Falco rufigularis no sul do Brasil: primeiros registros documentados em Santa Catarina e registro adicional no Paraná

July 27, 2017 | Autor: João Gava Just | Categoria: Ornithology, Ornitologia, Ornitología
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Falco rufigularis no sul do Brasil: primeiros registros documentados em Santa Catarina e registro adicional no Paraná João Paulo Gava Just1,2, Fernando Wons, Braulio Aguiar Florczak, Valdemiro Schauren & Jairo José Zocche1 Falco rufigularis Daudin, 1800 (Falconidae), popularmente conhecido como cauré ou falcão-morcegueiro, é uma pequena ave de rapina diurna que habita áreas adjacentes a florestas, clareiras, áreas abertas com árvores esparsas, margens de rios e eventualmente, zonas urbanas e cultivos agrícolas (Thiollay 1985, Sick 1997, Ferguson-Lees & Christie 2005). Está amplamente distribuída nos Neotrópicos, sendo dividida em três subespécies: F. r. petoensis, que ocorre das baixadas úmidas do norte do México até o sul do Equador, a oeste dos Andes; F. r. ophryophanes que ocorre no planalto brasileiro, áreas adjacentes da Bolívia, Paraguai e Argentina e F. r. rufigularis, que ocorre na base dos Andes, Trinidad, leste da Colômbia, a leste para Guianas e ao sul para o leste do Equador, leste do Peru, norte da Bolívia, nordeste da Argentina e sul do Brasil (Sick 1997, GRIN 2014). Os registros desta espécie no sul do Brasil são escassos e pouco documentados: no estado do Paraná estão concentrados no Alto Rio Paraná (Loures-Ribeiro & Anjos 2006) e segundo registros no website WikiAves (www.wikiaves.com.br), também na região sudoeste na área de influência do rio Uruguai (Francisco 2012, Militello 2013). No Rio Grande do Sul existiam apenas registros visuais no Parque Estadual do Turvo, noroeste do estado (Voss & Albuquerque 1990), que foram substanciados recentemente por Meller (2013) na mesma localidade através de documentação fotográfica. De acordo com Rosário (1996), Santa Catarina é o único estado do sul brasileiro sem registro de ocorrência confirmado deste falconídeo. Contudo, Meller (2013) comentou sobre observações de indivíduos no leste de Santa Catarina feitas em 2006 e 2009 pelos ornitólogos Jorge Albuquerque e Rafael Antunes Dias, as quais precisam ser consideradas com cautela por sua informalidade, falta de documentação e ausência de registros da espécie na porção leste dos outros estados do sul brasileiro. Desse modo, a fim de fornecer novos registros para o sul do Brasil e substanciar a presença de Falco rufigularis em Santa Catarina, apresentamos dois registros documentados na porção oeste catarinense e outro na porção sudoeste do Paraná. O primeiro registro em Santa Catarina se deu no dia 12 de maio de 2013, nas imediações da BR-282, Linha São Pedro, município de São Miguel do Oeste (26°40’10’’S e 53°34’35’’W, 550 m de altitude), às 09:20 h da manhã, onde um indivíduo adulto foi fotografado pousado em um poste (Figura 1A). Após 20 min os observadores retornaram à área e o indivíduo ainda permanecia pousado no mesmo local, oportunizando a observação de resquícios de penas de uma ave não identificada em seus tarsos. O ambiente do registro pode ser caracterizado como uma área periurbana, onde se encontram ainda alguns fragmentos de Floresta Estacional Decidual em meio a uma

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matriz dominada por cultivos agrícolas, reflorestamento de espécies exóticas e corpos d’água artificiais. Outro registro em território catarinense se deu no dia 9 de maio de 2014 às 11:55 h município de São João do Oeste (27º06’02’’S e 53º35’33’’W, 350 m de altitude), oeste do estado, onde um indivíduo adulto (Figura 1B) foi observado pousado por 30 min sobre um ninho de joão-de-barro Furnarius rufus (Gmelin, 1788) localizado em um poste de linha telefônica. O cauré iniciou uma série de golpes com o bico e garras quebrando a estrutura de barro, provavelmente em busca de filhotes ou ovos, mas sem êxito. Após esse registro, nos dois dias subsequentes o indivíduo foi visto pousado sobre o mesmo ninho. Nestas últimas observações nenhuma presa foi visualizada. O registro de F. rufigularis no Paraná foi realizado às 16:00 h em 28 de agosto de 2011 no centro do município de Capanema (25°39’46”S e 53°48’27’’W, 370 m de altitude), sudoeste do estado. Um indivíduo adulto foi visualizado e fotografado (Figura 1C) pousado em um poste predando uma pomba-de-bando Zenaida auriculata (Des Murs, 1847). Entre maio de 2012 e agosto de 2013 outros cinco registros (e.g. WA-1054345) foram obtidos no mesmo poste e em postes adjascentes, o que pode representar um ponto de forrageamento da espécie, uma vez que em todas as vezes apresentava presas em sua garra (A. Pieri in litt.). O ambiente do registro está totalmente inserido em centro urbano com presença de elementos arbóreos e fica situado há apenas 15 km do Parque Nacional do Iguaçu, onde mesmo com inventários significativos da avifauna (Castelino et al. 1996, Straube et al. 2004) a espécie ainda não havia sido citada para o território da Unidade de Conservação. Por apresentar registros próximos de Santa Catarina, a ocorrência de F. rufigularis no estado já era esperada. O fato de a espécie não ter sido citada antes, se deve ao fato de que a região de influência do rio Uruguai no extremo oeste catarinense, junto a algumas localidades do sudoeste do Paraná, podem ser consideradas entre as áreas que apresentam a maior lacuna ornitológica no sul do Brasil (Piacentini et al. 2006). Apesar de estarem localizadas próximas a áreas de proteção ambiental e com inventários ornitológicos significativos como o Parque Nacional do Iguaçu no Paraná (Straube et al. 2004), o Parque Estadual do Turvo no Rio Grande do Sul (Albuquerque 1981, Mahler Jr. 1996) e parte da Floresta Atlântica de Misiones na Argentina (e.g. Chebez 1996, Giraudo & Povedano 2004), é notável a carência de estudos em longo prazo, visando caracterizar comunidades de aves e implementações de ações mitigadoras para a conservação da biodiversidade. Agradecimentos Agradecemos Jonas R. R. Rosoni e Daniela Bôlla pelo auxílio na revisão do texto e os revisores pelas sugestões feitas ao manuscrito. Sarah e Natan Aguiar Florczak acompanharam BAF em campo. Atualidades Ornitológicas, 183, janeiro e fevereiro de 2015

