Exploração sexual comercial de crianças e adolescentes: reflexões contemporâneas no contexto do Brasil, da Argentina e do Uruguai

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Descrição do Produto

EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES Reflexões contemporâneas no contexto do Brasil, da Argentina e do Uruguai

Multideia Editora Ltda. Rua Desembargador Otávio do Amaral, 1.553 80710-620 - Curitiba – PR +55(41) 3339-1412 [email protected]

Conselho Editorial Marli Marlene M. da Costa (Unisc) Salete Oro Boff (Unisc/IESA/IMED) Carlos Lunelli (UCS) Liton Lanes Pilau (Univalli) Danielle Annoni (UFSC) Luiz Otávio Pimentel (UFSC)

Orides Mezzaroba (UFSC) Sandra Negro (UBA/Argentina) Nuria Bellosso Martín (Burgos/Espanha) Denise Fincato (PUC/RS) Wilson Engelmann (Unisinos) Neuro José Zambam (IMED)

Coordenação editorial e revisão: Fátima Beghetto Projeto gráfico, diagramação e capa: Sônia Maria Borba

CPI-BRASIL. Catalogação na fonte C987

Custódio, André Viana Exploração sexual comercial de crianças e adolescentes: reflexões contemporâneas no contexto do Brasil, da Argentina e do Uruguai / André Viana Custódio, Rafael Bueno da Rosa Moreira – Curitiba: Multideia, 2015. 168p.; 23cm ISBN 978-85-8443-025-3 1. Exploração sexual de crianças. 2. Exploração sexual de adolescentes. I. Moreira, Rafael Bueno da Rosa. II. Título. CDD 306.74 (22. ed.) CDU 343.541

É de inteira responsabilidade do autor a emissão de conceitos. Autorizamos a reprodução dos conceitos aqui emitidos, desde que citada a fonte. Respeite os direitos autorais – Lei 9.610/98.

André Viana Custódio Rafael Bueno da Rosa Moreira

EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES Reflexões contemporâneas no contexto do Brasil, da Argentina e do Uruguai

Curitiba

2015

AGRADECIMENTOS

Este livro é resultado da produção científica realizada no âmbito do Grupo de Estudos em Direitos Humanos da Criança e do Adolescente (GRUPECA) vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Direito – Mestrado e Doutorado – da Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC) razão pela qual os autores agradecem o apoio institucional no desenvolvimento dos estudos aqui apresentados. Também merece referência especial o apoio do Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq) que permitiu o aprofundamento de aspectos teóricos da exploração sexual comercial como uma forma de violência contra crianças e adolescentes por meio do Projeto Violência Intrafamiliar contra Crianças e Adolescentes e as Políticas Públicas aprovado no Edital Universal 14/2012.

Durante o desenvolvimento das pesquisas que embasam este livro inúmeras contribuições ocorreram envolvendo alunos, professores e colaboradores que a partir das suas reflexões, debates e estudos permitindo a concretização da versão final desta obra. Enumerá-los seria impossível, daí o registro de um abrangente agradecimento a todos. Assim, espera-se que se identifiquem com as ideias aqui expostas. Prof. Dr. André Viana Custódio Prof. MSc. Rafael Bueno da Rosa Moreira

PREFÁCIO

O grito necessário O que faz a violência? Rouba-nos da nossa dignidade. Quebra com os paradigmas da evolução. Sim, torna-nos bestas. Para a violência Não há clemência. É o único discurso, prática para qual não existe tolerância. Não podemos tolerar a barbárie! É imperiosa uma nova visão sobre humanidade. É imperioso que nos agreguemos num único grito: “Basta de violência”!! (Josiane Rose Petry Veronese)

Ao trabalhar com temas relativos à proteção dos direitos da criança e do adolescente, constatei que uma das mais profundas violações se constitui na violência sexual, nas suas mais variadas formas – do abuso, exploração sexual comercial (que alguns denominam como prostituição infantil, inclusive, muitos textos legais), a pedofilia, enfim, violações à dignidade sexual da criança e do adolescente; violações ao ser criança, em sua plenitude e essência. O tema objeto da obra “Exploração Sexual Comercial de Crianças e Adolescentes: Reflexões contemporâneas no contexto do Brasil, da Argentina e do Uruguai”, de André Viana Custódio e Rafael Bueno Da Rosa Moreira, aponta para uma questão que não pode ser dissociada em matéria de violências, que é a questão da prevenção, sobretudo por meio de uma política social que tenha como foco de abordagem uma nova visão da infância, que contemple a criança e o adolescente como sujeitos de direitos, o que importa em não mais visualizá-los como seres simplesmente receptores de

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira garantias, antes como seres humanos em processo de edificação de suas autonomias. A criança e o adolescente na ótica menorista, em vigor até o advento da atual Constituição Federal de 1988, eram meros objetos de toda uma ideologia tutelar, de uma cultura que coisificava a infância, e a exploração sexual comercial infantoadolescente está afinada com este entendimento, uma vez que crianças e adolescentes são vistos como mercadorias, portanto, comercializáveis. Na ótica de um novo direito – o do Direito da Criança e do Adolescente –, esta criança e adolescente são compreendidos como sujeitos, cujas autonomias constroem-se de forma paulatina; de modo algum pode-se admitir qualquer tipo de violência, qualquer tipo de exploração.

Neste sentido meninos e meninas precisam se desenvolver num ambiente que permita o seu pleno desenvolvimento sexual, físico, mental, emocional, espiritual l e social, em condições de liberdade e dignidade, de respeito ao seu corpo, à sua integridade. Determina o Estatuto da Criança e do Adolescente, repetindo norma constitucional, em seu artigo 5º: “Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão aos seus direitos fundamentais”. A prevenção de um problema tão sério como o é a exploração sexual comercial de crianças e adolescentes torna imprescindível uma ação conjunta entre a família, a sociedade e o Estado, utilizando métodos, programas, campanhas de esclarecimento e de combate, enfim, de uma série de instrumentos capazes de neutralizar o problema já na sua origem.

Nas palavras dos autores, em suas Reflexões Conclusivas: “Nas regiões de fronteira do estado do Rio Grande do Sul, estão sendo desenvolvidas políticas públicas regionais para o enfrentamento à exploração sexual comercial, denominadas Estratégia Regional de Enfrentamento ao Tráfico de Crianças e Adolescentes para Fins de Exploração Sexual no Mercosul – PAIR/Mercosul, visando ao melhor enfrentamento da causa e à padronização de condutas. Para o aperfeiçoamento dessas políticas, é necessária a garantia da articulação internacional e a criação de redes internacionais de enfrentamento à exploração sexual comercial relacionada às redes nacionais”. Há que se considerar que a sociedade deve cobrar do Poder Público uma maior fiscalização em hotéis, motéis e congêneres e, inclusive, parece oportuno o estabelecimento de medidas administrativas que resultem

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sexual comercial de crianças e adolescentes

na imposição de multas significativas, podendo resultar até mesmo na interdição de estabelecimentos nos quais fossem flagrados o uso sexual de crianças e adolescentes, sem detrimento, evidentemente, da responsabilidade penal. Todas essas ações poderão resultar numa efetiva mudança, a tão desejada mudança de comportamento social e não apenas de condutas individuais (ações, atitudes particularizadas), quando conseguirmos trabalhar e estruturar uma política integralizadora do valor máximo da dignidade do ser humano, matéria inclusive referendada na Carta Magna: Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático e tem como fundamentos: [...]

III – a dignidade da pessoa humana;

Já a Convenção sobre os Direitos da Criança, adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 20 de novembro de 1989, da qual o Brasil é um dos signatários, determina:

Art. 34. Os Estados-Parte se comprometem a proteger a criança contra todas as formas de exploração e abuso sexual. Nesse sentido, os Estado-partes tomarão, em especial, todas as medidas de caráter nacional, bilateral e multilateral que sejam necessárias para impedir: a) o incentivo ou a coação para que uma criança se dedique a qualquer atividade sexual ilegal; b) a exploração da criança na prostituição ou outras práticas sexuais ilegais;

c) a exploração da criança em espetáculos ou materiais pornográficos.

Tal dispositivo, portanto, assegura à criança e ao adolescente a proteção contra a exploração sexual e o abuso, incluído a prostituição e o envolvimento em pornografia.

Aspecto relevante que diz respeito à Convenção sobre os Direitos da Criança é a Constituição de um Comitê para os Direitos da Criança – artigo 43 –, com o objetivo de examinar os progressos realizados no cumprimento das obrigações contraídas pelos Estados-parte.

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira Sobre este tema é oportuno destacar que a Assembléia das Nações Unidas, em 25 de maio de 2000, adotou o Protocolo Facultativo para a Convenção sobre os Direitos da Criança, no tocante à venda, prostituição e pornografia infantis. Face às dez primeiras ratificações, o Protocolo passou a ter validade jurídica, desde o dia 18 de janeiro de 2002. O governo brasileiro depositou o instrumento de ratificação na Secretaria-Geral da ONU em 27 de janeiro de 2004, entrando em vigor no Brasil em 27 de fevereiro de 2004. O artigo 2º do referido Protocolo especifica:

a) Venda de crianças significa qualquer ato ou transação pela qual uma criança seja transferida por qualquer pessoa ou grupo de pessoas para outra pessoa ou grupo mediante remuneração ou qualquer outra retribuição; b) Prostituição infantil significa a utilização em atividades sexuais mediante remuneração ou qualquer outra retribuição;

c) Pornografia infantil significa qualquer representação, por qualquer meio, de uma criança no desempenho de atividades sexuais explícitas reais ou simuladas ou qualquer representação dos órgãos sexuais de uma criança para fins predominantemente sexuais.

O Protocolo tem também a preocupação em assegurar os direitos e interesses das crianças vítimas em todas as fases do processo penal, adaptando os procedimentos às suas necessidades especiais, bem como deverão ser proporcionados a essas crianças serviços de apoio adequados no decorrer de todo o processo judicial, garantindo-se a formação, em particular nas áreas do direito e da psicologia, das pessoas que trabalham com as crianças vítimas. Cada Estado-parte deverá apresentar ao Comitê dos Direitos da Criança, no prazo de dois anos após a entrada em vigor do Protocolo em causa, um relatório que contenha informações detalhadas sobre as medidas adotadas para tornar efetivas as disposições do Protocolo.

Em função disto, faz-se necessário todo um movimento, seja normativo, seja em termos de mudanças sociopolítico culturais por meio de políticas públicas, programas, campanhas que tenham como fim principal romper com o mórbido e intolerável ciclo de violência, nas suas mais variadas formas, e, portanto, em condições de opor-se de forma real à barbárie da violação sexual.

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sexual comercial de crianças e adolescentes

A Constituição Federal do Brasil de 1988 determinou que a “lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente” (art. 227, § 4o, CF). No que se refere à exploração sexual comercial de crianças e adolescentes, infelizmente, o Brasil, a Argentina e o Uruguai ainda retratam um quadro de negligência, de descaso, o que descortina que a Doutrina da Proteção Integral ainda não foi efetivamente incorporada às práticas, em especial, ainda não foi incorporada como políticas de Estado. É oportuno ressaltar que os maus-tratos físicos, emocionais, o abuso sexual, a exploração sexual, a pedofilia e outras modalidades penais devem claramente ser vistos como crimes que aviltam o ser humano em seu processo de formação.

Destacamos que desde o início dos anos de 1990, profissionais ligados à área da saúde mental compreendiam que uma criança violada, ao apresentar dificuldades emocionais e sociais, estas ocorriam face ao desenvolvimento de mecanismos de defesa intrapsíquicos, que resultariam no fracasso desse indivíduo na fase adulta ou como paralisadores do desenvolvimento psicossocial, que manteriam a vítima aprisionada à condição de criança ferida. No entanto, as mais modernas investigações (realizadas no McLean Hospital em Belmont, Massachusetts e na Havard Medical School) estão a delinear um quadro ainda mais grave: uma vez que as violações em crianças ocorrem num período formativo crítico, no qual o cérebro – enquanto estrutura física – está se moldando pela experiência cotidiana, o estresse produzido pela violência, o seu impacto, pode provocar uma marca em sua estrutura e função. Segundo Teicher, “tais abusos, parece, induzem a uma cascata de efeitos moleculares e neurobiológicos, que alteram de modo irreversível o desenvolvimento neuronal”1. Portanto, todas as modalidades de violência 1

TEICHER, Martin H. Feridas que não cicatrizam: a neurobiologia do abuso infantil. Scientific American Brasil, junho de 2002, p. 84. Acrescenta o autor: “A sociedade colhe o que planta na maneira como cuida de seus filhos. O estresse esculpe o cérebro para exibir variados comportamentos antissociais, embora adaptativos. Se vem em forma de trauma físico, emocional ou sexual, ou por meio de exposição a guerras, fome ou pestilência, o estresse pode desencadear uma onda de mudanças hormonais que liga permanentemente o cérebro de uma criança para lidar com um mundo cruel. Por meio dessa cadeia de eventos, a violência e o abuso passam de geração em geração, tanto quanto de uma sociedade para a seguinte. A dura conclusão a que chegamos é que temos a necessidade de fazer muito mais para assegurar que o abuso infantil nem venha a ocorrer, porque uma vez que essas alterações-chave ocorram no cérebro, pode não existir um caminho de volta.” (p. 89) Disponível em: . Acesso em: 30 mar. 2015.

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira praticadas contra a criança não são simplesmente tratáveis pela terapia, com uma reprogramação, ou que pudessem ser superados com exortações muito conhecidas como “esqueça”, pois já passou ou “supere”, a questão é muito mais complexa, uma vez que a violação provocou alterações físicas no cérebro, e até o momento ainda não foi descoberto uma possibilidade/ mecanismo capaz de reverter tal alteração. Estas descobertas científicas provocam em todos nós o desejo real de construirmos vidas que não fossem marcadas pelos mais variados tipos de violações. A compreensão de humanidade passa pela compreensão da infância. Não é possível concebermos o ser humano em sua completude se nele foi ausente, negada ou violada a criança. Enfim, gostaria de finalizar o prefácio desta instigante obra com as palavras de Zilda Arns:

Como os pássaros, que cuidam de seus filhos ao fazer um ninho no alto das árvores e nas montanhas, longe de predadores, ameaças e perigos, e mais perto de Deus, deveríamos cuidar de nossos filhos como um bem sagrado, promover o respeito a seus direitos e protegê-los. (Zilda Arns, 12 jan. 2010)2 Profa. Josiane Rose Petry Veronese Professora Titular da disciplina Direito da Criança e do Adolescente, da Universidade Federal de Santa Catarina, na graduação e nos Programas de Mestrado e Doutorado em Direito. Mestre e Doutora em Direito. Pós-doutora em Serviço Social pela PUC/RS. Coordenadora do Curso de Direito do Centro de Ciências Jurídicas da UFSC. Coordenadora do NEJUSCA – Núcleo de Estudos Jurídicos e Sociais da Criança e do Adolescente e subcoordenadora do Núcleo de Pesquisa Direito e Fraternidade.



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Trecho do seu último discurso junto ao povo do Haiti, em 12 janeiro de 2010, momentos antes de sua morte, ocasionada por um terremoto que atingiu aquele país. (BRASIL. Em último discurso, Zilda Arns defendeu proteção à infância. Disponível em: Acesso em: 2 abr. 2015)

APRESENTAÇÃO

Esta notável obra analisa o desenvolvimento das políticas públicas de enfrentamento da exploração sexual comercial em regiões de fronteira no estado do Rio Grande do Sul – Brasil e contextualiza a proteção jurídica aos direitos de crianças e adolescentes na Argentina, no Brasil e no Uruguai, assim como no âmbito da Organização das Nações Unidas e da Organização Internacional do Trabalho. A exploração sexual comercial é uma das piores formas de trabalho infantil disciplinadas na Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho e proíbe que crianças e adolescentes sejam explorados em atividades sexuais comerciais ou em qualquer atividade que vise à satisfação sexual de outra pessoa mediante uma contraprestação, financeira ou em outros tipos de oferta.

O direito internacional dos direitos humanos tem sua fonte fundamental nas Convenções da Organização das Nações Unidas e de seus organismos especializados tal como a Organização Internacional do Trabalho, que influenciou os Estados da Argentina, do Brasil e do Uruguai a concretizarem a proteção jurídica dos direitos da criança e do adolescente, efetivando-se a universalidade destes como sujeitos de direito, assim como possibilitando uma proteção nacional contra o trabalho infantil.

A consolidação da proteção jurídica a crianças e adolescentes necessita do desenvolvimento correspondente de políticas públicas intersetoriais para a garantia da diversidade de direitos de forma universal, mediante a atuação de atores

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira políticos no âmbito de cada um dos países, articuladas internamente, e no âmbito internacional, articulada entre os países da região estudada.

O livro utiliza a teoria da proteção integral como marco teórico necessário para enfrentar a complexidade do tema exploração sexual comercial, sob a ótima da atuação em rede e de forma articulada por parte dos executores das políticas públicas de atendimento e de proteção, nacional e internacional, para que assim se garantam melhores estratégias de prevenção e a erradicação deste fenômeno que afeta as sociedades contemporâneas. Ismael Francisco de Souza Doutorando em Direito – PPGD/UNISC

Professor de Direito da Criança e do Adolescente – UNESC Pesquisador do Núcleo de Estudos em Estado, Política e Direito – NUPED/UNESC

LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Tipo de violência sexual...................................................................62 Tabela 2: O perfil de agressor..........................................................................63 Tabela 3: Tipo de violência..............................................................................64 Tabela 4: Crianças e adolescentes retirados de pontos vulneráveis à exploração sexual comercial em rodovias brasileiras.................................101 Tabela 5: Percentual de companheira de caminhoneiros em atividades sexuais..........................................................................................103 Tabela 6: Percentual de caminhoneiros entrevistados que admitiram já ter saído com crianças e adolescentes/valor pago....................................104 Tabela 7: Disponibilidade do sexo na estrada – Índices de respostas “SIM” ...........................................................................105 Tabela 8: A frequência à escola da porcentagem mais pobre/mais rica da população brasileira.......................................................125 Tabela 9: Acesso à educação no Brasil..........................................................127 Tabela 10: Taxa de abandono/aprovação escolar.........................................129 Tabela 11: Rendimentos médios no Brasil – faixa etária entre 18 e 29 anos – por escolaridade.......................................................130 Tabela 12: O trabalho infantil no Brasil.........................................................136

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO..................................................................................................19 Capítulo 1 A PROTEÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL CONTRA A EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL..................................................................................................... 21 Capítulo 2 A PROTEÇÃO JURÍDICA CONTRA A EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL NO BRASIl....................................................................................................... 37 Capítulo 3 A PROTEÇÃO JURÍDICA CONTRA A EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL NA ARGENTINA..............................................................................................49 Capítulo 4 A PROTEÇÃO JURÍDICA CONTRA A EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL NO URUGUAI..................................................................................................55 Capítulo 5 EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL: DO CONTEXTO À INTEGRAÇÃO DOS CONCEITOS FUNDAMENTAIS NO BRASIL, ARGENTINA E URUGUAI.........61 Capítulo 6 AS CAUSAS DA EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL....................................75

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Capítulo 7 AS CONSEQUÊNCIAS DA EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL....................87 Capítulo 8 O CONTEXTO DA EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL NAS REGIÕES DE FRONTEIRA..................................................................................................... 97 Capítulo 9 FUNDAMENTOS PARA A COMPREENSÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS...............107 Capítulo 10 AS POLÍTICAS PÚBLICAS BRASILEIRAS DE ENFRENTAMENTO À EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL............................................................115 Capítulo 11 AS POLÍTICAS PÚBLICAS ARGENTINAS DE ENFRENTAMENTO À EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL............................................................139 Capítulo 12 AS POLÍTICAS PÚBLICAS URUGUAIAS DE ENFRENTAMENTO À EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL............................................................145 Capítulo 13 A ARTICULAÇÃO, OS AVANÇOS E OS DESAFIOS DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE ENFRENTAMENTO À EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL NAS REGIÕES DE FRONTEIRA.....................................................................149 REFLEXÕES CONCLUSIVAS.............................................................................155 REFERÊNCIAS.................................................................................................157

INTRODUÇÃO

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ste livro oferece reflexões contemporâneas sobre os diversos aspectos da exploração sexual comercial que afeta crianças e adolescentes, em especial no Brasil, Argentina e Uruguai. Sua construção ocorreu a partir da colaboração entre os autores no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade de Santa Cruz do Sul e do Grupo de Estudos em Direitos Humanos da Criança e do Adolescente. O trabalho infantil é um problema complexo presente na realidade de crianças e adolescentes, em especial nos países periféricos como os integrantes da América Latina. Dada a impossibilidade, temporal e espacial, para uma análise contextual e comparativa entre os diversos países, optou-se por dar luz a realidades presentes no Brasil, na Argentina e no Uruguai, com especial atenção às regiões de fronteira.

Após a instituição da Convenção sobre os Direitos da Criança da Organização das Nações Unidas e das Convenções 138 – sobre a idade mínima de admissão ao emprego – e 182 – sobre as piores formas de trabalho infantil e ação imediata para sua eliminação –, Brasil, Argentina e Uruguai vêm se adequando à proteção jurídica disciplinada em âmbito internacional, de modo que as ratificassem e assumissem o compromisso de cumprimento. As convenções internacionais influenciaram os países a legislar sobre a proteção de direitos de criança e de adolescentes, possibilitando a instituição da teoria da proteção integral no ordenamento jurídico interno de cada Estado.

O contexto da exploração sexual comercial demonstra índices consideráveis de incidência de casos de exploração sexual comercial devido a uma diversidade de causas que ocasionam os mais diversos prejuízos para o desenvolvimento integral de crianças e adolescentes. Nas regiões de fronteira internacional, onde existem cidades que são separadas por um

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira marco divisório imaginário, o problema é ainda maior, pois há uma característica peculiar que dificulta o seu enfrentamento, qual seja, o fato de haver o constante deslocamento de pessoas de várias nacionalidades entre as cidades, dificultando a atuação das políticas públicas. As políticas públicas de atendimento e de proteção à infância são importantes ferramentas na execução do sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente, visando à garantia de direitos e à proteção à infância. Para o enfrentamento da exploração sexual comercial, é de extrema importância a execução, a implementação, o desenvolvimento, o aperfeiçoamento, a intersetorialidade para a articulação e a concretização das políticas públicas.

Por fim, resta dizer que esta obra não tem a pretensão de completude ou de esgotamento do tema proposto, mas, acima de tudo, instigar e fomentar reflexões sobre esta importante realidade na qual convivem crianças e adolescentes no contexto das regiões latino-americanas.

Capítulo 1 A PROTEÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL CONTRA A EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL

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exploração sexual comercial como fenômeno complexo e multifacetário, presente na sociedade contemporânea, está intrinsecamente ligada às várias formas de organização econômico-capitalista e no contexto de uma realidade social profundamente excludente e injusta.

Assim, o desenvolvimento de políticas públicas de inclusão social é uma necessidade para a garantia de liberdade como forma de desenvolvimento humano e social. Para haver liberdade, deve-se possibilitar o acesso às mais diversas liberdades (políticas, civis, econômicas, oportunidades sociais, possibilidade de segurança, garantia de transparência) como a única forma para promover as condições necessárias ao desenvolvimento humano infantil, desvinculando a estrita relação que se fazia do desenvolvimento com a economia e a riqueza, que utiliza análises decorrentes do Produto Interno Bruto (PIB) para defender que está havendo desenvolvimento em um Estado.

Para a ocorrência do desenvolvimento, é necessária a remoção das principais fontes de privação de liberdade, entre elas “pobreza e tirania, carência de oportunidades econômicas e destituição social sistemática, negligência dos serviços públicos e intolerância ou interferência excessiva de Estados repressivos” (SEN, 2000, p. 18), possibilitando o acesso à participação na política, à educação básica, à assistência médica e ao mercado. O acesso a um tipo de liberdade poderá contribuir para o acesso aos outros tipos, havendo uma inter-relação entre elas (SEN, 2000, p. 17-55).

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira A liberdade é fator fundamental para o desenvolvimento, sendo que crianças e adolescentes que são exploradas sexualmente de forma comercial se encontram privados de se desenvolver como seres humanos em decorrência da exploração capitalista globalizada que intervém na sua liberdade e na sua dignidade sexual.

O atual modelo de globalização influencia uma universalidade de países, levando as consequências do hiperconsumismo e da mercantilização de pessoas a uma diversidade de comunidades. Portanto, a globalização garante os interesses econômicos em âmbito mundial, porém nada contribui para a efetivação de direitos humanos de maneira universal. Outra forma de globalização seria necessária para influenciar os direitos humanos em âmbito mundial, invertendo a lógica do capitalismo de maneira que se colocassem os seres humanos e seus direitos acima dos interesses econômicos (SANTOS, 2001).

Uma outra globalização supõe uma mudança radical das condições atuais, de modo que a centralidade de todas as ações seja localizada no homem. Sem dúvida, essa desejada mudança apenas ocorrerá no fim do processo, durante o qual reajustamentos sucessivos se imporão. (SANTOS, 2001, p. 147)

Essa mudança começaria pela atitude mais solidária, proporcionando um interesse social superior e uma mudança dos atuais modelos. Deveria haver preocupação maior com a condição de humanidade e a diminuição da importância da economia global, pois esta, “todavia, tem trazido como consequência para todos os países uma baixa de qualidade de vida para a maioria da população e a ampliação do número de pobres em todos os continentes” (SANTOS, 2001, p. 147-148). Santos (2001) busca um novo modelo, no qual o ser humano recupere sua importância e centralidade na economia global, aumentando a qualidade de vida e diminuindo a exclusão e a discriminação.

No entanto, o que se verifica atualmente é um aumento desenfreado dos interesses econômicos, o que vem gerando diversos prejuízos aos direitos humanos em âmbito mundial, evidenciando a exploração econômica das liberdades pessoais de adultos, de crianças e de adolescentes.

Para o enfrentamento dos problemas de exploração sexual comercial consequentes da globalização capitalista que prejudica direitos humanos de crianças e adolescentes, de suma importância é o desenvolvimento de

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

políticas públicas de garantia à universalidade de direitos e proteção durante a infância, bem como de políticas públicas de enfrentamento à exploração sexual comercial.

Além disso, compromissos internacionais influenciaram Brasil, Argentina e Uruguai a buscarem dispositivos que protegessem as crianças e os adolescentes contra o trabalho infantil, garantindo estratégias de efetivação de direitos humanos. Pode-se afirmar que diversos direitos humanos são desrespeitados com a ocorrência da exploração sexual comercial, e por consequência do trabalho infantil. No entanto, o discurso em relação aos direitos humanos encontra-se distante de sua concretização universal e efetiva, produzindo o distanciamento entre o desejado e o existente, entre a teoria e a prática, o que proporciona a construção de uma cultura política da desesperança. A violação de direitos humanos nos países democráticos do ocidente é cotidiana e muitas vezes sequer chegam ao sistema de justiça estando distante de qualquer possibilidade de reparação ou proteção.

Além disso, são escassas as formas e os mecanismos de garantia de direitos. Os direitos humanos possuem sistemas protetivos na esfera pública, melhores que na esfera privada, no entanto, devido ao “hecho de que en América Latina, los Estados son estructuralmente corruptos y patrimonialistas, los índices de violación y vulneración se multiplican” (RUBIO, 2009, p. 11-14). Dessa forma, vige, culturalmente, uma crise de efetividade na proteção dos direitos humanos de crianças e adolescentes. A cultura de conformismo e exclusão político-social reforçam as violências que se impõem sobre crianças e adolescentes, restando medidas de mera ação reparatória simbólica, consolidando “una cultura simplista, deficiente, insuficiente y estrecha de derechos humanos” (RUBIO, 2009, p. 15). Assim, a cultura em relação aos direitos humanos deve mudar: No se trata sólo de incrementar una conciencia y una cultura jurídica de protección, sino, además, potenciar una cultura de derechos humanos en general, integral, porque, en realidad, somos todos los seres humanos ahí donde nos movemos quienes, utilizando o no utilizando la vía jurídica, participamos en los procesos de construcción de derechos humanos, seamos o no seamos juristas. (RUBIO, 2009, p. 16)

Assim, para que aumente a efetividade das normas jurídicas que tratam de direitos humanos, um dos passos fundamentais é a mudança da

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira atual cultura, mediante maior reconhecimento e legitimidade das normas jurídicas por parte da sociedade por meio de políticas públicas destinadas à infância.

Observa-se que diversos Estados possuem propostas interessantes de proteção de direitos humanos em suas normas fundamentais, de acordo com os dispositivos internacionais; entretanto, estas nem sempre possuem a efetividade desejada, pois os mecanismos são fragmentados e de difícil implementação. Daí a importância da participação com o reconhecimento e a valorização da condição subjetiva dos atores envolvidos, para que […] los derechos humanos entendidos desde una perspectiva emancipadora y que pretende contribuir al incremento de niveles de emancipación, podrían concebirse como el conjunto de prácticas sociales, simbólicas, culturales e institucionales que reaccionan contra los excesos de cualquier tipo de poder y en donde se impiden a los seres humanos constituirse como sujetos. Cada vez que en cualquier contexto cultural se articulen e institucionalicen determinadas reivindicaciones sociales y aparezcan distintos procesos de lucha con particulares concepciones acerca de lo que es digno, teniendo en cuenta las condiciones que posibilitan la existencia de los sujetos participantes y afectados, se están cimentando las bases para establecer ámbitos de juntura con los que contribuir en la construcción dinámica, conflictiva y constante de una universalidad extensa y para todos, sin excepciones. (RUBIO, 2009, p. 31)

A garantia de direitos humanos, não tão somente o caminho em busca das condições essenciais de emancipação humana, é também uma forma de proteção contra os excessos de poder. Em consequência, a articulação de políticas públicas institucionais de um sistema de garantias de direitos humanos destinados a crianças e adolescentes possibilita o enfrentamento de todas as formas de violência e de exploração durante a infância, assegurando condições de desenvolvimento integral. Por estas e outras razões, a Organização das Nações Unidas e a Organização Internacional do Trabalho têm importante papel na proteção dos direitos humanos, em especial de crianças e adolescentes. Por meio de seus tratados, essas organizações influenciaram os seus Estados-membros a tomarem medidas em busca da garantia de direitos fundamentais nos seus sistemas normativos internos, nos quais crianças e adolescentes, pela sua condição, recebem atenção especializada e integral.

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

Um dos primeiros passos para a garantia dos direitos das crianças e dos adolescentes foi a instituição pela Organização das Nações Unidas, em 20 de novembro 1989, mediante sua Assembleia Geral, da Convenção sobre os Direitos das Crianças, que se encontra em vigor até os dias atuais. A Convenção foi ratificada pelo Brasil, por meio do Decreto 99.710, de 21 de novembro de 1990, pelo Uruguai, por meio da Lei 16.137, de 28 de setembro de 1990, e pela Argentina, por meio da Lei 23.849, de 27 de setembro de 1990. A convenção inicia um movimento internacional de proteção aos direitos de crianças e adolescentes no mundo, direitos estes que foram incorporados às legislações nacionais. A Convenção Internacional dos Direitos da Criança foi precedida por outros tratados internacionais que abordaram direitos humanos para a infância, ainda que indiretamente, como a Declaração de Genebra, a Declaração Universal dos Direitos das Crianças, o Pacto de São José da Costa Rica, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, entre outros. Porém, destas, foi a Convenção de 1989 que mais influenciou os países em buscar uma efetiva proteção às crianças e aos adolescentes e as garantias fundamentais ao seu pleno desenvolvimento. A Convenção sobre Direitos da Criança dispõe que se deve garantir a toda criança – considerada todas as pessoas com até dezoito anos de idade – os direitos humanos inerentes a qualquer pessoa, assim como serem asseguradas as plenas condições para a garantia de pleno desenvolvimento físico, mental, intelectual, cultural e social. É, portanto, a base teórica fundamental para instituir a teoria da proteção integral nos sistemas normativos internos dos países. E, sem dúvida, é o mais importante marco normativo de referência para o reordenamento de políticas públicas em países como o Brasil, a Argentina e o Uruguai (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1989). No Brasil, a teoria da proteção integral encontrou na atual Constituição Federal um novo paradigma ao ser incorporada no Direito da Criança e do Adolescente em substituição a conceitos teóricos que foram desenvolvidos no decorrer da história nacional. A teoria jurídica da proteção integral foi alicerçada por uma base democrática, tendo se desenvolvido juntamente aos processos de redemocratização da década de 1980 a partir da iniciativa e ação dos movimentos sociais.

Embora a Organização das Nações Unidas utilize como termo de referência a ideia de “doutrina”, entende-se no Brasil que existem diversos aspectos que permitem a utilização da terminologia “teoria da proteção in-

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira tegral”, superando mera concepção doutrinária. A teoria da proteção integral institui um conjunto de direitos fundamentais, bem como um sistema de princípios e de regras, gerando novo modelo jurídico-protetivo interdisciplinar. Portanto, a teoria da proteção integral instituiu a universalidade de crianças e adolescentes como sujeito titular de uma multiplicidade de direitos, que deverão ser efetivados pela família, pelo Estado e pela comunidade, sempre em busca da garantia do interesse superior da criança ou do adolescente de forma prioritária (CUSTÓDIO, 2008, p. 23-43).

Devido à importância do tema, a proteção dos direitos humanos das crianças e dos adolescentes tomou caráter universal, pois, na maioria dos países do mundo, as condições de vida são excepcionalmente difíceis. A mobilização da comunidade internacional é de suma importância para a garantia de melhores condições de vida para crianças e adolescentes do mundo inteiro; por este motivo, os organismos internacionais vêm dando destacada importância para tal tema. Na convenção em tese, ficou estabelecido, conforme artigo 2º, no mesmo sentido da Declaração Universal dos Direitos Humanos e dos pactos internacionais sobre direitos humanos, que toda pessoa possui direitos e liberdades inseridos nos pactos internacionais: [...] sem distinção de qualquer natureza, seja de raça, cor, sexo, idioma, crença, opinião política ou de outra índole, origem nacional ou social, posição econômica, nascimento ou qualquer outra condição. (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1989)

É de se destacar que o conceito de criança no âmbito do Direito Internacional dos Direitos Humanos refere-se a toda pessoa com até dezoito anos de idade, garantindo-se assim proteção especial e ideais condições para que possam crescer no seio da família, em ambiente que traga “felicidade, amor e compreensão”, apoio para o desenvolvimento educacional, conforme os princípios disciplinados na Carta das Nações Unidas, mormente no que tange ao “espírito de paz, dignidade, tolerância, liberdade, igualdade e solidariedade” (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1989). A Convenção, além de garantir os direitos básicos para o desenvolvimento integral de crianças e adolescente, também tomou o cuidado de estabelecer compromissos visando impedir que não ocorram, entre outras violências, as consequências decorrentes do trabalho infantil.

