entre a cooperação parlamentar bilateral e multilateral residem as diferenças que encontramos nos manuais que estudam a diplomacia clássica e os tipos de ajuda da cooperação internacional: até aqui temos vindo a utilizar a obra Diplomacia Pura de José Calvet de Magalhães, por nos parecer mais adequada. Considerando que os novos passos que conduziram os Estados para um quadro de relações multilaterais, permitiram os encontros entre grupos e comunidades estaduais em grandes conferências onde se procura o consenso em matérias que não são mais nacionais, observamos o mesmo tipo de fenómeno no caso da cooperação parlamentar. Invés de se fazer unicamente no plano bilateral, ela faz-se também em organizações internacionais que investem em assembleias parlamentares internacionais (como veremos no capítulo seguinte). Já a diferença entre cooperação técnica parlamentar e cooperação política parlamentar, reside no facto de que a primeira é essencialmente conduzida por e para funcionários técnicos parlamentares e tem como objectivo final a capacitação dos parlamentos na prossecução de um melhor sistema legal e de condições de trabalho e eficiência no controlo e fiscalização do poder executivo, tanto em plenário como nas comissões. A segunda é dirigida por partidos ou por parlamentares eleitos e tem como objectivo formar parlamentares ou políticos inseridos em partidos, para uma melhor consciencialização da importância dos partidos nas sociedades democráticas e no sentido de preparar os partidos que estão na oposição para o exercício de awareness face aos possíveis abusos do partido do governo ou do próprio governo.

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Hironori Yamamoto, Tools For Parliamentary Oversight: A Comparative Study of 88 "ational Parliaments, pp.9-11. 13

A cooperação parlamentar nasceu num mundo globalizado, a par dos movimentos transnacionais e da abertura dos mercados; ela é, assim, produto deste novo mundo imprevisível pós-guerra-fria, onde os arquipélagos-ilha isolados em si mesmo dão lugar aos arquipélagos-continente tornados regiões, civilizações ou organizações intergovernamentais. Nesse sentido a cooperação parlamentar é uma ferramenta externa dos parlamentos, alicerçada numa dada diplomacia parlamentar, que tem como fim a ajuda interparlamentar, quer no campo técnico ou político, quer a nível bilateral quer multilateral, num quadro de capacitação dos parlamentos por aprendizagem e mimetismo. Quanto ao nosso espaço geográfico, preferimos defini-lo nas fronteiras do espaço lusófono, considerando os países africanos de língua oficial portuguesa e TimorLeste e por outro lado o Brasil. Dividimo-lo em dois blocos para melhor ajustar o modelo que queremos provar, visto que tanto o sistema democrático nos PLOPs como em Timor-Leste é mais recente que no Brasil e depois porque o sistema e a experiência parlamentares comportam-se de formas diferentes nestes Estados. Teremos então um primeiro bloco onde a ARP participa activamente como motor da cooperação parlamentar, e no outro o caso do Senado Federal e da Câmara de Deputados, analisados apenas no quadro da cooperação parlamentar no espaço lusófono. Quanto à divisão metodológica preferimos fazer uma primeira parte descritiva, ou seja, que contenha uma descrição da vertente externa da ARP, abarcando a legislação referente à mesma e o funcionamento de cada elemento, ou seja um quadro descritivo das componentes da cooperação parlamentar portuguesa. Uma segunda parte que congrega dados qualitativos e quantitativos referentes às acções de cooperação parlamentar que ocorreram durante os seis meses do estágio. E por fim um estudo comparativo ou estudo de caso onde analisamos a vertente externa da ARP face à do Senado Federal brasileiro. Assim sendo o objectivo geral é o de estudar a actividade externa da ARP e mais especificamente abarcar um estudo comparativo no final para perceber o futuro da cooperação parlamentar no espaço lusófono. Escolhi este tema por duas razões essenciais: histórica e metodológica. Histórica pois desde que nos tornámos ex-metrópole de um império colonial tem faltado a análise destes temas, inseridos num novo espaço português de diálogo pós-colonial. Sendo aluno de um Instituto que nem há poucas dezenas de anos era a escola colonial por 14

excelência em Portugal, na formação e ensino, seria de esperar que quisesse enveredar por um estudo que se encontrasse no espaço construído e imaginado por nós e agora continuado pela beleza da diversidade dos povos, unidos em laços de sangue e língua. Metodológico pois é urgente repensar os moldes do estudo das relações internacionais e incluir nela uma vertente de relações parlamentares internacionais, cruzando a análise da politologia, sociologia e das relações internacionais propriamente ditas. Não existem estudos desta natureza em lado algum, para além dos que são realizados pelas instituições e organizações internacionais intervenientes no processo, ou seja, não existe um estudo científico desta nova realidade.

Quadro Teórico-Conceptual Assumimos como hipótese central deste trabalho o estudo da cooperação parlamentar inserida nos actuais processos de exportação do Estado de Direito em sociedades com democracias mais recentes. Ou seja, avaliar a exportação do modelo político ocidental através do mimetismo de regras e condutas para o bom funcionamento dos parlamentos. A partir daqui podemos edificar uma série de hipóteses secundárias que queremos abordar no relatório. Um deles refere-se à própria conduta do poder legislativo, ou seja, como se comporta ele nos PLOPs, e de que forma essas regras se assemelham ao do sistema português. Outra problemática prende-se com o controlo e a fiscalização efectivas que existem nestes parlamentos, ou seja, que sistema democrático e que relação, baseada na lógica da separação de poderes, subsiste? Se seguirmos a lógica de E. Kafft Kosta, que considera o poder executivo como um “poder operativo-vital”2, ou seja, que se assumiu como instância vital do funcionamento do sistema democrático e da máquina administrativa, temos de considerar a importância da figura do chefe de Estado ou de governo nos PLOPs face ao parlamento. Daqui partimos para a análise do sistema político, se ele é presidencial, parlamentar ou semi-presidencial; nesta secção seguimos o seminário organizado pelo Instituto Diplomático, O Semipresidencialismo e o Controlo da Constitucionalidade na África Lusófona, que apresenta algumas pistas interessantes sobre o assunto tais como as orações proferidas pelo Prof. Armando 2

E. Kafft Kosta, Estado de Direito – O Paradigma Zero: Entre Lipoaspiração e Dispensabilidade, p.432. 15

Marques Guedes, Processos de Constitucionalização dos Estados Africanos Lusófonos entre Factos e "ormas; Teorizando o Semi-Presidencialismo – Angola e São Tomé e Príncipe de N’Gunu N. Tiny e O Arquivo Histórico da Lusofonia e as Poleis Africanas em Gestação de Pedro Velez, bem como a tese de doutoramento do Prof. Kafft Kosta, Estado de Direito – O Paradigma Zero: Entre Lipoaspiração e Dispensabilidade, uma obra de referência sobre a importação do modelo de Estado de Direito democrático e suas implicações na actual Guiné-Bissau. Quereremos nesta fase simplesmente provar as degenerações do poder executivo e as hipóteses presidencialistas que se apresentam, e tal como Sundquist considerar que “virtualmente, todos os países, na América Latina e em África, que adoptaram o sistema presidencial degeneraram, mais cedo ou mais tarde, em ditadura.”3 Depois queremos considerar o papel da cooperação parlamentar portuguesa para o reforço destes parlamentos, num quadro de continuada presidencialização ou governamentalização. Desta forma tentaremos procurar sinais que provem a reestruturação destes parlamentos, na sua capacitação administrativa e técnica, e no reforço dos grupos parlamentares para um melhor controlo e fiscalização das acções governativas tanto no plenário como em comissões e inquéritos. Finalmente tentaremos cruzar dados sobre a formação parlamentar levada a cabo pelo Senado Federal e pela Câmara dos Deputados brasileiros, no sentido de fazer uma ponte com o serviço de relações internacionais da ARP, procurando saber se existe alguma cooperação parlamentar que possamos apelidar de lusófona. Os tipos de dados e fontes que procurámos agregar neste trabalho são de natureza bibliográfica, de recolha no terreno e informação parlamentar. Bibliográfica consideramos a de tipo genérico, ou seja, obras de referência da área de estudos da Ciência Política, Relações Internacionais, Direito Constitucional e Sociologia; neste grupo incluímos Teoria das Relações Internacionais do Prof. Adriano Moreira, Curso de Relações Internacionais do Prof. José Adelino Maltez, Direito Constitucional do Prof. Gomes Canotilho, Manual de Direito Constitucional do Prof. Jorge Miranda, "as Vésperas do Leviathan do Prof. Hespanha e Estado de Direito – O Paradigma Zero: Entre Lipoaspiração e Dispensabilidade do Prof. E. Kafft Kosta. De tipo técnica

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J. L. Sundquist, The U.S. Presidential System as Model for the World, cit. por E. Kafft Kosta, ibidem, p.431. 16

consideramos todos os livros e folhetos de organismos internacionais e de instituições nacionais, especificamente sobre cooperação parlamentar, cooperação internacional e espaço da lusofonia. Especializada consideramos toda a bibliografia fornecida pelas edições da ARP como é o caso da obra lançada este ano Parlamento na Prática e de outras obras listadas na última parte da nossa bibliografia. A recolha no terreno envolveu a clássica entrevista dirigida a funcionários e deputados envolvidos em acções de cooperação parlamentar e na recolha de informação disponibilizada pelos serviços de relações internacionais e de informação parlamentar. Utilizámos os meios de informação ao nosso dispor, visto que não temos a capacidade neste trabalho de incluir um estudo de caso feito no terreno. Metodologicamente a organização dos dados segue no segundo capítulo uma ordem qualitativa, no terceiro ela é quantitativa e qualitativa com a mostra de gráficos e uso de ferramentas informáticas de análise de dados e no quarto capítulo ela é qualitativa de natureza comparativa. Por fim o nosso quadro teórico-conceptual admite a seguinte estrutura:

Sociedade Civil Transnacional

Parlamentos

O indivíduo nas relações internacionais

Voz dos Cidadãos

O século do povo

Relações Interparlamentares DEMOCRACIA

Cooperação 17 Internacional

Parlamentar

As relações interparlamentares surgem num mundo globalizado, em constante transformação, sem previsibilidade, num processo de complexidade crescente, onde as estruturas se multiplicam para estar presentes em variados palcos ao mesmo tempo; num jogo de poder multipolar, onde a sociedade internacional passa a ser anti-estadual, não admitindo a unipolaridade do decision-making numa hierarquia das potências. É por isso que o último século não foi um segundo iluminismo, mas sim o século dos povos mudos do mundo, da descolonização, da libertação dos totalitarismos. Ora nesse quadro de sociedade civil transnacional os cidadãos não encontram fronteiras e passam a falar em torno de grandes espaços, numa ampliação dos seus patamares de liberdade, a caminho da comunidade; as relações interparlamentares são um caso específico dessa participação, visto que os representantes destes povos democráticos também têm participado na cena internacional. Este arranjo metodológico que fazemos não contradiz o conceito de indivíduo nas relações internacionais do Prof. Adriano Moreira, mas sim contempla-o, uma vez que é o indivíduo que, através da representação política do deputado e do serviço público administrativo participa nas relações interparlamentares. Neste mundo da cooperação e da exportação de fenómenos, instituições e comportamentos, onde as fronteiras deixam de fazer sentido, a democracia surge como o melhor dos regimes a implantar, num quadro neo-realista onde a potência vencedora do último grande cataclismo mundial e de um conflito gélido impôs pelo soft power comportamentos sociais por mimetismo através não só da economia liberal mas também pela ânsia de conhecimento e pela troca de gadgets, informação e conhecimento; mas também o impôs pelo hard power, de que as últimas investidas no Afeganistão e no Iraque o atestam, ou até mesmo de outros modelos imperialescos para os lados da Geórgia. Mas se assistimos a um movimento centrípeto, outras centrifugações se originam na revolta dos povos invadidos no seu seio, de que o terrorismo é o seu maior sinal. As relações interparlamentares são assim uma das ampliações da voz dos povos, e a cooperação parlamentar uma forma de cooperação específica que alarga o espectro das democracias em sociedades para-totalitárias, tal como o faz a cooperação internacional. Esperamos que este novo patamar das relações internacionais sirva não os interesses de uma nova balança de poderes ou de uma hierarquia das potências, mas sim o do Estado, último garante de que a nossa liberdade e criatividade não sejam engolidas pelo modelo robot. 18

Em seguida apresento duas propostas de estudos agregados ou para futuro estudo científico e aprofundado, que inclua um elemento histórico e uma conceptualização mais vasta dos processos de engenharia social globalizantes, no caminho para a democratização. O primeiro esboço fala do modelo de administração colonial português, numa resenha histórica sobre alguns processos de exportação e o segundo é uma proposta de análise da actual sociedade internacional e da democracia no ocidente e no espaço lusófono, mais especificamente. Na primeira proposta fazemos uma resenha histórica sobre a administração colonial portuguesa, baseando-nos tanto em obras contemporâneas como estadonovistas e novecentistas: Passagens para África: O Povoamento de Angola e Moçambique com "aturais da Metrópole (1920-1974) de Cláudia Castelo, as actas dos seminários da secção colonial do Congresso do Mundo Português, A Exposição do Mundo Português e a sua Finalidade "acional de Augusto de Castro, Política Colonial de Adriano Moreira, La Administración de Justicia en África Continental Portuguesa de

Alfredo

Héctor

Wilensky,

L’empire

Colonial

Portugais:

Organisation

Constitutionelle Politique et Administrative de Michel Frochot, Administração Colonial de Thomaz de Almeida Garrett, as actas da Primeira Conferência Económica do Império Colonial Português da iniciativa do Ministério do Ultramar, O Império de Henrique Galvão, entre outros. Queremos simplesmente apresentar factos históricos que legitimem o actual discurso institucional sobre a cooperação parlamentar portuguesa com as antigas colónias e não um tratado jurídico-político sobre a administração colonial. A segunda proposta, Voz da Democracia, é uma abordagem sobre o Parlamento, através de uma resenha histórico-conceptual sobre o Estado de Direito, sua fundação e exportação. Neste espaço recorremos a autores como Luís Cabral de Moncada em Estudos Filosóficos e Históricos, Contributo para uma Teoria do Estado de Direito de Jorge Reis Novais, o artigo de Paulo Otero A Subversão da Herança Política Liberal: A Presidencialização do Sistema Parlamentar, Direito Constitucional de Gomes Canotilho, Teoria Geral da Política de Norberto Bobbio, de Reinhold Zippelius Teoria Geral do Estado, e Ensaio Sobre o Problema do Estado de José Adelino Maltez. Será também relevante abordarmos muito esquematicamente a experiência parlamentar portuguesa, tendo em consideração: O Lugar da Assembleia da República no Sistema Político de Luís Sá e Parlamento na Prática, uma obra editada este ano e escrita por 19

funcionários da ARP, The Decline of Legislatures de James Bryce, e os artigos da Revista Análise Social: O Parlamento Português: Análise Organizacional da Actividade Legislativa de Walter Opello, A Assembleia da República e a Consolidação da Democracia em Portugal de Miguel Lobo Antunes e Sobre o Parlamento Português: Partidarização Parlamentar e Parlamentarização Partidária de Manuel Braga da Cruz.

1. Da Administração Colonial Portuguesa A Constituição de 1822 nasce no ano da independência do Brasil. A partir dessa altura desenham-se duas concepções distintas sobre a ocupação territorial da África portuguesa: uma primeira que se baseava essencialmente no investimento estatal com a “transplantação de pedaços de Portugal rural para África”4, através de uma política de desenvolvimento e civilização dos povos. Esta primeira visão tinha como principais cultores Sá da Bandeira, Paiva Couceiro (governador de Angola entre 1907 e 1909) e mais tarde Norton de Matos que seria governador-geral de Angola (1912-1915). E uma segunda visão em que se enquadravam Oliveira Martins e António Enes que defendiam a exploração económica sem iniciativa estatal. Esta última era sustentada pela geração de 95 já depois do cisma de Berlim e das campanhas de África preconizadas por Enes e Paiva Couceiro entre 1891 e 18955 e mais tarde por Teixeira Pinto na Guiné. As chamadas campanhas de libertação que se tinham vindo a implementar para a ocupação efectiva do território das colónias africanas, marcava o fim do império das feitorias. Ao contrário do Brasil em que a iniciativa permitiu o movimento dos bandeirantes, em África a colonização e sua administração basearam-se nos portos de mercadoria e na ocupação litoral. A organização política e territorial das tribos nestes territórios, não cortada pelos decretos colonialistas europeus, surgia como entrave à fixação administrativa e ao controlo militar pela metrópole. Além disso não só os portugueses apostavam na ocupação de tipo “alfandegária”; esta era também a lógica de ocupação inglesa à qual os próprios alemães se opunham, como são claras as palavras de Fabri, missionário alemão que em 1856 edita “Precisa a Alemanha de Colónias? Uma Observação Político-Económica”, seguindo o pensamento de Moldenhauer e 4

Cláudia Castelo, Passagens para África: O Povoamento de Angola e Moçambique com "aturais da Metrópole (1920-1974), p.49. 5 José Adelino Maltez, Tradição e Revolução, I vol., p.495 20

Hubbe-Schleiden: “Muitas vezes tive occasião de observar como as annexações no sul da Africa se faziam, e as idéas do ministério das colónias inglez, de fazer annexações no interior da Africa. O processo para realisar a posse era até agora muito simples e summario. Um navio de guerra inglez apparecia n’uma bahia apropriada e plantava ahi bandeira ingleza. Creava-se uma alfandega e mandavam-se alguns funccionarios, acompanhados por alguns empregados, ao interior fazer com os chefes dos indígenas contratos de rendas annuaes e nos quaes promettiam submetter-se á coroa ingleza.”6 O modelo administrativo português é específico, não só na sua concepção metapolítica de matriz histórica, como nas suas raízes católicas. É esse modelo que é negociado em Berlim e que não vence, restando a matriz religiosa. Sendo assim, a Igreja continua linguagem e símbolo da união dos povos. Prova disso é o baptismo do rei dos pepeliss da Guiné, Bacampolo Có, segundo ritos católicos e o posterior baptismo do seu primeiro filho Batonto que teve como padrinho o próprio D. Pedro II em 16947. Temos assim uma série de factores nacionais e internacionais que vão influir na escolha do modelo administrativo colonial português. Três cismas: Brasil (1822), Berlim (1885) e Ultimatum (1890) são duros golpes tanto para a política nacional onde os republicanos vão ganhando espaço até ao 31 de Janeiro de 1891 e daí até 1910, como para a política colonial que precisa agora de um paradigma de ocupação efectiva mas sempre sem grandes gastos: “O estado do thesouro metropolitano era periclitante; o Banco de Portugal não se encontrava em desafogada situação, e os bancos do Porto, com o infeliz negocio de Salamanca, ameaçavam desastre. Contribuíram para um tal estado de coisas os negócios do Brazil e a situação dos mercados estrangeiros […] e nas despezas, sem conta, peso e medida, feitas em todos os ministérios para consolo de faminto compadrio.”8 O falhado negócio do tratado de Moçambique, a crise financeira de 1891 e a ideia do deputado Ferreira de Almeida de vender as colónias para vencer a bancarrota do Estado, são factores que comprometem a clássica ilusão imperial portuguesa. A par disso abolimos a escravatura, em 1880 fez-se o III centenário da morte de Luís Vaz de Camões, elevando-o a figura mística. 6

Cit. por Vicente Pinheiro, Política Colonial – Discurso Proferido nas Sessões de 10 e 11 de Junho de 1885: Discussão do Acto Geral das Colónias. 7 E. Kafft Kosta, Estado de Direito: O Paradigma Zero – Entre Lipoaspiração e Dispensabilidade., p.195. 8 Thomaz de Almeida Garrett, Administração Colonial , p.65. 21

Tivemos, então, de enveredar pelo jogo geopolítico das potências europeias para manter um modelo de ocupação efectiva que arranca com as “campanhas de pacificação” e onde persistiu um sistémico gerir de dependências que continuará com o “orgulhosamente sós”.

Com Salazar e o Estado-Novo, o império passa a cobrir uma nova série de factores geopolíticos que vão desde a sobrevivência do território matricial português à doutrina razão-manifesto sobre a ocupação legítima para missão civilizadora, mais tarde com a subversão da teoria Freyriana do luso-tropicalismo. O “Arquipélago Tropical Atlântico Português” sem Brasil há mais de um século vira-se para África numa quase talassocracia, apresentando primeiro uma ocupação militar e depois administrativojurídico-política, que se consolida na década de 1940.

