ESTUDO ETNOBOTÂNICO DE PLANTAS MEDICINAIS NA COMUNIDADE SÃO GONÇALO BEIRA RIO, CUIABÁ, MT Marcelo Dias de Souza1 Rener Ribeiro Fernandes1 Maria Corette Pasa²
Resumo O presente trabalho objetivou o levantamento etnobotânico de plantas utilizadas pela população da Comunidade São Gonçalo Beira Rio localizada no município de Cuiabá MT, para fins medicinais e avaliar a relevância deste conhecimento para a comunidade local. A coleta dos dados foi realizada nos meses de setembro e outubro de 2010. Foram aplicados questionários junto aos moradores da comunidade para conhecer quais são, e como são utilizadas as plantas medicinais. Foram entrevistados 18 moradores adultos homens e mulheres que costumam fazer uso de plantas medicinais no seu cotidiano. As informações coletadas proporcionaram uma listagem das plantas citadas como medicinais, sendo 14 espécies as mais citadas e apresentam consenso informante entre as pessoas na comunidade. As plantas citadas pertencem a 14 famílias botânicas onde Citrus aurantium, Cecropia sp. e Averrhoa carambola foram as mais citadas, na qual foram relacionadas para 11 usos medicinais, sendo o maior número para dor de barriga com (4 plantas), seguido do uso para tratamento de gripe (3), pressão (2). Identificou-se na comunidade que os conhecimentos das pessoas de saber local encontram-se ameaçados de erosão cultural em relação à transmissão de geração em geração. Palavras-chave: Levantamento etnobotânico, comunidade ribeirinha, conhecimento popular
Abstract This present study aimed to ethnobotanical survey of plants used by the population of the São Gonçalo Beira Rio in the municipality of Cuiabá MT, for medical purposes and assesses the relevance of this knowledge to the local community. Data collection was conducted during September and October 2010. Were applied questionnaires to residents of the community to know what they are, and are used as medicinal plants. We interviewed 18 adults men and women who usually make use of medicinal plants in their daily lives. The information collected provided a list of the plants cited as medicinal, where 14 species being the most cited and present informant consensus among people in the community. The Plants cited belong to 14 botanical families where Citrus aurantium, Cecropia sp. Averrhoa carambola and were the most cited, in which 11 were related to medical uses, with the largest number to ache of paunch with (4 plants), followed by the use for treatment of cold (3), blood pressure (2). Was identified in the community that people's knowledge of local knowledge are threatened by erosion in relation to cultural transmission from generation to generation. Key words: Ethnobotanical survey, riverina community, popular knowledge
1 2
Mestrandos do PPG em Ciências Florestais e Ambientais.UFMT Dra. PPG em Ciências Florestais e Ambientais. UFMT.
[email protected]
Revista Biodiversidade v. 9, n. 1, 2010
91
INTRODUÇÃO
As populações humanas que ocupam as florestas tropicais convivem com a grande diversidade destes ambientes e desenvolvem cada qual à sua maneira, formas de explorá-los para sua sobrevivência (PINTO et al., 2006). O homem ainda não perdeu sua estreita relação com os vegetais, observando os fenômenos da natureza e utilizando-os para o seu próprio interesse. O uso dos recursos naturais é uma prática milenar, da qual o homem é o protagonista, ultrapassando todos os obstáculos do processo evolutivo e chegando até os dias atuais, sendo aplicada a toda população mundial (MOREIRA et al., 2002). O Brasil detém a maior diversidade biológica do mundo, contando com uma rica flora, despertando interesses de comunidades científicas internacionais para o estudo, conservação e utilização racional destes recursos, (SOUZA e FELFILI, 2006). Sendo assim é através da etnobotânica que se busca o conhecimento e o resgate do saber botânico tradicional, particularmente relacionado ao uso dos recursos da flora. (AMOROZO, 1996; BEGOSSI, 1998). Segundo Marodin e Batista (2002), A etnobotânica compreende o estudo e a interpretação do conhecimento, significação cultural, manejo e os usos tradicionais dos elementos da flora. Amorozo (1996) engloba a maneira como um grupo social classifica as plantas