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sexual comercial de crianças e adolescentes

Assim, os direitos humanos essenciais foram preservados na convenção, entre os quais se destaca a garantia ao direito à vida, à igualdade, à liberdade, à saúde física e mental, à segurança, ao desenvolvimento, à proteção contra a transferência ilegal para o exterior, à honra e à reputação, ao acesso à informação, ao bem-estar moral, social e espiritual, ao descanso e ao lazer, à participação da vida cultural e artística, à educação, à proteção contra todas as formas de violência física ou mental, bem como todas as formas de exploração econômica e sexual, ao tratamento prioritário da criança ou do adolescente com deficiência física (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1989). A proteção contra a exploração, o abuso sexual e a exploração sexual comercial também foi protegida pela Convenção sobre Direitos das Crianças, conforme disposto no artigo 34, que trata do compromisso dos Estados-partes que ratificarem a Convenção, em proteger as crianças e adolescentes contra qualquer forma de exploração e abuso sexual:

Art. 34. Os Estados-partes se comprometem-se a proteger a criança contra todas as formas de exploração e abuso sexual. Nesse sentido, os Estados-partes tomarão, em especial, todas as medidas de caráter nacional, bilateral e multilateral que sejam necessárias para impedir: a) o incentivo ou a coação para que uma criança se dedique a qualquer atividade sexual ilegal; b) a exploração da criança na prostituição ou outras práticas sexuais ilegais;

c) a exploração da criança em espetáculos ou materiais pornográficos. (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1989)

Cabe aos Estados signatários da Convenção, ainda, adotar todas as medidas para recuperação física e psicológica, assim como a reintegração social de crianças e adolescentes vítimas de qualquer forma de exploração ou abuso de natureza sexual (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1989). O artigo 19 dispõe que os Estados-parte deverão tomar medidas, nelas incluídas as administrativas, sociais, legislativas e educacionais, com a finalidade de proteger as crianças e adolescentes contra todas as formas de violência física ou mental, inclusive sexual: Art. 19. 1. Os Estados-partes adotarão todas as medidas legislativas, administrativas, sociais e educacionais apropriadas para pro-

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira teger a criança contra todas as formas de violência física ou mental, abuso ou tratamento negligente, maus tratos ou exploração, inclusive abuso sexual, enquanto a criança estiver sob a custódia dos pais, do representante legal ou de qualquer outra pessoa responsável por ela. 2. Essas medidas de proteção deveriam incluir, conforme apropriado, procedimentos eficazes para a elaboração de programas sociais capazes de proporcionar uma assistência adequada à criança e às pessoas encarregadas de seu cuidado, bem como para outras formas de prevenção, para a identificação, notificação, transferência a uma instituição, investigação, tratamento e acompanhamento posterior dos casos acima mencionados de maus tratos à criança e, conforme o caso, para a intervenção judiciária. (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1989)

O artigo 9º descreve que “Os Estados-partes deverão zelar para que a criança não seja separada dos pais contra a vontade dos mesmos […]”, exceto nos casos em que seja necessário para garantir os interesses maiores da criança ou do adolescente; são casos excepcionais que devem ser tratados com prioridade. O artigo 11 trata das medidas a serem adotadas pelos Estado-partes a fim de lutarem contra a transferência ilegal de crianças e de adolescentes para o exterior (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1989). A Organização das Nações Unidas estabeleceu medidas que devem ser tomadas para preservar os direitos afetados com a exploração sexual comercial, garantindo, ainda, a proteção jurídica do direito à saúde, à assistência social e à educação.

O direito à educação para crianças e adolescentes é protegido juridicamente de uma forma específica pela Convenção sobre os Direitos da Criança, devendo ser assegurado em condições de igualdade e no sentido de garantir a dignidade humana. Com a ratificação da Convenção, os Estados se comprometeram a assegurar o direito à educação no âmbito interno de cada país, como dispõe o artigo 28, assumindo compromissos em:

a) tornar o ensino primário obrigatório e disponível gratuitamente para todos; b) estimular o desenvolvimento do ensino secundário em suas diferentes formas, inclusive o ensino geral e profissionalizante, tornando-o disponível e acessível a todas as crianças […]; c) tornar o ensino superior acessível a todos com base na capacidade e por todos os meios adequados; d) tornar a informação e a orienta-

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sexual comercial de crianças e adolescentes

ção educacionais e profissionais disponíveis e acessíveis a todas as crianças; e) adotar medidas para estimular a frequência regular às escolas e a redução do índice de evasão escolar. (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1989)

O compromisso, portanto, é de se assegurar o acesso à educação de forma universal em todos os níveis de ensino e a possibilidade de continuidade do desenvolvimento educacional. O artigo 29 também prevê a educação orientada no sentido de permitir o desenvolvimento das “aptidões e a capacidade mental e física da criança em todo o seu potencial” (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1989).

Já o direito à saúde foi assegurado no artigo 24 da Convenção sobre Direitos da Criança, sendo disposto que os Estados-parte deverão reconhecer o direito universal de crianças e adolescentes usufruírem o melhor serviço possível para a recuperação de saúde e o tratamento de doenças, de modo que nenhuma criança seja privada dos serviços sanitários, sendo adotadas “as medidas eficazes e adequadas para abolir práticas tradicionais que sejam prejudicais à saúde da criança” (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1990). O artigo 39 da Convenção reconheceu a necessidade de se adotarem medidas de proteção à saúde e à assistência social, visando à recuperação de crianças vítimas de exploração ou violência sexual e para “estimular a recuperação física e psicológica e a reintegração social de toda criança vítima de qualquer forma de abandono, exploração ou abuso” (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1990).

Além das medidas promovidas pela Convenção dos Direitos da Criança, acrescentam-se outras estabelecidas historicamente pela Organização Internacional do Trabalho por meio das suas convenções e recomendações que propõem compromissos aos países-membros no sentido de assegurarem os direitos de crianças e adolescentes vítimas da exploração do trabalho infantil, no qual se insere a proteção contra a exploração sexual comercial.

A adoção da Convenção 138, aprovada pela Organização Internacional do Trabalho em 1973, é um marco fundamental ao estabelecer o compromisso com uma idade mínima geral de admissão ao trabalho iniciando o compromisso estratégico com ações para a prevenção e a erradicação do trabalho infantil no mundo. Além das medidas preconizadas na Convenção, a OIT estabeleceu outras medidas, que ao longo do tempo devem ser in-

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira corporadas às legislações nacionais, por meio da Recomendação 146 (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 1973). A Convenção 138 é considerada um dos tratados de direitos fundamentais da Organização Internacional do Trabalho e vem alcançando significativo número de países que a ratificaram. Embora nas Américas alguns países, como Suriname, México, Estados Unidos, entre outros ainda não tenham realizado a devida ratificação, há um movimento crescente de adesão como se pode notar em relação aos países do Mercosul, pois todos já ratificaram a Convenção, considerada o primeiro passo em busca da erradicação do trabalho infantil e objetivo comum dos Países-membros da Organização Internacional do Trabalho (OIT). A referida Convenção foi ratificada pela Argentina, no dia 11 de novembro de 1996, pelo Brasil, no dia 28 de junho de 2001, e pelo Uruguai, no dia 2 de junho de 1977 (PROGRAMA PARA ERRADICACIÓN DEL TRABAJO INFANTIL – IPEC, 2013).

A Convenção sobre idade mínima para o trabalho, composta de 18 artigos, tem por finalidade garantir que os países-membros estabeleçam políticas nacionais de prevenção e erradicação do trabalho e elevar progressivamente a idade mínima de admissão ao trabalho, até que seja possível o mais completo desenvolvimento físico e mental de crianças e adolescentes. A idade mínima estabelecida na Convenção não pode ser anterior àquela quando cessa a obrigação escolar, ou, em todo caso, quinze anos, podendo, excepcionalmente, baixar para catorze anos, nos casos em que os países-membros não estejam com a economia e os meios de educação suficientemente desenvolvidos, e desde que com a prévia consulta às organizações de empregadores e trabalhadores (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 1973). Quando o trabalho passa a ser perigoso para a saúde, para a segurança ou para a moralidade de crianças e adolescentes, a idade para começar a trabalhar não deverá ser inferior a dezoito anos, podendo, em caráter excepcional, ser autorizado o trabalho a partir da idade de dezesseis anos, o que não é aconselhável, principalmente sem que fiquem plenamente garantidas a saúde, a segurança e a moralidade dos adolescentes. Tal exceção jamais deverá ser utilizada no caso das “piores formas de trabalho infantil”, entre elas a exploração sexual comercial, pois são atividades que prejudicam, comprovadamente, a saúde, a moral e a segurança de crianças e de adolescentes (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 1973).

Há uma exceção em relação à idade de aplicação da Convenção, nos casos de quando o trabalho é efetuado por crianças e adolescentes nas es-

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sexual comercial de crianças e adolescentes

colas de ensino geral, profissional ou técnico, que preparam para o trabalho, quando se tem pelo menos catorze anos de idade. Refere-se, portanto, às possibilidades de profissionalização, que não se confunde com a prestação de trabalho, uma vez que é instituída no âmbito dos sistemas de educação. Qualquer outro tipo de trabalho, mesmo que de natureza leve, antes dos limites de idade mínima preconizados, devem ser objeto de reserva no momento de depósito do instrumento de ratificação, condição que no caso brasileiro não foi usufruída por assumir o compromisso com a proteção integral ao desenvolvimento de crianças e adolescentes e respeitar os limites de idade preconizados pelo tratado internacional. Reconhecendo a necessidade de medidas especializadas para o enfrentamento de formas específicas de trabalho infantil, a Organização Internacional do Trabalho editou a Convenção 182, que trata da proibição das piores formas de trabalho infantil e ação imediata para sua eliminação. Algumas das piores formas de trabalho foram precedidas por outros dispositivos, particularmente pela convenção sobre o trabalho forçoso de 1930. A referida convenção unifica as medidas anteriormente tomadas e vem acompanhada da Recomendação 190, com mecanismos e orientações para o aperfeiçoamento das políticas públicas de atendimento integral à criança, sendo uma esfera de ação prioritária a respeito do combate de formas complexas de trabalho infantil mediante a ação integrada e intersetorial (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 1999).

Segundo os dados do Programa Internacional para a Erradicação do Trabalho Infantil, somente Cuba não ratificou a referida convenção nas Américas, um passo importante na busca da abolição das piores formas de trabalho infantil, objetivo comum da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e do mundo. A Convenção 182, que data de 1999, foi ratificada pela Argentina, no dia 5 de fevereiro de 2001, pelo Uruguai, no dia 3 de agosto de 2001, e pelo Brasil, no dia 2 de fevereiro de 2000 (PROGRAMA PARA ERRADICACIÓN DEL TRABAJO INFANTIL – IPEC, 2013). A citada convenção internacional tem como objetivo a eliminação efetiva das piores formas de trabalho infantil, por meio de uma ação imediata e geral dos países que a ratificaram, tendo em conta a importância da educação básica gratuita e da necessidade de se livrar de todas essas formas de trabalho, assegurando a reabilitação e a inserção social dos explorados, observando também as necessidades de suas famílias (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 1999).

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira Para efeitos da Convenção, as piores formas de trabalho estão divididas em quatro grandes modalidades, que, conforme o artigo 3º, envolve:

a) todas as formas de escravidão ou práticas análogas à escravidão, tais como a venda e tráfico de crianças, a servidão por dívidas e a condição de servo, e o trabalho forçado ou obrigatório, inclusive o recrutamento forçado ou obrigatório de crianças para serem utilizadas em conflitos armados; b) a utilização, o recrutamento ou a oferta de crianças para a prostituição, a produção de pornografia ou atuações pornográficas; c) a utilização, recrutamento ou a oferta de crianças para a realização para a realização de atividades ilícitas, em particular a produção e o tráfico de entorpecentes, tais com definidos nos tratados internacionais pertinentes; e,

d) o trabalho que, por sua natureza ou pelas condições em que é realizado, é suscetível de prejudicar a saúde, a segurança ou a moral das crianças. (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 1999)

Aqui se deve frisar que, concomitantemente com a possibilidade de exploração sexual comercial contra crianças e adolescentes, podem ocorrer casos de escravidão ou prática análoga à escravidão, conforme as disposições da alínea “b”, nos casos em que há tráfico de crianças e de servidão por dívidas, que ocorrem juntamente à exploração sexual comercial. Os países-membros devem elaborar e pôr em prática programas com a finalidade de eliminar as piores formas de trabalho infantil com a maior urgência possível, adotando quantas medidas acreditem ser necessárias, nas mais diversas áreas (penal, laboral, civil, política, entre outras), para cumprir com esse objetivo (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 1999).

A educação, também é de grande importância para a eliminação das piores formas de trabalho infantil. E esta deve ser utilizada, de acordo com o artigo 7º da convenção, com o fim de: a) impedir a ocupação de crianças nas piores formas de trabalho infantil;

b) prestar a assistência direta necessária e adequada para retirar as crianças das piores formas de trabalho infantil e assegurar sua reabilitação e inserção social;

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sexual comercial de crianças e adolescentes

c) assegurar o acesso ao ensino básico gratuito e, quando for possível e adequado, à formação profissional a todas as crianças que tenham sido retiradas das piores formas de trabalho infantil; d) identificar as crianças que estejam particularmente expostas a riscos e entrar em contato direto com elas; e,

e) levar em consideração a situação particular das meninas. (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 1999)

Então, a maior intenção do dispositivo em questão é o de garantir o pleno desenvolvimento de crianças e adolescentes, mediante políticas públicas, bem como ações governamentais, com ênfase nas políticas educacionais e socioassistenciais.

Destaca-se o caráter universal da convenção, pois defende que os países-membros devem ajudar-se na aplicação, por meio de maior cooperação e assistência internacional mútua, incluindo o apoio ao desenvolvimento social e econômico, os programas de erradicação da pobreza e a educação universal, conforme o disposto no artigo 8º, visto ser urgente e prioritário combater as piores formas de trabalho infantil (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 1999).

O Mercosul, bloco de países ao qual pertencem Brasil, Argentina e Uruguai, também se comprometeram com a erradicação do trabalho infantil. Desde o ano de 1998, os países do bloco vêm ratificando compromissos regionais para combater o trabalho infantil, que culminaram com a “Declaração Presidencial dos Países do Mercosul sobre Erradicação do Trabalho Infantil”, de 2002, compromissos que estão em consonância com as convenções da Organização Internacional do Trabalho. No ano de 2012 foi firmada pelos Presidentes do Brasil, Argentina e Uruguai a “Segunda Declaração Presidencial sobre a prevenção e erradicação do trabalho infantil no Mercosul”, na qual “os Presidentes reiteram sua rejeição ao trabalho infantil e declaram sua decisão de aprofundar as ações destinadas a uma efetiva prevenção e erradicação do trabalho infantil […]” (MERCOSUL, 2012). Considerando a notável fragilidade das regiões de fronteira e a incidência da exploração sexual comercial nos países citados, optou-se por focalizar o estudo nessas regiões como forma de compreender estratégias de articulação que possam servir de referência para a construção de políticas públicas gerais para o enfrentamento da exploração sexual comercial uma vez que essas atividades retiram as crianças e adolescentes do convívio com sua família e os deslocam pelas fronteiras para fins de exploração,

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira motivos que tornam de suma importância a atuação de forma conjunta dos países no seu enfrentamento.

Após a instituição da proteção jurídica dos direitos da criança e do adolescente e da proteção jurídica contra o trabalho infantil em âmbito internacional, por meio das Convenções da Organização das Nações Unidas e da Organização Internacional do Trabalho, e a sua posterior ratificação por Brasil, Argentina e Uruguai, foram inseridas ao ordenamento jurídico interno de cada país a proteção jurídica contra o trabalho infantil, sendo desenvolvidas políticas públicas de enfrentamento ao trabalho infantil em consonância com o ordenamento jurídico internacional para cumprir com os compromissos firmados. O desenvolvimento de políticas públicas se dará de acordo com as características de cada país, primando pelas orientações previstas nos tratados internacionais. O artigo 39 da Convenção sobre Direitos das Crianças previu a adoção de medidas para a recuperação física, psicológica e a reintegração social de vítimas da exploração sexual comercial:

Art. 39. Os Estados-parte adotarão todas as medidas apropriadas para estimular a recuperação física e psicológica e a reintegração social de toda criança vítima de qualquer forma de abandono, exploração ou abuso; tortura ou outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes; ou conflitos armados. Essa recuperação e reintegração serão efetuadas em ambiente que estimule a saúde, o respeito próprio e a dignidade da criança. (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1989)

Foi disposto no artigo 1º da Convenção 138 da Organização Internacional do Trabalho o compromisso dos países-membros em manterem efetivas políticas públicas nacionais que assegurem a erradicação do trabalho infantil em geral, incluindo a exploração sexual comercial (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 1973).

A Recomendação 146 da Organização Internacional do Trabalho dispôs sobre o tratamento prioritário que deverá ser dado pelas políticas e programas nacionais para garantir as necessidades de crianças e adolescentes, visando assegurar o desenvolvimento físico e mental durante a infância nas melhores condições possíveis, sendo que para isso é necessário o enfrentamento à exploração sexual comercial. O planejamento das políticas públicas deve ser dado com atenção especial, buscando: medidas sociais e econômicas para atenuar a pobreza; medidas de bem-estar familiar

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sexual comercial de crianças e adolescentes

sem qualquer discriminação; garantia à educação; garantia à saúde; entre outras garantias (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 1973).

A Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho declarou em seu artigo 6º que os Estados-membros deverão, de forma prioritária, mediante a elaboração e implementação de políticas públicas, agir para eliminar as piores formas de trabalho infantil, entre elas a exploração sexual comercial (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 1999). Por sua vez, a Recomendação 190 da Organização Internacional do Trabalho assevera que os objetivos das políticas públicas de enfrentamento às piores formas de trabalho infantil deveriam ser: a) identificar e denunciar as piores formas de trabalho infantil;

b) impedir a ocupação de crianças nas piores formas de trabalho infantil ou retirá-las dessas formas de trabalho, protegê-las de represálias e garantir sua reabilitação e inserção social através de medidas que atendam a suas necessidades educacionais, físicas e psicólogas; c) dispensar especial atenção; i – às crianças mais jovens; ii – às meninas;

iii – ao problema do trabalho oculto, no qual as meninas estão particularmente expostas a riscos; e, iv – a outros grupos de crianças que sejam especialmente vulneráveis ou tenham necessidades particulares;

d) identificar as comunidades nas quais as crianças estejam especialmente expostas a riscos, entrar em contato direto e trabalhar com elas, e e) informar, sensibilizar e mobilizar a opinião pública e os grupos interessados, inclusive as crianças e suas famílias. (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 1999)

Então, as organizações internacionais, que são compostas por representações de uma universalidade de países em âmbito mundial, incentivaram em suas convenções a criação de políticas públicas para o enfrentamento da exploração sexual comercial, em particular, bem como todas as formas de trabalho infantil, em geral. Assim, os Estados que são membros dessas organizações internacionais assumem o compromisso de desenvolver políticas públicas com a finalidade de erradicação do trabalho infantil tão logo ratifiquem as convenções sobre o tema como vem ocorrendo no Brasil, Argentina e Uruguai que são ótimos exemplos das estratégias de ação e, por isso, merecem atenção especial.

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Capítulo 2 A PROTEÇÃO JURÍDICA CONTRA A EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL NO BRASIL

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tualmente, o Brasil possui normas jurídicas que buscam a garantia de direitos fundamentais de crianças e de adolescentes. A partir da Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 5 de outubro de 1988, o País vem se adequando às normas internacionais de proteção da criança e do adolescente, trazendo ao ordenamento jurídico brasileiro, entre outras garantias, a proteção integral, que ordena que tanto a família quanto a sociedade e o Estado assumam o dever de garantir, com prioridade absoluta, direitos fundamentais à criança, ao adolescente e ao jovem, conforme expressa o artigo 227 da Constituição Federal:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (BRASIL, 1988)

O Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei 8.069, de 13 de julho de 1990, norma regulamentadora do texto fundamental assegurou, no caput do artigo 1º, a proteção integral da criança e do adolescente, bem como dispôs, no artigo 4º, o conteúdo e o alcance do princípio constitucional da prioridade absoluta na efetivação de direitos:

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende: a) Primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias; b) Precedência no atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública; c) Preferência na formulação e na execução de políticas sociais públicas; d) Destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude. (BRASIL, 1990)

Os dispositivos têm por escopo garantir às crianças e aos adolescentes, entre outros direitos, o direito à vida, à educação, à saúde, ao lazer, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à proteção contra qualquer forma de discriminação, violência, opressão e crueldade, direitos que são afetados com a ocorrência de trabalho infantil.

O ordenamento jurídico brasileiro trouxe responsabilidades para o Estado, para a família, para a comunidade e para a sociedade em geral na proteção de direitos da criança e do adolescente, mediante uma tríplice responsabilidade compartilhada. É papel das famílias garantir a integralidade de direitos para o desenvolvimento integral de crianças e adolescentes. O Estado tem o dever de agir sempre que algum direito for ofendido, protegendo os direitos da criança ou do adolescente, e deve possibilitar o acesso a direitos sociais, proporcionando o atendimento integral de crianças e adolescentes e de suas famílias, por meio de políticas públicas. Já a sociedade e a comunidade devem atuar na preservação das condições essenciais ao desenvolvimento de crianças e adolescentes e no desenvolvimento e garantir a construção de políticas públicas. O Direito da Criança e do Adolescente, como ramo jurídico autônomo no sistema normativo brasileiro, foi profundamente influenciado pela Convenção sobre os Direitos da Criança, abarcando princípios e conceitos, e proporcionando maior proteção. Neste contexto, “o Estatuto da Criança e do Adolescente foi criado em atenção às regras e aos modernos princípios expedidos pelos diversos pactos internacionais relativos à defesa das crianças e dos adolescentes” (SOUZA, 2008b, p. 21).

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sexual comercial de crianças e adolescentes

O Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu artigo 2º, definiu que: “Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade” (BRASIL, 1990). O Estatuto da Criança e do Adolescente disciplinou a proteção aos direitos que são afetados com a exploração sexual comercial, mediante a instituição de políticas públicas. Para que medida de tal abrangência fosse possível, foram assegurados direitos fundamentais mediante proteção jurídica ampla de acordo com as necessidades particulares de desenvolvimento de crianças e adolescentes, tais como o direito à saúde, à assistência social, à educação, ao lazer e à cultura, dentre outros. O Estatuto da Criança e do Adolescente previu que a proteção jurídica para o desenvolvimento da política de atendimento será realizado por entidades governamentais (da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios) e não governamentais, conforme o disposto no artigo 86 que preconiza: “A política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente far-se-á através de um conjunto articulado de ações governamentais e não governamentais, da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios” (BRASIL, 1990).

A participação popular no desenvolvimento de políticas públicas é de suma importância para o envolvimento comunitário no enfrentamento de todas as formas de exploração de crianças e adolescentes, possibilitando um acesso democrático a formulação de políticas públicas: O princípio da participação popular na construção das políticas públicas prevê ação articulada entre sociedade civil e Estado, com a atuação dos Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente, como órgãos paritários e controladores das ações em todos os níveis. Este princípio visa estabelecer formas de participação ativa e crítica na formulação das políticas públicas, garantindo instrumentos de fiscalização e controle, amparando as exigências da sociedade quanto à efetivação das políticas com qualidade e em quantidade adequadas. (CUSTÓDIO, 2009, p. 37)

No artigo 87 do Estatuto da Criança e do Adolescente, foram expostas as linhas de ação da política de atendimento envolvendo as políticas sociais básicas relacionadas a cada um dos direitos fundamentais previstos no artigo 227, bem como serviços especiais de prevenção e atendimento

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira a crianças e adolescentes vítimas de negligência, maus-tratos, exploração, abuso, crueldade e opressão.

Dispõe o artigo 88 do Estatuto da Criança e do Adolescente as diretrizes para o desenvolvimento de políticas públicas de atendimento de crianças e adolescentes no Brasil: Art. 88. São diretrizes da política de atendimento: I – municipalização do atendimento;

II – criação de conselhos municipais, estaduais e nacional dos direitos da criança e do adolescente, órgãos deliberativos e controladores das ações em todos os níveis, assegurada a participação popular paritária por meio de organizações representativas, segundo leis federal, estaduais e municipais; III – criação e manutenção de programas específicos, observada a descentralização político-administrativa;

IV – manutenção de fundos nacional, estaduais e municipais vinculados aos respectivos conselhos dos direitos da criança e do adolescente;

V – integração operacional de órgãos do Judiciário, Ministério Público, Defensoria, Segurança Pública e Assistência Social, preferencialmente em um mesmo local, para efeito de agilização do atendimento inicial a adolescente a quem se atribua autoria de ato infracional; VI – mobilização da opinião pública no sentido da indispensável participação dos diversos segmentos da sociedade;

VI – integração operacional de órgãos do Judiciário, Ministério Público, Defensoria, Conselho Tutelar e encarregados da execução das políticas sociais básicas e de assistência social, para efeito de agilização do atendimento de crianças e de adolescentes inseridos em programas de acolhimento familiar ou institucional, com vista na sua rápida reintegração à família de origem ou, se tal solução se mostrar comprovadamente inviável, sua colocação em família substituta, em quaisquer das modalidades previstas no art. 28 desta Lei; VII – mobilização da opinião pública para a indispensável participação dos diversos segmentos da sociedade. (BRASIL, 1990)

Ao longo da década de 1990 foram iniciadas as primeiras experiências de políticas públicas de proteção e assistência social à crianças e adolescentes. O amadurecimento das políticas permitiu a instituição do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) que estabelece compromissos compartilhados na efetivação de uma política de assistência social

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sexual comercial de crianças e adolescentes

mediante ações compartilhas entre a proteção social básica e a proteção social especial.

A Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais, emitida pelo Conselho Nacional Assistência Social, por meio da Resolução 109, de 11 de novembro de 2009, organizou o conjunto de serviços socioassistenciais e vem articulada com os benefícios de transferência de renda condicionada às famílias, criando o Programa Bolsa Família (Lei 10.836/04, regulamentada pelo Decreto 5.209/04), destinado a famílias que se encontram em situação de pobreza e de extrema pobreza, tendo por finalidade proporcionar assistência a pessoas que se estão em situação de vulnerabilidade social, tendo por objetivos o disposto no artigo 4º do Decreto 5.209, de 17 de setembro de 2004: Art. 4º Os objetivos básicos do Programa Bolsa Família, em relação aos seus beneficiários, sem prejuízo de outros que venham a ser fixados pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, são:

I – promover o acesso à rede de serviços públicos, em especial, de saúde, educação e assistência social; II – combater a fome e promover a segurança alimentar e nutricional;

III – estimular a emancipação sustentada das famílias que vivem em situação de pobreza e extrema pobreza; IV – combater a pobreza; e

V – promover a intersetorialidade, a complementaridade e a sinergia das ações sociais do Poder Público. (BRASIL, 2004)

A Lei 10.836, de 9 de janeiro de 2004, assevera que o programa visa à transferência de renda com condicionalidades, assegurando benefícios financeiros básicos ou variáveis para o sustento familiar, que se distinguem pela situação da família. O artigo 3º dessa lei dispôs sobre as condicionalidades mínimas para a transferência de renda: Art. 3º A concessão dos benefícios dependerá do cumprimento, no que couber, de condicionalidades relativas ao exame pré-natal, ao acompanhamento nutricional, ao acompanhamento de saúde, à frequência escolar de 85% (oitenta e cinco por cento) em estabelecimento de ensino regular, sem prejuízo de outras previstas em regulamento. (BRASIL, 2004)

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira Assim, o beneficiário terá que cumprir com tais requisitos para garantir o recebimento do benefício mensal, garantindo o acesso aos direitos fundamentais à educação e à saúde de crianças e adolescentes. A condicionalidade da frequência escolar visa estimular a permanência de crianças e adolescentes na escola com a perspectiva do aumento da escolaridade, gerando benefícios reflexos, tais como a diminuição do analfabetismo, o acesso à pré-escola, à creche e à educação especial, a diminuição dos índices de trabalho infantil, o direito à igualdade de oportunidades de educação, maior acesso aos diversos níveis de ensino. O Programa Bolsa Família está de acordo com os preceitos previstos na Constituição Federal brasileira, tendo como finalidades a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades sociais (art. 3º, III), a garantia da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e a garantia dos direitos sociais à alimentação, à saúde, à educação, à proteção à maternidade e à infância, à moradia, à assistência social (art. 6º) (BRASIL, 1988).

É preciso frisar que conceito de direito reduzido ao mero crescimento econômico deve ser superado em âmbito global, para se buscar um direito voltado para a construção de uma sociedade mais justa e não mais voltado para a garantia dos “interesses econômicos”. Assim, “Se o direito tem desempenhado uma função crucial na regulação das sociedades, qual a sua contribuição para a construção de uma sociedade mais justa?” (SANTOS, 2008a, p. 20). Para a busca de uma sociedade mais justa, de suma importância é a emancipação social, fator que contribui para a formação de indivíduos com plena cidadania, sujeitos com consciência de seus direitos e com a possibilidade de reivindicá-los. Para que isso seja possível, são necessárias ações concretas para o enfrentamento das condições de exclusão social, principalmente com a erradicação da fome e a efetivação do desenvolvimento educacional universal, assim como o acesso à justiça por parte dos cidadãos, fatores que contribuem para a revolução democrática e a plena justiça social (SANTOS, 2008a, p. 20-24).

Conforme Santos (2008a, p. 90), para se concretizar a democracia, exige-se que os cidadãos possuam direitos de cidadania: “A revolução democrática da justiça que aqui vos propus é uma tarefa muito exigente, tão exigente quanto esta ideia simples e afinal tão revolucionária; sem direitos de cidadania efetivos a democracia é uma ditadura mal disfarçada”. A efetivação da cidadania em sua dimensão de desenvolvimento humano requer o acesso à educação de qualidade, e também às diversas oportunidades políticas e sociais para o enfrentamento da exclusão social.

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A participação da família e da sociedade na efetivação dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes possui uma maior possibilidade de sucesso no processo de desenvolvimento das políticas públicas voltadas à infância, além de oportunizar à comunidade a possibilidade de controle social sobre as políticas públicas. Assim, “Quanto maior a participação da sociedade, seja na elaboração, seja na implementação e fiscalização dessas políticas, maior será a sua eficácia, porque essas representam verdadeiramente o que determinada parcela da sociedade quer” (COSTA; REIS, 2010, p. 14-36).

A educação para a cidadania é necessária para o desenvolvimento político emancipatório, crítico e consciente, visando à participação nas decisões públicas locais. A condição de cidadania requer acesso à informação e aos conhecimentos básicos sobre políticas públicas e o fomento a ações coletivas no sentido de buscar soluções para os problemas sociais, entre eles o trabalho infantil, a pobreza, a exclusão social e a exploração sexual, enfrentando problemas tolerados culturalmente no âmbito das sociedades contemporâneas. Daí a importância do espaço local, considerado como o território onde se produzem e se estabelecem as relações políticas, para se pensar a construção das políticas públicas de atendimento a crianças e adolescentes, garantindo inclusive as ações de prevenção e erradicação de todas as formas de trabalho infantil. A participação cidadã por meio do controle social das políticas públicas e no cumprimento da legislação vigente garante maior possibilidade de efetividade e eficácia no enfrentamento à exploração sexual comercial (CASSOL, 2008, p. 152; 161). A instituição do Direito da Criança e do Adolescente no Brasil, além de reconhecer os direitos fundamentais, veio acompanhada de mudanças estruturais mediante a implantação do Sistema de Garantias de Direitos da Criança e do Adolescente.

O Sistema de Garantias de Direitos da Criança do Adolescente é um conjunto ordenamento e sistemático de organismos responsáveis pela efetivação de direitos. Assim, foram instituídos nos três níveis (União, Estados e Municípios), os Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente, órgãos responsáveis pelo planejamento, deliberação e controle intersetorial das políticas públicas de atendimento aos direito da criança e do adolescente. O Conselho de Direitos, a partir de sua composição paritária, é constituído com metade de seus representantes governamentais indicada pelo

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira Executivo e metade dos representantes escolhida pelas organizações não governamentais atuantes no respectivo nível.

A ação dos Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente deve estar estruturada a partir dos Planos Decenais de Direitos Humanos da Criança e do Adolescente constituído por diagnóstico, diretrizes, objetivos, metas, ações necessárias à efetivação dos direitos fundamentais da criança e do adolescente. Também são indispensáveis mecanismos de controle, monitoramento e avaliação das políticas públicas com medidas de correção dos rumos apontados nos respectivos planos, buscando maior efetividade e resultado.

Além disso, a legislação nacional instituiu a criação dos Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente, vinculados aos Conselhos de Direitos em seus respectivos níveis, com a finalidade de garantir a implantação e implementação das políticas públicas. O Estatuto da Criança e do Adolescente prevê, em seu artigo 260, a possibilidade de que os contribuintes, pessoas físicas ou jurídicas, façam doações aos Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente, de modo que os valores doados sejam deduzidos do imposto de renda:

Art. 260. Os contribuintes poderão efetuar doações aos Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente nacional, distrital, estaduais ou municipais, devidamente comprovadas, sendo essas integralmente deduzidas do imposto de renda, obedecidos os seguintes limites: I – 1% (um por cento) do imposto sobre a renda devido apurado pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real; e

II – 6% (seis por cento) do imposto sobre a renda apurado pelas pessoas físicas na Declaração de Ajuste Anual, observado o disposto no art. 22 da Lei 9.532, de 10 de dezembro de 1997. (BRASIL, 1990)

É importante destacar que as doações para o fundo não desobrigam a destinação, pelos entes federados, de recursos destinados às políticas públicas destinadas à infância. Portanto, o crédito arrecadado por meio de doação é um valor suplementar para o cumprimento das políticas públicas de atendimento de crianças e adolescentes no âmbito federal, estadual, distrital ou municipal.

Além das estruturas dos Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente e seus respectivos fundos, o Estatuto da Criança e do Adolescente criou um órgão de proteção no sistema de garantias de direi-

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tos de crianças e adolescentes para possibilitar a efetivação de direitos fundamentais de crianças e adolescentes e o zelo de tais garantias, denominado de Conselho Tutelar, instituição que se encontra vinculada ao Poder Público Municipal, conforme dispôs o artigo 131 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que aduz: “O Conselho Tutelar é órgão permanente e autônomo, não jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente, definidos nesta Lei (BRASIL, 1990). Nesse sentido, dispõe o Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu artigo 98: “O Conselho Tutelar tem poder para agir sempre que os direitos da criança e do adolescente forem ameaçados ou violados” (BRASIL, 1990), podendo “mobilizar o sistema e exigir a efetivação dos direitos da criança e do adolescente […]” (CUSTÓDIO; VERONESE, 2013, p. 176-185). Os Conselheiros Tutelares possuem atribuições específicas para a garantia da proteção integral de crianças e adolescentes, conforme prescreve o artigo 136 do Estatuto da Criança e do Adolescente: Art. 136. São atribuições do Conselho Tutelar:

I – atender as crianças e adolescentes nas hipóteses previstas nos arts. 98 e 105, aplicando as medidas previstas no art. 101, I a VII; II – atender e aconselhar os pais ou responsável, aplicando as medidas previstas no art. 129, I a VII; III – promover a execução de suas decisões, podendo para tanto: a) requisitar serviços públicos nas áreas de saúde, educação, serviço social, previdência, trabalho e segurança; b) representar junto à autoridade judiciária nos casos de descumprimento injustificado de suas deliberações. IV – encaminhar ao Ministério Público notícia de fato que constitua infração administrativa ou penal contra os direitos da criança ou adolescente; V – encaminhar à autoridade judiciária os casos de sua competência; VI – providenciar a medida estabelecida pela autoridade judiciária, dentre as previstas no art. 101, de I a VI, para o adolescente autor de ato infracional; VII – expedir notificações; VIII – requisitar certidões de nascimento e de óbito de criança ou adolescente quando necessário; IX – assessorar o Poder Executivo local na elaboração da proposta orçamentária para planos e programas de atendimento dos direitos da criança e do adolescente;

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira X – representar, em nome da pessoa e da família, contra a violação dos direitos previstos no art. 220, § 3º, inciso II, da Constituição Federal;

XI – representar ao Ministério Público para efeito das ações de perda ou suspensão do poder familiar, após esgotadas as possibilidades de manutenção da criança ou do adolescente junto à família natural.

