Ex-votos do Brasil (introdução em Português, avec traduction en français)
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J. Cl. Alves de Oliveira (éd.), Ex-‐votos do Brasil. Arte et Folkcomunicação, 2016, 258 p. © Quarteto Editora ISBN 978-‐85-‐8005-‐107-‐0
Preâmbulo da Clarisse Prêtre [Tradução em francês infra] Desde o arranjo de objetos nas salas de milagres até a reapropriação em uma perspectiva artística, as contribuições reunidas neste volume abordam a questão da identidade e do destino do ex-‐voto através de pontos de vista cruzados: historiadores da religião, artistas, museólogos, trazem uma nova luz sobre o fenômeno do objeto ligado a uma promessa, e, além disso, sobre a questão da relação entre o profano e o sagrado. Este é o paradoxo do ex-‐voto enfatizado aqui: testemunho mais tangível da fé, o objeto dedicado não pertence nem a um ritual religioso nem à arte sacra.
Na verdade, nem todas as ações votivas que acompanham a deposição de um ex-‐voto constituem uma essência sagrada do objeto. É o devoto que é fundamental nesse processo e que se sente um elemento primordial na existência do santuário. No ritual, o ex-‐voto é um meio de comunicação essencial entre os fiéis e os deuses, mas não assume nenhum caráter sagrado. As novas reflexões sobre a disposição das salas de milagres como espaço museológico também revelam muito bem o caráter profano dos objetos que, contudo, são dedicados aos deuses. Uma vez que o objeto não pertence à arte sacra, devemos a partir de então, romper com a velha teoria que sistematicamente assimila o ex-‐voto à arte popular. De um lado, o ex-‐ voto está longe da produção artesanal em grande quantidade para decoração, pois envolve pedidos pessoais e, de outro, também se distingue da produção industrializada, uma vez que cada objeto dedicado a uma divindade é único. Ele evoca, ainda, momentos da vida cotidiana, valores individuais e privados que estão embutidos no concreto e permitem reconstruir a vida dos devotos, constituindo assim uma fonte de informação fundamental para vários campos de investigação, como por exemplo, as doenças. Independentemente do tipo de objeto dedicado, seja ele em madeira, em cera manufaturada, em matéria orgânica ou de natureza bibliográfica, o ex-‐voto representa, sobretudo, a memória dos fiéis que o depositaram em um santuário. Por isso, não podemos associá-‐lo a uma produção artesanal popular desprovida de qualquer conexão com a pessoa que encomendou, fabricou e comprou o objeto. Contudo, o ex-‐voto também é parte de um processo da memória coletiva. Reflexo dos problemas sociais é um instrumento essencial para nos conduzir às profundezas da consciência. Esta enxerga na revelação do milagre uma resposta aos períodos de crise. O objeto dedicado em gratidão à realização do milagre dá materialidade aos desejos das comunidades, seja no sentido mais abrangente de sociedade, seja no sentido mais restrito de grupo familiar, profissional ou associativo. Por sua variabilidade, o ex-‐voto é um reflexo de uma piedade popular multifacetada, que devemos distinguir da religiosidade popular que se encontra fixada na tradição ritual ligada à sua história. Sua vocação para agradar a divindade e sua função particular de “objeto que comunica” lhe permite transcender tempo e espaço e ser apropriado pelas artes visuais em um ato de transmutação estética. Assim, indo além dos códigos fixos da cultura e das artes (popular, erudita e instituída), o ex-‐voto pode se tornar ferramenta de variadas criações artísticas, de acordo com o princípio da "circularidade" que eliminam as fronteiras entre a cultura de elite e a cultura popular. O questionamento do ex-‐voto nesta obra o coloca no centro de uma reflexão multidisciplinar (sociológica, etnológica, artística, etc.), sublinhando o seu estatuto particular na ligação fundamental existente entre o profano e o sagrado. De l’agencement des objets dans les salles des miracles à leur réappropriation dans une perspective artistique, les contributions rassemblées dans cet ouvrage abordent la question de l’identité et du devenir de l’ex-‐voto à travers des regards croisés : historiens de la religion, artistes, muséologues, apportent un éclairage nouveau au phénomène de l’objet lié à un vœu, et au-‐delà, à la question de l’articulation entre profane et sacré. Car c’est là le paradoxe de l’ex-‐voto qui est souligné ici : témoignage le plus tangible de la foi, l’objet dédié ne relève ni d’un rite religieux ni de l’art sacré. En effet, toutes les actions votives qui peuvent entourer le dépôt d’un ex-‐voto ne sont pas constitutives d’une essence sacrée de l’objet. C’est bien le dévôt qui est au centre de
ce processus et se considère comme un élément primordial de l’existence du sanctuaire. Dans le rituel, l’ex-‐voto est un medium de communication essentiel entre les fidèles et les dieux, mais ne revêt aucun caractère sacré. Les réflexions nouvelles sur l’agencement des salles des miracles comme espaces muséologiques attestent d’ailleurs bien du caractère profane des objets pourtant dédiés à des dieux. De la même façon qu’il n’appartient pas à l’art sacré, on doit dorénavant rompre également avec l’ancienne théorie qui assimilait systématiquement l’ex-‐voto à de l’art populaire. Loin de la production artisanale de masse destinée à la décoration, l’ex-‐voto repose sur des demandes personnelles et au-‐delà de la fabrication manufacturée (industrializado), l’offrande de chaque objet à une divinité est unique : il atteste de moments de la vie quotidienne, de valeurs individuelles et privées ancrées dans le concret et permet de reconstituer le quotidien des dévots en constituant une source d’information fondamentale pour des champs d’investigation variés, comme celui de la maladie, par exemple. Quel que soit le type d’objet dédié, qu’il soit en bois, “industrialisé” en cire, un élément organique ou bibliographique, il représente avant tout le souvenir du fidèle qui l’a déposé dans un sanctuaire et pour cela, on ne peut l’assimiler à une production d’un artisanat populaire déconnecté de tout lien avec la personne qui l’a commandé, fabriqué, acheté. Mais l’ex-‐voto s’insère également dans un processus de mémoire collective. Reflet des problèmes sociaux, il constitue un moyen essentiel pour nous conduire aux tréfonds de la conscience qui pose l’évidence du miracle comme réponse à des périodes de crise conjonturelle, et grâce à l’objet dédié en remerciement, confère une matérialité à des souhaits communs à des sociétés restreintes ou élargies, familiales, professionnelles, associatives. Par sa variabilité, l’ex-‐voto est le reflet de la piété populaire protéiforme, qu’on doit distinguer de la religiosité populaire figée dans une tradition rituelle liée à son histoire. Sa vocation à plaire à la divinité remerciée, son rôle particulier d’objet communicant, lui permettent de transcender temps et espace et d’être réapproprié par les arts visuels dans un acte de transmutation esthétique. En dépassant ainsi les codes figés de la culture et des arts considérés comme populaire, érudit et institué, l’ex-‐voto peut devenir outil de créations artistiques multiples répondant au principe de la « circularité » abolissant les frontières entre la culture des élites et la culture populaire. Questionner l’ex-‐voto comme on le fait ici, c’est donc le placer au cœur d’une réflexion pluridisciplinaire, socioloique, ethnologique, artistique, etc. qui souligne son statut hors-‐ normes de lien essentiel entre le profane et le sacré.
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