e as utiliza. Para Caballero (1979), os estudos etnobotânicos vão além do que pode pretender a investigação botânica, uma vez que suas metas se concentram em torno de um ponto fundamental que é a significação ou o valor cultural das plantas em determinada comunidade humana. Entre as plantas utilizadas em várias sociedades, existem aquelas que podem, freqüentemente, serem usadas para mais de uma doença ou várias espécies podem ser usadas separadamente ou em combinação para tratar de uma doença específica. A opção pela planta a ser utilizada é feita pela combinação da experiência vivida no dia a dia e da magia que as envolve. No Brasil, o uso de plantas medicinais pela população com a finalidade de tratar enfermidades foi sempre expressivo, principalmente devido à extensa e diversificada flora. Ainda hoje nas regiões mais pobres do país e até mesmo nas grandes cidades, plantas medicinais são comercializadas em feiras livres, mercados populares e encontradas em quintais residenciais (PASA et al, 2010). Numa dada população nem todos os membros conhecem todas as plantas; no entanto, as mulheres quase sempre envolvidas diretamente no tratamento de seus filhos e maridos são em geral, as principais depositárias do saber popular quanto ao uso das plantas. A descoberta de drogas como os alcalóides do grupo tropano, extraídos da beladona (Atropa belladona L.) da família Solanaceae, usados como antiespasmódicos na medicina moderna, teve como orientação o uso empírico para tratar dos males de uma população (PASA, 2011). Revista Biodiversidade v. 9, n. 1, 2010
92
Os estudos etnobotânicos têm como objetivo a busca de conhecimento e resgate do saber botânico tradicional, particularmente relacionado ao uso dos recursos da flora, (GUARIM NETO e MORAIS, 2003). Dessa forma, o uso das plantas no tratamento terapêutico passou a ser um dos traços característicos da espécie humana, e sua utilização estava presente em praticamente todas as civilizações ou grupos culturais conhecidos (LIMITED, 1999). O conhecimento tradicional sobre o uso das plantas ainda é vasto e, em muitos casos, o único recurso terapêutico disponível às populações rurais de países em desenvolvimento (PASA et al., 2005). As práticas relacionadas ao uso popular de plantas medicinais são o que muitas comunidades têm como alternativa viável para o tratamento de doenças ou manutenção da saúde. Porém, sua continuidade pode ser ameaçada pela interferência de fatores externos à dinâmica social do grupo (AMOROZO, 2002). O resgate do uso popular das plantas medicinais é de fundamental importância, pois quando adequadamente utilizadas, as ervas funcionam eficazmente e em geral não provocam efeitos negativos de qualquer espécie no organismo humano, possibilitando que as pessoas se beneficiem com mais uma alternativa de tratamento e manutenção da saúde (FONTES et al., 2007). É visível o papel que os povos tradicionais desempenham na exploração dos ambientes naturais, fornecendo informações sobre as diferentes formas de manejo executadas no seu cotidiano e usufruindo da exploração enquanto forma de sustentação desses povos (PASA et al., 2005). O presente trabalho teve como objetivo fazer o levantamento etnobotânico de plantas utilizadas pela população da comunidade de São Gonçalo – Beira Rio de Cuiabá MT, para fins medicinais como tratamento das enfermidades e avaliar a relevância deste conhecimento para as comunidades em questão. Além disso, relatar a finalidade para as quais as plantas são utilizadas e sua forma de preparação mais comum na medicina caseira.
MATERIAL E MÉTODOS
O presente estudo foi realizado na comunidade tradicional de São Gonçalo Beira Rio, no município de Cuiabá-MT, Brasil, nos meses de setembro e outubro de 2010. A região é conhecida regionalmente por possuir grandes artesãos, ceramistas, pescadores, redeiras, cantadores e dançadores do Siriri e do Cururu. São pessoas que cultuam a cultura cuiabana de raiz, ribeirinha e popular. O ponto central da localidade está entre as coordenadas geográficas 15°38’59”S de latitude e 56°04’09” W de longitude (Figura 1).
Revista Biodiversidade v. 9, n. 1, 2010
93
Figura 1 – Localizaçãoda Comunidade São Gonçalo beira Rio. (Fonte:GOOGLE EARTH, 2010).
