ESTADO, MERCADO E SOCIEDADE CIVIL COMO ATORES DO DESENVOLVIMENTO: O Desafio da Sustentabilidade no Século XXI - Entrevista com a Professora Heike Doering, PhD

May 27, 2017 | Autor: R. Periódico dos ... | Categoria: Sustentabilidade, Sociedade civil, Mercado, Estado
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ENTREVISTA ESTADO, MERCADO E SOCIEDADE CIVIL COMO ATORES DO DESENVOLVIMENTO: O Desafio da Sustentabilidade no Século XXI* Entrevista com a Professora Heike Doering, PhD Realizada por Priscila De Nadai† Nessa edição, a Revista Foco, por meio da Profa. Dra. Priscila De Nadai, traz uma entrevista com Heike Doering, PhD em Sociologia pela Universidade Cardiff (Reino Unido), professora da Escola de Negócios de Cardiff e pesquisadora do Centre for Local and Regional Government Research, também da Universidade Cardiff. Nos últimos anos, Doering tem desenvolvido pesquisas sobre desenvolvimento regional e gestão da sustentabilidade em economias emergentes. Um dos seus projetos de pesquisa está sendo desenvolvido no Espírito Santo em parceria com pesquisadores locais. Nessa entrevista, ela expõe sua trajetória como pesquisadora, os seus temas de estudo, além de nos apresentar a pesquisa que está desenvolvendo. Priscila De Nadai: Para iniciar nossa entrevista, conte-nos sobre a sua formação e trajetória profissional. Heike Doering: Eu estudei Estudos Culturais Britânicos, Economia e Direito na Universidade Técnica de Dresden, na Alemanha. Eu queria viver no Reino Unido depois que eu terminasse minha graduação e fui afortunada de encontrar um trabalho de pesquisadora na Escola de Historia na Universidade de Nottingham - Reino Unido. Nessa oportunidade eu aprendi como realizar pesquisa histórica. Depois eu fui para a Universidade de Cardiff para fazer meu PhD em sociologia e agora eu estou trabalhando na Escola de Negócios de Cardiff. Então eu mudei de país, de cidades e áreas de conhecimento algumas vezes. Priscila De Nadai: Nos últimos anos, temos visto muitos debates sobre o conceito de sustentabilidade e da sua importância no desenvolvimento econômico. Poderia nos falar um pouco o que é e como surgiu este conceito? Heike Doering: Sustentabilidade é um conceito muito escorregadio. Você está certa, houve muitos debates sobre isso. Especificamente o termo “desenvolvimento sustentável” remonta à década de 1980, na publicação do relatório Brundtland. O conceito se concentra em                                                                                                                 * †

Tradução livre por Priscila De Nadai Doutora em Administração pela Universidade de São Paulo/USP e docente da Faculdade Novo Milênio.

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Revista FOCO - ISSN: 1981-223X

desenvolvimento que atende às necessidades do presente sem esgotar os recursos para as gerações futuras. Então, sustentabilidade significa aceitar uma perspectiva de longo prazo e não somente perseguir objetivos de curto prazo. Também podemos ver a publicação “Silent Spring” de Rachel Carson, em 1962 como ponto de partida de discussões sobre o meio ambiente e sua conservação como um aspecto importante a ser considerado, além do desenvolvimento econômico, quando se fala em desenvolvimento. Da mesma forma, os debates na década de 1970 e, em particular, os escritos do Clube de Roma e seu livro “The Limits of Growth” devem ser vistos como influentes contribuições para o debate sobre a sustentabilidade. Ao mesmo tempo, a partir dos industriais paternalistas do século XIX é possível ver os primórdios de ideias sobre a responsabilidade corporativa visando mais do que apenas o lucro. Priscila De Nadai: Como governos, empresas e a sociedade civil podem contribuir para o desenvolvimento sustentável? Existem ações articuladas entre estes atores ou cada um faz a sua parte de forma isolada? Heike Doering: A partir da minha pesquisa, primeiramente no Reino Unido e agora no Brasil, eu aprendi que, em primeiro lugar, a sustentabilidade precisa ser declarada (definida) como prioridade. Desenvolvimento é muitas vezes visto como crescimento econômico ou crescimento da oferta de empregos. Isso, posteriormente, negligencia ou exclui outros aspectos como conservação ambiental, aprimoramento de habilidades ou coesão social. Em consequência, isso constantemente significa que somente o governo ou potenciais trabalhadores são considerados pela empresas como stakeholders. Quando falamos em governo, entretanto, temos que ter em mente que governos locais não necessariamente possuem os mesmos objetivos que o governo nacional. E ainda, em diferentes contextos, as empresas como atores principais do desenvolvimento sustentável respondem à diferentes formas de incentivo – por exemplo, na Alemanha, ou Escandinávia, as empresas podem responder de forma positiva à regulamentação; no Reino Unido e nos Estados Unidos as empresas possuem uma tendência a preferir sua própria forma de ação “voluntária”. Nesse sentido, o elemento mais importante para o desenvolvimento sustentável é composto pelos governos, pelas empresas e pela sociedade civil trabalhando em conjunto na definição de prioridades e objetivos. Isto, contudo, é uma noção muito idealista, pois na complexidade do nosso mundo torna-se muito difícil equilibrar e encontrar compromisso de múltiplas agendas. Priscila De Nadai: Fale um pouco sobre a sua pesquisa aqui no estado. Como anda a sustentabilidade no Espírito Santo? Heike Doering: Há dois ou três anos, eu venho pesquisando e conhecendo sobre o Espírito Santo. Eu me interessei pelo ES devido à sua combinação de indústrias pesadas (petróleo, siderurgia, aço e celulose) em um pequeno espaço. Eu queria saber como companhias multinacionais, as campeãs nacional brasileiras, os governos locais e os cidadãos trabalham em conjunto para atingir o desenvolvimento sustentável. Estou somente no início dessa pesquisa com meu colega da UFES, o professor Alexandre Reis Rosa. Até agora tivemos a oportunidade de conversar com pessoas de multinacionais, de algumas prefeituras e da sociedade civil organizada. Escutamos que a questão da comunicação entre diferentes atores é um problema. Organizações de empresários, multinacionais e organizações ambientais trabalham duro em busca de uma transformação socioeconômica, mas nem sempre trabalham em conjunto. Existe um grande número de projetos admiráveis, mas esses projetos não necessariamente convergem em uma estratégia coerente de desenvolvimento sustentável.

 

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Priscila De Nadai: Como é ser uma pesquisadora alemã, radicada no Reino Unido, fazendo pesquisa no Brasil? Quais seriam os maiores desafios para quem faz uma pesquisa internacional? Heike Doering: Em primeiro lugar, sou muito afortunada de ter a oportunidade de viajar e trabalhar em diferentes culturas. Eu me beneficio imensamente em vivenciar diferentes culturas. Isso não significa que é sempre fácil. Algumas vezes é difícil de me afastar dos meus próprios preconceitos e estereótipos. Estar aberta a situações novas e inquietantes nem sempre é confortável e pode ser bastante desgastante. Saber outros idiomas, isso me ajuda na comunicação com colegas e a fazer amigos. Definitivamente contribui para estabelecer uma relação com os participantes da pesquisa. Também acho que os conceitos e ideias desenvolvidos no contexto Anglo-saxão nem sempre são adequadas para o contexto Latino-americano. Percebo que países do hemisférios norte precisam dar mais abertura a toda a pesquisa interessante e emocionante que está acontecendo na América Latina.

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