É com o Estado-Novo que a ideia clássica imperialista e nacionalista portuguesa deixa de existir. Passa a sobreviver uma utopia salazarista com raízes no pensamento de Armindo Monteiro que “coloca o império acima das finanças, da economia e da política, em comunhão com o passado, a moral e o sentimento nacionais, qual consubstanciação do próprio ideal português.”9 O modelo civilizador do Portugal uno acima do paradigma racial que ameaçara a Europa durante a II Guerra Mundial, não passava de um jogo de semântica que trará o Acto Colonial (e com ele as teses assimilistas) e as Províncias Ultramarinas. O Estado-Novo institucionaliza um modelo próprio com laivos da sua contemporaneidade ideológica e política, tentando contrariar, através do utilitarismo económico que subsiste para além da utopia civilizadora, o próprio estado de alma que nas palavras de Unamuno nos caracteriza como povo de suicidas. Tudo não passaria do ideário político: a ocupação administrativa e territorial apresenta falhas ao nível do investimento público e privado a par de uma incipiente economia industrial e a maioria das campanhas migratórias de colonos falham. Serão o fatalismo da distância, o início da guerra colonial, o surto migratório das décadas de 1950 e 1960 e não a ideologia colonial estado-novista per si, que vão definir o plano de desenvolvimento económico baseado em novas urbes e na dinamização da indústria local. 9

Cláudia Castelo, ibidem, p.64. 22

A legislação fundamental de Rebello da Silva com a inclusão do código civil de Seabra às colónias a 18 de Novembro de 186910 foi um primeiro passo na uniformização administrativa dos territórios face à metrópole. Anteriormente ao código civil de 1867, alguma legislação fora gradualmente incluída na administração colonial tendo como documento inspirador a própria constituição de 1822. Dois grandes factores concorriam para a falta de ordenamento administrativo nos territórios portugueses: (1) falta de linhas comunicacionais eficientes ou continuadas; (2) revoltas de régulos e chefes tribais; quanto ao primeiro, as palavras de Thomaz de Almeida Garrett são explícitas: “ao passo que com Moçambique só tínhamos communicação uma ou duas vezes por ano, já a British India tinha um ramal de Aden a Zanzibar, as Messageries ligavam o ramal de Aden às Seychelles e Reunião às grandes linhas do Mediterrâneo e Indo-China, e os vapores da Union e da Castle Mail já dobravam o Cabo até ao Natal.”11 Para além da falta de recursos económicos da Coroa, a administração local sofria de deficiências várias, tais como o fraco investimento privado, a distância face à metrópole aliada à falta de transportes e de marinha mercante, a instabilidade do domínio territorial face aos régulos e a falta de colonos fixos no território com a criação de colónias penais. Estas deficiências não eram colmatadas pelo regime de prazos criado por Afonso de Albuquerque na Índia, que na África portuguesa surgira no século XVII12. Este regime baseava-se na colocação de um português com poderes de soberania junto de cada chefe indígena. Para além de conselheiro político, este tinha o poder de instituir localmente os decretos régios e de administrar a exploração agrícola. Os prazos falhavam quando as revoltas dos régulos punham em causa o regime: “eram continuadas as questões com os indígenas. O presídio de Lourenço Marques, um alvo de constantes ataques dos vátuas; em Inhambane o terror de Manieusse era tamanho, que a cada instante se julgava ser invadida a villa.”13 Também na Guiné o controlo do território era deficitário, como nos conta João Teixeira Pinto, encarregado de fazer um relatório ao Governador da Guiné de então Josué de Oliveira Duque: “Quando em 1912 cheguei a esta provínica para onde tinha 10

Alfredo Héctor Wilensky, La Administración de Justicia en África Continental Portuguesa, p.55. Thomaz de Almeida Garrett, ibidem, p.33. 12 Thomaz de Almeida Garrett na obra supracitada aponta 1676 como data da implantação do regime dos prazos em Angola (p.31). 13 Idem, ibidem, p.30. 11

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sido nomeado Chefe do Estado Maior era a nossa autoridade puramente nominal na região compreendida entre os rios de Farim ao N. e O., rio de Geba a S. e circunscrição de Geba a L. abrangendo os povos Oincas, Balantas, Brames ou Mancanhas, Manjacos e Papeis, com ocupação apenas das vilas de Cacheu e Bissau e o porto militar de Goli.”14 Um relatório do governador de Inhambane ao Ministro da Marinha em 1850 é citado pelo mesmo autor e serve aqui de ilustração: “a chamada província de Moçambique, permita-me v. ex.ª que lhe diga com a franqueza de soldado, que não é mais do que uma grande extensão de costa de praias áridas, sendo o domínio portuguez em terra firma de dois, trez dias, o maximo, de marchas regulares para o interior, o qual é dominado por régulos a que chamam poderosos gentios e só em Quelimane é que mais alguma terra firme é sujeita ao governo portuguez.”15 A vida administrativa colonial portuguesa nestes territórios baseava-se em frágeis domínios territoriais que estavam sujeitos aos avanços e recuos dos vátuas em Moçambique e por vários régulos em Angola. Esta realidade só termina em 1914 quando são instituídos poderes de governo local a alguns sobas ou a chefes tribais, através da Lei de Bases, inspirada nas excepções previstas no diploma de Rebello da Silva: as alíneas d) e e) do número 1 do artigo 8º faziam menção específica aos usos e costumes dos grumetes da Guiné, baneanes, vátuas, parses, mouros, gentios e demais indígenas de Moçambique, devendo estes ser respeitados e até incluídos num processo de codificação após iniciativa legislativa de governadores portugueses como ditava o número 2 do mesmo artigo16. Mais tarde sai reforçada com a ocupação militar que somos obrigados a fazer em 1917 por força da I Guerra Mundial. Esta lógica administrativa e legislativa surgira na Constituição de 1838, sendo resgatada pelo Acto Adicional de 1852 no seu artigo 15º que previa leis especiais para os territórios colonizados. Esta doutrina administrativo-política é uma constatação da fragilidade geopolítica local que tentávamos a todo o custo manter através de contingências militares e do jogo negocial entre sobas e governo português local e mais tarde com o 14

João Teixeira Pinto, Coluna de Operações Contra os Papeis e Grumetes Revoltados da Ilha de Bissau – Relatório do Chefe de Estado Maior e Comandante da Coluna ao Governador Português de 1 de Setembro de 1915, cit. por E. Kafft Kosta, ibidem, p.214. 15 Idem, ibidem, pp.30-31. 16 Alfredo Héctor Wilensky, ibidem, p.56. 24

controlo efectivo que tivemos de exercer durante a I Guerra Mundial para a manutenção dos territórios. É por essa razão que o modelo administrativo passa primeiro não pela imposição por assimilação do direito português, mas sim por um processo de codificação das especificidades e dos alheamentos indígenas. Será este modelo que o Estado-Novo vai, em parte, subverter através de uma reinterpretação contemporânea político-ideológica, já com o domínio total sobre o indigenato. Essa reinterpretação vai encerrar um ciclo político que indicava a progressiva autonomia. O ideal administrativo português pós-1933 tem como génese o pensamento de quatro nomes da política nacional do virar século XIX: António Enes, Mouzinho de Albuquerque, Paiva Couceiro e Eduardo Costa; Enes no seu “Moçambique: Relatório apresentado ao Governo” de 1893, tece considerações sobre que modelo administrativo deveríamos adoptar. Para o autor do relatório as leis da metrópole são impróprias para o environment africano que classifica de bárbaro ou semi-bárbaro. Para ultrapassar isso o governo deveria apostar na missão civilizadora dos povos africanos, incluindo algumas especificidades no direito civil português aplicável a esses territórios17. Num outro relatório sobre Moçambique18, Mouzinho de Albuquerque prefere basear-se no argumento racial para defender a criação de leis específicas ou estatutos a aplicar nas colónias a europeus e seus descendentes, a mestiços africanos asiáticos e/ou indígenas assimilados e a indígenas não assimilados. A ideia que aqui presidia era a de estabelecer estatutos jurídicos diferenciados a partir do elemento racial Para Paiva Couceiro no seu Dois Anos de Governo – Junho 1907 a Junho 190919, era necessário uma “solução intermédia e oportuna”. Essa solução passava pela interpretação das leis e costumes tribais baseados na tutelar figura do soba, nunca esquecendo o nosso predomínio político e administrativo sobre os territórios. Desta forma, “a pretensão de impor-lhes, pela força, o summum jus do nosso critério jurídico representaria, pois, a suma injuria do mais descabido contra-senso”20. Para Couceiro era necessário promover um período de transição jurídica que deveria começar pela observação próxima das leis e costumes aplicados pelos sobas, tentando sempre que 17

Especialmente em áreas do direito civil. Mouzinho de Albuquerque, Moçambique 1896-98, Vol. II. 19 Relatório sobre o governo de Paiva Couceiro em Angola entre 1907 e 1909. Este relatório está dividido em três partes: I – Nacionalização; II – A Civilização e a Protecção dos Nativos; III – Fomento, Economia e Finanças. 20 Paiva Couceiro, Dois Anos de Governo – Junho 1907 a Junho 1909: História e Comentários cit. por Alfredo Héctor Wilensky, ibidem, p.94. 18

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possível que essa regulamentação não pusesse em causa os princípios morais da civilização europeia. O autor defendia, assim, o regime de prazos como sistema transitório. Passada essa fase dever-se-ia apostar no recrutamento e formação de administradores capazes, que fizessem aplicar a lei metropolitana às colónias, pois que eles eram os tentáculos irradiantes da ideia de governo.21 Seriam esses tentáculos o suporte político-administrativo da aplicação da Justiça e do Direito nas colónias portuguesas, ideia já professada por anteriores governadores de Angola: Eduardo Costa e Cabral de Moncada que Couceiro não se cansa de citar. Eduardo Costa, também ele governador de Angola, redigiu o Estudo sobre a Administração Civil das nossas Possessões Africanas, defendendo a aplicação de um regime especial para cada colónia, contra o modelo assimilista: “Homens de costumes muito diferentes, muitas vezes antagónicos, de civilizações diferentes, podem considerar de igual modo a lei que a todos se aplica sem distinção?”22 Chega a ir mais longe e defende para além dos regimes específicos, leis civis e penais próprias a aplicar em territórios diferenciados. Entre o período que medeia 1914, momento em que é fixada a Lei de Bases da Administração Colonial e 1945, surgem outros diplomas que apontam para a progressiva descentralização do governo das colónias com instituições próprias (Conselhos Executivo e Legislativo). A lei nº 277 de Administração Civil das Províncias Ultramarinas de 15 de Agosto de 1914,23 com inspiração do ministro Artur de Almeida Ribeiro, referia-se já à limitação da discussão parlamentar sobre temas específicos das colónias, relegando-os para governos locais e autonómicos. Esta lógica é absorvida pelo texto das Cartas Orgânicas das Colónias de 1917 que prepara o terreno para uma lei do indigenato. E segue com a Lei de Bases de 1926 orientada pelo Comandante João Bello, ministro das colónias de então. A reforma administrativa colonial de 1933, o Acto Colonial e suas revisões posteriores, as teses “assimilistas” que ganharam folgo durante a II Guerra Mundial e a Carta Orgânica do Império Colonial Português24 subverteram o ideal imperialista que tinha vigorado até então. Passa a existir um Conselho do Império Colonial chefiado pelo 21

Idem, ibidem, p.95. Eduardo Costa, Estudo sobre a Administração Civil das nossas Possessões Africanas cit. por Alfredo Héctor Wilensky, ibidem, p.97. 23 Alfredo Héctor Wilensky, ibidem, p.110. 24 Vide Colectânea de Legislação Colonial, pp.11-102 e 103-116. 22

26

Ministro das Colónias que volta a centralizar e comandar todas as iniciativas políticas e legislativas das colónias à luz do Acto Colonial e da Lei Orgânica do Ultramar. A fórmula adoptada é a da unificação dos padrões jurídicos, políticos e administrativos, fórmula essa com base na lógica civilizadora que dará origem ao estatuto de Província Ultramarina às colónias, este último navegando por ventos da política internacional pósguerra. O modelo administrativo, à parte de todo o acervo jurídico (do qual mencionámos o que nos pareceu relevante), é também espelho de uma visão política, ou melhor metapolítica. A nossa administração colonial iniciou-se esparsamente nos séculos XVII e XVIII com o regime dos prazos, em finais de novecentos as campanhas militares para controlo do território para além do regime de “alfândegas” e atingiu-se o pleno com o sistema administrativo estado-novista. Do Império das feitorias, passando por 1885 até ao fim da I Guerra Mundial e das campanhas militares na Guiné em 1921 medeia um tempo mais longo do que aquele que se seguiu até 1961 e que finda em 1974. Ou seja, a nossa administração pública colonial teve apenas efeitos políticos e jurídicos a partir da década de 1920 e conheceu maior relevo nas décadas de 1950, 1960 e em plena guerra colonial juntamente com os movimentos migratórios e com o consequente crescimento urbano.

2. A Voz da Democracia Norberto Bobbio em Gli Ideali e la Rozza Materia recorda-nos uma frase do romance O Doutor Jivago, que é interessante reter: “É successo piú volte nella storia: quello che era stato concepito in modo nobile e alto, è diventato rozza matéria. Cosi la Grécia è divenuta Roma, cosí l’illuminismo ruso è diventato la rivoluzione russa.”25 Para Bobbio as grandes mudanças sociais e políticas como sejam revoluções, golpes de Estado, nunca são de total natureza transformacional. Isto é, todos os regimes coabitam com os seus antecessores, na figura do trauma colectivo ou da repetição sistémica de comportamentos. Tal como Ortega y Gasset para quem todas as revoluções são pósrevolucionárias, para Bobbio interessa analisar o regime em multa renascentur, ou seja nas suas derivações, continuidades e descontinuidades. Importa pois analisar não o

25

Michelangelo Bovero in Norberto Bobbio, Teoria Geral da Política, p.46. 27

caule da folha de árvore mas sim a floresta no todo. Na esteira, Bobbio também nos alerta para a necessidade de colocar face a face o regime ideal, utópico, sonhado, teorizado e o que acaba por ser implementado no mundo do real, contrariando ou não os valores e os comportamentos vigentes, degenerando em rozza materia. Importa

aqui

perceber

que

experiência

vivemos

e

que

modelo

importamos/exportamos. Ou seja, que ideal produzimos e exportamos face à realidade de quem importa, ou seja, o que é que está a ser implementado nesses países para o continuado reforço

da democracia?

continuidades/descontinuidades

Que rozza materia encontramos?

encontramos

entre

a

experiência

Que

demo-liberal

portuguesa e a dos PLOPs? O que é que existe de igual na Assembleia da República que possa ser comparável ao encontrado nos parlamentos dos PLOPs? Podemos afirmar que o Estado de Direito tem origem em três modelos conceptuais políticos bem diferenciados: um Rule of Law, um État de Droit e um Rechstaat. Ambos os três sofreriam a tal adjectivação liberal de que nos fala Jorge Reis Novais, resultado da oposição burguesa ao anterior Estado de Polícia e espelhado nas dicotomias Estado-Economia de Adam Smith, Estado-Moral de Kant e EstadoSociedade de Humboldt26. Ou seja, ele existe “quando o objectivo de protecção da liberdade e direitos fundamentais do cidadão mobiliza na sua prossecução e garantia o empenhamento do Estado.”27 O Estado de Direito é resultado não só da reacção burguesa ao Estado de Polícia, mas também da consolidação de uma série de princípios que destronará o pater famílias, ou o príncipe como primeiro servidor do Estado detentor da razão última, para dar lugar à limitação das competências do Estado entendido como unidade abstracta e não personificável. A lei passa a ser escrutinada por um conjunto de mecanismos limitadores, legitimados pela diminuição do direito de intervenção dele próprio. Este é o princípio basilar das sociedades europeias em que o rei auto-limita-se em juramento pela lei fundamental. Saímos, assim, do governo da oikos para o governo da sociedade/comunidade. A par da limitação jurídica, a prossecução do bem público entra em regime distributivo, dando-se espaço aos particulares e ao privado. Nas palavras de Novais “é 26 27

Jorge Reis Novais, Contributo para uma Teoria do Estado de Direito, pp.60-73. Idem, ibidem, p.73. 28

para garantir um núcleo de direitos fundamentais interpretados e integrados à luz dos valores supremos da iniciativa privada, da segurança da propriedade e das exigências da calculabilidade requeridas pelo funcionamento do sistema capitalista que se orienta o projecto de racionalização do Estado levado a cabo pela burguesia.”28 Entra-se num processo weberiano de racionalização da administração, do aperfeiçoamento técnico do Estado e de juridificação dos fenómenos que se vai complexificando à medida que surgem novas áreas de conhecimento, novas realidades. Os fenómenos jurídicos passam a ocupar o espaço dos fins omnicompreensíveis da polis: entramos num chardiniano processo de complexidade crescente. Outro fenómeno que precipitou o Estado de Direito foi a progressiva autonomia e a teoria da separação dos poderes que o instituem: “direitos fundamentais e divisão de poderes (com império da lei e princípio da legalidade), surgem, pois, como os elementos fundamentais do Estado de Direito liberal, tal como proclamava, de forma lapidar, o artigo 16º da Declaração de Direitos de 1791.”29 A par da autonomização dos poderes que vai conferir a cada órgão soberano do Estado as suas próprias competências traduzíveis na Constituição, os valores burgueses, vencedores das lutas contra o Estado de Polícia, incluem neste novo Estado a busca do bem comum e das liberdades e garantias individuais. A teoria da separação dos poderes surge como doutrina e princípio constitucional que vão basear todo o funcionamento do Estado de Direito. Tal como nos diz Luís Sá, ela “emerge na época moderna no campo da luta pelo poder: os partidários do poder real absoluto queriam ver no parlamento um mero conselho do rei; outros queriam ver limitados os poderes de assembleias tidas por demasiado poderosas e dispondo mesmo de poderes jurisdicionais, como aconteceu na Inglaterra de Carlos I.”30 É a partir dos fundamentos teóricos de Montesquieu, tantas vezes revistos, que surge o triângulo do poder: executivo-legislativo-jurídico. É este triângulo explícito no texto da lei fundamental que definirá teoricamente o sistema de governo: presidencial, semipresidencial ou parlamentar.

28

Idem, ibidem, p.73. Idem, ibidem, p.75. O mesmo artigo reza assim: “Qualquer sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos, nem estabelecida a separação dos poderes, não tem constituição.” 30 Luís Sá, O Lugar da Assembleia da República no Sistema Político, p.97. 29

29

São estes fundamentos modernos que definem o campo de acção dos parlamentos, dotando-os de legitimidade pela representação política através do sufrágio universal, de poderes fiscalizadores tanto da salvaguarda constitucional como do bom desempenho do regime. É por essa razão que Novais nos diz que “se, por um lado, a representação política […] institucionaliza a relativa separação e autonomia do aparelho de Estado, a divisão de poderes – entendida naqueles termos – garantia a previsibilidade da

intervenção

do

Estado,

ao

mesmo

tempo

que,

complementada

pela

institucionalização da justiça administrativa, se revelava como técnica jurídica adequada à protecção dos direitos individuais e à subordinação do poder às exigências da sociedade.”31 Em resumo, a progressiva implementação e institucionalização de órgãos, ferramentas e técnicas ao serviço do Estado, entendido de Direito e Liberal, vai imprimindo expectativas e anseios às populações que caminham no sentido da protecção e manutenção dos seus direitos, liberdades e garantias. A recente adjectivação democrática tem por base não só a prossecução das liberdades individuais, mas também a procura do progresso e da paz. Este assumiu um projecto universalista através dos movimentos globalizantes, da neo-máscara do liberalismo económico e surge como bandeira política da potência vencedora da II Guerra Mundial e do cisma bipolar ideológico. As propostas positivistas do século XIX que prometiam o bem-estar, a prosperidade, o progresso a partir da racionalização dos meios de produção, resultaram na aceitação progressiva de um sistema político que satisfizesse os projectos individuais. Foi a democracia que primeiro venceu na II Guerra Mundial o Estado totalitário, voltando a suplantar uma outra visão na década de 1990, seguindo-se uma quarta vaga de democratização que nem quinze anos tem. Fala-se actualmente de boa governação e exportação do acervo democrático como garante da liberdade dos povos e da paz perpétua neo-kantiana. Os tais índices de estabilidade, estabelecidos pelos países vencedores da II Guerra Mundial, incluem um aglomerado de conceitos: estabilidade política, liberdades individuais, primado da Lei, eficiência governativa, corrupção, sistema judicial e judiciário. Todos eles apontam para o paradigma do melhor governo, do melhor sistema político, que ao lado das teses liberais, impõem o Estado de Direito em pleno. Esse Estado será aquele capaz de, através da Justiça, assegurar uma série de liberdades individuais de expressão e

31

Jorge Reis Novais, ibidem, pp.74-75 30

sociabilidade a todos os cidadãos que deixaram de ser suseranos. O problema está quando confrontamos o império da Lei com as realidades antropológicas e sócioculturais que influem no sistema político: aqui encontramos a tal problemática bobbiana com que iniciámos este ponto. Não bastará impor pela força ou pelo primado da Lei uma nova ordem, pois que esta se encontra dependente das anteriores. Desta forma não podemos conhecer um regime democrático sem o relacionarmos com o seu passado e com os inputs/outputs dos restantes sistemas que fazem parte do Estado, com erro de muitas vezes esbarrar com a rozza materia que contraria todas as previsões. Muitas das vezes o império da Lei existe muito antes de haver justiça ou ética e o bom governo vem escrito por decreto presidencial ou ministerial. Não que isto seja novidade se observarmos certos nichos da nossa própria sociedade onde os códigos substituem uma consciencialização ética e cultural. Nos PLOPs a invenção da política prossegue ainda, tal como nas democracias mais consolidadas, um trajecto de racionalidade ética “marcada pela justiça, por aquilo que os clássicos qualificavam como bonnum honestum, o espaço do político propriamente dito.”32 Perguntamo-nos ainda hoje se o Estado de Direito é regra ou excepção. Numa sociedade internacional baseada nos princípios do racionalismo e do interesse estadual, onde o império dá lugar à comunidade e onde as poucas comunidades reservam para si próprias as vantagens de tais consociações, podemos afirmar que o Estado de Direito é ainda realidade de poucos. Mesmo com os esforços da comunidade internacional que procuram estabelecer um iluminismo crioulo através de mecanismos de engenharia social, muitas vezes descurando traumas e processos colectivos próprios de cada sociedade, a democracia é ainda um luxo. Ao tempo da escrita deste relatório recordo as últimas investidas russas por terras da Geórgia, Estado ainda há pouco tempo sem estruturas democráticas e com as últimas eleições presidenciais realizadas em Janeiro deste ano sob observação de organismos internacionais. Às portas da Europa unida mantêm-se uma série de comunidades sem democracia plena e com questões conflituais que ultrapassam o social. Ou ainda reconhecemos comunidades sem Estado, Estados sem Nações, Nações em busca do Estado em processo de importação de modelos, ou Estados que procuram instaurar uma Nação através de preceitos ocidentais.

32

José Adelino Maltez, Princípios de Ciência Política: Introdução à Teoria Política, p.34. 31

Com isto queremos afirmar que muitos dos actuais processos de democratização são, também, para os Estados receptores, processos de construção de Nação, no sentido em que se procura centralizar um pólo nacional de concórdia em torno do esforço de liberalização e democratização da sociedade. Esse pólo é, muitas das vezes um centro político decisório, encarnado por uma cidade ou região que apresenta melhores índices de desenvolvimento em todos os níveis e, que ao mesmo tempo congrega em si uma elite política e económica ocidentalizada, que envia os seus filhos para estudar nas universidades europeias e norte-americanas, que desfruta de grande parte dos luxos de que gozam as elites ocidentais numa lógica de enrichez-vous! vivendo das dialécticas do poder que se geram em torno dele e das variadas regiões do Estado, unidas em torno de grupos sociais e de famílias de poder, esse centro político é gerador de processos de engenharia socializante. Tal como nos diz o Prof. Hespanha “a divisão política do poder constitui também um instrumento de poder (ou um aparelho político) que serve tanto para a organização e perpetuação do poder de certos grupos sociais como para a expropriação de outros grupos. Com efeito, cada grupo social detém, de acordo com as características da sua organização, a capacidade de gerir certos aparelhos, enquanto que outros aparelhos escapam ao seu poder de direcção.”33 Esse centro e essa elite encontram-se em contacto com as esferas de poder ocidentais, dialogando com elas, quer a nível público quer privado. Sendo esses contactos essenciais, não só pelo mimetismo que causam, como também pelos jogos de influência e pressão internacional que se exercem e que participam activamente na formatação das novas regras do jogo interno desses Estados. E, se quisermos procurar neste novo poder a legitimidade basta-nos dizer que o fenómeno do poder não é apenas facto, mas essencialmente um pacto em que ao longo do tempo as formas de o legitimar têm sido encobertas em metáforas e figurativos cada vez mais complexos. Pois ao considerarmos o poder como percepção, tal como o fazia o mestre Agostinho da Silva, podemos concluir que o tal soft power de Joseph Nye Jr. é cada vez mais importante num mundo em frenética mutação, do que o hard power que se pretende transformacional através da força efectiva e que, ao perder legitimidade nas sociedades esclarecidas também encontra a revolta das comunidades invadidas no seu seio.