Foram aplicados questionários para coleta de dados junto aos moradores da comunidade para conhecer quais são, e como são utilizadas as plantas medicinais. O questionário de coleta de dados foi dividido em três partes: a primeira, refere-se aos dados sócio-econômicos (idade, sexo, procedência), a segunda aos dados referentes à diversidade das plantas apresentadas no quintal das residências de cada entrevistado; e a terceira, os dados botânicos (nome popular da planta) e os dados populares de uso da planta (indicação, parte utilizada, forma de preparo e via de administração). Foram entrevistados 18 moradores adultos homens e mulheres, que costumam fazer uso de plantas medicinais no seu cotidiano. As entrevistas foram acompanhadas por um morador tradicional (técnica bola de neve) do local que facilitou o acesso dos pesquisadores às residências e o critério para a escolha dos entrevistados foi o tempo de moradia no local, sendo escolhidos os moradores mais antigos e com possível conhecimento sobre o uso de plantas medicinais. Em seguida, foi elaborada uma listagem de todas as plantas citadas como medicinais. As espécies foram relacionadas por seus nomes populares, com observação in loco pelos pesquisadores junto aos informantes para a identificação dos exemplares em campo. A identificação dos gêneros das plantas levantadas foi realizada com base em bibliografia especializada, revisões e estudos taxonômicos disponíveis, através de chaves de identificação e por descrições genéricas e específicas. A confirmação das identificações foi realizada por comparações morfológicas com exsicatas identificadas no Herbário Central da UFMT, e ainda, por consultas com especialistas da área. Revista Biodiversidade v. 9, n. 1, 2010
94
RESULTADOS E DISCUSSÃO
As matas de galeria representam uma unidade de paisagem quanto aos espaços com vegetação natural, sendo consideradas fontes de recursos naturais, em especial de plantas com finalidades medicinais. A presença das matas ripárias, particularmente no cerrado mato-grossense, reveste-se de grande importância na vida da população regional. De um lado, pela oferta de remédios e alimentos para a subsistência das famílias; de outro, por ser um dos vetores que leva determinados moradores locais à conservação dos recursos nela existentes e, através dela se identificam socialmente, enquanto membro da comunidade. Foram entrevistados adultos entre 25 e 85 anos de idade. Dos entrevistados, 55,55% são do sexo feminino e 44,45% do sexo masculino. Quanto à origem dos informantes 33,33% são oriundos de outro local e 66,67% nasceram na própria comunidade. Dentre os participantes da pesquisa, 77,7% trabalham na área rural da própria Comunidade São Gonçalo. Por serem nativos da região rural todos os entrevistados sempre fizeram uso das plantas medicinais, sendo que 88,88% obtiveram esses ensinamentos de seus antepassados, enquanto que 11,12% aprenderam a utilizá-las uns com os outros. Todas as partes vegetais foram indicadas para o preparo de remédios, sendo que as mais utilizadas é a folha. Diferentes partes das mesmas plantas podem ser empregadas de diferentes modos, para a mesma afecção ou afecções diferentes. Observaram-se três formas de preparo das plantas com fins terapêuticos, tais como, xaropes, chá e compressa, que foram enquadradas conforme a conceituação. O chá foi a forma de preparo mais citada, demonstrando que, tradicionalmente, a comunidade trata a maioria de suas doenças por via oral. Durante a pesquisa observou-se que alguns entrevistados mostraram-se resistentes ao tratamento médico indicado devido à própria cultura da automedicação comum entre os brasileiros e, principalmente, pelo alto custo dos medicamentos alopáticos (JEUVANA, et al., 2007). Por esta razão, as pessoas locais preferem seguir o tratamento baseado no conhecimento da medicina tradicional, caseira. Todas as plantas mencionadas pelos informantes tiveram uma diversidade de uso (alimentar, ornamental, mistico-religiosa, lenha etc), mas a etnocategoria medicinal foi a mais frequente entre elas e encontra-se distribuída em 41 famílias botânicas, sendo as mais expressivas Fabaceae, Mimosaceae e Caesalpiniaceae (11,5% cada), Compositae (5,8%), Moraceae, Rutaceae, Labiatae, Bignoniaceae e Myrtaceae (4,6% cada) e o restante correspondem a 35%, conforme Tabela 1.