Parágrafo único. Se, no exercício de suas atribuições, o Conselho Tutelar entender necessário o afastamento do convívio familiar, comunicará incontinenti o fato ao Ministério Público, prestando-lhe informações sobre os motivos de tal entendimento e as providências tomadas para a orientação, o apoio e a promoção social da família. (BRASIL, 1990)

Portanto, os Conselhos Tutelares possuem competências específicas para garantir a proteção integral de crianças e adolescentes, e isso requer condições adequadas para sua atuação, pois,

Sem dúvida, o quadro geral dos Conselhos Tutelares no Brasil caracteriza-se pela precariedade das condições de trabalho, produzindo como reflexo a precarização dos direitos infanto-juvenis e impedindo a concretização proposta pelo sistema de garantias de direitos da criança e do adolescente. Daí a necessidade de conquista e reconhecimento histórico de condições dignas de remuneração e trabalho aos Conselheiros Tutelares como forma de atender aos comandos do princípio da prioridade absoluta. (SOUZA, 2008b, p. 85)

Os municípios devem prever no orçamento municipal recursos necessários para um adequado funcionamento dos Conselhos Tutelares, garantindo o exposto no artigo 134 do Estatuto da Criança e do Adolescente. “Isso inclui necessariamente a garantia de condições dignas de trabalho aos próprios Conselheiros para que tenham condições plenas para o exercício da função” (SOUZA, 2008b, p. 85-86). No que se refere à proteção contra a exploração do trabalho infantil, o artigo 7º, XXXIII, da Constituição Federal, atualizado pela Emenda Constitucional 20, de 15 de dezembro de 1998, estabeleceu limites de idade mínima para o trabalho, nos seguintes termos: Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: XXXIII – proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezes-

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seis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos. (BRASIL, 1988)

Após a promulgação da Lei 10.097, de 19 de dezembro de 2000, denominada Lei de Aprendizagem, a Consolidação das Leis Trabalhistas teve seus principais dispositivos que tratam de idade mínima para o trabalho alterados e adequados aos tratados internacionais. A aprendizagem visa à formação técnica e profissional para o trabalho, mediante um contrato especial e com o cumprimento de requisitos, para a garantia do desenvolvimento físico, moral e psicológico dos adolescentes (BRASIL, 1943).

O Estatuto da Criança e do Adolescente, no artigo 67, assevera sobre as condições mínimas para o exercício laboral adolescente, prescrevendo as condições de trabalho que, se violadas, configuram a exploração do trabalho infantil: Art. 67. Ao adolescente empregado, aprendiz, em regime familiar de trabalho, aluno de escola técnica, assistido em entidade governamental ou não governamental, é vedado trabalho: I – noturno, realizado entre as vinte e duas horas de um dia e às cinco horas do dia seguinte; II – perigoso, insalubre ou penoso; III – realizado em locais prejudiciais à sua formação e ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral e social; IV – realizado em horários e locais que não permitam a frequência à escola. (BRASIL, 1990)

Considerando que a exploração sexual comercial caracteriza-se como uma das piores formas de trabalho infantil, esta atividade é totalmente vedada para crianças e adolescentes em quaisquer circunstâncias e condições, prevendo a legislação, inclusive, medidas criminalizadoras quando constatadas tais condutas que coloquem crianças e adolescentes nessas condições. No entanto, a mera responsabilização criminal é, por si só, absolutamente ineficiente para evitar a exploração sexual de crianças e adolescentes, exigindo o fortalecimento do sistema de garantia de direitos e de políticas públicas de atendimento, proteção e justiça, bem como ações intersetoriais articuladas para o seu enfrentamento. Por isso, a ratificação da Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho é de fundamental importância, pois exige que o país construa políticas públicas eficazes para a proteção de crianças e adolescentes contra a exploração sexual comercial.

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Capítulo 3 A PROTEÇÃO JURÍDICA CONTRA A EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL NA ARGENTINA

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Argentina adequou a sua legislação nacional aos tratados internacionais ratificados que abrangem a proteção integral de crianças e adolescentes. Com o passar dos anos, após a ratificação em referência, a idade inicial para trabalhar foi sendo elevada e alinhada às Convenções 138 e 182 da Organização Internacional do Trabalho, tendo sido criada, também, a lei de proteção integral de crianças e adolescentes, que teve muita influência da Convenção sobre Direitos das Crianças da Organização das Nações Unidas – ONU.

A Constituição Nacional da Argentina declarou serem de hierarquia superior às leis daquele Estado alguns dos tratados que tratam sobre direitos humanos, entre eles a Convenção sobre Direitos das Crianças de 1989, conforme o disposto no inciso 22, do artigo 75, da Constituição Nacional. No sentido de proteção de crianças e de adolescentes, o inciso 23 do mesmo artigo atribuiu ao Congresso Nacional a competência de legislar e promover ações positivas que garantam a igualdade de oportunidades e pleno gozo e exercício de direitos fundamentais, especialmente para as crianças, proporcionando proteção àquelas que estiverem em situação de desamparo (ARGENTINA, 1853). Dos principais dispositivos jurídicos que tratam sobre o trabalho infantil, destacam-se as Leis 26.061, Lei de Proteção Integral dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes, do ano de 2006, e 26.390, Lei de Proibição do Trabalho Infantil e Proteção do Trabalho Adolescente, do ano de 2008, as

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira quais foram promulgadas após a ratificação das convenções internacionais acima referidas.

A primeira lei tem como objeto a proteção integral dos direitos de crianças e adolescentes, tendo sido positivado na legislação interna a respectiva proteção:

Art. 1º Objeto – Esta ley tiene por objeto la protección integral de los derechos de las niñas, niños y adolescentes que se encuentren en el territorio de la República Argentina, para garantizar el ejercicio y disfrute pleno, efectivo y permanente de aquellos reconocidos en el ordenamiento jurídico nacional y en los tratados internacionales en los que la Nación sea parte. Los derechos aquí reconocidos están asegurados por su máxima exigibilidad y sustentados en el principio del interés superior del niño. La omisión en la observancia de los deberes que por la presente corresponden a los órganos gubernamentales del Estado habilita a todo ciudadano a interponer las acciones administrativas y judiciales a fin de restaurar el ejercicio y goce de tales derechos, a través de medidas expeditas y eficaces. (ARGENTINA, 2005)

Tal lei visa proteger os direitos fundamentais de crianças e adolescentes, assegurando o interesse superior da criança e do adolescente (art. 3º), com plena garantia ao direito à vida, à dignidade, à identidade, à vida privada, à saúde, à educação, à liberdade, ao acesso a medidas de proteção, ao esporte, ao meio ambiente, à opinião, à igualdade, entre outros direitos, que devem ser assegurados, com prioridade absoluta, mediante a instituição de políticas públicas, que serão de responsabilidade governamental. A participação comunitária é incentivada na busca pela garantia da proteção integral de crianças e adolescentes. Há previsão de responsabilidades governamentais e da família na garantia dos mais diversos direitos das crianças e adolescentes (ARGENTINA, 2005). Os presentes direitos, protegidos juridicamente, são afetados com a ocorrência da exploração sexual comercial, que trará prejuízos também para o pleno desenvolvimento de direitos no plano familiar, cultural e social (ARGENTINA, 2005). A lei da proteção integral de crianças e adolescentes da Argentina dispôs, entre outros assuntos, sobre a instituição de políticas públicas destinadas à infância, conforme o artigo 4º, trazendo responsabilidades na proteção de direitos da criança e do adolescente à família (art. 7º), à comunidade (art. 6º) e ao Estado (art. 5º).

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Destaca-se a proteção jurídica contra os prejuízos que poderão ser ocasionados à dignidade da criança ou do adolescente em decorrência da exploração sexual comercial, baseado no previsto no artigo 9º:

Art. 9º DERECHO A LA DIGNIDAD Y A LA INTEGRIDAD PERSONAL. Las niñas, niños y adolescentes tienen derecho a la dignidad como sujetos de derechos y de personas en desarrollo; a no ser sometidos a trato violento, discriminatorio, vejatorio, humillante, intimidatorio; a no ser sometidos a ninguna forma de explotación económica, torturas, abusos o negligencias, explotación sexual, secuestros o tráfico para cualquier fin o en cualquier forma o condición cruel o degradante. Las niñas, niños y adolescentes tienen derecho a su integridad física, sexual, psíquica y moral. La persona que tome conocimiento de malos tratos, o de situaciones que atenten contra la integridad psíquica, física, sexual o moral de un niño, niña o adolescente, o cualquier otra violación a sus derechos, debe comunicar a la autoridad local de aplicación de la presente ley. (ARGENTINA, 2005)

Na lei foram instituídas também as diretrizes para a elaboração de políticas públicas: Art. 4º POLÍTICAS PÚBLICAS. Las políticas públicas de la niñez y adolescencia se elaborarán de acuerdo a las siguientes pautas: a) Fortalecimiento del rol de la familia en la efectivación de los derechos de las niñas, niños y adolescentes; b) Descentralización de los organismos de aplicación y de los planes y programas específicos de las distintas políticas de protección de derechos, a fin de garantizar mayor autonomía, agilidad y eficacia; c) Gestión asociada de los organismos de gobierno en sus distintos niveles en coordinación con la sociedad civil, con capacitación y fiscalización permanente; d) Promoción de redes intersectoriales locales; e) Propiciar la constitución de organizaciones y organismos para la defensa y protección de los derechos de las niñas, niños y adolescentes. (ARGENTINA, 2005).

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira Já a lei de proibição do trabalho infantil e proteção do trabalho adolescente tratou de elevar a idade mínima para o trabalho para dezesseis anos, conforme o seu artigo 2º, e garantir a proibição do trabalho infantil e proteção do trabalho adolescente, proibindo qualquer forma de trabalho ou atividade de sobrevivência, com ou sem o fim de lucro, abaixo dos dezesseis anos (ARGENTINA, 2008). A idade mínima para o trabalho na Argentina, em regra, é de dezesseis anos, conforme o disposto no artigo 32 da Lei de Contrato de Trabalho, que foi modificado pela Lei 26.390/08, aumentando a idade inicial para o trabalho para dezesseis anos. Desde que autorizadas pelos pais, tutores ou responsáveis, as pessoas entre dezesseis e dezoito anos podem celebrar contrato de trabalho, presumindo a autorização em referência quando os adolescentes em tal faixa etária já forem independentes ou estarem emancipados pelo matrimônio. Conforme o artigo 33 da lei em questão, a idade para comparecer em juízo laboral com reivindicações trabalhista é de dezesseis anos (ARGENTINA, 1976).

Há exceções na Argentina para o trabalho de pessoas com menos de dezesseis anos nos casos de trabalhos leves ou trabalhos artísticos, em que a idade mínima deve ser de catorze anos e a jornada de seis horas. O artigo 189 bis da Lei de Contrato do Trabalho permite outra forma trabalho a partir dos catorze anos, desde que cumprido com todos os requisitos: Art. 189. Bis – Empresa de la familia. Excepción.

Las personas mayores de catorce (14) y menores a la edad indicada en el artículo anterior podrán ser ocupados en empresas cuyo titular sea su padre, madre o tutor, en jornadas que no podrán superar las tres (3) horas diarias, y las quince (15) horas semanales, siempre que no se trate de tareas penosas, peligrosas y/o insalubres, y que cumplan con la asistencia escolar. La empresa de la familia del trabajador menor que pretenda acogerse a esta excepción a la edad mínima de admisión al empleo, deberá obtener autorización de la autoridad administrativa laboral de cada jurisdicción […]. (ARGENTINA, 1976)

Os artigos 119 e 187 da Lei de Contrato do Trabalho estabelecem a proibição de remuneração distinta por motivo de idade, buscando impedir qualquer tipo de discriminação salarial laboral para adolescentes traba-

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lhadores. As exceções são para quando houver a jornada reduzida ou para o trabalho de aprendizagem. O artigo 190 proibiu a jornada de trabalho noturno antes dos dezoito anos de idade (ARGENTINA, 1976).

A Argentina, ainda no ano de 2013, transformou em conduta criminal a exploração de trabalho infantil, conforme o disposto na Lei 26.847, que altera o Código Penal argentino, que passa a disciplinar o que segue: Art. 148 bis: Será reprimido con prisión de 1 (uno) a (cuatro) años el que aprovechare económicamente el trabajo de un niño o niña en violación de las normas nacionales que prohíben el trabajo infantil, siempre que el hecho no importare un delito más grave. Quedan exceptuadas las tareas que tuvieren fines pedagógicos o de capacitación exclusivamente. No será punible el padre, madre, tutor o guardador del niño o niña que incurriere en la conducta descripta. (ARGENTINA, 1984)

Portanto, a Argentina vem buscando a construção de um sistema de garantia de direitos a crianças e adolescentes de modo que se possa enfrentar a exploração sexual comercial, assim como qualquer forma de trabalho infantil, por meio de uma proteção jurídica consolidada e de políticas públicas destinadas à infância. A Argentina recepcionou os tratados internacionais e possui leis próprias para a proteção de direitos de criança e adolescentes, em especial a Ley de Protección Integral de los Derechos de las Ninãs, Niños y Adolescentes, bem como, o Decreto 415/06 que traz a sua regulamentação.

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Capítulo 4 A PROTEÇÃO JURÍDICA CONTRA A EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL NO URUGUAI

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Constituição uruguaia dispõe em seu artigo 54 que: “El trabajo de las mujeres y de los menores de dieciocho años será especialmente reglamentado y limitado” (URUGUAI, 1967).

O Uruguai possui um Código denominado “Código de la Niñez y la Adolescencia – Ley 17.823”, de 07 de setembro de 2004, destinado a toda pessoa com menos de dezoito anos, que inseriu a proteção integral a crianças e adolescentes naquele território. A proteção desses direitos é dever da família, do Estado, da comunidade e da sociedade, com prioridade absoluta, sendo instituídas diversas formas de proteção de crianças e adolescentes e de políticas públicas para garantia de direitos (URUGUAI, 2004).

O dispositivo inseriu no Estado uruguaio a teoria da proteção integral como dever da família, do Estado, da comunidade e da sociedade, assemelhando-se à proteção jurídica brasileira, assegurando multiplicidade de direitos interdisciplinares de forma universal às crianças e adolescentes, que são os sujeitos de direitos. O artigo 9º previu a garantia de diversos direitos às crianças e adolescentes, sem nenhuma distinção:

Art. 9º Todo niño y adolescente tiene derecho intrínseco a la vida, dignidad, libertad, identidad, integridad, imagen, salud, educación, recreación, descanso, cultura, participación, asociación, a los beneficios de la seguridad social y a ser tratado en igualdad de condiciones cualquiera sea su sexo, su religión, etnia o condición social. (URUGUAI, 2004)

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira A proteção jurídica positivou diversos direitos que são violados com a ocorrência da exploração sexual comercial, havendo a necessidade de instituição de políticas públicas para o seu restabelecimento ou efetivação. anos:

No Uruguai, a idade mínima estabelecida para o trabalho é de quinze Art. 162º (Edad de admisión). Fijase en quince años la edad mínima que se admitirá en los adolescentes que trabajen en empleos públicos o privados, en todos los sectores de la actividad económica, salvo las excepciones especialmente establecidas en los artículos siguientes, y aquellas que, teniendo en cuenta el interés superior del niño o adolescente, conceda el Instituto Nacional del Menor. Cuando el Instituto Nacional del Menor no las otorgue de oficio, las excepciones deberán ser gestionadas por los padres o quien acredite la tutoría legal y establecer como mínimo el nombre del representante legal del menor, la naturaleza de la actividad y la jornada diaria. (URUGUAI, 2004)

Cabe ao “Instituto del Niño y Adolescente del Uruguay” listar os trabalhos proibidos para pessoas com menos de dezoito anos, devido ao prejuízo que podem trazer as crianças e aos adolescentes:

Art. 164º (Tareas y condiciones nocivas de trabajo). El Instituto Nacional del Menor establecerá con carácter de urgente el listado de tareas a incluir dentro de la categoría de trabajo peligroso o nocivo para la salud o para su desarrollo físico, espiritual o moral, los que estarán terminantemente prohibidos, cualquiera fuere la edad del que pretenda trabajar o ya se encuentre en relación de trabajo. (URUGUAI, 2004)

No artigo 172 há proibição expressa ao trabalho noturno: “Los adolescentes no podrán ser empleados ni trabajar en horario nocturno, entendiéndose por tal a los efectos de este Código, el período comprendido entre las veintidós y las seis horas del día siguiente” (URUGUAI, 2004). O artigo 163º prevê a proibição de qualquer tipo de trabalho que possa afetar o desenvolvimento integral ou a moral da criança ou do adolescente:

Art. 163º (Obligación de protección). Para el caso de que los niños o adolescentes trabajen, el Estado está obligado a protegerlos contra toda forma de explotación económica y contra el desempeño de cualquier tipo de trabajo peligroso, nocivo para su salud o para su desarrollo físico, espiritual, moral o social.

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Prohíbase todo trabajo que no le permita gozar de bienestar en compañía de su familia o responsables o entorpezca su formación educativa. (URUGUAI, 2004)

Assim, encontra-se expressa a proibição de qualquer tipo de trabalho que afete a moral de crianças e de adolescentes, evidenciando, por consequência, a proibição à exploração sexual comercial. O artigo 166º dispõe sobre algumas obrigações do Estado:

Art. 166º (Prevención, educación e información). El Estado promoverá programas de apoyo integral para desalentar y eliminar paulatinamente el trabajo de estos niños y adolescentes. La sociedad civil deberá prestar su concurso en las campañas preventivas, educativas e informativas que se desarrollen a fin de asegurar el bienestar del niño y adolescente. Se consideran programas de educación en el trabajo, aquellos que, realizados por el Instituto Nacional del Menor o por instituciones sin fines de lucro, tienen exigencias pedagógicas relativas al desarrollo personal y social del alumno, que prevalecen sobre los aspectos productivos. En consecuencia, la remuneración que recibe el alumno por el trabajo realizado o por la participación en la venta de productos de su trabajo, no desvirtúa la naturaleza educativa de la relación. (URUGUAI, 2004)

No “Código de la Niñez y la Adolescencia” estão previstas políticas públicas destinadas a crianças e adolescentes. No Uruguai, é considerado criança todo ser humano até treze anos de idade, e adolescente todo ser humano entre treze e dezoito anos de idade, sendo considerados sujeitos de direitos, conforme previsto no artigo 1º. O artigo 3º dispôs sobre o princípio de proteção de direitos em que são titulares todas as crianças e adolescentes (URUGUAI, 2004). O Estado protegerá a universalidade de direitos de crianças e adolescentes, dando proteção especial quando se tratar da exploração sexual comercial:

Art. 15. (Protección especial). El Estado tiene la obligación de proteger especialmente a los niños y adolescentes respecto a toda forma de: A) Abandono, abuso sexual o exploración de la prostitución. (URUGUAI, 2004)

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira O capítulo VI do Código prevê as “Políticas Sociales de Promoción y Protección a la Niñez y Adolescencia”. Conforme o artigo 18, são objetivos fundamentais das políticas sociais de estímulo e de proteção de direitos da criança e do adolescente a promoção social e a proteção e atenção integral, buscando o desenvolvimento integral mediante a proteção integral de direitos (URUGUAI, 2004).

Como princípios básicos das políticas sociais destacam-se: o fortalecimento da integração e permanência de crianças e adolescentes em suas famílias e nas instituições de educação; a descentralização das políticas de acesso a serviços básicos destinados à infância e à família; a participação da sociedade nas políticas sociais; a promoção da solidariedade social destinada a crianças e adolescentes; o desenvolvimento e implementação de um sistema de políticas sociais básicas, complementares, de proteção especial e de caráter integral, com a finalidade de garantir a sobrevivência e o desenvolvimento de crianças e de adolescentes, e com a participação do Estado e da sociedade; a garantia de direitos fundamentais à universalidade de crianças e adolescentes, por meio de políticas sociais básicas; a criação de programas de atenção integral; a adoção de programas e serviços especiais de atenção médica e psicossocial e de prevenção de qualquer forma de violência ou exploração sexual ou laboral; a proteção jurídico-social; a adoção de políticas públicas nas áreas desportivas, culturais e recreativa; a criação de um sistema de controle do desenvolvimento durante a infância através de indicadores (URUGUAI, 2004). O capítulo XI do Código dispõe sobre a proteção dos direitos ameaçados ou violados de crianças e adolescentes e a aplicação de medidas urgentes de prevenção ou reparação. Assim, verifica-se que o juiz aplicará medidas de garantia ao atendimento de crianças e adolescentes. Visando à proteção de direitos de crianças e adolescentes, o juiz também poderá impor medidas aos pais ou responsáveis, que consistiriam, conforme artigo 119: na chamada de atenção para evitar violação ou ameaça de direito de crianças e adolescentes; orientação, apoio e acompanhamento sociofamiliar por meio de políticas públicas ou privadas; obrigação de matricular a criança ou o adolescente na escola ou em programas de capacitação; indicação a participação em programa público ou privado de proteção à família (URUGUAI, 2004). Poderão ser adotadas medidas de proteção à saúde pelo juiz, sendo possível a solicitação de tratamento psiquiátrico, psicológico ou mé-

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dico em instituições públicas ou privadas, de forma ambulatorial ou não (URUGUAI, 2004).

O artigo 124 prevê o direito da criança e do adolescente de participarem em programas de atenção integral, cuidados e alojamento, garantidos pelo Estado, de acordo com o princípio do interesse superior da criança ou do adolescente. Já os artigos 130 e 131 preveem que toda vez que houver denúncias de exploração sexual comercial, ou outras formas de violência, exploração ou abuso contra crianças ou adolescentes, deverá ser realizada, de forma imediata, a comunicação ao juiz competente, prevenindo danos secundários (URUGUAI, 2004).

Portanto, o Uruguai possui proteção jurídica contra a exploração sexual comercial e contra o trabalho infantil disciplinada na legislação constitucional e infraconstitucional, que busca garantir a proteção integral dos direitos de crianças e adolescentes de forma universal. As convenções internacionais sobre o assunto foram recepcionadas por aquele Estado, sendo respeitadas no que tange à proteção dos direitos infantojuvenis.

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Capítulo 5 EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL: DO CONTEXTO À INTEGRAÇÃO DOS CONCEITOS FUNDAMENTAIS NO BRASIL, ARGENTINA E URUGUAI

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exploração sexual comercial é uma piores das formas de trabalho infantil. Segundo dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT), na atualidade, existem cerca de 215 milhões de crianças e adolescentes trabalhando irregularmente no mundo (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 2012), em todos os tipos de jornadas, nos mais diversos ambientes e nas mais diversas formas de trabalho, desde os domésticos, rurais e nas ruas até os perigosos, insalubres, noturnos e nas piores formas de trabalho infantil. No Brasil, estima-se, baseado nos dados de 2012, que 3,5 milhões de crianças e adolescentes sejam explorados pelo trabalho infantil (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2012). Da análise de indicadores sobre violência contra criança e adolescentes do Sistema Único de Saúde – SUS, Waiselfisz (2012, p. 70-71) demonstrou que no ano de 2011 foram registrados 10.425 casos de violência sexual de crianças e adolescentes no Brasil, sendo o perfil de gênero da grande maioria dos casos identificados do sexo feminino (83,2%). Deste quantitativo de crianças e adolescentes explorados, o número de atendimentos no Sistema Único de Saúde demonstrou um percentual de 19,2% (correspondente a 2.324 casos) de atendimentos por assédio sexual; 59% (correspondente a 7.155 casos) de atendimentos por estupro; 15,1% (correspondente a 1.831 casos) de atendimento por atentado violento ao pudor; 2,7% (correspondente a 327 casos) de casos de pornografia infantil;

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira e 4,1% (correspondente a 495 casos), exploração sexual comercial; totalizando 12.132 atendimentos. Entre tais casos, houve um índice menor, mas não menos significativo, de crianças e adolescentes explorados sexualmente de forma comercial (2,7% na pornografia infantil e 4,1% na exploração sexual comercial) e que foram atendidos pelo Sistema Único de Saúde, porém existem outros tantos casos que, obviamente, continuam na obscuridade, sem ter tido um acompanhamento de saúde. Salienta-se que no que tange aos casos de atendimento por estupro (59% dos casos identificados), algumas das situações podem ter sido originadas pela exploração sexual comercial, tendo, posteriormente, sido configurada a conduta de estupro ou estupro de vulnerável. Tabela 1: Tipo de violência sexual

Tipo de violência

Percentual

Total

Estupro

59,0

7.155

Assédio

19,2

2.324

Atentado violento ao pudor

15,1

1.831

Exploração sexual

4,1

495

Pornografia infantil

2,7

327

100,0

12.132

Total Fonte: WAISELFISZ, 2012.

Waiselfisz (2012, p. 70-71) definiu

[…] por exploração sexual – utilização sexual de crianças e adolescentes com fins comerciais e de lucro, seja levando-os a manter relações sexuais com adultos ou adolescentes mais velhos – e de pornografia infantil – apresentação, produção, venda, fornecimento, divulgação e publicação, por qualquer meio de comunicação, inclusive a rede mundial de computadores (Internet), fotografias ou imagens com pornografia ou cenas de sexo explícito envolvendo crianças ou adolescentes.

Assim, a exploração sexual comercial, além de ser uma das piores formas de trabalho infantil, integra a categoria mais ampla denominada violência sexual, que também inclui o estupro, o atentado violento ao pudor entre outras formas.

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

O estudo, ainda, identificou os agressores de crianças e adolescentes, demonstrando que as diversas formas de violência sexual foram cometidas por amigos ou conhecidos, o que significou 28,5% dos casos (2.950 ocorrências). A cifra para outros é a segunda maior, com 19,8% dos casos (2.050 ocorrências), seguida dos desconhecidos, que tiveram 17,9% dos casos (1.848 ocorrências); logo em seguida fica a cifra de pais e padrastos, significando, respectivamente, 10,2% (1.056 ocorrências) e 10,3% (1.061 ocorrências) dos casos. Outros familiares também foram considerados na referida pesquisa, considerando que foram responsáveis os seguintes familiares: mãe (2% dos casos); madrasta (0,2% dos casos); cônjuge (0,9% dos casos); ex-cônjuge (0,2% dos casos); namorado (6,3% dos casos); ex-namorado (0,8% dos casos); irmão (2,6% dos casos) (WAISELFISZ, 2012, p. 72-73). Tabela 2: O perfil de agressor

Tipo de violência

Total

Percentual

Amigo/Conhecido

2.950

28,5

Outros

2.050

19,8

Desconhecido

1.848

17,9

Padrasto

1.061

10,3

Pai

1.056

10,2

Namorado

647

6,3

Irmão

269

2,6

Mãe

231

2,2

Cônjuge

98

0,9

Ex-namorado

84

0,8

Ex-cônjuge

17

0,2

Madrasta

23

0,2

10.334

100,0

Total Fonte: WAISELFISZ, 2012.

Deve-se destacar que a violência sexual em geral contra crianças e adolescentes se encontra presente, consideravelmente, dentro da relação familiar, conforme os dados de atendimento no Sistema Único de Saúde no ano de 2011. Dos casos expostos anteriormente, 33,7% dos autores são pessoas

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira com convivência familiar (pai, padrasto, mãe, madrasta, cônjuge, ex-cônjuge, namorado, ex-namorado ou irmão). Tais cifras são para todas as formas de violência sexual, porém, nestas, se encontram incluídas a exploração sexual comercial, que pode ser iniciada dentro do próprio lar. As crianças e os adolescentes explorados dentro do seio familiar encontram muitas dificuldades para sair de tal exploração, pois não podem contar com a ajuda das pessoas que deveriam ser a sua principal proteção: seus familiares. A violência sexual é o segundo maior tipo de violência notificado contra crianças e adolescentes, somente perdendo para a violência física. Enquanto esta teve 21.279 notificações de ocorrências, atingindo um percentual de 40,5%, aquela teve 10.425 casos, representando 19,9% das ocorrências (WAISELFISZ, 2012, p. 67). Tabela 3: Tipo de violência

Tipo de violência

Total

Percentual

Física

21.279

40,5

Sexual

10.425

19,9

Moral

8.948

17,0

922

1,9

Abandono

8.275

15,8

Outras

2.596

4,9

52.515

100,0

Tortura

Total Fonte: WAISELFISZ, 2012.

Nesse sentido, o Disque Denúncia Nacional (Disque 100), número telefônico que serve para o recebimento de denúncias de desrespeito aos direitos humanos, registrou, de maio de 2003 a março de 2011, um total de 156 mil denúncias, sendo que, destas, um percentual de 32% foi de violência sexual contra crianças e adolescentes em todo o território nacional, entre as quais se encontra abrangida a exploração sexual comercial, fator que demonstra o problema a ser enfrentado pelo Brasil, pois as cifras identificadas pelos mais diversos órgãos coletores de dados demonstram a complexidade de atitudes necessárias para o enfrentamento do tema (BRASIL, 2012, p. 11). O Plano Nacional para a Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil da Argentina assim dispõe: “En la República Argentina las niñas y los niños

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

que trabajan participan en casi todos los tipos de trabajo: agricultura, industria, minería, construcción, trabajo doméstico, comercio, servicios, explotación sexual y comercio de droga” (ARGENTINA, 2005, p. 8). Da mesma forma é no Brasil e no Uruguai, pois, assim como na Argentina, crianças e adolescentes estão sendo explorados em todas as partes da América do Sul.

Para analisar o trabalho infantil é importante definir um conceito para determinada expressão. Inicialmente, há de se ressaltar a diferenciação conceitual dos termos “criança” e “adolescente” no âmbito nacional e internacional. Tais termos são definidos distintamente; nesse sentido, algumas legislações internacionais definiram “criança” como toda pessoa com menos de dezoito anos de idade; já a legislação brasileira definiu como “criança” a pessoa que possui até doze anos de idade e “adolescente” a que possui de doze a dezoito anos. A Organização das Nações Unidas (ONU), na Convenção sobre os Direitos das Crianças, em que foi adotada e aberta a assinatura e ratificação pela Assembleia Geral das Nações Unidas na sua Resolução 44/25, de 20 de novembro de 1989, com a entrada em vigor em 2 de setembro de 1990, em conformidade com o disposto no seu artigo 49, dispôs no artigo 1º que criança é toda a pessoa com idade até dezoito anos, conforme o que segue: Para os efeitos da presente Convenção considera-se como criança todo ser humano com menos de dezoito anos de idade, a não ser que, em conformidade com a lei aplicável à criança, a maioridade seja alcançada antes. (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1989)

A Organização Internacional do Trabalho (OIT), na Convenção 138, de 1973, que dispõe sobre a idade mínima de admissão ao emprego, usa a expressão “criança” para definir pessoas com até dezoito anos de idade, conceito unânime no plano das relações internacionais (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 1973). Já na Convenção 182, de 1999, que dispõe sobre a proibição das piores formas de trabalho infantil e a ação imediata para a sua eliminação, foi estipulado, conforme o artigo 2º, que: “Para efeitos da presente Convenção, o termo ‘criança’ designa toda pessoa menor de 18 anos” (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 1999). No Brasil, conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei 8.069, de 13 de julho de 1990, em seu artigo 2º, considera-se criança toda pessoa até os doze anos incompletos de idade e adolescente, as pessoas entre os doze e dezoito anos de idade (BRASIL, 1990).

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira No que tange ao Uruguai, o Plano de Ação para a prevenção e erradicação do trabalho infantil definiu o termo “criança”:

Al respecto consideraremos a los niños/as como todo ser humano menor de 18 años, salvo que en virtud de la ley que le sea aplicable, haya alcanzado antes la mayoría de edad, y que por ello se encuentran en una etapa de desarrollo y formación psicológica / emotiva / intelectual y física, debiendo por tanto la sociedad garantizarles el máximo bienestar en todos los aspectos y la mayor protección. (URUGUAI, 2003, p. 4)

Portanto, há distinção dos conceitos de criança e de adolescente nas legislações nacionais e internacionais que deve ser considerada toda vez que for utilizado tal termo, não sendo possível haver uniformidade conceitual para as expressões em tela. Já se tratando das expressões “trabalho infantil” e “trabalho adolescente”, tentar-se-á chegar a uma conceituação clara para o assunto, definição que seja aceita nacional e internacionalmente. Deve-se frisar que tanto o trabalho infantil quanto o trabalho adolescente são realizados por crianças e por adolescentes, não sendo a expressão “trabalho infantil” única para tratar de trabalho de crianças e sim para tratar de atividade laboral executada por pessoas que possuem idade mínima abaixo do limite legal para o trabalho. No Plano Nacional para a Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil da Argentina, encontra-se clara definição para trabalho infantil, expondo praticamente todas as formas que se considera tal atividade:

A los efectos de dar un marco conceptual al Plan Nacional se entiende por trabajo infantil a toda actividad económica y/o estrategia de supervivencia, remunerada o no, realizada por niñas y niños, por debajo de la edad mínima de admisión al empleo o trabajo, o que no han finalizado la escolaridad obligatoria o que no han cumplido los 18 años si se trata de trabajo peligroso. Se entiende por niña o niño a todo ser humano por debajo de los 18 años de edad, salvo que en virtud de la ley que sea aplicable, haya alcanzado antes la mayoría de edad. (ARGENTINA, 2006)

No Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente Trabalhador do Brasil foi definido trabalho infantil:

O termo “trabalho infantil” refere-se, neste Plano, às atividades econômicas e/ou atividades de sobrevivência, com ou sem finalidade de lucro, remuneradas ou não, realizadas por crianças ou adolescentes

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

em idade inferior a 16 (dezesseis) anos, ressalvada a condição de aprendiz a partir dos 14 (quatorze) anos, independentemente da sua condição ocupacional. (BRASIL, 2011, p. 6)

Já se tratando de trabalho adolescente, o plano brasileiro definiu: “Para efeitos de proteção ao adolescente trabalhador será considerado todo trabalho desempenhado por pessoa com idade entre 16 e 18 anos e, na condição de aprendiz, de 14 a 18 anos” (BRASIL, 2011, p. 6). O plano brasileiro não abrange a totalidade de casos em que há a ocorrência de trabalho infantil, pois dos 16 aos 18 anos poderá ocorrer o trabalho infantil, quando o adolescente laborar em uma das piores formas de trabalho infantil ou em atividades insalubres, perigosas, penosas e imorais. No Plano de Ação para a prevenção e erradicação do trabalho infantil no Uruguai (URUGUAI, 2003, p. 4), a definição de trabalho infantil possibilita interpretação, o que pode gerar controvérsias e haver dúvidas:

Toda actividad que implica la participación de los niños/as en la producción y comercialización de bienes o en la prestación de servicios, a personas naturales o jurídicas, que les impidan el acceso, rendimiento y permanencia en la educación o se realice en ambientes peligrosos, produzcan efectos negativos inmediatos o futuros, o se lleven a cabo en condiciones que afecten el desarrollo psicológico, físico, moral o social de los niños.

Oliva (2006, p. 86) definiu trabalho infantil:

[…] a expressão – trabalho infantil – deve ser entendida como aquela que abrange trabalho essencialmente PROIBIDO, realizado por crianças e adolescentes com idade inferior a 16 (dezesseis) anos, excepcionada apenas a situação em que o adolescente esteja vinculado a contrato de aprendizagem, a partir dos 14 (catorze) anos.

Em contrapartida, relacionou a expressão “trabalho adolescente” a atividades laborais permitidas para o adolescente, como se observa: “[…] optamos pela utilização da expressão – trabalho de adolescente – para designar o labor permitido, excepcionalmente a partir dos 14 (catorze) anos, na condição de aprendiz, e, em regra, somente a partir dos 16 (dezesseis) anos de idade” (OLIVA, 2006, p. 87).