33

A. M. Hespanha, As Vésperas do Leviathan – Instituições e Poder Político: Portugal Século XVII, p.87. 32

Os mecanismos de engenharia social e a pacificação das sociedades através da institucionalização do conflito social, da realização de eleições, da aprendizagem democrática por mimetismo continuado, da exportação de técnicas de governação e da imposição de regras internacionais que procuram homogeneizar as respostas, são ferramentas de uso no quotidiano nas sociedades que iniciaram um processo de democratização. Mas que experiência parlamentar tivemos, para que hoje possamos contribuir para o fortalecimento da democracia nestas sociedades? Ainda em 1986, num seminário organizada pelo INA intitulado A Feitura das Leis: História da Elaboração de Textos Legais, António Barreto afirmava que “o parlamento tem o seu papel de forum, de confronto entre os diferentes partidos, mas não fornece ao conjunto dos partidos a documentação, os estudos e os materiais necessários para que se elaborem as leis. O recurso a essa matéria-prima tem que vir dos próprios partidos, da sociedade, dos técnicos ou dos Ministérios, mas não do próprio parlamento.” E vais mais longe ao considerar que “os próprios partidos, uns mais do que outros evidentemente, continuam a encarar o processo legislativo com alguma dose de improviso. Perante necessidades concretas improvisa-se a contribuição de cada um perante o processo, sobretudo devido à ausência de estudos prévios do que são as realidades e dos que são as situações a que as leis se vão aplicar.”34 Ou seja, tivemos nestas três décadas do melhor regime possível, uma aprendizagem continuada que reforçou o funcionamento do Estado e dos seus órgãos soberanos, para melhor servir os preceitos constitucionais e legitimar as escolhas por sufrágio universal que se têm repetido desde 1976. A Assembleia da República não foi excepção neste processo de democratização informal e formal, de conteúdo e forma, de lei e quotidiano. O parlamentarismo democrático fundado no sufrágio directo e universal em Portugal é apenas uma realidade pós-1974. E desde então tem sofrido mutações de carácter organizacional e administrativo. No artigo Sobre o Parlamento Português: Partidarização Parlamentar e Parlamentarização Partidária35, Manuel Braga da Cruz aponta as relações partidos-parlamento como factor mais que relevante nessas

34

António Barreto, A Elaboração da Lei de Bases da Reforma Agrária in A Feitura das Leis – História da Elaboração de Textos Legais, vol. I, p.153. 35 O mesmo pode ser consultado online gratuitamente em: http://analisesocial.ics.ul.pt/documentos/1223029409Z7nWW9ur7Yr37TV0.pdf. 33

mutações. Para o autor os parlamentos tornaram-se gradualmente assembleias de partidos, mantidas por “políticos profissionais surgidos com o desenvolvimento do Estado moderno e do processo de expropriação dos titulares privados do poder administrativo [que] fazem da política um meio de ganhar a vida e um ideal ou modo de vida”36. A “fonte do novo direito parlamentar”37, com a inclusão de regras para as relações intraparlamentares (entre deputados e partidos; na natureza nacional e partidária do mandato dos deputados), para a composição proporcional das comissões, para a constituição de grupos parlamentares e da organização de serviços técnicos (na lógica da ética do funcionário e do serviço público salvaguardados pela Constituição) contribuíram para o fomento progressivo de um parlamento transformador, que passa a privilegiar o trabalho das comissões, dos processos de designação e da socialização institucional, ao contrário do parlamento arena, onde subsiste o impacto das forças exteriores para a estrutura interna e para normas de subculturas38. No mesmo caminho, mas indo mais longe, Paulo Otero considera que o Estado tornou-se “instrumento nas mãos do partido do governo, permitindo que, especialmente em cenários de maioria absoluta ou equivalente, o sistema parlamentar conduza à transformação do Estado de partidos em verdadeiro Estado do partido governamental”39, numa lógica de subversão da herança política liberal onde o parlamento era voz de oposição e não de partidos e grupos parlamentares. Para Miguel Lobo Antunes40 “detectar as actuações que contribuem para que a implementação das regras do jogo da democracia atinja um ponto de não retorno, capaz de suportar e resolver as tensões desagregadoras que se gerem”, é um bom indicador do funcionamento capaz de qualquer parlamento, pois “em democracia, a legitimidade do poder resulta, por um lado, do respeito pelas regras estabelecidas, e aceites como razoáveis, que disciplinam o acesso ao poder e garantem uma participação da população na escolha dos dirigentes e, por outro lado, do modo como o poder é exercido, do respeito pelas minorias, que é garante da alternância.”41 Por isso é necessário um aperfeiçoamento continuado dos técnicos parlamentares que trabalham para o 36

Manuel Braga da Cruz, ibidem in Análise Social, vol. XXIV, p.98. Jorge Miranda, A Constituição de 1976. Formação, Estrutura e Princípios Fundamentais cit. por idem, ibidem, p.101. 38 Idem, ibidem, pp.103-104. 39 Paulo Otero, op. cit. in Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Armando M. Marques Guedes, p.263. 40 Miguel Lobo Antunes, A Assembleia da República e a Consolidação da Democracia em Portugal in Análise Social, vol. XXIV, pp.77-95. O mesmo pode ser consultado online gratuitamente em: http://analisesocial.ics.ul.pt/documentos/1223029335R1dYH5ij9Va55NG7.pdf. 41 Idem, ibidem, p.81. 37

34

aprofundamento do processo de controlo e fiscalização do poder executivo e para um melhor e mais capacitado poder legislativo. Sendo depois, também preciso o fomento de uma lógica oposicionista e de confronto e diálogo de ideias esclarecido. Por isso os parlamentos de hoje têm de ser mais do que parlamentos mínimos “que removem o conflito político das ruas, transpondo-os para a assembleia, onde se vai dissipar através da realização de discursos e doutras formas de actividade simbólica”, tornando-se “mais do que conselhos de conveniência em que diversas facções políticas se reúnem para se digladiarem na câmara. Terão de tornar-se conselhos de consenso, locais em que facções rivais se reúnam para resolver as suas divergências e definir objectivos comuns. Os parlamentos viáveis tornam uma democracia mais estável e duradoura, fazendo convergir a atenção do público para a política e promovendo uma atitude geral de apoio ao sistema. Além disso, em sociedades altamente pluralistas, os parlamentos viáveis podem contribuir para a integração de grupos étnicos e comunitários diferentes.”42 Esta congregação de visões com o intuito de harmonizar conflitos sociais através da institucionalização permite a autonomização progressiva e depois a independência do órgão legislativo por excelência que deve ser o parlamento. Tornando-se entidade própria ele pode gerar expectativas próprias, desempenha um papel fundamental na sociedade, é fonte de tradição democrática e pluralista, de Direito, Liberdades e Garantias.

42

Walter Oppelo, A Assembleia da República, O Parlamento Português: Análise Organizacional da Actividade Legislativa in Análise Social, vol. XXIV, pp. 127-150. Pode ser consultado online gratuitamente em: http://analisesocial.ics.ul.pt/documentos/1223029453C9hRS7ey3Oh85IH6.pdf. 35

§2 AS COMPETÊ)CIAS EXTER)AS DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA

Este capítulo tem como objectivo expor as relações parlamentares internacionais da ARP. O primeiro ponto refere-se à actividade internacional desenvolvida pelo Presidente da Assembleia da República, quer a nível diplomático, quer políticoinstitucional. O segundo ponto trata da organização e actividade do Gabinete de Relações Internacionais e Protocolo na sua vertente de apoio técnico às actividades internacionais da ARP. O terceiro ponto incide sobre a actividade legislativa da ARP no plano internacional, com especial atenção para a Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas e para a Comissão de Assuntos Europeus. O ponto seguinte abordará a participação dos deputados da ARP nas Assembleias Interparlamentares. E o último ponto incidirá sobre os Grupos Parlamentares de Amizade.

1. A Segunda Figura do Estado O PAR é, protocolar e formalmente (como dita o artigo 135º da CRP), a segunda figura do Estado, assumindo interinamente o cargo de Presidente da República durante a vagatura do mesmo ou por impedimento temporário, estando, também, previsto no artigo 145º da CRP a sua participação nas reuniões do Conselho de Estado. Escolhido após votação, entre os seus pares na primeira sessão do plenário no início de cada legislatura, o PAR é a alta figura representante do parlamento português, cabendo-lhe as funções explícitas nos artigos 16º, 17º, 18º e 19º do RAR: (1) Administrativa – o PAR é a figura máxima da administração e coordenação dos trabalhos desenvolvidos na ARP. Este trabalha em estreita cooperação institucional com o Secretário-Geral que está encarregue de superintender e coordenar os trabalhos desenvolvidos pelos funcionários, distribuídos organicamente pelos serviços da ARP (alínea t. do número 1 do art. 16º do RAR e art. 22º da LOFAR). Cabe a outro órgão a

36

administração da ARP, o CA43. Este reúne habitualmente uma vez por semana contando com a participação do SG, sete deputados representativos de todos os grupos parlamentares e um funcionário da ARP44. O CA é um órgão consultivo e de gestão. Como explícito no art. 15º da LOFAR, pronuncia-se sobre a política geral de administração e os meios necessários à sua execução, elabora planos de actividades e apresenta propostas de orçamento e ainda administra o pessoal da ARP, para além de outras actividades especificadas no mesmo artigo45. Juntamente com o PAR é o órgão que superintende a administração da ARP. Podemos, então, afirmar que o PAR divide as suas competências administrativas com o CA e com o SG, sendo apenas formalmente reconhecidos como órgãos administrativos o PAR e o CA pelo artigo 5º da LOFAR, visto que o SG é um órgão na dependência directa do PAR. (2) Político-Institucional – o PAR é o representante político e institucional da ARP, respondendo directamente perante o Plenário46, órgão máximo da legitimidade e do poder político delegado por sufrágio universal directo47. Para além do aspecto representativo da figura institucional, o PAR preside à mesa das sessões e da Comissão Permanente (alínea l) do nº1 do art. 16º do RAR48), “reúne-se com os presidentes dos grupos parlamentares na Conferência de Líderes […] para apreciar os assuntos previstos na alínea b) do nº1 do art. 16º (marcar as reuniões plenárias e fixar a ordem do dia)49” e preside à Conferência dos Presidentes das Comissões Parlamentares segundo os artigos 16º nº1 alínea n) e 21º do RAR. Segundo o artigo 18º rege competências sobre os deputados no que concerne ao regular funcionamento da instituição e do uso dos poderes atribuídos a estes. Detém, ainda, a capacidade de representação do Estado português, convidando ou recebendo entidades, representantes de Estados e cidadãos nacionais, tendo também uma agenda de deslocações. Compete ainda ao PAR, segundo 43

Artigo 14º da LOFAR. A LOFAR pode ser consultada online em: http://www.parlamento.pt/Legislacao/Paginas/LeiOrganizacaoFuncionamentoServicosAssembleiaRepubli ca.aspx. 44 Artigo 16º da LOFAR. Actualmente os seus membros efectivos são: deputados José Lello (presidente do CA e representante do Grupo Parlamentar do PS), Jorge Costa (PSD), João Rebelo (CDS-PP), José Soeiro (PCP), Helena Pinto (BE) e Francisco Madeira Lopes (PEV); a SG Adelina de Sá Carvalho e Vítor Madeira como representante dos funcionários. 45 José Manuel Araújo in Parlamento na Prática, Administração e Serviços, p.335. 46 Onde é eleito na primeira sessão de cada legislatura. 47 Quanto ao aspecto administrativo, a LOFAR é explícita quanto às competências do Plenário no seu artigo 4º: "Ao Plenário, como órgão supremo da Assembleia da República, compete apreciar, discutir e votar: a) O orçamento anual das receitas e despesas da Assembleia da República e os orçamentos suplementares; b) O relatório e conta de gerência, acompanhados do parecer do Tribunal de Contas.” 48 O RAR pode ser consultado online em: http://www.parlamento.pt/Legislacao/Paginas/RegimentoAssembleiaRepublica.aspx. 49 Artigo 20º nº1 do RAR. 37

o art. 19º do mesmo regimento, comunicar em nome da ARP com o Presidente da República e com o Governo. No plano das relações externas da ARP as suas competências são as seguintes: (a) Chefia, coordena, dinamiza e monitoriza as relações externas do parlamento; (b) Desenvolve encontros bi e multilaterais com os seus homólogos; (c) Convida outros presidentes de parlamentos, individualidades e representantes de Estados para encontros, conferências interparlamentares ou para participar em sessões especiais no hemiciclo (alínea d) do nº 2 do art. 16º); a recepção aos presidentes dos parlamentos é acompanhada de cerimónia protocolar de boasvindas; (d) Desloca-se ao estrangeiro a convite de outros presidentes, como representante do Estado português ou na condição de chefe de missão em conferências e encontros interparlamentares, representando desta forma a ARP; (e) Promove, aprova e acompanha a constituição de delegações parlamentares ao estrangeiro, quer para participar em reuniões de assembleias interparlamentares, quer no âmbito de viagens de estudo (alínea f) do nº1 do art. 16º do RAR) ou outras; (f) “Dinamiza a constituição dos GPAs, das comissões mistas interparlamentares e de outros organismos que se ocupem do diálogo da Assembleia com os países amigos de Portugal.”50 (g) Aprova e assina, no âmbito da cooperação parlamentar, os protocolos firmados entre a ARP e outros parlamentos nacionais; (h) Detém iniciativa política quanto ao conteúdo dos documentos a aprovar em variados sectores das relações externas da ARP, especialmente ao nível da cooperação parlamentar;

50

Alínea g) do nº1 do art. 16º do RAR. No caso dos GPAs a resolução nº 6/2003 referente aos mesmos consagra um artigo ao PAR dotando-o de poder de coordenação quanto às actividades desenvolvidas por estes. 38

Como quase toda a vertente externa da ARP é coordenada e monitorizada pelo PAR, ela depende politicamente da sua personalidade. Não diremos que a vertente externa da ARP dependa exclusivamente disso, mas que grande parte das iniciativas está dependente da visão e da análise da política externa do PAR. Para além da personificação do cargo, a vertente externa da ARP depende do orçamento que lhe é destinado, bem como do panorama internacional e da visão institucional inerente ao órgão. Para ilustrarmos isso mesmo, podemos comparar o mandato de Almeida Santos com o de Jaime Gama: enquanto o primeiro aproveitou o clima económico nacional favorável (1998) e a senda de democratização nos PALOPs para iniciar uma política de cooperação parlamentar; Jaime Gama, com experiência no MNE, iniciou uma legislatura com maior preocupação pelos encontros bilaterais e pelo empenho das delegações portuguesas nas assembleias parlamentares internacionais. O actual PAR, inserido num contexto de contenção de custos, preferiu indicar um caminho diferente para a vertente externa da ARP, coisa que Mota Amaral tinha já iniciado num contexto governo Barroso (2002). Analisemos, agora, a agenda internacional do PAR para o período entre 14 de Janeiro e 14 de Julho de 2008. Para isso preferimos elaborar uma grelha com actividades referentes a: (1) Diplomacia Parlamentar que compreende a recepção de presidentes dos parlamentos nacionais, líderes políticos, representantes de Estados e visitas bilaterais; (2) Cooperação Parlamentar que inclui todas as iniciativas bilaterais como recepção a delegações de deputados ou funcionários de outros parlamentos (casos de Visitas de Estudo), assinatura de protocolos e programas de cooperação; (3) Representação do Estado Português. Quadro 1 – Agenda Internacional do PAR Actividades

(1)

(2)

(3)

Datas 15.1

Recebe PANGB

11.2

Recebe PPTL Recebe EMB

39

15.2

Indonésia; Recebe Malam Bacai Sanhá; Audiência com delegação

18.2

20.2

deputados ANCV Recebe MNE Montenegro

22.2

Recebe EMB Paraguai

25.2

26.2

Audiência c/ EMB

Recebe delegação

EUA

do CA da ARM

Jantar Homenagem a Manuel Marin

29.2 a 6.3

Visita Bilateral Japão Audiência c/ EMB Bélgica;

10.3

Recebe Pres. Câmara Representantes Indonésia Visita Forças nacionais

16 a 18.3

Afeganistão e Líbano

31.3

Encontro c/ Embaixadores da 40

UE 1.4

Entrega Prémio Norte-Sul da APCE Recebe Pres.

3.4

Câmara Representantes Marrocos

8.4

Recebe líder oposição CaboVerde (MPD) Recebe Comissária

11.4

14.4

Europeia Maglena Kuneva Recebe Pres. UNITA

21.4

Recebe Pres. Parlamento Ucrânia

22.4

Recebe PM SãoTomé e Príncipe

28.4

Recebe Pres. Senado Austrália Recebe Pres.

29.4

Parlamento Land Renânia-Vestfália do Norte Recebe MNE

30.4

Nigéria; Recebe EMB 41

Tailândia; 5.5

Recebe Reis da Suécia

7.5

Recebe ex-EMB Britânico Powell

10 a 14.5

14.5

Visita bilateral

Visita bilateral

Brasil

Brasil

Recebe delegação GPA FrançaPortugal Conferência de

22 e 23.5

26.5

Pres. de Parlamentos do CE Recebe PM Qatar Visita Oficial dos Reis da Noruega;

27.5

Recebe Pres. do Hadash e deputado Knesset Recebe Comissão Parlamentar do

29.5

Cong. Nac. Chile

30.5

Recebe Pres. PE

2.6

Recebe MNE Marrocos

3.6

Recebe Pres. Parlamento Chipre

42

19 a 21.6

Conferência dos Pres. Parlamentos da UE Recebe Pres.

23.6

Conselho Consultivo Saudita

1.7

Recebe EMB Irão

3.7

Visita bilateral a

Visita bilateral a

Cabo-Verde

Cabo-Verde Audiência c/

8.7

deputados da ANA Audiência c/ EMB 9.7

Chipre; Audiência c/ EMB Suíça; Recebe MNE Argentina;

10.7

Recebe Pres. Tribunal de Contas Ucrânia; Recebe Pres. Comissão Negócios Estrangeiros do Parlamento Irão;

11.7

Encontro c/ Príncipe Aga Khan

Nota: Informação retirada do site da Assembleia da República em – www.parlamento.pt/presidente/agenda;

43

Como é visível no quadro 1, a maioria das actividades internacionais a que o PAR esteve ligado são de natureza 1), ou seja, estão inscritas no âmbito da magistratura de influência e a tudo o que a ela diz respeito. A diplomacia parlamentar feita pelo PAR, ou o diálogo entre parlamentos ou entre parlamentos e entidades estrangeiras, são as actividades mais representativas da vertente externa de um parlamento. Isto acontece porque é a figura do PAR que coordena aquilo que podemos grosseiramente designar por política para as relações parlamentares internacionais. Grosseiramente porque esta não é uma política com estratégia e quadro definidos ou preceitos/princípios sistemicamente explícitos num documento orientador. Chamamos de novo a atenção para as características que anteriormente definimos: (a) personificação do mandato, em que é notória a escolha de um rumo para esta política através da visão diferenciada de cada presidente; (b) ambiente interno/ambiente externo: como em qualquer outra instituição ou organização o institutional environment incide nas escolhas de quem lidera ou coordena as funcionalidades materiais da mesma51, tentando ao mesmo tempo “jogar” com os elementos que definem interna e externamente a instituição. É por essa razão que o PAR é o elemento chave do parlamento na sua vertente externa, pois é ele que representa o papel institucional. Como nos diz Christian Poncelet, presidente do Senado francês, “la diplomatie parlamentaire est en outre une diplomatie d’influence.”52 Para além do factor simbólico da magistratura de influência, a diplomacia parlamentar está embrenhada numa série de rituais. Isto é notório na multiplicação de cerimónias de boas-vindas e recepções que o PAR proporciona aos seus homólogos. Todas as cerimónias que tive o prazer de observar tais como a recepção ao Presidente da Câmara de Representantes de Marrocos ou do Presidente do Parlamento chileno, para já não falar na recepção aos reis da Suécia em visita bilateral ao nosso país, têm uma linha organizativa protocolar simbólica que vai ao encontro da glorificação dos parlamentos como órgãos soberanos, democraticamente eleitos e representantes da vontade dos povos. A diplomacia parlamentar pretende ser a voz dessa representação no mundo das relações internacionais, agindo pela liberdade e pelos direitos, procurando ter um papel predominante no equilíbrio democrático das estruturas nacionais e internacionais, glorificando a igualdade e a justiça entre os povos. 51

Oliver E. Williamson, Organization Theory, pp.44-48. Discurso de abertura de uma conferência sobre a Diplomacia Parlamentar feita no Senado francês. Podemos encontrar a mesma em www.senat.fr/internacional. 52

44

Nas actividades de tipo 2), é reservado ao PAR a competência quanto ao conteúdo da matéria, ficando o trabalho técnico nas mãos dos serviços da ARP, mais especificamente do GARIP. O PAR participa no processo através da aprovação e/ou escrita dos documentos, programas e protocolos que servem de base para as actividades a desenvolver. Neste âmbito são também privilegiados encontros bilaterais entre presidentes para o aprofundamento do processo ou para a assinatura de Protocolos de cooperação. É o PAR quem coordena e monitoriza todos os trabalhos relacionados com a cooperação parlamentar, como é visível nos encontros com os presidentes dos parlamentos da Guiné-Bissau (15 de Janeiro) e Timor-Leste (11 de Fevereiro) que antecederam a feitura de novos protocolos de cooperação. Também no âmbito das visitas de estudo de deputados ou funcionários parlamentares estrangeiros, o PAR recebeu formalmente uma delegação de deputados cabo-verdianos (18 de Fevereiro), uma delegação constituída pelos membros do Conselho de Administração da ARM (25 de Fevereiro), uma outra de uma Comissão do Congresso Nacional do Chile (29 de Maio) e uma de deputados da ANA (8 de Julho). Isto quer dizer que o PAR utiliza algumas ferramentas político-institucionais da magistratura de influência para reforçar a cooperação parlamentar da ARP.

2. Gabinete de Relações Internacionais e Protocolo As competências gerais atribuídas aos serviços estão consignadas no artigo 20º da LOFAR: (a) Apoio técnico-administrativo: é-lhes pedido que salvaguardem todo o acervo técnico-administrativo da sua competência específica. (b) Trabalho técnico: facultar estudos técnicos especializados para o melhor funcionamento dos trabalhos no plenário, em especialidade ou nos diversos sectores em que funciona a ARP. (c) Gestão: gerir tanto o acervo institucional como o orçamento do parlamento, através de uma “correcta gestão dos recursos financeiros, materiais e humanos disponíveis.”

