EUROPA: desafios para o novo século

May 23, 2017 | Autor: Vasco Coelho | Categoria: European Studies, European Union, Europe, Europa, União Europeia, Futuro da Europa
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EUROPA: desafios para o novo século por Vasco Coelho 10/12/2000

O século XX será lembrado como o século em que a Europa mais perto esteve do seu fim, ou pelo menos, do seu fundo mais tenebroso como civilização. Falo obviamente dos vários infortúnios que viveu, sobretudo das duas guerras mundiais que foram essencialmente europeias e que deixaram marcas profundas como a divisão Este/Oeste, agora quase dissipada, aparentemente. Se antes a Europa sempre se envolveu em guerras, ora entre os seus povos, ora com diferentes partes do globo para as conquistar (sem grande resistência devido à sua supremacia total), as duas guerras mundiais foram muito mais ruinosas e o enfraquecimento europeu foi aproveitado por outras potências entretanto emergentes para finalmente vingarem no panorama internacional. Hoje, o Velho Continente encontra-se numa fase decisiva da sua História: se nos últimos anos tudo se fez para que ele se constituísse como um bloco único e se passasse a imagem de que, de facto, ele o é, ainda não foi posta em prática pelos governantes e figuras principais da política europeia (tão carenciada) uma solidariedade entre grandes e pequenos de modo a que se desvaneça tamanha fragilidade no processo de construção e para que a coesão prevaleça sobre as demais forças centrífugas. Se dentro da União Europeia temos diferentes Europas, dentro do continente no seu todo, temos muitas mais. Não falo de diferenças étnicas e culturais, mas de estádios de desenvolvimento, estabilização das instituições políticas e de participação democrática do cidadão, bem como a todos os níveis se considera ser o mais justo socialmente. Conseguirão as várias Europas percorrer o “labirinto” que é mais vasto que a própria Europa? Não hajam dúvidas de que o processo de integração europeia está longe do seu fim, pois para atingir aquele que eu considero ser o melhor caminho e que de forma mais sólida perdurará na condução da Europa ao seu devir histórico e na concretização do seu projecto de prosperidade eterna – o Federalismo – é necessária uma grande maturação, na linha do que é defendido pelos movimentos federalistas da actualidade, inspirados nas ideias de Denis de Rougemont, desde os célebres congressos de Montreux e Haia, em 1947 e 1948, respectivamente. Se não for este o caminho, mais perto estamos, ainda assim, de realizarmos e concluirmos importantes etapas, mas que pecarão por defeito, não apagando nunca o espectro

de uma Europa dividida. Novos desafios se apresentam, quer externos, quer internos. Uma “Europa linguisticamente plural, culturalmente secularizada, mas secretamente prisioneira nos seus imaginários religiosos” luta ainda contra os fantasmas do passado, mas constitui-se de novo como potência económica e, futuramente, político-militar, ao mesmo tempo que se dinamiza como fonte de cultura e foco civilizacional.2 Havendo vontade política, esta Europa multicultural caminhará, com mais ou menos recuos, rumo a uma união federal de estados europeus, reunindo o que, de forma salutar, a diversifica num “equilíbrio dinâmico”, salvaguardando “a qualidade de cada minoria, de cada região ou nação” e constituindo-se como um “espaço de liberdade, de democracia e de participação num pluralismo de ideias, de culturas e de crenças”.3 O processo, embora frágil, é irreversível. Os países europeus resistem hoje à ideia de se barricarem a cada crise económica ou política e, com mais ou menos percalços, aprenderam, definitivamente, a dialogar entre si. Saiba a Europa responder afirmativamente, seguindo os princípios de subsidiariedade, de autonomia e de participação aos desafios que enfrenta, promovendo a solidariedade entre cidadãos, regiões e estados, e, aproveitar os seus recursos humanos e experiência histórica para se constituir como a terra onde todos os sonhos são possíveis de se concretizar. “Se o mundo tivesse de convergir para uma civilização comum, esta civilização deveria certamente muito às ideias que surgiram na Europa e às experiências realizadas neste continente desde há alguns séculos” 4, logo estamos (e apelo ao espírito empreendedor português que tantas vezes se desvirtualiza neste engajamento europeu) a apenas alguns passos de sermos um verdadeiro modelo que transformará o mundo. Se antes o fomos, acentuando as disparidades e transportando para todos os cantos do mundo modelos de subordinação que foram prevalecendo, voltaremos a sê-lo, renunciando ao princípio de dominação/hegemonia, que se encontra caduco, mas, pelo contrário, oferecendo a possibilidade de criar uma nova sinergia entre dois pólos antagónicos – globalização e fragmentação – unindo a própria diversidade num tecido comum de “solidariedades, de pertenças e de lealdades múltiplas”.5



Viriato Soromenho Marques in “Europa – Labirinto ou Casa Comum” Viriato Soromenho Marques in ob. cit. 3 Dusan Sidjanski in “O Futuro Federalista da Europa” 4 René Rémond in “Introdução à História do Nosso Tempo – do Antigo Regime aos Nossos Dias” 5 Dusan Sidjanski in ob. cit. 2

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