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira O Programa Internacional para a Erradicação do Trabalho Infantil da Organização Internacional do Trabalho (OIT) também definiu o trabalho infantil que deve se abolido, devendo ser meta comum de todos os Estados-membros da organização e correspondente a alguma das seguintes formas: Un trabajo realizado por un niño o niña que no alcance la edad mínima especificada para un determinado trabajo y que, por consiguiente, impida probablemente la educación y el pleno desarrollo del niño o de la niña.

Un trabajo que se denomina trabajo peligroso porque, ya sea por su naturaleza o por las condiciones en que se realiza, pone en peligro el bienestar físico, mental o moral de adolescentes o niños y niñas que están por encima de la edad mínima para trabajar. Cualquiera de las incuestionablemente peores formas de trabajo infantil, que internacionalmente se definen como esclavitud, trata de personas, servidumbre por deudas y otras formas de trabajo forzoso, como el reclutamiento forzoso de niños para utilizarlos en conflictos armados, explotación sexual comercial y pornografía, y actividades ilícitas. (PROGRAMA INTERNACIONAL PARA LA ERRADICACIÓN DEL TRABAJO INFANTIL – IPEC, 2013)

Quanto ao grau de visibilidade oferecido à sociedade, o trabalho infantil pode ser percebido a simples vista, ou seja, os trabalhos de fácil visualização, nas ruas, feiras, artesanatos, na coleta de produtos recicláveis. Aquele trabalho infantil pouco visível, no qual se destacam os trabalhadores rurais, os trabalhadores têxteis clandestinos, os trabalhos de jardinagem. E, por fim, os trabalhos considerados ocultos, que é o caso, por exemplo, dos trabalhos domésticos (LITTERIO, 2012, p. 81-95). A expressão “trabalho infantil invisível” é incorreta e deveria ser trocada pela expressão “trabalho com menor visibilidade” por parte da sociedade ou por “crianças e adolescentes esquecidos”, pois não há trabalho infantil invisível, sendo mera justificativa de autoridades públicas para as formas de trabalhos infantis esquecidos pelas políticas públicas e não enfrentados da maneira correta. Quanto menos visíveis são os trabalhos, mais difícil é o combate (CUSTÓDIO; VERONESE, 2013). No que diz respeito à construção do conceito de adolescência, particularmente na elaboração de uma definição pelo tempo e sua distinção cultural, que difere de uma sociedade para outra, destaca-se a definição:

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

Cuando hablamos de adolescencia nos referimos a un periodo de la vida cuyo inicio está asociado al crecimiento corporal y a una serie de cambios que suceden a nivel psicológico, intelectual y social. La adolescencia es, ante todo, un concepto que se construye en el tiempo, en función de las características culturales propias de la sociedad que se desarrolla […]. (VIRGILI; VIRGILI, 2010, p. 128)

Conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu artigo 69, o trabalho a partir dos catorze anos está condicionado ao respeito à condição especial de pessoa em desenvolvimento e a capacitação profissional adequada ao mercado do trabalho (BRASIL, 1990).

Das definições de “trabalho infantil”, destaca-se que este é toda atividade laboral praticada abaixo da idade mínima permitida para determinado tipo de trabalho, podendo ser uma atividade econômica e/ou estratégia de sobrevivência, remunerada ou não, realizada por crianças ou adolescentes. Assim, no Brasil, as idades mínimas permitidas seriam de catorze anos para o trabalho de aprendiz, mediante regime próprio conforme a Lei 10.097, de 15 de dezembro de 2000, e de dezesseis anos para o trabalho adolescente, seguindo requisitos necessários. Na Argentina, a idade mínima para o trabalho é de dezesseis anos, com a exceção do trabalho em empresas familiares, que pode estar abaixo dessa idade. Já o Uruguai instituiu como idade mínima para começar a trabalhar quinze anos. Os três países instituíram como dezoito anos a idade mínima para o trabalho perigoso, noturno, insalubre, penoso ou para o trabalho em qualquer uma das denominadas “piores formas de trabalho infantil”. Qualquer trabalho que não respeite esses limites é considerado trabalho infantil. A proibição tem por finalidade não prejudicar a educação, o desenvolvimento físico, moral e mental das crianças e adolescentes. Ao se tratar da expressão “trabalho adolescente”, pode-se dispor como sendo toda atividade laboral permitida praticada entre a idade mínima no respectivo país e os dezoito anos de idade, por meio de regime próprio e com diversas peculiaridades, que devem ser respeitadas, pois se não houver o cumprimento dos requisitos para o seu funcionamento, o trabalho adolescente, que era permitido, será considerado trabalho infantil, uma forma de trabalho proibido. No que tange à exploração sexual comercial, uma modalidade de trabalho infantil, que pode ser sujeito qualquer criança ou adolescente, o requisito para tal prática é que a pessoa tenha menos de dezoito anos

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira e que seja explorada sexualmente mediante algum tipo de benefício. A Organização Internacional do Trabalho a definiu da seguinte forma:

La exploración sexual comercial infantil es la exploración por un adulto de un niño, niña o adolescente, menor de 18 años, acompañada del pago en efectivo o en especie al niño, niña o adolescente, o a un tercero o terceros (PROGRAMA INTERNACIONAL PARA LA ERRADICACIÓN DEL TRABAJO INFANTIL – IPEC).

Sendo esta uma forma de exploração econômica que viola direitos humanos e coloca o explorado em condições análogas a de escravo.

A exploração sexual comercial de crianças e adolescentes é definida como uma relação de mercantilização (exploração/dominação) e abuso (poder) do corpo de crianças e adolescentes (oferta) por exploradores sexuais (mercadores), organizados em redes de comercialização local e global (mercado) ou por pais, ou responsáveis, e por consumidores de serviços sexuais pagos (demanda). (LEAL; LEAL, 2005, p. 21-22)

A exploração sexual comercial é uma das formas de violência sexual, tendo o caráter econômico como característica principal. Para a Organização Internacional do Trabalho, as modalidades de exploração sexual comercial são as seguintes:

La utilización de niños y niñas en actividades sexuales remuneradas, en efectivo o en especie, (conocida comúnmente como prostitución infantil) en las calles o en el interior de establecimientos, en lugares como burdeles, discotecas, salones de masaje, bares, hoteles y restaurantes, entre otros; La trata de niños, niñas y adolescentes con fines de explotación sexual; El turismo sexual infantil; La producción, promoción y distribución de pornografía que involucra niños, niñas y adolescentes, y El uso de niños en espectáculos sexuales (públicos o privados). (PROGRAMA INTERNACIONAL PARA LA ERRADICACIÓN DEL TRABAJO INFANTIL – IPEC)

A exploração sexual comercial é uma atividade na qual se explora o corpo da criança ou do adolescente mediante uma contrapartida econômica, algum benefício ou uma facilidade, com viés econômico ou não, seguindo, na maior parte das vezes, a lógica do mercado. O benefício recebido pela

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

criança ou adolescente em contrapartida à exploração sexual comercial será utilizado para a satisfação de necessidades básicas para a sobrevivência ou para consumo, caracterizando-se por ser um tipo de trabalho infantil que, mediante a significativa exploração, é uma atividade que se considera “perversa, desprotegida e degradante” (THOMÉ, 2009, p. 17).

Por consenso geral entre organizações governamentais, organizações não governamentais e instituições internacionais, o termo “exploração sexual comercial” substituiu a expressão “prostituição infanto-juvenil”, devido ao termo prostituição ser utilizado em atividades na qual o sujeito é adulto, tendo condições de escolher a prática de tal atividade, diferentemente do que acontece com crianças e adolescentes que se encontram em situação peculiar de pessoa em desenvolvimento, em que o trabalho, em uma das piores formas de trabalho infantil, poderá ocasionar consequências ao desenvolvimento integral de crianças e adolescentes (BARROS, 2008, p. 88). Toda criança ou adolescente que é explorada sexualmente de forma comercial é vítima de violência, pois se encontra em processo de desenvolvimento, devendo ser protegida totalmente até completar o seu desenvolvimento integral. Como a situação de pobreza e de exclusão social descarta muitas oportunidades, as crianças e adolescentes buscam alguma forma de sobrevivência, sendo, inúmeras vezes, aliciadas para a exploração sexual comercial. A situação de pobreza ou de extrema pobreza, aliada à situação de desenvolvimento na qual as crianças e adolescentes se encontram, ocasiona a ocorrência de uma atividade extremamente prejudicial para o desenvolvimento integral. Assim, crianças e adolescentes exploradas sexualmente de forma comercial encontram-se em situação de desigualdade e de inferioridade, possuindo o explorador, adulto, maior poder em tal relação (SOUSA, 2008, p. 49).

A atração sexual por crianças e adolescentes se tornou desejo de consumo no atual mundo globalizado, em que se exploram sexualmente crianças e adolescentes como objeto altamente lucrativo (SERPA, 2009, p. 21-23). A produção, promoção e distribuição de pornografia que explora crianças e adolescentes também é uma forma de exploração sexual comercial. A internet é um meio de transmissão de tais dados. O uso dela tem prós e contras, interferindo nas relações em sociedade, estando relacionado ao trabalho, à família, às relações de amizade e a tarefas específicas. Além disso, a internet se encontra relacionada com a prática social, principalmente entre os adolescentes que estão descobrindo sua identidade pessoal e social. A prática social da internet surge como extensão da vida

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira como ela é, tendo efeito positivo no que tange ao aumento da possibilidade de interação social, mas tal efeito diminui a interação pessoal face a face, gerando relações menos estreitas e com maior privacidade, possibilitando maiores facilidades para a exploração de crianças e adolescentes em ambientes virtuais (CASTELS, 2003, p. 99-102).

As redes organizadas de exploração sexual comercial se vinculam a agências de turismo de forma articulada para a exploração de crianças e adolescentes, compreendendo “agências, bares, boates, hotéis, restaurantes, taxistas” (SERPA, 2009, p. 18). As redes organizadas de exploração sexual comercial exploram, com interesses econômicos, o tráfico de pessoas, que ocorre no âmbito nacional ou internacional, sendo considerada uma atividade ilegal e clandestina. Entre os traficados para fins de exploração sexual estão as crianças e os adolescentes de regiões de fronteira, que são oprimidas e violentadas visando garantir a lucratividade dos aliciadores, do crime organizado e dos traficantes de pessoas, sendo considerada uma forma moderna de escravidão, que alia as práticas sexuais forçadas, o trabalho forçado, a adoção irregular e o trabalho em condições análogas a de escravo. Pode-se afirmar que há uma relação entre a exploração sexual de crianças e adolescentes com o turismo. O problema ocorre, entre outros motivos, em decorrência da constante busca por turismo sexual no Brasil e da intensa movimentação de pessoas nas grandes cidades, nas fronteiras internacionais, no litoral e em outras cidades turísticas (SERPA, 2009, p. 18). Tratando-se de conceito para exploração sexual comercial, consideram-se todas as formas de exploração de crianças e adolescentes em atividades de caráter sexual ou pornográfica, que sejam remuneradas ou a maneira de sobrevivência daquela pessoa humana em situação de pobreza ou extrema pobreza. Tal forma de trabalho infantil é combatida de maneira especial pela Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e enfrentada pelos países em questão.

Portanto, tanto no Brasil quanto na Argentina e no Uruguai, quando qualquer pessoa com menos de dezoito anos, criança ou adolescente, do sexo masculino ou feminino, for explorada sexualmente de forma comercial, incorrerá em uma das formas de trabalho infantil, que é denominada, mais especificamente, exploração sexual comercial. Assim, cabe frisar que o explorado, neste caso, é qualquer pessoa que tenha menos de dezoito anos de idade e tenha sido explorado em atividades sexuais comerciais. Toda e qualquer criança e adolescente tem como direito fundamental o de não trabalhar em qualquer uma das piores formas de trabalho infantil da Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho, nela

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

incluídas as formas de exploração sexual comercial. O direito de não trabalhar visa garantir o desenvolvimento físico, mental, social, psicológico e intelectual das crianças e dos adolescentes.

A infância é um período no qual a pessoa encontra-se em desenvolvimento humano, sofrendo transformações biológicas, psíquicas, morais e socioculturais. De suma importância é a garantia do desenvolvimento integral das crianças e adolescentes nessas fases que precedem a vida adulta, para que nesta esteja garantido o pleno desenvolvimento da cidadania. O direito a não trabalhar existe para que as crianças e adolescentes possam estudar e brincar, bem como se desenvolver integralmente, sem haver obrigações e responsabilidades prematuras, que não são suas e, em regra, são da família, da sociedade e do Estado, responsabilidade tripartite na garantia do desenvolvimento integral. Oliveira (1992, p. 82) defende que “o não trabalho não é ócio pernicioso, mas deve ser preenchido com a educação, com a frequência à escola, com o brinquedo, com o exercício do direito de ser criança”. O autor defende o direito de ser criança, ou seja, o direito de estar em um período no qual o que se deve garantir e o que é necessário são a educação e as brincadeiras. A exploração de crianças e de adolescentes no trabalho infantil é prejudicial à educação e à recreação destes, afetando sobremaneira o desenvolvimento físico, psicológico e da personalidade, pois estes não estão preparados para tais atividades:

La actividad laboral aleja a los niños de la educación y, de ese modo, perpetúa su situación de pobreza que es la causa que normalmente los conduce a trabajar. Por otro lado, la falta de recreación los convierte en individuos que crecen salteando etapas fundamentales para su futuro desarrollo psicológico. Ambas falencias, obviamente, conspiran contra el desarrollo íntegro de su personalidad. (LITTERIO, 2010, p. 346)

Todavia, a não observância ao direito a não trabalhar, havendo a ocorrência da exploração sexual comercial, trará consequências, tornando-se um problema que afetará os direitos fundamentais e humanos das crianças e dos adolescentes como a educação, a saúde, a profissionalização, a dignidade, a recreação, a cultura, entre outros. Assim, o direito a não trabalhar, ou melhor, o direito de não ser explorado sexualmente, de que é titular toda criança e adolescente, está associado a todos os direitos de sua titularidade como pessoa em desenvolvimento, pois, quando aqueles estão sendo explorados, as atividades ora

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira referidas são prejudicadas, afetando o futuro de crianças e adolescentes e causando-lhes consequências irreparáveis. Portanto, para assegurar o direito à recreação e o direito a estudar, há de estar assegurado o direito a não ser explorado, pois aqueles somente poderão ser respeitados se este for, caso contrário, nenhum direito será respeitado. Juntamente ao direito a não trabalhar, quando se fala em direitos de crianças e adolescentes e seus princípios, destacam-se os princípios da prioridade absoluta e da proteção integral, a que fazem jus toda criança e adolescente.

Os referidos princípios buscam garantir todos os direitos das crianças e adolescentes previstos nas normas internacionais, entre as quais a Convenção sobre os Direitos das Crianças, da Organização das Nações Unidas, e as Convenções 138 e 182, da Organização Internacional do Trabalho, que devem ser garantidos pelos Estados signatários destas; e nas normas nacionais, entre as quais a Lei 26.061/08 da Argentina, chamada Lei de Proteção Integral dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes, a Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente no Brasil.

Assim, diversos direitos podem ser afetados se não for assegurada a proibição do trabalho infantil, não sendo respeitados os direitos à saúde, à dignidade, à educação, à profissionalização, à liberdade, à alimentação, ao respeito, à convivência familiar, à cultura e a outros mais. Então, para se garantir todos os direitos fundamentais e humanos que possuem as crianças e os adolescentes, bem como cumprir com os tratados internacionais, é de suma importância a busca pela erradicação do trabalho infantil. Devem ser assegurados, também, os princípios do respeito à peculiar condição da pessoa em desenvolvimento e da igualdade entre crianças e adolescentes exploradas pelo trabalho infantil e não explorados. Ambos têm como uma de suas finalidades a proteção contra o trabalho infantil, sendo que o primeiro visa proteger a condição especial de desenvolvimento que se encontra a pessoa humana na infância e o segundo possui a intenção de buscar a igualdade entre crianças e adolescentes, evitando situações de desigualdade entre os que exercem atividades de trabalho infantil e os que não exercem tais atividades irregulares (MACHADO, 2003, p. 411-412). A dignidade da pessoa humana deve ser respeitada como fundamento do Estado Democrático de Direito, princípio a ser garantido desde a infância. Nos casos de exploração sexual comercial, as crianças e adolescentes explorados têm sua dignidade desrespeitada, o que causa impactos negativos ao desenvolvimento integral (MACHADO, 2003, p. 79-194).

Capítulo 6 AS CAUSAS DA EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL

O

trabalho infantil possui causas complexas, entre as quais se observa que tal atividade pode ser ocasionada pela situação de pobreza ou de extrema pobreza, pela cultura permissiva da sociedade a tal atividade, em decorrência de problemas de educação, da falta de compreensão da sociedade, dos mitos que são reproduzidos por esta, por problemas de gestão de políticas públicas, pela falta de políticas públicas eficazes, pela dificuldade de articulação dessas políticas públicas em regiões de fronteira, pela exploração de crianças e adolescentes originada pelo modelo capitalista, pela fome, pela situação de dependência química. No artigo que buscou identificar o perfil ocupacional do trabalho infantil no município de Pelotas (Rio Grande do Sul – Brasil), Facchini e outros ([s.d.]) identificaram a pobreza como a maior causa para o trabalho infantil, pois quanto mais baixa era a remuneração das famílias, maior a incidência de crianças e adolescentes trabalhando e maior a importância da remuneração para contribuir na manutenção das despesas familiares. A pobreza encontra-se significativamente presente em todo o mundo, possuindo destaque negativo na América Latina devido à desigualdade econômica ser mais intensa. As famílias pobres geralmente têm menos acesso à educação, o que dificulta o desenvolvimento e acaba por resultar na prática do trabalho infantil. As famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza tendem a explorar as crianças e adolescentes de suas famílias no trabalho infantil, o que os afasta do ensino escolar, resultando na continuidade do ciclo intergeracional da pobreza daquela família. Sen (2000, p. 123-146) destaca que a pobreza não deve ser vista somente como baixa renda; para ele a pobreza compreende também outros

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira fatores, como: o desemprego, as desigualdades, a falta de acesso à saúde, a alta mortalidade, as diversas formas de discriminação, a exclusão social, entre outros fatores que dificultam a inserção social, privando a capacidade da população. Certamente, a pobreza é uma das principais causas para o trabalho infantil, sendo que somente com a efetivação dos direitos das crianças e dos adolescentes, mediante políticas públicas que garantam o seu desenvolvimento integral, revertendo-se a exclusão causada por problemas de extrema pobreza e de desigualdade social, se conseguirá reverter a significativa exploração de mão de obra infantil (CASSOL, 2008, p. 77).

A cultura permissiva difere de um lugar para outro, afetando na aceitação ou não do trabalho infantil, por consequência, existem lugares mais permissivos que outros para cada atividade. Em algumas regiões dos países em questão, a exploração sexual comercial é mais visível, principalmente onde há incidência de exploração sexual comercial em locais turísticos e em fronteiras. É inegável que existam muitas pessoas que defendam a prática do trabalho infantil por acreditarem, sem um conhecimento aprofundado sobre o tema, que a referida atividade pode ser benéfica, porém os defensores em questão desconsideram as nefastas consequências do trabalho infantil, utilizando-se de mitos para justificar as práticas em questão. A Organização Internacional do Trabalho atua no combate das “justificativas” utilizadas pela população para continuar a atividade de trabalho infantil e promovendo direitos humanos de crianças e adolescentes, enfrentando por meio de exposição de cartilhas e manuais alguns discursos de dominação: “Crianças e jovens (pobres) devem trabalhar para ajudar a família a sobreviver”; “Criança que trabalha fica mais esperta, aprende a lutar pela vida e tem condições de vencer profissionalmente quando adulta”; “O trabalho enobrece a criança. Antes trabalhar que roubar”; “trabalho é um bom substituto para a educação” (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 2001). Custódio e Veronese (2013, p. 93-108) denominam “mitos” os argumentos utilizados por considerável parte da população para “justificar” a ocorrência de trabalho infantil como forma de exploração: “O primeiro mito: é melhor trabalhar do que roubar”; “O segundo mito: o trabalho da criança ajuda a família”; “O terceiro mito: é melhor trabalhar do que ficar nas ruas”; “O quarto mito: lugar de criança é na escola”; “O quinto mito: trabalhar desde cedo acumula experiência para o futuro”; “O sexto mito:

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sexual comercial de crianças e adolescentes

é melhor trabalhar do que usar droga”; “O sexto mito: trabalhar não faz mal a ninguém”. Tais afirmativas são consideradas mitos por não condizerem com a realidade, criando a ilusão de que o trabalho infantil contribuiria para a solução dos problemas atinentes à pobreza e à formação da pessoa humana, tentando justificar o injustificável, devido a uma cultura permissiva ao trabalho infantil que se prolifera na sociedade, fruto do modelo capitalista dominante, que em muito contribui para as desigualdades e exclusões, mas que não soluciona nenhum dos problemas acima citados (CUSTÓDIO; VERONESE, 2013, p. 93-108).

O aspecto cultural favorável ao trabalho infantil é um problema, pois muitas pessoas acreditam que o trabalho prematuro é benéfico e ajude no desenvolvimento das crianças e dos adolescentes, um argumento de dominação utilizado desde o Brasil Colônia e que permanece na atual exploração globalizada de crianças e adolescentes, decorrente do modo de produção capitalista:

Aliado ao fator econômico, a questão cultural e a crença que trabalhar seja sempre bom são apontadas pelos especialistas como os mitos que legitimam o trabalham infantil no Brasil. Essa questão cultural tem origem na cultura escravocrata brasileira, de que trabalhar contribuiria para a formação do caráter e protegeria a pessoa do ócio e da marginalidade. (CAVALCANTE, 2011, p. 39)

O desenvolvimento de políticas de promoção de direitos que permitam a compreensão das consequências do trabalho infantil e a posterior conscientização dos prejuízos que tal atividade produz, são tarefas que vão depender da educação e da informação e levaram tempo para a sua concretização. Os problemas educacionais são fatores que levam ao trabalho infantil. A falta de cobertura, qualidade e cumprimento da obrigatoriedade da educação podem afastar a criança e o adolescente da escola.

O trabalho infantil também pode ser causado pela necessidade de sobrevivência daqueles que estão em situações de vulnerabilidade econômica, permanecendo em condições de pobreza ou de extrema pobreza.

A dominação capitalista contribui para a ocorrência da exploração do trabalho infantil e, por consequência, da exploração sexual comercial, pois mantém um ciclo de pobreza e de exploração. Para Marx e Engels (2003, p. 26), a dominação oriunda do capitalismo decorre dos desejos burgue-

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira ses sobre os proletários, originando uma forma de viver em sociedade, que explora aqueles que não se encontram em situação de dominação, em que permanecerá uma constante oposição entre opressor e oprimido, permanecendo classes em conflito até a “reconstituição revolucionária de toda a sociedade ou pela destruição das classes em conflito”. Assim, “A sociedade global divide-se cada vez mais em dois campos hostis, em duas grandes classes que se defrontam – a burguesia e o proletariado” (MARX; ENGELS, 2003, p. 26-27). A burguesia orienta como deve ser a vida em sociedade, explorando quem quer que seja, oprimindo a classe dominada, que pratica atividades laborais para buscar viver em um capitalismo feroz, tendo também prejudicado as relações familiares, pois “A burguesia rasgou o véu sentimental da família, reduzindo as relações familiares a meras relações monetárias” (MARX; ENGELS, 2003, p. 28), em que se exploram até mesmo crianças e adolescentes com fins econômicos (MARX; ENGELS, 2003, p. 26-29). Deve-se destacar que “As ideias dominantes de uma época são sempre as ideias da classe dominante” e que “um fato é comum a todas as épocas, isto é, a exploração de uma parte da sociedade por outra” (MARX; ENGELS, 2003, p. 44-45). Assim, a ideia de uma cultura permissiva ao trabalho infantil e a instituição de mitos favoráveis a tal tipo de trabalho é desejo da classe dominante, o que contribui para exclusão e para discriminação, permanecendo o modelo de dominação. A burguesia possui o controle dos meios de produção e dos meios de comunicação, expondo sua ideologia como forma de multiplicação do capital, ditando as regras de convivência em sociedade, desde a infância (MARX; ENGELS, 2003, p. 44-46).

Dessa forma, o modelo de dominação decorrente do capital, em uma sociedade extremamente consumista, gera as mais diversas necessidades econômicas para as famílias, o que ocasiona as mais diversas formas de exploração, entre as quais a sexual, na busca pelo dinheiro para se conseguir obter as necessidades econômicas.

Com o advento da globalização, a dominação capitalista passou a ter características globais, se impondo a sociedade um modelo de vida sem qualidade e com muita velocidade. O modelo capitalista propicia maior exploração e garante os interesses dos detentores do poder econômico, que necessitam defender esse modelo como o ideal, incentivando o consumismo e a movimentação financeira, principalmente das pessoas pobres, classe que dificilmente almejará transformação das condições sociais e que é a mais explorada pelo sistema econômico excludente (SANTOS, 2001, p. 17-18).

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

Com a globalização, a competitividade é feroz, sem haver espaço para a compaixão; a intenção gerada pelo capitalismo é de que deverá, “a todo custo, que vencer o outro, esmagando-o, para tomar seu lugar” (SANTOS, 2001, p. 46). A competitividade encontra-se em todo lugar, seja entre empresas do mesmo ramo, seja entre pessoas disputando melhores condições de vida, seja entre cidades buscando benefícios econômicos, seja entre alunos nos bancos escolares buscando seus benefícios em prejuízo de colegas com maiores dificuldades, mas que estão concorrendo pelo mesmo lugar. Buscam-se valores ou vantagens individuais, benefícios próprios que prejudicam a coletividade, diminuindo a solidariedade. O consumismo acaba exercendo um controle sobre a população; na verdade, seria como uma padronização de como se deve viver, de como se deve portar-se e desenvolver-se, uma unificação em decorrência do capitalismo, com soluções únicas e idealizadas, que decorrem da competitividade constante e do consumismo agressivo (SANTOS, 2001, p. 46-55).

A velocidade da instituição de novas técnicas, que decorre da constante competitividade, causou desigualdades e exclusão social para aqueles que não conseguiram ou não puderam se adequar a essas inovações, política que aumenta o poder dos dominantes, assim como aumenta a alienação de parte da população que não consegue cumprir tais exigências. Essas tendências consumistas geram escassez constante, pois muitos jamais estarão satisfeitos com o que possuem e outras jamais terão acesso a certos produtos por se encontrarem em uma classe social às margens de alguns produtos escassos. A velocidade de invenção de novos produtos é muito alta, o que gera uma competitividade enorme, com publicidade de empresas, gerando desejos para muitos dos membros da sociedade (SANTOS, 2001, p. 117-131).

A adequação aos modelos padronizados decorrentes de um capitalismo globalizado gera desejos por parte das pessoas, para conseguirem se adequar às padronizações globais, que são excludentes e demonstram os modos de conviver em sociedade. A desigualdade e a exclusão social originadas pela globalização trazem prejuízos desde a infância, gerando, entre outras consequências graves, a exploração sexual comercial pelo mercado. O mercado não possui limites morais; no mundo de hoje, as mais diversas coisas ou serviços são comercializados pelo mercado. “Vivemos numa época em que quase tudo pode ser comprado e vendido. Nas três últimas décadas, os mercados – e os valores de mercado – passaram a go-

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira vernar nossa vida como nunca. Não chegamos a essa situação por escolha deliberada” (SANDEL, 2013, p. 11). Sem nenhuma moralidade, adultos exploram sexualmente de forma financeira crianças e adolescentes, para garantir os seus “desejos”, se beneficiando de estarem detendo o capital, em relação a uma pessoa que se encontra necessitada do valor financeiro para o seu sustento e para tentar enfrentar a situação de exclusão social, tendo afetado a garantia do desenvolvimento integral, para buscar a oportunidade de consumir para a subsistência. Essa relação de exploração comercial sexual coloca as crianças e adolescentes em uma situação semelhante à de mercadoria, pois se pode afirmar que: “Na sociedade de consumidores, ninguém pode se tornar sujeito sem primeiro virar mercadoria […]” (BAUMAN, 2008, p. 20). A transformação de sujeitos em mercadoria tem relação com a exploração sexual comercial. As crianças e os adolescentes sujeitados ao mercado da exploração sexual comercial têm seus direitos como sujeitos prejudicados devido ao tratamento que lhes é dado pela exploração econômica que se assemelha a de um objeto ou de uma coisa. As crianças e os adolescentes são transformados em coisas que são compradas para a satisfação dos desejos sexuais do agressor.

[...] todo ato ou omissão praticado por pais, parentes ou responsáveis contra crianças e/ou adolescentes que – sendo capaz de causar dano físico, sexual e/ou psicológico à vítima – implica, de um lado, uma transgressão do poder/dever de proteção do adulto e, de outro, uma coisificação da infância, isto é, uma negação do direito que crianças e adolescentes têm de ser tratados como sujeitos e pessoas em condição peculiar de desenvolvimento (GUERRA, 2001, p. 32-33).

O adultocentrismo também é uma causa para a exploração sexual comercial, prática que ocorre desconsiderando a importância das crianças e dos adolescentes devido às necessidades dos adultos. Os adultos são o centro da importância e das necessidades, diminuindo a importância de outras categorias, como os idosos e as crianças e os adolescentes. As crianças e os adolescentes não possuem as mesmas possibilidades de defesa dos adultos, sendo mais facilmente explorados pelo mercado, fator que gera a necessidade de proteção integral. Já os adultos são os que possuem o poder, restringindo liberdades e impondo a submissão de crianças e adolescentes.

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

O atual modelo capitalista prima pela exclusão, discriminação e exploração. Althusser (1969, p. 17-21) tratou de demonstrar a reprodução desse modelo por meio de aparelhos ideológicos. Estes são realizados por diversos mecanismos com tal finalidade. A reprodução da força de trabalho é um deles, se fazendo mediante a necessidade de o indivíduo trabalhar para obter um salário que possibilite a sobrevivência de sua família. A reprodução da força de trabalho é bem mais complexa do que parece, iniciando no sistema escolar, com a formação básica para uma estrutura capitalista, que faz com que o indivíduo em formação aprenda que deve estudar para, posteriormente, trabalhar e ser disciplinado, possibilitando a sua sobrevivência e a da sua família, conforme a lógica capitalista de submissão, desestimulando o desenvolvimento crítico humano, que motivaria o questionamento do modelo dominante.

[…] a reprodução da força de trabalho exige não só uma reprodução da qualificação desta, mas, ao mesmo tempo, uma reprodução da submissão desta às regras da ordem estabelecida, isto é, uma reprodução da submissão desta à ideologia dominante para os operários e uma reprodução da capacidade para manejar bem a ideologia dominante para os agentes da exploração e da repressão, afim de que possa assegurar também, «pela palavra», a dominação da classe dominante. (ALTHUSSER, 1969, p. 21-22)

Portanto, a reprodução da força de trabalho busca, por intermédio de várias instituições da sociedade, “a reprodução da «qualificação» desta força de trabalho, mas também a reprodução da sua sujeição à ideologia dominante ou da «prática» desta ideologia” (ALTHUSSER, 1969, p. 22-23). No discurso da Convenção Rio +20, Mujica (2012) expôs sobre um problema da atualidade, que é o desenvolvimento de uma sociedade baseada no mercado e no hiperconsumo, onde há uma competição desenfreada gerada pelo capitalismo, se questionando se a política governa o mercado, bem como a globalização, ou se o mercado não possui limites. O governante uruguaio também questiona o modelo de civilização que se adotou, concluindo que o desenvolvimento da sociedade, assim como a proteção ao meio ambiente, deve ser a favor da felicidade humana e nunca a favor da competição gerada pelo mercado.

Assim, a sujeição ao modelo dominante contribui para a necessidade das famílias trabalharem e consumirem, de forma que, muitas vezes, se

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira explore o trabalho infantil para garantir o consumo da família, mesmo que para atender às suas necessidades básicas.

Nesse ínterim, a globalização, que age no sentido de garantir os interesses capitalistas, origina exploração, exclusão social, desigualdades, competitividade e discriminação, contribuindo para o trabalho infantil, originadas pelas formas de exploração capitalista, que ocasiona a necessidade de sobrevivência humana. Tal ciclo é mantido constantemente, havendo dificuldade de que as famílias que se encontram exploradas consigam sair de tal situação. A reprodução da situação de exploração de classes, fator que é um desejo dos dominantes, garante a possibilidade de uma ideologia de dominação pela classe que se encontra no poder. Em pesquisa sobre exploração sexual comercial com meninas, Cerqueira-Santos ([s.d.], p. 8) demonstrou a relação da submissão de crianças e adolescentes à exploração sexual comercial com a utilização de drogas. Na entrevista, foi exposto que 36% dos entrevistados realizaram relações sexuais a fim de obter dinheiro para a utilização de drogas e outros 8% realizaram sexo oral com a mesma finalidade. Portanto, 44% dos entrevistados foram explorados sexualmente de forma comercial em troca de dinheiro para comprar drogas. A dependência química de crianças e adolescentes é gerada nos ambientes de exploração sexual comercial ou em decorrência da busca por refúgio em uma situação de exclusão social, sendo uma das causas do trabalho infantil.

Na pesquisa em discussão, 53,3% dos entrevistados descobriram que poderiam ganhar dinheiro em troca de sexo por intermédio de amigas e 38,6% mediante aliciador. Entre os demais destinos do valor, os entrevistados relataram que iriam: “comprar objetos”, “sustentar-se”, “ajudar a família”, “doar para alguém”, “sustentar a família”, todas elas necessidades de consumo (CERQUEIRA-SANTOS, [s.d.], p. 13). Antes de serem exploradas sexualmente, muitas das crianças e adolescentes sofrem algum tipo de abuso sexual no ambiente familiar e, por terem restrito acesso aos serviços básicos de saúde e educação, acabam sendo explorados sexualmente de forma comercial. Assim, a violência intrafamiliar também é um fator que pode ocasionar a exploração sexual comercial (MORAES, 2009, p. 111).

O Plano Nacional para a Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção do Adolescente Trabalhador da Argentina descreveu as causas identificadas para o trabalho infantil, demonstrando os principais

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sexual comercial de crianças e adolescentes

fatores que causam o trabalho infantil e no que consiste cada um deles. Primeiramente, para o governo argentino, os fatores econômicos são a principal causa para o trabalho infantil, incluindo nesta a falta de emprego, os salários insuficientes e a má distribuição de renda, fatores que acabam ocasionando e reproduzindo a pobreza, bem como obrigam as famílias a buscar as mais diversas formas para garantir suas necessidades para a sobrevivência, fato que contribui para o trabalho prematuro de crianças e de adolescentes (ARGENTINA, 2011, p. 23).