45

O GARIP divide-se em duas divisões: a de relações internacionais e protocolo53. Cada divisão é orientada por um chefe de divisão54 que assegura a organização dos trabalhos do serviço que chefiam. Estes respondem directamente ao director de serviço ao qual “compete superintender, orientar e coordenar os serviços das respectivas direcções.”55 Por sua vez, os directores de serviço reportam as informações necessárias ao SG para uma melhor cooperação inter-serviços56. O dever de sigilo e transparência de qualquer funcionário da ARP e o carácter técnico dos serviços obriga a que todo o trabalho de acompanhamento especializado não possa conter teor político57. Tal como prevê o artigo 35º da LOFAR, “Os funcionários e agentes da Assembleia da República estão exclusivamente ao interesse do serviço público […] e têm o dever de sigilo relativamente aos factos e documentos de que tenham conhecimento no exercício das suas funções.” Isto aplica-se a todas as actividades em que o GARIP participa como serviço de apoio técnico. Contrariamente, os funcionários que dão apoio aos grupos parlamentares não estão afectos ao dever de serviço público58, logo trabalham directamente com matéria política ou politizável. Em suma, os funcionários do GARIP estão sujeitos a actividades em que não podem emitir opiniões políticas ou de outro conteúdo sem ser técnico, o que não quer dizer que não façam trabalho consultivo. Para Nuno Paixão, funcionário da DRI, a diplomacia parlamentar é feita a partir daquilo que designa por meios de actuação; esses meios compreendem a actuação do PAR (como explicitámos anteriormente), das Comissões Parlamentares (que falaremos no ponto três deste capítulo), das delegações permanentes às várias Assembleias Parlamentares (ponto quatro deste capítulo), dos GPAs (ponto dois do capítulo seguinte) e dos serviços. Seguindo o raciocínio do autor, compete aos serviços dinamizar e apoiar tecnicamente as actividades internacionais da ARP, preferencialmente “assessoria especializada às deslocações do PAR, das delegações permanentes e aos grupos de

53

Na página x encontra-se o anexo y, “Organograma dos Serviços da ARP”, fornecido através da página http://www.parlamento.pt/Parlamento/Paginas/OrganogramadosServicos.aspx. 54 Artigo 43º da LOFAR. 55 Número 1 do artigo 42º da LOFAR. 56 Número 2 do artigo 42º da LOFAR. 57 Como é explícito o artigo 20º da LOFAR, os serviços da ARP funcionam em carácter técnico e não político. A lei fundamental prevê no seu artigo 181º que “os trabalhos da Assembleia e os das comissões serão coadjuvados por um corpo permanente de funcionários técnicos e administrativos”. 58 Número 1 do artigo 46º da LOFAR. 46

amizade”, bem como no âmbito da “cooperação técnica parlamentar”59. É importante frisar que mesmo no plano da cooperação a assessoria é de teor técnico, e é por isso que Nuno Paixão utiliza a expressão cooperação técnica parlamentar. Abordaremos no ponto um do capítulo seguinte essa mesma assessoria técnica no âmbito da cooperação parlamentar. Como nos diz José Manuel Araújo, Director do GARIP, este “é a estrutura encarregue de articular a actividade das relações externas do Parlamento, quer através das Relações Internacionais assegurando, entre outras, o apoio das delegações portuguesas às diversas Assembleias Parlamentares Internacionais e o desenvolvimento da cooperação com os parlamentos de língua portuguesa, como também através do Protocolo, consubstanciado pelo apoio às várias delegações estrangeiras que visitam a Assembleia da República e a todos os actos protocolares que se realizam na ARP.”60 Os objectivos do Gabinete de Relações Internacionais são os seguintes: (i) dinamizar e acompanhar as relações externas; (ii) prestar apoio a delegações parlamentares e a missões oficiais ao estrangeiro; (iii) colaborar e planear na organização de solenidades; (iv) organizar e assessorar conferências, colóquios e reuniões com delegações internacionais; (v) redigir relatórios e reger actividades internacionais e interparlamentares; (vi) assegurar o secretariado das delegações parlamentares no estrangeiro; (vii) organizar e acompanhar as visitas internacionais à ARP de delegações e representantes; (viii) fazer trabalho de assessoria no plano da cooperação parlamentar e dos GPAs; (ix) serviço de tradução;

59 60

Nuno Paixão in Parlamento na Prática, A Vertente Externa da Assembleia da República, pp.305-6. José Manuel Araújo, ibidem, p.343. 47

3. Comissão de Assuntos Europeus e Comissão de )egócios Estrangeiros A actividade externa da ARP com maior visibilidade é aquela que está definida pela própria CRP quanto às competências do parlamento no âmbito da ratificação dos tratados internacionais, da declaração de guerra e da legislação europeia. Estas competências, ao abrigo da “marca Montesquieu” da organização do poder político61, estão inscritas, respectivamente, nas letras i), m) e n) do artigo 161º e são de natureza política e legislativa. A ARP detém, ainda, competência de fiscalização (art. 162º CRP), competência relativa a outros órgãos (art. 163º CRP) e reserva absoluta ou relativa em matéria legislativa (arts. 164º e 165º CRP). As comissões parlamentares62, repartidas em função da proporção dos grupos parlamentares em cada legislatura, estão ao abrigo da letra da lei do artigo 178º da CRP e da competência fiscalizadora da ARP e da reserva absoluta ou relativa em matéria legislativa. A CNECP e a CAE trabalham com matéria internacional ou comunitária que seja de competência exclusiva relativa ou absoluta da ARP. As competências legislativas no âmbito internacional que prevêm a ratificação de tratados internacionais em que Portugal é signatário, bem como a gestão e a integração de legislação comunitária, têm sido as actividades mais visíveis das duas comissões. Para além disso, recebem periodicamente o ministro dos negócios estrangeiros e discutem semanalmente toda a legislação que lhes compete. No caso da CAE a gestão de informação e legislação europeia é um trabalho técnico-administrativo constante, tanto na intervenção parlamentar ex ante como ex post, para utilizarmos metodologia de Ana Fraga, funcionária da ARP63. Essa intervenção parlamentar no processo de construção europeia tem ganho relevo nas

61

Artigos 110º e 111º da CRP. As comissões podem ser: especializadas permanentes, eventuais e de inquérito. Na actual legislatura a lista de comissões é a seguinte: Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos Liberdades e Garantias, Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas, Comissão de Defesa Nacional, Comissão de Assuntos Europeus, Comissão de Orçamento e Finanças, Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Desenvolvimento Regional, Comissão de Poder Local, Ambiente e Ordenamento do Território, Comissão de Educação e Ciência, Comissão de Obras Públicas, Transportes e Comunicações, Comissão de Saúde, Comissão de Trabalho, Segurança Social e Administração Pública, Comissão de Ética, Sociedade e Cultura, Comissão de Acompanhamento e Avaliação da Política Nacional de Defesa da Floresta contra Incêndios, Comissão de Acompanhamento das Questões Energéticas. Informação online em: http://www.parlamento.pt/ComissoesAR/Paginas/default.aspx. 63 Ana Fraga, Os Parlamentos "acionais e a Legitimidade da Construção Europeia in capítulo III O Papel Individual dos Parlamentos "acionais nas Questões Europeias. 62

48

actividades internacionais da ARP, o que atesta a própria criação da COSAC, essencialmente um órgão de comunicação e aprendizagem entre comissões parlamentares especializadas em integração europeia. São ainda competências desta comissão: “apreciar todos os assuntos que interessem a Portugal no quadro das instituições europeias ou no da cooperação entre os Estados membros da União Europeia, designadamente a actuação do governo respeitante a tais assuntos”; “incentivar uma maior participação da ARP nas actividades desenvolvidas pelas instituições europeias; “intensificar o intercâmbio entre a ARP e o PE”; “designar os representantes portugueses à Conferência dos órgãos Especializados em Assuntos Comunitários dos Parlamentos Nacionais”64. Todas as comissões recebem periodicamente embaixadores, representantes dos variados Estados ou de parlamentos convidados para o efeito ou pela ARP ou em visita de trabalho e aprendizagem, como é exemplo a reunião entre a CAE e uma delegação do parlamento albanês do dia 21 de Janeiro de 2008, no caso sobre a experiência portuguesa na integração europeia e mais especificamente sobre o papel da ARP nesse processo.

4. Assembleias Parlamentares Internacionais Nas últimas décadas temos assistido ao aprofundar dos processos regionais de integração. Não podemos afirmar que é um processo recente se nos lembrarmos que o Tratado de Roma data de 1957, ou ainda que a própria NATO seria constitucionalmente formada em Washington em 1949. Este é um caminho essencialmente pós-guerra com alavancas e obstáculos pelo meio que, se não abriram o processo de integração mundial como tentou prever Mitrani, estabeleceu um outro de cariz regional e económico mais à medida dos neo-funcionalistas, dos quais Ernest Haas será o seu maior subscritor. Os parlamentos assumem aqui um papel de representação da voz dos cidadãos dos Estados-membros, ampliando a regra de Montesquieu às estruturas de integração regional mais ou menos profundas, se consideramos que essa integração pode assumir contornos constitucionalistas, ou seja, que mais não seja do que o desejo de estabelecer um super-Estado regional (as assembleias parlamentares internacionais surgem neste 64

Número 2 do artigo 4º da Lei nº20/94 de 15 de Junho referente ao “acompanhamento e apreciação pela Assembleia da República da participação de Portugal no processo de construção europeia”. 49

cenário onde o efeito borboleta assume contornos de cooperação e de teias relacionais para melhor prever acções e reacções no seio do espaço definido pelas fronteiras dos Estados). A ARP participa em algumas dessas assembleias parlamentares internacionais, ampliando a voz da sua representação externa através das delegações e deputações parlamentares, como estabelecido na resolução da ARP nº 5/200365 publicada no DR nº18 de 22 de Janeiro. As deslocações de deputados da ARP ao estrangeiro estiveram durante algum tempo na agenda da reforma da administração do parlamento; a polémica levantada acerca das viagens de alguns deputados levaria a ARP a reformular a sua política de deslocações com maiores critérios de avaliação e ponderação da mesma – daqui resultou o estabelecido na resolução nº 57/200466 publicada no DR nº184 de 6 de Agosto, que passou a designar os “princípios gerais de atribuição de despesas de transporte e alojamento e ajudas de custo aos deputados”. Estas delegações permanentes são constituídas por deputados “eleitos pelo conjunto dos parlamentares portugueses, em sistema de lista fechada […] segundo o método proporcional, isto é, de acordo com a votação obtida por cada um dos partidos nas últimas eleições legislativas.”67 A participação da ARP nestes fora internacionais estende-se às seguintes assembleias: Assembleia Parlamentar da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (APOSCE): a actual delegação portuguesa à APOSCE, eleita em 2005, tem contado com um esforço continuado dos oito membros que a compõem, liderados pelo deputado João Soares. Eleito presidente da assembleia em Julho deste ano na sessão anual, João Soares tem participado em equipas de observação de actos eleitorais na Europa de Leste e na região do Próximo Oriente, juntamente com o deputado Jorge Tadeu Morgado do PSD. De assinalar a importância estratégica da informação obtida no terreno pelos deputados portugueses, que, lentamente tem levado ao estreitamento de contactos com o MNE e com as variadas embaixadas portuguesas espalhadas nesta área68. Durante o período do meu estágio a delegação participou directa ou 65

Anexo Anexo 67 Nuno Paixão, ibidem, p.310. 68 João Soares in Delegação Portuguesa à Assembleia Parlamentar da OSCE: Maio 2005-Outubro 2007, p.19. 66

50

indirectamente em missões de observação das eleições presidenciais da Arménia (19 de Fevereiro), eleições legislativas na Sérvia (11 de Maio), eleições legislativas na Geórgia (21 de Maio) e eleições legislativas na Macedónia (1 de Junho); Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa (APCE): a delegação portuguesa é composta por catorze deputados, sendo sete os efectivos. A APCE é um dos órgãos estatutários do Conselho da Europa e um dos seus objectivos é velar pela democracia no espaço europeu, cabendo aos seus membros a eleição dos juízes do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos69. Desde 1977 que as delegações portuguesas são constituídas por deputados ilustres como Francisco Lucas Pires, Manuel Alegre, Francisco Salgado Zenha, Carlos Carvalhas, Medeiros Ferreira Jaime Gama, Vítor Constâncio e Mota Amaral. Tal como a APOSCE, a APCE tem participado em missões de observação de eleições, como aconteceu nas legislativas na Sérvia (11 de Maio) e através das suas comissões e subcomissões especializadas tem trazido para o debate questões ligadas aos direitos humanos, migrações, desenvolvimento, democracia e ambiente. Anualmente a assembleia premeia duas figuras que se destacaram na política mundial, através do prémio norte-sul que nesta edição foi entregue a Koffi Annan e a Simone Veil, na sala do senado do parlamento português (1 de Abril). Ao contrário da maioria das assembleias interparlamentares, esta organiza-se em função de grupos ou famílias políticas europeias, tal como o PE; Assembleia Parlamentar Euro-Mediterrânica (APEM): esta é a versão parlamentar do Processo de Barcelona iniciado em 1995 e que estabeleceu os princípios da parceria entre as duas margens do Mediterrâneo. A primeira sessão ocorreu em Março de 2004 e desde essa data que o processo tem contado com uma vertente parlamentar de desenvolvimento de relações e aprendizagens. A delegação portuguesa conta com três efectivos e dois suplentes, como previsto na resolução da ARP nº 58/2004 publicada no DR nº184 de 6 de Agosto. Actualmente a APEM é consultora da UE para os assuntos do Mediterrâneo e para o processo de Barcelona;

69

Nuno Paixão, ibidem, p.312. 51

Assembleia Parlamentar do Mediterrâneo (APM): criada por iniciativa da UIP, através das conferências para a segurança e cooperação no Mediterrâneo (CSCM). No quarto meeting da CSCM foi proposta a criação de uma Assembleia Parlamentar autónoma à UIP que continuasse o processo de diálogo e cooperação na região. Realizou-se, então, em Amã, em Setembro de 2006, a primeira sessão anual. A sua estrutura conta, para além do Plenário, de um Bureau, de três comissões permanentes (Cooperação Política e de Segurança; Cooperação Económica, Social e Ambiental; Diálogo de Civilizações e dos Direitos Humanos), comités ad-hoc e Secretariado. Tal como a APEM, a APM trabalha em conformidade com o princípio da cooperação entre as duas margens do Mediterrâneo, procurando alargar o espectro da democracia e da boa governança política no Magrebe. No décimo simpósio internacional da água organizado em Malta no âmbito da APM, os deputados José Junqueiro e Nuno Melo, acompanhados pela funcionária parlamentar Rita Ferreira (DRI), receberam a distinção mais alta do certame pela melhor defesa do Mediterrâneo, nas questões relacionadas com a água; Assembleia Interparlamentar do Fórum dos Países de Língua Portuguesa (AIFPLP): fundada aquando do IV fórum dos parlamentos de língua portuguesa, em Brasília em Janeiro de 2005. Tem como fundamento dotar o diálogo do FPLP com uma vertente parlamentar, ou seja, estabelecendo laços entre deputados das assembleias dos países lusófonos. A participação da ARP resume-se a um efectivo de dez deputados (metade dos quais suplentes). Com o intuito de aprofundar não só os laços culturais de que a língua é facto, a AIFPLP é um meeting que tem como intuito, através da socialização, estabelecer pontes para o aprendizado democrático entre os Estados. Prova disso foi a realização, em Lisboa entre 13 e 14 de Maio, de uma formação para deputadas, organizada pela rede de mulheres do FPLP; Assembleia Parlamentar da Organização do Atlântico )orte (AP)ATO): reúne desde 1955, tendo primeiro sido designada por Conferência dos Parlamentos dos Países da NATO. Como Luís Sá nos diz esta teve como objectivo

“ultrapassar

uma

concepção

estritamente

militar,

através

designadamente da criação de um órgão […] para confronto de pontos de vista

52

de membros dos parlamentos nacionais dos países membros.”70 Desde 1976 que Portugal conta com a participação de uma delegação de sete membros efectivos e sete suplentes “que participam nas duas sessões anuais, bem como nas reuniões das comissões, subcomissões e em outras iniciativas desta organização.”71 O deputado José Lello do grupo parlamentar do PS foi designado este ano presidente da mesma assembleia; Assembleia da União da Europa Ocidental (AUEO): o Tratado de Bruxelas Modificado definiu as regras da composição das delegações parlamentares à AUEO, “tornando obrigatório que os seus membros sejam os mesmos que integram as delegações de cada um dos respectivos parlamentares à APCE.”72 Desde 1988 que Portugal envia uma delegação parlamentar à AUEO, com a mesma composição que a da APCE. Com futuro incerto que pode passar pela extinção ou pela criação de uma Assembleia Interparlamentar Europeia de Segurança e Defesa, a AUEO encontra-se em situação indefinida, sendo que o próprio deputado Mota Amaral, o actual presidente da delegação portuguesa tem levantado dúvidas quanto à sua continuação; União Interparlamentar (UIP): criada em 1889 a UIP não tem tido um papel muito relevante, fora os últimos movimentos que apontam para o estreitar de laços com a ONU, no sentido de se criar as Nações Unidas dos Parlamentos, ou seja, de se estabelecer uma vertente parlamentar na ONU. O trabalho de cooperação parlamentar ligado ao PNUD tem criado pontes para a criação ou restabelecimento de parlamentos fustigados por conflitos. Segundo a resolução da ARP nº 60/2004 publicada no DR nº195 de 19 de Agosto, a delegação portuguesa é composta por onze membros, sendo oito os efectivos;

70

Luís Sá, O Lugar da Assembleia da República no Sistema Político cit. por Nuno Paixão, ibidem p.313. Nuno Paixão, ibidem, p.313. 72 Idem, ibidem, p.313. 71

53

5. Grupos Parlamentares de Amizade Os GPAs estão previstos na resolução da ARP nº 6/2003 publicada em DR nº20 de 24 de Janeiro e estão consignados no capítulo V do RAR73. Tal como o indica o artigo 1º da mesma resolução, “os GPA são organismos da ARP, vocacionados para o diálogo e a cooperação com os parlamentos dos países amigos de Portugal”, ou seja, são elementos de cooperação e aprendizagem democrática entre parlamentos num princípio de reciprocidade que assenta no relacionamento entre entidades homólogas com especiais razões de afinidade e que respeitam a pluralidade democrática74. A sua composição é entre sete e doze deputados respeitando a composição do plenário em cada legislatura, nomeando-se um presidente, um vice-presidente e um secretário75. Os objectivos são os seguintes76: (i) troca de conhecimento e experiências; (ii) aprofundamento das relações bilaterais entre os dois Estados, através do seu enquadramento e promoção dos interesses comuns nos domínios político, económico, social e cultural; (iii)exercício de consultas mútuas para eventuais articulações bilaterais ou até multilaterais; (iv) proporcionar a reflexão entre as duas partes no que concerne a assuntos que envolvem os dois Estados; (v) estabelecer laços culturais com valorização do papel das comunidades de emigrantes; (vi) fomentar a cooperação política parlamentar no quadro da diplomacia parlamentar; Segundo Nuno Paixão “trata-se de associações de parlamentares de dois países que decidem a criação do Grupo, não só em relação dos laços pessoais existentes mas, sobretudo, com o objectivo de estreitar as relações bilaterais, de incrementar o diálogo parlamentar e a troca de informações, de acompanhar iniciativas concretas no campo da 73

Do artigo 43º ao 47º. Artigo 2º da mesma resolução. 75 Número 1 do artigo 8º da resolução, referente aos órgãos. 76 Artigo 4º da mesma resolução. 74

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cooperação ou de relacionar-se com outras entidades do país em causa”77. Dentro destes objectivos os GPAs recorrem a reuniões com os seus homólogos, com “entidades que visem a aproximação entre os Estados e entre os povos a que digam respeito, apoiando iniciativas e realizando acções conjuntas ou outras formas de cooperação” ou ainda “convidar a participar nas suas reuniões, ou nas actividades que promovam ou apoiem, membros do corpo diplomático, representantes de organizações internacionais, peritos e outras entidades”78. Para além da vertente bilateral, os grupos parlamentares também têm uma multilateral como acontece com o Grupo de Parlamentares conexo com a UNESCO e o Grupo Parlamentar sobre População e Desenvolvimento. Durante esta legislatura foram já criados GPAs com Alemanha, Argentina, Brasil, Canadá, China, República da Coreia, Espanha, EUA, França, Índia, Israel, Itália, Japão, Moçambique, Marrocos, Paquistão, Rússia, Timor-Leste, Ucrânia e Venezuela. Comparando com a anterior (2002-2005) que contou com catorze GPAs incluindo PALOPs, Brasil e Timor-Leste, houve um salto quantitativo na emancipação de grupos mas foram excluídos alguns PLOPs, pois não se observou o princípio da reciprocidade que obriga a existência de um grupo homólogo no outro parlamento. Em relação aos países de língua portuguesa os GPAs revelaram-se de extrema importância no reforço da cooperação parlamentar através do desenvolvimento de “acções concretas […] que envolveram a doação dos mais diversos materiais (medicamentos, material escolar, equipamento informático), visitas a estes países ou a realização de seminários e conferências.”79 Estas intenções, maioritariamente em regime ad-hoc, representam uma nova intervenção para a cooperação parlamentar que não é apenas técnica e reforça o papel de intervenção da ARP no aprofundamento democrático nestes países. Prova disso têm sido os custos disponibilizados pelo OAR para os GPAs que se mantêm na mesma ordem de números desde 2004. O problema dos GPAs reside na cessação dos mesmos aquando do final da legislatura. Esta regra, estipulada na Conferência de Líderes de 13 de Novembro de 199680, acaba por gorar todas as actividades desenvolvidas. Os GPAs dependem 77

Nuno Paixão, ibidem, p.316. Artigo 5º da resolução, referente aos poderes dos GPAs. 79 Nuno Paixão, ibidem, p.316. 80 Artigo 7º do RAR de 6/2003 de 24 de Janeiro. 78

55

enormemente, senão mesmo totalmente, dos deputados e dos contactos que estes formam com entidades estrangeiras e seus homólogos; ao estabelecer-se esta regra estamos a fomentar o corte sucessivo de relações e mantemos o aspecto “ad-hoc” das acções. Retomaremos esta temática no segundo ponto do capítulo seguinte.

56

§3 COOPERAÇÃO PARLAME)TAR COM OS PAÍSES DE LÍ)GUA PORTUGUESA

Este capítulo aborda a cooperação parlamentar, inserida nas relações parlamentares internacionais que abordámos no capítulo anterior. A primeira parte trata das acções de cooperação bilateral, incluindo as suas tipologias de acção e mecanismos de avaliação previstos. Inclui também reuniões a que assisti, tanto de visita de delegações à ARP como de GPAs. A segunda parte aborda as acções multilaterais no âmbito da cooperação parlamentar portuguesa. E a terceira e última parte analisa a importância da experiência portuguesa no interparlamentarismo europeu. Aí analiso o documento sobre a cooperação interparlamentar saído da Conferência dos Presidentes dos Parlamentos da UE reunida este ano em Lisboa. Na última página deste capítulo incluo um esquema gráfico de análise da organização da cooperação parlamentar portuguesa.