Figura 1. Adultos de Falco rufigularis registrados: A - em poste em área periurbana, São Miguel do Oeste, Santa Catarina; B - sobre ninho de Furnarius rufus em São João do Oeste, Santa Catarina; C - predando indivíduo de Zenaida auriculata em área urbana de Capanema, Paraná. Fotos: Braulio Aguiar Florczak (A); Valdemiro Schauren (B); Fernando Wons (C).

Referências bibliográficas

Albuquerque, E.D. (1981) Lista preliminar das aves observadas no Parque Florestal Estadual do Turvo, Tenente Portela, Rio Grande do Sul, Brasil. Roessleria 4: 107-122. Castelino, M.A., N.R. Rey, J. Herrera, & J. Calo (1996). Inventario de las aves del Parque Nacional Iguazú (Misiones, Argentina). Buenos Aires: LOLA. Chebez, J.C. (1996) Fauna Misionera: catálogo sistemático y zoogeográfico de los vertebrados de la provincia de Misiones (Argentina). Buenos Aires: Editorial LOLA. Ferguson-Lees, J. & D.A. Christie (2005) Raptors of the world: A field guide. New Jersey: Princetown University Press. Francisco, J.B. (2012) [WA676531, Falco rufigularis Daudin, 1800]. WikiAves. Disponível em: . Acesso em: 23 de dezembro de 2014. Giraudo, A.R & H. Povenado (2004) Avifauna de la región biogeográfica Paranaense o Atlántica Interior de Argentina: biodiversidad, estado del conocimiento y conservación. Miscelánea 12: 332­-348. GRIN - Global Raptor Information Network (2014) Species account: Bat Falcon Falco rufigularis. Disponível em: . Acesso em: 23 de outubro de 2014. Loures-Ribeiro, A. & L. Anjos (2006) Falconiformes assemblages in a fragmented landscape of the Atlantic Forest in southern Brazil. Brazilian Archives of Biology and Technology 49: 149-162. Mähler Jr, J.K. (1996) Contribuição ao conhecimento da avifauna do Parque Estadual do Turvo, Rio Grande do Sul, Brasil. Acta Biologica Leopoldensia 18: 123-128. Atualidades Ornitológicas, 183, janeiro e fevereiro de 2015

Meller, D.A. (2013) Novos registros do cauré (Falco rufigularis) no nordeste da Argentina e sul do Brasil, incluindo a primeira documentação para o Rio Grande do Sul. Nuestras Aves 58: 26-28. Militello, E. (2013) [WA861890, Falco rufigularis Daudin, 1800]. WikiAves. Disponível em: . Acesso em: 23 de outubro de 2014. Piacentini, V.Q., I.R. Ghizoni-Jr., M.A. Azevedo & G.M. Kirwan (2006) Sobre a distribuição de aves em Santa Catarina, Brasil, parte I: registros relevantes para o Estado ou inéditos para a Ilha de Santa Catarina. Cotinga 26: 25-31. Rosário, L.A. (1996) As aves em Santa Catarina: distribuição geográfica e meio ambiente. Florianópolis: FATMA. Sick, H. (1997) Ornitologia Brasileira. Edição revisada e ampliada por José Fernando Pacheco, Rio de Janeiro: Nova Fronteira. Straube, F.C, A. Urben-Filho & J.F. Cândido-Jr. (2004) Novas informações sobre a avifauna do Parque Nacional do Iguaçu (Paraná). Atualidades Ornitológicas 120: 10. Thiollay, J.M. (1985) Species diversity and comparative ecology of rainforest falconiforms on three continents. Conservation studies on raptors: ICBP Technical Publication 5: 167-179. Voss, W.A. & E.P. Albuquerque (1990) Comunicação sobre a ocorrência do falcão-de-garganta-branca, Falco rufigularis Daudin, 1800, no Rio Grande do Sul, Brasil. Acta Biologica Leopoldensia 12: 201-202.

Laboratório de Ecologia de Paisagem e de Vertebrados, Universidade do Extremo Sul Catarinense (UNESC), Av. Universitária, Criciúma-SC, Brasil. 2 [email protected] 1

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