Fatores políticos também são considerados causas para o trabalho infantil na Argentina, havendo grande instabilidade política e falta de políticas públicas para modificar a atual situação de exploração de crianças e adolescentes, prejudicando os direitos destes e reproduzindo a pobreza em escala difícil de ser contida (ARGENTINA, 2011, p. 23). Por último, o plano demonstra os fatores culturais, que acabam multiplicando atitudes permissivas às práticas de trabalho infantil, por meio de uma valoração social positiva a tais práticas, reproduzindo os mitos sobre o trabalho infantil (ARGENTINA, 2011, p. 23). O principal motivo para a ocorrência de trabalho infantil descrito no Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente Trabalhador do Brasil foi a significativa desigualdade social existente no país:

A principal explicação para tanto se encontra na manutenção das estruturas socioeconômicas que levaram o Brasil a ser reconhecido mundialmente como um dos países com os maiores índices de desigualdade social, expressos na concentração de renda nas classes economicamente protegidas. No fim dos anos 80, o Banco Mundial elencava a desigualdade social brasileira como a segunda pior do mundo, só perdendo para a de Serra Leoa. Naquela década, 49,6% da renda nacional pertenciam aos 10% mais ricos da população, e apenas 13,8% da renda eram divididos entre os 50% mais pobres. (BRASIL, 2011, p. 12)

As causas para o trabalho infantil foram sistematicamente descritas no plano nacional brasileiro. A primeira causa seria a desigualdade social e a concentração de alta renda nas mãos de poucos, ciclo que persiste com o crescimento econômico dos últimos anos, mesmo que se busquem políticas públicas para melhor distribuição de renda e para inserção dos adultos

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira das famílias que se encontram em situação de pobreza ou extrema pobreza no mercado de trabalho. Como ainda há dificuldade para que se consiga proporcionar tais políticas a certas pessoas, acaba que essas famílias obrigam suas crianças e adolescentes a trabalharem, para que se tenha uma fonte de renda, gerando trabalho infantil, e permanecendo a situação de exclusão social daquelas famílias por gerações (BRASIL, 2011, p. 21). O fator cultural também é uma das causas descritas, pois, historicamente no Brasil, “o trabalho é entendido como fator positivo para crianças em condições de pobreza, exclusão e risco social”, havendo uma cultura de exploração de tal mão de obra, em que, erroneamente, parte da sociedade acredita que o trabalho irá ajudar a criança ou o adolescente que está trabalhando indevidamente, sendo que na verdade se está prejudicando o desenvolvimento integral da pessoa humana (BRASIL, 2011, p. 21). Dificuldades para o combate e fiscalização agravam o problema, pois existem alguns tipos de trabalho infantil que, por ser um trabalho envolvendo atividades ilegais ou que estejam na esfera da família, como é o caso da exploração sexual comercial e do trabalho infantil doméstico, são mais difíceis de serem enfrentados (BRASIL, 2011, p. 22). O plano também cita a dificuldade de prevenção e fiscalização do trabalho infantil tendo em vista a falta de recursos, de efetivo e de infraestrutura dos Conselhos Tutelares, além da baixa capacitação dos administradores públicos e do sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente (BRASIL, 2011, p. 22).

A falta de melhor articulação entre os programas, políticas e planos na área da infância são obstáculos para a erradicação do trabalho infantil no Brasil, como acontece: com a “dificuldade de acesso à aprendizagem e ao trabalho protegido”; com as “crianças encontradas em situação de trabalho pela Fiscalização do MTE, pelo Ministério Público do Trabalho e pelos Conselhos Tutelares não são atendidas a contento pelo PETI-Bolsa Família”; ou nos “casos em que crianças de famílias beneficiárias de transferência de renda permanecem ou retornam à situação de trabalho infantil” (BRASIL, 2011, p. 22). A falta de acesso universal à educação brasileira, a dificuldade de o Estado proporcionar uma educação de qualidade e a baixa escolaridade de muitas pessoas de referência da unidade familiar influenciam a ocorrência do trabalho infantil. O plano brasileiro demonstra as inúmeras dificuldades enfrentadas no combate ao trabalho infantil, expondo a constante bus-

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sexual comercial de crianças e adolescentes

ca por uma legislação adequada e por políticas de enfrentamento a essa exploração (BRASIL, 2011, p. 22).

Uma das principais causas para o trabalho infantil no Brasil é a ausência de estratégias específicas para sua erradicação nas políticas públicas educacionais, pois, possibilitando o acesso e a permanência na escola, estar-se-á prevenindo o trabalho infantil. Reis (2010, p. 160) defende a educação como forma de promoção dos direitos humanos de crianças e adolescentes, também surgindo como medida para tentar modificar a atual realidade de exploração de crianças e adolescentes, defendendo que A educação em direitos humanos abrange não apenas as atividades costumeiras da educação, como a leitura, a escrita e a aritmética, mas também envolve o fortalecimento da capacidade de usufruir e de construir uma cultura em que prevaleça o exercício de todos os direitos humanos. (REIS, 2010, p. 160)

A ausência de políticas públicas de atendimento integral à infância é um fator que causa a exploração sexual comercial. Para a garantia de um atendimento integral a crianças e adolescentes, seria necessária a disponibilização de uma rede de serviços universais de educação em todas as idades, de saúde, de assistência social básica e especializada, de esporte e de cultura.

A partir da análise dos dados, pode-se afirmar que a exploração sexual tem como causas: 1) a desigualdade econômica e social nos países da América Latina; 2) a insuficiência das estratégias de políticas públicas para o enfrentamento à exploração sexual comercial; 3) a persistência dos mitos culturais em torno do trabalho infantil; 4) a situação de pobreza e de extrema pobreza familiar e o ciclo intergeracional da pobreza; 5) a dificuldade de articulação entre políticas públicas nacionais e internacionais em regiões de fronteira; 6) a globalização, o hiperconsumismo, a imoralidade do mercado e a competitividade capitalista desenfreada; 7) a dependência química ou outras dependências na infância; 8) a exclusão social; 9) a violência sexual intrafamiliar; 10) a falta de acesso à escola e a evasão escolar; 11) a falta de assistência social e demais formas de inclusão social; 12) a falta de melhor distribuição de renda; 13) o adultocentrismo; 14) a coisificação de crianças e adolescentes; 15) a discriminação e o preconceito.

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira Portanto, diversos são os fatores que ocasionam a exploração sexual comercial e que devem ser combatidas. Observou-se que muitas delas decorrem da exploração capitalista no atual mundo globalizado, que origina pobreza, desigualdades sociais e exorbitantes diferenças de renda. A política deve cumprir importante papel na modificação de tal situação, inserindo e administrando planos que possam melhor distribuir a renda e enfrentar a exploração sexual comercial, assim como diminuir as situações de pobreza e exclusão social, visando à prevenção e à erradicação de todas as formas de trabalho infantil.

Capítulo 7 AS CONSEQUÊNCIAS DA EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL

A

s crianças e os adolescentes vivenciam períodos de intenso desenvolvimento humano, sofrendo transformações biológicas, psíquicas, morais e socioculturais, estando em situação peculiar de pessoa em processo de desenvolvimento. De suma importância é a garantia do desenvolvimento integral durante a infância, para que nesta fase esteja garantido o pleno desenvolvimento físico, mental, social, psicológico, moral e da cidadania. O trabalho infantil acaba prejudicando múltiplos direitos fundamentais próprios da criança e do adolescente, dentre eles: a educação, a recreação, o lazer, a saúde, o desenvolvimento integral, a brincadeira, o esporte, a cultura.

O direito de não trabalhar é um direito fundamental que se não for assegurado pode interferir no desenvolvimento físico e mental: Ao estabelecer a idade mínima de admissão ao emprego ou ao trabalho, o ordenamento jurídico confere as crianças e adolescentes menores de dezesseis anos o direito fundamental de não trabalhar, pois, nesse estágio do desenvolvimento humano, o trabalho interfere negativamente, impondo cargas psicobiológicas que a pessoa não pode suportar sem prejuízo do seu desenvolvimento físico, mental e intelectual. (GOULART, 2005, p. 16)

O trabalho infantil pode incidir negativamente na saúde e na educação, gerando prejuízos ao desenvolvimento integral de crianças e adolescentes:

El trabajo perjudica al niño no solamente en su aspecto físico, el cual se ve deteriorado en profundidad por la realización de actividades en

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira una etapa de la vida exclusivamente destinada al juego, al estudio, al desarrollo corporal y de la personalidad, sino también en su aspecto afectivo y emocional. La contextura física del niño no es apta para realizar ninguna tarea destinada a un adulto. En todos los casos, aunque en algunos más que en otros, el trabajo perturba seriamente su desarrollo y los daños son mayores cuando se trata de manipular substancias tóxicas, instrumentos cortantes, de trabajar en lugares subterráneos o en cualquiera actividad peligrosa. (LITTERIO, 2012, p. 95)

Tanto o desenvolvimento físico quanto o psíquico e o intelectual de crianças e adolescentes não estão concluídos antes da vida adulta, fato que justifica a proibição do trabalho infantil e a proteção do trabalho adolescente, tendo em vista que o trabalho poderá causar-lhes muitos prejuízos para o seu desenvolvimento integral (ARGENTINA, 2011, p. 24). Além das consequências para a saúde, o trabalho infantil traz consequências para a educação. A educação é um direito básico de toda criança e adolescente e ela permite que o indivíduo se insira adequadamente na sociedade, possibilitando a modificação pessoal da situação de exclusão social. A educação e a distribuição de renda permitem que as pessoas possam enfrentar o modelo capitalista discriminatório, sendo uma forma de inclusão social, que pode permitir ao indivíduo, na vida adulta, sair da situação de pobreza. O trabalho infantil produz muitos impactos na educação de crianças e de adolescentes. As dificuldades de um ser humano que se encontra em situação de desenvolvimento em conseguir estudar e trabalhar ao mesmo tempo são imensas, podendo ocasionar até mesmo enfermidades. Além disso, somam-se o abandono escolar, as ausências constantes, o cansaço, os atrasos para as aulas, o baixo rendimento e a repetência escolar (ARGENTINA, 2011, p. 26).

O trabalho infantil traz consequências à educação e ao desenvolvimento intelectual da criança e adolescente, que se encontra em processo de desenvolvimento, prejudicando a saúde física e mental, bem como causando exclusão social, o que afeta o desenvolvimento social e a autoestima (URUGUAI, 2003, p. 5). Do ponto de vista econômico, o trabalho acaba perpetuando a situação de pobreza da família, pois impede as possibilidades de enfrentamento da pobreza, mantendo a situação de exclusão. As investigações no Uruguai demonstram que a escolaridade dos pais influencia na situação socioeco-

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sexual comercial de crianças e adolescentes

nômica das crianças e dos adolescentes da família. Dessa maneira, com o trabalho infantil, as crianças e os adolescentes se encontram distantes do sistema educacional ou não conseguem um desempenho a contento, desperdiçando a possibilidade de terem uma vida digna no futuro, fato que reproduz a situação de pobreza em que se encontram (URUGUAI, 2003, p. 5-6). Sousa (2008, p. 47-48) destaca que “O ciclo vicioso de violência, pobreza, exclusão e discriminação perpetua a violação dos direitos da criança e confina o mais vulnerável à exploração sexual”. Nesse sentido, a autora indica que a pobreza da população brasileira, decorrente do modelo econômico globalizado, combinada com a exclusão social, impacta sensivelmente na ocorrência da exploração sexual comercial.

O trabalho infantil influi na renda ao longo da vida adulta, demonstrando que, quanto mais precoce é a entrada no mercado de trabalho, mais baixa será a renda no decorrer da vida, proporcionando a permanência de altos graus de desigualdade social (BRASIL, 2011, p. 21).

Além disso, o trabalho infantil possui uma relação muito estreita com o trabalho escravo. Em pesquisa sobre o perfil do trabalhador escravo rural no Brasil, foi comprovado que 92% dos trabalhadores libertados do trabalho escravo foram explorados no trabalho infantil durante a infância (REPÓRTER BRASIL, 2013, p. 8-9). Na exploração sexual comercial poderá ocorrer o cerceamento da liberdade e prejuízos para a dignidade da criança e do adolescente, havendo a exploração sexual mediante uma contraprestação financeira em benefício de um terceiro, configurando, além da atividade de trabalho infantil, uma atividade de trabalho escravo. Essa prática poderá se efetuar durante a infância e permanecer durante a fase adulta, trazendo inúmeras consequências para o desenvolvimento digno como ser humano. Portanto, a exploração do trabalho infantil perpetua o “círculo vicioso da pobreza”. Tal situação se reproduz nas famílias que não tiveram a devida escolarização no período da infância, obrigando-as a ingressar no mercado de trabalho em postos de trabalho precários e com baixa remuneração, o que não possibilita a garantia das necessidades básicas de uma família. O ingresso prematuro de crianças e adolescentes dessas famílias no mercado de trabalho, para tentar garantir a subsistência familiar, acaba gerando novamente o abandono da escola e a falta da escolarização necessária para sair da situação de pobreza ou de extrema pobreza (ARGENTINA, 2011, p. 26).

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira A Associação Brasileira de Magistrados, Promotores de Justiça e Defensores Públicos da Infância e da Juventude explicitou os principais problemas de saúde causados pelo trabalho infantil, destacando alguns que podem ser consequência da exploração sexual comercial:

Fadiga excessiva provocada por longas jornadas de trabalho, esforço físico e horários indevidos; Distúrbios do sono e irritabilidade em função dos horários inadequados de trabalho; […] Irritação nos olhos causada pela iluminação excessiva ou deficiente; Contraturas musculares, distensões, entorses por má postura, esforços excessivos e movimentos repetitivos; […] Mal-estar físico ocasionado por exposição excessiva ao sol, umidade, frio, calor, vento, poeira, etc.; Problemas de pele, como ferimentos, alergias, dermatites, furunculoses e câncer de pele, causados pela falta de proteção contra a luz solar e outros agentes físicos, químicos e biológicos; Bronquite, pneumonia, rinite e faringite devido à inalação de poeiras, fibras e à exposição ao ar-condicionado sem manutenção; Distúrbios digestivos em função de alimentação inadequada (alimentos mal conservados, mal preparados, colocados em recipientes impróprios, refeições apressadas ou em locais inadequados); Perda da alegria natural da infância: as crianças tornam-se tristes, desconfiadas, amedrontadas, pouco sociáveis, pela submissão ao autoritarismo e à disciplina no trabalho. […] (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE MAGISTRADOS, PROMOTORES DE JUSTIÇA E DEFENSORES PÚBLICOS DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE, online)

Deve-se destacar também que o trabalho infantil ocasiona problemas de saúde, doenças ocupacionais e acidentes de trabalho, como consequências da precocidade laboral (BRASIL, 2011, p. 21). Os problemas de adaptação a ambientes adultos e hostis também podem se transformar em traumas futuros, pois as crianças não estão preparadas para praticar atividades de adultos, acarretando-lhes problemas futuros. Há, ainda, alguns trabalhos que, por sua natureza, acabam afetando a moral e o próprio desenvolvimento, como é o caso da exploração sexual comercial (LITTERIO, 2012, p. 95).

Entre as consequências do trabalho infantil para a saúde de crianças e adolescentes, identificadas pelo Estado argentino, estão: Cuadros de fatiga provocada por largas jornadas de trabajo, esfuerzo físico y horarios nocturnos; irritabilidad y pérdida auditiva por exposición a niveles excesivos de ruido; irritación y pérdida ocular cau-

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

sada por excesiva exposición a luz intensa o deficiente, a la vez que exposición a agentes injuriosos tales como polvo, astillas y sustancias tóxicas; problemas posturales y contracturas por esfuerzos excesivos y movimientos repetitivos; deformaciones óseas por cargas excesivas e inadecuadas para la contextura; dolores de columna, de cabeza, y musculares; inflamación de tendones y articulaciones por el esfuerzo excesivo y repetitivo especialmente en manos y brazos; problemas respiratorios tales como bronquitis, neumonías, rinitis, faringitis e intoxicaciones debido a la inhalación de productos tóxicos; problemas gastrointestinales debidos a alimentación inadecuada, intoxicaciones y estrés emocional; malestar y fatiga física ocasionada por exposición excesiva al sol, humedad, frío, calor, viento, polvo, etcétera; lesiones y muerte por accidentes, por traslado y manipulación de herramientas de trabajo. (ARGENTINA, 2011, p. 24-25)

Crianças e adolescentes inseridas precocemente em atividades laborais sofrem problemas de saúde que afetam seu desenvolvimento integral e suas capacidades cognitivas quando ingressam na vida adulta, perpetuando doenças decorrentes do trabalho prematuro, as quais deixam sequelas físicas e emocionais, além de prejudicar a capacidade para se relacionar em sociedade e a formação moral. Nesse sentido, crianças e adolescentes que são explorados pelo trabalho infantil se encontram em desvantagem aos que não são explorados em tais atividades, sendo que as taxas de mortalidade infantil, analfabetismo, desnutrição, invalidez, repetência escolar são mais elevadas daqueles do que destes (ARGENTINA, 2011, p. 25-26).

Portanto, diversas são as enfermidades a que crianças e adolescentes estão expostos quando exercem atividades de trabalho infantil. Esses problemas ocasionam muitos malefícios e geram traumas, danos que na maioria das vezes são irreparáveis. O trabalho se encontra inserido na sociedade e nas famílias como forma de combate ou prevenção dos problemas da marginalização. Porém, o trabalho precoce não é garantia de futuro mais digno, diferentemente da educação, que pode proporcionar melhores condições futuras. A mentalidade das pessoas resiste a essa comprovação científica e crianças são submetidas às mais diversas formas de exploração, incluindo as piores formas de trabalho infantil, o que acaba negando a própria “condição de ser humano às novas gerações de cidadãos e cidadãs” (BRASIL, 2011, p. 11-12). O trabalho infantil é de extremo risco para a saúde e para o desenvolvimento, devido a vários fatores supramencionados, mas principalmente ao perigo do exercício de atividades laborais em certas idades. Porém, os

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira maiores riscos são atinentes às piores formas de trabalho infantil, e nesta classificação estão as atividades de exploração sexual comercial, pois a iminência de adquirir uma doença sexualmente transmissível é constante, podendo resultar também em morte.

O trabalho infantil é uma atividade de risco permanente. Para verificar o tamanho dessa ameaça, deve-se levar em conta sempre a idade e o tipo de atividade a ser desenvolvida. Quanto mais insegura for esta e quanto mais precoce for a idade, maior será o perigo. No entanto, o risco estará sempre presente quando ocorrer o trabalho infantil, pois, por menor que seja aquele, a atividade laboral infantil sempre ocasionará algum prejuízo para o desenvolvimento da criança ou do adolescente.

Os danos físicos e psicológicos são mais significativos quando da ocorrência da exploração sexual com fins comerciais, uma das formas que ocasiona as piores consequências para crianças e adolescentes (ARGENTINA, 2011, p. 25).

Em pesquisa sobre violência e atividade sexual desprotegida, que foi realizada com crianças e adolescentes do sexo feminino, com até quinze anos de idade, atendidas em um ambulatório de ginecologia do Rio de Janeiro, foi constatado que, nos casos em que ocorreu a exploração sexual comercial, houve significativa ocorrência de sexo sem o uso de preservativo, tendo em vista que os parceiros geralmente são mais velhos, sendo maior o poder de convencimento em relação às crianças e adolescentes explorados. Tal fato contribui para a ocorrência de doenças sexualmente transmissíveis (DST) e gravidez indesejada, riscos ocasionados pela exploração sexual infantil (TEIXEIRA; TAQUETE, 2010, p. 440-444). A exploração sexual comercial é uma atividade que exige demasiadamente do físico e do psicológico da criança e do adolescente e, para aguentar tal exploração, consequentemente, tais sujeitos buscam as drogas como forma de refúgio para tentar tornar mais fácil as referidas atividades. Além da exposição ao uso de drogas, os indivíduos, em tese, se encontram mais expostos a doenças sexualmente transmissíveis, entre elas o HIV/SIDA, ou à possibilidade de uma gravidez indesejada. As atividades de exploração sexual comercial afastam as crianças de atividades escolares, pois estas não conseguem realizá-las concomitantemente, o que gera o abandono escolar. Além disso, fazem-se presentes, ainda, como consequência da exploração sexual comercial, diversas formas de violência, entre elas: “agressão física, estupro, agressão verbal, assaltos e roubos”, e até mesmo a morte (SOUSA, 2008, p. 56-58).

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

Do ponto psicológico, Moraes (2009, p. 23-27) identificou que crianças e adolescentes vítimas da exploração sexual comercial, que muitas vezes foram exploradas sexualmente de forma inicial por seus pais, são constantemente discriminadas nos ambientes sociais. Tais discriminações ocorrem da convivência nas escolas, bem como nos programas de acolhimento, quando são destituídas da família por causa da violência intrafamiliar. A conduta preconceituosa sofrida por tais crianças e adolescentes, por elas já terem sido exploradas em relações sexuais, ocorre por diversos sujeitos, entre eles familiares, colegas, familiares dos colegas, professores e educadores. A exploração sexual de crianças e adolescentes pode trazer prejuízos psicológicos por ocasião do abuso emocional ou psicológico sofrido, podendo influenciar na “capacidade de sentir emoções positivas”, gerando sentimentos negativos que podem ocasionar em desmotivação das expectativas para o futuro, falta de autoestima, falta de confiança e enfermidades psicológicas. Outro fator prejudicial à saúde de crianças e adolescentes é a ocorrência de agressões ou de tortura quando são submetidos à exploração sexual comercial, o que pode gerar danos à saúde física e traumas à saúde mental, ocasionando também problemas para uma vida sexual saudável no futuro devido aos traumas ocorridos no período destinado ao desenvolvimento. A violência sexual ou doméstica pode motivar a ida de crianças e adolescentes para as ruas, sendo um fator de risco para a ocorrência de exploração sexual comercial. As crianças e adolescentes procuram as ruas como possibilidade de fuga, devido à necessidade de sobrevivência, o que acaba influenciando a ocorrência da exploração sexual comercial (THOMÉ, 2009, p. 18; 34). A exploração sexual de crianças e de adolescentes compromete o desenvolvimento da autoimagem e da autoestima, tendo em vista estas sentirem “estigmatização, exclusão e rejeição”, afetando-lhes emocionalmente, o que favorece o seu “envolvimento e a sua permanência na rede de exploração sexual”. No que diz respeito à estigmatização, ela se encontra associada “às concepções de devassidão, desmoralização, desonra e desqualificação”. Crianças e adolescentes exploradas sexualmente são comparadas a pessoas que se prostituem, sendo que estas são discriminadas por estarem fora dos padrões criados para as pessoas na atualidade, sendo opostas ao perfil considerado ideal e a elas sendo atribuído um grau de desonestidade (SERPA, 2009, p. 27). A exploração sexual comercial traz como consequências à saúde:

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira […] a inserção no mundo da exploração sexual traz consequências que abrangem transtornos orgânicos e psíquicos; confusão de identidade; dependência de drogas e/ou de álcool; envolvimento na criminalidade; encurtamento da expectativa de vida; envolvimento em redes de tráfico de drogas e fins sexuais; transformação da situação de exploração para profissional do sexo; transformação da situação de explorada para exploradora; perda de valores de respeito e dignidade humana; gestação e aborto inseguros; dificuldades para prosseguir nos estudos; dificuldades para inserção no mercado de trabalho e para traçar outros projetos de vida; mutilações; morte. (CORGOZINHO, 2010, p. 56)

Conforme pesquisa realizada com o universo de crianças e adolescentes que sofreram exploração sexual comercial, destacou-se que, entre as crianças e adolescentes do sexo feminino entrevistadas, 60,9% relataram ter pensado em suicídio, enquanto 58,1% tentaram efetivamente tal prática. Entre os motivos para tal situação, 20% relataram a exploração sexual sofrida como principal motivo, e outras 15,7%, pelo vício em drogas, evidenciando as consequências psicológicas da exploração sexual comercial, que pode resultar até mesmo em morte (CERQUEIRA-SANTOS, [s.d.], p. 8).

Na pesquisa mencionada, afirmou-se que 30% das entrevistadas já ficaram grávidas ao menos uma vez. Destas, 17% afirmaram já terem perdido filhos em abortos naturais ou provocados e somente 5,8% afirmaram que vivem com seus filhos atualmente. O uso da camisinha foi inconstante e 8% das entrevistadas afirmaram que são HIV positivo (CERQUEIRA-SANTOS, [s.d.], p. 10-11). Os efeitos da globalização causam muitos prejuízos à população latino-americana, que possui direitos humanos constantemente violados com as mais diversas formas de exploração, entre as quais a exploração comercial sexual. A comunidade internacional, por meio de acordos e tratados, busca diminuir as fronteiras e aumentar a proteção aos cidadãos. Nesse ínterim, o modelo do sistema econômico, que é excludente, somados às mais diversas catástrofes e conflitos, afetam a comunidade internacional, gerando muitas vítimas, o que ocasiona “violaciones graves y sistemáticas de los derechos humanos, que atentan contra obligaciones erga omnes del derecho internacional” (RUBIO, 2009, p. 39-40). Direitos humanos das crianças e dos adolescentes são constantemente desrespeitados com a exploração sexual comercial, ocasionando as

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

mais diversas consequências para o desenvolvimento integral desses seres humanos, evidenciando o distanciamento entre o discurso e a prática, quando se tratam de direitos humanos (RUBIO, 2009). Ainda existe muito a evoluir no que diz respeito à garantia de direitos humanos. Com a ocorrência da exploração sexual comercial, Brasil, Argentina e Uruguai veem suas crianças e adolescentes serem constantemente exploradas, sendo desrespeitados direitos fundamentais destas, garantidos por tratados internacionais ratificados pelos países em questão.

Como consequência, destacam-se os nefastos prejuízos para a saúde física e psíquica, gerando um risco permanente de contrair enfermidades, o déficit educacional, perverso problema que ocasiona analfabetismo, evasão escolar e exclusão de melhores possibilidades futuras, a perpetuação do ciclo intergeracional da pobreza e da exclusão social decorrente da exploração econômica capitalista, além do prejuízo ao desenvolvimento integral de crianças e adolescentes, em que são esquecidos os mais básicos direitos humanos e a garantia de prioridade absoluta aos direitos de crianças e adolescentes, não sendo garantidos os direitos à igualdade, à liberdade, à dignidade, à saúde, ao lazer, à segurança, à educação, à vida.

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Capítulo 8 O CONTEXTO DA EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL NAS REGIÕES DE FRONTEIRA

U

ma região de fronteira é a representação do encontro político e social de cidades vizinhas, caracterizada pela multiculturalidade quando estabelecida entre países distintos, considerando-se como região transfronteiriça. Este capítulo destina um olhar especial sobre a região de fronteira entre os municípios de Santana do Livramento, no Brasil, e Rivera, no Uruguai, e os municípios de Uruguaiana, no Brasil, e Paso de Los Libres, na Argentina. A primeira região dessa fronteira tem a particularidade de ser uma cidade sem controle fronteiriço entre ambos os países, sendo dividida por um marco imaginário que tem por base uma praça principal que fica metade no Brasil e metade no Uruguai. Já a segunda região de fronteira possui um controle fronteiriço da Argentina e outro do Brasil, sendo separada por uma ponte sobre o rio Uruguai (PEREIRA, 2010, p. 7). Em uma região de fronteira, diversas são as diferenças de características entre um país e outro, econômicas, políticas, entretanto, a sociedade se encontra interligada, sofrendo interferências mútuas. Tais regiões se caracterizam por abrigarem polos comerciais, com considerável circulação de pessoas, além de serem importantes áreas para as relações internacionais comerciais, realizando o serviço aduaneiro de importações e exportações. As regiões de fronteira possuem interação social e econômica, devido ao constante fluxo transitivo do espaço de fronteira. No entanto, assim como há distinção econômica pelo fato de ser uma fronteira, há diversos problemas ocasionados pelos fatores acima citados. Nesse escopo, a exploração de pessoas encontra-se presente de forma mais considerável.

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira A cooperação internacional, devidamente regulada, tende a “legitimar as atividades transnacionais e aumentar seu acesso às políticas nacionais de Estados-alvo, bem como sua capacidade de formar coalizões vencedoras para a mudança de uma política”. A colaboração internacional, portanto, possibilita maior probabilidade de enfrentamento dos problemas internos de cada Estado (PEREIRA, 2010, p. 40-41). Uma fronteira pode ser considerada dinâmica (de fato) ou estática (de direito). Uma fronteira estática é aquela onde se encontra a demarcação para fins geográficos, é o limite do território de um Estado Nacional, a limitação legal, não havendo espaço para integração. Já as fronteiras dinâmicas são aquelas que se permitem a passagem de pessoas, com o espaço constantemente transitável entre os limites fronteiriços, com fluxo e interações, havendo “inter-relações de caráter econômico, social e político” e constantes intercâmbios entre os indivíduos de dois Estados independentes, que acabam modificando a cultura da localidade. Tratando-se de definições, o termo “região de fronteira” é utilizado para a região interna de um Estado até o seu limite internacional, a fronteira propriamente dita. Já o termo “região transfronteiriça” é utilizado para definir a junção da região de fronteira, onde há território de mais de um Estado, com diferentes espaços político-administrativos, mas com interesses comuns, sendo a soma de duas regiões fronteiriças dentro do limite daquela fronteira internacional, onde se prima pela integração e pela cooperação bilateral (PEREIRA, 2010, p. 44-48).

Na região transfronteiriça há uma separação política, administrativa e jurídica, no entanto, tal fato não impede as relações sociais entre membros de distintos países, facilitando a criação de uma identidade própria para aqueles membros daquela sociedade, baseado na distinção cultural de mais de um país a que estes estão submetidos (PEREIRA, 2010, p. 50-52). Considerando a complexidade dessas relações, o combate à exploração sexual comercial e ao aliciamento para tal atividade é prejudicado pelas dificuldades enfrentadas para a articulação intersetorial das políticas públicas de atendimento, proteção e justiça, tendo em vista a facilidade de fuga para o outro país, bem como pelas tensões que marcam as fronteiras, implicando situações de violência nas regiões fronteiriças. Grande parte dos casos ocorridos nessas regiões fica na obscuridade, vigendo a “lei do silêncio”, pois, mesmo que sejam notórios alguns casos de exploração sexual comercial, as pessoas não fazem denúncias por medo de represálias.

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

Outros tantos casos têm dificuldade de combate por possuírem pouco grau de visibilidade, sendo de difícil identificação (PEREIRA, 2010, p. 82).

A região de fronteira possui uma característica ímpar, por ser um lugar onde geralmente se explora o comércio, devido às atratividades de comércio pelas diferenças econômicas dos países que se separam, ela atrai as pessoas das mais diversas nacionalidades e culturas, que vêm em busca de benefícios econômicos que podem ser gerados naquela localidade. É também uma região com característica de maiores possibilidades de ocorrência de atividades ilícitas, onde se verifica o tráfico ilegal de pessoas, de armas, de crianças e de adolescentes para exploração sexual comercial, de entorpecentes, entre outras atividades ilícitas, que acontece com mais frequência em regiões de fronteira. O aliciamento de crianças e adolescentes, do sexo masculino ou feminino, para a exploração sexual comercial, em casas de prostituição, rodovias, na internet ou nas ruas, em regiões de fronteira é constante, pois, pelo fluxo de pessoas entre os países, este é um mercado de alta lucratividade para os exploradores (MORAES, 2009, p. 39; 52-53). Na pesquisa qualitativa realizada por Moraes (2009) na Tríplice Fronteira (Foz do Iguaçu, Puerto Iguazu, Ciudad del Este), diversos foram os casos de crianças e adolescentes encontradas em atividades de exploração sexual comercial nas regiões de fronteira, tanto no Brasil quanto no Paraguai e Argentina, evidenciando a prática constante dessas atividades e demonstrando as mais distintas características dos explorados. Foram relatados casos de crianças e adolescentes, do sexo masculino e feminino, desde idades muito baixas, a partir dos 10 anos, sendo explorados sexualmente e recebendo em troca quantias ínfimas de dinheiro para serem utilizadas na aquisição de elementos básicos para a subsistência da família, nesta incluída, em alguns casos, os filhos. As entrevistas relatadas demonstraram que crianças ou adolescentes de uma nacionalidade foram exploradas no outro lado da fronteira, cidadãos de um Estado foram explorados em outro Estado. O aliciamento de crianças e adolescentes para exploração sexual comercial, bem como para outros tipos de violência, foi observado nas entrevistas, ocorrendo casos de tráfico de crianças e adolescentes para serem violentados no exterior, em atividades relacionadas ao sexo. Tendo em vista a violência intrafamiliar, muitas crianças e adolescentes preferiram sair de casa para evitar os abusos decorrentes de seus familiares, sentindo-se mais seguros na rua do que em suas próprias casas. As crianças e adolescentes violentadas, na maioria das vezes, dividia o valor da explo-

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira ração com os agenciadores da exploração sexual comercial. Observou-se, ainda, que parte dos entrevistados foi explorado sexualmente ou violentado por seus familiares antes de ser vítima da exploração sexual comercial. Dessa forma, as atividades de exploração sexual comercial relatadas na presente investigação muito se assemelham aos casos de trabalho em condições análogas às de escravos (MORAES, 2009, p. 54-60; 94-111).

De acordo com a Pesquisa sobre Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para fins de Exploração Sexual Comercial – PESTRAF, a cidade brasileira de Uruguaiana se encontra entre as rotas de tráfico externo de pessoas para fins de exploração sexual na Argentina, na cidade de Buenos Aires, e no Chile, onde se constatou que mulheres e adolescentes foram traficadas, de forma terrestre, por meio de transporte de táxi, ônibus e caminhão, pela Ponte Internacional que divide o Brasil da Argentina e por locais não informados. Por via aérea, foi constatado que a cidade de Uruguaiana foi rota para o tráfico de mulheres para a cidade de Murcia na Espanha, utilizando o Aeroporto Rubem Berta, em voo comercial (LEAL; LEAL, 2002, p. 72; 74; 104; 205).

Já ao se tratar do tráfico interno de pessoas para fins de exploração sexual comercial, verifica-se que a cidade de Uruguaiana foi destino de mulheres e adolescentes traficadas, por via terrestre, utilizando as rodovias nacionais, das cidades de São Paulo (SP), Bahia (BA), Santa Maria (RS) e Itaqui (RS). Das três primeiras cidades, o transporte utilizado foi o caminhão; na última, além de caminhão, foram usados ônibus e táxi. As mesmas rotas foram utilizadas com a cidade de Uruguaiana de origem do tráfico; portanto, ela foi destino e origem para as cidades acima citadas. Tais fatos são de extrema preocupação para as autoridades nacionais, estaduais e municipais, pois, devido à presente pesquisa e à investigação, por intermédio de inquéritos policiais, afirma-se que a cidade de Uruguaiana no Rio Grande do Sul – Brasil, que faz fronteira com a cidade de Paso de los Libres na Argentina, está entre as rotas, nacionais e internacionais, de tráfico de pessoas para fins de exploração sexual comercial (LEAL; LEAL, 2002, p. 76; 92). Em parceria multissetorial entre a Polícia Rodoviária Federal, a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, a Organização Internacional do Trabalho, a Childhood Brasil e o setor privado foi desenvolvido o Mapeamento dos Pontos Vulneráveis à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes nas Rodovias Federais Brasileiras, no período de 2011 a 2012, identificando pontos confirmados, pontos com indícios e

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

pontos vulneráveis à exploração sexual de crianças e adolescentes. No presente mapeamento, as entidades em tela consolidaram os dados dos anos estudados e de anos anteriores, relatando um total de 3.251 crianças e adolescentes vítimas retiradas de situação de risco pela Polícia Rodoviária Federal, que se caracterizam por serem aqueles pontos onde houve a confirmação ou indícios da ocorrência da exploração sexual comercial, o que soma 121 no ano de 2005, 322 no ano de 2006, 469 no ano de 2007, 663 no ano de 2008, 502 no ano de 2009, 511 no ano de 2010, 543 no ano de 2011 e 120 no ano de 2012 (BRASIL, 2012, p. 15-16; 22). Tabela 4: Crianças e adolescentes retirados de pontos vulneráveis à exploração sexual comercial em rodovias brasileiras

Total

Ano

Quantidade

2005

121 casos

2006

322 casos

2007

469 casos

2008

663 casos

2009

502 casos

2010

511 casos

2011

543 casos

2012

120 casos 3.251 casos

Fonte: BRASIL: Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República et al., 2012.