1. Acções de Cooperação Bilateral No capítulo anterior limitamo-nos a enunciar as competências externas da ARP e as ferramentas utilizadas para o fomento das relações parlamentares internacionais portuguesas. Incluídas no âmbito da diplomacia parlamentar, estas competências realçam uma unidade constante de análise: a democratização. Este movimento acontece em variados planos, sendo a parlamentar uma das mais recentes de um leque de ferramentas utilizadas pelos Estados ocidentais para ampliar esforços de cooperação política e técnica em Estados pós-conflito, em regime change ou em democracias recentes. O state-building ou o nation-building, para utilizarmos palavreado onusiano, tem servido para exportar uma série de estruturas e de comportamentos democráticos em situações onde a sociedade internacional é chamada a intervir, ora seguindo a política externa de certos Estados, ora através do apelo de grupos sociais dos Estados 57

destinatários. A cooperação parlamentar portuguesa, se bem que a um nível mais específico, está incluída nesta série de políticas internacionais de exportação do ideal democrático. Com o intuito de integrar os Estados no clube das democracias e dos bons regimes, estas actividades têm consequências ao nível da administração, da economia e da política nas sociedades destinatárias. Essas consequências estão inseridas naquilo que se acostumou designar por engenharias do social, que na actual conjuntura internacional assume faces visíveis e menos visíveis. A face mais visível está intimamente ligada à economia neo-liberal e ao arranjo pós-guerra que criou o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional e que mais tarde estabeleceria a Organização Mundial de Comércio; este regime internacional pós-colonial impôs as regras da livre-circulação e permitiu a uniformização dos sistemas económicos, financeiros e comerciais e estabeleceu as normas de cooperação e ajuda ao desenvolvimento, de que até Portugal foi destinatário com os pacotes de ajuda do FMI no governo Soares. A uniformização política é a consequência mais visível desta engenharia social planetária. Por outro lado tem-se recorrido a movimentos de socialização que estabelecem, no plano técnico e jurídico, as regras do jogo. Essa uniformização acontece no plano bilateral e multilateral através de processos de aprendizagem mútua, permitindo a “deslocalização” dos meios e a multiplicação das técnicas de exportação de sistemas políticos legais e administrativos. A cooperação parlamentar portuguesa surge como ferramenta de implementação de um sistema legal e administrativo e, por aí político, de normas, regras e princípios nos países de língua oficial portuguesa. A par do que se tem feito na UE, onde através das operações de gestão civil de crises ou do reforço da capacidade democrática81, têmse criado parcerias para a implementação de sistemas democráticos em sociedades pósconflito, como tem sido o caso das ex-repúblicas soviéticas82. No nosso caso temos verificado a multiplicação de contactos entre Estados excolónias portuguesas e juristas e técnicos nacionais83. Este aprendizado técnico tem-se

81

Maria João Militão Ferreira, A Política Externa Europeia – uma Reflexão da União Europeia como Actor Internacional, pp.306-3314. 82 O qual podemos dar o exemplo de edificação do parlamento na Geórgia. 83 Como é o caso do Prof. Jorge Miranda que redigiu o documento base para a Constituição de TimorLeste, bem como outros documentos legais discutidos em Assembleias Nacionais dos PLOPs: Uma 58

verificado na aplicação de documentação e na uniformização de sistemas legais e jurídicos, que se têm aproximado do nosso, não só por afinidade cultural mas também política e estratégica. A cooperação parlamentar tem incidido sobre estas realidades, principalmente após o início da democratização nos países africanos de língua portuguesa em meados da década de 1990. A partir dessa altura, todas as normas e problemáticas técnico-políticas e de teor legislativo têm sido postas na mesa pelas autoridades desses Estados, ávidos de solucionar os obstáculos que se colocam a sociedades que iniciaram processos de democratização. Prova disso é o que Christian Poncelet, presidente do senado francês, diz acerca dos serviços de relações internacionais dos parlamentos: “les services des relations internationales ont un role tout à fait spécifique à jouer dans le domaine de la coopération technique interparlamentaire. En fait, il s’agit d’íngénierie démocratique et même, pour être précis, d’ingénierie parlementaire qui doit être conduite par des praticiens de l’organisation et du fonctionnement parlementaires.84” Este papel de reforço dos parlamentos faz-se através do estabelecimento de uma teia institucional, que se baseia na própria organização administrativa da ARP. Ou seja, todos os serviços da ARP têm participado na cooperação parlamentar com os PLOPs, quer seja a título de aprendizagem, quer seja de capacitação dos serviços do parlamento destinatário. Estas aprendizagens desenvolvem-se nas áreas de apoio ao plenário, apoio às comissões, desenvolvimento e gestão da informação audiovisual e do património, gestão de recursos humanos, gestão de orçamento, acompanhamento técnico a deputados, protocolo, relações externas do parlamento, entre outras. As actividades de ensino, seja no terreno ou através de conferências, são dadas por pessoal com experiência em cada serviço especializado da ARP ou em Portugal. Organizações como a UIP têm promovido as relações parlamento-parlamento criando uma rede global institucional interparlamentar e fóruns, onde as instituições podem discutir problemáticas comuns ao nível da assistência mútua no campo da administração dos parlamentos. As agências internacionais têm estabelecido parcerias no sentido de aprofundar as relações entre serviços parlamentares: “assistance ranged

Constituição para Timor, Anteprojecto de Lei de Partidos Políticos da República Democrática de São Tomé e Príncipe, Sobre o Anteprojecto de Revisão da Constituição de Moçambique, todos incluídos na nossa bibliografia. 84 Discurso de abertura de uma conferência sobre a Diplomacia Parlamentar feita no Senado francês. Podemos encontrar a mesma em www.senat.fr/internacional. 59

from general support to physical and technical infrastructure support of legislative assemblies, such as modernization projects of parliaments funded by the Worl Bank and regional Development Banks. Examples of various projects are as follows: capacitybuilding targeting parliamentary staff, elected officials themselves or both in more technical skills required to perform their functions such as drafting of law, media training, audits and oversight.”85 Outras acções têm sido promovidas por estas organizações internacionais, com o objectivo de estreitar a relação entre deputados e eleitores, bem como apoiar campanhas anti-corrupção e de transparência do processo político86. Os parlamentos, como representantes da voz dos cidadãos devem ser os primeiros a estabelecer essa relação de proximidade, elevando o debate através de acções concretas no seu país para o enriquecimento da democracia, criando uma base de confiança entre o poder político e os eleitores. A cooperação parlamentar portuguesa levanta ainda outras questões, que se prendem com a natureza da nossa experiência parlamentar e com o processo de democratização em Portugal. É este acervo que acaba por definir o nosso campo de acção e o fomento de processos de aprendizagem por socialização, quer a nível político, quer técnico. Estes processos acontecem com o fomento de laços pessoais e com o mimetismo causado pelos encontros bilaterais e multilaterais, sendo que outros factores pesarão na definição das fronteiras dessa cooperação: o passado colonial, a guerra colonial, o processo de descolonização e independência, a implementação de regimes de partido único nos PALOPs e o surgimento de sistemas políticos multipartidários nesses Estados. Vejamos, então, de que forma a cooperação parlamentar tem actuado para aprofundar a democracia nos PLOPs.

1.1 Protocolos, Programas e Avaliação: mapa da cooperação parlamentar bilateral A ARP serve-se de Protocolos e Programas de cooperação para implementar um sistema de ajuda continuado, especificamente desenhado para cada um dos Estados destinatários. Os Protocolos são os documentos base que, por tempo indeterminado,

85

Carina Perelli, Strategic Concept: Challenges and Opportunities in Providing Assistance to Parliaments, p.8. Podemos encontrar a mesma publicação em www.ifes.org. 86 Idem, ibidem, p.8. 60

comprometem os dois parlamentos a estabelecer parcerias e a fomentar actividades de cooperação e aprendizagem mútua. Inspiram-se numa série de protocolos e acordos de cooperação firmados entre o governo português e as ex-colónias entre 1976 e 1980 que, admitiam a inter-ajuda em variados campos como difusão da língua, desenvolvimento equilibrado das relações económicas, envio de docentes e investigadores, cooperação no plano científico e cultural, domínio eleitoral entre outros87. Os Protocolos são assinados pelo PAR e admitem relação bilateral e recíproca no campo do apoio do reforço das capacidades dos parlamentos, seu funcionamento, administração e contacto com o poder político. São de carácter geral e apresentam propostas latas para o desenrolar das actividades de cooperação, bem como as regras estipuladas para a mesma relação. Os Programas são subsidiários dos Protocolos, uma vez que admitem as actividades bienais ou trienais que se pretendem desenvolver entre os dois países no âmbito da cooperação estabelecida pelos Protocolos. Estes são estipulados entre os serviços da ARP e os seus homólogos e pretendem fixar metas e datas para actividades de aprendizagem ou de reforço do parlamento nas sociedades. Estas actividades levam ao entrosamento e à multiplicação de aprendizagens entre os serviços parlamentares, cabendo a cada um comunicar e ensinar técnicas de trabalho ao serviço homólogo do parlamento destinatário. Nesta lógica os Programas apresentam o desenvolvimento de acções na área de apoio parlamentar, assessoria técnica, recursos humanos, biblioteca, documentação e informação parlamentar, informática, gestão e orçamento, relações públicas e internacionais e gestão e produção do acervo áudio e vídeo. A teia institucional dos serviços da ARP trabalha assim para o aprofundamento constante de mecanismos de socialização e aprendizagem democrática nos parlamentos dos PLOPs.

87

Acordo Geral de Cooperação e Amizade com a Guiné-Bissau e Acordo de Cooperação Científica e Técnica com a Guiné-Bissau, ambos de 1976; Acordo Geral de Cooperação e Amizade com São-Tomé e Príncipe de 1976; Acordo Geral de Cooperação e Amizade com Angola e Acordo de Cooperação no sector eléctrico com Angola, ambos de 1979. 61

O quadro seguinte mostra os Protocolos e os Programas de cooperação do actual cenário de cooperação88: Parlamento

Protocolo

Programa

Angola

2003

2003/04

Cabo-Verde

1995 + aditamentos 1997 e

2001/03

2002 Guiné-Bissau

2008

n/d

São-Tomé e Príncipe

2004

2007/09

Moçambique

2007

2003/05

Timor-Leste

2008

2003/05

Como é visível no quadro, nos últimos anos a ARP não tem firmado Programas de cooperação, mantendo-se em vigor apenas os Protocolos. Esta situação deve-se a variados factores. (a) OAR atribuído à cooperação parlamentar: o orçamento disponibilizado para este tipo de acções tem-se mantido em números absolutos mas não em números relativos se o compararmos com o orçamento geral da ARP, ou seja, os gastos da cooperação parlamentar face ao universo total dos gastos/ano do parlamento têm diminuído.

88

Podemos encontrar em anexo na página os protocolos e os programas de cooperação com os países lusófonos; podemos também consultá-los online em: http://www.parlamento.pt/RelacoesInternacionais/Paginas/CooperacaoInterparlamentar.aspx. 62

Gráfico 1 – Custos absolutos/ano para a Cooperação Parlamentar 1400000 1200000 1000000 800000 600000 400000 200000 0 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007

Fonte: Orçamento da Assembleia da República in DAR

Gráfico 2 – Custos relativos/ano para a Cooperação Parlamentar 1,60% 1,40% 1,20% 1,00% 0,80% 0,60% 0,40% 0,20% 0,00% 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 Fonte: Orçamento da Assembleia da República in DAR

Essa diferença nota-se entre 2004 e 2005, onde a cooperação representava cerca de 1,02% passou a ser de metade, ou seja, 0,56%. Desde aí que a representação relativa dos números da cooperação passaram a estar na ordem dos 0,5%. Se bem que esta actividade não é uma prioridade no OAR, é visível uma abordagem diferente desde 2005 na concepção das relações externas do parlamento. (b) Feedback: para que se mantenha uma relação bilateral são necessários contactos e manutenção dos mesmos ao longo do tempo, bem como um retorno do trabalho e das actividades levadas a cabo. Esse retorno no caso da cooperação parlamentar é avaliada através dos relatórios que são redigidos pelo parlamento português e pelo seu homólogo. Estes incluem o número de actividades 63

concluídas previstas no programa e determinam a natureza do próximo. O feedback depende dos seguintes factores: b.1) Ambiente Político – na maioria das vezes o seguimento dos programas ou dos protocolos depende dos momentos da política nacional como as eleições, mudança administrativa com nomeação de novo SG (os programas são desenhados e assinados entre SGs) ou presidente do parlamento, situações de conflito como a guerra civil ou golpe militar (de que até é exemplo o último golpe de tomada do poder na Guiné-Bissau); b.2) Situação do Parlamento – os parlamentos dos PLOPs apoiados pela ARP estão ainda em situação de arranque; como veremos no capítulo seguinte, estes apresentam diferenças de desenvolvimento face a variadas matérias e factores como independência face ao governo, edifício do parlamento com equipamento adequado ou sem ele, pessoal técnico administrativo e sua qualificação ou experiência, entre outros; estes factores influem na relação bilateral que se estabelece através dos protocolos e programas e dita o número de actividades concluídas previstas nos mesmos documentos; a situação do parlamento é avaliada segundo uma metodologia própria e aplicada durante as missões técnicas de avaliação que a ARP faz nos parlamentos dos PLOPs. São essas missões de avaliação técnica que permitem estabelecer os futuros Programas de cooperação; b.3) Política para as Relações Parlamentares Internacionais – tal como o factor anterior, esta está dependente das necessidades do parlamento destinatário da ajuda, bem como da vontade política demonstrada pela ARP para o reforço da relação bilateral; como esta relação não apresenta nenhum tipo de obrigatoriedade, muitas das vezes os parlamentos destinatários não correspondem ou não cumprem com os prazos previstos nos programas para o fomento de acções de cooperação, ou ainda a própria ARP não dá seguimento ao aprofundamento mesmo tendo sido pedido pelo parlamento destinatário, como é exemplo o caso da proposta de novo protocolo de cooperação com Cabo-Verde (2007) que acabou por não ter seguimento; 64

(c) Figura da Comissão Mista Permanente: tal como o feedback, a CMP permite avaliar o trabalho desenvolvido na cooperação interparlamentar. Esta foi estabelecida pela primeira vez no Protocolo de Cooperação com a ARM em 1996, inspirado pela utilização da mesma figura em acordos de cooperação entre o governo português e os governos dos PLOPs na década de 1970. No aditamento de 1997 ao protocolo de cooperação com a ANCV e no protocolo de 2003 com a ANA, esta figura está também prevista. Segundo o mesmo aditamento89, a CMP “é constituída por quatro deputados, sendo dois de cada uma das Partes, indicados pelo Presidente do respectivo parlamento”, sendo que “a Presidência da CMP é rotativa entre as Partes”; no elenco das competências está previsto que a CMP superintenda “na execução do Protocolo de cooperação e do seu aditamento”, estude “os cenários e os meios, nomeadamente técnicos e financeiros, que mais eficazmente assegurem o estreitamento das relações de cooperação parlamentar”, avalie “regularmente o grau de execução e a necessidade de actualização do Protocolo e do respectivo aditamento”, promova “debates de assuntos de interesse parlamentar para as Partes” e analise outras questões pertinentes. Estava também previsto que a mesma elaborasse um programa anual de trabalho apoiado pelo pessoal técnico dos dois parlamentos através de reuniões anuais. Todavia apenas a CMP prevista na cooperação com a ANCV reuniu uma vez em Lisboa, entre 20 e 24 de Janeiro de 2003, não tendo sido dado seguimento aos trabalhos da mesma. Tem, assim, ficado de fora uma ferramenta de apoio ao aprofundamento da cooperação parlamentar política portuguesa, bem como um bom método de avaliação técnica e política da mesma, apesar dos esforços dos GPAs.

1.2 Tipologia As actividades de cooperação inserem-se, abstractamente na seguinte tipologia: (a) Intercâmbio Político-Parlamentar: através de visitas de estudo de deputados ou de altos dirigentes dos parlamentos à ARP90 ou vice-versa;

89

Aditamento ao Protocolo de Cooperação assinado a 8 de Março de 1997 entre a ARP e a ANCV com inclusão do regulamento da CMP da ANCV e da ARP publicada em DAR nº15 de 3 de Agosto de 2002. Anexo na página 90 Com procedimentos fixados através do despacho nº13 da SG de 19 de Julho de 2007. 65

(b) Contribuição Financeira: pagamento de quotas dos parlamentos dos PLOPs para que os seus deputados possam participar em reuniões multilaterais ou de organizações parlamentares internacionais; auxílio financeiro dirigido e desligado; assistência financeira de emergência como já aconteceu com a ANPGB no pagamento das quotas para participar em reuniões da UIP; (c) Formação Profissional: através de acções de formação como os do CFI ou de cursos de formação realizados nos serviços da ARP como estágios on-job; missões de assistência técnica como de avaliação, diagnóstico e formação; cursos de curta duração; (d) Apoio Técnico: apoio prestado no país de origem por funcionários parlamentares portugueses ou contratação de especialistas do país de origem para assegurar trabalho técnico no parlamento destinatário; (e) Tecnologias de Informação e Comunicação: gestão e desenvolvimento de um parque informático; ligação à internet e criação de base de dados; (f) Fornecimento e Transporte de Equipamento e Material: doação de material variado como livros, computadores, manuais de apoio à formação e documentação especializada; (g) Partilha de encargos: a partilha dos custos agregados às actividades é estipulada no Programa de cooperação;

1.2.1

Actividades

Esta secção aborda as actividades que ocorreram durante o estágio. Elas são: visita de estudo à ARP de dois deputados e um funcionário da ANCV de 18 a 22 de Fevereiro; visita de estudo de deputados da Comissão de Saúde da ANA entre 25 e 28 de Março; missão de avaliação à ARM de 7 a 11 de Abril; visita de estudo de delegação de deputados e de um funcionário da ANA de 8 a 10 de Julho; Protocolo de Cooperação com o PNTL de 11 de Fevereiro.

66

1.2.1.1 Visita de Estudo da Assembleia )acional de Cabo-Verde de 18 a 22 de Fevereiro Os objectivos desta visita de estudo centraram-se no papel da ARP em matéria de protecção de dados pessoais (incluindo o funcionamento e organização da Comissão Nacional de Protecção de Dados - CNPD), no processo eleitoral português e nas competências da Comissão Nacional de Eleições (CNE), controlo das contas e finanças públicas e estudo do regime jurídico de incompatibilidades e impedimentos dos titulares políticos e altos cargos dirigentes em Portugal. A comitiva era composta pelos deputados Armindo Maurício (PAICV) e Humberto Cardoso (MPD) e José Graça, conselheiro jurídico do Presidente da ANCV. No caso da lei eleitoral interessou aos deputados o papel da CNE e da ARP no controlo e fiscalização dos actos eleitorais, nomeadamente na relação homóloga em Cabo-verde entre a Direcção-Geral de Apoio ao Processo Eleitoral (DGAPE) com o Núcleo Operacional da Sociedade de Informação (NOSI), ambos órgãos eleitorais caboverdianos; a isto juntou-se-lhe as matérias relacionadas com o recenseamento eleitoral e as especificidades geográficas do arquipélago. Estas dúvidas foram abordadas nas reuniões com a CNE, com Jorge Miguéis (director da área de administração eleitoral da Direcção-Geral de Administração Interna) e Graça Archer (directora de serviços jurídicos e estudos eleitorais), com o deputado António Filipe (PCP) na condição de vice-presidente da CACDLG e com Lucinda de Almeida (funcionária da ARP especialista em assuntos eleitorais). As audiências com o presidente do Tribunal Constitucional, com Joana Costa (assessora do gabinete do presidente do Tribunal Constitucional) e com o presidente da entidade de contas e financiamentos políticos (ECFP) serviram para discutir o papel da transparência face aos financiamentos públicos dos partidos durante o período eleitoral e fora dele. Realizou-se, também, uma visita de estudo à biblioteca da ARP para se conhecer as vantagens de um serviço técnico de informação de apoio aos grupos parlamentares. O fomento de uma nova lei eleitoral em Cabo-Verde foi o mote destas preocupações que incluíam a intervenção dos emigrantes no processo eleitoral cabo-

67

verdiano91, o recenseamento eficaz e transparente e a criação e gestão de uma base de dados nacional. Estas preocupações vão sempre ao encontro das necessidades continuadas de democratização, mantendo-se muitas dúvidas quanto aos processos de gestão técnica das estruturas com o sempre falado fantasma da politização dos órgãos de soberania. Não nos podemos esquecer que, tanto Cabo-Verde como os restantes PALOPs viveram desde a independência em regime de partido único, sendo muito recente a sua democratização.

1.2.1.2 Visita de Estudo de Deputados da Comissão de Saúde, Ambiente, Acção Social, Emprego, Antigos Combatentes, Família, Infância e Promoção da Mulher da Assembleia )acional de Angola de 25 a 28 de Março Esta visita de estudo teve como principal objectivo discutir a importância da ARP no estabelecimento de legislação nas áreas da saúde, trabalho e segurança social. Tive o prazer de assistir à reunião entre a delegação angolana e a Comissão de Trabalho, Segurança Social e Administração Pública, presidida pelo deputado Vítor Ramalho, no qual se discutiram assuntos relacionados com a inclusão de legislação sobre trabalho e segurança social, bem como o papel da comissão parlamentar na discussão dessas matérias.

1.2.1.3 Missão de Avaliação à Assembleia da República de Moçambique de 7 a 11 de Abril O grupo de trabalho da ARP era composto por Teresa Xardoné (adjunta da SG que chefiou a equipa), Ana Vargas (directora de Serviços de Apoio Técnico e Secretariado), Rui Costa (director de Serviço de Documentação e Informação ao Cidadão), João Viegas (director do Centro de Informática) e Cristina Ferreira (chefe da Divisão de Relações Internacionais). A missão centrou-se na análise das necessidades de cada serviço da ARM, através de reuniões serviço a serviço e de visitas aos locais de trabalho: apoio ao plenário, documentação, informação e arquivo, relações públicas,

91

De recordar que a maioria dos cabo-verdianos vive fora do arquipélago. 68

administração e finanças, relações internacionais, cooperação interparlamentar e protocolo e informática. As necessidades reportadas incidem com notoriedade na área informática, onde seria necessário incluir um parque informatizado que estabelecesse a ligação interserviços e entre grupos parlamentares e serviços; a falta de equipamentos específicos em cada serviço parlamentar é um obstáculo à eficiência do trabalho técnico da ARM. Mais especificamente falta reforçar a biblioteca e o seu espólio, preservar documentação histórica, sistematizar procedimentos na área protocolar e reforço das necessidades informáticas. Talvez o maior problema continua a ser a não independência financeira da ARM face ao governo, o que compromete o bom funcionamento da mesma e a continuada autonomia dos órgãos de poder. Com esta visita à ARM, a ARP assinou um novo Programa de cooperação, com vista a actualizar as necessidades e responder às mesmas de forma eficiente.

1.2.1.4 Visita de estudo de delegação de deputados e de um funcionário da Assembleia )acional de Angola de 8 a 10 de Julho Os deputados Jacques Matos Galo (MPLA) e João Lizimango (UNITA) e o funcionário parlamentar João António Pombal reuniram-se durante dois dias da visita com o centro de informática da ARP. Estas reuniões serviram para apresentar o parque informático do parlamento português e a sua importância para a gestão da informação parlamentar. Abordaram-se as questões relacionadas com a reformulação do site da ARP e a importância de se manter um parque informático na ANA, que actualmente precisa de estabelecer uma rede interna e de formar quadros técnicos para a gerir.

1.2.1.5 Protocolo de Cooperação entre a Assembleia da República Portuguesa e o Parlamento )acional de Timor-Leste de 11 de Fevereiro O novo Protocolo de cooperação com o PNTL vem substituir o Protocolo de 200292 e o seu aditamento de 200493. O anterior Protocolo fora estabelecido ainda em 92 93

Publicado em DR nº 16 de 16 de Fevereiro de 2002. Anexo Publicado em DR nº 19 de 21 de Fevereiro de 2004. Anexo 69

período de transferência de poderes da UNTAET para a República Democrática de Timor-Leste, e do estabelecimento de órgãos de soberania como foi o caso dos trabalhos da assembleia constituinte. Funcionários da ARP prestaram auxílio à constituinte, bem como no relacionamento com a UNTAET. O Protocolo de 2002 admitia, assim, no seu artigo 1º a “continuidade à cooperação já em curso, assegurando ainda a prossecução de acções concretas de partilha de experiências, através de visitas de delegações parlamentares, missões técnicas, programas de formação e outras formas de cooperação”, e no seu artigo 2º ficaria assegurado “a transição para o Parlamento Nacional da República Democrática de Timor-Leste das duas acções de assessoria técnico-parlamentar que a Assembleia da República de Portugal presta neste momento à Assembleia Constituinte”. O aditamento de 2004 admitiria mais dois eixos de cooperação: o Grupo Parlamentar de Amizade Portugal-Timor Leste94, e a consolidação de “consultas regulares e troca de experiências no domínio parlamentar”95, visto que o PNTL já estava estabelecido. Segundo o artigo 6º o aditamento teria a duração de quatro anos. O novo Protocolo refere-se à importância da “instituição parlamentar como centro da soberania popular, do pluralismo político e do resultado de eleições democráticas”, ao reforço da difusão do português e à convergência dos interesses na política internacional dos dois países. A grande diferença entre este Protocolo e o anterior é a especificação dos domínios de cooperação: o artigo 3º refere-se a “estágios práticos de formação contínua de funcionários parlamentares”, “assistência técnica na área jurídica, protocolo e relações públicas, audiovisual e informática” e “disponibilizar informação parlamentar, livros especializados, documentação vária e software e aplicações informáticas necessárias”; os artigos 4º e 5º referem-se a uma concertação de pontos de vista entre delegações no caso das organizações parlamentares internacionais; o artigo 6º contempla as reuniões bilaterais entre os presidentes dos dois parlamentos; o artigo 7º refere-se à metodologia relacionada com a cooperação parlamentar, especificando a duração plurianual dos Programas e à sua posterior avaliação. De notar a inclusão dos artigos 4º, 5º e 6º que reforçam o papel da diplomacia parlamentar, para além da cooperação que tem sido o elemento único dos Protocolos. A visão do PAR Jaime Gama tem conduzido as relações externas da ARP no sentido dos 94 95

Artigo 5º. Artigo 3º. 70

encontros bilaterais e multilaterais e tem, também, reforçado o papel das delegações parlamentares às assembleias interparlamentares através da tentativa de concertar pontos de vista.