Revista Biodiversidade v. 9, n. 1, 2010
95
Tabela 1. Plantas usadas como remédio na Comunidade são Gonçalo.2010. NOME CIENTIFICO ALISMATACEAE Echinodorus macrophyllus Miq. ANACARDIACEAE Myracondruon urundeuva FR.All. A P O C Y N AC E A E Hancornia speciosa Gomez. Macrosiphonia velame M.Arg. BIGNONIACEAE Anemopaegma arvense (Vell.) Stelf. Tabebuia aurea (M.) B. et H. Tabebuia heptaphylla (Vell.) Toledo. Tabebuia ochracea Standl. BORAGINACEAE Symphitum officinale L. BROMELIACEAE Bromelia balansae Mez. BURSERACEAE Protium heptaphyllum (Aubl.) March. CACTACEAE Discocatus heptacanthus (Rodr.) B. & R. CAESALPINIACEAE Bauhinia nitida St.-Hill Copaífera langsdorffii St.-Hill
NOME POPULAR
PARTE USADA PREPARO USOS POPULARES
Chapéu-de-couro
Folha
Aroeira
Melado da casca Aplicação local
Reumatismo, quebraduras Inflamação dos ovários
Mangaba Velame branco
Casca do caule Folha
Chá Chá,xarope
Úlcera Depurativo do sangue
Verga-teso
Raiz
Chá
Doenças musculares
Paratudo Ipê-roxo
Casca Casca do caule
Xa r o p e Chá
Anemia Câncer
Ipê-amarelo
Casca do caule
Chá
Câncer
Confrei
Folha
Chá
Inflamação do útero
Gravatá
Fruto
Xa r o p e
Doenças respiratórias
Amescla
Folha
Chá
Doenças respiratórias
Coroa-de-frade
Folha
Chá
Doenças do sangue, ácido úrico
Pata-de-vaca Copaíba, pau-dóleo
Rins, diabetes Antiinflamatório, cicatrizante
Chá
Reumatismo
Hymenaea stignocarpa Mart. ex. Hayne Senna ocidentalis St.-Hill.
Jatobá-do-campo Fedegoso
Folha Chá Resina do caule Aplicação local Flor, casca do Chá, xarope caule Raiz M acer ad a
Tamarindus indica St.-Hill. CELASTRACEAE Maytenus ilicifolia Mart. CHENOPODIACEAE Chenopodium ambrosioides L. COCHLOSPERMACEAE Cochlospermum regium ( Mart. & Sch.) Pilger COMPOSITAE Achyrocline satureoides D.C. Bacharis trimera Less.
Tamarindo
Folha
Chá
Malina (lavar a cabeça)
Espinheira-santa
Folha
Chá
Depurativo do sangue, infecção
Erva-Santa-Maria
Folha
Chá
Verminose
Algodão-do-campo
Raiz
Chá
Inflamação do útero e ovários
Macela Carqueja
Chá Digestão, disenteria e febre Chá, infusão Dores de estômago, vesícula e fígado
Matricaria recutita L. Mikania glomerata Sprengel Vernonia polianthes L.
Camomila Guaco, chá-porreta Caferana
Folha, caule Casca, raiz , folha Ramo foliar Folha Folha
CONVOLVULACEAE Operculina alata (Ham.) Urb.
CRUCIFERAE Brassica oleracea L. Cucurbita pepo L. EUPHORBIACEAE Euphorbia hyssopifolia L. Phyllanthus niruri L.
Anemia e fraqueza do corpo Problemas do fígado
Chá Chá Chá
Constipação intestinal Doenças respiratórias Problemas circulatórios
Batata-de-tiú, purga- de- Raiz lagarto
Batata seca ralada
Vermes
Couve
Folha
Cozida óleo Tratamento de furúnculos
Abóbora
Semente
Chá do pó
Vermífugo
Sete-sangrias Quebra-pedra
Folha Folha, raiz
Chá Chá
Pressão alta Problemas renais, diurético
Revista Biodiversidade v. 9, n. 1, 2010
96
FABACEAE Acosmium subelegans (Mohl). Quina-genciana, Yak. genciana
Raiz
Chá
Problemas de ovário e útero
Sucupira-preta Sucupira-branca Poejo
Fava Fava Folha
Chá Xa r o p e Chá
Inflamação da garganta Inflamação da garganta Febre, gripe, dor de garganta
Jequitibá
Casca do caule
Chá, gargarejo
Inflamação do útero e ovários
Angico branco
Casca do caule
Chá
Gripe, tosse
Stryphnodendron adstringens Barbatimão roxo Casca do caule (Mart.) Coville LAMIACEAE Rosmarinus officinalis L. Alecrim Folha LOGANIACEAE Strychnos pseudoquina St. Hill. Quina, quina-do- cerrado Casca do caule
Chá
Úlcera gástrica
Chá
Problemas cardiovasculares
Infusão na água
Vermífugo, estimulante do apetite
Bowdichia virgiloides H. B. K Pterodon pubescens Benth. Mentha pulegium L. LECYTHIDACEAE Cariniana rubra Gardner ex. Miers MIMOSACEAE Anadenanthera peregrina (L.) Spreng.