Na comparação entre os mapeamentos sobre os pontos identificados no Estado do Rio Grande do Sul dos anos de 2011-2012 e 2009-2010, foi registrada a diminuição do número de 154 no mais antigo para 92 no mais novo. Tal diminuição pode ter ocorrido pela interiorização ou migração dos pontos para locais que não são da circunscrição da Polícia Rodoviária Federal. Dos 92 casos atuais, 31 foram classificados como pontos críticos, 31 foram classificados como pontos de alto risco, 23 como pontos de médio risco e sete como pontos de baixo risco. No Brasil, foram identificados 1.776 pontos vulneráveis à exploração sexual de crianças e adolescentes nas rodovias nacionais, sendo destacado

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira por tal pesquisa que as condutas que, geralmente, mais influenciam, respectivamente, na ocorrência de tal atividade são: “ser um ponto de venda de bebida alcoólica”; “ter presença de caminhoneiro no local”; “haver aglomeração/ estacionamento de veículos em trânsito”; “existir iluminação na área”; “existir prostituição de adultos no ambiente”; “haver constante presença de crianças e de adolescentes no local”, entre alguns outros (BRASIL, 2012, p. 30-32).

Em estudo semelhante, nos anos de 2007 e 2008, foram mapeados pela Polícia Rodoviária Federal os pontos vulneráveis à exploração sexual infantojuvenil nas rodovias federais brasileiras. De tal estudo, destaca-se a identificação dos pontos vulneráveis das rodovias do Rio Grande do Sul, entre elas as rodovias que passam nas cidades de Uruguaiana e Santana do Livramento (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 2008, p. 74-81).

As rodovias BR-290 e BR-472, que desembocam na cidade de Uruguaiana, tiveram pontos relatados na pesquisa, sendo verificados como pontos vulneráveis perto desta cidade o que segue: no quilômetro 579 da BR-472, foram identificados “posto de combustível” e “área rural”; no quilômetro 585 da mesma rodovia, foram identificados “área urbana” e “outros”; no quilômetro 714 da BR-290, foram identificados “área rural” e “posto de combustível”; no quilômetro 715 da mesma rodovia, foram identificados “área rural” e “posto de combustível”; e no quilômetro 718 desta, foram identificados “área urbana” e “outros” (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 2008, p. 74-81). Já nas rodovias BR-293 e BR-158, que desembocam na cidade de Santana do Livramento, foram relatados os seguintes pontos vulneráveis: no quilômetro 563 da BR-158, foram identificados “área urbana”, “boate”, “posto de combustível”, “bar” e “outros”; no quilômetro 565 desta, foram identificadas “área urbana” e “boate”; no quilômetro 567 da mesma rodovia, foram identificadas “área urbana”, “boate” e “área rural”; no quilômetro 249 da BR-293 foram identificadas “área urbana” e “boate”; no quilômetro 338 da BR-293 foram identificadas “área rural” e “boate” (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 2008, p. 74-81).

Os caminhoneiros são trabalhadores que se encontram em alta rotatividade, percorrendo estradas, cidades e países. As cidades de Santana do Livramento, no Brasil, e Rivera, no Uruguai, e de Uruguaiana, no Brasil, e Paso de Los Libres, na Argentina, são locais que contam com grande fluxo de caminhões, tendo em vista que são importantes rotas comerciais

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

entre os países em estudo. Em pesquisa que procurou definir o perfil do caminhoneiro no Brasil, constataram-se dados sobre a vida sexual desses profissionais, demonstrando a utilização de atividades de prostituição ou de exploração sexual comercial nos intervalos de sua profissão. Nessa pesquisa, foi demonstrado que a média de relações sexuais semanais do caminhoneiro, quando está na estrada, foi de 1,73 em 2005 e de 1,64 em 2010. Quanto à companheira utilizada nessas relações sexuais, no ano de 2010, 43% dos entrevistados responderam que realizaram atividades sexuais com prostitutas; 31,3%, com parceiras eventuais; 31,7%, com companheira/esposa; 1,8% responderam realizar atividades sexuais com crianças ou adolescentes; e 1,8% responderam que não escolhem/realizam atividades com qualquer pessoa. Tais índices no ano de 2005 foram de 60,5% para atividades sexuais com prostitutas, 27,4% para parceiras eventuais, 11,3% para companheira/esposa e 0,8% para outros (CERQUEIRA-SANTOS, 2010, p. 10-11). Tabela 5: Percentual de companheira de caminhoneiros em atividades sexuais

Companheira

2010

2005

Prostitutas

43,0%

60,5%

Parceiras eventuais

31,3%

27,4%

Companheira/esposa

31,7%

11,3%

Crianças ou adolescentes

1,8%



Não escolhem/realizam atividade sexual com qualquer pessoa

1,8%





0,8%

Outros Fonte: CERQUEIRA-SANTOS, 2010.

Em tal investigação foi realizado um questionamento direto sobre “se já saíram com crianças ou adolescentes”, no qual 82,1% disseram que não haviam saído, em 2010, e 63,2% disseram que não haviam saído, em 2005. De acordo com os caminhoneiros, a média de valor pago para exploração sexual de crianças e adolescentes foi de R$ 25,05 em 2010 e de R$ 17,26 em 2005 (CERQUEIRA-SANTOS, 2010, p. 10-11).

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira Tabela 6: Percentual de caminhoneiros entrevistados que admitiram já ter saído com crianças e adolescentes/valor pago Companheira

2010

2005

Já saíram com crianças e adolescentes

17,9%

36,8%

R$ 25,05

R$ 17,26

Valor pago Fonte: CERQUEIRA-SANTOS, 2010.

Em relação à exposição do tema “Disponibilidade de sexo nas estradas”, nos anos de 2005 e 2010, quando perguntados sobre os quesitos a seguir, as respostas positivas acompanharam os percentuais que se passa a expor: “A prostituição é comum nos postos e estradas por onde ando”: as respostas foram sim para 99,2% dos entrevistados em 2005 e 98,5% em 2010; “Em geral, meus colegas caminhoneiros saem com prostitutas”: as respostas foram sim para 97,9% dos entrevistados em 2005 e 98,5% em 2010; “Comumente se veem meninos e meninas envolvidos na exploração sexual comercial”: as respostas foram sim para 93,7% dos entrevistados em 2005 e 89,6% em 2010; “Comumente se veem crianças e adolescentes envolvidos com a exploração sexual comercial em postos e estradas”: as respostas foram sim para 88,4% dos entrevistados em 2005 e 84,6% em 2010; “Em geral, meus colegas caminhoneiros saem com meninas e meninos menores de 18 anos para fazer programas”: as respostas foram sim para 85,8% dos entrevistados em 2005 e 70,0% em 2010; “É comum ver colegas dando carona para menores de idade”: as respostas foram sim para 71,7% dos entrevistados em 2005 e 51,5% em 2010; “Eu costumo sair com prostitutas”: as respostas foram sim para 48,5% dos entrevistados em 2005 e 33,5% em 2010; “Acho que alguma prostituta com quem saí tinha menos de 18 anos”: as respostas foram sim para 36,8% dos entrevistados em 2005 e 17,9% em 2010; “Eu já dei carona para crianças e adolescentes”: as respostas foram sim para 29,1% dos entrevistados em 2005 e 14,1% em 2010; “Algumas dessas crianças e adolescentes estavam fugindo de casa”: as respostas foram sim para 3,8% dos entrevistados em 2005 e 4,3% em 2010 (CERQUEIRA-SANTOS, 2010, p. 12).

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

Tabela 7: Disponibilidade do sexo na estrada – Índices de respostas “SIM” Questionamento

2005

2010

A prostituição é comum nos postos e estradas por onde ando

99,2%

98,5%

Em geral, meus colegas caminhoneiros saem com prostitutas parceiras eventuais

97,9%

98,5%

Comumente se vê meninos e meninas envolvidos na exploração sexual comercial

93,7%

89,6%

Comumente se vê crianças e adolescentes envolvidos com a exploração sexual comercial em postos e estradas

88,4%

84,6%

Em geral, meus colegas caminhoneiros saem com meninas e meninos menores de 18 anos para fazer programas

85,8%

70,0%

É comum ver colegas dando carona para menores de idade

71,7%

51,5%

Eu costumo sair com prostitutas

48,5%

33,5%

Acho que alguma prostituta com quem saí tinha menos de 18 anos

36,8%

17,9%

Eu já dei carona para crianças e adolescentes

29,1%

14,1%

Algumas dessas crianças e adolescentes estavam fugindo de casa

3,8%

4,3%

Fonte: CERQUEIRA-SANTOS, 2010.

Em se tratando dos “motivos que levam os homens a buscar/querer sexo com crianças e adolescentes”, foram relatadas as seguintes respostas: “safadeza e falta de vergonha na cara” (53,6%); “por ter mais excitação e prazer” (46,7%); “para satisfazer as necessidades do momento” (21,8%); “para aumentar a autoestima frente a alguém incapaz de questionar o seu desempenho” (19,5%); e “para se sentir poderoso” (18,8%) (CERQUEIRA-SANTOS, 2010, p. 13). Portanto, os dados evidenciam que a exploração sexual comercial é prática constante nas estradas nacionais e em outros locais de estacionamento. Dos percentuais que se destacam de tal pesquisa, salienta-se que: 89,6% viram meninos e meninas envolvidos com a exploração sexual de crianças e adolescentes; 84,6% viram crianças/adolescentes envolvidos com a exploração de crianças e adolescentes em postos e estradas; 70% relataram que os colegas caminhoneiros saem com meninas e meninos menores de 18 anos para fazer programas; 17,9% dos entrevistados têm dúvidas se alguma prostituta com quem saíram tinha menos de 18 anos. Fica claro, em tal estudo, que a exploração sexual comercial é constante nesse meio, havendo uma cifra significativa de explorados, tendo em vis-

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira ta que os caminhoneiros são os responsáveis pelo movimento de mais de 60% de toda a carga do país, sendo uma categoria que possui grande número de trabalhadores (CERQUEIRA-SANTOS, 2010, p. 2-13).

O que se pode observar a partir dos dados é que uma região transfronteiriça pode gerar interação e cooperação bilateral, ela está mais suscetível à ocorrência de muitos problemas, principalmente a ocorrência de atividades ilegais e de exploração. As fronteiras, atualmente, possibilitam a ocorrência de inúmeros fatores negativos, havendo nelas diversas concentrações de atividades criminosas e dificuldades para a fiscalização e combate destas. Um dos problemas que ficam mais suscetíveis é a exploração sexual comercial, atividade que possui dificuldade para enfrentamento, fiscalização, combate e erradicação. Uma região de fronteira traz constante circulação de pessoas e mercadorias, sendo, no caso das fronteiras estudadas (Santana do Livramento/Rivera e Uruguaiana/Paso de los Libres), rota de escoamento de caminhões entre o Brasil e a Argentina ou o Uruguai. Nessas cidades, há considerável circulação econômica, havendo também consideráveis desigualdades sociais internas ao país e externas à região transfronteiriça. As diferenças econômicas entre os países trazem mais poder aos membros do país que está com a economia e a moeda mais valorizada, e, por consequência, maior poder econômico a tais indivíduos. Uma região de fronteira também é local onde ocorre muito tráfico e uso de substâncias entorpecentes, o que acaba gerando vícios prematuros a tal substância, ocasionando a submissão à exploração sexual comercial. Há diferentes legislações de proteção de direitos de crianças e adolescentes, bem como distintas políticas públicas de enfrentamento ao trabalho infantil nos países, evidenciando que crianças ou adolescentes de um país podem se encontrar mais excluídas do que as crianças ou adolescentes que possuem nacionalidade do país do outro lado da fronteira. Tais fatores influenciam na exploração sexual comercial de crianças e adolescentes que se encontram nas mais diversas situações de exclusão social, se evidenciando que as regiões transfronteiriças são muito suscetíveis à prática em questão.

Capítulo 9 FUNDAMENTOS PARA A COMPREENSÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS

A

s políticas públicas devem ser desenvolvidas de acordo com um planejamento estratégico por parte do Estado em determinada área, sendo necessário passar por um constante controle de gestão, que primará por sua otimização e aperfeiçoamento, os quais serão desenvolvidos com base em indicadores sobre o tema. Assim, do ponto de vista teórico-conceitual, a política pública em geral e a política social em particular são campos multidisciplinares, e seu foco está nas explicações sobre a natureza da política pública e seus processos. Por isso, uma teoria geral da política pública implica a busca de sintetizar teorias construídas no campo da sociologia, da ciência política e da economia. As políticas públicas repercutem na economia e nas sociedades, daí por que qualquer teoria da política pública precisa também explicar as inter-relações entre Estado, política, economia e sociedade. (SOUZA, 2006, p. 25)

Como se vê, as políticas públicas têm por finalidade a busca simultânea por “colocar o governo em ação e/ou analisar essa ação (variável independente) e, quando necessário, propor mudanças no rumo ou curso dessas ações (variável dependente)” (SOUZA, 2006, p. 26). Além disso, elas necessitam da presença de uma autoridade governamental para serem consideradas como tal, caracterizando-se por possuirem um conjunto de atos, símbolos, decisões, planejamentos, atores públicos, resultados, além de depender de interações entre políticas distintas (FERNÁNDEZ, 2006, p. 499).

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira As políticas públicas, do ponto de vista prático, garantem “uma ação mais qualificada e mais potente, com maior impacto nas decisões atinentes às políticas” (SCHMIDT, 2008, p. 2.308). Já do ponto de vista acadêmico, o “interesse pelos resultados das ações governamentais suscitou a necessidade de uma compreensão teórica dos fatores intervenientes e da dinâmica própria das políticas” (SCHMIDT, 2008, p. 2.308).

A relação entre prática e teoria, no que diz respeito às políticas públicas, se encontra presente desde as origens do tema. Laswell, no ano de 1936, introduziu a expressão “policy analysis”, ou em português “análise de política pública”, buscando “conciliar conhecimento científico/acadêmico com a produção empírica dos governos e também como forma de estabelecer o diálogo entre cientistas sociais, grupos de interesse e governo” (SOUZA, 2006, p. 23), o que possibilitaria melhor qualidade da tomada de decisões.

Os estudos sobre políticas públicas distinguem-se em estudos com orientação descritiva e estudos com orientação prescritiva. Os estudos com orientação descritiva “concentram-se em desenvolver conhecimentos sobre o processo de elaboração das políticas e sobre suas características, com um viés comumente denominado de ‘teórico’” (SCHMIDT, 2008, p. 2.309). Já os estudos com orientação prescritiva “procuram apoiar os agentes das políticas, identificando obstáculos para seu êxito, indicando alternativas utilizadas em outros ambientes e soluções possíveis” (SCHMIDT, 2008, p. 2.309). Tais estudos jamais poderão ser analisados de forma isolada, sendo imprescindível a verificação de todos os aspectos, das mais diversas áreas do conhecimento, que necessariamente devem ser observados quando se estuda uma política pública. Os estudos e as discussões sobre políticas públicas e tudo o que se encontra em seu entorno cresceram em importância com o passar dos anos, para possibilitar análises mais precisas sobre a administração pública e ações governamentais, justificando planejamentos e decisões: […] pretende superar las limitaciones de los tradicionales estudios administrativos, que asumen como incontestable el mito weberiano de una burocracia puramente ejecutiva y políticamente neutral, y se centran en la descripción de las estructuras político-administrativas y de los procedimientos, sin prestar atención ni al análisis de los resultados de la acción gubernamental, ni a la explicación de la compleja naturaleza del proceso de formulación y ejecución de las decisiones que afectan a los asuntos públicos. (FERNANDEZ, 2006, p. 495)

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

No desenvolvimento das políticas públicas deve-se atentar para que não haja descontinuidade administrativa, fator que trará prejuízos e gerará o abandono das diretrizes vigentes em benefício de outras, que poderão ser distintas e contraditórias, provocando desperdício de recursos financeiros e de construção política (SCHMIDT, 2008, p. 2.312).

As fases de desenvolvimento das políticas públicas compõem um ciclo político, que se encontra em constante movimento. Para a análise das políticas públicas deve-se verificá-la de forma geral, observando o ciclo político como um todo, em todas as fases: “Fase 1: Percepção e definição de problemas”; “Fase 2: Inserção na agenda política”; “Fase 3: Formulação”; “Fase 4: Implementação”; “Fase 5: Avaliação” (SCHMIDT, 2008, p. 2.316 -2.320). Para Fernández (2006, p. 505-516), as fases do processo de políticas públicas são praticamente as mesmas, sendo subdivididas em cinco para buscar melhor delimitação do processo. Primeiramente, surge a “Identificación de los problema públicos y su entrada en la agenda”, em que se verificará e estruturará o problema que deve ter caráter público, estando as duas primeiras fases de Schmidt juntas aqui. A segunda fase seria a “Formulación de alternativas”, consistindo em verificar opções e alternativas para aquele problema verificado, visualizando custos, consequências e outros fatores que impactem em um projeto. Dados técnicos são de suma importância nesta. A terceira fase é a “Tomada de decisón”, na qual se verificarão os melhores caminhos, conforme um “modelo de racionalidad absoluta”, escolhendo a alternativa mais adequada, que melhor poderá ser tomada se as fases anteriores forem bem realizadas, uma fase que não estaria expressa individualmente no modelo de Schmidt. A quarta fase seria a fase de “Implementación” de determinada política, que deverá sempre ser otimizada, para evitar desperdícios e gastos desnecessários. Por fim, o autor trata da “La evaluación”, que seriam as avaliações de diversas áreas, por meio de seus métodos próprios, das políticas públicas, avaliando o impacto dos programas, assim como a eficácia e a eficiência destes. As duas últimas fases são as mesmas para os autores em discussão.

Para a implementação de uma política pública, observa-se que “as características e os resultados das políticas estão fortemente associados à estrutura econômica e social de um país, bem como às instituições, aos processos e às lideranças” (SCHIMIDT, 2008, p. 2.326). Dessa forma, a situação econômica e social do país são critérios definidores da perspectiva de efetivação de direitos por meio de políticas públicas. Após serem

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira criadas, as políticas públicas desenvolvem-se em programas, projetos, planos, pesquisas, bases de dados ou sistemas informação, para posteriormente serem implementadas, acompanhadas e avaliadas (SOUZA, 2006, p. 26).

As avaliações de políticas públicas por instituições e agências independentes, de forma criteriosa e com confiabilidade, são de suma importância para uma governabilidade eficiente e eficaz, bem como para garantir o direito de a sociedade ter informações precisas sobre as políticas públicas desenvolvidas em uma determinada gestão (SCHMIDT, 2008, p. 2.320). Para a avaliação de políticas públicas, analisam-se os indicadores relacionados a uma temática, possibilitando verificações em relação a um município, a um estado, a uma região ou em relação ao país como um todo. Entretanto, é necessário aprimorar a obtenção dos indicadores e seu uso, para aprimorar as análises decorrentes dos mais diversos assuntos de interesse público (SILVA; SOUZA-LIMA, 2010, p. 37).

Os indicadores proporcionam o auxílio no acompanhamento de políticas públicas, possibilitando ser apontada a direção de um processo já estabelecido, verificando se os objetivos foram alcançados ou não. Os indicadores são utilizados para acompanhar e aperfeiçoar os resultados de uma política pública, indicando os novos rumos por meio de mudanças ou manutenções de comportamentos. Em consequência, os indicadores são escolhidos conforme uma lista de critérios, de acordo com o objetivo que se pretende alcançar, se verificando qual o melhor indicador e como se deve avaliá-lo (SILVA; SOUZA-LIMA, 2010, p. 57-59). Nesse sentido, é necessária a aplicação de indicadores que visam avaliar as dimensões de um desenvolvimento sustentável, para assim formar um índice que avalia a eficiência da aplicação das políticas públicas, e desta forma colaborar com a elaboração de novas políticas públicas e acompanhar o desenvolvimento do Estado. Assim, de extrema importância é o relacionamento entre indicadores e políticas públicas, pois “o impacto positivo de uma política pública voltada para a melhoria da qualificação no município é relativo a proporção incrementada de um dos indicadores” (SILVA; SOUZA-LIMA, 2010, p. 47-48). Já no que diz respeito ao término ou à sucessão de uma política pública, deve-se analisar, após determinado prazo, por meio de uma avaliação, se a política deve continuar, ser redefinida ou encerrada. Porém, na prática, mesmo que um programa tenha avaliação negativa ou já se tenha

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

conseguido o seu objetivo, é muito difícil de ser cancelado, sendo mais habitual a troca de uma política por outra (FERNÁNDEZ, 2006, p. 516-517).

As políticas públicas no Brasil, até os anos 1980, no que diz respeito à decisão e financiamento, se caracterizavam por serem centralizadas, cabendo somente aos estados e municípios a sua execução, não havendo uma articulação entre políticas públicas. A sociedade civil não participava do processo de desenvolvimento das políticas públicas. A partir de 1988, buscou-se a descentralização e participação dos cidadãos nas políticas sociais, havendo iniciativas inovadoras, principalmente no que tange aos governos municipais, que promoveram ações no campo social e voltadas ao desenvolvimento local. No entanto, novos desafios surgiram, a descentralização se deu de forma heterogenia, chamando a atenção para a “necessidade de se preservarem políticas de coordenação em níveis mais abrangentes de governo, que minimizem desigualdades e garantam a busca de projetos regionais e de um projeto nacional” (FARAH, 2001, p. 122-132). A descentralização é necessária para o desenvolvimento de uma política pública conforme a realidade de cada localidade. Além disso, deve haver maior articulação entre governos municipais e as outras esferas, para que a atuação do município esteja vinculada às diretrizes federais, melhorando a efetividade do governo e primando por uma articulação intersetorial e intergovernamental (FARAH, 2001, p. 132-136). A participação popular no desenvolvimento de políticas públicas também é importante, o que possibilitaria a inclusão de novos atores da sociedade civil. A “formulação, implementação e controle das políticas sociais no nível local assinala uma inflexão importante com relação ao padrão de ação do Estado no campo social no país” (FARAH, 2001, p. 137).

Por meio de políticas públicas, o Estado retorna à sociedade aquelas contribuições decorrente do pagamento de impostos, visando à resolução de problemas sociais para garantir o ensino, a renda, a saúde, o esporte, a cultura, a assistência social, o trabalho, enfim, o desenvolvimento sustentável como um todo. O desenvolvimento sustentável de todas as regiões e localidades de um Estado, por meio de iniciativas públicas e privadas, contribuirão para a melhoria das condições sociais, ambientais, culturais e econômicas das atuais e futuras gerações (SILVA; SOUZA-LIMA, 2010, p. 36-43). A participação e a atuação dos cidadãos na política são de suma importância para o desenvolvimento social, buscando-se um autogoverno do cidadão com base em sua cidadania ativa, com o fito da busca pelo bem

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira comum, sem almejar interesses privados em prejuízo dos públicos. O republicanismo permite que os cidadãos de uma sociedade desenvolvam suas vidas com o objetivo de obtenção do maior nível de satisfação de seus desejos, porém nunca com a possibilidade da sujeição de um cidadão às intenções arbitrárias de outro (AGRA, 2005, p. 17-19). O republicanismo possui como uma de suas principais características o ideal de que “as decisões políticas são tomadas pela população, depois de amplo debate político que esclareça a temática abordada e permita uma escolha consciente” (AGRA, 2005, p. 69).

A instituição de políticas públicas em uma democracia exige todo um processo de construção articulada entre o poder público e a sociedade.

A escolha das políticas públicas em uma democracia é mais demorada; cada decisão, antes de ser tomada, deve ser precedida por intensos debates públicos, que proporcionam à população consciência a respeito dos assuntos que devem ser decididos. Sua vantagem é que quando as escolhas são realizadas, ostentam grau mais intenso de legitimidade que lhes garante sua eficácia. Em regime autoritário, as decisões podem ser tomadas com maior rapidez, entretanto, ao menor sinal de arrefecimento do poder de coerção que o mantém, sua legitimidade dilacera-se, bem como suas condições de governabilidade. (AGRA, 2005, p. 72)

Os debates relacionados a uma decisão prosseguem após a finalização primária dos diálogos de modo que sigam constantes os debates, principalmente por parte daqueles que não tiveram o seu posicionamento contemplado, com a finalidade de aperfeiçoar determinada decisão política, pois a contestação traz benefícios para a democracia, desde que se aceitem os resultados e se cumpram as leis e as políticas públicas (AGRA, 2005, p. 73).

As políticas públicas, para terem maior efetividade, necessitam ser desenvolvidas e consolidadas no âmbito mais próximo da sociedade. Atualmente, as políticas públicas destinadas à proteção de crianças e adolescentes se desenvolvem nos municípios, de forma descentralizada, e com a participação da comunidade, seguindo as orientações dos entes federados a que estão relacionadas, ou seja, estado e União. Pelo fato de estar mais próximo do cidadão, o Poder Local é mais factível de ser democratizado e de oportunizar uma maior participação

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

da comunidade. Mediante o espaço local são produzidas identidades próprias á pluralidade de sujeitos, criando um centro de poder político paralelo ao estatal – um espaço autônomo, formado, pela sociedade civil, numa nova relação desta com o Estado – e estabelecendo uma tensão permanente e deliberada como o governo de representação. (SANTIM, 2010, p. 424-425)

O poder local possibilita a aproximação dos membros de uma sociedade ao Estado, buscando um modelo democrático e participativo, no qual o cidadão possa atuar de forma concreta, “apossando-se dos espaços públicos, não apenas de decisão política, mas de fiscalização e concreção das tarefas do Estado”, possibilitando “revitalizar o poder local, explorando suas potencialidades captando o capital social e humano por meio das políticas públicas” (HERMANY, 2014, p. 3).

Destaca-se que não se pode concordar com as expressões “capital social” e “capital humano”, pois são expressões que se relacionam com economia, tornando-se perigosas em uma realidade na qual se mercantilizam pessoas, exploram-se indivíduos, escravizam-se seres humanos, comercializam-se liberdades, transformam-se pessoas em mercadorias, enfim, prima-se pelo capital em prejuízo dos direitos humanos de forma globalizada. Portanto, nas relações públicas locais, dever-se-ia primar pelo incentivo às qualidades sociais e qualidades humanas de uma coletividade, visando empoderar indivíduos, potencializar o sentimento de pertencimento e, consequentemente, aperfeiçoar a gestão da política municipal.

A esfera local potencializa a sensação de pertencimento a uma comunidade e estimula a intenção de os cidadãos se tornarem parte do processo decisório relacionado à política pública municipal e de contribuir com a sociedade de forma responsável e que possibilite o conhecimento de direitos e responsabilidades por parte os atores sociais. A hipótese de se obterem decisões compartilhadas entre a sociedade e a administração pública, com a participação de cidadãos ativos que primem pela ética, poderão trazer transparência e efetividade para as políticas públicas, assim como articular os interesses públicos e privados (HERMANY, 2005, p. 1.410-1.411). A abertura da participação da população nas decisões locais possibilita estratégias bem sucedidas para o poder local, devido à proximidade do processo decisório municipal e um intercâmbio de opiniões entre os representantes do ente público e os membros de uma sociedade, primando por uma administração compartilhada e mais democrática. Para tanto, é

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira necessário que os cidadãos estejam compromissados com a sua responsabilidade social e que possuam um sentimento de pertencimento a uma comunidade, mediante uma cidadania ativa, para haver benefícios para a sociedade (CASSOL, 2008, p. 144).

O enfrentamento dos impactos da globalização mediante políticas públicas desenvolvidas com a participação efetiva da comunidade é de relevância “nas questões que envolvem sua própria realidade econômica, social e política” (COSTA; LEME, 2012, p. 24-25), sendo de suma importância nas atuais gestões públicas. O exercício da cidadania no espaço público local e a solidariedade são de extrema importância para a articulação em rede de políticas públicas de proteção à infância, buscando a inclusão social nas comunidades e a consequente concretização da cidadania de crianças e adolescentes (COSTA; LEME, 2012, p. 24-25).

Capítulo 10 AS POLÍTICAS PÚBLICAS BRASILEIRAS DE ENFRENTAMENTO À EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL

N

o ano de 2002, o Brasil, por intermédio do Ministério do Trabalho Emprego, criou a Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil (Conaeti), com a finalidade de planejar o enfrentamento às mais diversas formas exploração de trabalho infantil e instituir um plano nacional para a erradicação dessa atividade. Essa comissão atua em consonância e integrada ao Programa Internacional para Erradicação do Trabalho Infantil (IPEC) da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e de acordo com as Convenções 138 e 182 desta. A comissão brasileira foi o órgão responsável por criar em âmbito nacional o Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção do Adolescente Trabalhador, que se encontra na segunda edição, vigente para o intervalo entre os anos de 2011 e 2015 (BRASIL, 2011, p. 1-5).

A Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil é composta por representantes do poder público, por representantes dos empregadores, por representantes dos trabalhadores, por membros da sociedade civil e por membros de organizações internacionais, que estão sob a coordenação do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). O plano instituiu como metas a erradicação das piores formas de trabalho infantil no Brasil em 2015 e a erradicação de todas as formas de trabalho infantil até 2020. As metas são decorrentes de compromisso internacional firmado na “XVI Reunião Regional Americana da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ocorrida em 2006” (BRASIL, 2011, p. 5). Portanto, o Brasil assumiu o compromisso para a erradicação da exploração sexual comercial, uma das piores formas de trabalho infantil, até

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira o ano de 2015, meta que dificilmente será cumprida em âmbito nacional devido à incidência constante de tais atividades.

O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), órgão responsável pelas políticas públicas de atendimento de crianças e adolescentes em âmbito federal, também atuou no planejamento do Plano Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção do Adolescente Trabalhador.

O Plano Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção do Adolescente Trabalhador tem como principal finalidade o planejamento estratégico de políticas públicas para o enfrentamento ao trabalho infantil por meio de uma diversidade de ações de intervenção por parte dos atores sociais que participam das políticas públicas de forma direta e indireta, atentando-se para o perfil do explorado e para as diferentes formas de exploração. Para tanto, as práticas deverão ser intersetoriais e transversais, consolidando um enfrentamento em rede, com a participação de agentes do Estado e membros da sociedade civil, para a erradicação do trabalho infantil no território brasileiro (BRASIL, 2011, p. 5).

A prevenção da exploração sexual comercial no Brasil também se encontra prevista no “Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes” (BRASIL, 2013), que foi antecedido pelo “Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual Infantojuvenil”, aprovado no ano de 2000 pelo Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), plano que proporcionou avanços no enfrentamento da violência sexual geral contra crianças e adolescentes, de modo que “Esse instrumento tornou-se referência e ofereceu uma síntese metodológica para a estruturação de políticas, programas e serviços para o enfrentamento à violência sexual” (BRASIL, 2013, p. 3). No Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes, foram expostas as principais medidas adotadas após a sua instituição: A instituição do Comitê Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes e da Comissão Intersetorial no âmbito do governo federal, o fortalecimento das redes locais/ estaduais; as diversas campanhas de sensibilização sistemáticas (Carnaval e 18 de maio – Dia Nacional de Luta Contra a Exploração e o Abuso Sexual), a adesão de um número crescente de organizações públicas e privadas ao enfrentamento da violência sexual, a visita ao Brasil do Relator Especial das Nações Unidas sobre venda, prosti-

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sexual comercial de crianças e adolescentes

tuição infantil e utilização de crianças na pornografia; a adoção da experiência de Códigos de Conduta contra a Exploração Sexual em diferentes segmentos econômicos (turismo, transporte, etc.); a criação do serviço de disque denúncia nacional gratuito – Disque 100 e, ainda, a realização do III Congresso Mundial de Enfrentamento da Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes no Brasil, em 2008, consideradas como conquistas previstas no referido Plano, reforçadas pela instituição de planos temáticos, como o Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária (2006) e o Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (2008). (BRASIL, 2013, p. 6)

Com a instituição do plano, buscou-se constante monitoramento e avaliação das condições de enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes, visando à garantia de direitos humanos e o aperfeiçoamento das políticas públicas por meio dos dados oriundos de indicadores. Tais indicadores visam aumentar a eficácia das políticas públicas nessa área, tendo em vista a contribuição que poderá trazer o monitoramento e a gestão de dados para a produção de informação, para a produção de medidas corretivas, para a verificação de impactos, para a análise dos dados expostos nos indicadores, entre outros aspectos atinentes ao desenvolvimento de políticas públicas. Os indicadores foram divididos por eixos, conforme se expõem: “Eixo prevenção”, que tem por objetivo “Assegurar ações preventivas contra o abuso e/ou exploração sexual de crianças e adolescentes, fundamentalmente pela educação, sensibilização e autodefesa”; “Eixo atenção”, com o objetivo de “Garantir o atendimento especializado, e em rede, às crianças e aos adolescentes em situação de abuso e/ou exploração sexual e às suas famílias, realizado por profissionais especializados e capacitados […]”; “Eixo defesa e responsabilização”, que possui a finalidade de “Atualizar o marco normativo sobre crimes sexuais, combater a impunidade, disponibilizar serviços de notificação e responsabilização qualificados”; “Eixo comunicação e mobilização social”, que tem por objetivo “Promover a participação ativa de crianças e adolescentes pela defesa de seus direitos na elaboração e execução de políticas de proteção”; “Eixo participação e protagonismo”, que visa “Fortalecer as articulações nacionais, regionais e locais de enfrentamento e pela eliminação do abuso e/ou exploração sexual, envolvendo mídia, redes, fóruns, comissões, conselhos e outros.”; “Eixo estudo e pesquisas”, com a finalidade de “Conhecer as expressões do abuso e/ou exploração sexual de crianças e adolescentes por meio de diagnósticos, levantamento de dados, estudos e pesquisas”. Nos

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira referidos eixos estão inseridas as diretrizes e eixos do “Plano Decenal dos Direitos de Crianças e Adolescentes”, havendo subdivisões para cada um dos eixos supracitados, bem como a exposição de objetivos, de indicadores de monitoramento e de ações de órgãos governamentais e parceiros, com o intuito de garantir os direitos humanos de crianças e adolescentes e de enfrentamento à violência sexual durante a infância (BRASIL, 2013, p. 22-50). A estruturação de eixos no planejamento e gestão de políticas públicas possibilita a delimitação de responsabilidades e a instituição de objetivos a serem alcançados com o desenvolvimento de políticas públicas, possibilitando constante avaliação de itens e aperfeiçoamento de atividades.

Com base nos planos nacionais, deverão ser elaborados, revistos ou implementados os planos nas esferas municipais e estaduais, assim como na esfera distrital, efetivando a política descentralizada de enfrentamento ao trabalho infantil ou a violência sexual contra crianças e adolescentes, que deve se desenvolver na esfera mais próxima da ocorrência do problema, incentivando a autonomia do poder local. Assim, as políticas públicas de enfrentamento ao trabalho infantil devem se desenvolver basicamente na esfera municipal de forma intersetorial, sendo sempre articuladas aos planejamentos estaduais e federais. O planejamento municipal será realizado pelos conselhos de direitos da criança e do adolescente em espaço democrático que utilizará da participação social no planejamento da política. O planejamento de políticas públicas intersetoriais, interdisciplinares, articuladas e descentralizadas irão possibilitar a instituição de uma rede de enfrentamento do trabalho infantil e a violências sexual contra crianças e adolescentes mediante ações integradas de diversos órgãos, sistema que se encontra em constante processo de implantação e aperfeiçoamento no território brasileiro.