1.3 Cooperação e Grupos Parlamentares de Amizade Os GPAs são entidades que estabelecem uma cooperação política entre dois parlamentos. Esta cooperação depende em grande parte dos intervenientes e dos seus recursos, neste caso contactos e agenda política, que permita activar uma relação bilateral privilegiada entre deputados e entre deputados e entidades que reforcem a relação estabelecida. Aqui o agente político é essencial para o fortalecimento da relação, quer seja pela manutenção e gestão dos contactos, como pelo estabelecimento de lobbies dentro do seu país para se atingirem certos objectivos. Esse é o caso dos exemplos seguintes. Um dos pontos fracos deste tipo de cooperação é que ela se centra, na maioria das vezes, na figura do presidente do GPA que acaba por ser o motor do estabelecimento da relação por ser aquele que detém mais contactos ou porque simplesmente se empenha no fomento de actividades. Esta secção dedicar-se-à a fazer uma descrição das reuniões que assisti dos GPAs Portugal-Timor-Leste, Portugal-Israel e Portugal-China. Pretendo com isto fazer uma abordagem dos GPAs inserindo-os na cooperação parlamentar portuguesa e fazendo uma comparação sucinta entre eles. Farei um estudo de caso das seguintes reuniões: GPA Portugal-Timor com recepção da Associação APARATI (19 de Fevereiro), GPA Portugal-Israel reunido com Benny Dagan subdirector do MNE israelita para as questões do Médio Oriente (10 de Abril) e GPA Portugal-China reunido com a Comissão de Saúde (1 de Abril).

1.3.1 Reunião do Grupo Parlamentar de Amizade Portugal-Timor-Leste de 11 de Fevereiro A reunião serviu para reunir os deputados do grupo para criação de uma proposta de programa de actividades para 2008. Visto que o grupo homólogo de 71

deputados timorenses ainda está em fase de formalização, o grupo português não tem tido muita actividade, devido também ao último escrutínio eleitoral timorense de Junho de 2007. A proposta do programa de actividades prevê a promoção de contactos com a embaixada de Timor-Leste em Lisboa, com entidades portuguesas ligadas à cooperação com o país e reuniões com instituições ou entidades timorenses sedeadas em Portugal. A segunda parte da reunião serviu para receber a associação APARATI, constituída por timorenses residentes em Portugal. Esta parte da reunião centrou-se no tema da atribuição de reformas a cerca de 1460 timorenses aposentados do Estado português. A mesma associação tem durante alguns anos tentado reaver as reformas, tendo-se reunido com grupos parlamentares, insistindo no estabelecimento de uma legislação que atribua as mesmas subvenções. Nesta reunião esperavam o apoio dos deputados presentes para a criação de uma legislação específica para o caso que apresentaram.

1.3.2 Reunião do Grupo Parlamentar de Amizade Portugal-Israel com Benny Dagan, subdirector do Ministério dos )egócios Estrangeiros israelita para as questões do Médio Oriente e com o Embaixador de Israel a 10 de Abril O contacto regular que o deputado João Rebelo (CDS-PP), presidente do GPA Portugal-Israel, tem estabelecido com o embaixador de Israel em Portugal tem servido para a criação de parcerias entre a embaixada de Israel, a comunidade israelita de Lisboa e o parlamento português. Uma dessas provas é a edificação em Lisboa do monumento em homenagem aos judeus vítimas do pogrom português96. O GPA Portugal-Israel centra parte da sua actividade nas questões da política externa de Israel e, principalmente sobre as questões ligadas ao Médio Oriente. Durante a reunião Benny Dagan falou da questão iraniana e dos últimos ataques palestinianos em território israelita, tecendo uma análise do governo iraniano e das suas teias relacionais, de Israel como Estado integrado no Médio Oriente e da questão palestiniana. Tal como outros encontros97, este serviu para evidenciar a visão israelita da sua própria política externa.

96

Notícia vista online em: http://www.cilisboa.org/hist_pt.htm. Como é exemplo o de dia 24 de Junho, em que o GPA recebeu Irit Lillian, Directora do Gabinete de Relações Bilaterais Europa Sul do Ministério dos Negócios Estrangeiros de Israel. 97

72

1.3.3 Reunião do Grupo Parlamentar de Amizade Portugal-China com a Comissão de Saúde e uma delegação chinesa a 1 de Abril98 A reunião serviu para discutir a lei nº 45/2003 ou do enquadramento base das terapêuticas não convencionais. A delegação chinesa era composta pelos: Professores Fan Xinjian e Li Zhenji da Universidade de Medicina Chinesa de Chengdu, Pedro Choy e Gao Kexiang, embaixador chinês acreditado em Lisboa. Era desejo da delegação que a mesma legislação entrasse em vigor para a inclusão da medicina tradicional chinesa no plano nacional de saúde. A delegação pediu um esclarecimento acerca do actual processo legislativo à presidente da Comissão de Saúde, a deputada Maria do Rosário Belém (PS).

2. Acções de Cooperação Multilateral A cooperação parlamentar portuguesa tem-se alargado ao multilateral, através de variados palcos. Abordamos nesta secção os seguintes: Fórum Parlamentar de Língua Portuguesa, Assembleia Interparlamentar de Língua Portuguesa, Associação de Secretários-Gerais dos Parlamentos de Língua Portuguesa, Curso de Formação Interparlamentar e Reunião entre os Serviços de Informática dos Parlamentos de Língua Portuguesa.

2.1 Fórum Parlamentar de Língua Portuguesa Este é uma organização de cooperação interparlamentar entre os Estados membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, instituído pela declaração de 21 de Março de 1998. Desde essa data realizaram-se cinco Fóruns: Maputo (1999), Cabo-Verde (2002), Brasília (2005), Luanda (2006) e Bissau (2007). O estatuto do FPLP foi aprovado em 19 de Novembro de 2002 na reunião dos presidentes dos parlamentos de língua portuguesa, reunidos na cidade da Praia99 e o seu regimento aprovado na reunião de Brasília. Os objectivos do Fórum estão inscritos no artigo 3º dos mesmos estatutos:

98

Podemos consultar em anexo na página o Programa de Actividades do GPA Portugal-China. Estatuto do Fórum dos Parlamentos de Língua Portuguesa aprovados a 27 de Fevereiro de 2003 pelo PAR João Bosco Amaral – publicado em DR nº 63 Resolução da ARP nº21/2003 de 15 de Março. 99

73

(i) contribuir para aprofundar a paz, as instituições democráticas e a boa governança, consolidando o Estado de Direito; (ii) defesa dos direitos inalienáveis do Homem, combatendo todas as formas de discriminação e de tráficos; (iii) intensificar a cooperação no plano cultural, educativo, económico, científico e tecnológico; (iv) concertação de interesses em variados fóruns internacionais; (v) promover a harmonia em matéria legislativa; (vi) estabelecer contactos e intercâmbios entre os parlamentos através de experiências no domínio legislativo e do controlo do executivo; (vii) “organizar acções de cooperação e solidariedade entre os parlamentos nacionais dos Estados membros da CPLP”; (viii) “acompanhar e estimular as actividades da CPLP”; Inseridos numa série de princípios que tentam assegurar a defesa da democracia, dos regimes plurais e da fundação do Estado de Direito, estes objectivos acompanham o aprofundamento da cooperação interparlamentar com os PLOPs. Com ênfase na aprendizagem na área legislativa e no controlo das acções governativas, objectivos máximos de um qualquer parlamento inserido num sistema democraticamente eleito, o FPLP contribui para os processos de aprendizagem cooperativa que se desenham entre os parlamentos, no reforço do sistema democrático em que estes estão inseridos. A aprendizagem nas áreas legislativa e de fiscalização do executivo são importantes em Estados onde os parlamentos ainda estão economicamente ou legalmente dependentes dos governos ou onde estes assumem apenas um papel tribunício, estando ainda longe de assegurar um verdadeiro controlo das instituições democráticas. A prossecução destes objectivos está assegurada pelos três órgãos do Fórum, sendo eles o Presidente, a Conferência dos Presidentes dos Parlamentos e a Assembleia Interparlamentar100. A presidência é rotativa e anual, cabendo a cada presidente do parlamento respectivo o cargo de presidente do Fórum (artigo 6º); as Conferências 100

Artigo 5º dos Estatutos da FPLP. 74

reúnem uma vez por ano todos os presidentes dos parlamentos membros (artigos 8º, 9º e 10º) e é o órgão que centraliza a maioria das decisões, bem como toda a política seguida pela FPLP; a Assembleia interparlamentar reúne os presidentes dos parlamentos e as delegações parlamentares eleitas em cada plenário para o efeito (artigos 11º e 12º). O último Fórum realizou-se entre os dias 12 e 14 de Outubro de 2007 em Bissau e juntou a Conferência de Presidentes, a reunião extraordinária da ASG-PLP, a reunião da Rede de Mulheres Parlamentares e a Assembleia Interparlamentar com a delegação portuguesa formada pelos deputados Vítor Ramalho (do PS, presidindo à delegação), Miguel Coelho (PS), Maria do Rosário Carneiro (PS) e Luísa Mesquita (PCP) e pelas funcionárias Cristina Ferreira (chefe da DRI) e Helena Alves (DRI). Os esforços realizados para incluir o Fórum como Assembleia Parlamentar da CPLP ainda não deram frutos, uma vez que, apesar de já ter sido aprovada pela reunião do Conselho de Ministros através da revisão dos estatutos da CPLP, nem todos os parlamentos aprovaram em plenário a mesma. Inserida nas actividades do Fórum realizou-se no auditório do edifício novo da ARP, entre 13 e 14 de Maio deste ano um “Seminário de Formação destinado a Deputadas da Rede de Mulheres Parlamentares do Fórum dos Parlamentos de Língua Portuguesa”. Participaram na mesma as deputadas Isabel da Costa Dala (ANA), Martina Moreira Moniz, Antónia Mendes e Maria da Conceição Cruz (ANPGB), Maria Ângela Majarte (ARM), Maria Terezinha da Silva Viegas e Maria Paixão (PNTL). Os temas abordados foram: “orçamento de Estado numa perspectiva de género”, “legislação e protecção da mulher” e “liderança e participação política”. Estas reuniões da rede de mulheres não são nada de novo pois aparecem integradas nos actuais debates internacionais sobre a participação da mulher na política com o objectivo de erradicar a discriminação de género e para abrir as sociedades para a sua inclusão na vida activa no contributo para a democratização das sociedades.

2.2 Associação de Secretários-Gerais dos Parlamentos de Língua Portuguesa A ASG-PLP coopera, a título consultivo, em todas as actividades do FPLP, estando dependente das linhas orientadoras emanadas pela conferência dos presidentes, como dita o artigo 6º dos estatutos do Fórum. A sua existência muito se deve à 75

experiência que Portugal traz das reuniões entre SGs dos parlamentos da UIP, bem como de intercâmbios técnicos que se tinham vindo a estabelecer a título pessoal e adhoc entre SGs dos parlamentos de língua portuguesa. Os seus objectivos são: “promover o desenvolvimento da cooperação técnicoparlamentar comum”, “contribuir para a consolidação e modernização das instituições parlamentares” e “facilitar o contacto pessoal e institucional dos seus membros”101. Ou seja, a ASG-PLP é a institucionalização de contactos que se tinham vindo a estabelecer entre serviços e SGs de todos os parlamentos de língua portuguesa102. De salientar a importância do artigo 9º que remete a ASG-PLP para “relações preferenciais com a União Interparlamentar através da Associação dos SecretáriosGerais dos Parlamentos criada no seu âmbito”, o que alarga o espectro da associação para a multilateralização dos mecanismos de cooperação interparlamentar.

2.3 Curso de Formação Interparlamentar O Centro de Formação Parlamentar e Interparlamentar foi criado pela resolução de 2004 “tendo por objectivo enquadrar a formação dos recursos humanos da ARP, criando condições para esse tipo de formação incluir os deputados e funcionários dos parlamentos de língua portuguesa, reforçando assim o trabalho de cooperação parlamentar.”103 O CFI é administrado pelo CFPI e conta já com quatro edições consecutivas, reunindo deputados e funcionários dos parlamentos de língua portuguesa com necessidades administrativas e de formação num mesmo curso, durante um curto espaço de tempo em Lisboa. Este surge a par das formações que tinham ocorrido no Instituto Nacional de Administração para funcionários parlamentares. O CFI foi ideia da anterior SG, Isabel Côrte-Real, que pensou o curso como ferramenta de reforço das situações ad-hoc de cooperação parlamentar que se tinham vindo a verificar na relação bilateral com os parlamentos dos PLOPs a partir de 2003. Desta forma pretendia-se criar um curso desta natureza no nosso país. Quis-se colmatar o erro de formar pessoas que, nos parlamentos destinatários acabavam por ficar pouco

101

Artigo 2º dos mesmos estatutos. Número 1 do artigo 6º dos mesmos estatutos. 103 José Manuel Araújo, ibidem, p.344. 102

76

tempo na mesma actividade e que repetiam formações em diferentes áreas, sem garantir conhecimento e experiência especializada. Este seria, então, uma conferência alargada que juntaria funcionários parlamentares e deputados em formação intensa e especializada. Com o parcial abandono da cooperação bilateral, o CFI surgiu como a ferramenta mais intensa de formação e capacitação continuadas da ARP nos parlamentos de língua portuguesa.

2.4 Reuniões entre os Serviços dos Parlamentos de Língua Portuguesa A par da cooperação política se ter multilateralizado ao nível dos parlamentos de língua portuguesa, outro fenómeno tem vindo a acompanhar esta tendência. Esse fenómeno é o que designamos por multilateralização dos contactos entre serviços dos parlamentos. A par da ajuda e aprendizagem técnica feita a título bilateral no âmbito dos Protocolos e Programas de cooperação, as relações entre os serviços têm aumentado, gerando reuniões especificamente orientadas para a realização de relatórios da situação de cada serviço dentro do parlamento, tornando-se uma ferramenta informal de aprendizagem e contacto constantes104. Isto acontece não apenas pelos impulsos gerados pela cooperação bilateral que origina contactos pessoais, mas também pela necessidade de apoiar e aprofundar a cooperação técnico-parlamentar entre parlamentos de língua portuguesa, já iniciada pela ASG-PLP. Outro factor que influi para o aparecimento destas reuniões prende-se com o rumo que a própria cooperação bilateral tem levado. Nesta última legislativa temos assistido a movimentos de ressurgimento da cooperação, após período de alguma contenção orçamental, mas também pelo estabelecimento de uma nova visão para as relações parlamentares internacionais da ARP, impressa por Jaime Gama. O carácter pessoal e informal das reuniões entre funcionários parlamentares assume contornos específicos e remete-nos para um outro patamar da própria cooperação parlamentar multilateralizada. Mesmo assim as reuniões ainda não assumem

104

Como são prova os relatórios apresentados sobre cada parlamento no site da ASG-PLP: http://www.asg-plp.org/upload/cadernos_tematicos/doc_103.doc. e http://www.asgplp.org/upload/cadernos_tematicos/doc_138.doc. 77

carácter institucional e surgem esparsamente no tempo. As únicas que se têm mantido, muito pela mão de João Viegas, director do Centro de Informática da ARP, são entre serviços de informática da ARP, da ANSTP, da ANA, da ANCV e do Congresso brasileiro e até agora têm permitido o aprofundamento de aprendizagens de gestão dos parques informáticos, ou ainda, em casos de parlamentos ainda sem rede interna, no seu fomento através de formação a funcionários ou de apoio técnico continuado a redes já existentes mas ainda esparsas no terreno.

3. Experiência

Portuguesa

no

Interparlamentarismo

Europeu:

Conferência dos Presidentes dos Parlamentos da União Europeia e Cooperação Interparlamentar Um dos factores mais importantes do entrosamento da cooperação parlamentar portuguesa é a nossa experiência comunitária de mais de vinte anos. Com a integração europeia, Portugal passou a ter de incluir um acervo legislativo comunitário que passava naturalmente pelos parlamentos nacionais. Esse foi e é o papel mais visível dos parlamentos no processo de construção europeia. Como referimos na introdução, o novo Tratado de Lisboa inclui pela primeira vez um articulado referente aos parlamentos nacionais e ao seu papel no processo105. Outro fenómeno interparlamentar paralelo ao legislativo é o cooperativo. A UE tornou-se um palco de socialização e de construção de parcerias que levam ao mimetismo em matéria legislativa e técnica, áreas de interesse e desenvolvimento do papel dos parlamentos. Esta cooperação faz-se pensada na continuada capacitação das técnicas parlamentares através do diálogo informal ou institucionalizado entre os parlamentos nacionais e os órgãos comunitários. Exemplo disso são as visitas dos funcionários parlamentares portugueses ao PE. Esta cooperação tem-se feito com os países candidatos à entrada na UE, acompanhando as conversações e a negociação entre a Comissão Europeia e esses mesmos Estados, sendo sinal disso a participação de delegações de países candidatos na reunião de SGs da União Europeia a 4 de Abril na sala do Senado da ARP. A capacitação parlamentar surge como aprendizagem de métodos democráticos no espaço 105

Artigo 12º que prevê a utilização do escrutínio pelos parlamentos nacionais em todas as iniciativas legislativas e não legislativas. 78

comunitário e para-comunitário, na continuação das políticas de fronteira que a UE tem levado a cabo, bem como na ajuda à criação de estruturas de Estado de Direito nesses países. A cooperação entre funcionários, de que a reunião anual de SGs é a bandeira, acontece também a todos os níveis de serviços homólogos. Exemplo paradigmático é a COSAC que já referimos anteriormente. A reunião de SGs da Europa realizou-se este ano em Lisboa106 no dia 4 de Abril e serviu para preparar a agenda da conferência dos presidentes dos parlamentos da UE. Desta conferência resultou a aprovação de um documento sobre a cooperação entre parlamentos nacionais da UE107. Os objectivos destas guidelines compreendem108: (i) promover a troca de informação e de melhores práticas; (ii) reforçar o escrutínio e o controlo parlamentar; (iii) assegurar o exercício efectivo das competências parlamentares no quadro da UE e do processo de integração, nomeadamente na monitorização dos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade; (iv) promover a cooperação com os países do terceiro mundo; Os palcos previstos para esta cooperação intra-parlamentos da UE são a Conferência dos Presidentes dos Parlamentos, a COSAC, as reuniões sobre tópicos de interesse comum, as reuniões entre comissões especializadas dos parlamentos, a reunião dos SGs e encontros entre deputados109. Estas guidelines são sinal da preocupação de reforçar o papel dado pelo Tratado de Lisboa aos parlamentos nacionais e de incluir um método organizado para implementar uma rede de cooperação entre parlamentos da UE. Talvez o próximo passo seja dado para incluir uma relação estratégica entre os parlamentos europeus na relação com os seus homólogos do terceiro mundo.

106

Tanto a reunião de SGs como a conferência de presidentes realizaram-se este ano no parlamento português por causa da presidência portuguesa da UE. 107 Guidelines for the Inter-Parliamentary Cooperation in the European Union – anexo y 108 Ponto I ou Objectives. 109 Ponto II ou Framework. 79

§4 PROCESSOS DE APRE)DIZAGEM DEMOCRÁTICA )O ESPAÇO LUSÓFO)O

Este capítulo fará uma pequena incursão pelo mundo da exportação do acervo democrático no espaço lusófono. Para isso incluímos a cooperação parlamentar numa série de técnicas de aprendizagem administrativa, jurídica e política, analisando a efectividade da mesma para o aprofundamento da democracia nestas sociedades. Na primeira parte apresento um quadro metodológico que contém o contexto de aplicação da cooperação parlamentar portuguesa, traçando as tendências futuras através da análise de casos paradigmáticos e contraditórios, como sejam Timor-Leste ou GuinéBissau e Moçambique ou Cabo-Verde. Depois apresentamos dois estudos de caso: o primeiro analisa a cooperação parlamentar como eixo de harmonização dos sistemas legais de língua portuguesa, para além do Direito constitucional comparado; o segundo esboça um pequeno quadro comparativo entre a formação parlamentar dada pela ARP e pelo Senado Federal brasileiro.

1. Contexto O próximo quadro ilustra em que contexto tem sido utilizada a cooperação parlamentar portuguesa num cenário pós-colonial. Esse contexto inclui, a meu ver, as preocupações com o conceito de estatalidade e da sua efectiva existência em Estados pós-coloniais. Ou seja, pressupõe-se uma série de factores que condicionam a existência de um Estado de Direito democrático, ou ainda na sua raíz, de um Estado nas concepções clássicas e modernas do termo. A cooperação parlamentar, através de dois eixos (autonomização dos parlamentos e capacitação técnica dos funcionários parlamentares), apresenta-se neste modelo como um dos garantes do progresso democrático em sociedades que apresentam défices de estatalidade. 80

Esquema 1. O Pós-Colonial e a Capacitação Parlamentar

Défice de Estatalidade

1. Estado in fieri 2. Regime Presidencialista 3. Democracia Jovem

Acervo

4. Economia Dependente a. Passado Colonial 5. Conflitos Internos/Regionais 6. Incoerência entre Law in the Books e Law in Action

b. Descolonização c. Política Externa Portuguesa

7. Falta de Administração Qualificada 8. Serviço Público Partidarizado

Cooperação Parlamentar 1. Autonomização dos Parlamentos 2. Superar Carências Administrativas

C

DEMOCRATIZAR

A Missões Técnicas

Visitas de Estudo

P A

Protocolos e C

Programas

I T A R

Estágios On Job

Financiamento

APRE)DER

81

O défice de estatalidade que aqui admitimos é consequência de uma série de factores bem mais vastos do que aqueles que apresentamos. Para a análise do nosso objecto de estudo pretendemos apenas definir oito: Estado in fieri, regime presidencialista, democracia jovem, economia dependente, conflitos internos/regionais, incoerência entre law in the books e law in action, falta de administração qualificada e serviço público partidarizado. De novo recordamos que este trabalho não tem pretensões de apresentar um modelo científico de análise que prove uma hipótese heurística; queremos apenas montar um esquema mental que nos permita inserir a cooperação parlamentar num dado contexto político, ambiental e societal. Por Estados in fieri consideramos os Estados que pela sua origem colonial não proporcionam o conceito romântico de um Estado, uma Nação; na sua acepção contemporânea poderemos considerar aqueles Estados que dotados de um centro vivem em perturbação com outros centros que tentam a auto-determinação como meio de potenciar o conceito clássico de Nação; estes Estados não detêm total legitimidade para uso do monopólio da força, ou não lhes é dotada essa legitimidade pelos restantes centros, bastando-lhes instrumentos ou artifícios imagéticos de controlo da centralidade estatal através de conceitos políticos ocidentais recicláveis em índigenas – aqui admitimos o tal movimento de importação de meios de aprendizagem democrática. O regime presidencialista distingue-se do sistema presidencial dotado de constitucionalidade formal, ou seja, incluído na law in the books. Muitos dos regimes africanos presidenciais na sua constitucionalidade são-no também presidencialistas, pelas considerações de centralismo numa figura ou órgão do Estado, neste caso na presidência. Noutros casos em que se observam ora constitucionalidade semipresidencialista híbrida ora de parlamentarismo, também podemos considerar exemplos de derivas presidencialistas que não estão previstas constitucionalmente e, que provam, as tentativas de centralização do poder na figura do chefe de Estado. Este fenómeno, analisado por Sundquist em The U.S. Presidential System as Model for the World, diznos que o poder em África e na América do Sul segue uma distribuição diferenciada daquela que encontramos no ocidente, não só pela sua herança cultural, bem como da genética do poder e da sua legitimidade, muitas das vezes baseada no passado tribal. Prova-se em variados Estados (como Angola e Guiné-Bissau) que o chefe do governo assume características patriarcais no seio da comunidade; ele é assim o provider e tem