LYTHRACEAE Lafoensia pacari St. Hill. MALPIGHIACEAE Heteropteris aphrodisiaca O. Mach. Malpighia glabra L. MALVACEAE Gossypium herbaceum L. Malva sylvestris L. MORACEAE Artocarpus altilis L. Brosimum gaudichaudii Trèc. Cecropia pachystachya Trèc. MYRTACEAE Eucalyptus globulus Labill. Eugenia uniflora L. Syzigium jambolanum D.C. NYCTAGINACEAE Boungainvillea spectabilis Willd. OXALIDACEAE Averrhoa carambola L. PASSIFLORACEAE Passiflora edulis Sims.
Mangava-brava
Casca do caule
Infusão
Gastrite e úlcera
Nó-de-cachorro, raizde-Santo -Antônio Acerola
Raiz
Chá
Fadiga
Fruto
No álcool
Resfriado
Algodão-bálsamo
Chá, xarope Inflamação do útero e ovário
Malva branca
Flor, semente, fruto Folha
Chá
Inflamação do útero e ovário
Fruta-pão Algodãozinho, mamicade-cadela Embaúba
Folha Folha, casca, caule Broto
Infusão Chá
Diabete Antiinflamatório, anemia
Chá
Bronquite e pneumonia
Eucalipto Pitanga Jamelão, jambolão
Folha Folha Folha
Chá Chá De c o c ç ã o
Resfriado Diabete, colesterol Diabete
Três-marias
Folha
Chá,banho
Amarelão
Carambola
Folha
Chá
Diabete
Maracujá
Folha
Chá
Ansiedade, insônia
Nas entrevistas foram citadas 14 espécies de plantas medicinais, pertencentes a 14 famílias botânicas, sendo elas: Amaranthaceae, Anacardiaceae, Asphodelaceae, Cecropiaceae, Ciperaceae, Fabaceae,
Gentianaceae,
Leguminosae,
Myrtaceae,
Nyctaginaceae,
Oxalidaceae,
Rutaceae,
Sterculiaceae, Zingiberaceae, conforme Tabela 2. Foram relacionadas plantas para 11 usos medicinais, sendo o maior número para dor de barriga com (4 plantas), seguido do uso para tratamento de gripe (3), pressão (2). Os demais tratamentos observados obtiveram a citação de apenas uma planta, sendo eles: diabete, inflamação, dor de cabeça, dor de garganta, rouquidão, rim, zipela e stress. Revista Biodiversidade v. 9, n. 1, 2010
97
Tabela 2. - Número de citações, nomes populares, gêneros, família, hábito, parte utilizada, forma de preparo e indicação terapêutica citadas com fins medicinais pela comunidade de São Gonçalo Beira Rio, Cuiabá - MT, Brasil, 2010. NºCitaçõe s
Nome Vulgar
Nome Cientifico
Família
Hábito
Parte Usada
Tipos de Uso
Tratamento
7
Laranja azeda
Citrus aurantium
Rutaceae
Arbóreo
Casca do fruto
Xarope
Gripe
6
Embaúba
Cecropia sp.
