Etnografia da Apresentação

July 25, 2017 | Autor: Augusto Armondes | Categoria: Etnomusicology, Etnography, Etnomusicologia
Share Embed


Descrição do Produto

Música, Cultura e Sociedade B


Etnografia da Performance



Augusto Armondes, Egberto Brant e Helder Fernandes




Para a nossa Etnografia da Performance vamos falar sobre a apresentação ocorrida no dia 9 de Outubro de 2014 no bar A Casa, com a apresentação do grupo de música instrumental brasileira Delega's Cia. O premiado músico Thiago Delegado, violonista, líder do quarteto que conta além do violão de bateria, baixo e clarineta/sax/flauta, comanda a noite com um som instrumental carregado de improviso e virtuosismo.
Ficamos sabendo da apresentação através do nosso professor André Limão Queiroz, que toca bateria no conjunto. Todas as quintas-feiras ocorre o show com a presença de vários músicos conhecidos no meio musical de Belo Horizonte, além do público comum.
O bar A Casa fica situado no bairro de Santa Efigênia, região sudeste da capital mineira. Belo Horizonte tem a tradição de ter lugares como esse, tudo bem simples, sem muito conforto, local para beber uma cerveja, comer uns tira gostos, conversar e ouvir música, a famosa tradição de boteco. O espaço não é muito amplo, com piso de madeira e janelas bem grandes, basicamente uma sala de estar de um casarão antigo, daí provavelmente o nome. Um segurança estava na porta entregando as comandas, um homem no caixa e dois garçons, um homem e uma mulher, serviam as pessoas no salão. Várias mesas estavam espalhadas, algumas comuns de bar, outras mais altas. Ocorre música ao vivo todos os dias em que a casa está aberta. É cobrado 15 reais de couvert. O cardápio conta basicamente com bebidas e porções, comum a esse tipo de bar. Os preços são um pouco altos, mas também normal para a região.
Chegamos no local por volta das 23:00 horas. Estava um pouco vazio, várias mesas desocupadas, o ambiente estava bem iluminado. O palco ainda não estava pronto, alguma movimentação com cabos e microfones, a bateria não estava montada ainda. Havia um som ambiente. As pessoas, de todas as idades, dos 20 aos 60 anos aproximadamente, classe média, tanto negras como brancas, conversando bastante e bebendo suas cervejas e vinhos, algumas sentadas, outras em pé. O Thiago Delegado conversava muito com os presentes, o que dá a sensação de que o show seria bem íntimo, e de que essas pessoas que estavam lá são frequentes.
Esse ambiente de conversa e descontração durou por volta de uma hora. Nesse tempo poucas pessoas novas chegaram ao bar. O garçom saiu da casa e foi ajudar a carregar a bateria que havia chegado. Tudo pronto, tudo montado, e por volta da meia noite as luzes são diminuídas e o show começa.
O som, bem mais alto que a música ambiente que tocava antes, era bem regulado, ouvia-se todos os instrumentos. Não ouve nenhum tipo de apresentação, eles só começaram a tocar e pronto. Música instrumental brasileira, com momentos de improviso de todos os músicos fazia cada música durar por volta de seis, sete minutos. No início, após cada música a plateia aplaudia, coisa que foi se perdendo durante a apresentação. A maioria estava com sua atenção mais voltada para a conversa do que para o palco. Alguns dançavam timidamente em seu canto. Gradativamente mais pessoas chegavam ao local. Algumas eram músicos que aparentavam estar vindo de suas próprias apresentações em outras casas.
Quem chegava sempre cumprimentava os que estavam presente, fortalecendo a ideia de que esse público se conhece é frequente a essa apresentação. Vários outros músicos do cenário mineiro estavam presente, como Michel Maciel, violonista, Aranha, guitarrista, e vários colegas da Escola de Música da UFMG. Em especial havia um senhor, negro, com idade avançada, atento a apresentação, mas sempre cumprimentado por alguém que estava chegando. Mais tarde soubemos que se tratava de Mozart Secundino de Oliveira, 91 anos, personagem icônico da cena do choro em BH.
A medida que o show ia acontecendo o ambiente se tornava mais descontraído. Com o aumento do teor alcóolico, as inibições diminuíram e as pessoas começaram a dançar de fato. Casais se misturavam em meio as mesas e dançavam. Os garçons recolhiam as mesas não usadas para liberar mais espaço. A maioria dos presentes já acompanhava tudo de pé. Nesse momento as palmas que faltavam no início acontecem ainda mais intensas que antes.
Sem convite nem aviso, um cavaco é ouvido. Logo em seguida uma percussão também é adicionada. Era o momento das participações. Com muito virtuosismo duelos de improviso são travados entre os músicos. Agora a atenção da audiência está voltada para o palco, com aplausos e gritos de motivação para cada músico após seu solo.
Passado uma hora e meia aproximadamente de apresentação é dado um intervalo. O Thiago apresenta os músicos que estão tocando, que recebem palmas. Ele convida então uma cantora para uma canja. A partir desse momento, só voz e violão. Enquanto isso, os outros músicos aproveitaram para conversar com os presentes e beber algo. Em relação à canja, houve uma mudança no clima do ambiente. A moça, da qual não me lembro o nome, era a aniversariante da noite e se apresentava de forma intimista, como se estivesse em casa. Com canções mais leves, em relação ao instrumental. Mas as pessoas facilmente se adaptaram a este clima. O respeito para com o artista, de modo geral, se mostrava bem explícito.
Terminado o intervalo, a música instrumental recomeçou e se estendeu por pouco mais de meia hora. Agora o repertório foi bem animado e dançante, provavelmente para aproveitar a empolgação da plateia na parte final do show. Neste momento os garçons avisaram que continuariam a servir até a música parar, depois disso, só comprando fichas no caixa e se dirigindo direto ao balcão. Pelo menos metade das mesas já haviam sido retiradas e muita gente já tinha ido embora. As pessoas dançavam com mais liberdade pelo espaço estar maior. Ao terminar, o nome de todos os músicos foi mais uma vez dito, receberam aplausos. As luzes se acenderam e o som mecânico voltou a tocar, com volume bem baixo. Os músicos desmontaram o equipamento rapidamente e todos com a ajuda de um garçom ajudaram a carregar tudo para os carros. Os que ainda estavam presente não foram embora de imediato. As várias saideiras, as conversas, os risos ainda ocorriam. O Limão nos reconheceu, foi até a nossa mesa e nos cumprimentou. Todos os músicos fizeram o mesmo, indo de mesa em mesa agradecendo a presença e conversando com seus amigos e conhecidos. Enquanto aguardávamos na fila para pagar a conta, ainda haviam algumas rodinhas de conversa entre clientes mas rapidamente o ambiente ia se esvaziando. Saímos e conversamos alguns instantes do lado externo. Ao entrarmos no carro, um morador de rua, passando-se por flanelinha quis cobrar por ter "vigiado" o carro.

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.