82

legitimidade para centralizar o poder. Ora, isto contraria totalmente o que formalmente é adoptado nos textos legais. Quando classificamos estes Estados como democracias jovens, queremos simplesmente aludir ao fenómeno temporal e não a conceitos valorativos que nos podem conduzir para análises actualmente fetichistas entre rogue e failed states. Aqui queremos especificamente incluir os regimes africanos pós-independência (que se observarmos o mapa das ex-colónias portuguesas nesse continente verificamos que todos seguiram o modelo soviético); o fenómeno familiar, tribal e a ligação entre os movimentos de independência e a formação de partidos políticos; as derivas políticas ocidentais que foram gradualmente incluídas na legislação desses Estados e que os conduziu a reformas de veludo; a formação de um sistema multipartidário recente; a corrupção e os fenómenos de compra do poder e as ligações entre o público e o privado, bem como o compadrio e a falta de ética profissional; a falta de autonomia dos tribunais e do parlamento, quer por impedimentos económicos, quer políticos. Por economia dependente queremos realçar a questão do subdesenvolvimento e do seu passado colonial e presente pós-colonial. A problemática da dívida externa e da exportação de matérias-primas, bem como a falta de instituições capazes de gerir os recursos. Conflitos de ordem, primeiro social e depois militar; socialmente podemos considerar que a institucionalização do debate através do parlamento é um bom indicador da forma como o conflito está a ser digerido pelo sistema democrático e pela sociedade civil. Dever-se-á ter em atenção as guerras civis em conjunto com os fenómenos de centralização do poder político e das tomadas de assalto unilaterais na Administração pública. No aspecto militar não nos podemos esquecer da relação entre movimentos

de

libertação/partidarização

dos

mesmos

com

a

guerra

civil/multipartidarismo. A incoerência entre law in action e law in the books é uma preocupação central deste capítulo; partindo do texto Os Processos de Constitucionalização dos Estados Africanos Lusófonos entre Factos e "ormas do Prof. Armando Marques Guedes, inserido no seminário O Semi-Presidencialismo e o Controlo da Constitucionalidade na África Lusófona organizado pelo Instituto Diplomático, tentaremos relacionar não só o 83

Direito constitucional com a sua aplicabilidade material e política, como também a relação entre o uso do poder político e a sua consagração formal, e a inclusão do Direito de origem ocidental e especificamente o português nas concepções “tribais” de poder. Aqui voltamos a indicar os fenómenos de derivação do poder como importantes na montagem do nosso contexto. A falta de administração qualificada é produto primeiro da descolonização e segundo da falta de quadros formados nestes Estados, que possam responder aos anseios de mudança democrática. A não existência de quadros capazes inseridos no serviço público constitui-se uma deficiência relevante para a continuada democratização das estruturas sociais e, para o processo de construção do Estado. Outro fenómeno que acompanha a falta de administração qualificada é a própria partidarização do serviço público; todos os países africanos lusófonos passaram por regimes monopartidários e experimentaram em alguns casos guerras civis e sofreram das consequências de certos conflitos regionais. O fim da guerra colonial ditou a partidarização das divisões tribais e das variadas sensibilidades comunitárias que participaram em movimentos de auto-determinação. Em todos os casos optou-se pela sovietização que nos casos angolano e moçambicano conduziu à guerra civil. A democratização do regime com o multipartidarismo incipiente na segunda metade da década de 1990 foi também sinal do cisma provocado pelo fim da URSS em África, restando ainda alguns exemplos práticos do sistema que, supomos serem endémicos ao entendimento local do conceito de poder político. Ora a sovietização, ora a democratização encerram em si processos de adaptabilidade indígena a sistemas e regimes ocidentais. Estes processos são visíveis na neurótica centralidade do Estado (o governo das províncias e as tentativas de “municipalizar” Moçambique e Angola), nos resquícios da economia colectivizada (Cabo-Verde não procedeu à total privatização dos terrenos agrícolas), no nepotismo. Importa perceber que papel teve Portugal nos aspectos jurídico e político, para a formação, primeiro de um regime tendencialmente soviético e, segundo na democratização do mesmo. Aqui devemos incluir o esforço do parlamento português na qualificação e capacitação da administração, numa abertura ao multipartidarismo e à descentralização do Estado. Outra questão interessante é a de saber se existe algum apoio da ARP aos grupos parlamentares dos países lusófonos. Em conclusão, importa 84

analisar a partidarização da administração pública, em particular dos técnicos parlamentares, em paralelo com os processos democratizantes. A cooperação parlamentar portuguesa é também produto de um passado colonial, de um processo de descolonização, de uma política externa e de um fenómeno de diplomacia parlamentar que acompanhou o florescer dos métodos de cooperação internacional. No capítulo que reservámos para a metodologia, apresentámos um quadro teórico-conceptual que vale a pena revisitar nesta fase do nosso raciocínio. Ali colocávamos em caminhos paralelos a cooperação internacional e a cooperação de teor parlamentar; decidimos fazê-lo pois a primeira está ligada a movimentos intergovernamentais e supranacionais e a segunda pertence ao leque de cooperações específicas, de teor técnico e político, que baseiam a experiência parlamentar do ocidente para a transportar para Estados com processos democratizantes muito recentes ou que no passado enfrentaram conflitos militares, políticos e sociais internos. Está provado que a cooperação internacional não substitui a cooperação parlamentar, visto que os técnicos que nela participam não têm experiência suficiente para edificar de raíz um parlamento e por aí, um sistema parlamentar assente numa constituição que o abriga. É por isso que a cooperação parlamentar tem como objectivos a autonomização dos parlamentos e a superação de carências administrativas. A autonomização acontece pois os parlamentos sofrem ora do centralismo da presidência da república (constitucional ou através de derivas presidencialistas), ora de questões orçamentais (dependência face ao governo ou ministérios específicos e não do orçamento de Estado com certa autonomia para gerir receitas e património; orçamentos limitados), ora de questões administrativas (falta de quadros técnicos qualificados; partidarização dos quadros; gestão deficitária dos recursos, salvo excepções; modelos rígidos de trabalho; falta de qualificação continuada pós descolonização), ora da falta de experiência parlamentar dos deputados (as sessões parlamentares estão muitas vezes dependentes das iniciativas legislativas do governo, sendo que os grupos parlamentares ou não têm quadros qualificados para o apoio técnico, ora se vive em regime tribunício). A superação das carências administrativas acontece através dos protocolos e programas de cooperação parlamentar da ARP; este eixo pretende capacitar os funcionários de outros parlamentos com ferramentas técnicas para que estes possam desempenhar melhor as suas funções. Através da capacitação e formação dos técnicos 85

consegue-se a capacitação dos trabalhos parlamentares, numa lógica democratizante. Já no plano político dá-se importância aos GPAs e aos encontros entre deputados portugueses e outros dos países lusófonos (no âmbito da FPLP ou de Organizações Parlamentares Internacionais). É por isso que capacitar, através da superação de carências técnicoadministrativas, bem como no apoio à construção de Estados e edificação dos pilares da democracia com o estabelecimento de proto-parlamentos e da criação dos mesmos pósprocesso

independência

ou

pós-regimes

totalitários,

são

essenciais

para

o

estabelecimento de um sistema parlamentar crível. Pois aprender surge numa lógica bilateral num processo de democratização em Estados com jovens democracias ou saídos de regimes totalitários, num processo de adaptabilidade continuada. E essa aprendizagem é também biunívoca, uma vez que se apresenta como método de trabalho para as democracias ocidentais inseridas na globalização e numa economia neo-liberal. Num continuum transformacional, as democracias menos recentes enfrentam as questões que estão inseridas nos contemporâneos processos de democratização na Ásia e em África.

2. A Qualidade do Sistema Parlamentar no Espaço Lusófono A institucionalização de um parlamento acontece quando “ é possível detectar-se a existência e a permanência de regras, processos e modelos de comportamentos válidos que permitem que se atenda a novas configurações de reivindicadores e/ou reivindicações políticas”110 Para Oppelo esse esprit de corps depende de uma autonomia, de uma complexidade e de um universalismo próprios, capazes de inserir o parlamento num sistema com separação de poderes, com orgânica e que seja representativo da sociedade e das suas variadas franjas. O estudo das relações entre os parlamentos e os restantes órgãos de poder tiveram um boom a partir da década de 1970, com os estudos de Hopkins no Bunge da Tanzânia (1970), de Hoskins na Assembleia Nacional da Colômbia (1971), de Mezey na Assembleia Legislativa da Tailândia (1972) e de Kim e Woo na Assembleia Nacional da Coreia (1975); todos estes estudos basearam-se em parlamentos frágeis, sujeitos a

110

Walter Oppelo, ibidem, p.130. 86

constantes intervenções militares e dominados ou penetrados por forças exteriores como o executivo ou os partidos. Estes estudos rompem com o establishment anterior, uma vez que admitem uma análise profunda, não apenas do funcionamento orgânico dos parlamentos mas também do próprio sistema parlamentar envolvente. Para os exemplos acima referenciados preferiu-se o método que G. B. Powell Jr. define em Contemporary Democracies: Participation, Stability and Violence, através da relação entre cultural background e constitutional type como dois eixos importantes da análise que define o contexto das relações jurídicas, políticas e administrativas que se estabelecem entre órgãos de poder. Esta relação aliada ao factor de unicidade ou pluralidade das sociedades, permite-nos desenhar um quadro do sistema parlamentar inserido na construção do Estado ou na importação de regras e instituições democráticas. Um dos factores a ter em conta é o que estabelece uma relação entre unicidade/pluralidade societal e unicameralismo/bicameralismo; o próximo quadro ilustra essa relação no espaço CPLP. Quadro 2 – Sistema Parlamentar/Orgânica Societal Parlamento

Unicidade Societal

Semipluralidade

Pluralidade Societal

Societal Unicameral

Cabo-Verde; Portugal; S. Tomé e Príncipe;

Bicameral

Timor-Leste

Angola; Guiné-Bissau; Moçambique; Brasil;

Fonte: Retirado de E. Kafft Kosta, Estado de Direito – O Paradigma Zero: entre Lipoaspiração e Dispensabilidade, p.423.

A primeira ilação é a de que a relação entre unicidade societal e unicameralismo e pluralidade societal e bicameralismo não é proporcional, visto que tanto em sociedades nacionais como plurinacionais se observam casos de unicameralismo e bicameralismo. Ou seja, a escolha do modelo parlamentar, na maioria dos casos nos Estados plurinacionais da CPLP não segue a orgânica da sociedade mas sim a importação de um modelo próprio, que acaba por se aproximar do português. É interessante notar que a única sociedade plural e que é ao mesmo tempo Estado Federal, 87

apresenta um modelo bicameral; neste caso a regra analítica que estabelece a relação entre pluralidade societal e bicameralismo é simples excepção. Os parlamentos, como órgãos que superintendem o conflito social, institucionalizando-o, deverão ser o espelho da orgânica societal e não apenas de um sistema político; é interessante observar que a maioria dos parlamentos em África é unicameral, desmentindo na prática a aplicação do bicameralismo por sociedades plurinacionais ou pluriétnicas. Mas em todo o caso “existem umas pedrinhas na engrenagem do sistema. Essas pedrinhas são o decalque que, em África, é usual fazer-se de modelos do ex-colonizador e são, também e fundamentalmente, a ficção da homogeneidade que perpassa em toda a classe política. Ficção de uma sociedade homogénea e una.”111; pois os tais processos de engenharia social participam na formatação das regras do jogo político e tentam uniformizar o plural num discurso de construção da Nação, que se tenta através da burocratização e da importação de modelos de Estado. Outro factor importante a analisar é o da própria rotatividade do sistema, ou se preferir da alternância do poder. Não queremos neste trabalho fazer um estudo da situação política de cada Estado da CPLP, mas podemos aludir a um caso. Cabo-Verde, onde os dois maiores partidos (PAICV e MPD) já formaram governo e onde a alternância se fez de forma salutar, é um exemplo nobre da boa gestão dos materiais legais importados face ao cultural background e às aspirações do povo cabo-verdiano; a experiência governativa é suficiente para que o partido e as suas estruturas tenham um comportamento diferente enquanto são oposição: podem fomentar um melhor debate, têm estruturas melhor preparadas para responder aos apelos do governo e do partido do governo, ou seja, desenha-se um bom feedback no debate político-parlamentar e no controlo das acções governativas em sede parlamentar e não só. A escolha pelo modelo parlamentar português deve-se a uma série de factores; primeiro que tudo o factor língua que facilita a troca de experiências e de bibliografia técnica, política e jurídica; o passado colonial e a aprendizagem administrativa dessa altura e nos momentos pós-descolonização; factor geopolítico de aproximação, facilitador da homogeneidade do linguarejo técnico-político e das negociações

111

Idem, ibidem, p.424. 88

diplomáticas e da política externa dos Estados envolvidos; aproximação a um modelo com maior experiência que advém dos obstáculos vividos e ultrapassados. Esta aproximação acontece, para o interesse do nosso trabalho, em três níveis: político, jurídico e parlamentar. Em termos políticos ela é facilitadora de processos de negociação diplomática e de política externa, bem como na definição de conceitos e estratégias conjuntas. No espaço CPLP podemos não só falar a mesma língua mãe como invocar conceitos pertencentes a um aparelho político e a uma estratégia. Juridicamente pois ao longo do processo de democratização alguns juristas portugueses como os constitucionalistas Jorge Miranda e Gomes Canotilho têm participado na elaboração de projectos para legislação, como foi exemplo o projecto de elaboração de uma constituição para Timor-Leste, feita por Jorge Miranda em candidatura feita perto da UNTAET. Noutros casos a cooperação parlamentar, e mais especificamente os técnicos parlamentares portugueses têm estado directa ou indirectamente envolvidos na cimentação de legislação, através de aconselhamento e de ensino de técnicas de supervisão técnico-jurídica a funcionários de outros parlamentos. O caso paradigmático é o da Assembleia Constituinte de Timor-Leste, em que a ARP através de funcionários permanentes ajudou na montagem do parlamento nacional de Timor-Leste e no consequente sistema parlamentar112. Se em boa verdade os casos em que a democracia e o sistema parlamentar têm funcionado, observa-se que se teve a preocupação de admitir um modelo que encaixasse nos moldes dos traumas colectivos de cada sociedade e no seu cultural background, outros há como é o caso da Guiné-Bissau e Angola (se bem que em níveis diferentes) em que a pluralidade nacional e os processos de engenharia social, num contexto de state-building ou nation-building, produziram enviesamentos tais que a tal law in the books não é a efectiva no terreno. No campo da cooperação parlamentar, podemos identificar três níveis de parlamentos receptores da ajuda. Para construirmos um quadro do nível de dependência de cada parlamento recorreremos a três indicadores: mecanismos de dissolução, meios de controlo/fiscalidade e funcionamento/gestão interna. 112

Visita Oficial da Assembleia da República a Timor-Leste, Edições da Assembleia da República; Kelly Cristiane da Silva e Daniel Schroeter Simião (org.), Timor-Leste por Trás do Palco – Cooperação Internacional e a Dialética da Construção do Estado. 89

A função moderadora que no pensamento de Benjamin Constant caberia ao chefe de Estado num sistema semi-presidencial ou parlamentar deveria ser a regra e não a excepção nos variados sistemas políticos que se nos apresentam nos PLOPs. A regra do semi-presidencialismo que observamos na Guiné-Bissau, Timor-Leste e São-Tomé e Príncipe é, no terreno, uma realidade importada que deve ser vista caso a caso. Enquanto na Guiné-Bissau os apelos sedutores da sereia presidencialista113 têm conduzido a sucessivos golpes de Estado (aos quais Kafft Kosta apelida de “golpes de Estado constitucionais”) conduzidos pelos jogos de poder que se geram em torno da figura do chefe de Estado, que acaba por aglutinar não só as funções que lhe estão confiadas constitucionalmente, como também as do chefe do executivo114. Ao mesmo tempo que Sundquist considera que “perhaps the most important reasons that countries have been moving away from the pure parliamentary structure in the direction of the U.S. model are these: the recognized need for strong and decisive leadership, and the perception that such leadership is more likely to be provided by a single individual than by the often diffuse collective decision-making machinery set up by parliaments; the added governmental legitimacy that accrues when the head of the government gets his or her mandate directly from the people rather than from an inner circle of party leaders”115, Kafft Kosta assume que as derivas presidencialistas encetadas na GuinéBissau são produto de uma interpretação das imagéticas do poder e da subversão dos mecanismos legais previstos na lei fundamental. Considerados por muitos como “variante(s) menos feliz(es) do direito português”, esquecemo-nos muitas das vezes que estas derivações são “adveniente(s) de uma indubitável vida própria em contextos sui generis muito diferentes dos portugueses.”116 Aqui aludimos uma vez mais ao elemento cultural background de que temos vindo a falar. Tanto em São-Tomé e Príncipe como em Timor-Leste e Moçambique (principalmente a partir da última revisão constitucional datada de Novembro de 2004, 113

E. Kafft Kosta, ibidem, p.426. Como aconteceu no período entre 1980 e 1999 em que Nino Vieira como Chefe de Estado também gere o governo; na união entre Nino Vieira e a Junta Militar entre 1998 e 1999; Malam Bacai Sanhá (Presidente da República interino) e Ansumane Mané (Co-Presidente da República) sobre o PrimeiroMinistro Fadul entre 1999 e 2000; Kumba Yalá entre 2000 e 2001 acumula informalmente o cargo de chefe de Estado e de governo. 115 J.L. Sundquist, ibidem, pp.53-54. 116 Armando Marques Guedes, Os Processos de Constitucionalização dos Estados Africanos Lusófonos entre Factos e "ormas in "egócios Estrangeiros nº11.4 de Outubro de 2007, p.7. 114

90

com entrada em vigor em Janeiro de 2005) têm-se observado boas condições para o exercício da separação dos poderes e da autonomização do parlamento face aos restantes órgãos de poder. Casos paradigmáticos, em oposição, são os de Angola e Cabo-Verde. Enquanto o primeiro assenta num presidencialismo marcante, o segundo tende, para a maioria dos especialistas, para um regime parlamentarista. Não será pela classificação do tipo de sistema político que os podemos colocar em pontos opostos, mas sim pelos comportamentos e respostas aos desafios de mudança democrática. Angola teve as suas últimas eleições legislativas neste ano de 2008 onde se observou a disciplina e uma experiência continuada, graças não só aos ensinamentos trazidos por observadores internacionais, como pelo esforço do povo angolano e das suas instituições. Mas ao contrário de Cabo-Verde o chefe de Estado em Angola acumula demasiados poderes e goza, ao lado do MPLA partido do poder, de uma confortável governação sem controlo e fiscalização efectivos tanto parlamentar como judicial; apesar do parlamento angolano ter hoje em dia mais do que duas cores representadas em plenário, o que é uma maisvalia para os processos de estabelecimento de uma oposição política e para o sarar das feridas da guerra. Em Cabo-Verde, para além da rotatividade, temos vindo a observar excelentes exemplos de governabilidade e de saudável jogo democrático entre os dois maiores partidos. Quanto ao sistema político e às suas formas de controlo devemo-nos primeiro debruçar sob a escolha do sistema semi-presidencial. A imagem que o semipresidencialismo contempla desde Duverger é a divisão equitativa dos poderes e a limitação consequente; é “receita política de divisão-limitação de poder – uma receita que se torna particularmente convidativa em comunidades que, simultaneamente, pretendam dar de si próprias uma imagem de democraticidade, e se queiram distanciar de formas ditatoriais de concentração de poder.”117 Se quisermos voltar à comparação do sistema político português com os dos restantes PLOPs, podemos considerar que a experiência portuguesa pós-Estado-Novista, que nos traria a Constituição de 1976 e os afinamentos de 1982, é de sobeja importância para a fundação do Estado de Direito tanto em África de língua portuguesa como em Timor-Leste. Não nos cabe neste trabalho avaliar da escolha de um sistema semi-presidencial em Portugal, mas fica aqui

117

Idem, ibidem, p.12. 91

uma nota. De novo voltamos a considerar a importância de juristas portugueses para o fomento e exportação destes modelos. Todas as constituições prevêem as competências de cada parlamento: São-Tomé e Príncipe (art. 97º), Moçambique (art. 135º), Cabo-Verde (art. 174º), Angola (art. 88º), Guiné-Bissau (art. 85º) e Timor-Leste (art. 95º). Algumas delas repetem-se como é o caso da figura da revisão constitucional, da feitura de leis e votação de moções e resoluções, aprovação do orçamento do Estado e do programa do governo, avaliação da actuação do governo e vigia do cumprimento da constituição. Nas relações com os restantes órgãos de poder, todas as constituições prevêem a dissolução do parlamento pelo chefe de Estado, nas competências que lhe são proferidas: São-Tomé e Príncipe (letra e) do art. 81º), Moçambique (letra e) do art. 120º), Cabo-Verde (letra e) do art. 134º), Angola (letra e) do art. 66º), Guiné-Bissau (letra a) do art. 69º) e Timor-Leste (letra f) do art. 86º); no caso guineense a dissolução apenas acontece em “caso de grave crise política” (letra a) do art. 69º); no caso cabo-verdiano para além da crise políticoinstitucional apontam-se duas hipóteses de dissolução: através da rejeição de duas moções de confiança ou da aprovação de quatro moções de censura ao governo numa mesma legislatura (nº1 do art. 142º); em Moçambique só e quando o programa do governo não é aceite em plenário (letra e) do art. 120º). Em todos os casos a dissolução só poderá acontecer, excepto no timorense e angolano118, após doze meses do início da legislatura. Quanto às regras de fiscalização e controlo nem todas as constituições fazem menção explícita ao seu exercício. A constituição cabo-verdiana fá-lo no art. 179º (competência fiscalizadora), a angolana apenas diz que “os deputados da assembleia nacional têm o direito […] de interpelar o governo ou qualquer dos seus membros, bem como o de obter de todos os organismos e empresas públicas a colaboração necessária para o cumprimento das suas tarefas”119, tal como a guineense que no seu art. 81º prevê a interpelação ao governo por via oral ou escrita; além disso todas as constituições prevêem a participação do governo e dos seus membros em reuniões do plenário. Para além disso todas as constituições dotam os parlamentos de competência legislativa absoluta e relativa.