Cecropiaceae
Palmeira
Broto da Planta
Gema
Gripe
6
Carambola
Averrhoa carambola
Oxalidaceae
Arbóreo
Folha
Chá
Pressão
5
Capim cidreira
Kyllinga odorata
Ciperaceae
Herbáceo
Folha
Chá
Gripe
5
Chico Magro
Guazuma tomentosia
Sterculiaceae
Arbóreo
Casca
Chá
Zipela
5
Amarra pinto
Boerhavia diffusa
Nyctaginaceae
Herbáceo
Raíz
Chá
Rim
5
Goiaba
Psidium guajava
Myrtaceae
Arbóreo
Casca/Broto da Planta
Chá
Dor de barriga/Estômago
5
Mangueira
Mangifera indica
Anacardiaceae
Arbóreo
Fruto
Chá
Pressão
5
Estomalina
Alternanthera brasiliana
Amaranthaceae
Arbóreo
Folha
Chá
Dor de Estômago
5
Caferana
Tachia guyanensis
Gentianaceae
Arbustivo
Folha
Chá
Dor de Estômago
5
Babosa
Aloe vera
Asphodelaceae
Arbustivo
Casca
Chá
Dor de Estômago; inflamação;
5
Pata de vaca
Bauhinia forticata
Fabaceae
Arbóreo
Folha
Chá
Diabete
5
Gengibre
Zingiber officina
Zingiberaceae
Arbustivo
Raíz
Chá
Dor de garganta/Rouquidão
4
Tamarindo
Tamarindus indica
Leguminosae
Arbóreo
folhas
Compressa/banho
Dor de cabeça/Stress
Em se tratando da medicina popular mato-grossense Borba e Macedo (2006) destacam o uso das plantas medicinais encontradas nos quintais das residências registrando-se a utilização de 87 espécies, dentro de 48 famílias, com um total de 47 indicações terapêuticas para as diversas afecções bucais que acometem os habitantes do bairro Santa Cruz em Chapada dos Guimarães. A espécie com maior número de citações foi a camomila (Matricaria chamomilla L.), seguida da laranjeira (Citrus aurantium L.), poejo (Mentha pulegium L.) e marcela (Achyrocline satureoides (Lam.) DC.). A espécie vegetal que obteve vegetal com maior diversidade de aplicação terapêutica para a saúde bucal foi o poejo (Mentha pulegium L.), seguida de goiabeira-branca (Psidium guajava L. var. pyrifera), açafrão (Crocus sativus L.), arnica-do-campo (Camarea ericoides St. Hil.), camomila (Matricaria chamomilla L.), mangava-brava (Lafoensia pacari A. St.-Hil.) e tanchagem (Plantago major L.). Para os autores constatou-se diversas espécies vegetais usadas pela comunidade com finalidade terapêutica em relação à manutenção e recuperação da saúde bucal: plantas nativas, encontradas no Cerrado e plantas exóticas, cultivadas em seus quintais. As espécies de plantas medicinais nativas continuam sendo bastante usadas, apesar do número de espécies de plantas medicinais exóticas ser maior, em relação às plantas citadas. Enfatizando a etnobotânica Vendruscolo e Mentz (2006) ao abordarem o uso das plantas medicinais em um bairro na cidade de Porto Alegre no Rio Grande do Sul ressaltam a importância do valor de uso, a forma de coleta e o armazenamento das espécies Achyrocline satureioides (“marcela”) e Cuphea carthagenensis (“sete-sangria”), entre outras espécies com maior índice de importância para a comunidade que são cultivadas nos pátios e/ou jardins e ainda adquiridas com vizinhos e amigos que Revista Biodiversidade v. 9, n. 1, 2010
98
as cultivam e dessa forma corroborando com os dados coletados na comunidade Bom Jardim. Os autores acima referidos também detectaram em seus estudos que a marcela é coletada nos campos ou em beiras de estrada tradicionalmente na época religiosa da Semana Santa (uma semana antes da Páscoa), e suas flores são postas para secar e posteriormente guardadas para utilização. Cuphea carthagenensis ocorre nos campos e beiras de estrada, não havendo a necessidade do plantio. Também destacam Aloe arborescens, Achyrocline satureioides, Citrus limon, Citrus aurantium, Cunila microcephala, Eugenia uniflora, Foeniculu vulgare e Plectranthus barbatus que foram citadas por informantes pertencentes a todas as oito regiões em que o bairro é dividido pelo Posto de Saúde, possuindo cada uma delas, mais de 30 citações de uso. Este dado demonstra que o conhecimento sobre a utilização destas espécies é igualmente distribuído no bairro.
