Ética naturalizada e evolução: um ensaio sobre a «naturalização» do Direito (Parte 12)

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Ética naturalizada e evolução: um ensaio sobre a «naturalização» do
Direito (Parte 12)

Atahualpa Fernandez(
Marly Fernandez(


"Afirmar que la facultad [moral] vino de algún sitio
no nos satisface; debemos tratar de comprender de dónde
vino y la naturaleza del proceso mediante el cual se
desarrolló; y ha sido el señor Darwin quien ha sentado los
fundamentos de este conocimiento en su obra sobre "El
origen del Hombre"… La teoría de la evolución nos
proporciona un informe mucho más completo que el que
teníamos, sobre la génesis de los sentimientos que
intervienen en la configuración de la Sanción Ética y
Jurídica". F. Pollock




Altruísmo biológico e altruísmo moral ou psicológico: TIT FOR TAT (2)
Dito seja incidentalmente e de passagem que a confiança, aqui,
constitui um requisito de fundamental importância. Trata-se, em sentido
técnico, de um nível particular da probabilidade subjetiva com que um
agente avalia que outro agente ou grupo de agentes realizará uma ação
determinada, antes que possa supervisar tal ação (ou independentemente de
sua capacidade para supervisá-la) e em um contexto no qual afeta a sua
própria ação. Como destacou J. Dunn, a confiança é um mecanismo para
enfrentar-se à liberdade dos demais: pressupõe um risco de defecção da
outra parte e, sobre esta base, tem sido contrastada com a "segurança".
Dentro de uma relação, a confiança normalmente implica uma crença de que a
outra parte está comprometida com a relação.
Este modelo explica, de fato, como pode evolucionar uma forma de
cooperação entre indivíduos não emparentados e resolver assim um dos
enigmas que preocupava a Darwin. Claro que aqui também se pode objetar que
este "altruísmo recíproco", como foi denominado por Trivers, não é o
altruísmo desinteressado de que falam algumas teorias éticas. Isto é certo,
mas, em consideração à imparcialidade, há que anotar que nem todas as
teorias éticas elaboradas pelos filósofos reconhecem a existência de um
altruísmo puramente desinteressado.
O filósofo escocês David Hume, por exemplo, enfatizou que o ser humano
não está confinado a um puro egoísmo e é capaz de verdadeiro afeto e
generosidade, mas assinalou que estes são realmente desinteressados no seio
dos estreitos vínculos familiares. Para além destes estreitos limites a
cooperação social está sujeita à condição da reciprocidade. Isto é o que
Hume chama a virtude artificial da justiça[1]. Também é interessante notar
que ao menos um filósofo moral contemporâneo, John Rawls, simpatiza com a
ideia de que o sentido da justiça que dá estabilidade a nossas sociedades
tem fundamentos biológicos e é produto da evolução por seleção natural.[2]
Rawls simpatiza especialmente com o conceito de "altruísmo recíproco"
de Trivers que acabamos de expor. Anota que é mais bem este conceito e não
o conceito do puro altruísmo, o que pode dar um fundamento biológico à
virtude da justiça como equidade, que é central em sua própria filosofia
moral. Uma explicação bastante simples da justiça e da igualdade, porque é
justamente o contrário da repulsiva tradição liberal acerca do monismo
motivacional do comportamento humano e, em biologia, da "lei da selva". Em
outras palavras – e superando o muro de Durkheim que separa o
natural/biológico do cultural -, a base evolucionária do altruísmo mostra
que o sentido de justiça tem raízes profundas na mente das pessoas e não
precisa contrariar nossa natureza animal que, de uma forma ou outra, acaba
por delimitar as condições de possibilidade de nossa vida ético-
comunitária.[3]
Embora não haja, como dissemos antes, uma resposta simples à pergunta
de se a moralidade (e a justiça) é um fenômeno cultural ou um fenômeno
biológico, o certo é que a importância da mútua relação entre evolução
biológica e a emergência de uma conduta moral e jurídica mais complexa
parece estar fora de qualquer dúvida razoável: o processo evolutivo
proporcionou ao ser humano as habilidades e os requisitos para desenvolver
uma moralidade (que por sua vez deu origem a juridicidade), assim como um
conjunto de necessidades, de emoções e de desejos básicos que a moral (e o
Direito) deve ter em consideração.
Assim que não somente as influências do meio – incluindo a cultura
humana – variam segundo o "substrato" genético sobre o qual atuam, senão
que também, e muito particularmente, o comportamento adaptativo ao estilo
de vida das sociedades de caçadores-coletores parece haver modelado muito
provavelmente a conduta social e moral primitiva, e se serviu dela para a
aparição de grupos cuja sobrevivência passou a depender sobremaneira de
determinadas estratégias sócioadaptativas (baseadas na constituição,
funcionamento e complexidade cognitiva do ser humano) que, com o passo do
tempo, deram lugar a atual comunidade ética.
De modo que se alguém pretenda pôr em dúvida que a investigação de
corte sociobiológico sobre o altruísmo possa dar uma explicação
evolucionista e funcionalista da origem da ética, do direito e da justiça,
assim como das atitudes ético-jurídicas fundamentais, poderá apaziguar sua
dúvida pensando em filósofos como Hume e Rawls, que dão exemplo de que ao
menos certos estilos de filosofia moral concordam com uma explicação
funcional e evolucionista do comportamento moral humano.[4]
Dito isto, parece que a única maneira intelectualmente honrada e
objetiva de abordar o tema e articular em que consiste nossa natureza e
nosso comportamento moral – quer dizer, as implicações morais e jurídicas
da "natureza humana" - é seguindo o fio condutor do enfoque evolucionista.
Em palavras de Francisco Ayala, se "queremos entender lo que somos y adónde
vamos, debemos entender de dónde venimos, puesto que ello define nuestra
realidad y delimita nuestras posibilidades. Nuestra historia biológica
define y delimita lo que somos y lo que podemos ser... Sólo bajo el prisma
de la evolución es posible entender lo que los humanos somos, de donde
venimos y las posibilidades que nos brinda el futuro."