118

Ambos apontam o mínimo de seis meses após o início da legislatura; a constituição angolana prevê-o no seu art. 95º e a constituição timorense no art. 100º. 119 Art. 83º. 92

A questão muda de figura quando interpretamos o funcionamento de cada parlamento previsto nas variadas constituições. Apesar de cada um dos parlamentos possuir reserva absoluta quanto ao seu regimento interno, nem todos funcionam nos mesmos moldes. É que em termos formais o funcionamento de cada um é bastante similar, o que não acontece quando analisamos a actividade legislativa e a capacidade técnica tanto da organização interna, como de funcionários e grupos parlamentares. Para já muitos deles apenas funcionam ordinariamente por curtos períodos continuados de tempo: a ANSTP durante “duas sessões ordinárias por ano, sendo uma delas consagrada, nomeadamente, à apreciação do relatório de actividades do Governo e à discussão e votação do orçamento geral do Estado”120; a ARM ordinariamente duas vezes por sessão legislativa (art. 139º) com uma delas a iniciar-se em dois períodos de quarenta e cinco dias úteis cada, uma em Março e outra em Outubro; a ANPGB que reúne ordinariamente quatro vezes por ano (art. 89º). A ANA reúne num período de oito meses a contar do dia 15 de Outubro em cada sessão legislativa (art. 96º) e a ANCV reúne entre 1 de Outubro e 31 de Julho do ano seguinte (nº 2 do art. 150º). Por outro lado as competências técnicas que se exigem aos funcionários públicos e aos funcionários dos grupos parlamentares são um elemento essencial para a classificação do grau de dependência de cada parlamento. Moçambique tem mostrado excelentes condições de organização e planeamento parlamentar, como provou a última missão de diagnóstico realizada pela ARP121; em termos de gestão a ARM tem excelentes condições de organização e planeamento de actividades, como prova a nova alteração à lei orgânica de funcionamento da assembleia e a organização de relatórios constantes sobre a missão e os objectivos de cada serviço parlamentar. A grande lacuna do parlamento moçambicano reside na informatização dos serviços e na formação de funcionários nessa área e no campo da feitura de leis. A ARM possui autonomia administrativa mas não financeira, o que obstaculiza o funcionamento da instituição. As necessidades apontadas pela ANCV incidem maioritariamente na formação de técnicos “em áreas de Direito, Economia, Finanças e Orçamento para técnicos

120

Art. 105º. Como mostra o relatório final da missão realizada à Assembleia da República de Moçambique entre 7 e 11 de Abril de 2008. Esta documentação foi-nos fornecida pela Divisão de Relações Internacionais e por razões de confidencialidade não se encontra anexa ao trabalho. 121

93

afectos às comissões especializadas”122. Tal como a ANSTP, a ANCV apresenta bons resultados quanto à continuada qualificação dos seus técnicos e no melhoramento das condições e métodos de trabalho, o que garante um improvent do aparelho legislativo e das manifestações de controlo e fiscalização. O feedback, que se observa nestes dois parlamentos quanto à cooperação parlamentar, tem resultado em reformas do sistema de justiça, segurança social, administração pública e educação, como provam os relatórios trimestrais das actividades enviados pelo SG da ANSTP Romão Pereira do Couto, à SG da ARP. Tanto o PNTL como a ANPGB continuam a apresentar problemas de formação e gestão; estas deficiências têm sido colmatadas pela figura do técnico residente, que para além de trazer formação continuada in loco, também proporciona a criação de pontes de comunicação com o parlamento receptor. Quanto ao PNTL já referenciámos o apoio ao proto-parlamento timorense e o consequente apoio dado por técnicos da ARP; outro meio que tem sido utilizado é o de contratar nacionais com formação superior que são depois formados pela ARP nas várias áreas técnico-parlamentares. O trabalho dos técnicos portugueses possibilitou a criação e manutenção de uma base de dados do processo legislativo, de tramitação das iniciativas e do registo biográfico dos deputados; manteve-se também um técnico para a área de contabilidade e gestão financeira123. No campo da fiscalização o PNTL admite num relatório enviado em Outubro de 2005 pelo seu SG Adelino Afonso de Jesus á ARP que, houve progressos através do aumento de visitas de estudo parlamentares a vários distritos e no acompanhamento e agendamento de encontros com várias autoridades públicas. Mas reconhece que essa fiscalização só acontece no quadro de uma boa relação com o governo e com formação técnica e teórica dos funcionários e deputados, para acompanhar iniciativas legislativas124. As necessidades da ANPGB vão mais longe, visto que cerca de 60% dos deputados da actual legislatura não falam português125 e o novo edifício do parlamento, construído pela República Popular da China, não possui todas as infra-estruturas de 122

Relatório das Missões de Diagnóstico realizadas pela ARP na ANCV entre 14 e 18 de Fevereiro e 24 de Fevereiro e 2 de Março de 2005. Por razões de confidencialidade este relatório não se encontra anexo. 123 Avaliação Final do Programa de Cooperação Parlamentar Luso-Timorense 2003/2005. Por questões de confidencialidade a mesma não se encontra anexa. 124 Relatório Trimestral das Actividades do Técnico Residente do Projecto I – Áreas de Apoio ao Plenário e de Secretariado às Comissões Especializadas, enviado pelo SG do PNTL à SG da ARP em Outubro de 2005. Por razões de confidencialidade o mesmo não se encontra anexo. 125 Relatório da Missão de Diagnóstico feita pela ARP na ANPGB entre 23 de Fevereiro e 2 de Março de 2007. Por questões de confidencialidade o mesmo não se encontra anexo. 94

comunicação necessárias, para além de que as existentes foram fornecidas com instruções em chinês. A formação de funcionários continua uma das lacunas, visto que a instabilidade política e as dificuldades económicas são entraves na continuada aprendizagem de técnicas. Por fim apresentamos um quadro do grau de autonomia de cada parlamento em estudo. Esse grau de autonomia admite os elementos que estivemos a analisar nesta secção; os mecanismos de controlo e as regras de funcionamento apenas consideramolos do ponto de vista legal devido à natureza deste relatório; o factor gestão interna terá em consideração os elementos que apresentámos no final desta secção agregados aos relatórios que nos forneceram na DRI da ARP. Quadro 3 – Autonomia dos Parlamentos Lusófonos Índice

Mecanismo de Controlo

Gestão

Grau de

Interna

Autonomia

Funcionamento Parlamento A)A

Suficiente

Bom

Suficiente

Autónomo

A)CV

Bom

Muito Bom

Muito Bom

Independente

A)PGB

Insuficiente

Insuficiente

Insuficiente

Dependente

A)STP

Bom

Bom

Bom

Independente

ARM

Suficiente

Suficiente

Suficiente

Autónomo

P)TL

Suficiente

Bom

Insuficiente

Dependente

As classificações que aqui assumimos podem ser resumidas da seguinte forma: A ANA apesar de apresentar um bom quadro legal, esse não tem sido suficiente para que se observe a independência do parlamento face a outros órgãos de poder, como a presidência e o conselho de ministros; O parlamento cabo-verdiano é o melhor exemplo de todos eles pois, para além de uma muito boa gestão dos recursos, ele funciona em paralelo com uma base legal 95

sólida e com ética de trabalho; o mesmo acontece com a ANSTP que, apesar de ter apenas dois tempos de trabalhos durante cada sessão legislativa, apresenta boas condições de funcionamento; A ANPGB, ao contrário do caso cabo-verdiano, apresenta numerosas falhas tanto na formação dos sues funcionários como no aspecto legal; O caso moçambicano apesar de apresentar condições legais de controlo e fiscalização das iniciativas legislativas e de ter bons resultados na gestão interna, continua a depender economicamente do governo; No caso do PNTL o problema reside na formação técnica dos funcionários e dos deputados, ficando a iniciativa legislativa extremamente dependente do executivo; Em qualquer caso todos os parlamentos sofrem de deficiências técnicas que os habilitam a ficar dependentes da máquina burocrática dos governos, naturalmente apoiados pela cooperação internacional através da contratação de técnicos estrangeiros que fornecem material e experiência no terreno. Essa máquina burocrática dota os governos de iniciativa legislativa, roubando progressivamente aos parlamentos a sua capacidade matriz. Os que continuam dependentes da dotação do orçamento do Ministério das Finanças apresentam ainda maiores obstáculos, pois muitas das vezes nem chegam a abrir portas como supõe a lei constitucional. Será necessário continuar a apostar na cooperação parlamentar, não só para dotar os parlamentos de capacidade controladora e fiscalizadora, como na formação dos deputados e partidos políticos para o fomento de oposições esclarecidas e capazes de iniciativa legislativa. Pois, perante casos de maiorias absolutas, estes parlamentos passam a ter apenas uma função tribunícia num simples arranjo entre cavalheiros, onde seriam necessários sistemas parlamentares em que os cidadãos possam confiar.

3. Para um Estudo Comparativo da Formação Parlamentar na Assembleia da República e no Senado Federal Brasileiro O Curso de Formação Interparlamentar, promovido pelo Centro de Formação Parlamentar e Interparlamentar da ARP, que falámos no ponto 2.3 do capítulo anterior, é essencialmente um eixo de formação parlamentar lusófono. Promovido pela ARP teve 96

até agora quatro edições desde 2004. A primeira delas centrou-se no tema “O Parlamento e os Desafios da Realidade Contemporânea” e juntou funcionários da ANCV, da ANPGB, da ARM, da ANSTP e do PNTL; o segundo curso intitulado “A Natureza Interdisciplinar do Trabalho dos Funcionários Parlamentares” juntou funcionários do PNTL, da ANSTP, da Câmara dos Deputados do Brasil, da ARM, da ANCV,

da

ANPGB

e

da

ANA;

o

terceiro

designou-se

“Formar

para

Comunicar/Comunicar para Formar” e juntou funcionários da ANA, da Câmara dos Deputados do Brasil, da ANCV, da ANPGB, da ARM, da ANSTP e do PNTL; o quarto e último curso de 2007, “O Conhecimento Individual e o Conhecimento Organizacional” juntou funcionários da ANA, da Câmara dos Deputados do Brasil, da ANCV, da ANPGB, da ARM, da ANSTP e do PNTL. Todos os cursos centraram-se em temas relacionados com o processo legislativo, a feitura de leis, organização e ética do trabalho dos serviços parlamentares, ética do funcionalismo público, ética parlamentar do deputado, mecanismos de fiscalização parlamentar, interactividade com o cidadão, tecnologias de informação, diplomacia parlamentar e gestão estratégica da informação e do património. Os objectivos destes quatro cursos sempre foram a formação de funcionários parlamentares através de seminários e conferências presididos por funcionários e deputados da ARP, professores, técnicos de empresas privadas e de institutos/órgãos de gestão do Estado; da partilha de experiências parlamentares e do desenvolvimento de acções de motivação de trabalho; e principalmente contribuir para a constituição de redes parlamentares lusófonas126. No quadro da ASG-PLP pretendeu-se desenvolver o CFI a partir do IV Curso realizado em 2007; o objectivo é de criar uma rede de trabalho de quadros de apoio parlamentar, incluída nas actividades da ASG-PLP, alargando e especificando o tipo de cooperação multilateral através da utilização da plataforma da organização para uma continuada troca de informação. O resultado foi a formalização do encontro interparlamentar de quadros de apoio ao processo legislativo, na senda dos encontros multilaterais entre funcionários parlamentares da área de informática (ponto 2.4 do capítulo anterior); realizada em Lisboa entre 24 e 28 de Outubro deste ano, o encontro promoveu a troca de conhecimentos específicos numa área sensível do processo parlamentar. Desta forma estas reuniões podem ser monitorizadas estrategicamente e 126

Informação nº12/CFPI/2007 (circular interna) referente ao IV Curso de Formação Interparlamentar; por questões de confidencialidade a mesma não se encontra anexa. 97

concertadas entre os Secretários-Gerais dos parlamentos lusófonos através dos encontros da ASG-PLP. Ao transformar a lógica do Curso, promovem-se os encontros anuais especializados entre serviços dos variados parlamentos lusófonos127 e dinamizase a formação parlamentar através da plataforma de actividades da ASG-PLP. No encontro de Lisboa estiveram presentes quadros da ANA (José António – Director do Gabinete Jurídico; Geraldo Cambiete – Técnico Superior; António Rufino de Carvalho – Técnico Médio); da Câmara dos Deputados do Brasil (Flávio José Barbosa de Alencastro – Técnico Legislativo; Cristiano Ferri Soares de Faria – Analista Legislativo; Fernando Sabóia Vieira – Consultor Legislativo); do Senado Federal (Florian Augusto Madruga – Chefe do Gabinete da Presidência do Senado); da ANCV (Nilce Ariene Ramos Rodrigues – Directora dos Serviços Parlamentares; Luís Miguel Pires de Oliveira Lima – Chefe de Divisão de Apoio e Secretariado às Comissões; Antoinette Combrie Lopes – Técnica Parlamentar do Apoio ao Plenário); da ARM (Mateus Fernando Uamir – Secretário da Comissão de Assuntos Jurídicos, Direitos Humanos e de Legalidade; Raquel Dias Margarido – Técnica Superior Legislativa; Elisabete de Almeida Madeira – Técnica Superiora da Administração Pública; Valgy Hassane Tricamegy – Director da Divisão de Apoio às Comissões); da ARP (António Almeida Santos – Técnico Superior da Divisão de Apoio ao Plenário; Lurdes Sauane – Técnica Superior da Divisão de Apoio ao Plenário; Joaquim Ruas – Técnico Superior da Divisão de Apoio às Comissões; Luísa Veiga Simão – Assessora da Divisão de Apoio às Comissões; Maria João Godinho – Técnica Superior da Divisão de Apoio às Comissões; Fátima Abrantes Mendes – Assessora da Divisão de Apoio às Comissões; Maria do Rosário Tavares – Técnica Superior da Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual); da ANSTP (Salustino David dos Santos Andrade e Silva – Director de Serviços de Apoio Parlamentar e Documentação; Francisco Ferreira dos Santos – Director de Serviços de Administração e Finanças; Hélder dos Santos Matos – Chefe de Departamento de Documentação e Informação Parlamentar; Nelson Lombá – Consultor; Adelino Lourenço Pires dos Santos – Consultor da ARP na ANSTP em estágio na ARP); e do PNTL (Armando Machado – Chefe de Serviços de Apoio ao Plenário).

127

Em cada ano realizar-se-á um encontro específico; esse encontro será organizado pelo parlamento que nesse ano detém a presidência da ASG-PLP; para consulta dos estatutos online: http://www.asgplp.org/Estatutos.aspx. 98

A par da formação interparlamentar que a ARP tem dinamizado desde 2004, também no SF têm apostado na formação continuada de quadros da administração pública, parlamentares e cidadãos. Agregada ao SF surgiu a UNILEGIS, única Universidade do mundo especializada na área do processo legislativo com licenciaturas e mestrados que incluem a Ciência Política e as Relações Internacionais; tem como objectivo ser “mais um instrumento de ampliação das possibilidades do exercício da cidadania, à disposição da sociedade, para ser um fórum permanente de debate de ideias.” Como instituição pública de ensino a UNILEGIS promove a comunicação e o aprofundamento do debate acerca do processo legislativo por toda a rede administrativa do Estado brasileiro, a par do que fazem o Ministério do Planejamento e a Escola Nacional de Administração Pública; funciona como uma verdadeira universidade inserida na cibernética governação e envolve a participação de parlamentares, professores, especialistas e profissionais qualificados do sector legislativo, num esforço de “construção de uma sociedade e educação cidadãs, colaborando no processo de integração e modernização do legislativo, não apenas do brasileiro, como também do de outros países, especialmente os de língua portuguesa, e da comunidade de nações latinoamericanas e de cultura hispânica.”128 Os cursos da UNILEGIS abrangem áreas como a Educação, Cidadania, Políticas Públicas, Gestão Governamental, Administração Pública Legislativa, Processo Legislativo, Direito e Ciências Políticas; esta instituição veio substituir os Serviços de Selecção e Aperfeiçoamento criados no SF em 1970, o Centro de Formação e Administração Legislativa e o Centro de Recursos Humanos, e está actualmente incluída no Instituto Legislativo Brasileiro por meio da resolução nº1/2001 do SF129. O ILB, criado em 1997 através da resolução nº9 do SF, actua na capacitação dos funcionários, não só do Senado como de todas as esferas do poder legislativo, contribuindo para o desenvolvimento dos parlamentos brasileiros, da formação técnica de parlamentares e funcionários, da formação para a cidadania e para a participação democrática e no reforço das instituições legislativas130.

128

Consulta online em: http://www.senado.gov.br/ilb/historicouni.htm. Consulta online em: http://www.senado.gov.br/sf/senado/unilegis/asp/IN_Historico.asp. 130 Consulta online em: http://www.senado.gov.br/ilb/histotico.htm. 129

99

A actuação da UNILEGIS não inclui, actualmente, parcerias com os parlamentos da lusofonia, tal como faz o CFI; mas em termos de profundidade e continuidade a UNILEGIS deu um passo relevante no campo da formação parlamentar, uma vez que admite cursos superiores e mestrados e formação técnica continuada a parlamentares, ao lado do ILB. Olhando o ensino superior e técnico como depositário do conhecimento e da experiência que são necessários para o aprofundamento da prática da cidadania, a UNILEGIS é uma excelente iniciativa, uma vez que ela se abre ao público em geral e proporciona a constituição de um acervo científico e técnico. A experiência do CFI e da UNILEGIS são fundamentais para a possível criação de uma instituição lusófona de aprendizagem do processo legislativo, da administração pública e das ciências políticas, num centro de conhecimento técnico com fomento de um campus de ciências sociais – verdadeiro elemento estratégico que deverá guiar a comunidade de língua portuguesa.

100

CO)CLUSÃO

O trabalho que aqui concluimos é produto de nove meses de gestação; pensado e repensado, avaliado e reavaliado, estruturado e reestruturado vezes sem conta. Da matéria bruta que fomos catando aqui e ali, informação privilegiada que obtivemos através do nosso estágio, tentámos obter o melhor resultado com o menor enviesamento possível, observadas as regras de recolha e filtragem dos materiais e depois de montado um contexto e a metodologia que pensámos adequada. Foi um trabalho de crescimento que o Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, a minha escola para sempre, me deu a oportunidade de desenvolver finda a licenciatura em Relações Internacionais que frequentei nestes últimos quatro anos; crescimento pessoal a caminho do meu poema; crescimento pela experiência no terreno; crescimento científico e académico pelo contacto com responsáveis e bibliografia especializada. Tempo agora de largarmos as nossas ferramentas científicas e viajarmos pelo mundo da opinião. Ao longo da recolha da nossa informação e da construção tijolo a tijolo deste relatório de estágio, confrontei-me com a busca desta comunidade lusófona que está por cumprir. Não será apenas o sonho Portugal, que é o sonho das Nações sem fronteiras, da alma mater e do império anti-império, mas também o sonho de sermos nós mesmos, crianças, eternos imperadores do mundo. O século que terminou há oito anos anunciou a descolonização, os movimentos sociais, a luta contra a tirania, continuando a busca eterna pelo melhor governo dos povos, das Nações e das pequenas comunidades contra os imperialescos projectos e contra o Deus-Pai, tirano, chefe de família e da oikos. E chegou a democracia, ainda diamante e não calhau pois é promessa e vivência de poucos; e anunciou-se a abertura das fronteiras, tal como aconteceu na Europa pós II Guerra Mundial com o Mercado único e onde vivemos placidamente numa paz continuada, onde os territórios mantémse apenas nos corações dos homens tornados cidadãos. Noutros pontos do globo, outros continuam apenas cidadãos de Estados e vivem revoltosos na luta pela comunidade e pela Nação, contra a tirania da burocrática máquina estatal, pela busca do sonho da pertença. O Estado de Direito, aquela conquista do ocidente agora transformada bandeira, é o acervo do Homem em busca de si próprio pela Justiça e pela Liberdade; mas não 101

chegou a todos da mesma maneira que as velhas trademarks palmilham montanhas da Ásia Central e lagos da África subsaariana. Quanto à comunidade lusófona deveríamos continuar esse projecto que um dia Sérgio Buarque disse ser o de viajarmos pelo mundo fora, de arquipélago em arquipélago, de não termos terra e de sermos heróis e reis, onde a lei nos obrigasse a ser felizes. Seria apostar no projecto da Cidadania Lusófona, tal como Cabo-Verde já o fez, seria estabelecer uma Universidade Cearense agregada à CPLP; na criação de um outro patamar de liberdade com a livre-circulação das gentes de língua portuguesa nos vários arquipélagos criados pelo Homem português de sempre; no estabelecimento sem complexos de inferioridade de um centro de estudos lusófonos, que congregasse todos os tipos de saber, fora da maquinaria estatal mas ao serviço dele, na busca da melhor comunhão. Sermos capazes de ultrapassar os modelos importados de teóricos, da Europa bruxelizada e dos tecnocratas em busca do sonho comunitarista português, ao lado da Justiça contra o monopólio burocrático e castrador da criatividade, já depois do pai tirano, depois da oikos, depois da máquina – o comunitarismo. Pois “mais do que nunca é a pessoa ameaçada do homem que reclama a transcendência no espaço e no tempo, escolhendo-se como promessa da única eternidade, a da alma que nos individualiza, contra o robot que nos ameaça”131. Que se faça a idade do Espírito Santo numa comunidade de língua portuguesa!

131

Mário Cláudio, Textos Sobre a Ideia de Pátria in Segunda Edição da Revista Águia, nº1, Setembro de 2008. 102

BIBLIOGRAFIA GERAL

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109

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-

sítio

do

Instituto

-

sítio

da

Assembleia

Português

de

Apoio

ao

http://www.ipu.org/english/home.htm - sítio da União Interparlamentar http://www.nato-pa.int/ - sítio da Assembleia Parlamentar da Organização do Atlântico Norte http://new.oscepa.org/ - sítio da Assembleia Parlamentar da Organização para a Cooperação e Segurança na Europa http://www.parlamento.ao/ - sítio do parlamento da Assembleia Nacional de Angola http://www.parlamento.cv/ - sítio da Assembleia Nacional de Cabo-Verde http://www.parlamento.pt – sítio da Assembleia da República http://www.parlamento.st/ - sítio da Assembleia Nacional de São-Tomé e Príncipe http://www.parlamento.tl/ - sítio do Parlamento Nacional de Timor-Leste http://www.parliament.uk/ - sítio do Parlamento Inglês http://www.senado.gov.br – sítio do Senado Federal brasileiro http://www.senat.fr/ - sítio do Senado francês

110

Í)DICE

Agradecimentos………………………………………………………………………7 Abstract……………………………………………………………………………….9

§1 Questões de Método Primeiras Linhas…………………………………………………………………….…11 Quadro Teórico-Conceptual…………………………………………………………...15 1. Da Administração Colonial…………………………………………………....20 2. Voz da Democracia……………………………………………………………27

§2 As Competências Externas da Assembleia da República 1. A Segunda Figura do Estado………………………………………………….36 2. Gabinete de Relações Internacionais e Protocolo……………………………..45 3. Comissão de Assuntos Europeus e Comissão de Negócios Estrangeiros……..48 4. Assembleias Parlamentares Internacionais……………………………………49 APOSCE……………………………………………………………………...50 APCE…………………………………………………………………………51 APEM………………………………………………………………………...51 APM………………………………………………………………………….52 AIFPLP………………………………………………………………………52 APNATO…………………………………………………………………….52 AUEO………………………………………………………………………..53 UIP…………………………………………………………………………..53 5. Grupos Parlamentares de Amizade………………………………………….54 111

§3 Cooperação Parlamentar com os Países de Língua Portuguesa 1. Acções de Cooperação Bilateral……………………………………………57 1.1.Protocolos, Programas e Avaliação…………………………………….60 1.2.Tipologia………………………………………………………………..65 1.2.1 Actividades………………………………………………………66 1.2.1.1 Visita de Estudo da ANCV……………………………67 1.2.1.2 Visita de Estudo de Deputados da Comissão de Saúde, Ambiente, Acção Social, Emprego, Antigos Combatentes, Família, Infância e Promoção da Mulher da ANA…………………………………………………………....68 1.2.1.3 Missão de Avaliação à ARM…………………………..68 1.2.1.4 Visita de Estudo de Delegação de Deputados e de um Funcionário da ANA……….. …………………………………69 1.2.1.5 Protocolo de Cooperação entre ARP e PNTL………….69 1.3 Cooperação e Grupos Parlamentares de Amizade…………………71 1.3.1 Reunião do GPA Portugal-Timor-leste…………………..71 1.3.2 Reunião do GPA Portugal-Israel com Benny Dagan…….72 1.3.3 Reunião do GPA Portugal-China…………………………73 2. Acções de Cooperação Multilateral………………………………………….73 2.1 FPLP………………………………………………………………..73 2.2 ASG-PLP…………………………………………………………...75 2.3 CFI………………………………………………………………….76 2.4 Reuniões entre Serviços dos Parlamentos…………………………..77 3. Experiência Portuguesa no Interparlamentarismo Europeu: Conferência dos Presidentes dos Parlamentos da União Europeia e Cooperação Interparlamentar………………………………………………………………..78

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§4 Processos de Aprendizagem no Espaço Lusófono 1. Contexto……………………………………………………………………80 2. A Qualidade do Sistema Parlamentar no Espaço Lusófono………………..86 3. Para um Estudo Comparativo da Formação Parlamentar na Assembleia da República e no Senado Federal………………………………………….....96

Conclusão…………………………………………………………………………….101 Bibliografia Geral……………………………………………………………………103 Bibliografia Temática………………………………………………………………..108 Consultas Online……………………………………………………………………..110

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