CONCLUSÕES As plantas continuam sendo indispensáveis às terapêuticas na qualidade de seus preparados medicinais para essa comunidade. A conservação da biodiversidade, gerada através dos conhecimentos tradicionais e práticas conservacionistas torna-se vantajosa pelos saberes etnobiológicos, etnoecológicos e etnobotânicos. Considerando-se, assim, um processo de registro e de conhecimentos provenientes de um determinado grupo acerca de seu ambiente vivido em seus diferentes aspectos, construído com o trabalho, através de informações que refletem efetivamente a complexidade dos ecossistemas. O conhecimento gerado através do resgate do saber popular (saber local) deve ser valorizado através de ações que viabilizem e garantam o uso desses recursos pelas populações, especialmente com plantas de uso medicinal. Conclui-se que o sistema terapêutico da comunidade é um processo histórico vivido pelos moradores mais antigos. Porém, esses conhecimentos atualmente não são adquiridos pelos jovens da comunidade, fato esse que revela a erosão dos conhecimentos populares pelas pessoas de saber local.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
AMOROZO M. C. M. Uso e diversidade de plantas medicinais em Santo Antônio do Leverger, MT, Brasil. Acta Botanica Brasilica. v.16, p.189-203, 2002. AMOROZO, M. C. M. Abordagem etnobotânica na pesquisa de plantas medicinais. Plantas medicinais: arte e ciência - um guia de estudo interdisciplinar. São Paulo, Ed. UNESP, p.47-68, 1996. BEGOSSI, A. Etnobotânica em comunidades caiçaras. Etnobotânica: bases para a conservação. Rio de Janeiro, EDUR. p.108-120, 1998. Revista Biodiversidade v. 9, n. 1, 2010
99
CABALLERO J. La etnobotânica: três Xalapa, Ed. INREB, p. 27-30. 1979.
puntos de vista y uma perspectiva.
La etnobotânica.
FONTES, D. J.; COELHO, V. A. T.; GOMES, F. T. Uso de Plantas Medicinais pelos Moradores da Comunidade de Conceição de Ibitipoca, MG. Revista Brasileira de Biociências, Porto Alegre. v. 5, n. 1, p. 237-239, 2007. GUARIM NETO, G.; MORAIS, R. G. Recursos medicinais de espécies do cerrado do Mato Grosso: um estudo bibliográfico. Acta Botanica Brasílica, v.17, p.561-584, 2003. JEUVANA, D.; COELHO, V. A. T.; GOMES, F. T. Uso de Plantas Medicinais pelos Moradores da Comunidade de Conceição de Ibitipoca, MG. Revista Brasileira de Biociências, Porto Alegre, v.5, n.1, p.237-239, 2007. LIMITED, P. Segredos e virtudes das plantas medicinais. Rio de Janeiro: Reader’s Digest Brasil, 1999, 29p. MARODIN, S. M.; BATISTA, L. R. M. Plantas medicinais do Município de Dom Pedro de Alcântara, Estado do Rio Grande do Sul, Brasil: espécies, famílias e usos em três grupos da população humana. Revista Brasileira de Plantas Medicinais. v.5, n.1, p.1-9, 2002. MOREIRA, R. C. T.; COSTA, L. C. B.; COSTA, R. C. S.; ROCHA, E. A. Abordagem Etnobotânica acerca do Uso de Plantas Medicinais na Vila Cachoeira, Ilhéus, Bahia, Brasil. Bonaerense. Acta Farm. v.21, n.3, p.205-11, 2002. PASA, M. C.; SOARES, J. J.; GUARIM NETO, G. Estudo etnobotânico da comunidade de Conceição-Açu (alto da bacia do rio Aricá Açu, MT, Brasil). Acta Botanica Brasilica. v.19, p.195207, 2005. PASA, M. C. & BASTOS, E. A. S. A etnobiologia no fragmento florestal Recanto do Sol, Campo Verde, MT. In: (Org) Jeater W.M.C.Santos. Produção do espaço e transformações socioambientais das paisagens do Mato Grosso. Edufmt. Pp: 71 – 94. 2010. PASA, M. C. O saber local e a medicina popular: A etnobotânica em Cuiabá. Mato Grosso. Brasil. Bol. Mus. Para. Emílio Goeldi. Cienc. Hum., Belém, v. 6, n. 1, p. 179-196. 2011.
PINTO, E. P. P.; AMOROZO, M. C. M.; FURLAN, A. Conhecimento popular sobre plantas medicinais em comunidades rurais de mata atlântica – Itacaré, BA, Brasil. Acta Botanica Brasilica. V.20, n.4, p.751-762, 2006. SOUZA, C. D.; FELFILI, J. M. Uso das plantas medicinais na região de Alto Paraíso de Goiás, GO, Brasil. Acta Botanica Brasilica. v.20, p.135-142, 2006.
Revista Biodiversidade v. 9, n. 1, 2010
100