As políticas públicas voltadas para o enfrentamento à exploração sexual comercial possuem a finalidade de efetivação de direitos fundamentais para crianças e adolescentes, utilizando-se de quatro tipos de políticas integradas de proteção aos direitos de crianças e adolescentes, que são: “política de atendimento”; “política de proteção”; “política de justiça”; e “política de promoção dos direitos” (CUSTÓDIO; VERONESE, 2013, p. 163-166). As políticas de atendimento são planejadas pelos Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente no âmbito federal, estadual e municipal, não havendo uma subordinação hierárquica entre eles. Os conselhos descentralizados são autônomos e deliberam nos seus respectivos

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

níveis. As deliberações dos níveis mais centralizados têm caráter de recomendação. O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) tem por finalidades:

Ao CONANDA compete elaborar as normas gerais da política nacional de atendimento dos direitos da criança e do adolescente, fiscalizando as ações de execução; zelar pela aplicação da política nacional de atendimento dos direitos da criança e do adolescente; apoiar a promoção de campanhas educativas sobre os direitos da criança e do adolescente, com a indicação das medidas a serem adotadas nos casos de atentados ou violação dos mesmos. (BRASIL, 2011, p. 5)

As linhas de ações das políticas públicas de atendimento definidas no Estatuto, mais especificamente nos artigos 86, 87 e 88, buscam garantir o princípio da prioridade absoluta. Entre as diretrizes dessa política, destaca-se a descentralização da política de atendimento de crianças e adolescentes e o incentivo a construção de redes de ações integradas, em que se busca, ainda, a municipalização e a integração com a comunidade, que possui como principal órgão os Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente. A tal órgão compete, entre outras atividades, “deliberar e controlar o conjunto de políticas públicas básicas, dos serviços especializados e de todas as ações governamentais e não governamentais direcionadas para o atendimento da criança e do adolescente” (CUSTÓDIO; VERONESE, 2013, p. 165-176). Portanto, os Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente deverão planejar o desenvolvimento de políticas públicas de atendimento à saúde, à assistência social, à educação, à cultura, ao lazer e ao esporte, políticas que atuarão, entre outras finalidades, no enfrentamento à exploração sexual comercial, exercendo o controle, a fiscalização, a normatização e a deliberação sobre essas políticas.

Os Conselhos não são órgãos meramente consultivos, tendo a função de implementar a política de atendimento à criança e ao adolescente, tendo o poder de controle e deliberativo em relação às políticas públicas, possuindo capacidade de decisão e de acompanhamento. Os conselhos possuem autoridade de análise da situação da infância podendo intervir nas políticas públicas e propor medidas para o seu aperfeiçoamento. Os conselhos não eximem e nem substituem o dever do governo na execução das políticas públicas, porém eles deliberam e acompanham a implemen-

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira tação, execução e os resultados de uma política, realizando controle em todos os níveis (CASSOL, 2008, p. 136).

Aos Conselhos incumbe, também, a capacitação de toda a rede de atendimento à criança e ao adolescente e dos executores do Sistema de Garantia de Direitos de Crianças e Adolescentes, fazendo com que haja a mobilização e a articulação entre o Sistema de Garantia de Direitos e as políticas públicas de atendimento. Na área de assistência social, o enfrentamento à exploração sexual comercial se dá por meio do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), responsável por organizar a Política Nacional de Assistência Social no território nacional, de forma descentralizada e participativa. Tal sistema possibilita a proteção social especializada por intermédio dos Centros de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), com abrangência regional ou municipal, tendo como uma de suas finalidades o atendimento a crianças e adolescentes em situação de abuso ou de exploração sexual, com ou sem fins comerciais (BARROS, 2008, p. 109-113). O Plano Nacional de Assistência Social diferenciou a proteção social básica da proteção social especial, conforme segue: Se a proteção social básica tem como objetivos prevenir situações de risco e fortalecer os vínculos familiares e comunitários, a proteção social especial é a modalidade de atendimento assistencial destinada a famílias e indivíduos que se encontram em situações de risco pessoal e social, por ocorrência de abandono, maus tratos físicos, abuso sexual, trabalho infantil, dentre outros. (BRASIL, 2005, p. 37)

Então, verifica-se que existem duas formas de proteção social disponibilizadas pelo Sistema Único de Assistência Social – SUAS: a proteção social básica, que é realizada pelos Centros de Referência de Assistência Social (CRAS), e a proteção social especial, que é realizada pelos Centros de Referência Especializados de Assistência Social (CREAS) (BRASIL, 2005).

Os Centros de Referência Especializados de Assistência Social (CREAS) são os responsáveis por ofertar os serviços especializados, de forma continuada, aos indivíduos e às famílias que se encontram em situação de violação ou ameaça de violação de direitos, se encontrando em situação de risco social ou pessoal, em decorrência de violência física, sexual, psicológica, exploração sexual, afastamento do convívio familiar,

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

rompimento de vínculos ou outros tipos de exploração ou de violência (BRASIL, 2005, p. 35-37). A assistência social especializada realizada pelos Centros de Referência Especializados de Assistência Social (CREAS) se dá por meio dos serviços de média complexidade e dos serviços de alta complexidade. O serviço de proteção especial de média complexidade é utilizado quando o vínculo familiar e comunitário não foi rompido, realizando-se o atendimento às famílias e indivíduos com os direitos violados. Em contrapartida, o serviço de proteção especial de alta complexidade é oferecido quando o indivíduo e seus familiares se encontram fora do seu núcleo familiar, necessitando de moradia, higienização, alimentação, devido a violação ou ameaça de direitos (BRASIL, 2005, p. 38). Já os Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) oferecem para crianças e adolescentes o “Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos”, no qual se assegura a assistência social básica com o objetivo de prevenção de situações de riscos e o fortalecimento de relações familiares e comunitárias, destinando-se a pessoas que se encontram em situação de vulnerabilidade social (que decorre de pobreza, de privações e/ou de fragilização de vínculos afetivos). A cada tipo de fragilidade será dado um tipo de atenção diferenciada em consonância com as necessidades individuais, estimulando as potencialidades familiares e a participação social no processo de assistência social. Os Serviços de Convivência e Fortalecimento de Vínculos se encontram articulados ao Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família (PAIF) (BRASIL, 2005, p. 33-35). A assistência social em geral no Brasil segue algumas diretrizes:

I – Descentralização político-administrativa, cabendo a coordenação e as normas gerais à esfera federal e a coordenação e execução dos respectivos programas às esferas estadual e municipal, bem como a entidades beneficentes e de assistência social, garantindo o comando único das ações em cada esfera de governo, respeitando-se as diferenças e as características socioterritoriais locais;

II – Participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis; III – Primazia da responsabilidade do Estado na condução da Política de Assistência Social em cada esfera do governo;

IV – Centralidade na família para concepção e implementação dos benefícios, serviços, programas e projetos. (BRASIL, 2005, p. 32-33)

121

122

André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira As crianças e adolescentes vítimas da exploração sexual comercial serão atendidas pela assistência social básica e pela assistência social especializada, conforme as suas necessidades, em âmbito municipal, para que se consolide o afastamento da exploração sexual ou da violência sexual com ou sem caráter econômico.

A política pública de atendimento de assistência social para o enfrentamento à exploração sexual comercial utiliza-se, ainda, do Programa Bolsa Família e do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil – PETI, mediante controle do Cadastro Único, para possibilitar distribuição de renda para o enfrentamento à pobreza e à extrema pobreza, garantindo uma renda mínima para o sustento familiar mediante a obrigação de frequência escolar mínima, o acompanhamento sanitário das crianças e adolescentes beneficiárias e o afastamento de atividades relacionadas ao trabalho infantil. Atualmente, ambos os programas se encontram integrados como forma de enfrentamento à pobreza e à extrema pobreza, um dos motivos que ocasionam o trabalho infantil, mediante a transferência de renda direta às famílias de forma condicionada a requisitos pré-estabelecidos de acompanhamento do desenvolvimento de crianças e adolescentes. A garantia à assistência social para vítimas da exploração sexual comercial e o combate à pobreza, à extrema pobreza e à exclusão social são fatores que contribuem para a erradicação dessa forma de trabalho infantil. Nesse sentido, o Programa Bolsa Família age com o intuito de possibilitar melhor distribuição de renda, de combater à fome, de proporcionar inclusão social, de diminuir as desigualdades sociais, de diminuir a pobreza e de erradicar a miséria, bem como, subsidiariamente, com o intuito de erradicar o trabalho infantil, garantindo que as crianças e adolescentes frequentem a escola.

O Programa Bolsa Família faz parte da política pública de assistência social brasileira que tem como objetivos diminuir as desigualdades sociais por meio de melhor distribuição de renda, garantir direitos fundamentais universais à pessoa humana, proteger a infância e erradicar a pobreza e a fome.

Em consequência, o Programa Bolsa Família garante o acesso a serviços públicos destinados à proteção dos direitos à saúde, à assistência social e à educação, o que possibilita o acompanhamento sanitário, nutricional e educacional, o combate à fome, promoção da segurança alimentar e nutricional e a matrícula e a frequência na escola dos membros das

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

famílias beneficiárias pela política pública, com o objetivo de inclusão social, combate à pobreza, à extrema pobreza, à fome, à evasão escolar e ao analfabetismo.

O acesso à alimentação e a melhoria das condições nutricionais são benefícios que se evidenciam com a instituição do Programa Bolsa Família, o que possibilita o enfrentamento à fome, diminuindo as possibilidades de exploração de todas as formas de trabalho infantil por parte das famílias, pois a falta de alimentos e a busca por melhor alimentação faz com que muitas crianças e adolescentes sejam influenciadas a serem exploradas sexualmente de forma comercial.

Os valores recebidos pelas famílias beneficiárias são utilizados essencialmente para a alimentação familiar, conforme se evidencia em pesquisa realizada no território nacional sobre os gastos principais do dinheiro recebido pelo beneficiário, em que os entrevistados puderam escolher até três opções para exporem no que foram realizadas as despesas, verificando que 87% das famílias responderam que utilizavam os valores para a alimentação, 46% utilizavam para a compra de material escolar, 37% utilizavam para compra de vestuário, 22% utilizavam para a compra de remédios, 10% para compra de gás e 1% para gastos com água, sendo que, quanto mais pobre for a família beneficiada, maior será o gasto com a alimentação. As famílias beneficiárias do programa realizam um gasto médio de R$ 200,00 reais com alimentação, o que equivale a 56% da renda familiar total (INSTITUTO BRASILEIRO DE ANÁLISES SOCIAIS E ECONÔMICAS, 2008, p. 4-5).

Após o recebimento do benefício, muitas famílias conseguiram aumentar o consumo de produtos alimentares em geral, o que contribuiu para as condições nutricionais das crianças e adolescentes, constatando-se que, em relação às famílias dos entrevistados, aumentou em: 78% o consumo de açúcares; 76% o consumo de arroz e cereais; 68% o consumo de leite; 63% o consumo de biscoitos; 62% o consumo de industrializados; 61% o consumo de carnes; 59% o consumo de feijão; 55% houve o consumo de óleo; 55% o consumo de frutas; 46% o consumo de ovos; 43% o consumo de raízes; 40% o consumo de vegetais. Tais índices demonstram o impacto significativo da política pública no combate à fome no Brasil, o que contribui para o desenvolvimento integral de crianças e adolescentes (INSTITUTO BRASILEIRO DE ANÁLISES SOCIAIS E ECONÔMICAS, 2008, p. 6).

123

124

André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira Nota-se que o benefício recebido pelo Programa Bolsa Família é gasto primordialmente com as necessidades básicas familiares, consolidando o enfrentamento da fome no Brasil e superando os obstáculos relacionados ao acesso ao direito à alimentação a um número considerável de famílias brasileiras. A garantia do direito à alimentação de crianças e adolescentes contribui para a prevenção da exploração sexual comercial como atividade em busca por subsistência. Entretanto, o problema do acesso à alimentação ainda possui obstáculos a serem superados para a universalização do combate à fome no ambiente familiar nacional.

A educação nacional também é beneficiada com as políticas de atendimento para garantir a assistência social. As contribuições do Programa Bolsa Família, no contexto do Sistema Único de Assistência Social, vêm contribuindo sensivelmente para a frequência escolar de crianças e adolescentes da população mais pobre da população nacional desde o ano de 2001. Porém, no que diz respeito à frequência da creche, da pré-escola e do ensino médio, a assiduidade ao ambiente escolar por parte da população mais pobre ainda está muito abaixo da população mais rica. Destaca-se negativamente a evasão escolar no ensino médio das crianças e adolescentes das classes mais pobres, a qual, embora tenha diminuído entre os anos de 2001 e 2012, ainda é preocupante, pois é o momento em que os adolescentes começam a trabalhar, priorizando o trabalho em prejuízo dos estudos, o que trará impacto negativo em sua futura vida profissional devido à falta de preparação suficiente para as melhores oportunidades. No que diz respeito à taxa de alfabetização entre as classes mais pobres e mais ricas, verifica-se que a população mais pobre possui menores índices de alfabetização em relação aos mais ricos desde o ano de 2011, mas o distanciamento está diminuindo com o passar dos anos após a consolidação das estratégias de ação do Programa Bolsa Família e da ampliação das ações de proteção social básica e especial no âmbito do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), o que possibilita melhores oportunidades. No que tange ao ensino fundamental, os índices de frequência à escola das populações mais pobres e mais ricas se assemelham (TODOS PELA EDUCAÇÃO, 2014).

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

Tabela 8: A frequência à escola da porcentagem mais pobre/mais rica da população brasileira Creche (0 a 3 anos) Ano

25% Mais pobres

25% Mais ricos

2001

8,9%

29,3%

2012

16,2%

44,0%

Pré-escola (4 a 5 anos) Ano

25% Mais pobres

25% Mais ricos

2001

52,4%

88,8%

2012

77,6%

94,6%

Ensino fundamental Ano

25% Mais pobres

25% Mais ricos

2007

92,3%

93,5%

2012

93,8%

93,8% Ensino médio

Ano

25% Mais pobres

25% Mais ricos

2001

17,6%

73,2%

2012

44,2%

75,0%

Taxa de alfabetização Ano

25% Mais pobres

25% Mais ricos

2001

76,6%

98,0%

2004

79,6%

97,9%

2007

82,4%

98,1%

2009

84,0%

97,9%

2012

86,0%

98,3%

FONTE: IBGE/PNAD/Todos pela educação.

Verifica-se que com a instituição do programa Bolsa Família, a continuidade escolar vem aumentando entre as populações mais pobres do Brasil, cumprindo com um requisito para a efetivação do direito à educa-

125

126

André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira ção, o que contribui para a democratização da educação e para a justiça social no território brasileiro.

Portanto, o Programa Bolsa Família melhora as condições nutricionais, garante a saúde e possibilita a educação, fatores que afastam crianças e adolescentes da exploração sexual comercial. Constata-se que a efetivação de políticas públicas de atendimento que visem garantir a assistência social contribui para a garantia ao direito à saúde e também à educação. Assim, as políticas públicas de atendimento à assistência social devem estar interligadas às políticas públicas de atendimento à saúde e à educação para possibilitar a proteção integral de crianças e adolescentes e o enfrentamento à exploração sexual comercial.

Em se tratando do direito à educação, já se verificou a existência de políticas públicas de atendimento à assistência social que condicionam a transferência de renda à frequência escolar, possibilitando o acesso à escola e a sua continuidade. As políticas públicas para assegurar a assistência social básica e especializada auxiliam também na universalização do direito à educação. No entanto, existem as políticas públicas de atendimento educacional no âmbito federal, estadual e municipal que visam assegurar o direito à educação de crianças e adolescentes, enfrentando, por consequência, a exploração sexual comercial.

O atendimento à educação de crianças e adolescentes por meio de políticas públicas, assegurando a proteção jurídica, é de extrema importância para o enfrentamento à exploração sexual comercial, pois as crianças e os adolescentes que se encontram presentes na escola se afastam de atividades de exploração do trabalho infantil. Assim, concretizar o direito à educação de crianças e adolescentes de forma universal, por meio de um sistema de ensino de qualidade, é uma maneira de enfrentar a exclusão social, erradicar a pobreza e o trabalho infantil, bem como garantir a cidadania. A Educação é um dos mais complexos desafios da sociedade contemporânea. Está ligada à conquista da cidadania, à consolidação das democracias, à participação social, à inserção no mundo do trabalho, à capacidade de inovar e produzir novos conhecimentos, à convivência pacífica e à tolerância, à qualidade de vida, entre tantos outros aspectos. A Educação é indissociável da própria sustentabilidade do desenvolvimento e do uso dos recursos do planeta. (TODOS PELA EDUCAÇÃO, 2014, p. 8)

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

O acompanhamento constante das políticas públicas deve ser realizado pelo Estado para verificar sua efetividade. O Brasil, por meio de entidades não governamentais e de órgãos oficiais, monitora anualmente os indicadores que controlam a educação. A Organização da Sociedade Civil de Interesse Público “Todos Pela Educação” é uma das entidades que, com o intuito de melhorar a educação, realiza o acompanhamento e a compilação dos dados brasileiros no âmbito da União, dos estados e dos municípios, que são divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

As políticas públicas de atendimento à educação vêm possibilitando um acesso mais universal ao direito à educação de crianças e adolescentes, o que se evidencia com a análise dos percentuais expostos pelos indicadores nacionais que demonstram que o índice de acesso à educação na faixa etária de 4 a 17 anos se encontram crescendo constantemente desde o ano de 1995, aumentando o número de alunos matriculados. No ano de 2011, o índice de acesso à educação foi de 92%, chegando ao pico, porém o índice atingiu 90,4% em 2007, 86,9% em 2001, 78,6% em 1995. No entanto, em 2010 quase quatro milhões (3.855.963) de crianças e adolescentes não tiveram acesso à educação, número preocupante (TODOS PELA EDUCAÇÃO, 2014). Tabela 9: Acesso à educação no Brasil

Ano

Percentual de acesso à educação

População nacional

Entre 4 a 17 anos

População total

Entre 4 e 17 anos

1995

78,6%





1996

79,7%





1997

81,9%





1998

83,6%





1999

85,0%





2000



169.799.170

47.948.404

2001

86,9%





2002

87,5%





2003

88,1%





127

128

André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira 2004

88,4%





2005

88,8%





2006

89,9%





2007

90,4%

183.987.291



2008

91,4%





2009

91,9%





2010

91,5%

190.755.799

45.364.276

2011

92,0%





FONTE: IBGE/PNAD/Todos pela educação, 2014.

A educação diminui a exclusão social e as possibilidades de exploração sexual comercial, mas não basta o acesso, sendo necessária, também, a garantia da continuidade no ensino, da qualidade do ensino e da frequência escolar. A aprovação nas séries escolares e a permanência no ambiente escolar propiciam a continuidade do ensino. No Brasil, a taxa de aprovação nas séries iniciais do ensino fundamental tem aumentado desde o ano de 1996, quando era de 81,1%, passando para 91,7% em 2012. No entanto, as taxas de aprovação nas séries finais do ensino fundamental e no ensino médio não seguem um caminho constante, passando por aumentos e diminuições no decorrer dos anos, o que demonstra problemas para a garantia da continuidade da educação de crianças e adolescentes (TODOS PELA EDUCAÇÃO, 2014). No que diz respeito à taxa de abandono escolar, vem ocorrendo uma diminuição constante no índice de abandono nas séries iniciais do ensino fundamental, que passou de 9,9% em 1996 para 4,8% em 2005 e para 1,4% no ano de 2012, e nas séries finais do ensino fundamental, que passou de 11,7% em 1996 para 9,5% em 2003 e para 4,1% em 2012 (TODOS PELA EDUCAÇÃO, 2014).

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

Tabela 10: Taxa de abandono/aprovação escolar Ano

Taxa de aprovação

Taxa de abandono

E.F. Séries iniciais

E.F. Séries finais

E.M.

E.F. Séries iniciais

1996

81,1%

81,2%

86,0%

9,9%

11,7%

9,8%

1997

84,3%

84,7%

87,4%

8,8%

10,0%

9,1%

1998

85,3%

82,7%

87,9%

8,4%

12,5%

8,8%

1999

84,4%

81,6%

87,3%

7,7%

12,4%

8,5%

2000

82,7%

81,6%

85,3%

9,0%

11,5%

10,3%

2001

84,5%

82,5%

84,8%

6,6%

10,0%

10,3%

2002

85,2%

82,3%

83,7%

5,7%

9,7%

10,8%

2003

85,0%

81,5%

84,3%

5,4%

9,5%

9,4%

2004

83,8%

79,0%

82,2%

5,5%

10,4%

10,5%

2005

81,6%

77,0%

73,2%

4,8%

9,4%

10,3%

2006

81,6%

77,0%

73,2%

5,7%

9,6%

15,3%

2007

85,8%

79,8%

74,1%

3,2%

6,7%

13,2%

2008

87,0%

79,9%

74,9%

2,9%

6,2%

12,8%

2009

88,5%

81,3%

75,9%

2,3%

5,3%

11,5%

2010

89,9%

82,7%

77,2%

1,8%

4,7%

10,3%

2011

91,2%

83,4%

77,4%

1,6%

4,2%

9,5%

2012

91,7%

84,1%

78,7%

1,4%

4,1%

9,1%

E.F. Séries finais

E.M.

FONTE: IBGE/INEP/DTDIE/Todos pela Educação, 2014.

Entretanto, no ensino médio, não se conseguiu diminuir a taxa de abandono, na qual não se teve diminuição no decorrer dos últimos anos, estando em 9,8% em 1996, passando por 15,6% em 2006 e ficando em 9,1% em 2012 (TODOS PELA EDUCAÇÃO).

A frequência ao ensino fundamental ainda pode ser melhorada para se buscar melhor desenvolvimento de crianças e adolescentes. A garantia da educação fundamental é extremamente importante para se enfrentar a exclusão social no futuro, pois “No Ensino Fundamental, a desigualdade

129

130

André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira afeta a base de toda a aprendizagem escolar futura e da cidadania: a alfabetização” (TODOS PELA EDUCAÇÃO, 2014, p. 10). A relação entre a pobreza e a falta de acesso/frequência à educação de crianças e adolescentes é muito estreita. A extrema pobreza, a miserabilidade e a pobreza impactam na frequência/matrícula à escola, levando muitas vezes à exploração sexual comercial (TODOS PELA EDUCAÇÃO, 2014, p. 18; 31).

Os jovens e adultos de 18 a 29 anos têm, em média, quatro anos a mais de escolaridade entre os mais ricos, em relação aos 25% mais pobres. Há nove vezes mais jovens de 18 a 24 anos do primeiro quartil de renda matriculados no Ensino Superior na comparação com os 25% mais pobres. Isso se reflete no trabalho e na renda: enquanto o salário médio de um cidadão dessa faixa etária com ensino superior completo chega a R$ 2,3 mil, os vencimentos das pessoas que não completaram o Ensino Médio ficam em R$ 752,00. (TODOS PELA EDUCAÇÃO, 2014, p. 11)

A evasão escolar acaba trazendo prejuízos ao futuro de crianças e adolescentes, o que lhes impossibilitará o acesso a melhores oportunidades de emprego e de salário. Aquelas crianças e adolescentes que foram afastadas das escolas para serem exploradas sexualmente de forma comercial desde as idades mais prematuras terão muitas dificuldades para ascenderem a melhores oportunidades de trabalho em um mercado globalizado excludente e extremamente competitivo. Tabela 11: Rendimentos médios no Brasil – faixa etária entre 18 e 29 anos – por escolaridade

Escolaridade

2012

2009

2007

Superior Completo ou equivalente

R$ 2.342,92

R$ 2.277,70

R$ 2.253,40

Superior Incompleto ou equivalente

R$ 1.234,54

R$ 1.160,91

R$ 1.225,08

Médio Completo ou equivalente

R$  958,93

R$  848,61

R$  838,44

Médio Incompleto ou equivalente

R$  752,68

R$  634,28

R$  597,81

Fundamental Completo ou equivalente

R$  771,96

R$  657,97

R$  637,53

Fundamental Incompleto ou equivalente

R$  614,99

R$  503,19

R$  481,30

Sem instrução

R$  652,33

R$  462,50

R$  380,40

FONTE: IBGE/Pnad/Todos pela educação.

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

Os agentes responsáveis pelas políticas públicas de atendimento à educação deverão buscar a identificação de crianças e adolescentes explorados em qualquer forma de trabalho infantil, entre elas a exploração sexual comercial, notificando os órgãos de proteção aos direitos da criança e do adolescente, para possibilitar a garantia de direitos.

De suma importância é a disponibilidade de alimentação nas escolas, para enfrentar a situação de fome quando se tratam de crianças e adolescentes, pessoas que necessitam de atenção prioritária tendo em vista a situação peculiar de pessoa em desenvolvimento. Nas escolas, deve-se incentivar também o lazer, o esporte e a cultura, utilizando esses locais para buscar a efetivação de direitos fundamentais para a garantia do desenvolvimento integral de crianças e adolescentes, bem como para auxiliar no desenvolvimento educacional. Portanto, uma política pública de atendimento à educação eficaz, universal e contínua, que possibilite a permanência de crianças e adolescentes no ensino escolar, bem como que seja interdisciplinar e articulada a outras políticas públicas, é extremamente importante para a efetivação de direitos fundamentais durante a infância e para o enfrentamento à exploração sexual comercial. As políticas públicas de atendimento à saúde de crianças e adolescentes, importante ferramenta no enfrentamento à exploração sexual comercial, são realizadas pelo Sistema Único de Saúde e visam garantir o acesso universal à saúde por parte de crianças e adolescentes.

As políticas públicas de saúde para o enfrentamento à exploração sexual comercial e a todas as formas de trabalho infantil encontram-se previstas nas “Diretrizes para atenção integral à saúde de crianças e adolescentes economicamente ativos”, do ano de 2005. Essas diretrizes trazem orientações que inserem responsabilidades aos atores da política de atendimento do Sistema Único de Saúde no enfrentamento ao trabalho infantil. Os agentes executores da política pública deverão verificar e identificar casos de problemas de saúde decorrentes de atividades de exploração sexual comercial ou atividades que demonstrem o trabalho infantil, utilizando de constante vigilância epidemiológica, notificando toda e qualquer ocorrência de verificação de possível atividade de trabalho infantil no presente ou no passado, avaliada e diagnosticada conforme a exposição de riscos do trabalho, ao “Sistema Nacional de Notificação (SINAN) do Ministério da Saúde, os Sistemas de Vigilância em Saúde, Estaduais e Municipais, a Delegacia Regional do Trabalho do Ministério

131

132

André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira do Trabalho e Emprego, o Ministério Público do Trabalho e o Conselho Tutelar” (BRASIL, 2005, p. 14-21). Assim, com a finalidade de contribuir para a erradicação de todas as formas de trabalho infantil e garantir a proteção da saúde na infância, “o Ministério da Saúde, por meio da Área Técnica de Saúde do Trabalhador, elaborou e vem implantando uma Política Nacional de Saúde para a Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção do Trabalhador Adolescente” (BRASIL, 2005, p. 7), sendo responsável no território brasileiro também pelo enfrentamento em rede da exploração do trabalho infantil.

As políticas públicas de atendimento à saúde devem se desenvolver articuladas, principalmente com as políticas públicas de atendimento à assistência social e com as políticas públicas de proteção, para garantir o enfrentamento efetivo à prática da exploração sexual comercial tão logo seja constatada a exploração de crianças e de adolescentes. Daí a importância de um bom treinamento para o agente de saúde que irá desenvolver a política pública de atendimento à infância para realizar a notificação a todos os órgãos que irão realizar a proteção de direitos da criança e do adolescente.

As políticas públicas de atendimento relacionadas ao esporte e ao lazer são disponibilizadas pelo Ministério do Esporte, por meio da Política Nacional de Esporte, que visa à inclusão social, à melhoria da qualidade de vida e à democratização da cultura do esporte por meio do incentivo a atividades esportivas de forma gratuita. Com a finalidade de possibilitar o acesso ao esporte e ao lazer, existem os “Projetos Esportivos Sociais” e o “Projeto Segundo Tempo”. No entanto, tais projetos não chegam a todos os municípios do país, impossibilitando o acesso ao esporte a crianças e adolescentes de muitos municípios. Então, as políticas de atendimento ao esporte devem se relacionar com as políticas de atendimento à educação e ao lazer com a finalidade de possibilitar o acesso ao esporte a todos os alunos das redes de ensino do país, sendo a melhor forma de universalizar o acesso ao esporte em âmbito nacional (LEME, 2012, p. 141-142). Já as políticas públicas de atendimento à cultura são disponibilizadas pelo Ministério da Cultura por meio do Plano Nacional de Cultura, que disponibiliza as diretrizes e estratégias para a execução das políticas públicas de cultura no Brasil. A cultura é essencial para o desenvolvimento da cidadania, para o fortalecimento da autoestima e para incentivar o sentimento de pertencimento a seu grupo, sendo que o seu acesso será disponibilizado pelo Programa Mais Cultura. O acesso à cultura deve ser incentivado pelas políticas públicas destinadas ao atendimento cultural, mas também deve

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

ser proporcionado de forma articulada com as políticas públicas de atendimento à educação e de assistência social. No que diz respeito a crianças e adolescentes, o acesso à cultura e ao direito de brincar é incentivado por programas como os “as ações Pontinhos de Cultura e os Espaços de Brincar Mais Cultura, que possuem vinculação com os propósitos do PETI” (LEME, 2012, p. 142-144). A comunidade e as entidades não governamentais são de extrema importância para o desenvolvimento de políticas públicas nas mais diversas áreas e para a fiscalização dos gestores políticos e servidores públicos na execução, planejamento e desenvolvimento de políticas públicas destinadas à infância.

O Conselho de Direitos da Criança e do Adolescente atuará, ainda, na elaboração e na execução da proposta orçamentária, no planejamento financeiro para a execução das políticas públicas de atendimento e de promoção dos direitos humanos de crianças e de adolescentes, com o objetivo de assegurar os direitos fundamentais de crianças e adolescentes e contribuir para a erradicação da exploração sexual comercial.

Como órgão que atua na política de proteção no sistema de garantias de direitos de crianças e adolescentes, os Conselhos Tutelares devem encaminhar os casos de exploração sexual comercial para a rede de atendimento. A partir da instituição do Estatuto da Criança e do Adolescente, buscou-se criar uma rede de enfrentamento ao trabalho infantil, que contasse com ações governamentais de distintos órgãos dos três poderes, da sociedade e das famílias, atuando com um objetivo comum de combater todas as formas de exploração de crianças e de adolescentes.

O Conselho Tutelar deverá agir sempre que os direitos da criança e do adolescente estiverem sendo violados ou ameaçados, podendo “mobilizar o sistema e exigir a efetivação dos direitos da criança e do adolescente […]”. Dentre as principais medidas que visam à proteção da criança e do adolescente, o Conselho Tutelar deve promover, dentre outras medidas: [...] encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade; orientação, apoio e acompanhamento temporários; matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental; inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e ao adolescente; requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; inclusão em programa oficial ou comunitá-

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira rio de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos. (CUSTÓDIO; VERONESE, 2013, p. 176-185)

O Conselho Tutelar também pode aplicar medidas aos pais e responsáveis, conforme o disposto no artigo 129 do Estatuto da Criança e do Adolescente, cabendo-lhe, ainda, solicitar ou determinar que os pais matriculem crianças e adolescentes na escola, acompanhando o desempenho escolar, baseado no abaixo exposto: Art. 129. São medidas aplicáveis aos pais ou responsável:

I – encaminhamento a programa oficial ou comunitário de proteção à família;

II – inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos; III – encaminhamento a tratamento psicológico ou psiquiátrico; IV – encaminhamento a cursos ou programas de orientação;

V – obrigação de matricular o filho ou pupilo e acompanhar sua frequência e aproveitamento escolar;

VI – obrigação de encaminhar a criança ou adolescente a tratamento especializado; (BRASIL, 1990)

O Ministério do Trabalho e Emprego também atua para a garantia da proteção de crianças e adolescentes, fiscalizando e coibindo as práticas de exploração de crianças e adolescentes em atividades de trabalho infantil efetuando sanções administrativas, quando for o caso, bem como encaminhando tais situações para o Conselho Tutelar, Ministério Público e para as políticas públicas de atendimento, contribuindo, assim, para o enfrentamento ao trabalho infantil e para a proteção de crianças e adolescentes.

O serviço de disque denúncia, por meio do Disque 100, é um serviço de atendimento telefônico para se iniciar uma medida de proteção ou de atendimento de crianças e adolescentes vítimas de alguma violência ou exploração. O serviço serve para o enfrentamento ao trabalho infantil por meio do encaminhamento de denúncias às políticas públicas nacionais. Na rede de enfrentamento ao trabalho infantil também existem os Fóruns Nacionais e Estaduais de Erradicação do Trabalho Infantil, bem como deveria haver fóruns municipais (não existem na maioria dos municípios), que são um local para a formulação de ações para a prevenção

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

e o enfrentamento ao trabalho infantil. O Fórum visa mobilizar e articular agentes governamentais e da sociedade civil no enfrentamento de tal prática, de forma democrática e participativa (LEME, 2012, p. 113-115).

Além das políticas citadas, existem as políticas públicas de justiça e de promoção de direitos humanos que também são voltadas para a garantia e proteção de direitos de crianças e adolescentes.

As políticas públicas de atendimento à educação, à assistência social, à saúde, ao lazer, ao esporte, à cultura, bem como as políticas públicas de proteção deverão agir de forma articulada e em conjunto, uma realizando encaminhamentos, a outra colaborando com a gestão das políticas, buscando a garantia interdisciplinar da proteção integral de crianças e adolescentes. Portanto, as políticas públicas de proteção deverão ser desenvolvidas no sentido de encaminhar crianças e adolescentes às políticas de atendimento para possibilitar a garantia de direitos fundamentais, mediante uma colaboração mútua. E as políticas de atendimento deverão se desenvolver em conjunto sempre que possível e necessário para a busca da garantia do desenvolvimento integral. Assim, é necessária a articulação intersetorial das políticas públicas, com a construção integrada de fluxos e protocolos de atendimento para a garantia dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes.

Então, havendo a identificação por um órgão das políticas públicas de atendimento ou de proteção de uma criança ou adolescente sendo explorado sexualmente de forma comercial, deverão ser realizados encaminhamentos para garantir a proteção integral, possibilitando o acesso à assistência social, à saúde, à educação, ao esporte, ao lazer e à cultura, sendo tomadas as medidas necessárias pelas políticas de proteção. Em consequência, destaca-se a importância da articulação entre as políticas públicas para o enfrentamento da exploração sexual comercial, possibilitando a troca de informações e a atuação conjunta visando à garantia de direitos de crianças e adolescentes, assim como a busca pelo atendimento e proteção intersetorial, o que possibilita um enfrentamento em rede à exploração de todas as formas de trabalho infantil, mediante o comprometimento dos servidores no desenvolvimento de políticas públicas, identificando casos de exploração sexual comercial e realizando encaminhamentos e acompanhamentos, consolidando um sistema de garantia de direitos de crianças e adolescentes. Essa diversidade de políticas públicas de enfrentamento ao trabalho infantil vem contribuindo para o enfrentamento da exploração sexual comercial, o que se comprova com os indicadores para o tema. Verifica-se que

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira os números de trabalhadores infantis vêm diminuindo no Brasil segundo os dados oficiais. Analisando o indicador sobre o total de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos praticando atividades consideradas trabalho infantil, constatou-se que este passou de 8,42 milhões em 1992, para 5,52 milhões no ano de 2001, para 5,00 milhões no 2004, para 4,84 milhões em 2007, para 4,25 milhões em 2009 e 3,5 milhões em 2012. No entanto, verifica-se que o avanço no enfrentamento ao trabalho infantil ainda encontra um núcleo resistente e que coloca obstáculos que dificultam a sua erradicação (BRASIL, 2011, p. 13-14). Tabela 12: O trabalho infantil no Brasil

Percentual de trabalho infantil em relação à população na idade estudada (entre 5 e 17 anos)

Ano

Número de trabalhadores infantis no Brasil em milhões

1992

8,42

19,6%

1993

8,31

19,0%

1995

8,23

18,7%

1998

6,64

15,5%

1999

6,49

15,1%

2001

5,52

12,7%

2002

5,48

12,6%

2003

5,12

11,7%

2004

5,00

11,4%

2005

5,17

11,8%

2006

4,86

11,1%

2007

4,84

10,8%

2008

4,45

10,2%

2009

4,25

9,8%

2010

3,40

2011

3,67

8,6%

2012

3,50

8,3%

FONTE: BRASIL, 2011; IBGE-PNAD.