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( Membro do Ministério Público da União/MPU/MPT/Brasil (Fiscal/Public
Prosecutor); Doutor (Ph.D.) Filosofía Jurídica, Moral y Política/
Universidad de Barcelona/España; Postdoctorado (Postdoctoral research)
Teoría Social, Ética y Economia/ Universitat Pompeu
Fabra/Barcelona/España; Mestre (LL.M.) Ciências Jurídico-
civilísticas/Universidade de Coimbra/Portugal; Postdoctorado (Postdoctoral
research)/Center for Evolutionary Psychology da University of
California/Santa Barbara/USA; Postdoctorado (Postdoctoral research)/
Faculty of Law/CAU- Christian-Albrechts-Universität zu Kiel/Schleswig-
Holstein/Deutschland; Postdoctorado (Postdoctoral research) Neurociencia
Cognitiva/ Universitat de les Illes Balears-UIB/España; Especialista
Direito Público/UFPa./Brasil; Profesor Colaborador Honorífico (Associate
Professor) e Investigador da Universitat de les Illes Balears, Cognición y
Evolución Humana / Laboratório de Sistemática Humana/ Evocog. Grupo de
Cognición y Evolución humana/Unidad Asociada al IFISC (CSIC-UIB)/Instituto
de Física Interdisciplinar y Sistemas Complejos/UIB/España; Independent
Researcher.
( Doutora (Ph.D.) Humanidades y Ciencias Sociales/ Universitat de les Illes
Balears- UIB/España; Postdoctorado (Postdoctoral research) Filogènesi de la
moral y Evolució ontogènica/ Laboratório de Sistemática Humana-
UIB/España; Mestre (M. Sc.) Cognición y Evolución Humana/ Universitat de
les Illes Balears- UIB/España; Mestre (LL.M.) Teoría del Derecho/
Universidad de Barcelona- UB/ España; Investigadora da Universitat de les
Illes Balears- UIB / Laboratório de Sistemática Humana/ Evocog. Grupo de
Cognición y Evolución humana/Unidad Asociada al IFISC (CSIC-UIB)/Instituto
de Física Interdisciplinar y Sistemas Complejos/UIB/España.
[1] Como se sabe, Hume – ademais de Adam Smith ou qualquer dos filósofos
escoceses da escola da simpatia - tratou de fundamentar a ética no
naturalismo, baseando na existência de uma emoção simpática a capacidade de
entender e valorar os problemas alheios, de compartir o sofrimento do
outro. Neste contexto, a simpatia (sympathy) é um conceito que articula, ao
largo do desenvolvimento das distintas teorias que se englobam dentro da
escola escocesa do moral sense, a explicação psicologista do fundamento
da moral humana. Desde o papel lateral e um tanto modesto com o que
aparece, junto com outros sinônimos que caracterizam na obra de Shaftesbury
o que poderia vagamente denominar-se "amor social", vai cobrando
paulatinamente força até converter-se no elemento essencial da teoria da
fundamentação da moral em Hume e Smith – certamente com variado
significado. Recordemos que se trata de uma tradição filosófica que fazia
a distinção entre dois domínios que se vinculam ao fenômeno ético: de um
lado, o motivo pelo que se age moralmente e, de outro, o critério da ação
moral. Um exemplo poderá precisar esta distinção: ante uma ação que
consideremos moralmente necessária – tal como ajudar uma pessoa atacada por
um delinquente -, existem muitas formas de reações. Haverá aquele que
defenda a vítima e aquele que prefira não ter problemas e fugir. O critério
que concerne ao dever moral de ajudar os que estão em perigo é,
provavelmente, idêntico para os benfeitores e para os covardes, mas o
motivo que leva a agir de uma forma ou de outra é claramente diferente.
Temos, portanto, um domínio, o da motivação moral, que pode ser descrito em
termos de espécie, e outro, o dos códigos éticos ou morais, que necessita
da filosofia, da sociologia e da história para testemunhar sua existência.
Parece fora de toda dúvida que, em maior ou menor medida, essa classe de
proposição acaba por ocupar seu lugar no atual contexto de uma ética
naturalizada.
[2] Em uma passagem de sua Teoria da Justiça, Rawls dá uma clara
demonstração de que se encontra bastante aberto a esse tipo de argumento.
Por exemplo, ao defender a sua posição contra o utilitarismo, escreve: "Al
argumentar en favor de la mayor estabilidad de los principios de la