-

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

O avanço no combate ao trabalho infantil se deve à instituição de uma diversidade de políticas públicas com tal fim, no entanto, é necessário um constante aperfeiçoamento, com a finalidade de melhorar tal enfrentamento em busca do cumprimento de metas para a erradicação do trabalho infantil no Brasil. Entretanto, as políticas públicas nacionais sofrem algumas restrições para o seu desenvolvimento, impactando negativamente no sistema de garantia de direitos de crianças e adolescentes.

A consolidação de melhores resultados no enfrentamento ao trabalho infantil esbarra nas limitações das políticas públicas e em algumas inadequações no seu desenvolvimento, o que impossibilita, muitas vezes, o cumprimento da legislação sobre o tema. (BRASIL, 2011, p. 9)

As políticas públicas de atendimento de assistência social que têm por finalidade a distribuição de renda condicionada ocorrem lentamente. E os membros adultos das famílias mais pobres da população nacional possuem uma dificuldade de inclusão ao mercado de trabalho, o que mantém a situação de exclusão social (BRASIL, 2011, p. 21).

O Sistema de Garantias de Direitos de Crianças e Adolescentes, assim como os Conselhos de Direitos e Tutelares sofrem problemas que restringem a sua atuação, que são decorrentes, principalmente, de falta de infraestrutura, de falta de materiais, de maior prioridade da sociedade e do poder público e de falta de pessoal capacitado:

A prevenção e a erradicação do trabalho infantil não são assumidas efetivamente como prioridade pela sociedade e pelo poder público. Um sinal disso é a insuficiência de recursos humanos, materiais e de infraestrutura para a atuação e funcionamento dos Conselhos de Direitos e Tutelares. Outro sinal é o fato de que administradores públicos e atores do Sistema de Garantias de Direitos de Crianças e Adolescentes estão pouco capacitados para lidar com as questões do trabalho infantil. (BRASIL, 2011, p. 22)

A articulação entre as políticas públicas destinadas à criança e ao adolescente também se encontra deficitária, sendo necessária melhor e mais constante articulação conjunta e intersetorial para a proteção dos direitos durante a infância, enfrentando a exploração sexual comercial e seus prejuízos (BRASIL, 2011, p. 22).

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira Os agentes gestores e executores que desenvolvem as políticas públicas e aqueles que fazem parte do sistema de garantia de direitos muitas vezes não possuem o conhecimento necessário para a atuação nas políticas públicas, desconhecendo o direito da criança e do adolescente e as políticas públicas destinadas à proteção da infância. Os gestores e executores das políticas públicas necessitam de uma preparação e formação para que haja uma atuação participativa, daí a importância de se disponibilizar e oportunizar a participação em fóruns, cursos, seminários e palestras sobre o tema. Portanto, os agentes necessitam de um aperfeiçoamento constante para o desenvolvimento das políticas públicas de forma eficaz, efetiva e que assegure a proteção de direitos fundamentais de crianças e adolescentes. Como estratégias para o fortalecimento do sistema de garantias de direitos da criança e do adolescente, destacam-se algumas:

1. Priorização da prevenção e erradicação do trabalho infantil e proteção ao adolescente trabalhador nas agendas políticas e sociais; 2. Promoção de ações de comunicação e mobilização social; 3. Criação, aperfeiçoamento e implementação de mecanismos de prevenção e erradicação do trabalho infantil e proteção ao adolescente trabalhador, com destaque para as piores formas; 4. Promoção e fortalecimento da família na perspectiva de sua emancipação e inclusão social; 5. Garantia de educação pública de qualidade para todas as crianças e os adolescentes; 6. Proteção da saúde de crianças e adolescentes contra a exposição aos riscos do trabalho; 7. Fomento à geração de conhecimento sobre a realidade do trabalho infantil no Brasil, com destaque para as suas piores formas. (BRASIL, 2011, p. 27-28)

A priorização dessas estratégias possibilitará um avanço intersetorial no enfrentamento à exploração sexual comercial, assim como a todas as formas de trabalho infantil, mas tais atividades dependem do comprometimento da família do Estado e da comunidade, por meio da responsabilidade compartilhada prevista constitucionalmente. Para tanto, deve-se primar pela instituição e pelo desenvolvimento de todas as políticas públicas destinadas à criança e ao adolescente na universalidade de municípios brasileiros, utilizando-se da participação da comunidade.

Capítulo 11 AS POLÍTICAS PÚBLICAS ARGENTINAS DE ENFRENTAMENTO À EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL

A

Argentina instituiu a Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil (CONAETI) no ano de 2000. A comissão foi o órgão responsável por criar o Plano Nacional para a Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil, com o planejamento de políticas públicas de enfrentamento do trabalho infantil. A lei da proteção integral de crianças e adolescentes previu a instituição do Sistema de Proteção Integral de Direitos da Criança e do Adolescente, dispondo sobre o tema em título próprio, previsto a partir do artigo 32 do dispositivo jurídico. O sistema é composto por todos os organismos e entidades que planejam, coordenam, executam, orientam e realizam a supervisão das políticas públicas nacionais provinciais e municipais, que visam à prevenção, à promoção, à assistência, ao resguardo, à proteção e ao restabelecimento de direitos da criança e do adolescente, buscando a proteção integral de direitos previstos juridicamente. Para a implementação do Sistema de Proteção de Direitos de Crianças e Adolescentes, devem-se buscar a articulação entre políticas públicas nacionais, provinciais, da cidade autônoma de Buenos Aires e municipais. O sistema contará com os seguintes meios:

Políticas, planes y programas de protección de derechos; Organismos administrativos y judiciales de protección de derechos; Recursos económicos; Procedimientos; Medidas de protección de derechos; Medidas de protección excepcional de derechos. (ARGENTINA, 2005)

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira As medidas de proteção integral a direitos durante a infância se encontram previstas no artigo 33 da lei, sendo definidas como aquelas que são emanadas pelos órgãos administrativos locais para enfrentar a ameaça ou violação de direitos ou garantias de crianças e adolescentes. Os objetivos dessas medidas são a preservação e a restituição de direitos, assim como a reparação de consequências em decorrência de infração de direitos. O artigo 34 dispõe que as medidas têm como finalidade: Las medidas de protección de derechos tienen como finalidad la preservación o restitución a las niñas, niños o adolescentes, del disfrute, goce y ejercicio de sus derechos vulnerados y la reparación de sus consecuencias (ARGENTINA, 2005).

O artigo 35 dispõe que se aplicaram, prioritariamente, as medidas de proteção que tenham por finalidade a preservação e o fortalecimento de vínculos familiares de crianças e adolescentes com direitos ofendidos, entre os quais aqueles que são consequência da exploração sexual comercial. Podem ser adotadas sempre que houver ameaça ou violação de direitos em decorrência da exploração sexual comercial, entre outras medidas, as previstas no artigo 37, quais sejam: medidas que busquem a permanência do convívio familiar; disponibilização de bolsas de estudo e inclusão/permanência na escola; inclusão das famílias, das crianças e dos adolescentes em programas destinados ao apoio e ao fortalecimento familiar; acesso ao tratamento médico, psicológico e psiquiátrico das crianças e adolescentes e de suas famílias; assistência econômica. Como medida excepcional, pode ser decretada a retirada de crianças e adolescentes do convívio familiar de acordo com o previsto em lei, mas sempre atentando para o interesse maior da criança e do adolescente. Os argumentos para tal medida excepcional jamais poderá ser devido à falta de recursos econômicos, físicos, políticos ou de programas administrativos (ARGENTINA, 2005). O Sistema de Proteção Integral de Direitos da Criança e do Adolescente possui como órgãos administrativos de proteção de direitos da criança e do adolescente os que se expõe:

Secretaria Nacional de Niñez, Adolescencia y Familia; Consejo Federal de Niñez, Adolescencia y Familia; Defensor de los Derechos de las Niñas, Niños y Adolescentes; Las Organizaciones no Governamentales. (ARGENTINA, 2005)

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

A “Secretaria Nacional de Niñez, Adolescencia y Familia” é o órgão superior de proteção de direitos da criança e do adolescente, juntamente ao poder executivo nacional, órgão especializado em matéria de direitos durante a infância, que terá diversas atribuições principalmente no que tange ao planejamento de políticas públicas (ARGENTINA, 2005).

O “Consejo Federal de Niñez, Adolescencia y Familia” tem por funções: Art. 46. FUNCIONES. El Consejo Federal de Niñez, Adolescencia y Familia tendrá funciones deliberativas, consultivas, de formulación de propuestas y de políticas de concertación, cuyo alcance y contenido se fijará en el acta constitutiva. Tendrá las siguientes funciones: a) Concertar y efectivizar políticas de protección integral de los derechos de las niñas, niños, adolescentes y sus familias; b) Participar en la elaboración en coordinación con la Secretaría Nacional de Niñez, Adolescencia y Familia de un Plan Nacional de Acción como política de derechos para el área específica, de acuerdo a los principios jurídicos establecidos en la presente ley; c) Proponer e impulsar reformas legislativas e institucionales destinadas a la concreción de los principios establecidos en la Convención sobre los Derechos del Niño; d) Fomentar espacios de participación activa de los organismos de la sociedad civil de las provincias y de la Ciudad Autónoma de Buenos Aires, reconocidas por su especialidad e idoneidad en la materia, favoreciendo su conformación en redes comunitarias; e) Promover la supervisión y control de las instituciones privadas de asistencia y protección de derechos; f) Gestionar en forma conjunta y coordinada con la Secretaría Nacional de Niñez, Adolescencia y Familia la obtención de recursos financieros nacionales e internacionales para la efectivación de las políticas públicas de niñez, adolescencia y familia; g) Efectivizar juntamente con la Secretaría Nacional de Niñez, Adolescencia y Familia la transferencia de los fondos a los Estados Provinciales para la financiación de dichas políticas; h) Gestionar la distribución de los fondos presupuestariamente asignados para la formulación y ejecución de las políticas previstas en el Plan Nacional de Acción; i) Promover en coordinación con la Secretaría Nacional de Niñez, Adolescencia y Familia, mecanismos de seguimiento, monitoreo y evaluación de las políticas públicas destinadas a la protección integral de los derechos de las niñas; niños y adolescentes. (ARGENTINA, 2005)

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira Já o “Defensor de los Derechos de las Niñas, Niños y Adolescentes” é o responsável pela proteção e promoção de direitos da criança e do adolescente, que foi criado pela referida lei para atuar no nível nacional e provincial na defesa de direitos da criança e do adolescente, promovendo ações de defesa e proteção de direitos, supervisão de entidades públicas privadas, requisição de atendimento de assistência social, saúde e educação e receber todo tipo de reclamação formulado em relação à ofensa de direitos de crianças e adolescente (ARGENTINA, 2005). Os defensores terão os deveres de agir após a denúncia:

Art. 64. DEBERES. Comprobada la veracidad de la denuncia o reclamo, el Defensor de los Derechos de las Niñas, Niños y Adolescentes deberá: a) Promover y proteger los derechos de las niñas, niños y adolescentes mediante acciones y recomendaciones que efectuará ante las instancias públicas competentes, a fin de garantizar el goce y el ejercicio de los mismos; b) Denunciar las irregularidades verificadas a los organismos pertinentes quienes tienen la obligación de comunicar al Defensor de los Derechos de las Niñas, Niños y Adolescentes el resultado de las investigaciones realizadas; c) Formular recomendaciones o propuestas a los organismos públicos o privados respecto de cuestiones objeto de su requerimiento; d) Informar a la opinión pública y a los denunciantes acerca del resultado de las investigaciones y acciones realizadas. A tal efecto deberá establecerse un espacio en los medios masivos de comunicación. (ARGENTINA, 2005)

Além das políticas acima demonstradas, poderá haver a atuação de organizações não governamentais na defesa de direitos da criança e do adolescente.

A Argentina identificou aspectos positivos no enfrentamento ao trabalho infantil com a implementação da política pública denominada “Asignación Universal por Hijo”, que é um benefício financeiro aos filhos de famílias desempregadas, o que permitiu a diminuição dos índices de trabalho infantil, aumento da matrícula escolar e diminuição da evasão escolar:

En sintonía con lo expuesto, a partir de la implementación de la Asignación Universal por Hijo (AUH), se logró promover la reinserción y permanencia de los niños en la escuela, considerándola una herra-

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

mienta apropiada para la erradicación del trabajo infantil. Los primeros datos obtenidos del análisis de impacto de la AUH muestran que la tasa de actividad de niños, niñas y adolescentes ha caído un 15% entre los años 2009 y 2010. De manera que puede leerse una reducción en el trabajo infantil a partir de la aplicación de la AUH. A la vez datos preliminares del Ministerio de Educación muestran una clara tendencia de aumento en la matrícula escolar, alcanzando aproximadamente un 20% en el año 2010. De esta manera se entiende que la AUH promueve la asistencia y permanencia de los niños, niñas y adolescentes en la escuela y apunta a brindar una respuesta social de manera integral que beneficia a toda la familia. (ARGENTINA, 2011, p. 26-27)

O plano argentino prevê linhas de ação e objetivos. O objetivo geral do plano é a prevenção e a erradicação do trabalho infantil em todas as suas formas e a proteção do adolescente trabalhador, por meio de ações que permitam a participação de distintos atores sociais (ARGENTINA, 2011, p. 29).

Já como linhas de ação e objetivos específicos, o plano argentino prevê o desenvolvimento de diversas políticas públicas; divulgação permanente de campanhas publicitárias que visem informar uma complexidade de dados e legislações com a intenção de erradicar o trabalho infantil; desenvolvimento permanente do controle, do recolhimento e do intercâmbio de dados sobre o trabalho infantil, promovendo estudos e pesquisas estatísticas sobre o tema; enfrentamento do ciclo vicioso da pobreza; fortalecimento das “comisiones provinciales”, desenvolvendo políticas públicas de maneira descentralizada e integrada, de forma intersetorial e articulada, mediante um funcionamento contínuo; fortalecimento dos relacionamentos familiares de crianças e adolescentes em situação de risco, propiciando o desenvolvimento de atividades culturais, esportivas e de lazer, incentivando o trabalho dos adultos da família; fortalecimento do sistema de fiscalização e prevenção do trabalho infantil por meio de fiscalizações, incluindo a criação de redes de inspeção para o enfrentamento ao trabalho infantil; implementação, a partir de atores sociais, de outros mecanismos de prevenção ao trabalho infantil e proteção ao trabalho adolescente; garantia de inclusão e permanência de crianças e adolescentes no sistema educacional, com a finalidade de erradicação do trabalho infantil; garantia da saúde integral de crianças e adolescentes, enfrentando o trabalho infantil e suas consequências com a finalidade de promover o desenvolvimento integral de crianças e adolescentes, detectando por intermédio do sistema de saúde oficial, consequências decorrentes do trabalho infantil; promo-

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira ção da participação dos diversos atores sociais no processo de prevenção, enfrentamento e erradicação ao trabalho infantil (ARGENTINA, 2011, p. 30-49). A comissão dispôs no plano a necessidade de instituir o caráter interdisciplinar no enfrentamento ao trabalho infantil, devendo prever esse dispositivo nos mais diversos programas e projetos relacionados ao tema: Carácter transversal: los objetivos de prevención y erradicación del trabajo infantil deben estar presentes en los diferentes programas y proyectos de las áreas sociales. Para ello es necesario un relevamiento continuo que permita incorporar acciones destinadas al abordaje de la problemática en el propio diseño de programas y proyectos. (ARGENTINA, 2011, p. 72)

O plano previu a descentralização da execução de políticas públicas para o enfrentamento ao trabalho infantil com a finalidade de dar uma melhor resposta ao problema nos níveis provinciais e municipais (ARGENTINA, 2011, p. 72).

Enfim, a Argentina planejou um enfrentamento ao trabalho infantil de forma interdisciplinar, articulada, descentralizada e em rede, mediante a participação de diversos atores da sociedade civil e do Estado, instituindo a participação comunitária no processo de erradicação do trabalho infantil e atribuindo responsabilidade aos executores de políticas públicas de atendimento à saúde, à educação, à assistência social, à cultura, ao esporte e ao lazer como forma de erradicação e prevenção ao trabalho infantil. O plano também atentou para a fiscalização estatal em relação à prática do trabalho infantil como forma de proteção de crianças e adolescentes.

Capítulo 12 AS POLÍTICAS PÚBLICAS URUGUAIAS DE ENFRENTAMENTO À EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL

N

o ano 2000, o Uruguai criou o “Comité Nacional para la Erradicación del Trabajo Infantil” (CETI), tendo como objetivo coordenar e propor políticas e programas que visem eliminar o trabalho infantil. A comissão contribuiu para a elaboração do “Plan de Acción para la Prevención y Erradicación del Trabajo Infantil en el Uruguay”, que tem sua versão mais recente referente ao período de 2003-2005. Portanto, verifica-se que o plano de prevenção e erradicação do trabalho infantil do Uruguai não está sendo atualizado periodicamente, para se adequar à complexidade de enfrentamento ao trabalho infantil naquele Estado.

O “Comité Nacional para la Erradicación del Trabajo Infantil” (CETI) tem por finalidades: Asesorar, coordinar y proponer políticas y programas tendientes a la eliminación del trabajo infantil.

Elaborar y proponer el Plan Nacional de Acción para la eliminación progresiva del trabajo infantil y la protección del adolescente trabajador. Fortalecer la coordinación y concertación entre las instituciones públicas y privadas, nacionales e internacionales relacionadas con la infancia, a efectos de definir alternativas y estrategias que reduzcan o eliminen las causas básicas que generan el trabajo infantil y que promuevan la efectividad de la legislación sobre la edad mínima de admisión al empleo.

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira Generar instancias descentralizadas de actuación, fomentando el compromiso local con los objetivos propuestos. Promover acciones destinadas a formular un diagnóstico de la realidad nacional en torno al tema, con miras a elaborar y establecer un Plan Nacional de Lucha Contra el Trabajo Infantil; desarrollar políticas orientadas a su prevención y en definitiva, a su abolición, brindando especial atención a los niños y niñas que trabajen en condiciones inaceptables o de violación de los derechos humanos, en actividades o en condiciones peligrosas o que sean particularmente vulnerables. (URUGUAI)

O capítulo XVII do “Código de la Niñez y la Adolescencia” prevê a criação do “Consejo Nacional Consultivo Honorario de los Derechos del Niño y Adolescente”, com competência em nível nacional para:

Promover la coordinación e integración de las políticas sectoriales de atención a la niñez y adolescencia, diseñadas por parte de las diferentes entidades públicas vinculadas al tema; Elaborar un documento anual que contemple lo establecido en el numeral anterior; Ser oído preceptivamente en la elaboración del informe que el Estado debe elevar al Comité sobre los Derechos del Niño de las Naciones Unidas; Opinar, a requerimiento expreso, sobre las leyes de presupuesto, rendición de cuentas y demás normas y programas que tengan relación con la niñez y adolescencia. (URUGUAI, 2004)

O Conselho atuará na coordenação e integração articulada de políticas públicas intersetoriais destinadas a crianças e adolescentes e no assessoramento nos assuntos relacionados a direitos da criança e do adolescente. Os Ministérios da Educação e da Cultura do Uruguai serão os responsáveis pela provisão de recursos para o funcionamento do Conselho, que poderá criar comissões departamentais ou regionais com a mesma finalidade (URUGUAI, 2004). O “Plan de Acción para la Prevención y Erradicación del Trabajo Infantil en el Uruguay” previu medidas progressivas para a erradicação do trabalho infantil, buscando dar um especial tratamento à erradicação das piores formas de trabalho infantil, mediante um enfoque interdisciplinar e multidisciplinar de enfrentamento ao trabalho infantil e suas consequências à saúde, à educação, à moral, ao lazer, enfim, ao desenvolvimento integral de crianças e adolescentes, com a participação do Estado e da comunidade (URUGUAI, 2003, p. 5-7).

Exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes

A estratégia de enfrentamento ao trabalho infantil no Uruguai conta com os seguintes órgãos: “Programa de Sensibilización Pública”; “Programa de Protección Legal y Judicial”; “Programa de Educación”; e “Programa de Alternativas Económico – Productivas”. A primeira linha de ação do plano uruguaio é o “Programa de Protección Legal y Judicial”, que tem por finalidade a proteção dos direitos de crianças e adolescentes, os quais estão previstos juridicamente, buscando garantias contra a exploração do trabalho infantil e o fortalecimento do sistema de proteção (URUGUAI, 2003, p. 18-19). A segunda linha de ação é o “Programa de Sensibilización Pública”, que consiste em desenvolver estratégias de informação pública e de comunicação nos diversos setores sociais sobre a problemática do trabalho infantil e sobre a ofensa a direitos humanos. O programa também se propõe a combater os mitos sobre o trabalho infantil culturalmente aceitos pela sociedade, incentivando a difusão de informações, campanhas nos meios de comunicação, promoção de debates, sensibilização de agentes comunitários e a educação infantil (URUGUAI, 2003, p. 19-21).

A terceira linha de ação é o “Programa de Educación”, que possui como objetivo a permanência de crianças e adolescentes no sistema educativo nacional, mediante a participação da comunidade, da família e do Estado. Quando se aumenta a permanência na escola durante a infância, diminui a evasão escolar, e isso fará com que no futuro possam ascender a melhores oportunidades de trabalho, bem como, no presente, permitirá que a criança e o adolescente não sejam explorados pelo trabalho infantil (URUGUAI, 2003, p. 21-22). A quarta linha de ação é o “Programa de Alternativas EconómicoProductivas”, propiciando proteção contra o trabalho infantil e empregos para os adultos das famílias que tiveram crianças e adolescentes identificados como explorados pelo trabalho infantil, possibilitando alternativas econômicas a essas famílias (URUGUAI, 2003, p. 22-23). Verifica-se que o Uruguai ainda carece de meios necessários para o enfrentamento ao trabalho infantil, à exploração sexual comercial e à proteção de direitos humanos de crianças e adolescentes, que tendem a melhorar a partir do reordenamento político institucional das políticas públicas de enfrentamento ao trabalho infantil.

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Capítulo 13 A ARTICULAÇÃO, OS AVANÇOS E OS DESAFIOS DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE ENFRENTAMENTO À EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL NAS REGIÕES DE FRONTEIRA

A

Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho previu no seu artigo 8º a cooperação internacional entre Estados para o enfrentamento as piores formas de trabalho infantil e a aplicação dos dispositivos nela ratificados. O apoio deve ser recíproco e articulado, visando à erradicação das piores formas de trabalho infantil e da pobreza, ao desenvolvimento econômico e social e à garantia de uma educação universal (OIT, 1999). O Mercosul vem buscando realizar a cooperação regional e a articulação das políticas públicas de enfrentamento ao trabalho infantil nas regiões de fronteira dos países do bloco, unindo esforços mediante um compromisso regional que visa ao aperfeiçoamento de ações e a uma melhor compreensão para a causa. Os países do bloco vêm firmando diversos compromissos com o intuito de erradicar o trabalho infantil na região. Em 1998, foi ratificada a Declaração Sociolaboral do Mercosul; em 1999, a Declaração dos Ministros do Trabalho do Mercosul sobre Trabalho Infantil; em 2002, a Declaração Presidencial dos Países do Mercosul sobre a Erradicação do Trabalho Infantil; em 2006, o Plano Regional para a Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil no Mercosul; e em 2012 a Segunda Declaração Presidencial sobre a Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil no Mercosul (MERCOSUL, 2006).

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira O Plano Regional para a Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil no Mercosul, adotado no ano de 2006, expressou o compromisso entre os Estados para prevenir e erradicar o trabalho infantil na região de forma integrada e padronizando condutas, tendo como finalidade “dar los lineamientos y objetivos fundamentales para desarrollar una política regional para la prevención y erradicación del trabajo infantil en el MERCOSUR” (MERCOSUL, 2006, p. 2). O plano adotou como marco legal para o cumprimento dos objetivos as declarações internacionais da Organização das Nações Unidas e da Organização Internacional do Trabalho, bem como os compromissos regionais firmados entre os Estados do bloco (MERCOSUL, 2006, p. 3).

Portanto, buscou-se por meio do plano o desenvolvimento de uma política regional para a prevenção e erradicação do trabalho infantil de forma conjunta no âmbito do Mercosul. Porém, o plano não foi atualizado conforme o previsto, não demonstrando os avanços e nem vencendo os desafios sobre a temática na região (MERCOSUL, 2006).

As Declarações sobre a Prevenção e Erradicação ao Trabalho Infantil dos Presidentes dos países da região ratificam o compromisso com o tema. A “Segunda Declaración Presidencial sobre Prevención y Erradicación del Trabajo Infantil en el MERCOSUR”, firmada no ano de 2012 pelos presidentes do Brasil, da Argentina e do Uruguai, expressou o repúdio a qualquer forma de trabalho infantil e o aprofundamento nas ações destinadas a uma efetiva prevenção e erradicação ao trabalho infantil, mediante as seguintes ações: intensificar os diálogos os e compromissos para a implementação de ações conjuntas entre os atores do governo, da sociedade civil, os empregadores e os representantes dos trabalhadores; possibilitar espaços de articulação entre o público e o privado com a finalidade de erradicar o trabalho infantil; possibilitar a participação dos sindicatos como entidade de enfrentamento ao trabalho infantil; utilizar os meios de comunicação para a divulgação de discursos favoráveis aos direitos da criança e do adolescente e a erradicação do trabalho infantil; criar e possibilitar a atuação em conjunto de grupos multissetoriais locais, regionais e nacionais para a restituição de direitos de crianças e adolescentes exploradas pelo trabalho infantil; estimular e produzir boas práticas de erradicação e prevenção ao trabalho infantil; promover a integração entre os governos, a sociedade civil e a academia para a investigação e aperfeiçoamento das ações; promover políticas públicas que disponibilizem locais para atendimento de crianças

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e adolescentes quando os pais estiverem trabalhando; padronizar a idade mínima para o início do trabalho de acordo com a Convenção 138 da Organização Internacional do Trabalho; possibilitar a inserção ou a reinserção ao direito à educação de crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil; possibilitar a permanência e a finalização dos períodos escolares; possibilitar o atendimento à saúde de crianças e adolescentes, identificando situações de exploração de trabalho infantil; possibilitar o atendimento de crianças e adolescentes vítimas do trabalho infantil; inserir agentes de saúde nas populações que se encontrem em situação de pobreza ou extrema pobreza para enfrentamento do trabalho infantil; fortalecer a articulação entre as políticas públicas de prevenção e erradicação do trabalho infantil (MERCOSUL, 2012). Assim, destaca-se que a Segunda Declaração Presidencial sobre a Prevenção e a Erradicação do Trabalho Infantil no Mercosul reafirmou o compromisso conjunto de enfrentar e erradicar o trabalho infantil na região, mediante a atuação articulada das ações regionais para cumprir os compromissos estabelecidos por Brasil, Argentina e Uruguai.

Por meio de ações integradas e referenciais e com o intuito de enfrentamento à violência sexual contra crianças e adolescentes nas regiões de fronteira do Mercosul, Uruguai, Argentina, Paraguai e Brasil vêm se esforçando para a implementação do Programa PAIR/Mercosul – Estratégia Regional de Enfrentamento ao Tráfico de Crianças e Adolescentes para Fins de Exploração Sexual no Mercosul. O programa atua em rede, de forma articulada e com a cooperação internacional dos países da região para o enfrentamento da violência sexual e do tráfico de crianças e adolescentes para fins de exploração sexual em quinze cidades fronteiriças desses países (MERCOSUL). O programa é executado tendo a participação de diversas entidades públicas e privadas dos quatro países na sua execução, mediante o apoio financeiro do Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID e dos governos de cada país. A estrutura do programa conta com um órgão executor das ações nas cidades gêmeas, denominado Comitê Executivo Binacional ou Transnacional, sendo o responsável pela implementação do programa de forma descentralizada (MERCOSUL). O PAIR/Mercosul atua em nível regional como um mecanismo destinado permanentemente à consulta e à cooperação no enfrentamento à exploração sexual infantil nas regiões de fronteira, possibilitando o direcionamento de esforços e de recursos para tal finalidade, buscando: de-

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira senvolver a troca de informações sobre o tema; possibilitar o atendimento pelas políticas públicas das crianças e adolescentes vítimas da violação de direitos; desenvolver práticas para o enfrentamento à exploração sexual comercial; executar um programa que trará experiências positivas para o enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes em regiões de fronteira internacional com o deslocamento de pessoas (MERCOSUL). A implementação do PAIR/Mercosul contou com sete fases a ser percorridas simultaneamente: “1 – Articulação político-institucional”; “2 – Diagnóstico rápido e participativo”; “3 – Seminário para construção dos planos operativos locais”; “4 – Planos Binacionais e Transnacionais”; “5 – Capacitação da rede e pactuação de fluxos”; “6 – Construção da estratégia regional”; “7 – Monitoramento dos planos operativos regionais” (MERCOSUL).

Portanto, o programa possui uma sistematização do desenvolvimento de atividades para a construção da rede articulada regional nas cidades em que houver a implementação, possibilitando a construção da política pública com a participação das esferas pública e privada (governo e sociedade), a capacitação de agentes para o desenvolvimento das atividades, a qualificação dos gestores e dos executores das políticas públicas e a posterior análise e monitoramento para o aperfeiçoamento das atividades. Haverá incentivo ao desenvolvimento das políticas públicas no poder local, pois o desenvolvimento de planos de ação e de diagnósticos ocorrerá no local de desenvolvimento do programa, utilizando o compartilhamento de documentos, registros, bibliografias, estatísticas e qualquer outra fonte de informações sobre a exploração sexual comercial ou o tráfico de crianças e adolescentes para o fim de exploração sexual regional. Pereira (2010, p. 78-87) expôs sobre a integração dos países da tríplice fronteira para atuação em rede. Atuando em rede, com cooperação e interação mútua, pôde-se avançar no combate à exploração sexual comercial em regiões de fronteira, como demonstrado no estudo em questão sobre a tríplice fronteira (Foz do Iguaçu, Puerto Iguazu, Ciudad del Este). As redes de enfrentamento transfronteiriças contam com a atuação articulada do governo e da sociedade civil no combate à exploração sexual comercial, possibilitando a participação dos mais diversos órgãos, entre eles a Organização Internacional do Trabalho, Organização das Nações Unidas, Conselhos Tutelares, Governos Municipais e Nacionais, sindicatos, igrejas,

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empresas, universidades, jornais, empresas de telecomunicações, ONGs, nas medidas de contribuição ao enfrentamento de tais atividades, criando ações planejadas e desenvolvidas de forma coordenada e articulada pelos órgãos que participaram das atividades em tela, com o objetivo de sensibilizar a sociedade civil para o problema e permitir a união de esforços e estratégias para o combate à exploração sexual comercial entre os países transfronteiriços. Entre tais ações se destaca o Projeto OIT/IPEC de Prevenção e Eliminação da Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes na Região de Fronteira Argentina/Brasil/Paraguai, que atuou diretamente junto com o governo de tais países e contribuiu para a criação de redes de combate à exploração sexual comercial na sociedade civil. Em tais assertivas, tanto a sociedade civil quanto a Organização Internacional do Trabalho foram protagonistas nas medidas para o enfrentamento ao tipo de exploração em discussão. Por fim, verifica-se que, quando se delimita o espaço para a realização do enfrentamento à exploração sexual comercial, por meio de um compromisso regional, é possível a obtenção de melhores resultados em relação à erradicação do trabalho infantil e de constante aperfeiçoamento em relação às políticas públicas, possibilitando a articulação internacional de redes de enfrentamento ao trabalho infantil e de sistema de garantia de direitos a crianças e adolescentes.

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REFLEXÕES CONCLUSIVAS

Com o desenvolvimento da investigação, verificou-se que a exploração sexual comercial afeta grande número de crianças e adolescentes em regiões de fronteira, locais onde há considerável trânsito de pessoas. O contexto da exploração sexual comercial evidencia uma complexidade de causas a serem combatidas pelas políticas públicas para a erradicação dessa modalidade de trabalho infantil. A globalização econômica, a constante competitividade, o hiperconsumismo e o capitalismo desenfreado geram pobreza e exclusão social, influenciando diretamente nas causas para a exploração sexual comercial. Verificou-se, também, que a exploração sexual comercial traz diversas consequências aos direitos de crianças e adolescentes, o que prejudica o seu desenvolvimento integral e gera prejuízos ao direito à saúde, à educação, ao lazer, à possibilidade de exercer brincadeiras, ao esporte, à cultura, à profissionalização, e a melhores oportunidades futuras. A normativa internacional influenciou o Brasil, a Argentina e o Uruguai a instituírem a teoria da proteção integral no ordenamento jurídico interno. Os ordenamentos jurídicos internos de cada Estado estão alinhados às convenções internacionais, havendo uma padronização nas legislações dos países da região no que diz respeito à proibição da exploração sexual comercial e da instituição de ações imediatas para a sua erradicação. A teoria da proteção integral garantiu a condição de sujeito de direitos à universalidade de crianças e adolescentes, possibilitando o tratamento prioritário no seu atendimento e instituindo a garantia de direitos durante a infância como dever do Estado, da família, da comunidade e da sociedade.

Após a concretização da proteção jurídica no Brasil, na Argentina e no Uruguai, foram desenvolvidas políticas públicas intersetoriais para o

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André Viana Custódio & Rafael Bueno da Rosa Moreira enfrentamento à exploração sexual comercial. O Brasil vem consolidando uma diversidade de políticas públicas que possibilitam a proteção de direitos e o atendimento a crianças e adolescentes no sistema de garantia de direitos, assegurando o acesso à assistência social, à educação, à saúde, ao esporte e à cultura, que deve se desenvolver de forma articulada e descentralizada, consolidando uma rede de enfrentamento à exploração sexual comercial e de proteção de direitos humanos de crianças e adolescentes. Constata-se que, após a instituição das políticas públicas destinadas ao enfrentamento ao trabalho infantil e à garantia de direitos de crianças e adolescentes que vêm sendo desenvolvidas no Brasil de forma articulada e em rede, estão sendo diminuídos, estrategicamente, os índices oficiais de ocorrência de exploração de trabalho infantil em território brasileiro. Esses fatores não objeto detalhado de análise nas políticas públicas uruguaias e argentinas em decorrência da baixa quantidade de pesquisas que foram encontradas sobre o tema. No entanto, mesmo com a consolidação da proteção jurídica e com a instituição de uma diversidade de políticas públicas, muitos ainda são os problemas no desenvolvimento das políticas públicas de atendimento e de proteção de crianças e adolescentes no Brasil, necessitando de constante aperfeiçoamento na execução das políticas públicas tendo em vista a falta de recursos, de efetivo e de infraestrutura dos órgãos executores de políticas públicas, além da baixa capacitação dos administradores públicos e do sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente.

Nas regiões de fronteira do Estado do Rio Grande do Sul, estão sendo desenvolvidas políticas públicas regionais para o enfrentamento à exploração sexual comercial, denominadas Estratégia Regional de Enfrentamento ao Tráfico de Crianças e Adolescentes para Fins de Exploração Sexual no Mercosul – PAIR/Mercosul, visando ao melhor enfrentamento da causa e à padronização de condutas. Para o aperfeiçoamento dessas políticas, é necessária a garantia da articulação internacional e a criação de redes internacionais de enfrentamento à exploração sexual comercial relacionada às redes nacionais.

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