justicia, empecé del presupuesto de que ciertas leyes psicológicas son
verdaderas, o que son de forma aproximada. No voy a proseguir el análisis
del problema de la estabilidad para más de este punto. Podemos, entre
tanto, observar que es posible preguntar como es que los seres humanos
adquirieron la naturaleza que esta descrita por estos principios
psicológicos. La teoría de la evolución sugiere que se trata del resultado
de la selección natural: la capacidad para el sentido de la justicia y los
sentimientos morales son una adaptación de la humanidad a su lugar en la
naturaleza. Como afirman los etólogos, los patrones del comportamiento de
la especie y los mecanismos psicológicos a través de los cuales ellos son
adquiridos constituyen características suyas de la misma manera que los
trazos distintivos de sus estructuras corporales; y estos patrones de
comportamiento sufren una evolución, tal como los órganos y el esqueleto.
Parece claro que para los miembros de una especie que vive en grupos
sociales estables la capacidad de obedecer mecanismos de cooperación
equitativos y de desenvolver los sentimientos necesarios para apoyarlos es
altamente ventajosa, en especial cuando los sujetos poseen una vida larga y
dependen unos de otros. Estas condiciones garantizan que habrá innumeras
ocasiones en que la decisión coherente a una justicia recíproca es benéfica
para todas las partes relacionadas". Note-se que M. Ruse descreve alguns
puntos de contato entre a teoria de Rawls e o evolucionismo. Por exemplo, o
que reside "en el hecho de que, seres cuyo sentido moral haya sido modelado
por la selección natural tendrán intereses centrados en ser justo (just),
en el sentido de ser equitativo (fair). Desde un punto de vista individual
y egoísta, gustaríamos que todos los otros estuvieran a nuestro servicio.
Pero eso es simplemente imposible, porque todos los otros desean
exactamente lo mismo. Tenemos que encontrar, para esta situación, una
especie de equilibrio recíproco. Y es precisamente aquí que interviene la
moralidad: un tipo de moralidad que es particularmente compatible con la
ética evolucionista que defiende". Por outro lado, Rawls introduz, ainda
que de forma indireta, o principio ético do altruísmo a ser exigido ou
cobrado dos mais talentosos e afortunados: a abdicação consciente de certos
privilégios e vantagens materiais legítimas em favor dos socialmente menos
favorecidos. Em outras palavras, a base evolutiva do altruísmo recíproco
mostra que o "sentido de justicia tiene raíces profundas en la naturaleza
humana que, de una forma u otra, acaba por delimitar las verdaderas y
reales condiciones de posibilidad de nuestra vida ético-comunitaria" (F. de
Waal).
[3]https://www.researchgate.net/publication/275635459_Justica_e_igualdade_De
_onde_surge_o_sentido_do_que_e_justo_nos_humanos_Parte_1;
https://www.researchgate.net/publication/275635765_Justica_e_igualdade_De_on
de_surge_o_sentido_do_que_e_justo_nos_humanos_Parte_2
[4] Ideia que não é tão nova como parece. Em 1876, por exemplo, o então
jovem filósofo do direito, Frederick Pollock, escreveu sobre a evolução, o
direito e a ética: "Afirmar que la facultad [moral] vino de algún sitio no
nos satisface; debemos tratar de comprender de dónde vino y la naturaleza
del proceso mediante el cual se desarrolló; y ha sido el señor Darwin quien
ha sentado los fundamentos de este conocimiento en su obra sobre "El origen
del Hombre"… La teoría de la evolución nos proporciona un informe mucho más
completo que el que teníamos, sobre la génesis de los sentimientos que
intervienen en la configuración de la Sanción Ética y Jurídica, y nos
permite la explicación de un conjunto importante de los elementos
implicados en ella, en concreto el instinto social y de empatía, que nunca
antes habían sido explicados". (Pollock, F. "Evolution and ethics", Mind: A
Quarterly Review of Psychology and Philosophy, vol. 1, nº 3, july/1876).
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